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O termo inicial do prazo de quinze dias fixado pelo art. 475-J do CPC

O termo inicial do prazo de quinze dias fixado pelo art. 475-J do CPC

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A Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, teve um objetivo evidente, qual seja, aprimorar o rigor técnico-científico do Código de Processo Civil, tal como se observa na nova redação dada aos artigos 162 §1º, 267, 269 e 463.

Por ora, contudo, será dada ênfase ao disposto no art. 475-J do CPC, que excluiu do Processo Civil Brasileiro o ato de citação em execução de sentença que condenou a pagar quantia certa ou já liquidada, mas não explicitou em que momento e nem como será efetuada esta intimação para pagar. Eis a redação do caput:

Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

Sobre o prazo de quinze dias a que se refere o dispositivo acima transcrito, Alexandre Freitas Câmara [01] funda-se no art. 240 do mesmo Código e na garantia constitucional do processo justo para defender a tese de que "o termo a quo deve ser a intimação pessoal do demandado para pagar" (grifos do original), explicando que

a partir do momento em que a sentença começar a produzir efeitos deverá o juiz determinar a intimação pessoal do devedor para pagar o valor indicado na sentença (ou na decisão do incidente de liquidação), no prazo de quinze dias, sob pena de multa.

Sem maiores delongas, Vicente de Paula Ataide Junior discorda por acreditar que

da simples ciência do trânsito em julgado, inclusive pelo próprio advogado do devedor (art. 475-J §1º), comprovada por qualquer meio, passará a correr o prazo de quinze dias (...), no caso de sentença líquida, ou pela intimação da decisão de liquidação por arbitramento ou por artigos [02].

Numa terceira corrente de opinião, Humberto Theodoro Júnior esclarece, embora sem explicar, que "tem o devedor que tomar a iniciativa de cumprir a condenação no prazo legal, que flui a partir do momento em que a sentença se torna exequível" [03]. A esta conclusão é possível chegar mediante qualquer espécie de interpretação, seja ela teleológica, sistemática ou lógica, salvo a literal (posto que omisso o art. 475-J do CPC).

Por uma interpretação teleológica, é de se notar que o dispositivo em apreço (como tantos outros da mesma Lei) tem por objetivo tornar efetiva a norma insculpida no art. 5º, inciso LXXVIII da CRFB, que exige dos Poderes Legislativo e Judiciário a observância do princípio da celeridade. A citação em execução foi simplesmente suprimida, constituindo flagrante violação àquela norma constitucional o entendimento de que o ato citatório (para em 24 horas pagar ou nomear bens à penhora, conforme a regra geral do art. 652 do CPC) foi substituído por um ato de intimação (para em 15 dias pagar).

Como se não bastasse a interpretação conforme a Constituição, mediante uma interpretação sistemática observa-se que a Lei nº 11232, de 22 de dezembro de 2005, inspirou-se na Lei nº 9099, de 26 de setembro de 1995, segundo a qual:

Art. 52 ............................................

IV – não cumprida voluntariamente a sentença transitada em julgado, e tendo havido solicitação do interessado, que poderá ser verbal, proceder-se-á desde logo à execução, dispensada nova citação.

Nos Juizados Especiais Cíveis, "a execução por título judicial prescinde de citação, expedindo-se, desde logo, mandado de penhora" [04] (ou seja, não havendo quitação, assim que a sentença se torna exequível é cabível sua execução, mediante requerimento do credor e expedição do mandado de penhora). Aplicando-se esta mesma sistemática, do art. 475-J do CPC é possível extrair que, não havendo quitação no prazo de quinze dias iniciado no momento em que a sentença se tornou exequível, é cabível sua execução mediante requerimento do credor e expedição do mandado de penhora.

Por fim, mediante uma interpretação lógica, verifica-se que a Lei nº 11232, de 22 de dezembro de 2005, admite uma única intimação da sentença (da qual se iniciam o prazo recursal e, posteriormente, o prazo para pagamento). Ofende o princípio da razoabilidade a crença de que não existe uma "intimação da sentença", mas sim uma "intimação que possibilita recorrer em face da sentença" e outra posterior "intimação que exige o cumprimento da mesma sentença". Também rechaçável, por implicar num bis in idem, o entendimento de que existem duas "intimações da sentença", a primeira para dar início ao prazo recursal e a segunda para dar início ao prazo de pagamento.

Face ao exposto, mediante interpretação teleológica, sistemática e lógica do art. 475-J do Código de Processo Civil, é correta a afirmação de que, proferida a sentença, as partes devem ser intimadas (o que geralmente ocorre em Audiência de Instrução e Julgamento ou via Diário Oficial), donde se inicia o prazo recursal (art. 242 do CPC). Do momento em que a sentença se torna exequível, inicia-se automaticamente o prazo de 15 dias para quitação, findo o qual o credor pode requerer o início da execução através da expedição do mandado de penhora e avaliação.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Cumprindo a sentença de acordo com a Lei nº 11.232/2005. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, nº 1111, 17 jul. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8653>. Acesso em: 17 jul. 2006.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. II. 12ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

LIMA, Hermes. Introdução à Ciência do Direito. 31ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1996.

NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v. I. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. II. 39ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.


Notas

01 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. II. 12ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 467-468.

02 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Cumprindo a sentença de acordo com a Lei nº 11.232/2005. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, nº 1111, 17 jul. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8653>. Acesso em: 17 jul. 2006.

03 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. II. 39ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 51. No mesmo sentido, Athos Gusmão Carneiro, "Nova execução. Aonde vamos? Vamos melhorar", in RePro 123, São Paulo: RT, 2005, p. 118, para quem esse prazo passa a fluir automaticamente da data em que a sentença se torna exequível, quer por haver transitado em julgado, quer por ter sido interposto recurso sem efeito suspensivo (apud CÂMARA, Alexandre Freitas. op. cit., p. 468).

04 Enunciado nº 06 do V Encontro dos juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais, publicado no Aviso TJ-RJ nº 16/2003. No mesmo sentido, consulte-se: NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 1505, nota 3a.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FADEL, Marcelo Costa. O termo inicial do prazo de quinze dias fixado pelo art. 475-J do CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1147, 22 ago. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8830. Acesso em: 28 mar. 2024.