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Restituição de valores quando o imóvel for entregue com área inferior ao que foi contratado na promessa de compra e venda

Restituição de valores quando o imóvel for entregue com área inferior ao que foi contratado na promessa de compra e venda

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Restituição de valores quando o imóvel for entregue com área inferior ao que foi contratado na promessa de compra e venda.

É possível reivindicar, nas relações de consumo, a restituição de valor pago por área excedente quando for identificada a entrega de bem imóvel com metragem inferior à que foi contratada na promessa de compra e venda.

Trata-se de vício aparente, devendo o titular do direito requerer o citado ressarcimento no prazo de 90 (noventa) dias, considerando ser uma relação de consumo de um produto durável.

O prazo deverá ser contado a partir da entrega efetiva do produto, o que acontece com o termo de entrega de chaves.

Vejamos o teor do art. 26, inciso II e §1° do CDC:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

Cumpre destacar que o mencionado prazo decadencial de 90 (noventa) dias não se confunde com o prazo prescricional para pleitear indenização pelo descumprimento do contrato, que é de 10 (dez) anos, regra geral, conforme ao art. 205 do Código Civil.

A controvérsia foi analisada pela terceira turma do STJ, que por maioria dos votos, decidiu pela possibilidade de ação de restituição de valor pago por área excedente, em virtude de vício aparente, relativo à entrega de bem imóvel com área inferior a contratada, quando a ação for proposta no prazo decadencial de 90 (noventa) dias, sendo afastada a regra geral do prazo prescricional de 10 (dez) anos.

Esse foi o entendimento da Terceira Turma do STJ no REsp: 1898171 SP 2020/0253407-8:

PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALOR PAGO POR ÁREA EXCEDENTE. IMÓVEL ENTREGUE EM METRAGEM A MENOR. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COMPROVAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. DECISÃO UNIPESSOAL. IMPOSSIBILIDADE. VÍCIO APARENTE. PRETENSÃO DE ABATIMENTO PROPORCIONAL DO PREÇO. VENDA AD MENSURAM. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA MANTIDA.

1. Ação de restituição de valor pago por área excedente, em virtude da entrega de imóvel em metragem menor do que a contratada.

2. Ação ajuizada em 28/03/2019. Recurso especial concluso ao gabinete em 21/10/2020. Julgamento: CPC/2015.

3. O propósito recursal é o afastamento da prejudicial de decadência em relação ao pedido do recorrente de restituição de valor pago por área excedente, decorrente da aquisição de imóvel entregue em metragem menor do que a contratada.

4. A comprovação da divergência jurisprudencial exige o confronto entre acórdãos, motivo pelo qual é inadmissível o uso de decisão unipessoal para essa finalidade.

5. A entrega de bem imóvel em metragem diversa da contratada não pode ser considerada vício oculto, mas sim aparente, dada a possibilidade de ser verificada com a mera medição das dimensões do imóvel - o que, por precaução, o adquirente, inclusive, deve providenciar tão logo receba a unidade imobiliária.

6. É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC).

7. O prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC relaciona-se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe são conferidas pelos arts. 18, § 1º, e 20, caput, do mesmo diploma legal (a saber, a substituição do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato.

8. Para as situações em que as dimensões do imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão ou com determinação da respectiva área (venda ad mensuram), aplica-se o disposto no art. 501 do CC/02, que prevê o prazo decadencial de 1 (um) anos para a propositura das ações previstas no antecedente artigo (exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço).

9. Na espécie, o TJ/SP deixou expressamente consignada a natureza da ação ajuizada pelo recorrido, isto é, de abatimento proporcional do preço, afastando-se, por não se tratar de pretensão indenizatória, o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos previsto no art. 205 do CC/02.

10. Ao mesmo tempo em que reconhecida, pela instância de origem, que a venda do imóvel deu-se na modalidade ad mensuram, não se descura que a relação havida entre as partes é, inegavelmente, de consumo, o que torna prudente a aplicação da teoria do diálogo das fontes para que se possa definir a legislação aplicável, com vistas a aplicar o prazo mais favorável ao consumidor.

11. De qualquer forma, ainda que se adote o prazo decadencial de 1 (um) ano previsto no CC/02, contado da data de registro do título - por ser ele maior que o de 90 (noventa) dias previsto no CDC - impossível afastar o reconhecimento da implementação da decadência na espécie, vez que o registro do título deu-se em 04/01/2013 e a ação somente foi ajuizada em 28/03/2019.

12. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ - REsp: 1898171 SP 2020/0253407-8, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/04/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/04/2021).

Na prática, o consumidor adquirente de imóvel em lançamento imobiliário tem direito a restituição financeira por pagamento excedente quando verificar que o imóvel recebido tem área inferior à que consta na promessa de compra e venda.

Para isso deverá propor a ação no prazo decadencial de 90 (noventa) dias, contados do termo de entrega de chaves.

Por fim, segundo o art. 18 do CDC, caso o fornecedor não consiga corrigir o erro e não entregue a área contratada conforme consta na promessa de compra e venda, o adquirente do bem imóvel poderá exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço.


Autor

  • Ubirajara Guimarães

    Direito Imobiliário | @ugprofessor | www.ubirajaraguimaraes.com.br

    Professor. Palestrante. Parecerista. Advogado (Militante em Direito Imobiliário e Tributário no setor público e privado). Corretor de Imóveis e Conselheiro Suplente do CRECI-Ba 9ª Reg., Assessor do Secretário da Fazenda do Município de Lauro de Freitas/Ba., Membro de Comissão de Avaliação Imobiliária do Município de Lauro de Freitas/Ba., Membro da Comissão de Loteamentos e Comunidades Planejadas e da Comissão de Notarial e Registral do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM.

    Bacharel em Direito (F2J). Pós-Graduado em Direito Imobiliário (UNIFACS). Pós-Graduado em Direito Tributário (IBET). Pós-Graduado em Direito Público com Módulo de Extensão em Metodologia do Ensino Superior (UNIFACS). Pós-Graduado em Direito e Política Ambiental (F2J). Tecnólogo - Curso de Nível Superior de Formação Específica em Gestão Imobiliária (UNIFACS). Técnico em Transações Imobiliárias (IEN).

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