Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/85238
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Sócrates e Justiça

Sócrates e Justiça

Publicado em . Elaborado em .

Texto sobre o pensamento socrático acerca do tema da justiça, bem como sobre suas implicações para o momento histórico.

INTRODUÇÃO

Nesse texto, vamos tratar de um dos mais importantes filósofos gregos: Sócrates (470 a 399 a.c.); sua filosofia nos é cara, pois nos situa em uma relação de obediência a nossos princípios morais e às leis positivas, bem como coloca a educação como uma das mais importantes virtudes a serem constituídas nos indivíduos. É em Sócrates, também, que começamos a ver uma ideia mais forte de primado do coletivo em detrimento do indivíduo, ou seja, de maior respeito ao conjunto social. Vamos analisar, portanto, uma das maiores personalidades do mundo ocidental, não só por suas ideias, mas, principalmente, por suas ações.


CONTEXTO HISTÓRICO

Sócrates nasce em Atenas, no auge da democracia constituída por Sólon, que realizava ali a reforma social da pólis após o também glorioso governo de Péricles. O período socrático nasce, portanto, com a quebra de duas filosofias, a filosofia pré-socrática, fixada na ideia de cosmologia e a filosofia sofista, fixada na palavra, na importância do discurso e na relatividade das leis. Sócrates diverge do pensamento pré-socrático, pois sua filosofia é teleológica, e, como tal, coloca o ser humano no centro de suas próprias ações, busca responder a questões da ética humana; diverge da filosofia sofista, por sua vez, por acreditar que as leis são invioláveis, e que o conhecimento não deve ser comprado ou vendido.

Não existem obras literárias feitas por Sócrates, então, a maior parte das referências sobre sua existência e realizações derivam dos livros de Platão e Xenofonte, que nos mostram Sócrates em ação, seja nos debates com os sofistas ou ajudando os cidadãos e seus amigos a encontrarem a verdade.


O INCANSÁVEL PERGUNTADOR

A filosofia de Sócrates se voltava para os assuntos éticos-sociais, ou seja, nesse ponto, o que interessava a Sócrates eram as ações humanas, suas motivações e a moral dos indivíduos. Portanto, era comum vê-lo em praças públicas (ágora) e nas ruas da cidade (pólis) questionando as pessoas sobre temas como justiça, política, religião e virtude. Entendemos Sócrates analisando mais seus diálogos que seus pensamentos, diálogos esses pautados na maiêutica: uma série de perguntas que possuía como objetivo mostrar aos indivíduos a verdade, que, por sua vez, estava dentro de cada um, só precisando ser revelada. Nessa linha de procura pelo saber verdadeiro é onde reside a felicidade humana, um homem virtuoso seria, desse modo, aquele que limita a influência de suas emoções e se conduz para a realização do saber. O que vai influenciar Platão, mais tarde, a desvalorizar os prazeres do corpo e concentrar a filosofia na prática racional.


SOCIEDADE ACIMA DO INDIVÍDUO / JUSTIÇA

Sócrates acreditava que a lei deveria ser respeitada, pois ela representava a vontade da sociedade, e como tal, é conforme a vontade dos deuses, os quais são verdadeiros símbolos de ética e virtude. Aliás, o lado religioso de Sócrates era seu grande motor para acreditar no respeito à eficácia da lei, ele pensava que se a lei não é cumprida, ou efetivada, isso é um crime contra a sociedade e uma injustiça contra a vontade divina. No entanto, contrário aos filósofos pré-socráticos, ele não acreditava que o divino ou os deuses intervia diretamente na sociedade, os homens eram responsáveis pela sociedade, ele apenas acreditava que os homens deveriam tentar se assemelhar às virtudes divinas, pois essas devem ser as mais puras. Sócrates era tão fiel a essa ideia de respeito às leis da cidade que por elas foi morto.

Quando julgado por influenciar os jovens da cidade e a adorar outros deuses, Sócrates se recusou a fugir, o que era totalmente possível, pois poderia contar com a ajuda de seus discípulos e amigos. Ele, no entanto, encarou a acusação injusta como a realização da eficácia da lei. Recusou, também, uma defesa com base na emoção, acreditava ele que sua defesa era sua própria história, sua vida. Pouco antes de ser condenado a beber cicuta, Apolodoro lhe disse: "Não posso aguentar Sócrates ver-te morrer injustamente", ao que Sócrates respondeu: "Meu caro Apolodoro, então preferias ver-me morrer justamente?".

Ao aceitar a acusação injusta dos homens, ele acreditava que iria possuir uma acusação justa dos deuses. Esse ato, além de uma significação da integridade de Sócrates aos seus ideais, causou para a sociedade um grande respeito à lei, ao desejo social em detrimento do indivíduo, o que será mais aprofundado por Aristóteles depois.

A justiça em Sócrates, portanto, é a sua vida, porquanto podemos retirar diversos ensinamentos sobre justiça apenas com suas decisões e escolhas: com seu respeito às leis podemos retirar um pensamento de justiça associado ao respeito ao que é conforme a lei, e, desse modo, a justiça como algo que deve ser efetivado; com seu respeito as suas leis morais, podemos retirar uma integridade moral incomum, considerando ser justo seguir a sua verdade; e com seu respeito à sociedade, o coletivo sendo a representação do justo e o que o contraria sendo o injusto.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A filosofia socrática, como vimos, é uma filosofia pautada na ética teleológica, ou seja, ela tem como objeto o ser humano e o conhecimento, coisas que estão intimamente ligadas: a primeira contém a segunda. Sócrates nos mostrou que o conhecimento é o caminho para se alcançar a felicidade, mostrando-se feliz até mesmo pouco antes de sua morte, pois acreditava ter realizado tudo o que correspondia a uma vida boa e virtuosa; acreditava que não havia cometido erro algum, pois o erro deriva da ignorância.

Analisamos, portanto, um homem que possuía a ética, a religião e a justiça ao seu lado, e a força em suas crenças o fez segui-las até o fim. Um homem que é estudado através de suas ações, pela falta de textos próprios, e, mesmo assim, consegue garantir uma riqueza de ensinamentos aos que o leem por outros olhos e por outros ouvidos. Espero que esse texto lhe tenha sido útil, se não de forma intelectual, que pelo menos de forma material.


REFERÊNCIAS:

Curso de Filosofia do Direito / Eduardo C. B. Bittar, Guilherme Assis de Almeida. - 11. ed. - São Paulo: Atlas, 2015.

Convite à Filosofia / Marilena Chaui. - 1. ed. - São paulo: Àtica, 2000.


Autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.