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Notas para um ensaio sobre a dignidade da pessoa humana.

Conceito fundamental da Ciência Jurídica

Notas para um ensaio sobre a dignidade da pessoa humana. Conceito fundamental da Ciência Jurídica

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            "Fatos como os que ocorreram em Auschwitz são violentas advertências sobre o que pode acontecer quando os indivíduos – e por extensão, sociedades inteiras – perdem o contato com os sentimentos humanos básicos."

Tenzi Gyatso, o décimo quarto DALAI LAMA


SUMÁRIO. 1. Considerações iniciais. PARTE I. 1. Premissas Metodológicas. O Direito no quadro das ciências sociais da pós-modernidade. 2. Linguagem, Direito e Ciência do Direito. 3. Texto e Norma. Distinções. PARTE II. 1. A Dignidade da Pessoa Humana. 2. Como conhecê-la? 3. Sobre o Conceito Jurídico Fundamental (Dignidade da Pessoa Humana) e sua Natureza. 4. Apontamento sobre os modelos jurídicos, ocidental e islâmico. 5. Por que a pessoa humana possui dignidade? 5.1. Porque a pessoa humana é espírito. 5.2. Porque o ser humano é pessoa.


1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS.

            É caro a todo operador do direito o princípio jurídico posto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, qual seja, a dignidade da pessoa humana. Este escrito faz deste conceito previsto no mundo do dever ser uma ponte necessária e imprescindível para o estudo do ser do direito brasileiro, no que pertine ao seu conceito fundamental.

            Para esclarecimento do leitor, fazem-se necessários alguns aportes de natureza metodológica, máxime a visão adotada pelo autor sobre o Direito e a forma de estudá-lo na atual quadra de nossa vida jurídica. O mais é desdobramento das premissas.


PARTE I

1. PREMISSAS METODOLÓGICAS. O DIREITO NO QUADRO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS DA PÓS-MODERNIDADE.

            Iniciamos esta reflexão trazendo à colação as palavras sempre autorizadas de Boaventura de Souza Santos, [01] ao ponderar que estamos no fim de um ciclo de hegemonia de uma certa ordem científica. Na ciência moderna o conhecimento avançava pela especialização, pela busca do racionalismo cartesiano; neste sentido, ele era tanto mais rigoroso quanto mais restrito era o objeto (metodicamente mutilava-se o objeto) sobre o qual incidia; havia uma nítida segregação do saber, por conseguinte, uma compartimentabilização do conhecimento ao mesmo tempo em que imperava uma severa vigilância nas fronteiras das disciplinas, para reprimir o cientista que quisesse transpor tais limites, fazendo do cientista um "ignorante" especializado. Kelsen, na seara jurídica, foi um dos baluartes deste modelo, malgrado, pelo conjunto da obra, possa ser facilmente reconhecido como o maior jurista do século passado.

            Celso Lafer também anotou com rigor as características da ciência moderna, mormente a visão filosófica do pensamento moderno, marcado pela questão do método. São deles as palavras:

            Uma das notas importantes do pensamento moderno é a acentuada preocupação com o problema dos limites e das possibilidades do conhecimento. Esta passagem da reflexão sobre o ser – que marcou o pensamento clássico e medieval – para o conhecer permite que se diga que a Filosofia moderna desenvolveu-se como uma crítica sobre o conhecimento, e portanto como metodologia. [02]

            O modelo científico pugnado pela ciência moderna, no campo jurídico, se por um lado produziu um reconhecido avanço racional, por outro reduziu a complexidade da vida à secura de uma dogmática mutiladora e reducionista, que a ciência jurídica da pós-modernidade quer superar ao redescobrir o mundo filosófico, ético, sociológico entre outros, em busca de uma complexidade e uma prudência aristotélica perdida pela modernidade.

            A verdade que nos foi revelada, ainda que como legado importante da modernidade, é que os fatos observados pelas ciências têm vindo a escapar ao regime do isolamento até então proposto. Os objetos têm fronteiras cada vez menos definidas; são nas mais das vezes constituídos por anéis que se entrecruzam em teias complexas com os dos restantes objetos, a tal ponto que os objetos em si são menos reais que as relações entre eles. Como então criar um isolamento prisional para o conceito fundamental, dignidade da pessoa humana? É impossível, além de inconveniente.

            Neste escrito, o leitor verá que trabalharemos o conceito dignidade da pessoa humana mediante teorias que buscam explicá-lo através de um conhecimento que extrapole os parcos limites de uma dogmática estritamente normativista [03], indo além fronteiras, ao encontro de uma epistemologia jurídica agregadora, híbrida, plural, lingüística, complexa, porém, acima de tudo, compromissada com uma postura ética e positiva em relação ao ser humano. [04]

            Neste sentido, o conhecimento jurídico volta a ser uma aventura encantada, uma busca da totalidade, da complexidade, uma superação dos dualismos natureza/cultura, observador/observado, coletivo/individual etc. O universo jurídico pós-moderno não é de delimitação tão-somente, mas também de mistura, de celebração do cruzamento, do híbrido, do complexo, do plural, do concreto, do retórico. Muito mais do que se ter um objeto jurídico cartesianamente determinado, o que temos hoje são temáticas, agrupamentos de objetos, relações, galerias por onde os conhecimentos progridem ao encontro uns dos outros, formando um enorme mundo jurídico comunicacional, onde ganham cada dia mais relevo estudos ao modo de uma "situação comunicativa" tal como pugnada por Jürgen Habermas [05], ou à moda pontesiana e popperiana, oportunamente lançada por Adriano Soares da Costa [06], ou na linha de uma "semiótica jurídica", tão bem capitaneada pelo professor Paulo de Barros Carvalho [07].

            Falar em linguagem comunicacional, em relações sujeito-a-sujeito, em temáticas como agrupamentos de objeto é reconhecer a complexidade do conhecimento na pós-modernidade, o complexus, como bem ensina Edgard Morin [08]. Significa o que foi tecido junto. De fato, há complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o econômico, o jurídico, o político, o filosófico, o sociológico, o psicológico, o afetivo etc.), e há um tecido interdependente, interativo, unindo o todo e as partes e as partes entre si; por isso a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade. O que precisamos é substituir um pensamento que separa e reduz por um pensamento que distingue e une. Não se trata de abandonar o conhecimento das partes pelo conhecimento das totalidades, nem da análise pela síntese, mas, sim de conjugar. Conjugar é diferente de sintetizar: na síntese se reduz, na conjugação, distingue-se para unir.

            É conhecida a lição de Lourival Vilanova quando diz:

            Há um abismo entre o ‘mundo do ser’ e o do ‘dever-ser’, a vontade de superar este abismo é o que caracteriza propriamente a ´´cultura. [09]

            Com efeito, não há fusão do dever-ser no ser, contudo o direito é objeto cultural da ordem do dever-se, e o dever-ser o é em direção ao ser, à experiência, razão pela qual só um pensamento que conjugue, um pensamento que separe o ser do dever-ser para uni-los no objeto que cultural que é o direito poderá fazer com que o direito hodierno tenha força social suficiente para enfrentar e dar respostas aos desafios da complexidade, com os quais o desenvolvimento próprio de nossa era nos confronta inelutavelmente.

            Releva, assim, a importância de a ciência do direito ser encarada sob estas novas perspectivas oriundas da pós-modernidade, para que só assim possamos alcançar respostas satisfatórias para o entendimento do que quer proteger a Constituição Federal, quando considera a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.

            A pós-modernidade ou pós-positivismo se aproxima e muito do pensamento conjetural de que nos fala o inesquecível Miguel Reale [10], ou seja, no sentido de que o Direito, sendo uma das dimensões da vida humana, de sua experiência, não pode deixar de refletir as perplexidades e complexidades conaturais ao ser humano, em cuja atividade individual e coletiva a flexível conjetura atende mais aos valores existenciais do que às pretensas certezas do racionalismo rigoroso e restrito.

            O respeito à dignidade da pessoa humana e por conseguinte a diminuição da miséria que assola este país são assuntos a serem tematizados por todos os ramos do direito, em especial o direito constitucional. Para isto, é necessária uma outra forma de conhecimento jurídico, compreensivo, íntimo, e que não mutile e reduza nosso pensamento, mas que antes nos conjugue com o que estudamos. Não se trata mais do espanto medieval perante uma realidade hostil possuída do sopro da divindade, nem do racionalismo neutro do iluminisno, ou do ceticismo do século XX, mas, antes de tudo, da prudência perante um mundo que, apesar de domesticado, nos mostra cada dia mais a precariedade do sentido de nossas vidas, em meio a um turbilhão de desigualdade social, pobreza e miserabilidade crescentes.

            O que acima foi dito nos remete de imediato à necessidade de uma nova metodologia jurídica, de um novo pensar jurídico, voltado para solucionar os conflitos complexos de uma sociedade pluralista, exigindo, destarte, a consideração na aplicação do direito de conhecimentos que até então eram considerados ajurídicos, como sabiamente aduz o professor Vicente de Paulo Barretto [11]:

            O direito pós-moderno aparece, então, quando o lemos sob essa nova ótica, não como instrumento de conservação social, mas sim como agente da mudança social.

            Como bem definiu o professor de Direito Constitucional Luís Roberto Barroso [12], os traços característicos do pós-positivismo são, basicamente, um conjunto de idéias plurais que ultrapassam os limites de um legalismo estrito do positivismo-normativista, sem recorrer às categorias da razão subjetiva do jusnaturalismo. Sobressaem também marcas de uma forte ascensão dos valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialidade dos direitos humanos fundamentais; logo, com o pós-positivismo a discussão ética volta ao centro do Direito.

            O pluralismo epistemológico incide na temática jurídica, fazendo com que surja uma nova hermenêutica, onde – mais do que a razão cartesiana do ´´sim´´ ou ´´não´´ – está presente a ponderação de interesses e a reelaboração teórica, filosófica e prática do estudo do Direito.


2. LINGUAGEM, DIREITO E CIÊNCIA DO DIREITO.

            O conhecimento atual está profundamente marcado e mediado pela linguagem, de maneira que conhecer algo é conhecer a linguagem que torna esse algo compreensível. Agora, atenção! Tenhamos cuidado para que tal assertiva (Linguagem e Direito) seja ampliadora do fenômeno jurídico que é complexo, e não reducionista e mutiladora do Direito.

            Pois bem. Vivemos um contexto filosófico onde ressaem fortes os conceitos oriundos da chamada Filosofia da Linguagem Contemporânea. Fruto desta concepção filosófica é o alcunhado giro lingüístico, que introduz a novidade epistemológica de que o conhecimento e a linguagem têm sentido apenas no diálogo, e que a relação sujeito-objeto não pode ser vista apenas limitada a essa díade, sendo triádica, sujeito-objeto-comunidade.

            Manfredo Araújo de Oliveira traz preciosa lição sobre o tema,

            O pressuposto básico dessa concepção é de que a linguagem se radica num acordo prévio a respeito de um sistema de normas e convenções sociais. Insiste-se, portanto, aqui, acima de tudo, no caráter prático e intersubjetivo da linguagem humana. A linguagem passa a ser entendida, em primeiro lugar, como ação e mais precisamente como ação social, que, por essa razão, não pode ser explicada como produto de um único sujeito. Ela é a mediação necessária no processo intersubjetivo de comunicação de tal modo que o ponto de referência de toda a filosofia é, agora, a comunidade de sujeitos em interação, sua práxis comum, realizada de acordo com regras determinadas e originadas a partir do uso das palavras nas comunidades específicas [13].

            Assim, o giro lingüístico se dá com a inflexão da filosofia para o estudo da linguagem como mediadora e constitutiva do conhecimento intersubjetivamente válido. O sujeito e o objeto se relacionam na comunicação com os outros partícipes do discurso. Contudo, a linguagem neste sentido é um índice temático e não um fim temático ensimesmado, isto porque ela só ganha sentido e representação no diálogo com o outro.

            Se em Kant, a razão prática está associada a um padrão interpretativo que se explica a partir da singularidade do sujeito (o imperativo categórico kantiano é um exemplo), a partir da reviravolta lingüística, a razão prática é substituída pela razão comunicativa, acoplando o conceito de racionalidade ao medium lingüístico. Isto é, na razão comunicativa o agir é orientado para o entendimento, para o outro, rompe-se o individualismo e entra-se num jogo dialógico. [14] Noutro dizer, o próprio conceito de validade moral desloca-se de uma consciência moral individual, para o âmbito de uma linguagem pública, realizada através do discurso argumentativo como um entendimento intersubjetivo. [15]

            Neste contexto filosófico, o que é o "real"? Certamente, o "real" é o que pode ser representado em proposições verdadeiras, ao passo que o verdadeiro é o que pode ser explicado em relação ao outro no momento que se assevera uma proposição [16], "afinal de contas, a linguagem deseja ser comunicada, e não prescinde da alteridade. É pelo outro que me descubro como eu na vivência do discurso. É nesse sentido que podemos, então, compreender o papel do simbólico como representação social de algo que esta aí". [17]

            O Direito Constitucional, ramo onde está inserido o tema deste escrito, sofre o impacto direto da filosofia da linguagem contemporânea. Tanto ele, direito constitucional, quanto a ciência jurídica que o estuda, são ambos corpos de linguagem, dois discursos de ordem lingüística, da ordem do dever-ser e da ordem das ciências respectivamente, cada qual portador de suas peculiaridades próprias. O ordenamento jurídico constitucional é ontologicamente tridimensional, ou seja, é composto de uma integração normativa de fatos segundo valores, que se sintetizam no conceito fundamental da dignidade da pessoa humana.

            A linguagem do direito constitucional positivo é chamada de linguagem-objeto, quando cotejada com a linguagem da ciência do direito constitucional, que é de sobrenível, ou metalinguagem. Ao direito constitucional positivo corresponde a lógica deôntica, lógica do dever-ser, em razão disto as normas de direito constitucional são válidas ou não-válidas, diferentemente, da ciência do direito constitucional, cujos enunciados são verdadeiros ou falsos. [18] A linguagem da ciência do direito constitucional é tida como uma metalinguagem, cujo vetor é descritivo da linguagem-objeto, a lógica que preside esta linguagem é a lógica das ciências, ou lógica apofântica, cujos enunciados, como já dito, são valorados como verdadeiros ou falsos.

            Um parêntese para uma importante e decisiva observação. Trabalhamos com o conceito de "ciência" na acepção de um conjunto organizado de conhecimentos relativos a um determinado objeto, mediante o uso de um método próprio. Neste sentido é que falamos em ciência do direito constitucional. Contudo, a problematização das questões jurídico-constitucionais, muito embora sejam estruturadas cientificamente, são ontologicamente de natureza prudencial, i.e, diante de múltiplas soluções corretas para uma mesma questão, o intérprete jurídico elege a aceitável, a discursivamente justificável [19].

            Se a ciência do direito produzisse interpretações ontologicamente científicas, poderíamos então afirmar que frente a algumas questões jurídicas, a ciência jurídica ainda não seria capaz de oferecer respostas, contudo, não é assim que ocorre na ciência jurídica, não se trata de conseguir ou não conseguir oferecer respostas racionalmente aceitáveis, mas, sobretudo, de que o operador do direito estará sempre frente a múltiplas respostas jurídicas.

            Por isso, acertadamente a nosso ver, Eros Roberto Grau [20], assoalhado em Aristóteles (Ética a Nicômaco), afirma que a interpretação jurídica (que já é aplicação do direito) é uma prudência, uma virtude cientificamente estruturada, cujo conteúdo é a razão intuitiva que não discerne o exato do ponto de vista jurídico, mas sim o correto, o aceitável, o justificável na comunidade do discurso, daí a interpretação jurídica ser uma juris prudentia e não uma juris sientia. [21]


3. TEXTO E NORMA. DISTINÇÕES.

            Emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, medida provisória, resoluções, decretos, sentenças, acórdãos e atos administrativos são textos normativos. Fontes de direito que contêm enunciados prescritivos (artigos, incisos, alíneas etc). Adquirem concretude existencial naqueles suportes físicos prescritos pelo próprio direito: diário oficial, autos do processo, autos administrativos e etc. De modo que, estes textos normativos (fontes) veiculam tantas normas quanto o juízo do intérprete puder identificar e justificar perante a comunidade jurídica do discurso [22]. Não há se confundir norma e texto normativo (ex: lei). Este é o veículo geral, base empírica dos enunciados prescritivos. A norma é a significação desses enunciados colhida pelo intérprete jurídico

            Em sendo assim, já podemos reter algumas conclusões parciais: a)- emenda constitucional, lei etc. são textos normativos que veiculam normas jurídicas; b)- a significação das normas jurídicas não se esgota na dimensão dos enunciados, mas sim, é construída a partir deles; c)- uma lei, por exemplo, contém diversos enunciados, todavia, pode não conter em toda sua extensão, uma norma jurídica completa.

            Feito este registro, é importante também afirmarmos que ali onde houver texto, haverá, necessariamente, um contexto. Não há texto sem contexto. E o conteúdo semântico da norma jurídica será construído depois de uma séria e profunda investigação contextual capaz de apreender os valores que nela intervém, postulando a orientação adequada para as condutas intersubjetivas que disciplina.

            A significação se contém no texto, mas não apenas nele [23]. É processo de construção de sentido partindo de um dado, do que aí se encontra. Há texto e há contexto [24]. Contexto do texto e contexto do intérprete, entra aí o jogo-de-linguagem. Para se chegar a uma norma jurídica como expressão completa de significação deôntico-jurídica, não se pode olvidar que cada texto tem sua historicidade, os valores que o impregnam, os fins a que visam. Cada intérprete tem o seu condicionamento histórico, psicológico, cultural e axiológico (sistema de referência ou pré-compreensão). Explicando mais ainda: as normas jurídicas estão nas significações que nós construímos com base nos textos normativos (um dado que aí se encontra), construímos pela leitura dos enunciados. Juntando um enunciado a outro enunciado, às vezes nós precisamos de muitos enunciados, vamos até a códigos diferentes, corpos de linguagem prescritiva diferentes, para aprisionar um enunciado, juntá-lo a outro, e construir uma norma em termos de significação deôntico-jurídica.

            Como fina sutileza teórica, anota Adriano Soares da Costa que a

            norma jurídica não é a significação que um intérprete individualizado, psicologizado, saque das fontes do direito. Como fato sociocultural, a norma jurídica é a significação prescritiva que visa disciplinar e influenciar a zona material da conduta humana. Logo, para cumprir o seu fim, a norma há de ser vista e compreendida como significação socialmente aceita, ou seja, como vivência intencional, ou ainda, no dizer de Luiz Recasens Siches, como vida humana objetivada. [25] (grifos não constam do original).


PARTE II

1. A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

2. COMO CONHECÊ-LA?

            Começamos esta parte II com uma reflexão propedêutica. Como podemos conhecer o significado do conceito jurídico dignidade da pessoa humana? É sabido que cada ser humano possui seu próprio universo de conhecimento, uma estrutura cultural que é o seu chamado sistema de referência. Muitas vezes o sistema de referência de um ser humano não pertence só a ele, pode tal sistema ser o universo cognitivo de uma coletividade. É natural que oriundos das mesmas contingências, os sistemas de referências de pessoas ou de um mesmo grupo sejam semelhantes uns aos outros. [26]

            Portanto, é mediante o nosso sistema de referência que aproximaremos do objeto de estudo, daí porque tanto se fala que o conhecimento de uma realidade está sempre condicionado pelo sistema de referência do sujeito conhecedor.

            Neste sentido, poderíamos ponderar que o próprio modo de se aproximar do objeto eleito não é um ato de liberdade, liberdade aqui pensada como ausência de pré-motivo. Todo ato livre é sempre determinado por algum motivo, qual o patrimônio cultural do sujeito cognoscente, o confronto de uma informação vinda do mundo exterior, com todo o cabedal de aprendizado já armazenado pelo agente. [27]

            Lado outro, o objeto a ser conhecido também está inserido em um sistema de referência, por exemplo, o conceito dignidade da pessoa humana está inserido dentro do sistema de referência que podemos chamar de Direitos ocidentais, i.e, um conjunto de normas jurídicas, que culturalmente assentam sua especificidade na assimilação dos legados da Grécia e da Roma clássicas, do Cristianismo e da Igreja, das Revoluções liberais e dos prodígios da ciência e da técnica. [28]

            Só a partir destas constatações é que o leitor poderá entender a construção que se vai delineando neste texto. O sentido atribuído ao conceito dignidade da pessoa humana está marcado por um sistema de referência fruto dos direitos do ocidente, é impossível negar esta afirmação. Entretanto, a consagração do conceito só se afirmará no século XX, após a grande tragédia do Holocausto na 2ª grande guerra, máxime a inesquecível lembrança do ocorrido nos campos de concentração nazista em Auschwitz.

            Deste modo, não podemos negar o sistema de referência que circunda o objeto eleito, a dignidade da pessoa humana, como também não podemos negar a nossa visão de mundo, até porque interpretamos e lemos a realidade a partir de nós mesmos, razão pela qual somos concordes com Leonardo Boff quando ensina,

            Ler significa reler e compreender, interpretar. Cada um lê com os olhos que tem. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual a sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura. A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender, é essencial conhecer o lugar de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que experiências tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação. Sendo assim, fica evidente que cada leitor é co-autor. Porque cada um lê e relê com os olhos que tem. Porque compreende e interpreta a partir do mundo que habita. [29] (grifos não constam do original).


3. SOBRE O CONCEITO JURÍDICO FUNDAMENTAL E SUA NATUREZA.

            Fixadas nossas premissas para conhecimento de nosso tema, qual seja, a dignidade da pessoa humana, consoante art. 1º, inciso III, da Constituição Federal, passamos a defini-lo com um conceito jurídico fundamental para o ordenamento brasileiro, bem como ao final discorreremos sobre sua natureza jurídica.

            Conceituar é abstrair, é retrooperar até as origens do pensamento em busca do sentido do conceito construído. É como salienta Lourival Vilanova,

            O conceito, desta sorte, é uma abstração; o pensamento, por essência, se move no abstrato. Não abstrato na acepção do hipotético, irreal, mas no sentido de que separa o que existe unido, decompõe o que se apresenta em indissolúvel unidade. [30]

            Sigamos margeando livremente o pensamento do mestre Vilanova. O conceito supremo ou fundamental da cada sistema científico funciona logicamente como um pressuposto do conhecimento. No direito, efetivamente, é ele – conceito fundamental - que delimita dentro do campo do social, a dignidade da pessoa humana como pressuposto da ciência jurídica. Neste sentido, o conceito fundamental da dignidade da pessoa humana tem a função lógica de um a priori. É, com efeito, um esquema prévio, um princípio fundante, um ponto de vista anterior, munido do qual o pensamento se dirige à realidade jurídica, desprezando seus vários setores, fixando aquele que corresponde às linhas ideais delineadas ainda que inicialmente pelo conceito fundamental. [31]

            Sem conceito fundamental, é de se indagar como a história, a sociologia, a biologia e o direito podem extrair do real os seus objetos específicos? Não poderiam. Ouçamos Vilanova:

            Para se investigar onde se encontra o direito, fato social e o fenômeno biológico ou histórico, é necessária a constituição prévia de um conceito supremo para cada setor. Supremo ou fundamental, porquanto não é obtido, nem se deixa reduzir a outros conceitos. E é anterior à experiência, uma vez que sem a prévia determinação do conceito, não seria possível o conhecimento. O pensamento perder-se-ia na selva extraordinariamente intricada de fatos diversos que compõem o real, sem aptidão para discernir estes fatos em categorias específicas. O conceito fundamental para cada ciência, é, portanto, a condição de experiência. E, na qualidade de condição, tem de ser a priori. A aprioridade do conceito fundamental nada mais representa do que um dos aspectos das condições transcendentais do conhecimento, postas em relevo pela filosofia kantiana. [32] (grifos não constam do original).

            A dignidade da pessoa humana, muito embora positivada no texto constitucional, o que à primeira vista parece contrariar o que acima foi dito, sobretudo no que concerne ao a priori do conceito fundamental, é conceito fundamental que antecede ao próprio texto constitucional, é um a priori lógico que condiciona toda experiência hermenêutica interpretativa do art. 1º, III, da Carta Magna. Lembremos de algumas notas essenciais do pensamento de Locke: o direito surge no espaço aberto pela liberdade, à liberdade se auto-limita em nome da dignidade da pessoa humana. Nasce assim, o Estado. O Estado se fundamenta na defesa deste valor fundamental, e só se legitima se diuturnamente estiver compromissado com este valor supremo: a dignidade da pessoa humana.

            Nesta perspectiva também se direciona o pensamento de Ingo Wolfang Sarlet, ao dizer que,

            Assim, vale lembrar que a dignidade evidentemente não existe apenas onde é reconhecida pelo Direito e na medida que este a reconhece, já que constitui dado prévio, no sentido de preexistente e anterior a toda experiência especulativa. [33] (grifos não constam do original).

            O conceito jurídico dignidade da pessoa humana (que, acima de tudo, é um conceito inaugurador de sentido) é o conceito fundamental da ciência jurídica. Na ordem do conhecimento jurídico é o conceito supremo. Não é possível, logicamente, remontar a um conceito mais alto no domínio do jurídico. Nesse particular domínio, ele é único. Por ser o conceito supremo não está coordenado a outros, nem é derivado de outros. Por seu posto lógico, é o vértice da pirâmide jurídica conceitual. Sua amplitude de validez e legitimidade cobre todo o campo dos objetos jurídicos.

            Para Radbruch [34], citado por Celso Lafer, há princípios fundamentais de Direito que são mais fortes do que todo e qualquer preceito jurídico positivo, de tal modo que toda lei que os contrarie não poderá deixar de ser privada de validade. Eis aí, mais uma vez, o chamamento da dignidade da pessoa humana, como postulado normativo supremo no direito brasileiro.

            Não obstante o direito posto, enquanto objeto da ciência do direito, possa ser dividido didaticamente em ramos, o que fornece unidade e sentido às investigações científicas sobre o direito, é o conceito de dignidade da pessoa humana previsto no art. 1º, III da Constituição Federal. Este conceito fundamental funciona logicamente, como o pressuposto unificador de todos os ramos científicos do direito.

            Ainda, fortes em Lourival Vilanova, podemos afirmar que o direito é, essencialmente, um esforço humano no sentido de realizar o valor justiça. Essa dimensão ideal existe no conceito fundamental da dignidade da pessoa humana – pois este conceito não se reduz a uma mera forma de sugestionar atos, com total indiferença para o valor. [35] Se o conceito dignidade da pessoa humana é dever ser, e o é; é dever ser de algo. Este algo é a busca incessante da proteção jurídica ao ser humano, busca esta que impregna o conceito fundamental dignidade da pessoa humana por corolário todo o ordenamento jurídico.

            O conceito dignidade da pessoa humana há que se realizar no mundo do ser, afinal, salienta Vilanova, as normas jurídicas não constituem "direito" se carecem de toda relação com a realidade social humana. [36]

            Já é hora de acrescentarmos mais uma questão ao debate. Vejamos.

            Qual é a natureza jurídica do conceito fundamental, dignidade da pessoa humana? Trata-se de um princípio jurídico? É uma regra? A distinção entre princípios e regras assumiu importância capital em vários planos do cenário jurídico nacional e internacional.

            A sistematização dada ao tema "princípio jurídico e regras como espécies de normas" tem em Ronald Dworkin seu grande divulgador. Por todos, ouçamos as palavras do Professor Luis Roberto Barroso:

            A distinção qualitativa entre regra e princípio é um dos pilares da moderna dogmática constitucional, indispensável para superação do positivismo legalista, onde as normas se cingiam a regras jurídicas. A Constituição passa a ser encarada como um sistema aberto de princípios e regras, permeável a valores jurídicos suprapositivos, no qual as idéias de justiça e de realização dos direitos fundamentais desempenham um papel fundamental. [37]

            Como bem anotou Ana Paula de Barcellos com sutileza, "Não é preciso descrever aqui todas a discussões teóricas envolvendo a distinção entre regras e princípios e nem seria útil reproduzir os vários critérios que têm sido empregados para extremar as duas espécies normativas" – para quem o quiser, remetemos o leitor ao texto da Professora Barcellos ora citado. [38]

            Enfim, para respondermos à indagação acima posta, qual a natureza do conceito dignidade da pessoa humana, vamos nos valer dos ensinamentos de Humberto Ávila.

            Para este autor, crítico da classificação proposta por Dworkin, pode-se diferençar os princípios das regras baseado em três argumentos: a)- natureza da descrição/comportamento – as regras descrevem comportamentos ou poderes para atingir fins; princípios descrevem fins cuja realização depende de efeitos decorrentes da adoção de comportamentos; b)- natureza da justificação exigida – as regras exigem um exame de correspondência entre o conceito da norma e o conceito de fato, sempre com a verificação da manutenção ou realização das finalidades sub- e sobrejacentes; os princípios exigem uma compatibilidade entre os efeitos da conduta e a realização gradual do fim; c)- natureza da contribuição para decisão – as regras têm pretensão terminativa, e os princípios têm pretensão complementar. [39]

            A sistematização proposta por Humberto Ávila torna-se sobremais importante quando cria uma terceira categoria de normas, que não se confunde nem com os princípios nem com as regras: são os chamados postulados normativos, que se caracterizam por serem normas de segundo grau que estruturam a aplicação de outras normas. O autor cita como exemplo de postulados normativos a proporcionalidade e a razoabilidade, chamados de princípios pela doutrina tradicional.

            Pois bem. Para nós a natureza jurídica do conceito fundamentaldignidade da pessoa humana, insculpida no art. 1º, III, da Constituição Federal – é a de um postulado normativo, muito embora tal conceito esteja inserido no título I, Dos Princípios Fundamentais (atecnias da linguagem objeto, que não interferem na linguagem científica). Insista-se, o postulado normativo da dignidade da pessoa humana se diferencia das regras e princípios quanto ao nível e função. Enquanto os princípios e as regras são os objetos da aplicação, o postulado normativo da dignidade da pessoa humana estabelece os critérios de aplicação dos princípios e das regras. E, enquanto os princípios e as regras servem de comandos para determinar condutas obrigatórias, permitidas e proibidas, ou condutas cuja adoção seja necessária para atingir fins, o postulado normativo da dignidade de pessoa humana serve como parâmetro para a realização de outras normas.

            Por ser um conceito jurídico fundamental, o postulado normativo da dignidade da pessoa humana é uma metanorma, que estrutura a aplicação de outras normas, com elas não se confundindo, por isso concordamos com a oportuna nomenclatura proposta por Humberto Ávila. [40]


4. APONTAMENTOS SOBRE OS MODELOS JURÍDICOS, OCIDENTAL E ISLÂMICO.

            Nos itens anteriores, anotamos, ainda que de passagem, a especificidade da construção de sentido do conceito dignidade da pessoa humana no interior dos direitos ocidentais; agora faremos uma sucinta aproximação ao modelo jurídico islâmico.

            Como bem pontuado por Ana Paula de Barcellos [41], a dignidade da pessoa humana está marcada, no ocidente, por quatro momentos fundamentais, a saber: o Cristianismo, o iluminismo-humanista, a obra de Kant e o refluxo da Segunda Grande Guerra Mundial, nessa ordem.

            Vejamos o modelo islâmico. O Islão é submissão a Deus. É esse o seu significado etimológico e também o seu sentido mais profundo. Se podemos falar de uma civilização, falaremos ainda com mais propriedade de uma comunidade de fiéis. [42]

            O Alcorão é um código. Ainda que nem todas suas disposições possam integrar a categoria de normas jurídicas, porque é essencialmente um livro de princípios religiosos e morais, temos de convir que há no Alcorão matéria jurídica. A relação primordial a ordenar no Alcorão é a que une os homens entre si, mas sobretudo a que une os fiéis a Deus.

            O direito no Islão está marcado por esta submissão a Deus. Diremos, por isso, que a cada identidade civilizatória corresponde uma identidade jurídica. Negar isto é sobremaneira difícil.

            É como adverte Patrícia Jerônimo,

            O Direito não é universal. Universal é a necessidade humanamente sentida de viver de acordo com uma ordem de valores e de normas, não a forma por que essa necessidade ganha concreta realização. Pretender que o Direito pode assumir uma forma única, independente da realidade que intenta ordenar, significa uma inadmissível distorção dos termos da equação que preside às relações entre o jurídico e o humano. Significaria sempre uma pretensão ilegítima – quer porque simplesmente defasada, quer porque as mais das vezes comprometida com projectos de natureza extrajurídica, muito distantes de qualquer ideal de uniformização do justo; dirigidos, acima de tudo, à maximização do domínio. [43] (grifos não constam do original).

            A professora portuguesa se filia àquela corrente para a qual os direitos humanos devem ser vistos no conjunto como um Direito Natural civilizacional relativo, ou seja, um Direito Natural não no sentido de universal que deriva da natureza do homem e das coisas, mas um Direito que, mais modestamente, se contenta com o ser a expressão do "justo" válida para um concreta comunidade humana.

            Se o individualismo é o humanismo possível para os espíritos ocidentais, para os muçulmanos prevalece o coletivo. Os muçulmanos não se concebem isoladamente, mas como parte de uma comunidade religiosa, por isso, tal como o mundo a que se dirige, o Direito muçulmano é um Direito religioso. Logo, esse caráter absoluto lhe permite uma extensão virtualmente ilimitada, muito além das fronteiras que um ocidental fixaria para os domínios do Direito. Por estas e por outras, é que os conceitos de dignidade da pessoa humana e direitos humanos são construções típicas do ocidente.

            Sobre a concepção dos direitos humanos como tema global, debatem duas teorias, os relativistas e os universalistas.

            Para os primeiros (relativistas ou culturalistas), a dignidade da pessoa humana – sendo um valor que pode dizer-se universal – conhece formas muito diversas de expressão, tantas quantas as formas de ser Homem, porque o ser humano é um ser acima de tudo situado (culturalismo). A natureza humana não se realiza numa comunidade abstrata, o homem realiza a sua natureza no seio das culturas. Fora dos domínios ocidentais, a dignidade ínsita na natureza humana ganha formas diferentes, não significa necessariamente o reconhecimento aos indivíduos de direitos oponíveis ao poder e aos outros; passa, muitas vezes, por coisas como a honra, sentimento de pertença à comunidade, devoção religiosa, gestos de generosidade e deveres perante o grupo.

            Em respeito às diferenças civilizatórias, não está - segundo esta corrente - o ocidente autorizado a julgar outras culturas. Noutro dizer, levado as últimas conseqüências, o relativismo há que admitir que tolera a intolerância.

            Já os segundos (universalistas), estão estruturados sobre o conceito de dignidade da pessoa humana. A unidade do gênero humano sobrepõe-se, então, à diversidade das culturas habitadas pelo homem. Existe, contra todas as dúvidas dos culturalistas, uma identidade humana universal. E é por referência a ela – bem como à irredutível dignidade da pessoa humana que ela leva implicada – que se justificam os Direitos do Homem com a sua característica de universalidade. [44]

            Mais difícil do que situar os autores em uma corrente ou outra é fixar para ambas as correntes o significado preciso do que se entende por dignidade da pessoa humana. Vejamos doravante.

            Consoante lições de Ingo Wolfgang Sarlet, os Estados Unidos da América, a maior potência do mundo, membro da ONU (Organização das Nações Unidas), em números expressivos de estados federados admite a execução da pena capital, pena de morte. E a sua Suprema Corte, embora não de forma unânime, entende-a constitucional. Entretanto, a Suprema Corte norte-americana tem decidido que determinadas técnicas de executar a pena capital são cruéis e desumanas, logo devem ser proibidas. É exemplo a morte por enforcamento, que constitui, no entender da Corte, prática atentatória à dignidade da pessoa humana, nomeadamente, por inflingir – ao menos em relação aos outros meios utilizados (injeção letal e eletrocutamento) – sofrimento desnecessário ao sentenciado, já que constatada a possibilidade maior de uma postergação do estado de inconsciência e morte, com risco de asfixia lenta e até mesmo de decapitação parcial ou total, verificada em diversos casos. [45]

            Veja, caro leitor, os EUA entendem que a pena de morte não é ofensiva à dignidade da pessoa humana, apenas o modo de executá-la, que pode vir a ser ofensivo à dignidade da pessoa humana.

            No Islão, a Constituição Iraniana de 1980, em seu artigo 22, dispõe que, "a dignidade dos indivíduos é inviolável. .. salvo nos casos autorizados por lei". Vejam o quão frágil também o é a proteção da dignidade da pessoa humana neste país, onde ainda se verificam práticas de tortura, mutilações genitais, discriminação religiosa e sexual. [46]

            Como membro da delegação brasileira junto à CDH (Comissão de Direitos Humanos) da ONU, J.A. Lindgren Alves [47] destaca a preocupação da CDH com a situação dos direitos humanos no Sudão. Em situação avaliada pela CDH nos anos de 1991 a 1994, apurou-se que o sistema penal sudanês contém dois componentes principais, que são radicalmente contrários às provisões das convenções internacionais de que o Sudão é parte, quais sejam, crimes absolutos e a instituição de retribuição.

            Explicando. Os crimes absolutos são imperdoáveis e passíveis de punição corporal ou pena de morte, não contemplando atenuações de responsabilidade baseadas em gênero ou idade – inclusive, a partir da puberdade, havendo completado quinze anos, e até os 70, todos os ofensores são punidos, podendo as crianças entre sete anos e a puberdade ter a sentença transformada pelas Cortes em açoitamento que não excederá vinte chibatadas. [48]

            São espécies de crimes absolutos: o assalto à mão armada (punível com morte, ou crucificação e morte, ou amputação da mão direita e do pé esquerdo); roubo capital (punido pela amputação da mão direita); adultério feminino (punido com morte por apedrejamento se a ré for casada, ou 100 chibatadas, se solteira); adultério masculino (punição com açoitamento, e, adicionalmente, com expatriação por um ano). [49]

            A retribuição múltipla, segundo componente do sistema penal questionado pela CDH, também está prevista no Código Penal e consiste na possibilidade de um indivíduo ser executado em lugar de um grupo e um grupo no lugar de um indivíduo. [50]

            Em respostas aos questionamentos da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da ONU, o governo sudanês alegou que algumas dessas práticas do direito islâmico estão enraizadas nas tradições do país. Todavia, ainda que isto seja realmente a realidade do direito sudanês, a verdade é que o Sudão ratificou o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção sobre os Direitos da Criança. [51]

            Para finalizar, oportunas são as palavras do embaixador brasileiro, J.A. Lindgren Alves, quando em seu livro aborda o tema da Universalidade dos Direitos Humanos, e não deixa de ponderar:

            Do ponto de vista da diplomacia e do direito, o avanço é extraordinário. Apesar disso, porém, não se pode afirmar que, no campo operativo, o universalismo tenha realmente suplantado o relativismo. [52]


5. POR QUE A PESSOA HUMANA POSSUI DIGNIDADE?

            Dentre tantas, podemos pelo menos detectar duas questões centrais que envolvem a indagação supra: o ser humano e sua dignidade.

            O objetivo principal da filosofia ao longo dos séculos sempre foi praticamente um, qual seja, conhecer o homem. São de Kant [53] as famosas indagações:

            O campo da filosofia pode ser delimitado nas seguintes questões: 1ª) O que eu posso saber? 2ª) O que eu devo fazer? 3ª) O que eu posso esperar? 4ª) O que é o homem?

            A primeira pergunta diz respeito à metafísica, a segunda à moral, a terceira à religião. A bem da verdade, as três primeiras podem ser resumidas na última, a quarta, pois tudo se fundamenta no homem.

            O que se entende por dignidade enquanto atributo do homem? Segundo o Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano [54], por princípio da dignidade da pessoa humana, entende-se a exigência enunciada por Kant consoante a fórmula do imperativo categórico: "Age de tal forma que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre também como um fim e nunca unicamente como um meio". Isto significa que, para Kant, as coisas têm preço, são substituíveis, relativas; o homem tem dignidade, por isso não tem preço, é um valor absoluto e insubstituível.

            Etimologicamente, dignidade vem do latim digna, merecedora de alguma coisa digna, significando também cargo, honra ou honraria. É adjetivo derivado da forma verbal decet, de decere, convir. Daí emanam também os significados para decente, de que é sinônimo. [55]

            Lança luzes sobre a idéia da dignidade da pessoa humana a Ministra do Supremo Tribunal Federal, Drª Carmem Lúcia Antunes Rocha, quando pontifica que

            Dignidade é o pressuposto da idéia de justiça humana, porque ela é que dita a condição superior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana independe de merecimento pessoal ou social. Não se há de ser mister ter de fazer por merecê-la, pois ela é inerente à vida e, nessa contingência, é um direito pré-estatal.

            O sistema normativo de direito não constitui, pois, por óbvio, a dignidade da pessoa humana. O que ele pode é tão-somente reconhecê-la como dado essencial da construção jurídico-normativa, princípio do ordenamento e matriz de toda organização social, protegendo o homem e criando garantias institucionais postas à disposição das pessoas a fim de que elas possam garantir a sua eficácia e o respeito à sua estatuição. A dignidade é mais um dado jurídico que uma construção acabada no direito, porque firma e se afirma no sentimento de justiça que domina o pensamento e a busca de cada povo em sua busca de realizar as suas vocações e necessidades. [56] (grifos não constam do original)

            Ingo Wolfgang Sarlet conceitua a dignidade da pessoa humana como "a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos". [57]

            Diante do que já vimos, impera afirmar que o homem é um ser de valor absoluto, por isto um ser dotado de uma dignidade que lhe é imanente, e sem a qual o sentido de justiça humana se esvai.

            Assim sendo, já podemos tentar responder à questão que abre este tópico: por que o ser humano possui dignidade? Sigamos. É preciso ir à fonte, que é o próprio homem, porquanto a dignidade é atributo seu. Lado outro, poderíamos analisar o homem sob vários pontos de vista, do ponto de vista da natureza, do ponto de vista religioso, do ponto de vista psicológico, do ponto de vista filosófico, enfim, de várias maneiras.

            Numa tomada de posição, vamos tentar responder à provocação que inaugura este tópico, olhando a pessoa humana sob algumas perspectivas jurídico-filosóficas, porquanto toda idéia será reconduzida à base empírica do Texto Constitucional. Primeira resposta: a pessoa humana possui dignidade porque ela é espírito. Segunda resposta: porque o ser humano é pessoa. Vejamos as duas.

            5.1. PORQUE A PESSOA HUMANA É ESPÍRITO.

            Que o homem seja espírito não é coisa óbvia. O que é óbvio é exatamente o contrário: que o homem é matéria, corpo. Esta é a advertência sábia de Battista Mondin. [58]

            O homem em sua espiritualidade é um ser livre, sobreleva-se além dos limites de espaço e de tempo que o circundam. Avalia e julga o mundo todo da experiência, tanto o passado quanto o presente, podendo ainda prefigurar o seu futuro. O homem em sua condição espiritual é chamado a voltar-se sempre para uma realidade que o transcende. Fruto desta transcendência é a sua dignidade e superioridade diante do resto da criação [59]. O homem possui uma razão que o permite sentir que a sua condição de matéria não é a sua essência mais íntima: que existe nele um ser mais profundo, que se chama, sopro vital, espírito, alma ou mente.

            O exemplar melhor acabado da espiritualidade do homem é a sua liberdade. Liberdade é condição própria do espírito. Mesmo preso em uma penitenciária, espiritualmente o homem continua livre. O espírito, e somente o espírito, é essencialmente livre. O espírito sopra onde quer. Lembremos do filme ganhador do Oscar "A Vida é Bela", onde mesmo estando ambos em um campo de concentração no período nazista, o pai pintava para o filho as cores da espiritualidade humana.

            Em razão desta espiritualidade humana, sábias foram as palavras dos representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte, quando positivaram no preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil,

            ...promulgamos, sob a proteção de DEUS, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. (grifos não constam do original)

            É sabido que o preâmbulo contém uma proclamação de princípios para o ordenamento que acaba de se implantar. O preâmbulo é sim um decisivo elemento de interpretação e integração dos diversos artigos que lhe seguem. É o que nos ensina Alexandre de Moraes [60],

            Apesar de não fazer parte do texto constitucional propriamente dito e, conseqüentemente não conter normas constitucionais de valor jurídico autônomo, o preâmbulo não é juridicamente irrelevante, uma vez que deve ser observado como elemento de interpretação e integração dos diversos artigos que lhe seguem. (o negrito não consta do original)

            Veja, caro leitor, o preâmbulo não é despiciendo para o operador do direito, porquanto o seu valor de elemento de interpretação e integração adere a outros artigos e enunciados da Constituição para que assim sejam aplicados fielmente os valores protegidos pelo povo brasileiro.

            Portanto, enquanto elemento de integração e interpretação não autônomo, na dicção acertada de Alexandre Moraes, o preâmbulo é instrumento decisivo para o alcance do significado da dignidade da pessoa humana, positivado no art. 1º, III, da Carta Magna. Ou, no dizer de Juan Bautista Alberdi, o preâmbulo serve de fonte interpretativa para dissipar as obscuridades das questões práticas e de rumo para atividade política do governo. [61]

            Entendido o preâmbulo como fonte interpretativa das normas constitucionais, já podemos afirmar, sem qualquer receio de erro, que a Constituição Federal reconhece que a dignidade da pessoa humana está fundada na existência de DEUS. É um nítido reconhecimento constitucional da natureza espiritual do homem.

            Atenção, caro e dileto leitor. Não está aqui afirmação de que o Estado brasileiro adota esta ou aquela religião, não seríamos ingênuos a tanto. O que se está a dizer, porque juridicamente possível, é que, para nossa Constituição, o homem possui dignidade como pessoa humana, porque fundado em DEUS. É a leitura que se deve fazer do preâmbulo em conexão com o art. 1º, III, da Carta Maior.

            No Brasil, existe a separação entre o Estado e a Igreja, sendo assim o Brasil é um país leigo, laico ou não-confessional, como bem anota Pedro Lenza. [62]

            Aliás, consoante art. 5º, VI, "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias".

            Agora, vamos aos esclarecimentos. O Estado é laico, não tem religião, porém, o cidadão e seus direitos estão sob a proteção de DEUS, por força da norma interpretativa oriunda do preâmbulo, o que implica a dizer que a Constituição brasileira delineia, de forma límpida, a distinção entre espiritualidade e religião.

            A Constituição reconhece a espiritualidade do homem, porque invoca a proteção de DEUS no preâmbulo. De qual DEUS? Claro fica que é o DEUS da espiritualidade, o DEUS que transcende e agasalha todas as pessoas humanas independentemente do seu credo religioso. O DEUS da Constituição da República Federativa do Brasil é o DEUS até mesmo do ateu, do agnóstico, porque é um DEUS de pura espiritualidade, fruto da transcendência humana, que ultrapassa os limites estreitos seja do catolicismo, do islamismo, do budismo, do judaísmo, do hinduísmo, ou de qualquer outra religião.

            Vejamos agora a distinção entre religião - que é vedado ao Estado brasileiro aderir a uma - e espiritualidade, conceito agasalhado pela Constituição Federal.

            A religião objetiva estabelecer princípios éticos e morais básicos, porém, pode-se falar de ética e moralidade sem ter de se recorrer à religião, valendo-se assim do conceito de espiritualidade. Quem nos vai esclarecer a diferença entre a religião e a espiritualidade (conceito constitucionalmente protegido), é o Dalai Lama [63], ouçam.

            Na realidade, creio que há uma importante distinção a ser feita entre religião e espiritualidade. Julgo que a religião esteja relacionada com a crença no direito à salvação pregada por qualquer tradição de fé, crença esta que tem como um de seus principais aspectos a aceitação de alguma forma de realidade metafísica ou sobrenatural, incluindo possivelmente uma idéia de paraíso ou nirvana. Associados a isso estão os ensinamentos ou dogmas religiosos, rituais, orações, e assim por diante. Considero que a espiritualidade esteja relacionada com aquelas qualidades do espírito humano – tais como amor e compaixão, paciência, tolerância, capacidade de perdoar, contentamento, noção de responsabilidade, noção de harmonia – que trazem felicidade tanto para a própria pessoa quanto para os outros. Ritual e oração, junto com as questões de nirvana e salvação, estão diretamente ligados à fé religiosa, mas essas qualidades interiores não precisam estar. Não existe portanto nenhuma razão pela qual um indivíduo não possa desenvolvê-las, até mesmo em alto grau, sem recorrer a qualquer sistema religioso ou metafísico. É por isso que às vezes digo que talvez se possa dispensar a religião. O que não se pode dispensar são essas qualidades espirituais básicas.

            Insistamos, neste particular, que o postulado normativo da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal, deve ser interpretado e conhecido e justificado à luz da experiência espiritual de DEUS, contemplada no preâmbulo da Carta Magna, e fonte interpretativa do direito constitucional, conforme já vimos de ver.

            É importante esta distinção entre espiritualidade e religião; não se trata de uma separação entre uma e outra, tão-somente uma distinção. Uma vez distintas, podem relacionar e conviver, mas sem que uma dependa necessariamente da outra. É pensando assim que podemos conceituar juridicamente a idéia de espiritualidade (preâmbulo da Constituição) como idéia fundante do conceito de dignidade da pessoa humana.

            Sem o sentido de espiritualidade presente em nós, não podemos sacar do Texto Constitucional o exato sentido da dignidade da pessoa humana. Espiritualidade tem a ver com experiência, não com doutrina, não com dogmas, não com ritos, não com celebrações, que são caminhos institucionais capazes de nos ajudar na espiritualidade, mas que são posteriores a espiritualidade.

            É como ensina Leonardo Boff [64], ouçam:

            Nasceram da espiritualidade, podem conter espiritualidade, mas não são a espiritualidade. São água canalizada, não a fonte da água cristalina. (grifos não constam do original).

            A experiência de DEUS, que quer iluminar a o sentido da dignidade da pessoa humana no Texto Constitucional, é um encontro que de se dá a partir de DEUS. As religiões falam sobre DEUS, a espiritualidade é uma experiência a partir de DEUS. É uma abertura, uma transcendência, é um abrir e jamais um fechar, daí porque a espiritualidade do sentido da pessoa humana, contido no postulado jurídico da dignidade da pessoa humana, engloba todos os homens, inclusive os não religiosos, os religiosos, os agnósticos etc., porque é conceito jurídico fundamental que transcende as religiões.

            Só imbuídos de espiritualidade poderemos compreender o verdadeiro significado da dignidade da pessoa humana em nosso ordenamento jurídico. Só assim poderemos ver no homem um fim em si mesmo, independente de suas riquezas, de seus credos, de sua classe social, de estar empregado ou não empregado etc.

            Desenvolver esta espiritualidade em nós é aperfeiçoar nossa capacidade de interpretar o direito a partir de uma visão profundamente humana, só assim o direito fará sentido em nossas vidas. Se somos espiritualizados, somos mais contemplativos, somos capazes de escutar as mensagens e os valores que impregnam o mundo a nossa volta, sobretudo dos excluídos, somos capazes de nos indagar: qual o significado disso tudo para mim?

            Tornamo-nos mais sensíveis, e por isso evoluímos juridicamente, porque passamos a ver a temporalidade das coisas, a usura do tempo, e saber que não estamos vivos apenas porque ainda não morremos, mas porque a vida, conforme bem lembra Leonardo Boff, é uma oportunidade para crescer, para aceitar nossos defeitos, nossos limites, nosso envelhecimento e nossa mortalidade. [65]

            Mais espiritualizados, mais humanos. O Estado brasileiro é laico, quer dizer, não possui religião oficial, porém, como é fundado sob a proteção de DEUS, reconhece juridicamente a espiritualidade da pessoa humana, e por conseguinte, a dignidade da pessoa humana, dignidade esta que se estrutura partir da experiência humana de DEUS, enquanto espiritualidade.

            Nos escritórios, nos gabinetes, onde se desenvolve o direito enquanto jogo de puro poder econômico, pode até triunfar o cinismo, o descrédito em tudo e em todos. Porém, não podemos desprezar a aurora que vem, não podemos desfazer o olhar inocente da uma criança, não podemos contemplar com indiferença a profundidade do céu estrelado sem cair no silêncio e na profunda reverência, nos perguntando o que se esconde atrás das estrelas, qual é o caminho da minha vida, o que posso esperar dela? O que é o ser humano que sou e os que me rodeiam? Para que serve o meu trabalho? Qual o sentido do meu trabalhar?. São perguntas que o ser humano sempre se coloca, e, ao colocá-las, revela-se como ser espiritual, e sobretudo com dignidade, uma vez que a dignidade da pessoa humana é valor imanente a todo e qualquer homem. [66]

            O conceito de espiritualidade humana, trabalhado neste tópico sob a ótica do Texto Constitucional e do postulado normativo da dignidade da pessoa humana – art. 1º, III da Constituição Federal, deve ser aplicado à luz da efetividade e concretização (princípio dá máxima efetivação) das normas constitucionais. Aliás, é o alerta que nos faz Cleber Francisco Alves [67] quando sustenta com saber,

            Vale enfatizar que essa noção de dignidade da pessoa humana – ao ingressar no mundo jurídico – não deve ser tomada num sentido meramente teórico ou abstrato, pois tal enfoque não é compatível com o tratamento mais contemporâneo que a principiologia constitucional vem merecendo, como visto anteriormente. Esse princípio, ainda que seja de pouca densidade normativa, deve ter um proeminência absoluta, presidindo todo o trabalho de interpretação e implementação efetiva das demais normas constitucionais e infraconstitucionais, podendo servir de fundamento autônomo e bastante por si só, para embasar decisões que reconhecem a inconstitucionalidade de preceitos que venham a afrontá-lo. (grifos não constam do original).

            Para finalizar este tópico, querido leitor, trazemos à colação as palavras sempre sensíveis e iluminadas do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto [68], que bem se amoldam a tudo que trabalhamos neste item. Ouçamos o Ministro,

            Terminemos este segmento reflexivo com a ponderação de que não desconhecemos o grande risco intelectual de quem se dispõe a falar sobre Deus, sabido e ressabido que a existência mesma de Deus nem pode ser rigorosamente confirmada nem rigorosamente desconfirmada pela Ciência. Deus, então, para os intelectuais que O admitem é sempre uma hipótese de trabalho. Um postulado. um conceito que se intui a priori, como é próprio de todo postulado. Logo, falar sobre Ele não é formular proposições deduzidas da análise de elementos objetivos que se conectam para formar um todo unitário, mas saltar imediatamente para uma conclusão. Todavia, não foi a partir da intuição da existência de uma norma fundamental simplesmente pensada, uma norma fundamental hipotética, e, portanto, pressuposta (não efetivamente posta por nenhum órgão jurídico, nenhum costume, nenhum instância volitiva imanente, enfim), que HANS KELSEN pôde falar de uma Ciência do Direito? Uma ordem sistemática de conhecimentos que tem naquela hipotetização normativo-fundamental a sua própria condição inicial de possibilidade como esfera autônoma e científica do saber? (nem todos os grifos constam do original).

            5.2. PORQUE O SER HUMANO É PESSOA.

            Continuemos a responder àquela indagação primeva, por que o ser humano possui dignidade?

            Porque ele é pessoa. Só do homem dizemos que é pessoa, não dizemos do cão, do cavalo, do gato, nem mesmo das plantas e das pedras. O conceito do homem enquanto pessoa se afirma no ocidente a partir do "humanismo", entendido aqui como aquele amplo movimento espiritual que, no século XV, começou na Itália com alguns pensadores como Ficino, Pico della Mirandola, Valla, Maquiavel etc., que no século seguinte se expandiu por todo continente europeu.

            São Tomás de Aquino é chamado de o precursor dos humanistas. O humanismo tem com suas características principais: uma concepção altamente positiva do homem e a volta à era clássica greco-romana tomada com modelo de uma cultura que teve esse alto conceito do homem. [69]

            Por ser pessoa, o homem possui dignidade. Lembremos de Kant. As coisas têm preço, possuem valor exterior (de mercado) e manifestam interesses particulares. A dignidade representa um valor interior (moral) e é de interesse geral. A dignidade enquanto valor moral é incomensurável, por não ser mercadoria não pode ser substituído por outro, como sói acontecer no caso das coisas.

            Ademais, o homem como valor absoluto dotado de dignidade não pode dispor de si mesmo, pelo mesmo raciocínio anterior, ou seja, por não ser coisa. O homem não é "propriedade" de si mesmo. Na medida em que ele é pessoa, ele é o sujeito ao qual pode caber a propriedade de coisas. Ora, se ele fosse propriedade de si mesmo, seria ele uma coisa, cuja posse poderia reivindicar, pura aporia.

            Ele é, insista-se, pessoa, o que é diferente de propriedade e, portanto, não é uma coisa, pois é impossível ser, ao mesmo tempo, coisa e pessoa, daí porque o homem não pode dispor de si mesmo, não pode instrumentalizar-se. [70]

            Segundo Battista Mondin, o homem é um ser cultural, espiritual e livre, mas é sobretudo pessoa e um valor absoluto.

            É cultural, na medida em que não é como as plantas e os animais, puro produto da natureza; mas o é fruto de uma sapiente colaboração entre natureza e cultura. A cultura não é uma roupa que se vista ou se dispa ao próprio prazer, não é qualquer coisa acidental ou secundária, mas é um elemento constitutivo da essência do homem, ela faz parte da natureza humana. Sem a cultura não é possível existir nem a pessoa individualmente, nem o grupo social. [71]

            É espiritual na medida em que possui a capacidade de transcender a si próprio, somente o espírito é livre, porque sopra onde quer. É livre porque dotado de autonomia e vontade iluminadas pela razão, não está subordinado aos instintos como estão os animais. É pessoa e valor absoluto porque não é um valor instrumental, ele pertence à ordem dos fins, e não à dos meios.

            Agora, o valor absoluto do homem está no espírito. Se não se situa (o valor) no espírito é, totalmente gratuito e arbitrário considerar o homem um valor absoluto. Se o homem é só corpo, só matéria, ele se torna necessariamente uma realidade manipulada, instrumentalizada e, portanto, não pode ter um valor absoluto. O homem é absoluto e infinito enquanto valor, ainda que finito como ser. [72]

            Ninguém melhor do que Miguel Reale estudou a fundo as questões filosóficas que envolvem o homem, articulado com o mundo jurídico. São dele as palavras que seguem:

            O homem, considerado na sua objetividade espiritual, enquanto ser que só se realiza no sentido de seu dever ser, é o que chamamos de pessoa. Só o homem possui a dignidade originária de ser enquanto deve ser, pondo-se essencialmente como razão determinante do processo histórico. (itálico constante do original). [73]

            Malgrado o valor absoluto de todo ser humano, infelizmente, como pontua a Ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia Antunes Rocha [74], ainda convivemos com subomens empilhados sob viadutos, crianças feito pardais de praça, sem pouso nem ninho certos, velhos purgados da convivência das famílias, desempregados amargurados pelo seu desperdício humano, deficientes atropelados em seu olhar sob as calçadas, presos animalados em gaiolas sem porta, enfim, exclusões sociais de todos os tipos e espécies que ferem mortalmente o princípio da dignidade da pessoa humana.

            Ainda fortes no pensamento da Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha [75], podemos afirmar que:

            Toda pessoa humana é digna. Essa singularidade fundamental e insubstituível é ínsita à condição humana, qualifica-o nessa categoria e o põe acima de qualquer indagação. Quando se questiona, nestes chamados tempos modernos, se há de permitir, ou não o nascimento de um feto no qual se detecte a existência de anomalia a impossibilitá-lo para uma vida autônoma, está-se a infirmar aquela assertiva e a tornar a humanidade um meio para a produção de resultados e a desconhecer ou desprezar a condição do homem de ser que é fim em si mesmo e digno pela própria natureza. Aquilo traduz-se, pois, como injustiça contra os que não se apresentam em iguais condições psicofisiológicas, intelectuais etc. É a injustiça havida na indignidade revelada na desumanidade do tratamento dedicado ao outro. É a injustiça do utilitarismo que se serve do homem e o dota de preço segundo a sua condição peculiar, que se expressa numa forma em vez de se valer pela essência humana de que se dota. (grifos não constam do original).

            Ser pessoa é uma realização em direção ao outro. A realização de nós mesmos passa necessariamente pelo próximo. Por este motivo, para definir adequadamente a pessoa, não basta a subsistência e nem a coexistência com os outros, é necessária também a proexistência, que é o preocupar-se ativamente com o destino do outro. A proexistência que ajuda a realização dos outros (do próximo) repercute positivamente na pessoa do próprio proexistente, é como que se antecipasse uma via para a realização de sua pessoa: consolida-a, enriquece-a, torna-a maior, mais nobre, mais feliz. [76]

            Por fim, fechamos este item com as palavras insuperáveis da Ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia Antunes Rocha, que, com fina sensibilidade verberou:

            A dignidade da pessoa humana é a prova de que o homem é um ser de razão compelido ao outro pelo sentimento, o de fraternidade, o qual, se às vezes se ensaia solapar pelo interesse de um ou outro ganho, nem por isso destrói a certeza de que o centro de tudo ainda é a esperança de que a transcendência do homem faz-se no coração de outro, e nunca na inteligência aprisionada no vislumbre do próprio espelho. Afinal, mesmo de ouro que seja o espelho, só cabe a imagem isolada. Já no coração, ah! coração, cabe tudo. (grifos não constam do original).


Notas

            01 Um Discurso sobre as Ciências na transição para uma ciência pós-moderna. Revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo - USP. São Paulo. V. 3. p. 71.

            02 A Reconstrução dos Direitos Humanos. Um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt.. 6ª reimpressão. 1988. p. 49.

            03 Cf. por todos, Marco Aurélio Greco, "Contribuições (uma figura ´´sui generis´´)" São Paulo. Dialética. 2000.

            04 Cf. Roberto Wagner Lima Nogueira, Direito Financeiro e Justiça Tributária. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 111/136.

            05 Cf. Teoria de la Acción Comunicativa:Complementos y Estudos Previos. Madrid. Cátedra. 2001.

            06 Cf. Teoria da incidência da norma jurídica. Crítica ao realismo língüistico de Paulo de Barros Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey. 2003. passim.

            07 Cf. Direito Tributário - Fundamentos Jurídico da Incidência. São Paulo. Saraiva. 1998.

            08 Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. 4 ed. Cortez. São Paulo. 2001. p. 38.

            09 Sobre o conceito do direito. Recife. 1947. p. 88.

            10 Nova fase do Direito Moderno. 2ª ed. rev. São Paulo. Saraiva. 1998. p. 144.

            11 In prefácio de Margarida Maria Lacombe Camargo, Hermenêutica e Argumentação - Uma contribuição ao Estudo do Direito. 2ª ed. amp. Rio de Janeiro.Renovar. 2001.

            12 Luís Roberto Barroso, Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 303-343.

            13 Diálogos entre razão e fé. São Paulo: Paulinas, 2000, p.24. Grifos apostos.

            14 Luiz Moreira. Fundamentação do Direito em Habermas. 2ª ed. Belo Horizonte: Mandamentos. 2002. p. 100-102.

            15 Marina Velasco. Ética do Discurso. Apel ou Habermas? Rio de Janeiro: FAPERJ: Mauad. 2001. P. 11.

            16 Luiz Moreira. op. cit. p. 107.

            17 Adriano Soares da Costa. Teoria da incidência da norma jurídica. Crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey. 2003. op. cit. p. 23.

            18 Cf. por todos, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário. 14ª ed. São Paulo: Saraiva. 2002.op. cit. p. 3-4.

            19 Eros Roberto Grau, Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2ª ed. São Paulo. Malheiros. 2003. p. 35.

            20 "Não se tome, no entanto, a afirmação de que a interpretação do direito não é ciência, mas prudência, como assertiva de que as decisões jurídicas são imprevisíveis. Isso não é exato. Sendo inúmeros os sentidos do uso do vocábulo "ciência", nada nos impede de sustentar que a decisão jurídica, porque há de ser previsível estrutura-se cientificamente {Menezes Cordeiro 1989: LXII]. Mas "cientificamente", aqui, significa exclusivamente decisão consumada segundo determinadas regras. Como a prudência é sempre implementada segundo certas regras, que asseguram um mínimo de previsibilidade à decisão nela fundada, poderia se referida como cientificamente estruturada". Eros Roberto Grau, Ensaio discurso sobre...op. cit. p. 96.

            21 Eros Roberto Grau, Ensaio e discurso sobre...op. cit. p. 93-98.

            22 "A interpretação, diversamente e consoante pensamos, é processo de revelação do conteúdo do texto positivado, vale dizer, é processo de construção da significação expressa no suporte físico que é o grafema adscrito em uma folha de papel. Mas esses signos são dados, no sentido de que estão ali para expressar algo, por intermédio de um código convencionado pela comunidade do discurso. Não fosse assim, os signos nada significariam, sendo a significação algo exterior a eles, atribuída pelo intérprete de forma arbitrária. A comunicação desse modo, seria de impossível realização, uma vez que não haveria critérios objetivos e convencionados para a emissão da mensagem e para o seu recebimento. Se cada receptor recebesse uma mensagem de modo diverso, sem meios de controle do seu sentido, seria a comunicação uma impossibilidade lógica". Adriano Soares da Costa. Teoria da incidência da norma jurídica. Crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey. 2003. p. 9-10. (grifos não constam do original).

            23 Cf. Adriano Soares Costa, Incidência e aplicação da norma jurídica tributária: uma crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho. São Paulo. Revista Tributária e de Finanças Públicas. RT. n. 38. maio-junho de 2001. p. 23.

            24 Stephen Ullmann, em seu clássico Semântica, Fundação Calouste Gulbenkian, 5a ed. Lisboa, 1987, p. 104, 108/109, nos alerta para o fato de que: "os lingüistas modernos, contudo, não só deram maior importância ao contexto, como também alargaram consideravelmente o seu raio de acção e investigaram mais profundamente a sua influência no significado das palavras. (...) "Essa ampliação dos contextos, lingüísticos e não-lingüísticos, abriu novos horizontes ao estudo do significado. Ao que agora temos de aspirar é a uma

            25 Teoria da incidência da norma jurídica. op. cit. p. 7.

            26 Cf. Goffredo Telles Júnior. O direito quântico. 6ª ed. São Paulo: Max Limonad. 1985, p. 284/285. Cf. também, Roberto Wagner Lima Nogueira, Fundamentos do Dever Tributário. Belo Horizonte: Del Rey. 2003. p. 8/11.

            27 Cf. Goffredo Telles Júnior, op. cit. p. 282/290.

            28 Cf. Patrícia Jerônimo. Os Direitos do Homem à escala das civilizações – Proposta de análise a partir do confronto dos modelos ocidental e islâmico. Coimbra: Almedina. 2001. p. 187.

            29 Cf. Águia e a galinha: uma metáfora da condição humana. 24ª ed. Petrópolis: Vozes. 1998, p. 9.

            30 Sobre o Conceito de Direito. Escritos Jurídicos e Filosóficos. V. 1. São Paulo: AXIS MVNDI-IBET. 2003, p. 14.

            31 Cf. noutro contexto, Lourival Vilanova, op. cit. 17.

            32 Cf. Lourival Vilanova, op. cit. p. 17.

            33 Dignidade da Pessoa Humana e Direito Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4ª ed. rev. e atualizada. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2006, p. 42.

            34 Apud. Celso Lafer. A Reconstrução dos Direitos Humanos... op. cit. p. 78.

            35 Cf. Lourival Vilanova, op. cit. p. 50

            36 Cf. Lourival Vilanova, op. cit. p. 60.

            37 Fundamentos Teóricos e Filosóficos do Novo Direito Constitucional Brasileiro. (Pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). In "A Nova interpretação Constitucional. Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações Privadas". Luís Roberto Barroso (organizador). 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2006, p. 30.

            38 Alguns parâmetros normativos para a ponderação constitucional. In "A Nova interpretação Constitucional. Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações Privadas". Luís Roberto Barroso (organizador). 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2006. p. 70/71.

            39 Princípios e Regras e a Segurança Jurídica. Revista de Direito do Estado – RDE. Rio de Janeiro: Renovar. nº 1, janeiro/março de 2006. p. 194/915.

            40 Cf. Humberto Ávila. Teoria dos Princípios. da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2ª ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 79/116.

            41 A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar. 2002. 103/104.

            42 Cf. Patrícia Jerônimo. Os Direitos do Homem à escala das Civilizações. Proposta de análise do confronto dos Modelos Ocidental e Islâmico. op. cit. p. 107108.

            43 Cf. Os Direitos do Homem... op. cit. p. 183.

            44 Cf. Patrícia Jerônimo, op. cit. p. 246/256.

            45 Cf. Ingo Wolfgang Sarlet, op.cit. p. 56.

            46 Cf. Ingo Wolfgang Sarlet. op. cit. p. 56, nota de rodapé nº 110.

            47 Os Direitos Humanos como tema global. São Paulo: Perspectiva. 1994, p. 142/143

            48 Cf. J. A. Lindgren Alves, op. cit. p. 142

            49 Cf. J. A. Lindgren Alves, op. cit. p. 143.

            50 Cf. J. A. Lindgren Alves, op. cit. p. 143

            51 Cf. J. A. Lindgren Alves, op. cit. p. 143.

            52 Cf. J. A. Lindgren Alves, op. cit. p. 139/140.

            53 Apud. Battista Mondin. Definição Filosófica da Pessoa Humana. Bauru: EDUSC. 1998. p. 7.

            54 Dicionário de Filosofia Nicola Abbagnano. São Paulo: Martins Fontes. 1998. p. 276.

            55 Deonísio da Silva. De onde vêm as palavras – origens e curiosidades da língua portuguesa. 14ª ed. São Paulo: A Girafa. 2004. p. 264.

            56 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e a Exclusão Social. Revista Interesse Público. Ano 1. nº 4, outubro/dezembro de 1999. São Paulo: Notadez. p. 26.

            57 Dignidade da Pessoa Humana... op. cit. p. 60.

            58 Cf. Definição Filosófica da Pessoa Humana. op. cit. p. 21.

            59 João Paulo II. Carta Encíclica Fides et Ratio. Aos Bispos da Igreja Católica sobre as relações entre a Fé e a Razão. 7ª ed. São Paulo: Paulinas. 2004, p. 82

            60 Direito Constitucional. 19ª ed. São Paulo: Atlas. 2006. p. 15.

            61 Apud. Alexandre de Moraes. op. cit. p. 15.

            62 Direito Constitucional Esquematizado. 10ª ed. São Paulo: Método. 2006. p. 62.

            63 Dalai Lama. Sua Santidade o Dalai Lama. Um Ética para o Novo Milênio. 7ª ed. Rio de Janeiro: Sextante. 1999. p. 32/33.

            64 Leonardo Boff. Espiritualidade – Um caminho de transformação. 2ª ed. Rio de Janeiro: Sextante. 2001. p. 66.

            65 Espiritualidade. Um caminho de transformação. op. cit. p. 73.

            66 Cf. Leonardo Boff. Espiritualidade... op. cit. p. 80/81.

            67 Cleber Francisco Alves. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: o enfoque da Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar. 2001. p. 176/177.

            68 Teoria da Constituição. Rio de Janeiro: Forense. 2003, p. 15.

            69 Battista Mondin. O Humanismo Filosófico de Tomás de Aquino. Bauru: EDUSC. 1998. p. 7

            70 Maria Celina Bodin de Moraes. O Conceito de Dignidade Humana: substrato axiológico e conteúdo normativo. In Constituição, Direitos Fundamentais e Direito Privado. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2006. p. 115, e p. 135, nota de rodapé nº 96.

            71 Cf. Battista Mondin. Definição Filosófica da Pessoa Humana. op. cit. 15.

            72 Cf. Battista Mondin. Definição Filosófica da Pessoa Humana. op. cit. p. 44.

            73 Miguel Reale. Filosofia do Direito. 17ª ed. São Paulo: Saraiva. 1996, p. 220.

            74 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e a Exclusão Social. op. cit. p. 25.

            75 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana... op. cit. p. 28.

            76 Battista Mondin. Definição Filosófica da Pessoa Humana.. .. op. cit. p. 30/31.


Autor

  • Roberto Wagner Lima Nogueira

    mestre em Direito Tributário, professor do Departamento de Direito Público das Universidades Católica de Petrópolis (UCP) , procurador do Município de Areal (RJ), membro do Conselho Científico da Associação Paulista de Direito Tributário (APET) é autor dos livros "Fundamentos do Dever Tributário", Belo Horizonte, Del Rey, 2003, e "Direito Financeiro e Justiça Tributária", Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2004; co-autor dos livros "ISS - LC 116/2003" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Ives Gandra da Silva Martins), Curitiba, Juruá, 2004; e "Planejamento Tributário" (coord. Marcelo Magalhães Peixoto), São Paulo, Quartier Latim, 2004.

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NOGUEIRA, Roberto Wagner Lima. Notas para um ensaio sobre a dignidade da pessoa humana. Conceito fundamental da Ciência Jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1116, 22 jul. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8668. Acesso em: 28 mar. 2024.