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Estratégias processuais dos devedores

Estratégias processuais dos devedores

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"Este trabalho tem por finalidade abordar alguns temas ou aspectos que podem suscitar eventual interesse dos advogados na definição de estratégias a ser adotadas na condução do patrocínio das causas de clientes em débito para com instituições financeiras. nesse campo, precisamente, que se constata, além da flagrante desigualdade econômico-financeira em que se situam os devedores, como regra geral, sobretudo uma generalizada postura de conformismo, para não dizer de inércia e de submissão, frente às pressões e pretensões dos credores, no mais das vezes descabidas."

I - OBJETIVO DO TRABALHO

Este trabalho tem por finalidade abordar alguns temas ou aspectos que podem suscitar eventual interesse dos advogados na definição de estratégias a ser adotadas na condução do patrocínio das causas de clientes em débito para com instituições financeiras.

A título de esclarecimento preliminar, importa salientar não ser pretensão do autor esgotar a matéria e nem tampouco inovar sobre os assuntos abordados, muitos dos quais se ressentem, claramente, de um maior aprofundamento teórico. O principal objetivo do trabalho foi o de contribuir para o debate, com um enfoque o mais prático possível e numa tentativa de colecionar, de maneira sistematizada, algumas questões controvertidas ou que podem suscitar discussões a respeito de matéria de ordem processual vivida no dia-a-dia dos advogados que militam no foro.

O relacionamento entre devedor e instituição financeira envolve, geralmente, os mais diversos interesses; de um lado, os que podem ser classificados como sendo de natureza material (é o caso, v.g., da discussão a respeito do montante do débito); de outro lado, aqueles considerados como de natureza subjetiva, envolvendo até mesmo aspectos de ordem moral e/ou ética, cuja identificação e motivação demandariam análise mas aprofundada que refugiria ao limitado objetivo estabelecido.

Assim, atento à ótica exclusivamente jurídica desse relacionamento, limitar-se-á o campo de abrangência deste trabalho a alguns de seus aspectos processuais, julgados merecedores de uma abordagem específica destinado aos que se dedicam à ingrata tarefa de defender os devedores.

É nesse campo, precisamente, que se constata, além da flagrante desigualdade econômico-financeira em que se situam os devedores, como regra geral, sobretudo uma generalizada postura de conformismo, para não dizer de inércia e de submissão, frente às pressões e pretensões dos credores, no mais das vezes descabidas..

É claro que não se pretende ignorar o que o professor NAGIB SLAIBI FILHO, juiz de direito no Rio de Janeiro, em trabalho publicado no site TEIA JURÍDICA, chamou de a "natural inferioridade do devedor no processo de execução" acentuando, depois de citar CELSO AGRÍCOLA BARBI, que:

"Não há, assim, como se pretender, ainda para amoldar o procedimento instituído por lei ao critério subjetivo de algum intérprete quanto ao tratamento isonômico, de se fazer com o que o devedor seja tratado da mesma forma que o credor.

Em "processo de execução, é imanente a desigualdade de tratamento entre credor e devedor, pois aquele ostenta, sobre esse, a superioridade jurídica decorrente da superioridade econômica que lhe pode exigir uma conduta determinada."

Essa "natural inferioridade do devedor", se aceita, não deve ir além do aspecto estritamente financeiro, posto que, no campo processual, há que se respeitar o princípio do equilíbrio entre as partes, respeitadas as suas peculiaridades (desigualdades subjetivas e formais).

Inobstante as considerações doutrinárias, delimitando o princípio constitucional da isonomia (art. 5º, inciso LV), o que se vê, no mais das vezes, são os próprios devedores se deixando conduzir a um acentuado plano de inferioridade jurídica no embate com os seus credores, agravando ainda mais as conseqüências financeiras inerentes ao descumprimento de suas obrigações.

Na verdade, essa postura implica em reconhecer que o "Juízo da Execução" estaria se auto-substituindo, de forma inaceitável, pelo Juízo em que o Credor deveria previamente - dando causa a um processo de conhecimento -, ter submetido sua pretensão de ver fixado e estabelecido o quantum debeatur, e onde o Devedor teria oportunidade de, através de uma ampla instrução probatória, manifestar sua contrariedade à cobrança e deduzir suas pretensões a respeito de critérios de reajuste e incidência de acessórios e encargos.

O inaceitável é que o Credor se utilize da Ação de Execução, com seu rito procedimental drástico e, sobretudo, com o evidente propósito de coagir, para, inequivocamente, cobrar um débito cujo valor deveria ter sido previamente apurado no processo de conhecimento.

Quando o profissional do Direito é chamado a cuidar dos interesses de um devedor, deve se preocupar com o contexto em que se insere o relacionamento do seu cliente com a instituição financeira credora, cabendo-lhe advertir que, antes de tomar uma decisão ou de optar por uma determinada estratégia no campo do Direito, devem ser exaustivamente ponderados não só os fatores de natureza jurídica, mas todos os fatores que devam ser levados em consideração na análise de um provável enfrentamento judicial, ante as inevitáveis restrições cadastrais e retaliações creditícias de toda ordem que lhe serão impostas, como "castigo" e para servir de exemplo para que outros não sigam o mesmo caminho!

Partindo dessa premissa, e desde que o caminho escolhido, pesados os prós e os contras, seja o do enfrentamento judicial, tem-se como viável discutir uma estratégia que considere recomendável, por parte do Devedor, adotar uma das seguintes alternativas básicas: (a) tomar a iniciativa, ingressando em juízo com algumas demandas; ou (b) aguardar que o Credor promova alguma ação para, em seguida e só então, interpor medidas de cunho preponderantemente defensivo.


II - PROCEDIMENTOS DE INICIATIVA DO DEVEDOR, ANTECIPANDO-SE AO CREDOR

Resolvendo o Devedor adotar uma conduta ativa ou agressiva, no sentido de não esperar ser acionado pelo Credor, são postas à sua disposição algumas medidas, dentre as quais merecem ligeira referência, as seguintes:

Concordata Preventiva ou Autofalência

Tratam-se, inquestionavelmente, de providências extremas e que afetam gravemente a vida da empresa e dos seus sócios e administradores.

Inobstante, não se pode deixar de considerar que, em algumas situações, quando uma empresa atinge elevados níveis de endividamento, sem perspectivas de reverter no médio prazo suas dificuldades, é não só conveniente, mas sobretudo oportuno, ingressar com Concordata ou até mesmo com a Autofalência, especialmente quando a situação adversa se traduz num quadro em que, havendo ainda alguma remota possibilidade de recuperação, estão presentes fatores de difícil ou impossível administração, como quando se detecta uma insustentável fragilidade financeira com o passivo exigível de curto prazo se revelando bastante superior à capacidade de aporte e geração de recursos próprios (como aumentos de capital ou alienação de ativos) ou de recursos de terceiros (estes de caráter "não-exigível" sob pena de agravar ainda mais a situação).

Antes que a situação se complique ainda mais, levando a uma situação irreversível e de deterioração insustentável, não se pode deixar de analisar a hipótese de adoção de uma daquelas providências, no exame mais amplo de um conjunto complexo de interesses de toda ordem, dentre os quais não só os estritamente jurídicos, mas também os econômicos, os negociais, etc., todos dizendo respeito à empresa, aos seus sócios e administradores.

Ação de Prestação de Contas

Geralmente essa Ação é proposta visando questionar lançamentos feitos pelos bancos nas contas de correntistas, com base em extratos periodicamente remetidos. É utilizada, via de regra, para obter a posterior condenação do banco no ressarcimento de valores pagos indevidamente.

A obrigação de prestar contas, por parte das instituições financeiras, tem sido reconhecida pela jurisprudência. A propósito, veja-se parte do voto do Relator, Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO, no julgamento do Recurso Especial nr. 12.393-0 - SP:

"O Supremo, contudo, ao contrário do que entendeu a Câmara julgadora no caso vertente, considerou cabível e adequado o ajuizamento da ação de prestação de contas visando à obtenção de pronunciamento judicial acerca da exatidão, ou não, do conteúdo das contas oferecidas e rejeitadas.

Também esse o sentido do outro aresto da Suprema Corte colacionado pela recorrente, cuja ementa, transcrita nas razões recursais, restou assim vazada:

"Prestação de contas - Apresentação das contas - Apresentação extrajudicial - Exigência em juízo. A apresentação de contas extrajudicialmente não impede que sejam exigidas em juízo, se não houve acertamento amigável a respeito daquelas. Agravo regimental desprovido".

............

"Diante de tal ordem de considerações, imperioso concluir que o recorrente poderia, como efetivamente fez, ajuizar a ação de prestação de contas de que se cuida, colimando obter certeza quanto à correção ou incorreção dos valores lançados nos extratos que lhe foram enviados, sendo inaceitável que "a priori", antes do exame das contas, se reconheça carência da ação por falta de interesse processual. "

Ação de Interpretação de Cláusulas Contratuais e Ação de Revisão e/ou Declaração de Nulidade de Contrato cumulada com Repetição de Indébito.

Através dessas Ações, pretende-se, via de regra, discutir cláusulas contratuais e/ou a revisão judicial, com a repetição do indébito, consistente na devolução dos valores cobrados ilegalmente ou em desacordo com o contrato.

Abrange não apenas os contratos vigentes, mas também e especialmente, os contratos já encerrados, no que concerne à estipulação de cláusulas e disposições tidas como ilegais e abusivas, tais como, dentre outras, as que tratam dos seguintes aspectos:

  • configurando excessiva onerosidade;

  • prática do anatocismo;

  • cumulação de correção monetária com comissão de permanência;

  • fixação de taxas e indexadores unilaterais - taxa ANBID;

  • flutuação de taxas.

Cabe a advertência de que, por se tratarem de ações de natureza pessoal, a prescrição é vintenária, podendo, assim, se perseguir a revisão das operações que tiverem sido realizadas nos últimos 20 anos.

A jurisprudência tem-se inclinado no sentido de que a revisão dos contratos é possível, mesmo em relação aos empréstimos e financiamentos inteiramente quitados, desde que se demonstre haver uma ligação entre os diversos contratos. Esse o entendimento manifestado pelo 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, no Acórdão relativo ao julgamento da Apelação nr. 737.410-7, obtido através do site TEIA JURÍDICA:

"De pronto, é preciso afastar a impossibilidade de revisão do conjunto de contratos, que se mostra viável se, como no caso, comprovadamente, consubstanciaram um negócio bancário continuado, onde os contratos novos serviram para pagamento dos contratos anteriores.

A jurisprudência mais recente tem assentado que é perfeitamente passível de revisão, ou verificação de ilegalidades e irregularidades, os vários contratos, quitados ou não, que se mostram, na realidade, um negócio único e continuado de empréstimo bancário. Se demonstrado, como no caso, que os contratos constituem um mesmo negócio, o posterior servindo para quitar o anterior, é possível a revisão contratual que envolva a todos eles, vencidos e não vencidos."

II.2 - ADVERTÊNCIA: O CREDOR NÃO ESTARÁ IMPEDIDO DE INGRESSAR EM JUÍZO CONTRA O DEVEDOR.

Ressalvadas as hipóteses de Falência - onde se instaura um juízo universal dos credores - e de Concordata Preventiva - esta em relação aos créditos quirografários -, certamente que o advogado do devedor haverá de ter advertido o seu cliente de que não será pelo fato de este se antecipar e ingressar com uma daquelas ações, que o Credor ficará impedido de cobrar judicialmente o seu crédito.

Mesmo que obtenha provimento liminar para impedir que o Credor possa ingressar com uma medida judicial, via de regra a ação de execução, provavelmente esse êxito será efêmero. Tem-se como pacífico o entendimento de que, se o Credor vier a ser coibido de ingressar com ação contra o Devedor, para receber o seu crédito, estará sendo desrespeitada a norma constitucional constante do artigo 5º, inciso XXXV, que assegura o direito público subjetivo de ação, consistente no livre acesso ao Judiciário. Além desse preceito de caráter genérico, para o caso específico de procedimento executivo aplica-se a norma do § 1º do artigo 585 do Código de Processo Civil, segundo o qual a "propositura de qualquer ação relativa ao débito constante do título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução".

Cabe também esclarecer que nada impedirá, em princípio, que algumas das ações mencionadas possam vir a ser propostas mesmo depois de o Credor haver ingressado com a cobrança judicial de seu crédito. Somente uma detida avaliação de cada caso, com todas as suas implicações processuais, é que recomendará a adoção ou não de determinada medida.

II.3 - VANTAGENS PARA O DEVEDOR EM SE ANTECIPAR

No exame preliminar que deve anteceder a definição da estratégia jurídica de enfrentamento do credor, há que se acentuar as possíveis vantagens processuais conferidas ao Devedor, dentre as quais podem ser referidas as seguintes:

A reunião dos processos

Mesmo que o Credor venha, logo a seguir, ingressar com a cobrança judicial de seu crédito, considera-se vantajoso para o Devedor a antecipação porque poderá pleitear a reunião dos processos para julgamento no mesmo juízo, com fundamento na continência ou na conexão das ações, que estará devidamente configurada em decorrência da identidade das partes e de causas de pedir, baseadas como são no mesmo negócio jurídico.

Além de impedir que sejam adotadas decisões conflitantes, a reunião dos processos em um único juízo certamente fortalecerá a posição do Devedor, cujos argumentos e alegações far-se-ão sempre perante o mesmo juiz, possibilitando a este uma compreensão mais ampla das questões que lhe são submetidas, especialmente face os argumentos de defesa do Devedor.

Evitar restrições cadastrais

Pode-se considerar também uma vantagem para o Devedor (pessoa física ou jurídica), uma vez se antecipando ao Credor, e em face dos princípios regentes da "política nacional das relações de consumo" (CDC e Decreto 2.181/97), pleitear ao juiz, liminarmente, através de antecipação de tutela (art. 273 do CPC), que determine a suspensão do fornecimento a terceiros, por parte do Credor, sob pena de multa diária (astreinte), de informações cadastrais restritivas, ao mesmo tempo em que proceda com a imediata anotação contestativa ou explicativa (assentamento verdadeiro porém justificável) com relação a dados constantes de bancos de dados e cadastros de consumo (art. 43, § 3º do CDC, c/c arts. 7º, III da LHD, 84, § 3º do CDC e 273 do CPC).

Nada impede que essa providência possa vir a ser adotada na hipótese de o Credor ter tomado a iniciativa, executando o seu crédito; nesse caso, recomenda-se que o Devedor, nos autos da Execução, ingresse com Medida Cautelar Incidental, pleiteando liminarmente a concessão de ordem determinando a não-inclusão ou, se for o caso, a exclusão, do seu nome dos cadastros restritivos de crédito, enquanto durar a pendência.

Discutir matérias que não são abrangidas pelos limites estreitos dos embargos

Uma outra vantagem para o Devedor, havendo se antecipado ao Credor, consiste em dispor de instrumentos que possibilitam a discussão de questões que, em princípio, não caberiam ser debatidas no campo estreito e restrito dos Embargos, quando, regra geral, as alegações devem se limitar a contraditar e responder exclusivamente às pretensões do Credor constantes da inicial da Execução (art. 741 do CPC).

A limitação dos embargos

Como a Execução não comporta reconvenção, o que se constata nos Embargos é uma atuação eminentemente defensiva por parte do Devedor, porquanto circunscrita e delimitada pelas questões abrangidas na peça atrial da Ação de Execução, de tal sorte que suas pretensões deverão se limitar basicamente a responder, não podendo suas alegações ultrapassar os limites atinentes à discussão sobre o montante do débito (matéria de mérito, em especial tendentes a demonstrar o excesso de execução) ou a questões prejudiciais visando, basicamente, desconstituir o título que tiver aparelhado a Ação.

Não é raro o Devedor enfrentar, nos Embargos, inúmeras dificuldades e até mesmo uma certa prevenção por parte de alguns juizes, que parecem considerar, aprioristicamente, como uma conduta temerária e no mais das vezes protelatória, qualquer tentativa visando desconstituir o título ou se contrapor à cobrança. Nega-se, em geral, até mesmo a instrução probatória, mormente quando destinada à realização de perícia, sob a alegação de que, havendo o Devedor firmado um contrato e/ou emitido o título objeto da cobrança, não cabem outras discussões (pacta sunt servanda), nem mesmo quanto ao montante do débito, aferido geralmente, segundo entendem, "por simples cálculos aritméticos".

Faz-se mister lembrar que, antecipando-se ao Credor, estará o Devedor numa posição mais fortalecida quando vier a ser promovida uma eventual rodada de negociação.

Por último, mas não menos importante, deve-se registrar que, ao recomendar essas providências, não se está defendendo nem muito menos aconselhando uma política de enfrentamento irresponsável e temerário, mas tão-somente lembrando que, hoje em dia, não é mais nenhum "crime" brigar com uma instituição financeira. Antes brigar e tentar sobreviver, do que se acomodar o empresário e esperar que seus herdeiros recebam uma medalha póstuma de reconhecimento e de gratidão por ter sido "correto e bonzinho" e nunca ter tido um título protestado na vida e nem sofrido uma execução.


III - ESTRATÉGIAS DE DEFESA DO DEVEDOR, UMA VEZ INGRESSANDO O CREDOR COM MEDIDA JUDICIAL

Não havendo optado por tomar a iniciativa visando questionar judicialmente o seu débito, somente resta ao Devedor aguardar que o Credor ingresse em juízo, o que geralmente acontece sob a forma de Execução Forçada, isto quando não escolhe outros meios suasórios mais prejudiciais, como a Ação de Falência ou o Arresto Cautelar.

Sendo, todavia, concreta a possibilidade de o Credor intentar alguma medida judicial, sugere-se que o Devedor, para não correr riscos e não ser surpreendido, e para ter alguma chance de reverter eventual medida contrária aos seus interesses, adote a elementar providência de montar um esquema de acompanhamento periódico junto à distribuição do foro de seu domicílio principal (ou nos diversos foros onde possa vir a ser demandado, inclusive através de carta precatória), a fim de que tome prévio conhecimento de eventual ingresso de uma ação, de modo a lhe possibilitar, com razoável antecedência, a adoção de providências defensivas e/ou ofensivas.

III.1 - AGRAVANDO DO "CITE-SE".

Não é nenhum despropósito aconselhar o Devedor - havendo fundados argumentos que possam conduzir à decretação liminar da nulidade da execução -, a ingressar com um Agravo de Instrumento contra o despacho vestibular - no mais das vezes prolatado sem qualquer fundamentação, violando, assim, a regra do artigo 93, IX, da Constituição Federal -, que haja determinado a sua citação para, no prazo de 24 horas, pagar o débito ou nomear bens à penhora.

O fundamento desse recurso - cuja interposição independe da adoção de outras providências, como a objeção de pré-executividade ou uma exceção de incompetência - reside na elevada carga de lesividade que se contém no despacho preambular - conhecido nas lides forenses como o "cite-se"-, considerando-se que o juiz não pode mandar citar o devedor, num processo de execução, salvo se estiver suficientemente demonstrado que se encontram presentes os requisitos tidos como essenciais à propositura desse tipo de ação: haver um débito representado por um título líquido, certo e exigível.

Esse despacho também afigura-se como ilegal quando, de modo inequívoco, a petição inicial não tiver atendido aos pressupostos de constituição válida e regular do processo, e bem assim quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual (art. 267, IV e VI do CPC).

Assim, desde que seja relevante a fundamentação (fumus boni iuris) e fique demonstrada - ainda que em sede de juízo de cognição sumária ou preliminar - a possibilidade de ocorrer lesão grave e de difícil reparação (periculum in mora), deverá o Agravante requerer ao relator a quem for distribuído o recurso, com fundamento nos artigos 527, II, e 558, do CPC, seja atribuído efeito suspensivo, acarretando a ineficácia do despacho recorrido, até o julgamento definitivo do Agravo, cuja matéria de fundo consistirá, basicamente, na anulação do despacho inicial, tendo em vista que, face a ausência de pressuposto de constituição válida e regular, deveria o processo de execução ter sido extinto sem julgamento do mérito (art. 267, IV, do CPC).

III.2 - ARRESTO

Em determinadas circunstâncias, não é raro ver o Credor ingressar com alguma medida cautelar, quase sempre a de Arresto, utilizado como providência de cunho menos acautelatório e muito mais com objetivos intimidatórios; na verdade, a adoção de tal providência se traduz numa tentativa, protegida sob o manto de aparente legalidade, de coação do devedor para forçar uma solução de pagamento do débito.

Por ser esse o caso mais comum, e dadas as evidentes limitações deste trabalho, trataremos especificamente desse tipo de procedimento cautelar.

O juiz, geralmente, se impressiona com as alegações dos credores e, muitas vezes sem que tenha havido uma comprovação indiscutível do atendimento dos pressupostos genéricos e específicos da Cautelar, concede liminarmente a providência requerida, inaudita altera pars.

Daí porque, pertinente se nos afigura a advertência de R. REIS FRIEDE:

"O processo cautelar, notadamente o inominado (derivado do Poder Cautelar Geral), e o ex-officio (derivado do Poder Cautelar Genérico) se encontra apto a proporcionar soluções imediatas, rápidas, para problemas angustiantes, contém ele em si dose imensa de perigo. Os jurisdicionados, por um lado se vêem entregues à discrição e ao bom senso dos Juizes; com o grave risco de - caso eles não exerçam adequadamente sua discrição, ou não possuam o necessário bom senso -, o processo cautelar imediatamente descambar para um desastre completo.

........

No uso da margem do prudente arbítrio que lhe deixa a lei, o Juiz deverá indeferir a liminar, caso não se convença da sua conveniência ou necessidade como também da efetiva e comprovada presença de todos os requisitos e pressupostos autorizadores de sua concessão.

É de destacada importância observar que o Magistrado só está investido do denominado Poder Cautelar Geral ou do Poder Cautelar Genérico quando houver fundado receio de que uma parte cause à outra "lesão grave e de difícil reparação". Na aquilatação da iminência do dano, de modo a configurar fundado receio, é solicitado ao máximo a argúcia do Juiz, para que não se deixe levar por primeiras impressões no tocante à existência da ameaça. O critério seguro será sempre o da prudência do Juiz, dosada com a constatação de indícios que denunciem a plausibilidade de efetivação do dano, em termos veementes." (in ASPECTOS FUNDAMENTAIS DAS MEDIDAS LIMINARES, Forense Universitária, 1ª edição, 1993, pág. 79)

Na análise da Ação Cautelar de Arresto, cabe ao advogado do Devedor examinar, em primeiro lugar, se o Requerente atendeu aos requisitos genéricos exigidos para o ingresso de uma ação regulada pelo procedimento ordinário (art. 282 do CPC). A seguir, deve verificar se foram observados os requisitos específicos exigidos em relação a essa providência preparatória, dentre os quais merece destaque o que impõe a apresentação de caução, quando o arresto é concedido sem justificação prévia. "A caução torna-se obrigatória sempre que o arresto for concedido sem justificação prévia. "São dadas ao juiz duas alternativas ao deferir o arresto: realizar a justificação prévia ou não a realizar, devendo, no último caso, exigir a prestação de caução pelo credor" (1º TACivSP, 7ª Câmara, AI 342.742, Rel. Juiz Régis de Oliveira, v. u., j. 18.6.85, RT 599/134)"

Não tendo sido prestada a caução, ou sendo esta flagrantemente insuficiente ou inidônea, tornando-a viciada e imprestável ao fim a que se destina, há que se pugnar, ao amparo do artigo 816, II, do CPC, pela reforma do despacho liminar concessivo do arresto.

Para a concessão do Arresto, é essencial (art. 814) a conjugação de dois requisitos: (a) a prova literal da dívida líquida e certa, e (b) a prova documental ou a justificação de algum dos casos mencionados no artigo 813.

Regra geral, os Arrestos são intentados com fundamento na alínea "b" do inciso II do artigo 813, quando o devedor, que tem domicílio, "caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta por os seus bens em nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar credores;"

É preciso ficar suficientemente provado que o Devedor tenha se tornado insolvente e que, além da insolvência, tenha praticado qualquer dos atos elencados na alínea b do inciso II do artigo 813;

A concessão da tutela, representada pela liminar, no caso de ações cautelares típicas - como é a hipótese do Arresto disciplinado no artigo 813 e seguintes do CPC - está sempre condicionada à verificação de um risco objetivamente apurável, que se traduz na plausibilidade do dano potencial, ou seja, no fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, poderá causar ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.

Faz-se mister demonstrar, também, que se encontram presentes os requisitos essenciais à concessão de uma providência liminar, quais sejam: a demonstração do periculum in mora, do fumus boni iuris e da ausência do periculum in mora inverso.

Diga-se, outrossim, que a certeza da relação final, e bem assim a efetividade da sentença, como objetos da proteção da Medida Cautelar, não estarão, de forma alguma, correndo o risco de serem afetados, se o Credor não tiver demonstrado ter sofrido redução em sua garantia genérica - representada pelo patrimônio do Devedor - com o que não pode vir, antecipadamente, pedir e muito menos obter, um provimento judicial acautelatório de interesses que, em tese, se encontram devidamente protegidos.

No mais das vezes não se vislumbra a urgência com que teria sido reclamada a concessão da liminar inaudita altera pars, sem que o Credor haja provado, ainda que de forma superficial, o perigo da ocorrência provável da destruição do bem exposto.

Essa apreciação elementar deve ser promovida de forma rigorosa pelo magistrado, no juízo de admissibilidade do pedido liminar.

Válido, nesse sentido, o comentário de R. REIS FRIEDE:

"O factum, como constatação jurídico-constitucional, entretanto, não encerra qualquer questão de hierarquia entre os Poderes, mas, com toda a certeza, uma autêntica questão de competência prevista, expressamente, na própria Constituição Federal, como produto concreto e efetivo do Poder Constituinte - na qualidade de poder soberano (expressão de soberania nacional), originário (criador da ordem jurídica fundamental e dos poderes de Estado (poderes constituídos), ilimitado (não adstrito a regra jurídica anterior de direito positivo) e incondicionado (não subordinado a nenhuma condição prévia para seu exercício) - cuja titularidade exclusiva pertence ao povo e, unicamente em seu nome - cativa a este espírito fundamental - é exercido pelos agentes, previamente legitimados.

O membro do Poder Judiciário, fiel a este espírito, no entanto, não possui (como alguns, por absoluto desconhecimento, possam supor), o poder pleno e dissociado de qualquer tipo de limitação ou restrição de ordem legal-constitucional, pois, se assim fosse, o Juiz possuiria, em essência, o poder arbitrário típico dos tiranos das Monarquias Absolutistas do passado. O Julgador da era contemporânea, muito pelo contrário, está, na verdade, imbuído de um poder que ao mesmo tempo, está ligado a sua própria discricionariedade (livre convencimento), como também o está a uma inerente vinculação ao dever inafastável do cumprimento efetivo da constituição Federal e das leis que com ela convergem, formando o denominado binômio poder-dever.

Por esta específica razão, não possui o Magistrado uma verdadeira e ampla liberdade de decidir, unicamente, consoante seu próprio convencimento ou, ainda, conforme seu subjetivo "senso de justiça", estando, muito pelo contrário, irremediavelmente restrito aos estreitos limites impostos pela lei constitucional e pelas leis infraconstitucionais dotadas dos atributos da vigência e da eficácia." (op. cit., ps. 93-94).

Como já assinalado, a discricionariedade atribuída ao Juiz, em exame da concessão da liminar, não se traduz em arbítrio, posto se vincular à observância dos requisitos básicos e tradicionais: (1) o periculum in mora - consistente no fundado receio da existência de um dano jurídico de difícil ou impossível reparação, aferido através do juízo da probabilidade, com comprovada plausibilidade da existência do dano, e (2) o fumus boni juris, expressando a verificação da plausibilidade do direito alegado pela parte, ou, na definição de WILLARD DE CASTRO VILLAR, "o juízo de probabilidade e verossimilhança do direito cautelar a ser acertado" (em Medidas Cautelares, 1971, p. 59).

Além desses tradicionais requisitos, outros dois passaram a ser exigidos pela Doutrina e mais recentemente pela jurisprudência: a inexistência do periculum in mora inverso, e também a relevância dos fundamentos do pedido.

Quanto a este último - a relevância dos fundamentos do pedido, ou a relevância dos motivos alegados -, não se trataria, em verdade, de um requisito autônomo, mas um aspecto do fumus boni juris.

Já no que concerne à comprovação da inocorrência do periculum in mora inverso, trata-se, sem dúvida, de requisito cuja autonomia parece indiscutível.

Mais uma vez, há que se socorrer do ensinamento de R. REIS FRIEDE, para quem o periculum in mora inverso se traduz:

"... mais especificamente, na sua "não-produção", consistente, exatamente, no afastamento, por seu turno, da eventual concretização de grave risco de ocorrência de dano irreparável (ou de difícil reparação) contra o Réu (Impetrado ou Requerido), como conseqüência direta da própria concessão da medida liminar eventualmente deferida ao Autor (Impetrante ou Requerente). (op. cit. p. 106)

A não-produção do denominado periculum in mora inverso, necessariamente implícito no próprio bom senso do julgador, portanto, desponta inegavelmente como um pressuposto inafastável para a decisão final pela concessão da medida liminar - a ser sempre obrigatoriamente verificado, de forma compulsória -, uma vez que, em nenhuma hipótese, poderia ser entendido como um procedimento lícito a modificação de uma situação de fato perigosa para uma parte - mas tranqüila para outra - por uma nova que apenas invertesse a equação original, salvaguardando os interesses de uma das partes em detrimento da outra e ao elevado custa da imposição de gravames (até então inexistentes e por vezes até mesmo insuportáveis)." (op. cit., ps. 106-108)

É preciso, então, verificar, na análise do caso concreto, se o deferimento da medida liminar não teria acarretado, para o Devedor, precisamente o periculum in mora inverso, inclusive, porque, em muitos casos, a amplitude do arresto pode significar até mesmo a paralisação das atividades operacionais do devedor, quando este se trata de uma empresa, chegando a acarretar a inviabilização da pretensão do Credor.

Além desses requisitos, tidos como genéricos em relação a todas as Medidas Cautelares, no caso do Arresto, presentes devem se encontrar os requisitos específicos consistentes na apresentação de uma prova literal (isto é, escrita ou documental) da existência de uma dívida líquida e certa; e também na prova documental de algum dos casos mencionados no artigo 813; ou, então, deve o juiz promover a justificação prévia, com fundamento no artigo 815.

Assim, no juízo preliminar de admissibilidade do Arresto, não deve o juiz se impressionar com meras alegações do Credor e aceitar simples acusações, mas exigir a prova concreta da ocorrência de pelo menos um dos casos indicados expressamente na lei. E mais: a justificação prévia somente é dispensada (art. 816) se a medida tiver sido requerida pela União, Estado ou Município nos casos previstos, ou se o credor prestar caução.

A exigência de caução, de resto, é imposição legal, não podendo o juiz dispensá-la. Nesse sentido, as decisões oferecidas por Theotônio Negrão:

"Art. 816: 2. O juiz pode realizar a justificação prévia ou dispensá-la; mas, neste caso, deve exigir caução do requerente do arresto (RT 599/134).

Art. 816: 3. Reciprocamente, se o arresto for concedido liminarmente, sem justificação prévia, o requerente deve, obrigatoriamente, prestar caução (JTA 96/76)." (em Código de Processo Civil e legislação Processual em Vigor, 30ª edição, 1999, pág. 766).

Em resumo: quando se tratar de Arresto, o juiz somente poderá concedê-lo liminarmente e sem justificação prévia - exigida se o Credor não tiver provado documentalmente algum dos casos mencionados no artigo 813 - desde que seja prestada caução (art. 816, II). Trata-se, portanto, de uma imposição legal, não podendo ficar ao arbítrio, ou, mais apropriadamente, ao critério do juiz (como ato discricionário) a exigência de caução, para a concessão de medida cautelar, como disciplina o artigo 804 do CPC.

A propósito, veja-se a seguinte decisão oferecida por ALEXANDRE DE PAULA:

"são dadas ao juiz duas alternativas ao deferir o arresto: realizar a justificação prévia ou não realizá-la, devendo, no último caso, exigir a prestação de caução pelo credor (Ac. unân. da 7a Câm. do 1º TACivSP de 18.6.85, no agr. 342.742, rel. juiz Régis de Oliveira; RT 599/134). (in Código de Processo Civil Anotado, 5a edição, RT, vol. III, pág. 3202)."

Advirta-se, também, que o Devedor terá de ficar atento à verificação da observância, por parte do Credor, dos prazos peremptórios estabelecidos nos artigos 806 e 808, II, do CPC.

Cabe à parte propor a ação (principal) no prazo de 30 dias, contado da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório. É o que estabelece o artigo 806.

Não sendo intentada no trintídio a ação principal ou se a medida cautelar não vier a ser executada também no mesmo prazo, cessará a eficácia da cautelar (art. 808, I e II).

Qualquer que seja a hipótese, ao invés de proferir decisão interlocutória, o que implicará na continuação do processo, é preferível que o juiz seja instado a sentenciar, decretando a perda da eficácia do Arresto, declarando extinto o processo sem julgamento do mérito e condenando o Autor nos ônus sucumbenciais.

O arresto de vários bens

Caso interessante é o que acontece quando a execução da medida cautelar se desdobra na prática de vários atos, ou na constrição de diversos bens: prevalece a interpretação de que o prazo peremptório e decadencial de 30 dias previsto no art. 806 - para ingresso da ação principal - é contado a partir da primeira constrição, isto é, desde que se inicie a execução das providências restritivas incidentes sobre os bens do requerido.

Essa a opinião de HUMBERTO THEODORO:

"... o prazo para ajuizamento da ação principal deve forçosamente ser contado do primeiro ato de execução material da medida cautelar e não do último da série, porque, desde o primeiro já existira "efetivação da medida" (art. 806)". (em MEDIDA CAUTELAR, Ed. Univ. de Direito, 13ª edição, p. 151).

Outro não é o ensinamento de SÉRGIO SHIMURA, autor de obra que esgota o tema do arresto cautelar:

"Havendo constrições sobre vários bens, ou em relação a vários réus, o prazo é contado da primeira constrição, e não da última. É que o prazo do art. 806 é estabelecido em favor do réu, que sofre o cerceamento da disposição de seus bens, e não em prol do arrestante. Demais disso, desde o primeiro ato de execução material, já existe efetivação da medida.

É dizer, havendo a concessão da liminar, é a partir do cumprimento do despacho concessivo que o prazo para a propositura da ação principal é contado, pois é deste cumprimento que surge a restrição ao direito. Hipóteses há, contudo, em que a efetivação da medida se protrai no tempo, isto é, não pode, por qualquer razão, ser efetivada de uma só vez.

Neste caso, como é evidente, conta-se o prazo do primeiro ato de execução material da medida e não do último da série.

A razão para aplaudir esta orientação está no fato, aliás muito simples, de que este primeiro ato de execução material já é mais do que suficiente para provocar restrição ao direito do requerido."(em ARRESTO CAUTELAR, ed. TR, 1993, ps. 294-295)

A jurisprudência também segue esse mesmo entendimento. Nesse sentido, decisão fornecida por WILSON DE SOUZA CAMPOS BATALHA:

"Havendo a concessão de liminar, é a partir do cumprimento do despacho concessivo que o prazo para a propositura da ação principal é contado, pois é deste cumprimento que surge a restrição ao direito. Hipóteses há, contudo, em que a efetivação da medida se protrai no tempo, isto é, não pode, por qualquer razão, ser efetivada de uma só vez. Neste caso, como é evidente, conta-se o prazo do primeiro ato de execução material da medida, e não do último da série." (1º TACivSP, 3ª Câm, Ap. 310.746, rel. Juiz Souza Lima, v. u., j. 11.5.83, RT 578, 145)". em CAUTELARES E LIMINARES, LTr, 1995, p. 128)

E THEOTÔNIO NEGRÃO:

"Art. 806:5. "Existindo restrição do direito do réu, desde o primeiro ato de execução, deste conta-se o prazo, não importando que a medida compreenda outros, efetuados em dias subsequentes. Releva, para fluência do prazo, o momento em que efetivada a medida, e não aquele em que se juntou aos autos o mandado"(RSTJ 20/403 e STJ-JTAERGS, 77/340). Neste sentido: RT 578/145).

Art. 806: 5a. Conta-se o prazo do art. 806 do momento em que surge uma restrição ao direito da parte contrária; se houve concessão de medida liminar, é a partir de sua efetivação que correm os 30 dias (STJ-4ª Turma, REsp 1.446-RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 28.11.89, negaram provimento, v.u., DJU 5.2.90, p. 457, 1ª col., em.; RT 473/113, 475/132, 490/129, 496/111, 503/141, 506/132, 608/66, 624/191, RF 284/263, 291/243, RJTJESP 89/198, JTA 35/162, 35/215, 37/210, 41/97, 49/94, 61/51, Bol. AASP 865/237, 1.406/289). Coerentemente, se há vários atos de constrição, do primeiro é que se conta o prazo de 30 dias (RT 578/145, RJTJESP 112/233, JTAERGS 96/182).(op. cit., pág. 760):

Recurso contra a decisão concessiva do arresto

Se entender que dispõe de elementos suficientes para fazer com que o juiz reveja sua decisão, ingressa o Devedor diretamente nos autos com pedido de reconsideração do despacho concessivo da providência liminar. Caso contrário, deve interpor junto ao Tribunal de Segundo Grau competente, o Recurso de Agravo de Instrumento com pedido de concessão de liminar para suspender os efeitos do despacho agravado. De qualquer sorte, é importante que o Devedor atente para o fato de que, se optar pelo pedido de reconsideração, não deve se descuidar e deixar transcorrer o prazo de 10 dias sem ingressar com o Agravo, para que não se venha alegar a preclusão da matéria e a intempestividade do recurso. Uma vez deferindo o juiz o pedido de reconsideração, o Devedor desiste do Agravo de Instrumento.

III.3 - A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE

A regra geral é que o Executado, desde que intentada a Ação de Execução, somente pode deduzir suas alegações e defesas através dos Embargos, depois de seguro o juízo com a efetivação da penhora.

Tem-se visto a utilização cada vez mais freqüente, de petições apresentadas pelo Devedor, em fase antecedente aos Embargos, a fim de postular a extinção da Execução, sem que haja necessidade de interpor aquela ação incidental.

Na verdade, o que se persegue com esse tipo não ortodoxo de Incidente, é geralmente a desconstituição do título com que tiver o Credor Exequente aparelhado a Execução. Trata-se de medida de oposição - fundada ao mais das vezes na constatação de vícios ou defeitos que acarretam a nulidade ou a anulabilidade do título - a que se tem denominado de "exceção" ou de "objeção de pré-executividade" e que vem enfrentando severas resistências quanto à sua admissibilidade, ao entendimento - no mais das vezes preconceituoso, para não dizer simplório -, de que "o devedor somente pode se defender nos Embargos."

Foi com essa preocupação que CÂNDIDO DINAMARCO alertou:

"É preciso debelar o mito dos embargos, que leva os juizes a uma atitude de espera, postergando o conhecimento de questões que poderiam e deveriam ter sido levantadas e conhecidas liminarmente, ou talvez condicionando o seu conhecimento à oposição destes." (em EXECUÇÃO CIVIL, 4ª ed. São Paulo, Malheiros, 1994, p. 169)

Aos poucos, embora com imensa dificuldade, as exceções de pré-executividade vão sendo admitidas e até mesmo atendidas, naqueles casos em que se comprova de plano que a Execução não poderia ter sido intentada à falta de pressuposto essencial à sua propositura. Claro está que não se pode admitir que a exceção de pré-executividade se torne uma rotina, como um modo de o Devedor apresentar suas defesas e alegações sem que, previamente, haja sido ultrapassada a fase de realização da penhora, para segurança do juízo.

O que se deve esperar é que o juiz, usando do bom senso e do equilibro, saiba bem distinguir uma exceção pertinente e válida, de uma simples petição meramente protelatória e desprovida de fundamentos razoáveis a justificar sua admissibilidade como peça antecedente dos Embargos.

Já decidiu o STJ que "excepcionalmente, admite-se a exceção de pré-executividade, no âmbito da qual, sem o oferecimento da penhora, o executado pode obter um provimento, positivo ou negativo, sobre os pressupostos do processo ou sobre as condições da ação - decisão, então, sujeita a agravo de instrumento."(cf. Ementa do Acórdão ref. ao julgamento do ROMS 9980/SP, publicado no DJ de 05.04.99, relator o Min. ARI PARGENDLER).

Por não vislumbrar como essas exceções possam ter o condão de suspender o processo, consideramos válida a advertência quanto ao cuidado que o devedor há de observar, de, uma vez citado regular e validamente para pagar ou apresentar bens à penhora, não se limitar a ingressar com a petição de objeção, deixando transcorrer in albis o prazo de 24 horas para oferecer bens à penhora.

Nesses casos, o Devedor pode perder o prazo (preclusão temporal) que lhe assistia para nomear bens à penhora e/ou para ingressar com o recurso (Agravo de Instrumento) contra o despacho preambular que determinou a citação.

Claro que essa preocupação, no que concerne à nomeação de bens, não existirá no caso de se tratar de execução relativamente a dívida garantida por penhor, anticrese ou hipoteca, quando, nos termos do artigo 655, § 2º, do CPC, a penhora recairá, independentemente de nomeação, sobre a coisa dada em garantia. Nessa hipótese, revela-se inócua e equivocada, porque processualmente desnecessária, atitude do Devedor peticionando nos autos para oferecer bens à penhora.

Com efeito, quando se trata de execução fundada em créditos em relação aos quais preexiste uma garantia contratual, é inadmissível que, na fase inicial, recaia a penhora sobre quaisquer outros bens, devendo necessariamente incidir apenas sobre os que tenham sido dados em garantia, mesmo que o valor do débito objeto da execução haja sido estabelecido ou calculado pelo Credor, na petição inicial, em montante superior ao valor que, supostamente, possa ser atribuído aos bens inicialmente penhorados. Nessa primeira fase, o princípio da suficiência da penhora não admite questionamento, salvo se, comprovadamente, e desde a ocasião em que tiverem sido dados em garantia, os bens hajam sido avaliados em montante inferior ao do crédito.

A discussão sobre a necessidade de reforço ou ampliação da penhora somente poderá ocorrer, ao amparo do que estabelece o artigo 685, II, do CPC, quando vier a ser ultrapassada a fase da avaliação dos bens penhorados, o que pressupõe, necessariamente, tenham sido julgados improcedentes ou procedentes em parte, os Embargos quando opostos regularmente.

Reitere-se, então, o ponto de vista no sentido de que, uma vez ingressando o Devedor com a objeção de pré-executividade, o processo não fica suspenso, razão pela qual deverão continuar sendo praticados todos os atos e cumpridas todas as etapas definidas do estatuto processual.

Evidentemente que o magistrado, uma vez convencido, em sede de juízo preliminar de admissibilidade, da procedência das alegações do Devedor, atento ao princípio da economia processual e em respeito à regra contida no artigo 620 do CPC - segundo a qual a execução far-se-á do modo menos gravoso para o devedor -, poderá determinar, no exercício do poder que lhe confere a lei de conduzir e presidir o feito, a suspensão da prática de determinados atos, como, por exemplo, a realização da penhora, enquanto não for prolatada decisão a respeito da objeção.

Somente uma exceção típica, como, por exemplo, a de incompetência, acarretará a suspensão do processo de Execução.

Os casos mais comuns de objeção de pré-executividade dizem respeito (a) à inexigibilidade do título, por falta de liquidez, certeza e exigibilidade, e (b) à impossibilidade jurídica do pedido, quando o Credor não apresenta o demonstrativo do crédito, em se tratando de execução fundada em título extrajudicial, deficiência essa que também pode ser vista sob o ângulo da inexigibilidade.

O que se deve pleitear, então, é a desconstituição do título executivo, por falta de exigibilidade, e o reconhecimento de que o Autor Exequente não tem interesse de agir, devendo ser julgado carecedor da ação.

Em trabalho divulgado através do site JUS NAVIGANDI, o advogado Jonair Martins, de Araçatuba (SP), oferece uma análise bem fundamentada apoiada na doutrina e na jurisprudência, a respeito das "objeções de pré-executividade", interpostas em processos de execução, para que o Executado possa discutir a exigibilidade do título de crédito, sem a necessidade de apresentação de bens em garantia. Desse seu trabalho, é oportuna a transcrição das seguintes passagens:

"O equívoco da doutrina em não visualizar o contraditório no processo executivo consiste numa fisionomia diversa que apresenta. A eficácia condicionada do título executivo revela uma desigualdade das partes no âmbito do Direito Material. Vale dizer, a posição privilegiada do credor que possui uma situação favorável criada antes do processo executivo em nada interfere nesta nova relação (processual) que irá se formar. O princípio do contraditório na relação executiva deve ser preservado e ainda, no plano processual, a igualdade das partes rigorosamente observada.

............

A partir dessas observações, se pode concluir que é perfeitamente possível e adequado admitir-se o exercício do direito de defesa na execução, independentemente da oposição de embargos, sobretudo quando se alega a inexistência dos pressupostos processuais exigíveis à constituição de toda relação processual ou das condições da ação também exigidos na sistemática adotada pelo atual CPC para que exista o próprio direito de acionar a jurisdição.

Entendimento contrário importaria negar-se as garantias constitucionais anteriormente referidas ou defender-se que a execução não se realiza através de um processo, pois estes sempre é essencialmente dialético.

Para Nelson Néry Júnior, há de reconhecer-se ao devedor o direito de apontar irregularidade formal do título que aparelha a execução, a falta de citação, a incompetência absoluta do juízo, o impedimento do juiz e outras questões de ordem pública, sem a necessidade de prévia garantia do juízo e da oposição de embargos, como manifestação do princípio do contraditório.

O EG. 1º TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL DE SÃO PAULO, a admite, quando a questão é passível de apreciação independente de embargos:

"RECURSO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Interposição contra decisão que indefere exceção de pré-executividade decorrente da impossibilidade jurídica da ação de execução – inexistindo dispositivo legal que impeça a suscitação da matéria nos próprios autos da execução, cumpre ao Juiz decidi-la fundamentadamente – Decisão reformada – recurso provido. (1º TAC- Ap. 628-889-1 – Comarca de Mauá – 11ª Câm. Rel. Juiz Ary Bauer - j. 17/08/95)

Do corpo do acórdão se extrai:

"Tal forma de defesa se justifica em hipótese onde se patenteia a ausência de condições da ação exemplificativamente a possibilidade jurídica afastada por título flagrantemente nulo ou inexistente, hipótese onde sequer se justificaria a realização da penhora, que pressupõe a executoriedade do título...."

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A EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO

"A doutrina moderna reconhece expressamente a utilização da exceção de pré-executividade, tendo a jurisprudência já apreciado e adotado em alguns casos. Em primeiro grau de jurisdição seguidamente os juizes acolhem esta modalidade de iniciativa do executado. PONTES DE MIRANDA, ao elaborar parecer famoso "CASO MANNESMANN", assim feriu a questão: "quando se pede ao juiz que execute a dívida (exercício de pretensões pré-processual e processual à execução), tem o juiz de examinar se o título é executivo, seja judicial, seja extrajudicial" (Dez Anos de Pareceres, 1975, v. IV/132-3 ). Segue o renomado parecerista: "se alguém entende que pode cobrar dívida que consta de instrumento público, ou particular, assinado pelo devedor e por duas testemunhas, e o demandado –– dentro de 24 horas –– argüi que o instrumento público é falso, ou de que a sua assinatura, ou de alguma testemunha, é falsa, tem o juiz de apreciar o caso antes de ter o devedor de pagar ou sofrer a penhora.

Linhas adiante conclui o imortal PONTES " UMA VEZ QUE HOUVE ALEGAÇÃO QUE IMPORTA EM OPOSIÇÃO DE EXCEÇÃO PRÉ-PROCESSUAL OU PROCESSUAL, O JUIZ TEM DE EXAMINAR A ESPÉCIE E O CASO PARA QUE NÃO COMETA A ARBITRARIEDADE DE PENHORAR BENS DE QUEM NÃO ESTAVA EXPOSTO À AÇÃO EXECUTIVA" (15)

O condicionamento de penhora ou depósito para o exercício de "ação" incidental de embargos do devedor, que seria a medida cabível, contraria e excepciona o disposto no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal adiante transcrito (16). Dispõe a Carta Magna: "A lei não excluirá da apreciação pelo PODER JUDICIÁRIO lesão ou ameaça a direito"

Além dos casos em que se possa demonstrar, de plano, a verificação de deficiências formais ou substanciais do título, com o reconhecimento preambular de sua nulidade (como, por exemplo, quando falta a assinatura do devedor na nota promissória, ou quando se verifica não ter havido a subscrição por duas testemunhas de um documento particular onde se reconhece um débito), uma das hipóteses mais freqüentes de utilização da objeção de pré-executividade se dá quando o Devedor dispõe de elementos que, dispensando uma investigação mais aprofundada, possam revelar ao juiz que o Credor pretende receber um valor excessivo e incompatível com o seu título.

Daí porque, é importante reiterar a lição ofertada por CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, no sentido de:

"... parecer certa a conclusão de que as denominadas ‘exceções de pré-executividade’ ganham, com o advento da Lei nr. 8.884/94, um campo evidente de aplicação, sem prejuízo daquelas hipóteses em que doutrina e jurisprudência sempre entenderam seu cabimento; toda vez que a apresentação da memória discriminada de cálculo for apresentada abusivamente, despicienda da apresentação de bens a penhora para o fim de o executado apresentar as razões de seu inconformismo. Dito ao revés; injurídica a agressão ao patrimônio do executado toda vez que houver abusividade no comportamento do exequente quanto ao oferecimento da memória de cálculo." (em EXCESSO ABUSIVO DE EXECUÇÃO, p. 121).

O que se vê, todavia, nesses casos, é o juiz, sem um maior aprofundamento das alegações oferecidas, inacolher ou indeferir liminarmente a Exceção, ao cômodo argumento de que, por se tratar de questão relativa a "excesso de execução", somente poderia vir a ser discutida nos Embargos.

Quando, porém, existem e se constatam erros flagrantes ou diferenças evidentes, muitas vezes revelados com base em documentos fornecidos pelas próprias instituições financeiras, não se deve aceitar que o montante comumente absurdo cobrado seja tido apenas como uma "quantia superior à do título", com o que se daria a incidência do artigo 743, I, do CPC, de modo a ensejar o reconhecimento do excesso de execução, como matéria a ser objeto dos Embargos do Devedor (art. 741, I).

Nesses casos, e mesmo que se possa ter como certa a obrigação contida no instrumento negocial anexado à petição inicial da Execução, restaria configurada a iliquidez e a inexigibilidade quanto à prestação; isto é,: o montante da obrigação objeto da cobrança, por não ser precisamente o que o próprio Credor reconhece ser o devido, conduz à indeterminação e, por via de conseqüência, à inexigibilidade do título.

Insucessos ocasionais não devem desestimular os que propugnam pelo uso da objeção de pré-executividade, havendo que perseguir a compreensão dos juizes, para o reconhecimento de que os vícios demonstrados sirvam para modificar a força operante do título, acarretando a decretação da nulidade da ação a conseqüente extinção do feito.

Em trabalho de excelente nível técnico, denominado "JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE NA EXECUÇÃO FORÇADA E EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE", publicado no site JUS NAVIGANDI, o Dr. Renato Vasconcelos Magalhães, juiz de direito no Rio Grande do Norte, assim externou sua firme opinião:

"Sempre atento a efetivação da justiça, buscando dar ao Direito a sua devida vivificação, entendo perfeitamente possível a utilização da exceção de pré-executividade para se atacar a execução antes e independentemente dos embargos, notadamente quando se alega a inexistência de pressupostos processuais necessários à constituição e desenvolvimento regular do processo ou das condições da ação, ou mesmo pela presença de qualquer outro vício que macule a relação processual instaurada no processo de execução e que, possa ser apreciada e julgada pelo juiz sem a necessidade de dilação probatória."

O direito de reagir e de lutar

O que se há de defender, até as últimas instâncias, é a legitimidade conferida ao Devedor para se insurgir contra a "obrigação" de se submeter inerte à agressão patrimonial a que está exposto, impondo-se, antes de exercitado o sagrado direito de defesa, o constrangimento da penhora, com os inevitáveis e muitas vezes graves prejuízos materiais e morais, tudo isto sem que o Credor Exequente haja atendido à elementar e preliminar exigência processual consistente em dispor de um titulo liquido, certo e exigível!

Para a constituição válida e regular do Processo de Execução, faz-se mister, também sob esse ângulo, que o quantum debeatur expresse o montante da prestação de maneira inequívoca e extreme de dúvidas, mesmo em se admitindo a sua aferição por simples cálculo aritmético.

Inaceitável processualmente, é que o Credor Exequente, apenas e tão-somente porque é credor, se utilize da via executiva, com seu rito procedimental drástico e sem comportar defesa, para cobrar um valor por vezes incerto ou indeterminado, portanto ilíquido e indevido; por essa razão, não dispõe o Credor de titulo liquido, certo e exigível, desatendendo, então, aos requisitos exigidos pelo art. 586 do CPC.

Admitir, nesses casos, que a Ação de Execução possa ser iniciada apenas com base numa declaração unilateral e equivocada do Credor - a quem a própria Justiça (?) avaliza foros de senhor todo-poderoso e dono da verdade, cuja palavra está imune a dúvidas - significa uma verdadeira subversão da Ordem Jurídica, posto submeter previamente o devedor à constrição da penhora, além de lhe impor o ônus de provar, com todos os custos e dissabores, na Ação de Embargos, que o valor cobrado não é o devido e não é o correto.

Como a liquidez e a exigibilidade são pressupostos essenciais à caracterização do título executivo, sua ausência acarreta, também, considerar como inadequado e inidôneo o procedimento escolhido pelo Autor da Ação, possibilitando, assim, a incidência da regra do art. 295, V, do CPC, que impõe o indeferimento da petição inicial porque "o tipo de procedimento escolhido pelo autor não correspondeu à natureza da causa."

Alternativa e sucessivamente, pode-se pedir o reconhecimento de que, ao processo, faltou pressuposto de constituição válido e regular, com o que a norma aplicável seria a do artigo 267, IV do Estatuto Processual.

Em relação especificamente à Ação de Execução, o Código de Processo Civil não quis deixar margens a dúvidas, ao cominar a pena de nulidade do processo (art. 618. I), a ser decretada de ofício, a todo tempo, quando o título não for líquido, certo e exigível.

Oportunos, a esse propósito, os ensinamentos ofertados por ALBERTO CAMIÑA MOREIRA, precisamente sobre o a possibilidade de o excesso de execução ser alegado por exceção de pré-executividade:

"Essa hipótese não havia sido enfrentada, ao que nos parece, pela doutrina até o advento da Lei n. 8.898, de 29 de junho de 1994, que deu nova redação ao art. 604 do Código de Processo Civil e extinguiu a liquidação por cálculo do contador.

Hoje a execução é movida com a "memória discriminada e atualizada do cálculo". E, se o calculo contiver erro e caracterizar excesso de execução? Donaldo Armelin (o que sobeja do efetivamente devido carece de certeza), Cândido Dinamarco ( o que sobeja está sem título executivo), Cássio Scarpinella (o excesso abusivo deve ser subsumível ao conceito de erro de cálculo ou erro material, que não transita em julgado e o juiz conhece de ofício), Eduardo Talamini (o que sobeja enquadra-se na impossibilidade jurídica do pedido) e Paulo Lucon ( o que sobeja está sem título ) propugnam a possibilidade d o executado alegar o excesso no próprio processo de execução, desnecessários os embargos. (em DEFESA SEM EMBARGOS DO EXECUTADO, Saraiva, 1998, ps. 138-139).

Em seguida, aquele Autor, depois de asseverar que a exceção de pré-executividade tem lugar verificado o excesso de execução, "bastando que se considere a desigualdade existente entre o valor (quantia) do título e o pleiteado pelo credor" conforme entende JOSÉ DE MOURA ROCHA, conclui:

"Entretanto, é lógico que o excesso decorrerá de erro cometido por ocasião da elaboração da memória do cálculo; mas erro que não demande alta indagação e seja perceptível a olho nu, independentemente de ser estapafúrdio ou abusivo. Ou, como anotado no despacho que inadmitiu recurso especial, erro de cálculo "será sempre uma operação aritmética falha ou o resultado dela, jamais um critério acerca do qual se registre possível controvérsia."

O NÃO-ACOLHIMENTO DA EXCEÇÃO: CONDUTA PROCESSUAL RECOMENDADA

Pretender a decretação da nulidade da Execução, sem que tenha o Executado interposto os Embargos, não é, propriamente, uma estratégia processual nova. Há muito tempo os advogados suscitam o tema, agora mais bem desenvolvido e estruturado, sob a roupagem da "exceção de pré-executividade".

Deparando-se, então, o Devedor com uma decisão contrária do juiz, não acolhendo ou indeferindo a exceção de pré-executividade, e, se for o caso, determinando o prosseguimento da Execução, com a realização da penhora, a providência acertada é ingressar com o recurso de Agravo de Instrumento com pedido de concessão do efeito suspensivo ativo ou da tutela antecipada.

Inicialmente, há que se ter em mente que significativas reformas foram introduzidas em tempos recentes na sistemática recursal prevista no CPC, e que um dos exemplos dessas reformas é a possibilidade de o relator, em sede de agravo de instrumento, conceder efeito suspensivo ao recurso, no caso de perigo de dano ao direito postulado ou ao bem a ser protegido. Com isso, a principal intenção do legislador foi acabar com o uso anômalo do mandado de segurança, utilizado à larga com a finalidade de, em sede de liminar, conferir efeito suspensivo a agravo de instrumento afrontando decisão interlocutória de primeiro grau.

Foi justamente a partir dessas Reformas, com a nova feição dada ao Agravo de Instrumento, mediante a possibilidade da concessão de efeito suspensivo pelo relator, que os Tribunais passaram a ser solicitados com maior freqüência nos casos em que o Devedor Executado recorria contra decisões dos juizes monocráticos negando acolhimento às exceções de pré-executividade.

Exatamente com essa configuração mais recente, é que o emérito advogado processualista pernambucano MANOEL ENILDO LINS, , ingressava, já em 9 de Julho de 1996, devidamente amparado na doutrina e na melhor jurisprudência, com o bem fundamentado Agravo de Instrumento nr. 30810-5, pleiteando liminarmente a concessão de efeito suspensivo, com fundamento no artigo 527, II, do CPC, para suspender o cumprimento de decisão proferida em processo de Execução pelo Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca do Cabo, que havia indeferido petição do Executado onde se perseguia a nulidade da execução, à falta de título executivo.

Mas, sendo a decisão agravada negativa, como ocorre no caso ora comentado, considerou-se, inicialmente, que o Relator não poderia conceder o efeito suspensivo ao Agravo, atendendo ao comando literal do artigo 527, II, do CPC, sob o entendimento de que não seria possível suspender o "nada".

Trata-se de postura equivocada, porque, mesmo havendo negado uma determinada postulação, claro está que a respectiva decisão existe e produz efeitos. Trata-se, como assevera o professor de Direito Processual Civil de Santa Catarina, LUIZ CARLOS NEMETZ, em trabalho denominado O NOVO REGIME DO AGRAVO E O EFEITO SUSPENSIVO ATIVO, de "um pronunciamento judicial interlocutório negativo acerca de uma postulação." O que não parece correto é admitir que a Parte afrontada pela decisão de primeira instância possa, em muitos casos, vir a sofrer prejuízo irreparável, uma vez estando obrigada a aguardar o julgamento do mérito do recurso de agravo órgão colegiado de segundo grau .

Visando solucionar esse impasse, a doutrina e a jurisprudência recomendam que o Relator, nesses casos, suspenda o cumprimento da decisão até o pronunciamento da turma ou câmara, com fundamento no artigo 558, ou conceda antecipadamente a tutela pretendida afinal no recurso, nos termos do artigo 273, do CPC. É o que, por exemplo, assevera o ex-ministro do STJ ATHOS GUSMÃO CARNEIRO, um dos condutores da reforma processual:

"Nesse ponto cabe uma perquirição: quid iuris, se a decisão interlocutória tiver conteúdo negativo e, portanto, não comportar cumprimento a ser suspenso? Assim, p.ex., a decisão denegatória da perícia, que a parte insta como necessária e urgente ante a iminência de desaparecimento dos vestígios de um determinado evento. A mera suspensão dos efeitos da decisão impugnada manteria sem solução o requerimento de realização da prova pericial.

Será possível, em casos dessa ordem, a impetração de mandado de segurança para que a decisão denegatória seja substituída por decisão com conteúdo positivo?

Esta não nos parece ser a melhor solução, inclusive porque a ausência do pressuposto do direito líquido e certo (= fatos incontestáveis, no clássico magistério de Costa Manso) manteria a deturpação no emprego do writ. O melhor caminho processual afigura-se, destarte, o de permitir ao relator, usando o poder geral de cautela previsto no art. 798 do Código de Processo Civil, determinar seja efetuada a perícia, com o que será evitado o risco da procrastinação, capaz de torná-la impossível.

Essa diretiva, em última análise, bem se harmoniza com a antecipação dos efeitos da tutela, de tão largo alcance para eficiência do processo e introduzida de forma genética no direito processual brasileiro pela Lei nº 8.952/94, ao dar nova redação ao art. 273 do Código de Processo Civil" (O Novo Recurso de Agravo e Outros Estudos, 1996, Rio, Forense, pp. 73 e 74).

Esse, igualmente, o entendimento majoritário do Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, conforme anota o eminente juiz LÁZARO GUIMARÃES, em trabalho veiculado no site da TEIA JURÍDICA, segundo o qual: "o uso do termo suspender tem o mesmo alcance que a expressão "que suspenda o ato impugnado", constante do art. 7º, II, da Lei 1.533/51, que, de resto, é a fonte inspiradora da Lei 9.139. Essa é a interpretação teleológica do dispositivo, aquela que melhor atende à finalidade de pronta sustação dos efeitos do ato judicial com indícios suficientes de erronia".

Consolida-se, portanto, a tendência jurisprudencial no sentido de conferir ao Relator do Agravo, a faculdade de conferir efeito suspensivo ativo ou substitutivo, antecipando os efeitos da tutela pretendida, isto é, o atendimento ao pleito desatendido pela decisão negativa contida na decisão agravada.

O Relator, nesses casos, atua como juiz preparador do recurso, como ensina NELSON NERY JÚNIOR, em seus comentários ao artigo 558:

" 8. Decisão impugnada negativa. Caso a decisão impugnada seja de conteúdo negativo, como, por exemplo, o indeferimento de medida liminar, o relator pode conceder, liminar e provisoriamente, a medida pleiteada como mérito do recurso, atuando neste caso como juiz preparador do recurso. O órgão coligado competente para o julgamento do mérito do recurso pode manter a medida concedida pelo relator ou revogá-la." (em p. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMENTADO, Editora Revista dos Tribunais, 4ª edição, 1999, p. 1.075).

O advogado FELICÍSSIMO SENA, em trabalho publicado no site AVOCATI LOCUS, sintetizou com precisão a nova configuração do EFEITO SUSPENSIVO ATIVO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO:

"Dessa análise resulta que a referência supostamente facultativa atribuída ao artigo 558 quando diz que ‘o relator poderá’ na verdade é uma parcela do conhecido ‘poder dever’ do Estado Juiz, pois quando a lei confere ao magistrado um certo poder, igualmente o incumbe do dever de desempenhar esse poder adequadamente, nada havendo que mesmo de longe se assemelhe a uma "faculdade" a ser exercida ou não.

O conhecido e justificado ‘livre convencimento do juiz’ não lhe confere a liberdade irrestrita de, conforme seu humor em relação às partes ou a seus patronos, conceder-lhes ou não o que a lei lhes atribui. Como se interpreta das referências contidas em linhas pretéritas, essa liberdade está restrita, no caso em espécie, à análise da existência ou não das condicionantes conhecidas como perigo da demora e adequação do fato à lei. O outro raciocínio, isto é, a liberdade de análise subjetiva do juiz, submeter-nos-ía à ditadura do judiciário.

Dessas análises, exsurge a evidência de que o efeito suspensivo nos Agravos de Instrumento contra decisões judiciárias negativas, deve receber o ‘plus’ da força ativa, pela qual o relator, além de suspender a eficácia da decisão denegatória, atende ao pleito antecipatório posto no juízo de primeiro grau, uma vez que a interpretação do novo texto do artigo 558 do CPC deve buscar sua finalidade real, isto é, tornar desnecessário o uso do Mandado de Segurança com a dimensão vulgarizada que lhe deu a jurisprudência na concessão do efeito suspensivo e no provimento que a decisão recorrida havia negado.

Exemplos da utilidade da interpretação legal aqui delineada surgem nos casos de negativas de liminar ou de antecipação de tutela que busquem alcançar inexigibilidade de encargos tributários e reintegração ou manutenção de posse, com irreparáveis prejuízos à parte, embora fosse seu direito o não pagamento do tributo cobrado ou a obtenção possessória.

A adequação interpretativa ora sugerida tem suporte na inteligência de Nelson Nery que ao comentar o artigo 558 do CPC, à página 802 de seu CPC Comentado, ed/RT , 3ª edição, destaca: "Caso a decisão impugnada seja de conteúdo negativo, como por exemplo, o indeferimento de medida liminar, o relator pode conceder, liminar e provisoriamente, a medida pleiteada como mérito do recurso, atuando, neste caso como juiz preparador do recurso. "

A jurisprudência segue na linha do pensamento aqui defendido, tanto que o STJ, ao julgar o RMS 8516-RS, conforme decisão publicada no DJU de 08.09.97 já citado, registrou "II - Ainda que a decisão interlocutória seja de conteúdo negativo, a via adequada para impugná-la é o recurso de Agravo de Instrumento, ao qual pode ser conferido o denominado ‘efeito suspensivo ativo’. Interpretação teleológica do ‘novo’ art. 55 do CPC."

O Tribunal de Justiça de Pernambuco também vem adotando, pela grande maioria de seus membros, o mesmo entendimento no sentido de que, face às decisões de cunho negativo, o Relator, estando presentes os requisitos básicos do fumus boni iuris e do periculum in mora, pode acatar o pedido formulado pelo Agravante e que restou inacolhido pelo juiz de primeiro grau. É o que se vê no despacho proferido pelo ilustre Desembargador MÁRCIO XAVIER, nos autos do Agravo de Instrumento nr. 008. 0049565-4, publicado no Diário da Justiça de 14.4.99, quando teve oportunidade, como Relator, de tecer as seguintes considerações

"Devo considerar, por fim, que no meu entendimento, o óbice maior que se poderia antepor à aplicação, in casu, da disposição contida na parte final do art. 558 do Código de Processo Civil, seria o argumento de que, sendo de conteúdo negativo, como efetivamente o é, a parte da decisão que constitui o alvo de ataque deste agravo, estaria ela imune de ser atingida pelo efeito suspensivo, e que, neste caso, a obtenção da providência perseguida somente poderia ser alcançada através de liminar em mandado de segurança.

A questão, porém, já foi solucionada pela 2ª Turma do Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no julgamento do ROMS nº 5854-PE, em que foi Relator o eminente Min. ADHHEMAR MACIEL, que, em decisão unânime, publicada no DJ de 10.03.97, à pág. 5940, firmou o seguinte entendimento: "EMENTA: ..... atualmente, contra a decisão monocrática que denega liminar em outro writ, cabe tão somente recurso de agravo, e não outra ação de mandado de segurança. Hoje, não há mais que se falar em writ para conferir efeito suspensivo a recurso, nem em mandado de segurança como sucedâneo de recurso sem efeito suspensivo. Em suma, o mandado de segurança voltou ao seu eito natural, deixando de ser a panacéia de outrora". No mesmo sentido: ROMS 1857-SP, ROMS 5810-PB, RMOS4715-PR. Ainda mais incisivo é o seguinte trecho do aresto, também da lavra do eminente Min. ADHEMAR MACIEL, no ROMS nº8516RS, publicado no DJ de 04.08.97:

"Ainda que a decisão interlocutória seja de conteúdo negativo, a via adequada para impugná-la é o recurso de agravo de instrumento, ao qual pode ser conferido o denominado efeito ´suspensivo ativo´. Interpretação teleológica do ´novo´ art. 558 do CPC. Precedentes dos Tribunais Regionais Federais".

Presentes, pois, os requisitos exigidos, DEFIRO o pedido liminar de atribuição do efeito suspensivo ativo (ou substitutivo), formulado pela agravante, para estender a tutela antecipada, também, aos seus créditos oriundos das operações com álcool combustível". Não vejo nenhuma razão para modificar o meu entendimento já esposado no agravo anterior. Nem mesmo o aresto citado pelo Dr. Juiz prolator da decisão afrontada, e transcrito à fl. 127 destes autos, tem o condão de modificar a minha convicção a respeito da matéria Suspendo, pois, os efeitos da decisão recorrida, restaurando o status quo ante, até o pronunciamento final da 4ª Câmara Cível. "

Nessa mesma linha de raciocínio, e com um enfoque muito bem fundamentado a respeito dos requisitos para a concessão do efeito ativo, tem-se manifestado o culto Desembargador JONES FIGUEIREDO ALVES, também integrante do Tribunal de Pernambuco, como se pode verificar através do despacho proferido nos autos do Agravo de Instrumento nr 0051767-9, publicado no DJ de 12.6.99, em que figurou como Agravante uma empresa arrendatária em contrato de leasing com uma instituição financeira:

"A agravante pede a atribuição de efeito ativo ao presente agravo, ante ao conteúdo negativo da interlocutória guerreada.

Passo a analisar o pedido de atribuição de efeito ativo requerido.

No caso em tela, em se tratando de uma decisão monocrática de cunho negativo, no momento em que se defere a suspensividade da decisão agravada, autoriza-se, por outra face, a substituição desta lacuna por uma outra decisão, dotada de efeito ativo, em sentido e direção opostos a atacada pelo recurso. A doutrina pátria dominante entende perfeitamente viável a concessão da tutela antecipada, pleiteada em sede de recurso, pelo juízo ad quem, com a conseqüente atribuição do efeito ativo, quando urgente for a matéria em discussão, em face do caráter negativo da decisão vergastada.

Tenha-se presente, nesse alcance, o seguinte comentário, analisando a matéria sob o enfoque da novel redação dos dispositivos processuais civis:

"O relator, investido dos poderes de juiz preparador do recurso, pode, igualmente, antecipar a tutela pretendida como objeto do recurso. É o que correntemente se denomina ‘efeito ativo’ do recurso. Isso pode ocorrer quando a matéria for urgente, o que se verifica, por exemplo, quando a decisão impugnada for de caráter negativo: o juiz nega liminar e a parte agrava de instrumento; ao despachar o agravo o relator pode conceder a liminar, que produzirá efeitos desde logo, em decisão que deverá ser referendada, oportunamente, pelo órgão colegiado. Com isso, evita-se a impetração de MS ou o ajuizamento de ação cautelar, com dispêndio de tempo, dinheiro e atividade jurisdicional. Como o relator, na condição de juiz preparador do recurso, tem amplos poderes, a ele se estende igualmente o poder de antecipar a tutela recursal (...)". (in Código de Processo Civil Comentado, Ed. Revista dos Tribunais, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, 4ª ed., 1999, pg. 1073). (grifo nosso)

Demais disso, ao menos em uma visão apriorística, em aplicação analógica à regra legal contida no artigo 558 do CPC, entendo justo o pleito da agravante em ver deferida a pretendida antecipação dos efeitos da tutela antecipatória, pois vislumbro a ocorrência dos dois pressupostos capazes de dar ensejo à atribuição do efeito ativo ao presente agravo de instrumento.

Senão vejamos:

O instituto da tutela antecipada tem, dentre os pressupostos basilares de sua concessão, a verossimilhança dos fatos alegados e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Na hipótese vertente, faz-se mister perquirir a melhor interpretação dos alcances da concessão antecipatória e de seus efeitos : de um lado, a antecipação total dos efeitos da tutela meritória consiste na realização forçada do direito que o autor pretende ver realizado; face outra, a antecipação parcial nada mais é do que o acelerar o efeito executivo com vistas à realização de determinada parcela do direito afirmado, tratando-se, por conseguinte, da produção imediata de um efeito para uma finalidade parcial, como aqui ocorre.

É preciso observar que a conseqüência inteligível decorrente da procedência do pedido de revisão de contrato de arrendamento mercantil, objeto principal da ação ordinária em curso na instância inferior, é, entre outras coisas, a impreterível necessidade da emissão de novos boletos de pagamento, logicamente com os devidos ajustes baseados nos índices correcionais determinados na sentença.

Destarte, torna-se visível e insofismável que o pedido feito pela ora agravante, em sede de liminar, está visceralmente atrelado, ou melhor, encontra-se inserido no próprio pedido principal de revisão contratual, enaltecendo-se daí a plausibilidade do direito.

De mais a mais, é de ser relevado, ainda, que a denominada imprevisibilidade do aumento exacerbado do câmbio no mercado brasileiro não se constituiria em requisito essencial à aplicação do CDC e à conseqüente revisão dos mencionados contratos. Deveras, a regra inserta no art. 6º, V, da Lei nº 8.078/90 não exige que o fato superveniente, que der ensejo à onerosidade excessiva, seja imprevisível ou mesmo irresistível. A bem da verdade, a norma se faz aplicável, de modo cogente, pela simples ocorrência de fato superveniente que quebre o equilíbrio econômico do contrato, tornando excessivamente onerosa a prestação imposta ao consumidor.

Por outro lado, a hipótese em apreço traz em si mesma uma equação simples de ser resolvida, eis que, em não se emprestando efeito ativo ao presente, o resultado seria, inevitavelmente, mais danoso ao arrendatário do que à empresa de leasing. Com efeito, o periculum in mora milita em favor daquele último, haja vista que a eventual concretização da ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação dar-se-ia, certamente, de modo mais gravoso, para o arrendatário. De fato, essa situação fatalmente conduziria ao inadimplemento contratual, conseqüente constituição em mora e subseqüentes efeitos danosos à reputação financeira e honorabilidade da ora agravada, além da possível rescisão contratual e inclusive a provável perda da posse do bem arrendado.

Deste modo, em presente exame provisório e circunscrito à possibilidade de concessão de efeito ativo ao recurso ora interposto, entendo que deve ser modificada a decisão do MM juiz monocrático indeferitória da antecipação da tutela meritória, visto que a agravante cuidou de exaltar os requisitos a demonstrar, plausibilidade do direito e lesão grave e de difícil reparação, de modo a autorizar a antecipação dos efeitos da tutela de mérito.

Posto isto, DEFIRO o pedido de efeito ativo liminar requerido, em aplicabilidade analógica à regra legal contida no art. 558, CPC, para determinar a emissão, pela financeira agravada, dos boletos bancários referentes ao meses de fevereiro, março e subseqüentes do ano em curso, ficando autorizada a parte agravante, caso não expedidos os respectivos boletos, a fazer o correspondente depósito em juízo das parcelas devidas, tendo por referência o valor do dólar do dia do último pagamento, realizado em dezembro de 1998, sobre o qual deverá incidir o índice de variação do INPC. "

Outro ilustre integrante do Tribunal de Justiça de Pernambuco, o douto Desembargador HÉLIO SIQUEIRA CAMPOS, defensor confesso da tese da não concessão do efeito suspensivo a Agravo de Instrumento contra decisão negativa, resolveu excepcionar, para acatar o entendimento majoritário, conforme se pode verificar pela decisão publicada no DJ de 14.4.99, referente ao Agravo nr. 009. 0049273-1, também interposto a respeito de mudança cambial de contrato de leasing:

"Cumpre explicitar, preambularmente, que, enfaticamente venho, de há muito, decidindo e defendendo que, em sede de Agravo na forma instrumentalizada, é vedado ao Julgador do 2º Grau imprimir eficácia suspensiva a ato jurisdicional negativo.

"Id est" não deve, na hipótese, substituir a Instância de Reiteração jurisdicional uma Decisão negada na Instância "a quo", por outra positiva na Instância de Superposição, para não causar mossa ao princípio do Juiz Natural, subtraindo-lhe a possibilidade do Juízo de Retratabilidade.

3 - Reconheci e reconheço nas decisões pretéritas que este entendimento sofre exceção, acaso deflua a flagrante ilegalidade ou dano de difícil reparabilidade do ato atacado.

4 - Visualizo, na espécie, a lesão grave, bem assim a relevância dos fundamentos capazes de emprestar o efeito suspensivo desejado. Entendo, que há a configuração do "fumus boni iuris", com a possibilidade da modificação dos termos contratuais claramente abusivos. Vislumbro outrossim, o "periculum in mora", pois a não revisão das parcelas futuras poderá trazer a parte contratante graves prejuízos de difícil reparabilidade, porque com a atual modificação da política cambial do Governo Federal, alterando de maneira abrupta a taxa cambial e elevando de maneira vertiginosa, a indexação da moeda estrangeira, acarreta em caso tais, enriquecimento ilícito por parte da instituição financeira, em total detrimento do consumidor, parte mais fraca em situações como estas, ficando responsável por este ônus extremamente gravoso e indevido."

Ainda a respeito do efeito ativo, oportunas são as observações de LUIZ CARLOS NEMETZ:

"Negar a aplicabilidade do efeito suspensivo aos agravos interpostos contra decisões denegatórias de liminares é negar a finalidade da Lei nr. 9.139/95.

Não se trata - portanto - de reparar a decisão atacada.

Este reparo - se for o caso - somente poderá ocorrer no julgamento definitivo do recurso de agravo. Trata-se, sim, de se deferir um socorro, nos limites excepcionais do art. 558 do CPC, quando esta tutela emergencial foi ilegal ou ilegitimamente negada aquele que tinha o direito de recebê-la.

............

Negar a aplicabilidade do efeito suspensivo aos agravos interpostos contra decisões denegatórias de liminares é negar à parte o devido processo legal (na proporção em que nega o art. 558 do CPC de modo a querer dizer o que ele não disse).

É restringir o magistrado da prerrogativa de uso do seu poder geral de cautela.

Sem falar na quebra do princípio constitucional da isonomia, onde aquele que obtém a liminar recebe um tratamento juridiscional diverso daquele que não a obtém; e também no retrocesso, na volta ao passado, na manutenção de um estado de antagonismo jurisprudencial que não interessa a ninguém: nem ao Estado, nem aos jurisdicionados."

Um outro aspecto relacionado com o tema, a merecer nossa reflexão, é o que diz respeito à alternativa que resta àquele que não pode dispor de imediata decisão do Relator do Agravo de Instrumento para obter um provimento "ativo" ou "substitutivo" que repare o prejuízo sofrido ou que esteja na iminência de vir a ser imposto, face a uma decisão interlocutória de cunho negativo. Nesse caso, parte da doutrina, hoje minoritária, propõe a utilização do Mandado de Segurança ou de Medida Cautelar.

O jovem procurador do Estado e advogado pernambucano LEONARDO JOSÉ CARNEIRO DA CUNHA abordou com muita propriedade esse aspecto da discussão:

"A utilização de mandados de segurança, medidas cautelares ou quaisquer outros incidentes que visem à consecução da prestação jurisdicional indeferida pela decisão agravada afigura-se desaconselhável, quando o pretendido efeito pode ser obtido nos próprios autos do recurso.

Desse modo, tornar-se-ia viável o objetivo da reforma, manifestamente voltado à eliminação do uso do writ contra atos judiciais, não o reduzindo à inutilidade.

Afora essas circunstâncias, o entendimento segundo o qual não seria possível a aplicação do art. 558 do CPC, quando se tratar de decisão indeferitória, conduziria à eliminação do princípio da unirrecorribilidade ou da taxatividade dos recursos.

Isso porque teria no conteúdo da decisão o critério para a definição do recurso cabível. Significa que, a prevalecer aquele entendimento, o meio de impugnação contra as decisões interlocutórias deveria variar de acordo com o seu conteúdo. Se revestir feição positiva ou concessiva, seria cabível o agravo de instrumento com efeito suspensivo. Do contrário, ou seja, se ostentar cunho negativo ou denegatório, caberia o uso de mandado de segurança ou de medida cautelar junto ao respectivo tribunal.

.........

É forçoso admitir que, se poderá o relator negar seguimento ao agravo por verificar ser manifestamente improcedente, antecipando a provável decisão que seria exarada pelo colegiado, nada impede que reforme, desde já, o ato judicial agravado, antecipando, de igual forma, a provável decisão a ser proferida pelos seus pares."(em POSSIBILIDADE DE SER CONCEDIDO EFEITO SUSPENSIVO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, Revista da Esmape - Recife, vol. 3, nr. 7, ps. 506-508)

Importa salientar, finalmente, que, em sendo dado cumprimento à decisão agravada, determinando a continuação da Execução, com a citação do Devedor (se esta não tiver ocorrido) e a efetivação da penhora, haverá casos de ocorrência de danos de difícil reparação, como se dá, v.g., na constrição de bens no mais das vezes essenciais à manutenção das atividades produtivas de algumas empresas; isto, além de sujeitar o executado a todo tipo de restrição creditícia e cadastral, obrigando-o a realizar despesas incontornáveis para a consecução de sua defesa. Como assinala o juiz RENATO VASCONCELOS MAGALHÃES:

"Não há olvidar que o próprio fato de ter que se defender na esfera judicial já constitui em si um ônus e, às vezes, propiciador de lesões de caráter irreparável. Quando se trata, então, do processo de execução, da forma que se encontra codificado, a lesão é concreta e real, se se imaginar que a única forma de se defender requer uma disponibilidade patrimonial posta à mercê do Estado." (ob. citada)

Daí porque, havendo demonstrado a relevância do pedido e os pressupostos do fumus boni iuris, do periculum in mora, e a não ocorrência do periculum in mora inverso, que levam à certeza de que a principal conseqüência do cumprimento do despacho agravado significará a verificação de danos e prejuízos financeiros irreparáveis ou de difícil reparação, o que poderá resultar na ineficácia da providência consubstanciada no acolhimento do recurso, a final, sugere-se que o Executado, na conclusão de sua petição recursal, peça ao Relator que, antecipando os efeitos da tutela pretendida, conceda liminar acolhendo a Objeção, ou determine a sustação da decisão agravada, com especial fundamento nos artigos 273, 527, II, e 558, caput, do CPC, continuando suspensa a Execução, até decisão final do Agravo.

Acentue-se, finalmente, que, uma vez dispondo sobre a matéria veiculada na exceção, não estará o Tribunal ad quem suprimindo grau de jurisdição, porquanto, se o juiz a quo negou ou deixou de acolher o pedido, implica em considerar ter conhecido a objeção de pré-executividade, havendo, todavia, negado o seu deferimento. Nesse sentido o entendimento de ALBERTO CAMIÑA MOREIRA: "Se a exceção foi conhecida mas teve seu conteúdo indeferido, o tribunal pode prover sobre a defesa articulada e extinguir o processo de execução". (in op. cit., p. 187).

Deve, então o Agravante, pedir que Recurso de Agravo venha a ser provido, para o fim de reformar a decisão agravada, acolhendo a objeção de pré-executividade e decretando a extinção do processo de execução, por nulidade do título (art. 618,I, do CPC) - geralmente a hipótese mais comum, mas não a única -, condenando-se o Exequente nos ônus da sucumbência, inclusive honorários advocatícios na base de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.

Por último, recomenda-se que o Agravante, em caráter sucessivo alternativo, peça que, se o Tribunal entender que o inacolhimento da Exceção pelo juiz não significou o indeferimento do conteúdo do pedido ou a apreciação de seu mérito, deve, então, tornar sem efeito a r. decisão agravada, determinando-se que o juízo de primeiro grau prolate nova decisão apreciando as questões de fundo suscitadas em caráter de pré-executividade.


IV - DEFESAS TÍPICAS DOS EMBARGOS

Ultrapassada a fase de realização da penhora, e uma vez dela intimado regularmente, o Devedor ingressa com a Ação de Embargos, cabendo-lhe adotar duas linhas básicas de alegações: a primeira, tratando das questões preliminares e prejudiciais, e a segunda envolvendo as matérias de mérito ou de fundo.

Esta é a ocasião adequada que tem o Devedor para oferecer ou renovar todo o arsenal de alegações que dispõe, a respeito dos temas que possam conduzir à extinção do processo de Execução. É o caso, por exemplo, de suscitar a ilegitimidade e/ou falta de interesse de agir do Autor; a falta de título líquido, certo e exigível, etc. (Não custa lembrar que a prescrição da dívida é tida como matéria de mérito, não devendo, portanto, ser colocada como preliminar ou questão prejudicial.)

Ainda dentre as alegações prejudiciais afrontando propriamente o título que tiver aparelhado a Execução, assiste ao Devedor, em fase antecedente ao exame de mérito, suscitar inúmeras questões, dentre as quais se destacam as que dizem respeito à falta de observância dos pressupostos de constituição válida e regular do processo.

Quanto às questões que tenham sido postas em eventual objeção de pré-executividade, a sua reiteração é não só recomendável, como, sobretudo, imprescindível, sob pena de preclusão, já que, em sede de Embargos, deve o Executado se reportar a tudo o que lhe cabe alegar, por força do que dispõe o art. 741 do CPC.

Dadas as evidentes limitações deste trabalho, e bem assim atendendo aos objetivos a que se propõe, descabe aqui a pretensão de esgotar o exame a respeito de todas as exceções e questões preliminares e prejudiciais que podem ser apresentadas pelo Executado quando da apresentação dos Embargos. Consideramos, todavia, oportuno alinhavar alguns comentários a respeito de certos temas que, eventualmente, possam despertar algum interesse.

a) ILEGITIMIDADE PARA A CAUSA DE DEVEDOR COOBRIGADO

Uma das questões prejudiciais que podem ser colocadas nos Embargos, como matéria antecedente ao exame de mérito, diz respeito à preliminar de ilegitimidade para a causa relativamente à pessoa que, figurando no processo como litisconsorte necessário, participou na condição de garantidor em contrato cujo inadimplemento tenha autorizado o Credor a cobrar o débito exeqüendo.

O fundamento dessa alegação de ilegitimidade residirá no fato de que, havendo o Credor ajuizado a Execução contra o Devedor principal e os seus avalistas e/ou coobrigados, a Ação poderá ser tida como proposta contra todos aqueles que, em tese e aparentemente, seriam solidariamente obrigados nas relações jurídicas subjacentes; dessa forma, entende-se que o Credor Exequente teria renunciado tacitamente a essa solidariedade (Código Civil, art. 912, caput).

Em decorrência dessa renúncia à solidariedade entre devedor principal e avalistas, o pagamento do débito, em princípio, passou, ipso jure, a somente poder ser exigido do Devedor Principal.

Trata-se de inequívoca renúncia tácita, a respeito da qual escreveu LACERDA DE ALMEIDA:

"Parág. 11º. - Como cessa a solidariedade

Cessa a solidariedade:

A) PELA RENÚNCIA DO CREDOR. O credor assim como pode perdoar no todo ou em parte a dívida, pode remitir a solidariedade a favor de todos os devedores ou de alguns deles.

Remitida a solidariedade a favor de todos os devedores, torna a obrigação a seu caráter genérico de simplesmente conjuntiva; mas a renúncia em favor de algum dos devedores não altera a natureza da dívida em Relação aos demais.

"Como liberalidade, que é, a renúncia não se presume, deve ser expressa ou resultar ao menos de fatos inequívocos que denunciem da parte do credor a intenção de renunciar.

Assim, por exemplo, em chamar coletivamente a juízo todos os devedores tem o credor implicitamente renunciado à solidariedade em beneficio de todos; que outra coisa se não pode inferir da propositura da ação por tal maneira." (in "Obrigações", Tipografia de César Reinhardt, Porto Alegre, 1897, parág. 11, pág. 51).

Nessa mesma linha é a lição de MANOEL IGNÁCIO CARVALHO DE MENDONÇA, que, inclusive, observa ser essa a "doutrina geralmente aceita":

"O credor pode renunciar a solidariedade em favor de um ou de alguns, ou de todos os devedores.

Se o credor renunciar a solidariedade em proveito de um ou de alguns dos devedores, só poderá demandar os outros com a dedução da parte correspondente aos remidos da solidariedade.

A renúncia pode ser expressa ou tácita. Quando feita em favor de um ou de alguns é relativa; em favor de todos é absoluta.

Os casos de renúncia tácita não devem ser previstos por lei; é uma questão de interpretação da vontade.

Embora, porém, a renúncia de direitos deva ser sempre restritamente interpretada, a natureza da solidariedade é tal que, ocorridos certos fatos ou praticados certos atos do credor, não se pode evitar interpretar que ele desistiu de seu direito de haver a prestação por inteiro: em uma palavra, que renunciou a solidariedade.

Daí entendermos com a doutrina geralmente aceita que a renúncia tácita se verifica: a) pelo recebimento da parte da dívida, sem reserva da solidariedade; b) pela propositura da ação e condenação de um dos devedores pela parte deste na dívida. a ação proposta coletivamente contra todos os devedores é uma renúncia da solidariedade em favor de todos" (em "Doutrina e Prática das Obrigações", 3a. ed. tomo I, Livraria Freitas Bastos, 1938, pág. 326. Grifos dos Embargantes).

O efeito inseparável da renúncia é a extinção do direito que lhe seja objeto.

Essa precisamente a lição ofertada pelo eminente e saudoso civilista pernambucano, o Prof. JOSÉ PAULO CAVALCANTI - cujos ensinamentos correspondem, literalmente e na íntegra, à argumentação ora desenvolvida - a respeito do instituto da renúncia:

"1. definição - A renúncia é o ato ou negócio jurídico dispositivo pelo qual o titular de um direito extingue esse direito. É o ato pelo qual o sujeito - à semelhança do suicida, com Relação à vida animal - voluntariamente acaba com seu direito.

Pode-se dizer, por conseqüência, que o oposto da renúncia é o protesto pelo qual se declara querer conservar um direito. Ato de eliminação deliberada do próprio direito, a renúncia é produtiva apenas desse efeito eliminativo. Quaisquer outros efeitos são estranhos ao negócio renunciativo." (em "Da Renúncia no Direito Civil", Revista Forense, 1958, págs. 11/15).

Nestas condições, ao ajuizar a Execução contra o Devedor Principal e, conjuntamente, contra os "avalistas e coobrigados", neste preciso instante o Credor teria renunciado a qualquer direito ou pretensão que tivesse contra os mesmos avalistas e/ou coobrigados.

E a irrevogabilidade da renúncia é acentuada pelo próprio JOSÉ PAULO CAVALCANTI:

"18. Eficácia e irrevogabilidade. A renúncia, quando negócio unilateral não-receptício, se consuma e é irrevogável de si mesma, desde a emissão; quando negócio unilateral receptício, desde a recepção." (in op. cit. pág. 150)

Por negócio receptício entende-se aquele cuja eficácia depende de que tenha chegado ao conhecimento de determinado sujeito; e por negócio não-receptício entende-se aquele cuja eficácia não depende de que tenha chegado ao conhecimento de nenhum destinatário.

Como expõe ORLANDO GOMES:

"Há negócios jurídicos cuja declaração de vontade tem de se tornar conhecida do destinatário enquanto outros dispensam esse conhecimento. Daí, a distinção feita por SITTELMANN e hoje incorporada à técnica jurídica entre declarações receptícias e declarações não receptícias, preferindo SANTORO PASSARELLI denominá-las, respectivamente, declarações endereçadas e não endereçadas. As primeiras só se tornam eficazes quando a declaração é recebida por aqueles aos quais se dirige. Se alguém pretende despedir um empregado, a despedida só se efetiva quando este vem a ter conhecimento, real ou presumido, da declaração do empregador. O efeito das segundas produz-se independentemente da recepção. Certo é que também estas se dirigem a outra pessoa, projetando-se em sua esfera jurídica. Do contrário, não seriam declarações de vontade, pois lhes faltaria aquele propósito notificatório que as distingue das simples atuações da vontade, mas a pessoa a quem interessam não precisa ter conhecimento do ato em que se inserem, que vale independentemente de comunicação." (em "Introdução do Direito Civil", 6a. ed. Forense, 1979, nr. 215, pág. 318).

Em caso como o que ora se coloca, a renúncia do Credor Exequente teria sido não-receptícia (ou seja, não era necessário para sua eficácia que fosse conhecida pelos Devedores) e, portanto, teria se consumado com o simples ajuizamento - equivalente ao propósito notificatório – da petição inicial da execução coletiva; quando, entretanto, fosse receptícia, se teria consumado a partir da citação dos Devedores.

Há que se pleitear, nos Embargos opostos face a uma execução coletiva, que, por força da renúncia tácita à solidariedade entre os devedores, o Executado na condição de avalistas e/ou coobrigados seja considerado como parte ilegítima para a causa, com amparo no artigo 912, caput, do Código Civil, devendo, então, ser o processo extinto, com fundamento no artigo 267, VI, do CPC,

b) NOTA PROMISSÓRIA EMITIDA PRO-SOLVENDO

Dentre os ataques à falta de título líquido, certo e exigível, vale examinar a hipótese de a execução ser fundada apenas em uma nota promissória vinculada a contrato, como no caso de ter sido emitida para garantia de um empréstimo.

Filiamo-nos à corrente que entende que, nesse caso, o título se ressente de autonomia, posto se vincular a um negócio jurídico subjacente. Em outras palavras: havendo sido (a nota promissória) emitida em garantia de um débito, não tem o referido título caráter pro-soluto, mas pro-solvendo, carecendo, portanto, de condições de exigibilidade e de executoriedade.

Por sua inteira pertinência ao caso versado, merece transcrição a ementa do Acórdão de lavra do eminente Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, no julgamento d 4ª Turma do E. STJ, realizado no dia 09.06.98, publicada no Diário da Justiça de 21.9.98, nos seguintes termos:

"PROCESSUAL CIVIL. PROCESSO DE EXECUÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO. NOTA PROMISSÓRIA A ELE VINCULADA. DESPROPORÇÃO ENTRE OS VALORES DOS TÍTULOS E O EXECUTADO. ILIQUIDEZ. INEXISTÊNCIA, EM REGIME DE ELEVADA INFLAÇÃO, DE DEMONSTRATIVO DE EVOLUÇÃO DA DÍVIDA. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE DE INSTAURAÇÃO DENTRO DA EXECUÇÃO. VALORES QUE DEVEM CONSTAR DA INICIAL. RECURSO PROVIDO.

I - Existindo grande desproporção entre os valores constantes dos títulos exequendos e o constante da inicial da execução, deve o credor demonstrar a evolução da dívida, inclusive para permitir a defesa por parte do devedor, sob pena de ser considerado ilíquido o título executivo.

II - A nota promissória atrelada ao contrato de mútuo perde sua característica de autonomia, em razão da própria iliquidez do título que lhe serviu de sustentação.

III - O processo de execução tem por pressuposto um título líquido, certo e exigível, sendo imprescindível que os valores exequendos guardem consonância com a dívida."

Ante a caracterização de que a Nota Promissória é um título sem autonomia e vinculado a um negócio jurídico subjacente, não possuindo, portanto, as características de exigibilidade ou de executoriedade, pede-se ao juiz reconheça que esse título não preenche os requisitos necessários a se considerar como título executivo.

Por oportunas, merecem transcrição as lições dos comercialistas, dentre os quais JOÃO EUNÁPIO BORGES , que ressalva:

"Mas, se o título de crédito é, apenas, um meio, um instrumento da mobilização e da circulação do direito derivante de determinado negócio ou Relação - compra e venda, empréstimo ou qualquer outra - em Relação aos contratantes imediatos (por não estar em jogo o interesse da circulação), (...)

isto é, entre partes originárias, tudo continua (apesar da emissão do título), disciplinado pela Relação contratual na qual o título se insere; sendo este, nas mãos do tomador, não propriamente um título de crédito, mas simples documento de legitimação incapaz de atribuir-lhe qualquer direito diverso do que resulta da Relação subjacente.

Assim, entre partes imediatas, o contrato exerce a plenitude de sua eficácia, seja o fim de excluir qualquer obrigação do emitente do título, seja para o de demonstrar uma diversa consistência ou modalidade de obrigação, seja para o fim de impedir exercício do direito cartular por motivo de inadimplemento da outra parte."

E cita TÚLIO ASCARELLI, para quem, da própria abstração do negócio, isto é, da sua separação da causa, se impõe, em relação ao título "de um lado, a sua distinção de uma Relação fundamental, e, de outro, a necessidade de determinar a sua conexão com essa Relação fundamental. Assim, realizo uma compra ou obtenho um empréstimo (negócio fundamental): assino, por isso, uma cambial que posso entregar ao credor pro soluto ou pro solvendo, como pagamento, como garantia, reforço e assim por diante, presumindo-se sempre correlativamente, salvo inequívoca estipulação em contrário, que o título tenha sido dado pro solvendo e não pro soluto e que, por isso, a entrega da cambial não extingue a ação derivada da Relação fundamental, decorrendo tal conclusão do princípio de que a novação não pode ser presumida e que, portanto, normalmente, a cambial é entregue para reforçar a posição do credor e não com eficácia novadora" (TÚLIO ASCARELLI, Títulos de Crédito págs. 119 e 121 e nota 1 à pág. 119)

(em "Títulos de Crédito", Forense, 1971, págs. 143 e 144)

Demonstra-se, então, que o Exequente teria se valido de um procedimento inadequado e que não correspondeu a natureza da causa, ou, em sucessivo, determinante da falta de pressuposto de constituição válido e regular do processo, devendo, assim, a petição inicial ser indeferida e extinto o processo sem julgamento do mérito, de acordo com os artigos 295, V, e 267, I e II, do CPC.

c) A FALTA DE EXECUTIVIDADE DOS CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO

Antes da vigência da Lei 8.953/94 – quando se exigia, na redação do inciso II do artigo 585 do CPC, que do documento constasse a obrigação de pagar quantia determinada -, era duvidoso se gozavam ou não da presunção de título executivo líquido e certo, os contratos de abertura de crédito. Inobstante, a divergência a respeito da exigibilidade de tais contratos continua existindo, especialmente no STJ.

O cerne da discussão consiste na admissibilidade de apresentação de extratos referentes à movimentação da conta corrente como suficientes para conferir executividade ao contrato com base no qual, havendo utilizado o crédito, o correntista se tornou inadimplente, através de um débito que, ao final, não teria sido pago.

Na jurisprudência tem prevalecido o entendimento de que os contratos de abertura de crédito não se prestam para aparelhar ações de execução, por lhes faltar o requisito da liquidez e da certeza do débito.

Inicialmente, vale trazer à colação julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

"Comprovado o preenchimento abusivo do título, sendo ilíquidos e incertos os valores lançados em conta corrente e preenchida a nota por saldo incoincidente com sua data de emissão, achados valores em primeiro grau, sem irresignação do exequente, descaracterizado está o título executivo, descabendo sua execução – Ausência de liquidez e certeza do título vencido vinculado à conta corrente. Lançamento de verbas impugnadas e não justificadas e de juros inexplicados. Prerrogativa apenas da Fazenda Pública de criar unilateralmente títulos executivos". (TARS – Ac. 195.151.915 – 4ª C – Rel. Juiz Moacir Leopoldo Haeser – j. em 30.11.95).

E a 3ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, vem reiteradamente decidindo nessa linha. No julgamento do RESP nr. 165112/RS realizado em 08.09.98, publicado no DJ de 09.11.98, sendo relator o Ministro BARROS MONTEIRO, a decisão unânime da Turma mereceu a seguinte EMENTA:

"EXECUÇÃO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. ILIQUIDEZ. Não satisfaz o requisito da liquidez o contrato de abertura de crédito que se faz acompanhar de extrato que não esclarece suficientemente a evolução do débito."

Também no julgamento do RESP 159804/SP, realizado em 04.08.98, publicado no DJ de 21.09.98, sendo Relator o Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, a Turma, por unanimidade, decidiu:

"Ação de execução. Contrato de abertura de crédito em conta corrente acompanhado de extratos bancários. Inexistência de título executivo. Precedentes da Corte.

  1. Conforme jurisprudência atual da 3ª Turma, o contrato de abertura de crédito, mesmo que acompanhado de extrato bancário, não é título executivo, haja vista que o contrato não consubstancia obrigação de pagar importância certa e determinada e os extratos são produzidos unilateralmente, sem a intervenção do possível devedor.

  2. Recurso especial conhecido e provido."

Nesse mesmo sentido, outras Ementas de Acórdãos emanados da mesma E. 3ª Turma do STJ:

"Contrato de abertura de crédito. Limitando-se a ensejar a utilização de determinada quantia não consubstanciada a obrigação de pagar quantia determinada, inexistindo correspondência com o modelo previsto no art. 585, II, do CPC. Impossibilidade de o título completar-se com extratos fornecidos pelo próprio credor que são documentos unilaterais, Não é dado às Instituições de crédito criar seus próprios títulos executivos, prerrogativa da Fazenda Pública. (Resp n. 29.597-3-RS, 3ª turma, rel. Min. Eduardo Ribeiro).

....

"Título executivo extrajudicial previsto no artigo 585, II, do CPC é o documento que contem a obrigação incondicionada de pagamento de garantia determinada (ou entrega de coisa fungível em momento certo). Os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade devem estar certos no título. A apuração dos fatos, a atribuição de responsabilidades, a exegese das cláusulas contratuais tornam necessário o processo de conhecimento e descaracterizam o documento como título executivo". (STJ – Ac. Unân. – 13.05.96 – Resp nº 71.331-SP – Rel.Min. Waldemar Zveiter).

....

"TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL - CONTRATO DE ABERTURA DE CREDITO EM CONTA CORRENTE. CONSOLIDOU-SE A JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA NO SENTIDO DE QUE O CONTRATO DE ABERTURA DE CREDITO EM CONTA CORRENTE NÃO CONSTITUI TITULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. IRRELEVÂNCIA DE NOVA REDAÇÃO DO ART. 585, II, DO CPC. RECURSO CONHECIDO PELO DISSÍDIO, MAS NÃO PROVIDO" (Recurso Especial n. 139271- RS, Relator Ministro Costa Leite –). Diário da Justiça de 09-03-98, Pág. 00091

A 4ª Turma do E. STJ também vem se pronunciando no mesmo sentido:

"PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. CONTRATO DE ABERTURA DE CREDITO. NÃO-DEMONSTRAÇÃO DA EVOLUÇÃO DA DIVIDA. TITULO EXECUTIVO. ILIQUIDEZ. IMPRESTABILIDADE DO EXTRATO APRESENTADO PELO CREDOR. RECURSO DESPROVIDO. I- O CONTRATO DE ABERTURA DE CREDITO ROTATIVO TEM A NATUREZA DE TITULO EXECUTIVO, SUFICIENTE PARA INFORMAR O PROCESSO DE EXECUÇÃO, DESDE QUE ACOMPANHADO DE EXTRATO DE MOVIMENTAÇÃO DA CONTA CORRENTE QUE PERMITA AFERIR A EVOLUÇÃO DA DIVIDA E A EXATA CORRESPONDÊNCIA COM O QUE TENHA SIDO AJUSTADO, COMO OCORRE NA HIPÓTESE SOB EXAME. II- TAL EXTRATO, CONTUDO, CUMPRE SEJA ELABORADO DE FORMA DISCRIMINADA, COM EMPREGO DE RUBRICAS ADEQUADAS (ESPECIFICAS), E DE MOLDE A ABRANGER TODO O PERÍODO TRANSCORRIDO ENTRE A DATA DA CELEBRAÇÃO DO AJUSTE E A DO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO, POSSIBILITANDO, ASSIM, A AFERIÇÃO DA SUA EXATA CORRESPONDENCIA COM O QUE PACTUADO E PERMITINDO A IMPUGNAÇÃO, EM SEDE DE EMBARGOS DO DEVEDOR, DOS LANÇAMENTOS EFETUADOS DE MODO ABUSIVO, EM DESCOMPASSO COM AS ESTIPULAÇÕES CONTRATUAIS". (Recurso Especial n. 66.181-PR e 89.770-RS, Rel. Ministro Sálvio Figueiredo Teixeira, DJ de 24/11/1997, pág. 61.234)

"EXECUÇÃO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. ILIQUIDEZ. Não satisfaz o requisito da liquidez o contrato de abertura de crédito que se faz acompanhar de extrato que não esclarece a evolução do débito" (Recurso Especial nr. 165112/RS, Rel. Ministro Barros Monteiro, DJ de 09.11.98, pág. 111).

A respeito da inexequibilidade dos contratos de abertura de crédito, vale a transcrição da opinião de José Wilson Gonçalves, Juiz de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de Santos (SP), em trabalho sobre os CONTRATOS BANCÁRIOS:

"Os extratos traduzem operações unilaterais da instituição financeira; lançamentos levados a efeito exclusivamente no interesse do credor, e que não espelham meros cálculos aritméticos, mas valores complexos, à primeira vista suscetíveis de dúvida, insegurança, a impedir a execução de plano, visto que "a execução para cobrança de crédito, fundar-se-á sempre em título líquido, certo e exigível" (grifei) (CPC, art. 586, "caput").

O art. 585, inc. II, da mesma lei, por seu turno, deve ser interpretado em harmonia com o princípio insculpido no art. 586, de maneira que, mesmo diante da nova redação, dada pela Lei nº 8.953/94, que suprimiu o pressuposto "do qual conste a obrigação de pagar quantia determinada, ou de entregar coisa fungível", exige-se valor determinado no documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas para ostentar tal documento executividade; em última análise a determinação do valor deve estar condicionada unicamente a cálculos aritméticos singelos, como acontece, por exemplo, em relação ao cheque, à nota promissória etc. que represente dívida amortizada parcialmente, em que a execução se refira a saldo visivelmente perceptível.

A respeito do tema RT 734/488, a saber: "O contrato de abertura de crédito em conta corrente, ainda que acompanhado dos respectivos extratos de movimentação da conta, não é título executivo extrajudicial, sendo inviável sua execução e impossível o título completar-se com extratos unilaterais, pois não é dado às instituições de crédito criar seus próprios títulos, o que é prerrogativa da Fazenda Pública".

Diante desse quadro, torna-se o título ilíquido, devendo o débito ser submetido a acertamento prévio, por meio de processo de conhecimento, com perícia contábil a determinar o real valor exigível."


V - ALGUMAS QUESTÕES DE FUNDO, COMO MATÉRIA DE MÉRITO DOS EMBARGOS, TENDENTES A DEMONSTRAR EXCESSO DE EXECUÇÃO

V.1 - ANATOCISMO: A CAPITALIZAÇÃO INDEVIDA DOS JUROS

Continua sendo prática generalizada entre as instituições financeiras (e também entre as chamadas empresas de factoring), a cobrança capitalizada dos juros, inclusive sob expressa previsão contratual, mediante cláusulas que, via de regra, têm a seguinte redação :

"Os encargos financeiros devidos em razão deste contrato, incidirão sobre a média dos saldos devedores diários, calculados pelo método hamburguês, e serão considerados para todos os fins e efeitos legais, como parte integrante do principal da dívida."

Mesmo que se adote outra redação, e ainda que se constate que os juros não são cobrados sobre a média dos saldos devedores diários ou mensais, mas com base em outro critério, o fato é que, desde que possibilitem a incidência de uns sobre os outros, em relação a determinado período de apuração, adicionando-se e incorporando-se novos valores ao saldo devedor anterior, estarão os juros sendo cobrados de forma capitalizada.

Geralmente os próprios instrumentos contratuais e os demonstrativos de débito, anexados à Execução, não deixam dúvida sobre a ocorrência de capitalização dos juros. Em casos como tais, quando respondem aos Embargos com suas Impugnações, os Credores adotam a estratégia de tentar fundamentar tal cobrança sob as mais diversas justificativas, dentre as quais se sobressai (até por sua ingenuidade) o ultrapassado argumento de que , ante o quadro "inovador" legislativo, face as leis nrs. 4595/64 e 4728/65, a "Lei da Usura" havia se tornado obsoleta, e que a Súmula nr. 596 do E. STF permitira a capitalização.

A capitalização de juros continua disciplinada pelo art. 4º do Decreto no. 22.626/33 (Lei da Usura) que dispõe:

"É proibido contar juros dos juros; esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente ano a ano."

Esse dispositivo, consagrando a proibição da prática do anatocismo, deu origem à Súmula no. 121 do Supremo Tribunal Federal, que estipula:

"É VEDADA A CAPITALIZAÇÃO DE JUROS, AINDA QUE EXPRESSAMENTE CONVENCIONADA."

Diga-se, também, que o citado art. 4º da "Lei da Usura" continua em vigor, aplicando-se inclusive às instituições financeiras, não tendo sido revogado pela Lei nº 4.595/64, conforme assentado na jurisprudência unânime do E. Supremo Tribunal Federal e mais recentemente na do Superior Tribunal de Justiça.

A capitalização de juros somente é possível em caso de expressa previsão legal. E o caso, por exemplo, dos títulos de crédito à exportação (Lei nº 6.313, de 16.12.75), e de cédulas comercial (Lei nº 6.840, de 03.11.80), industrial (Dec.-Lei nº 413, de 09.01.69) e rural (Dec.-Lei nº 167, de 14.02.67).

Mesmo nesses casos, sua cobrança somente deve ser acatada quando tiver sido expressamente pactuada no contrato ou instrumento de financiamento. Daí porque, o entendimento do STJ, conforme se pode verificar pela EMENTA do acórdão do julgamento do Recurso Especial nr. 181.891(98/0051120-2) - RS, publicada no DJ de 01.02.99, sendo relator o Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA:

"Este Tribunal já fixou orientação no sentido de que somente nos casos expressamente autorizados por norma específica, como no mútuo rural, comercial ou industrial, é que se admite seja os juros capitalizados, e, ainda assim, desde que existente pactuação nos contratos."

Uma hipótese permitida, de juros dos juros, estipula-a o próprio art. 4º, segunda parte: "esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano".

O STJ igualmente tem decidido de forma reiterada que o anatocismo é prática vedada. Nesse sentido, temos as seguintes decisões:

"Direito privado. Juros. Anatocismo. A contagem de juros sobre juros e proibida no direito brasileiro, salvo exceção dos saldos líquidos em conta-corrente de ano a ano. Inaplicabilidade da lei da reforma bancaria (n. 4.595, de 31.12.64). Atualização da sumula n. 121 do STF. Recurso provido (REsp 2293/90-al, 3ª T, rel. Min. Cláudio Santos, publ. DJU 07/05/90, p. 3830).

"Juros. Limitação. Mutuo Bancário. Capitalização (contratos em que e permitida). - as instituições financeiras não estão submetidas, em suas operações, ao limite da taxa de juros estabelecido no dec. Lei 22.626/33. Lei 4.595/64. - a capitalização dos juros somente é permitida nos casos previstos em lei, entre eles as cédulas e notas de créditos rurais, industriais, comerciais, mas não para o contrato de mutuo bancário. Precedentes inadmitindo a capitalização dos juros no financiamento para capital de giro, no saldo em conta corrente, no contrato de abertura de credito e no cheque ouro. Honorários distribuídos de acordo com a lei. Recurso conhecido em parte, quanto a limitação dos juros, e nessa parte provido (REsp 90924-rs, 4ªt, rel. Min. Ruy Rosado, publ. DJU 26/08/96, p. 29696).

Juros. Taxa e capitalização mensal. Contrato de abertura de credito em conta-corrente. 1. Cuidando-se de operações realizadas por instituição integrante do sistema financeiro nacional, não se aplicam as disposições do dec. N. 22626/33 quanto a taxa de juros. Sumula 596-STF. 2.A capitalização mensal dos juros e vedada pelo art. 4. Do dec. N. 22626, de 1933, e dessa proibição não se acham excluídas as instituições financeiras. Recurso especial conhecido e provido, em parte (Resp 32632-rs, 4ªt, rel. Min. Barros Monteiro, publ. DJU 17/05/93, p. 9341).

Por desrespeitar a regra de ordem pública constante do art. 4º. da "Lei de Usura", os contratos celebrados com as instituições financeiras, na parte em que propiciam a cobrança capitalizada de juros, são ilegais e, portanto, nulos de pleno direito, nos termos do art. 145, V. do Código Civil.

V.2 - CORREÇÃO MONETÁRIA ou TAXA DE JUROS CUMULADA COM COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.

Embora hoje em dia tenha sofrido expressiva redução, ainda existem inúmeros contratos firmados com instituições financeiras onde se estipula a cobrança cumulativa de correção monetária com comissão de permanência, além de juros de mora e de multa.

A comissão de permanência é uma verba cobrada ilegalmente, sendo, portanto, indevida.

Nesse sentido, o Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São-Paulo, em acórdão de 13.12.89, decidiu:

"COMISSÃO DE PERMANÊNCIA E CORREÇÃO MONETÁRIA - RESOLUÇÃO BACEN 1.129/86 - ILEGALIDADE.

O diploma legal sobre a correção monetária e a regra sobre a comissão de permanência têm campos distintos de incidência e regulam matérias diversas, com objetivos inconfundíveis. A comissão de permanência visa à remuneração de operações e serviços bancários e financeiros, a correção apenas a atualização da moeda. Desse modo, é ilegal a Resolução BACEN 1.129/86, ao permitir aos bancos cobrar de seus devedores, por dia de atraso no pagamento de seus débitos, além dos juros moratórios, a Comissão de permanência, criando nova forma jurídica compensatória da mora do devedor - indenização - não prevista em lei. (1º TA Civ.-SP - Ac. unân. da 8a Câm. julg. em 13.12.89 - Ap. 417.226/3 Capital - Rel. Juiz Ferraz de Arruda - Alfredo Robellard de Marigny vs. BANESPA S/A Crédito, Financiamento e Investimos)."

E o relator, em seu voto condutor, esclarece:

"O item II da citada resolução dispõe expressamente que os bancos, além dos encargos previstos no item anterior, não poderão cobrar "quaisquer outras" quantias compensatórias pelo atraso no pagamento dos débitos vencidos" numa clara e induvidosa demonstração de que a comissão de permanência por ela instituída cuidava-se de verba compensatória de mora. E na realidade assim é.

Cobrada sempre à maior taxa de juros vigente no período do empréstimo ou à taxa de mercado do dia do pagamento, a referida comissão não pode, à evidência, ser considerada mera taxa remuneratória de serviço, como assentou o Colendo Supremo Tribunal Federal e nem como instrumento de atualização monetária como tem entendido a jurisprudência deste Tribunal. Da literalidade do item II da resolução 1.129/86 e do que representa na prática a sua aplicação, especialmente considerando-se a capitalização dessas taxas, projetando o débito muito além da razoabilidade inflacionária, não se pode negar o caráter compensatório da verba instituída sob rótulo de simples comissão de permanência. Caracteriza-se, inegavelmente, semelhante cobrança como indenização moratória concedida aos bancos sem nenhuma sustentação legal. Como verba indenizatória que é, ofende ela a expressa disposição do art. 1.061 do Cód. Civ., que estabelece que as perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros de mora e custas, sem prejuízo da pena convencional. Assim sendo, a resolução 1.129/86 criou fórmula compensatória do atraso de pagamento de débito não permitida em lei."

Em trabalho denominado "COMPETÊNCIA NORMATIVA DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL", o Professor MARÇAL JUSTEN FILHO, titular de Direito Comercial da Universidade Federal do Paraná, dissecou com acuidade a competência do C.M.N., especialmente no que concerne aos aspectos constitucionais da intervenção estatal nos contratos privados.

Nesse sentido, entendeu que, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais da legalidade e da vedação de delegação de atribuições, o C.M.N. somente poderia receber competência administrativa, nunca normativa; quando muito, teria competência fiscalizadora, objetivando assegurar o cumprimento das disposições previstas em lei.

E uma de suas conclusões foi a seguinte:

Por decorrência, não se coadunam com a constituição Federal dispositivos que remetam ao CMN a faculdade de dispor normas jurídicas a serem observadas no trato entre particulares e instituições financeiras. Dispositivos tais como o art. 2º, parág. 1º., do Decreto-lei nr 2.290 não encontram apoio jurídico, por delegarem a órgão administrativo funções legislativas.

19. Nesse campo, a autorização do CMN para instituições financeiras cobrarem comissão de permanência é insustentável."

19.1. As conseqüências do inadimplemento dos devedores não envolvem qualquer exigência de INTERVENÇÃO do Estado na ordem econômica. Não se trata de regular relações que não se possam desenvolver com eficácia em regime de livre iniciativa. Nenhum vínculo existe entre (a) regime de livre iniciativa e de competição e (b) inexecução de obrigações.

Logo, autorização para cobrança de comissão de permanência não se insere na matéria suscetível de ser regulada a pretexto de INTERVENÇÃO na ordem econômica.

19.2. Depois, o exame da constituição Federal comprova que não se poderia atribuir poder genérico ao CMN para reger as relações entre particulares e instituições financeiras.

19.3. Seja pela ofensa aos princípios da legalidade e da separação de poderes, seja pela contrariedade à limitação da INTERVENÇÃO do Estado no domínio econômico, o CMN careceria de competência para invadir o relacionamento dos particulares, prevendo a "comissão de permanência". (in "Condições Gerais dos Contratos Bancários e a Ordem Pública Econômica", ed. Juruá, 1988, pág. 60).

Tem-se, portanto, que a cobrança da comissão de permanência é ILEGAL e, portanto, indevida, na medida em que se consubstancia em autêntico mecanismo compensatório da mora do devedor - indenização - não prevista em lei.

Assim, e a um só tempo, a cobrança da Comissão de Permanência contraria o Código Civil, em seu artigo 1.061 - posto que, como fórmula compensatória, não se caracteriza como juros de mora, custas ou pena convencional - além de afrontar o preceito constitucional da LEGALIDADE constante do artigo 5º, II, da Constituição da República, e do artigo 153, parágrafo segundo, da anterior Carta Magna.

E mesmo que, apenas para argumentar, se pudesse entender como legal e constitucional a cobrança da Comissão de Permanência, o referido encargo não poderia incidir de forma cumulativa com a Correção Monetária.

Com efeito, a comissão de permanência seria constituída de juros e também de correção monetária.

Tanto isso é verdade, que o douto CELSO ARAÚJO GUIMARÃES, Juiz de Direito de Curitiba, assim esclarece:

"Não há, no entanto, como ignorar-se que a comissão de permanência tenha, essencialmente, o caráter de remuneração da instituição financeira pelo mútuo concedido, no período que se estabeleceu entre a data da liquidação originariamente prevista, e aquela em que a mesma efetivamente ocorreu.

Mas, à toda evidência, ao lado desse caráter remuneratório, a comissão de permanência possui, paralelamente, também o caráter de encargo destinado a atualizar o valor monetário originário do mútuo, pois que embutido já se achava este fator, quer na taxa geral que informou originariamente a operação, quer na taxa de mercado do dia do vencimento ou da própria liquidação, e que determinam, ontem ou hoje (segundo as diversas resoluções das autoridades monetárias), o montante da referida comissão.

Decorre daí, de forma muito clara, a impossibilidade de cumulação da comissão de permanência com a correção monetária, na exigência judicial da dívida, pois que se estaria a conceder duas correções do valor mutuado por títulos ou causas diferentes.

A comissão de permanência é, pois, figura especial, criada a favor das instituições financeiras, destinada a, durante o período de prorrogação da operação de crédito não liquidada no vencimento, remunerar o capital mutuado (juros) e também atualizá-lo monetariamente; é, dessa forma, concomitantemente, remuneração do capital e forma própria e específica de corrigir a moeda." (in "Condições Gerais dos Contratos Bancários", Ed. Juruá, 1988, pág. 83)

O E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já cristalizou o entendimento de que a comissão de Permanência é inacumulável com a correção Monetária. Nesse sentido, a Súmula nr. 30, do seguinte teor:

"A COMISSÃO DE PERMANÊNCIA E A CORREÇÃO MONETÁRIA SÃO INACUMULÁVEIS."

Sobre a matéria, veja-se o seguinte excerto da EMENTA do acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial nr. 4.768-RJ, publicado no DJ de 22.04.91:

"2. comissão de Permanência. Instituída quando inexistia previsão legal de correção monetária, visava a compensar a desvalorização da moeda e remunerar o mutuante. Sobrevindo a Lei nr. 6.899/81, deixou de justificar-se aquela primeira finalidade, não havendo de cumular-se com a correção ali instituída.

Não há cogitar-se de prestação de serviços, por parte do credor que diligencia a cobrança de seu crédito, sendo inaceitável compreender-se, aquele acessório, entre as tarifas remuneratórias." (in "Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais", ed. LEX, vol. 28, pág.96)

Configurada, portanto, a cumulação e, para evitar o BIS IN IDEM , há que se reconhecer sua ilegalidade, segundo a jurisprudência predominante, devendo, portanto, ser excluída do débito a ser apurado, a INDEVIDA comissão de permanência, somente podendo incidir sobre o débito apenas os juros legalmente aplicáveis e, se for o caso, a correção monetária.


VI – ALGUMAS OCORRÊNCIAS NO CURSO DO PROCESSO

VI.1 - DO PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS, SENDO VÁRIOS OS EMBARGANTES

Havendo diversos executados, quando se inicia o prazo para interposição dos Embargos?

Parte expressiva da jurisprudência tem entendido que esse prazo se inicia depois que se opera a intimação da penhora do último executado.

Nesse sentido, vale a transcrição das seguintes decisões oferecidas por ALEXANDRE DE PAULA e GERALDO MAGELA ALVES, em seu Repertório de Jurisprudência do Código de Processo Civil Brasileiro:

"876. A regra é que a contagem do prazo para embargar a execução se inicia depois que todos os co-devedores forem intimados da penhora, ainda que o bem penhorado seja de propriedade de um deles, já que, seguro o juízo pela penhora, todos podem embargar a execução (Ac. unam. da T. Cív. do TJ-MS, de 28-2-83, na apel. 291/82, rel. des. Nelson Mendes Fontoura; Rev. Jurisp. TJ-MS, vol. 17, p. 94; Rev. dos Tribs., vol. 587, p. 220; Rev. Bras. Dir. Proc., vol. 51, p. 196) (p. 516)

882. Sendo vários os réus, o prazo para oferecimento de embargos à execução é contado a partir da última intimação (Ac. unân. da 3ª Câm. do TJ-RJ, de 17-6-75, na apel. 92.042, rel. des. Ivânio Caiuby). (p. 517)

883. Enquanto não efetivada a intimação da penhora a todos os interessados, não flui o prazo para embargar a execução (Ac. unân. da 3ª Câm. do TJ-RS, de 6-4-78, na apel. 29.840, rel. des. Ney da Gama Ahrends; REv. de Jurisp. do RJ-RS, vol. 71, p. 359). (p. 517)

898. O prazo para embargar nas execuções movidas contra vários devedores, nas quais foram penhorados bens apenas de um devedor, conta-se da intimação da penhora ao último devedor intimado, ainda que os bens penhorados não lhe pertençam (A. unân. da 1ª Câm. do TA-MG, de 16-2-77, na apel. 9.853, rel. juiz Oliveira Leite; Rev. Forense, vol. 267, p. 238; Julgs. do TA-MG, vol. 6, p. 155; Rev. dos Tribos., vol. 521, p. 249). (p. 520)

910. O prazo para o oferecimento de embargos, nas execuções movidas contra vários devedores, conta-se da intimação da penhora do último devedor, ainda que os bens penhorados não lhe pertençam (Ac. unân. 12.184 da 1ª Câm. do TA-PR, de 15-10-80, na apel. 1.298, rel. juiz Wilson Reback; Adcoas, 1981, nr. 80.142). (p. 522)

918. Em exegese sistemática, o decêndio para a interposição dos embargos do devedor conta-se da juntada aos autos do mandado da penhora, devidamente cumprido, intimados os devedores. Em sendo dois ou mais os executados, o decêndio corre após completado o ciclo de intimações da penhora, resguardada assim a necessária unidade do prazo para a defesa (Ac. da 2ª Câm. do TA-RS, de 25-5-76, na apel. 12.597, rel. juiz Athos Gusmão Carneiro; Julgs. do TA-RS, vol. 20, p. 307). (p.523)

924. Na execução por quantia certa promovida contra vários devedores, a contagem do prazo de dez dias para a interposição de embargos é única e começa a fluir a partir da última intimação da penhora, ainda que efetivada por precatória. Seguro o juízo pela penhora válida, qualquer executado poderá oferecer embargos à execução (Ac. do 2º Gr. Cív. do TA-RS, de 13-12-85, nos embs. 184.054.773, rel. juiz Castro Gamborgi; Julgs. do TA-RS, vol. 59, p. 133). (p. 524)

937. ..."o prazo para a oferta dos embargos só começa a fluir depois que o último co-executado é intimado da penhora. É verdade que ao disciplinar o processo de execução não consignou o legislador, expressamente, a regra constante do art. 241, II, do CPC. Não se pode negar, porém, a aplicação subsidiária da norma do processo de conhecimento à execução. É corrente, na hipótese de mais de um co-executado, o oferecimento de defesas comuns. Assim, a apresentação de embargos a contar de cada intimação da penhora, traria, no mínimo, o inconveniente de tumultuar o procedimento. Não seria raro, em caso em que demorasse a intimação de um co-executado - v.g. -, encontrar este os embargos opostos por outro já decididos". (Ac. unân. da 2 ª Câm. do 1º TA Civ.SP, de 3-12-80, no agr 282.019, rel. juiz Déscio Mendes Pereira). (ps.527/528)

Na hipótese de ser lavrado mais de um auto por força da ocorrência de várias diligências, a penhora somente se dará por consumada após a lavratura do auto relativo ao último bem.

O fundamento desse entendimento repousa na disciplina do artigo 664 do CPC, segundo o qual:

"Art. 664. Considerar-se-á feita a penhora mediante a apreensão e o depósito dos bens, lavrando-se um só auto se as diligências forem concluídas no mesmo dia.

Parágrafo único. Havendo mais de uma penhora, lavrar-se-á para cada qual um auto".

A teor desse dispositivo, depreende-se que, em relação às diligências concluídas em dias diferentes e que resultarem em diversas penhoras de bens, lavrar-se-ão tantos autos quantas forem as penhoras.

Dessa forma, enquanto não for lavrado o último auto, não se pode falar em conclusão da penhora, mas, tão-somente, em conclusão das diligências que se consubstanciaram nas penhoras parciais.

Pode-se dizer, portanto, que, na hipótese de a penhora incidir sobre vários bens, e desde que haja necessidade da realização de mais de uma diligência, somente poderá se falar em penhora válida quando tiver sido promovida a última diligência e lavrado o auto respectivo. A penhora, assim, como ato complexo, teria se desdobrado em vários atos que podem ser tidos como penhoras parciais, sempre integrando o ato único consistente na penhora determinada pelo Juiz.

Pondere-se, ainda, que a segurança do juízo - tida como requisito básico à admissibilidade dos embargos do devedor no caso de execução por quantia certa contra devedor solvente - somente se dará quando for completada a penhora; isto é, quando forem efetivamente apreendidos, por força da constrição judicial, todos os bens, em especial quando a apreensão desses bens não resultar de nomeação, como nos casos a que nos referimos de execução de crédito pignoratício, antiictérico ou hipotecário, em que a penhora, independentemente de indicação pelo Devedor ou mesmo pelo Credor, recairá sobre a coisa dada em garantia (art. 655, § 2º, do CPC).

Cabe esclarecer, também, que a hipótese ora versada - em que a penhora se desdobra em vários autos - não pode, jamais, se confundir com os casos de segunda penhora, em que se dá a substituição de penhora anulada, ou quando o credor desiste da primeira por serem litigiosos os bens, por estarem penhorados, arrestados ou onerados, ou quando houver insuficiência caracterizada depois de executados os bens.

Esses casos de segunda penhora estão expressamente disciplinados no artigo 667 do CPC, ensejando não mais a interposição de Embargos à execução, mas, se cabíveis, de Embargos à Penhora.

VI.2 - O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE / FALTA DE REALIZAÇÃO DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA

Raros são os juizes que acatam, em sede de Embargos, os pedidos de realização de provas, dentre as quais a pericial.

Na maioria dos casos, sequer explicam ou justificam a supressão da fase de dilação probatória, decidindo pelo julgamento antecipado da lide, com o que, ainda que de forma implícita, denegam pedido geralmente formulado pelo Devedor na petição atrial dos Embargos.

A perícia, no mais das vezes, é necessária e se mostra imprescindível para apurar o correto valor do débito, excluindo os excessos apontados nos Embargos e/ou, para esclarecer os critérios utilizados pelo Credor para a fixação do quantum debeatur.

Trata-se de matéria de fato relevante ao deslinde da controvérsia, e cuja verificação, sem dúvida, poderia afetar a convicção do Julgador, na apreciação do thema decidendum, como matéria prejudicial à apreciação do mérito.

Para evitar a preclusão da matéria, incumbe ao Devedor ingressar tempestivamente com o Recurso de Agravo de Instrumento, na modalidade retida, a fim de que, quando do julgamento da Apelação, seja o assunto objeto de apreciação preliminar, objetivando a anulação do processo, a partir da prolação do despacho que negou a instrução probatória.

No Agravo, sugere-se que o Devedor, destaque e acentue, inclusive para fins de prequestionamento, os seguintes aspectos ilegais da decisão:

DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL VIOLADO: o inciso LV do artigo 5º

A decisão afrontada teria propiciado o rompimento do equilíbrio processual entre as partes, ao negar o direito a uma delas de comprovar suas alegações, violando, assim, as garantias constitucionais da ampla defesa e do pleno contraditório, insculpidas no artigo 5º, LV, da Constituição Federal.

AFRONTA AOS ARTIGOS 331 e 334 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Há também desrespeito ao artigo 331 do CPC, no pressuposto de que não teria ocorrido nenhuma das hipóteses previstas no artigo 330.

Com efeito, o julgamento antecipado da lide não pode ocorrer, porquanto a questão de mérito não era unicamente de direito; e, mesmo sendo de direito e de fato a questão de mérito, haveria necessidade de produzir provas em audiência.

A prova pericial, de resto, não se configuraria como prova protelatória ou procrastinatória, nem tampouco os fatos a serem provados poderiam ser tidos como notórios ou em cujo favor militasse presunção legal de existência ou veracidade, o que dispensaria a realização das provas, nos termos do que reza o artigo 334 do CPC.

Assim, há que se pretender o reconhecimento de que o Juiz não teria se valido do prudente arbítrio que deve presidir sua atuação, além de ter possibilitado a que fosse rompido o equilíbrio processual entre as partes, ao negar o direito a uma delas de comprovar suas alegações.

Pelas lições que encerra, vale transcrever o seguinte trecho de acórdão oferecido por ALEXANDRE DE PAULA:

"106. O julgamento antecipado da lide é, sem dúvida, uma das maiores conquistas do código processual civil de 1973. O instituto, no entanto, deve ser usado com extrema parcimônia, porque pode implicar cerceamento de defesa, com inutilização parcial do processo e conseqüente desperdício de tempo na entrega da prestação jurisdicional. Toda vez que houver a mais mínima possibilidade de produção de prova em audiência, ou fora dela, mas na fase instrucional, a lide NÃO deve ser julgada antecipadamente, senão caminhar em direção à audiência de instrução e julgamento. Arrimando-se a contestação em matéria de fato, que NÃO pode ser solvida sem instrução probatória regular, NÃO pode o Magistrado realizar o julgamento antecipado da lide. Valendo-se do art. 330, inc. I, do CPC, em caso a que este NÃO se pode aplicar, o Juiz lhe nega vigência (Ac. unân. da 4a Câm. do TJBA, de 2.9.87, na apel. 491, rel. des. Paulo Furtado; Adcoas, 1988, 116.352 e 116.725).(em "Código de Processo Civil Anotado", 5a edição, 1992, Edit. Revista dos Tribunais, Vol. II, pág. 1382).

THEOTÔNIO NEGRÃO nos oferece algumas decisões sobre o tema, em suas anotações ao artigo 330:

"Existindo necessidade de dilação probatória para aferição de aspectos relevantes da causa, o julgamento antecipado da lide importa em violação do princípio do contraditório, constitucionalmente assegurado às partes e um dos pilares do devido processo legal" (STJ-4ª Turma. REsp 7.004-AL, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 21.8.91, deram provimento, v.u., DJU 30.9.91, p. 13.489, 1ª col., em.).

Evidenciando-se a necessidade de produção de provas, pelas quais, aliás, protestou o autor, ainda que genericamente, constitui cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, fundado exatamente na falta de prova do alegado na inicial" (STJ-3ª Turma, REsp 7.267, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 20.3.91, deram provimento, v.u., DJU 8.4.91, p. 3.887, 2ª col., em.)."

Se os fatos indicados podem ser outros que NÃO os indicados no documento e assim modificados pela prova possível e requerida, cumpre seja realizada para conhecimento inteiro da espécie, vedada a antecipação do julgamento." (em CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL e Legislação Processual em Vigor, 30ª edição, 1999, ps. 385-386).

DESRESPEITO AOS ARTIGOS 130 e 131 DO CPC

Não se pode olvidar que a regra contida no artigo 131 do CPC, assecuratória do princípio da livre convicção ou do livre convencimento do juiz, há que ser aplicada sem prejuízo da garantia maior que têm as partes, no processo: de obter a prestação jurisdicional.

Quando prolatadas sem qualquer explicação ou fundamentação, as decisões que suprimem a dilação probatória revelam-se, no mínimo, imotivadas, cabendo acentuar que o princípio da livre convicção do juiz não pode ser aceito como dogma absoluto, sob pena de afetar o princípio mais abrangente da isonomia processual.

Recorde-se que o princípio da livre convicção, no plano do direito adjetivo, está sujeito às restrições impostas pela observância das regras constantes do artigo 130 do CPC e, pela constatação inequívoca de que, havendo matéria de fato a ser apreciada, tornava-se imprescindível produzir provas em audiência (art. 330, I, do CPC).

Daí porque, já decidiu o E. STF, em julgamento no qual foi relator o Ministro FRANCISCO REZEK, somente ser legítima a antecipação do julgamento da lide quando os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado (Revista Trimestral de Jurisprudência, vol. 115, p. 789).

Não se pode também deixar de considerar que, havendo matéria controversa posta em discussão, a dilação probatória se transmuda em verdadeiro objeto do processo. Nesse sentido, a observação de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR:

"Enquanto o processo de execução é voltado para a satisfação do direito do credor e atua sobre bens, o processo de conhecimento tem como objeto as provas dos fatos alegados pelos litigantes, de cuja apreciação o juiz deverá definir a solução jurídica para o litígio estabelecido entre as partes.

De tal sorte, às partes não basta simplesmente alegar os fatos. "Para que a sentença declare o direito, isto é, para que a relação de direito litigiosa fique definitivamente garantida pela regra de direito correspondente, preciso é antes de tudo que o juiz se certifique da verdade do fato alegado"(João Monteiro), o que se dá através das provas."(em CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, vol. I, Forense, 6ª edição, 1990, p. 445).

Acentue-se, também, ter havido manifesta ofensa ao artigo 130 do CPC, por força do qual cabia ao juiz, a requerimento das partes, determinar as provas necessárias à instrução do processo, e somente indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

E essa ofensa ao artigo 130 reforça ainda mais o entendimento de que houve cerceamento de defesa.

A esse respeito, veja-se THEOTÔNIO NEGRÃO:

"Art. 130.6: Constitui cerceamento de defesa o julgamento sem o deferimento de provas pelas quais a parte protestou espedificamente: falta de prova de matéria de fato que é premissa de decisão desfavorável àquele litigante"(RSTJ 3/1.025)l Neste sentido: STJ-3ª Turma. Resp 8.839-SP, rel. Min. Waldemar Zveiter. J. 29.4.91, deram provimento, v.u., DJU, p. 7.427., 2ª col. Em.

..............

"Se a pretensão do autor depende da produção da prova requerida, esta não lhe pode ser negada, nem reduzido o âmbito de seu pedido com um julgamento antecipado, sob pena de configurar-se uma situação de autêntica denegação da Justiça" (RSTJ 21/416)". (ob. cit., pág.215-216).

OFENSA AO ARTIGO 420 DO CPC

A perícia somente deve ser indeferida se ocorrer alguma das hipóteses previstas no parágrafo único do artigo 420 do Código de Processo Civil: (I) a prova do fato não depender do conhecimento especial de técnico; (II) for desnecessária em vista de outras provas produzidas; ou (III) se a verificação for impraticável.

Partindo do pressuposto de que não tenha ocorrido nenhuma dessas três hipóteses, deve-se alegar que o despacho recorrido teria suprimido inexplicavelmente a dilação probatória, ao desconhecer e ignorar o pedido de produção de provas, especialmente a pericial, essencial e imprescindível à correta elucidação da controvérsia.

Por sua inteira pertinência, vale transcrever a seguinte decisão anotada por THEOTÔNIO NEGRÃO, a propósito do artigo 420 do CPC:

"Art. 420:6. A realização de prova pericial é direito da parte, que somente pode ser negado se configurada qualquer das hipóteses referidas no parágrafo único do art. 420 do CPC, do que decorre a impossibilidade de ser indeferida sem qualquer justificativa"(RTFR 164/39)." (op. cit., p. 424)

Sobre o tema - cerceamento de defesa decorrente do julgamento antecipado da lide sem a realização de provas - a jurisprudência é copiosa. Para ilustrar, seguem transcritos alguns julgados coletados por ALEXANDRE DE PAULA, encabeçados por decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, sendo relator o eminente Desembargador SOUZA RIBEIRO:

"26.105-A No julgamento antecipado da lide, subtraído o princípio do contraditório, oferecendo-se às partes oportunidade de produzirem, em audiência, a prova do que fora respectivamente alegado na inicial e na contestação, anula-se o processo para determinar sejam obedecidas as regras do art. 331 do CPC (Ac. Unân. Da 1ª Câm. Do TJ-PE, de 23-9-86, na apel. 727, rel. des. SOUZA RIBEIRO; ADCOAS, 1987, nr. 112.756).

"26.120. Impossível o julgamento antecipado da lide quando a questão é de fato e de direito e a prova depende de produção em audiência, tempestivamente requerida (Ac. Unân. Da 2ª Câm. Do TJ-SC de 11-3-86, na apel. 23.673, rel. des. HÉLIO MOSIMMANN: Adcoas, 1986, nr. 108.027; Ver. Dos Tribs., vol. 607, p. 199).

"26.129. O instituto de julgamento antecipado da lide deve ser utilizado com cautela e interpretado com prudência, para não configurar graves riscos para o direito de defesa e para o direito do réu ao processo, haja vista que a conseqüência do uso indevido do instituto é a nulidade insanável da sentença (Ac. Unân. Da 2ª Câm. do TA-MG de 22-8—86, no agr. 4.851, rel. juiz PAULO MEDINA: Ver. Amagis, vol. 13, p. 81).

Em suma: "A produção de provas constitui direito subjetivo da parte, a comportar temperamento a critério da prudente discrição do magistrado que preside o feito, com base em fundamentado juízo de valor acerca de sua utilidade e necessidade, de modo a resultar a operação no equilíbrio entre a celeridade desejável e a segurança indispensável na realização da justiça."

Estas, assim, as razões sugeridas para constar do agravo retido, cuja apreciação preambular o Devedor deverá pedir, atendendo ao que prescreve o artigo 523 do CPC, quando do julgamento da Apelação, esperando que o recurso seja conhecido e venha a ser provido, reconhecendo ter havido cerceamento de defesa, por supressão da dilação probatória consistente na perícia destinada a apurar o quantum debeatur e o excesso de execução apontado nos Embargos, para o fim de julgar nula a sentença recorrida, determinando a realização da perícia.

VI.3 - A PROVISORIEDADE DA EXECUÇÃO NO CASO DE PENDER RECURSO CONTRA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS

A maioria da doutrina entende que, não obstante ser definitiva, a execução de título extrajudicial adquire, todavia, feições de provisoriedade, quando se trata da prática de atos tendentes à alienação do domínio, na pendência de recursos (ainda que sem efeito suspensivo) interpostos na Ação dos Embargos do Devedor.

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, uma das maiores autoridades em Execução, oferece a seguinte opinião:

"A execução do título extrajudicial é definitiva porque o título que a fundamenta não está, de início, pendente de julgamento que o possa alterar ou cassar.

Mas, uma vez interpostos embargos do devedor, o título extrajudicial torna-se litigioso. Daí em diante, mesmo que o recurso não tenha efeito suspensivo, não se pode mais cogitar de execução definitiva, porque a sua base jurídica, que é o título do credor, passou à instabilidade própria das relações jurídicas na dependência de pronunciamento judicial.

Estando sub judice o próprio direito do credor à realização executiva da obrigação do devedor, a execução assume feições de provisoriedade, o que impedirá, na pendência da Apelação sem efeito suspensivo (art. 520, nr. V), atos de execução definitiva como os da arrematação dos bens penhorados." em CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, Forense, 14ª edição, 1995, Volume II, p. 20).

E explicita seu ponto de vista, verbis:

"Questão interessante é a que advém da interposição de embargos à execução definitiva, causando a suspensão do processo principal.

Se os embargos são julgados improcedentes, a Apelação do devedor só tem efeito devolutivo (art. 520, nr. V), o que levou alguns ao entendimento de que a execução restabeleceria de imediato seu curso, propiciando ao credor oportunidade de realizar o praceamento ou leilão dos bens penhorados, mesmo antes do julgamento do recurso. Isto porque a execução reaberta era definitiva e não provisória.

Nosso entendimento no entanto, é outro. Se os embargos suspendem a execução definitiva, essa suspensão não desaparece, pelo menos em toda extensão, senão quando ocorrer a solução negativa da ação incidental, em caráter definitivo, ou seja, enquanto não houver coisa julgada, pelo esgotamento da via recursal ou pela não utilização dos recursos cabíveis no prazo legal, os efeitos da pendência dos embargos continuam atuando sobre a execução. Se o recurso, na espécie, não impede a reabertura da execução, impede pelo menos a sua movimentação como execução definitiva, provocando, temporariamente, uma transfiguração na natureza dos atos executivos praticáveis.

Autorizar a reabertura da execução em caráter definitivo, quando provisória é a rejeição dos embargos, é medida que se nos afigura temerária, diante dos irremediáveis prejuízos que poderá acarretar ao embargante, caso seja vitorioso na solução do recurso.

A nosso ver, só as situações indiscutíveis, de plena certeza jurídica, autorizam o juiz a ultimar os atos de alienação forçada dos bens penhorados.

Por isso, se pende Apelação ou outro recurso da decisão que rejeitou os embargos, mesmo que de efeito apenas devolutivo, como o agravo ou o recurso extraordinário, solução definitiva da lide não existe, e a reabertura da execução só se pode dar a título precário, isto é, como medida provisória, sujeita às limitações do art. 588." (em PROCESSO DE EXECUÇÃO, edição Universitária de Direito, 17ª edição, 1994, ps. 142-143)

Tem-se, portanto, que essa transitoriedade, remetendo o processo executivo para o procedimento da execução provisória (art. 588), impediria a prática de atos tendentes à alienação de bem penhorado, enquanto os Embargos do Devedor ainda se encontrarem pendentes de decisão final (com trânsito em julgado).

Em outra obra, HUMBERTO THEODORO assevera:

"Dentro dessa ordem de idéias, a suspensão da execução decorre, em nosso Código, da regra geral que manda suspender o processo sempre que o provimento jurisdicional de mérito "depender do julgamento de outra causa" (causa prejudicial) (art. 265, IV, "a")." ( em "EXECUÇÃO - Direto Processual Civil ao Vivo", Aide Editora, Volume 3, 1991, págs. 52/53).

Simpósio realizado no Rio de Janeiro concluiu que: "no caso da execução definitiva, interposta Apelação pelo executado-embargante, contra a sentença que julgou improcedentes os embargos, pode a execução prosseguir, mas agora provisoriamente (CPC, 520, n. V), não se justificando o levantamento de dinheiro penhorado, sem caução, nem se permitindo a alienação do domínio." A referência é feita por THEOTÔNIO NEGRÃO, considerando essa posição a mais acertada, "salvo quanto ao fato de considerar definitiva uma execução que mais tarde se torna provisória, o que parece menos lógico." E continua:

"Segundo entendemos, a execução por título extrajudicial é provisória, e só se tornará definitiva se não forem opostos embargos à execução, ou após transitar em julgado a sentença que os tiver apreciado (neste sentido: RT 665/115).

Se os embargos à execução, não rejeitados liminarmente, têm efeito suspensivo (art. 741), desde o seu recebimento para discussão está suspensa a execução, e será provisório tudo quanto se fizer enquanto pendentes." (em CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - legislação Processual em Vigor, Saraiva, 27ª edição, 1996, ps. 447-448).

O efeito suspensivo dos Embargos do Devedor passou a figurar de forma expressa no Código de Processo Civil (§ 1º do art. 739), por força das alterações introduzidas pela Lei nr. 8.953, de 13.12.94.

Assim, acabou-se a discussão em torno dessa questão, inobstante a maioria esmagadora da jurisprudência já se inclinasse pela tese da suspensividade.

Não obstante a previsão legal (art. 520, V, do CPC) no sentido de que a Apelação será recebida só no efeito devolutivo quando interposta de sentença que rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los improcedentes, faz-se mister ressalvar que tal preceito há que ser aplicado com as devidas e necessárias cautelas, para evitar a ocorrência de graves danos e prejuízos irreparáveis ao executado. Não tem, esse dispositivo, a prevalência absoluta que alguns pretendem lhe conferir.

Com efeito, e em primeiro lugar, cabe lembrar que, de conformidade com as alterações introduzidas recentemente pela Reforma do CPC, a nova redação conferida ao artigo 558 pela Lei nr. 9.139, de 30.11.95 permite que o relator suspenda o cumprimento da decisão até o julgamento definitivo da turma ou câmara, no caso de Apelação recebida apenas no efeito devolutivo (art. 558, parágrafo único c/c art. 520), desde que reste demonstrada a possibilidade de ocorrer lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação.

Válidas, então, as observações feitas por THEOTÔNIO NEGRÃO, em relação aos artigos 520 e 558 do CPC:

"Art. 520:8a Em todos os casos do art. 520, o relator poderá dar efeito suspensivo à apelação (v. art. 558 § ún., na redação da Lei 9.139, de 10.11.95)."

"Art. 558:5. Resulta, da combinação do "caput" com o parágrafo, que, em todos os casos de agravo ou de apelação no efeito apenas devolutivo (art. 520), o relator pode dar efeito suspensivo ao recurso, desde que seja relevante o fundamento invocado e da execução possa resultar lesão grave e de difícil reparação."(30ª edição, 1999, págs, 535 e 592).

Independentemente de se entender que a execução de título extrajudicial é definitiva ou provisória, o fato é que, havendo, em relação aos Embargos do Devedor, recurso pendente de julgamento, a continuação da execução com base no art. 680 e seguintes do CPC não recomenda a prática de atos tendentes à alienação do bem penhorado, providência essa cuja implementação deverá aguardar o trânsito em julgado da sentença que indeferiu ou rejeitou os Embargos, atenta, inclusive à regra constante do art. 620.

Nesse sentido, veja-se o entendimento esposado pelo Desembargador SOUZA RIBEIRO, do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, ao proferir despacho em Agravo de Instrumento interposto contra decisão indeferitória de pedido de sustação de Carta de Arrematação, não tendo ainda transitado em julgado a decisão concernente à arrematação. A decisão do Relator foi a seguinte:

"Na verdade, a Agravante comprova a interposição de Agravo Regimental, sujeito, ainda, à apreciação desta Casa, o que efetivamente torna "sub-judice" a questão formulada. Além do mais, estando a questão ainda sujeita a decisão judicial, a execução só pode ter caráter provisório, não admitindo a sua consecução quando se tratar de alienação do domínio, e, nos demais casos, sem a prestação de caução. Assim, torna-se relevante a concessão liminar, pois, caso contrário, causará à agravante sérios e irremediáveis prejuízos. Isto posto, defiro a liminar requerida, para estender o efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento, no sentido de sustar os efeitos da Carta de arrematação expedida, até ulterior deliberação."

Para ratificar e confirmar esse entendimento, cabe a citação dos seguintes excertos oferecidos por ALEXANDRE DE PAULA, a respeito do art. 587 do CPC:

"1. É provisória a execução na pendência de ApelaçÔo interposta da sentença que julga improcedentes os embargos à execução (Ac. unân. da 2ª Sec. do TRF DE 12.6.84, NO MS. 103.616-pr, rel. min. Carlos Velloso; RTFR, 126/393).

8. "(...) Na realidade, em execução por título extrajudicial a praça não pode ser realizada enquanto não decidida a ApelaçÔo interposta pelo executado contra a sentença que considerou improcedentes os embargos à execução. É que tal execução, segundo melhor corrente, é provisória enquanto pendentes os embargos opostos em virtude de recurso ordinário ou extraordinário" (do ac. unân. da 17ª Câm. do TJSP DE 18.12.85, no agr. 101.311-2, rel. des. Oetterer Guedes; RJTSP, 99/272).

10. A execução de título extrajudicial tem caráter provisório, pendendo recurso da sentença que tiver julgado improcedentes os embargos do devedor. Reveste-se de ilegalidade o ato que determina o prosseguimento de execução de título extrajudicial, pendendo recurso da decisão que julgou improcedentes recurso da decisão que julgou improcedentes os embargos do devedor (Ac. unân. 23.028, da 3ª Câm. do TAPR DE 25.2.86, NO AGR. 23/86, REL. JUIZ Wilson Reback; Rev. Ass. MAGS-pr, 42/245).

15. A execução por título extrajudicial é sempre definitiva, a ela não se aplicando as regras sobre a execução provisória. Enquanto não resolvida definitivamente a AÇÃO incidental contida nos embargos, inviável a prática de ato satisfativo do crédito. Tal significaria extinguir-se a execução antes de extinguir-se o incidente dos embargos (Ac. unân. da 3ª Câm. do TARS DE 9.4.86, NO AGR 186.004.032, rel. juiz Ivo Gabriel da Cunha; Adcoas, 1987, n. 111.993). em CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, RT, 5ª edição, vol. III, ps. 2433-2435)

Ainda recentemente, o E. Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, em decisão publicada no DJ de 26.11.98, no julgamento do Agravo Regimental nr. 017.0045607-1/01, em que foi relator o juiz ANTENOR CARDOSO SOARES JÚNIOR, assim entendeu, pela unanimidade dos membros da 4ª Câmara Cível:

EMENTA: Alienação de bens em execução provisória. Pendente recurso de apelação contra decisão que rejeitara embargos à execução. Inadmissibilidade. Manutenção de decisão interlocutória que determinou a suspensão de praça já designada até o julgamento do agravo de instrumento ou da apelação. Exegese do art. 588 do CPC."

Concluindo: a teor dos indicados precedentes jurisprudenciais, e com o apoio da melhor doutrina, deve ser defendido o entendimento de que, encontrando-se ainda pendente de julgamento definitivo a Apelação contra a sentença que julgou improcedentes - ou procedentes em parte - os Embargos do Devedor, a Execução continua suspensa, não devendo, assim, ser iniciada a fase de alienação dos bens penhorados.

Alternativamente, e mesmo que, ad argumentandum, se considere que a Execução não estaria suspensa, cabe lutar pela tese de que a continuação da Execução se reveste de transitoriedade, não podendo, então, ser praticados atos tendentes à alienação dos bens penhorados, ainda que se entendendo definitiva a execução.

Se, inobstante esses argumentos, o juiz da Execução determinar mesmo assim a prática de atos tendentes à alienação dos bens, deve o Executado ingressar com Agravo de Instrumento com pedido de suspensividade da decisão afrontada ou, se for o caso, com petição dirigida ao Relator da Apelação, requerendo por igual a suspensão do cumprimento daquela decisão, amparado no artigo 558, parágrafo único, do CPC.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MONTEIRO, Luiz de Sá. Estratégias processuais dos devedores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. -1309, 1 dez. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/899. Acesso em: 29 mar. 2024.