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A rejeição dos embargos declaratórios com efeitos infringentes não dá margem à alegação de ofensa ao art. 535 do CPC em sede de recurso especial

A rejeição dos embargos declaratórios com efeitos infringentes não dá margem à alegação de ofensa ao art. 535 do CPC em sede de recurso especial

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            Os embargos declaratórios tipificados pelo artigo 535 e incisos do Código de Processo Civil contam com uma essência nobre e muito valiosa para o alcance de uma decisão escorreita. De fato eles se destacam como instrumentos de perfectibilização dos julgados, facultando às partes, e principalmente ao mesmo julgador da decisão embargada, o melhoramento do aresto.

            São três as hipóteses capazes de dar ensejo à sua oposição. Quando a decisão embargada for omissa e carecer de complemento, restar obscura necessitando ser aclarada, ou ainda resvalar em contradição que deva ser afastada.

            Não raramente, quando os embargos declaratórios são rejeitados pelo Tribunal Regional, ao argumento de inexistir deformidade no acórdão embargado, os operadores do Direito têm se valido do recurso especial fundado na alínea ‘a’ do permissivo constitucional, para apontar violação ao artigo 535, I e II do Diploma Processual Civil, e assim postular pela nulidade do acórdão que deixou de aclarar o decisum embargado.

            Ainda que excepcionalmente, o Superior Tribunal de Justiça vem acolhendo essa tese quando remanescentes do acórdão embargado, manifesta contradição, omissão ou obscuridade, tais vícios não tiverem sido sanados pelo julgamento dos embargos.

            A dúvida nasce quando os embargos declaratórios são opostos visando a infringência do julgado, e não meramente a sua integração com a retificação do lapso. O tema aqui em altercação se propõe a enfrentar justamente essa incerteza, traçando um paralelo e destacando as semelhanças e disparidades de relevância entre as duas modalidades.

            Isso porque os embargos declaratórios com efeitos infringentes são uma espécie alienígena dos embargos declaratórios tradicionais previstos no artigo 535 do Código de Processo Civil, não obstante as duas modalidades compartilhem da mesma natureza, e dos mesmos meios, os fins almejados através deles são em larga escala, distintos.

            Proveniente da criatividade dos advogados, consolidado pela jurisprudência e pela doutrina, os embargos declaratórios com efeitos infringentes não têm por objetivo o complemento do julgado, mas curiosamente a modificação e inversão do seu mérito a favor do embargante. É exatamente o desejado através deles que torna esta espécie tão estranha à sua natureza institucional.

            O caráter infringente empregado nos embargos de declaração só é possível excepcionalmente. Nessas estreitas hipóteses, os declaratórios exercem uma função que a sua natureza nua e crua não lhe outorga, e isso desvirtua suas origens gerando efeitos diversos do comumente visto.

            A oposição dos embargos declaratórios com efeitos infringentes repercute na prática como se estivesse sendo interposto um recurso de apelação, o acórdão que acolhe os primeiros será correspondente ao acórdão que abriga o segundo. Isso porque a finalidade de ambos é geralmente a mesma, qual seja, a de inversão do julgado. Seus efeitos, de praxe, são similares. Eles submetem o embargante ou o recorrente a um resultado idêntico, que se satisfaz através de uma modificação substancial da decisão atacada, capaz de trazer para si um aproveitamento até então pertencente à parte ex adverso.

            Como se nota, os embargos declaratórios comuns, onde se busca a integração do julgado com a correção dos vícios previstos nos incisos do artigo 535 do Diploma Processual Civil, em muito se diferem dos embargos declaratórios com efeitos modificativos. Enquanto os primeiros anseiam pelo aperfeiçoamento, ou por maiores esclarecimentos em favor da decisão embargada, os de natureza infringente têm como razão de existir o intuito de inversão do julgado embargado, podendo essa pretensão estar calcada em termos meritórios ou processuais.

            Ainda que o caminho utilizado para se valer dos embargos declaratórios com efeitos infringentes passe por alegações de obscuridade, contradição ou omissão, o que continua prevalecendo para distingui-lo da espécie tida como tradicional, é exclusivamente o fim almejado através dele.

            Se a intenção veiculada pelos embargos declaratórios é dirigida na busca da inversão do julgado, estar-se-á diante da sua espécie excepcional e atípica, neste caso os seus termos não se comunicam com os mandamentos previstos no artigo 535, I e II do CPC.

            Isso quer dizer que se os embargos declaratórios com efeitos infringentes forem rejeitados, não há que se falar em defeito na prestação da tutela jurisdicional e conseqüente violação ao artigo 535 do CPC, pois não obstante tenham sido apontados vícios tais como omissão, contradição ou obscuridade, a finalidade dos embargos declaratórios era tão somente de re-julgar e inverter o mérito.

            Não é razoável a intenção de anular via recurso especial uma decisão sob o argumento de ofensa ao artigo 535, I e II do CPC, quando os embargos declaratórios foram opostos com o intuito de infringência, só porque o desfecho imposto pelo Tribunal Regional não acolheu as pretensões do embargante, lhe denegando a reforma do mérito decidido pelo acórdão embargado.

            Se o embargante decidiu pelo uso dos embargos declaratórios almejando a modificação do julgado, e não simplesmente a sua integração mediante o saneamento dos vícios, foge em muito do bom senso jurídico permitir que ele modifique em vias de recurso especial o tom visivelmente declarado, e só porque não contou com uma decisão a contento, possa alegar violação ao artigo 535 do CPC.

            Uma coisa é a pretensão pela perfectibilização do aresto embargado. Outra bem diferente é o desejo pela sua modificação com a inversão do mérito em proveito do embargante. São caminhos que partem da mesma natureza, mas que seguem desdobramentos bem distintos.

            Por conseqüência óbvia, quando a parte atribui efeitos infringentes aos embargos declaratórios, e os mesmos não são acolhidos, atécnica se torna à argüição de violação ao artigo 535, I e II do Código de Ritos. Não se pode alegar defeito na prestação da tutela jurisdicional só porque restou frustrada a tentativa de alterar o mérito.

            Destarte, só é passível de nulidade, em razão de ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil apontada em sede de recurso especial, aquele acórdão propalado pelo Tribunal Regional em embargos declaratórios, que mesmo diante de manifesta omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada, deixa de promover o aperfeiçoamento desta última com o saneamento dos vícios.

            Obviamente, se assim não o fosse, estaríamos, ainda que por analogia, permitindo a interposição de recurso especial para anular todas as decisões de segundo grau de jurisdição que vierem contrárias aos interesses veiculados por recursos como o de apelação, embargos infringentes, etc. Afinal, vale repisar que embargos declaratórios com natureza infringente reproduzem os mesmos termos e as mesmas pretensões daqueles, podendo levar também a resultados idênticos.

            A impropriedade da alegação de afronta ao artigo 535, I e II do CPC, quando rejeitados os embargos declaratórios que visavam à infringência do julgado é tema que encontra guarida em alguns julgados do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

            Dentre os exemplos disponibilizados pelo quadro jurisprudencial desta Colenda Corte neste sentido, citamos o RESP 354220/PR, RESP 397586/PR, AgRg no RESP 634059/BA, RESP 425070/ES, RESP 304753/DF.

            Nos paradigmas acima o entendimento exposto não compartilha com a tese de violação ao artigo 535, I e II do CPC, quando os embargos declaratórios rejeitados pelo Tribunal Regional possuíam natureza infringente.

            A mera irresignação do embargante quanto ao desfecho desfavorável imposto pelo Tribunal Regional, não tem o condão de caracterizar a nulidade do acórdão que adveio dos embargos declaratórios opostos com fins de infringência do julgado.

            Desta feita, conclui-se, data venia, que o manejo do recurso especial alegando a violação ao artigo 535, I e II do CPC, e conseqüentemente postulando pela nulidade do acórdão proferido em embargos declaratórios com fins infringentes, é uma pretensão imprópria, senão atécnica. A hipótese anteriormente descartada é exclusividade dos embargos declaratórios tradicionais, ou típicos, sempre opostos com a finalidade de integração e perfectibilização do julgado.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARRA, Rodrigo. A rejeição dos embargos declaratórios com efeitos infringentes não dá margem à alegação de ofensa ao art. 535 do CPC em sede de recurso especial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1132, 7 ago. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8750. Acesso em: 18 abr. 2024.