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A execução provisória trabalhista e as novas perspectivas diante da Lei nº 11.232/2005

A execução provisória trabalhista e as novas perspectivas diante da Lei nº 11.232/2005

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A CLT não dedicou um único dispositivo legal ao regramento procedimental da execução provisória. A autonomia do direito processual do trabalho, no entanto, não pode servir de empecilho para que o intérprete direcione o sentido da norma jurídica à realidade vigente.

1. Considerações iniciais.

A despeito das alterações havidas no âmbito do direito processual, permanece a idéia central de que a tutela de execução só pode ser implementada mediante título executivo judicial ou extrajudicial. Em se tratando de títulos judiciais, a modalidade mais corriqueira manejada perante os órgãos jurisdicionais é a tutela executiva fundada em sentença que contempla comando de índole condenatória. Embora não se tenha uma estatística precisa quanto ao tema, é possível afirmar que a execução com base nas sentenças judiciais representa a esmagadora maioria dos procedimentos de índole executiva.

A eficácia executiva plena da sentença, no entanto, só é atingida diante da ocorrência do fenômeno da coisa julgada. Nesse sentido, a atividade jurisdicional de execução ou cumprimento do julgado só se concretiza de maneira definitiva diante da impossibilidade de impugnação do pronunciamento judicial. No entanto é de conhecimento geral que, caso o réu venha a utilizar-se de todos os meios recursais postos à sua disposição, a ocorrência da coisa julgada poderá levar anos ou até décadas [01].

O direito processual nunca permaneceu inerte diante dessa constatação e tradicionalmente admite a antecipação da prática de atos destinados à execução da sentença. Essa prática precária e antecipada dos atos processuais era admitida tradicionalmente de maneira muito tímida e limitada, sempre encarando os atos de execução provisória como situação excepcional e desprovida de finalidade prática [02]. Aliás, o nosso marco regulador da execução provisória sempre recebeu críticas dos processualistas quanto ao seu caráter excepcional e residual [03], muito embora ao longo dos anos esse procedimento tenha recebido um grande impulso pelas inovações legislativas (pelo menos em se tratando do direito processual civil).

O olhar crítico lançado pela moderna processualística, no entanto, faz com que cresça paulatinamente a importância da utilização da execução provisória. Vê-se hodiernamente que a preocupação exagerada em poupar o devedor dos percalços da atividade executiva vem dando espaço para uma tentativa de se buscar o resgate da duração do trâmite processual em favor do credor. Alguns processualistas têm inserido no âmbito do direito brasileiro a noção de distribuição do ônus da demora do trâmite processual. Tradicionalmente esse ônus é atribuído exclusivamente ao autor da demanda, todavia busca-se aos poucos distribuir esse encargo em relação também ao réu da demanda. Nesse sentido é emblemática a lição de Luiz Guilherme Marinoni, verbis: "Para que impere a igualdade no processo é preciso que o tempo seja isonomicamente distribuído entre as partes litigantes. O tempo deve ser repartido, no curso do procedimento, de acordo com o índice de probabilidade de que o autor tenha direito ao bem disputado." ·.

Ora, o processo só atinge sua plenitude, do ponto de vista isonômico, quando não se atribui exclusivamente ao autor da postulação a responsabilidade pela demora da concretização da tutela jurisdicional. Tratando-se de tutela de índole executiva fundada em título judicial, onde já houve pronunciamento expresso do poder judiciário acerca do direito controvertido, mais razão ainda existe para convocar o executado para participar dos riscos e dissabores da demora do processo.

A execução provisória, como veremos adiante, apresenta-se como uma forma de concretizar essa tendência moderna da processualística. Nela abre-se a possibilidade de o executado ser compelido ao cumprimento das obrigações reconhecidas jurisdicionalmente, mesmo sem o trânsito em julgado da decisão respectiva. Nesse sentido, o horizonte da atividade executória provisória tende a se alargar, principalmente, no âmbito do direito processual do trabalho, onde, via de regra, o crédito a ser satisfeito tem natureza alimentar.


2. Da fixação do marco normativo regulador da execução provisória trabalhista.

Muito embora a questão da execução provisória seja tema intimamente ligado à efetividade da tutela executiva trabalhista, a nossa legislação processual pouquíssima importância deu ao assunto. Restringiu-se a Consolidação, em seus parcos artigos dedicados ao direito processual, a citar a possibilidade de ocorrência da execução provisória. Por incrível que pareça, essa frugal regulação se operou no âmbito da normatização relativa aos recursos feita no art. 899, limitando-se a afirmar que é "...permitida a execução provisória até a penhora".

Trata-se, portanto, da única menção que a Consolidação das Leis do Trabalho fez em relação ao instituto da execução provisória. Não há qualquer tipo de regulamentação do instituto nos tímidos limites da legislação processual trabalhista. Observe-se que o laconismo da consolidação nesse assunto é, de certa forma, justificável, tendo em vista que o diploma regulador do direito processual civil, na época da aprovação da Consolidação, pouca importância dispensava ao tema da execução provisória. O Código de Processo Civil de 1939 dispunha, no seu art. 883, III, que, no âmbito da execução provisória, era proibida a prática de atos de "...alienação de domínio", sendo condicionado o levantamento de dinheiro à prestação de caução idônea. Como a prestação de caução para a prática de atos processuais não é procedimento facilmente acomodável na realidade do direito processual do trabalho, deve-se supor que o regramento previsto na parte final do art. 899 da CLT parecesse suficiente.

Nesse sentido, pelo menos na vigência do CPC de 1939, a execução provisória trabalhista encontrava-se circunscrita aos atos de apreensão do patrimônio do devedor, sendo remotas as possibilidades de transferência patrimonial. Essa situação perdurou com o advento do Código de Processo Civil vigente que, em sua redação original, manteve praticamente a mesma sistemática adotada pela legislação anterior [04].

A partir da edição da Lei nº. 10.444, de 07 de maio de 2002 [05], a regulação da execução provisória no âmbito do processo civil modificou de maneira contundente os impedimentos outrora expostos, trazendo: a) a possibilidade de desencadeamento da execução provisória sem a necessidade de caucionamento; b) a exigência do caucionamento apenas para a prática de atos de transferência de domínio; c) a possibilidade de dispensa da prestação de caução quando a obrigação objeto da execução fosse inferior a sessenta salários mínimos e o exeqüente demonstrasse se encontrar em "estado de necessidade".

As mudanças, no entanto, não pararam por ai. O direito processual civil continuando no ritmo frenético de mudanças (desencadeado principalmente a partir de ano de 1994 [06]), foi novamente alterado pela Lei nº. 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Trata-se de norma emblemática que instituiu uma nova sistemática de condução da tutela executiva referentes aos títulos judiciais, eliminando a formação de uma nova relação processual. As alterações promovidas pela mencionada lei foram de grande profundidade em relação à tutela executiva, principalmente quanto aos títulos executivos representados pelas sentenças ou acórdãos. O novo arcabouço normativo trazido pela Lei nº. 11.232/2005, por intermédio dos arts. 475-A e segs., apresentou, portanto, as seguintes características: consolidação do chamado sincretismo processual, com o fim da dualidade funcional das tutelas cognitiva e executiva (art.475-I); adoção de medidas de coerção visando ao cumprimento de obrigações de pagar (art. 475-J, in fine); admissibilidade de tutela do devedor no âmbito da mesma relação processual (art. 475-J, § 1º); e eliminação da possibilidade de manejo da apelação durante a implementação da tutela executiva (arts. 475-H e 475-M, § 3º).

No que concerne à execução provisória, no entanto, as alterações foram bem modestas e pontuais, sendo apenas digna de destaque a possibilidade de dispensa de prestação de caução para a prática de atos de transferência de domínio na pendência de agravo de instrumento em face de recurso extraordinário ou especial (CPC, art. 475-O, § 2º, II).

Vê-se, portanto, que a sistemática da execução provisória vigente difere substancialmente daquela em curso quando do advento da consolidação de 1943. Não é aceitável, portanto, partir-se da premissa de que o diploma consolidado apresenta-se auto-suficiente quanto à regulação da execução provisória. De fato, o contido no art. 899 da CLT resume-se a identificar no âmbito do direito processual do trabalho a possibilidade de manejo do instituto da execução provisória. Ao se reportar à locução "até a penhora", não se estabelece um limite instransponível para a continuidade do procedimento executório. O texto limitou-se a adotar a sistemática vigente quando de sua edição, não sendo possível visualizar, no nosso entender, a fixação de qualquer elemento normativo definidor ou limitador da prática dos atos relativos à execução provisória.

Não se argumente que, em se tratando de atos executivos, a regra de subsidiariedade é aquela preconizada pelo art. 889 da CLT, que prevê a aplicação da lei dos executivos fiscal (hoje em dia a Lei nº. 6.830, de 22 de setembro de 1980). A premissa é absolutamente equivocada tendo em vista que a execução fiscal é baseada em título extrajudicial e essa modalidade de título é incompatível com o instituto da execução provisória. Logo é inócua qualquer pretensão de se buscar no art. 889 da CLT a resposta para a flagrante incompletude do sistema normativo trabalhista em relação à matéria atinente à execução provisória.

Sabe-se, por outro lado, que a matéria não é pacífica entre os doutrinadores que insistem em reconhecer que a CLT, em seu art. 899, apresenta uma limitação para a execução provisória trabalhista, mesmo após as alterações promovidas no âmbito da legislação processual civil [08]. Não vislumbro, no entanto, como conceber qualquer tipo de autonomia reguladora ao referido dispositivo legal.

Não se deve deixar de perceber que a inserção do mencionado dispositivo operou-se no âmbito da descrição dos efeitos atribuídos aos recursos trabalhistas, sem se vislumbrar qualquer objetivo do legislador em regulamentar a questão de fundo concernente à execução provisória. Ora, a CLT não dedicou um único dispositivo legal ao regramento procedimental da execução provisória, permanecendo inerte quanto aos requisitos e aos procedimentos do ato processual respectivo. Note-se que essa espécie de normatização referencial está presente em varias passagens do texto consolidado, como é o caso das liquidações por arbitramento e por artigos (art. 879, caput) e da penhora (art. 883). Nessas situações o texto legal trabalhista se reporta expressamente aos referidos institutos, todavia não apresenta qualquer tipo de regramento específico, relegando-se à legislação processual comum o detalhamento da questão.

A normatização processual da CLT é escassa e dessa realidade não podemos nos afastar. Essa escassez de regramentos, no entanto, não retira a importância e a autonomia do direito processual do trabalho que, a despeito do laconismo e imprecisão de suas normas, permanece avançada em relação ao direito processual civil, pelo menos em dois aspectos: a postura inquisitorial do magistrado trabalhista (CLT, art. 765 e 878) e a irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias (CLT, art. 893, § 1º).

A autonomia do direito processual do trabalho, no entanto, não pode servir de empecilho para que o intérprete direcione o sentido da norma jurídica à realidade vigente. É, por conseguinte, ilusório o argumento de que a consolidação apresenta regramentos e limites para o instituto da execução provisória. A postura do legislador é absolutamente omissa em relação à regulação do instituto e, repito, limitou-se a fazer uma breve remissão ao texto processual civil vigente à época. É importante observar que não se trata de opinião recente ou isolada. É possível identificar, no âmbito doutrinário, pronunciamento de renomados juslaboralistas defendendo a integral aplicação do processo civil em matéria de execução provisória. Nesse particular, merece destaque a lição do juslaboralista baiano José Augusto Rodrigues Pinto, verbis: "...sustentamos que, por aplicação subsidiária da lei formal comum, inteiramente compatível com a índole da trabalhista, também na execução provisória de sentenças proferidas em dissídios individuais se deve ir até o último dos atos de constrição, a sentença que julga a execução, vedada apenas a prática de atos processuais de alienação do patrimônio do devedor." [09]

A expressão "até a penhora" teve apenas a finalidade de esclarecer o conteúdo da execução provisória e a impossibilidade, na época, de permitir a prática de atos de transferência patrimonial. Nesse sentido, o marco normativo a ser observado é aquele presente na legislação processual civil, fonte subsidiária do processo do trabalho. É lógico que a observância desse marco normativo não afasta as peculiaridades próprias do direito processual do trabalho, o que significa dizer que o disposto no CPC, art. 475-O é plena e totalmente aplicável ao direito processual do trabalho, ressalvando apenas os dois pilares ideológicos: a postura inquisitorial do Juiz e a irrecorribilidade das decisões interlocutórias.


3. Desencadeamento da execução provisória

Muito embora nosso direito processual tenha passado por contundentes aprimoramentos, ainda permanece a idéia de que a execução só será considerada definitiva quando esgotados os meios recursais e quando tenha se operado a coisa julgada. Não há, portanto, maiores controvérsias no sentido de que o título executivo judicial representado pela sentença ou acórdão só adquire todos os seus efeitos com o trânsito em julgado. Observe-se que, não existe uma diferença ontológica entre a execução provisória e a definitiva, tendo em vista que a provisoriedade é do título executivo e não do procedimento executivo. O fato de a decisão judicial poder sofrer algum tipo de reforma pelos tribunais é que determina o caráter não definitivo da execução.

É relevante observar que, mesmo antes do trânsito em julgado da sentença ou acórdão, é possível que alguns efeitos da sentença sejam observados de maneira precária ou provisória. Entre esses efeitos destaca-se a antecipação da prática de atos de índole executiva, com o fito de satisfazer a obrigação constante do título. Nesse caso, o trânsito em julgado, concretizando a autoridade da sentença, abre espaço para que os efeitos do comando jurisdicional floresçam sem qualquer possibilidade de neutralização. Não é demais mencionar que a distinção entre os efeitos e a autoridade da sentença são descritos com maestria pela doutrina de Dinamarco que, amparado nos ensinamentos de Liebman, dispõe que: "...o instituto da execução provisória fundada em decisões judiciais não passadas em julgado associa-se intimamente à clássica distinção entre eficácia e autoridade da sentença, proposta por Liebman e vitoriosa doutrina...Nos casos em que a lei admite essa execução, a sentença está a produzir seus efeitos, ainda que provisoriamente, apesar de não estar coberta pela auctoritas rei judicatæ." [10]. Vê-se, por conseguinte, que a sentença, tão-logo prolatada, já produz efeitos na órbita jurídica, todavia esses efeitos só adquirem o caráter de imutabilidade, diante da concretização da autoridade da sentença.

Não há, por conseguinte, uma diferença estrutural ou ontológica entre a execução provisória e a definitiva. Em ambas serão observados os efeitos da sentença, em menor ou em maior grau, e serão praticados atos de índole executiva da mesma tessitura. Conforme preleciona a tradicional doutrina processual, não é possível identificar uma distinção essencial entre as execuções definitiva e provisória [11]. Ambas são processadas de maneira idêntica, mas apenas a definitiva não se submete à possibilidade direta e imediata de alteração ou sustação.

Nesse sentido, o elemento essencial para a caracterização da execução provisória é apenas a inexistência de efeito suspensivo atribuído ao recurso. A suspensividade é efeito próprio do recurso, que, no entanto, influi de maneira decisiva na exeqüibilidade do julgado. A atribuição de efeito suspensivo ao recurso, impede a tutela de executiva de caráter provisório, postergando a satisfação da obrigação da qual o autor é titular. Segundo preleciona Nelson Nery Júnior: "...o efeito suspensivo é uma qualidade do recurso que adia a produção dos efeitos da decisão impugnada assim que interposto recurso, qualidade essa que perdura até que transite em julgado a decisão..." [12] . É o efeito atribuído ao meio recursal o elemento que determinará a execução provisória, ou seja, sendo atribuído o efeito suspensivo desaparece a possibilidade de manejo de execução provisória.

No direito processual do trabalho, praticamente inexistem recursos com efeito suspensivo, tendo em vista que a regra geral preconizada pela CLT, art. 899, atribui apenas o efeito devolutivo aos recursos trabalhistas. De maneira expressa, a legislação só reconhece a possibilidade direta de concessão de efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto em face de decisão em dissídio coletivo (Lei nº. 10.192, de 14 de fevereiro de 2001, art. 14). Há, todavia, a possibilidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso em sede de tutela cautelar incidental, conforme referendado pela Súmula nº. 414, I do Tribunal Superior do Trabalho [13]. De toda forma, no âmbito do direito processual do trabalho, a concessão de efeito suspensivo aos recursos reveste-se de caráter de absoluta excepcionalidade, prevalecendo, na maioria dos casos, a regra inserida na CLT, art. 899.

A natureza do recurso não é elemento determinante para se autorizar ou vedar o início da execução provisória. É plenamente possível a utilização do instituto na pendência de recurso ordinário, recurso de revista, agravo de instrumento, recurso extraordinário perante o Supremo Tribunal Federal, ou qualquer outra modalidade recursal não submetida a efeito suspensivo. Algumas considerações, no entanto, devem ser tecidas quanto à possibilidade da execução provisória na pendência de agravo de petição, tendo em vista que se trata de hipótese recursal própria para discutir as decisões judiciais em sede de tutela executiva. É que, na sistemática do direito processual do trabalho, o agravo de petição apresenta-se como o meio recursal típico para discutir as decisões proferidas no âmbito da tutela executiva [14], o que poderia levar à conclusão apressada da incompatibilidade dessa modalidade recursal com a execução provisória.

Segundo dispõe a CLT, art. 897, § 1º, na pendência do agravo de petição só existe a possibilidade de exeqüibilidade dos valores que não foram objeto da insurreição do recorrente. Sendo assim, poder-se-ia entender, de maneira mais apressada, que os atos executórios ou valores que foram objeto de impugnação não poderão ser alvos do procedimento de execução provisória.

Nesse aspecto, a doutrina apresenta-se dividida [15] e para muitos a discussão seria absolutamente estéril, tendo em vista que a finalidade precípua do agravo de petição é discutir a própria prática dos atos executivos, não se podendo falar em execução provisória. Além do mais, para os que acreditam que a execução provisória se encerra na penhora, não haveria qualquer importância na discussão. Acreditamos que modernamente o trato do problema pode tomar outros rumos.

Observe-se que a regra inserta no âmbito do parágrafo primeiro do art. 897 não se refere à execução provisória, mas sim à definitiva, tendo em vista que se autoriza apenas o fracionamento da parte incontroversa da condenação. Ora, se não há mais qualquer impugnação em determinado montante da condenação imposta ao réu, a execução é de caráter definitivo. Provisória seria, portanto, a execução fulcrada nos limites da condenação objeto da insurreição do agravante e ainda pendente de apreciação pelo Tribunal.

Na maioria dos casos, essa configuração advém do manejo dos embargos como forma de tutela do direito do devedor, sendo absolutamente necessária a análise dos aspectos concernentes à suspensividade ou não da tutela executiva. Tradicionalmente assimilou-se, no âmbito da processualística, a idéia de que o oferecimento dos embargos, como meio de oposição do devedor, já ocasionaria a suspensão da tutela executiva [16].

O advento da Lei nº. 11.232/05 trouxe uma sistemática diferenciada para os embargos do devedor no âmbito do direito processual civil, inclusive estabelecendo uma terminologia própria, ou seja, impugnação ao cumprimento da sentença (CPC, art. 475-J, § 1º). Mas não apenas o meio impugnativo foi modificado, mas também a sua própria natureza, que deixou de ser de ação autônoma e passou a ser de mero incidente processual. Além do mais, a regra de suspensividade imediata dos antigos embargos restou atenuada, ficando ao critério do Juiz determinar a suspensão ou não do processo até a decisão, nos termos do CPC, art. 475-M. A suspensividade da execução em face do ajuizamento do meio de tutela do devedor é, portanto, dependente da ocorrência de sério gravame, devida e cabalmente demonstrado perante o Juiz condutor da tutela executiva [17].

Ora, não vislumbramos qualquer óbice para a aplicação da referida regra ao direito processual do trabalho. Na realidade, a CLT limitou-se a tratar da questão relativa aos embargos do devedor no âmbito do seu art. 884, e nunca dedicou uma única linha ao problema da suspensividade ou não da execução. Operava-se a suspensão da execução, tão-somente, por que assim determinava o CPC em seu art. 739, § 1º [18]. Nunca houve nenhuma regra própria da sistemática processual laboral prevendo a suspensividade ou não dos embargos. E até mesmo a Lei nº. 6.830/80, norma tradicionalmente destinada à aplicação subsidiária à tutela executiva trabalhista (CLT, art. 889), é totalmente omissa em relação ao tema.

Nesse sentido, se os próprios embargos do devedor, a partir da vigência da Lei nº. 11.232/2005, perderam o caráter geral da suspensividade da execução, não se pode atribuir essa qualidade ao recurso contra essa decisão. Demonstra-se assim, a plena possibilidade de manejo da execução provisória na pendência de agravo de petição.

Aliás, conforme asseveramos acima, o meio recursal manejado pelo devedor não é determinante para a autorização da execução provisória, mas sim o efeito atribuído ao respectivo remédio.


4. Da provocação da tutela executiva provisória.

No âmbito do direito processual civil a execução provisória tem início pela provocação da parte interessada, não sendo possível a provocação de ofício pelo juiz (CPC, art. 475-O, I). Esse viés procedimental, no entanto, não pode ser transmitido ao direito processual do trabalho. É característica marcante e indelével do processo do trabalho a postura inquisitorial do Juiz do Trabalho, podendo adotar as medidas que entenda necessárias para a concretização da tutela jurisdicional (CLT, art. 765). Esse caráter dinâmico e proativo da prestação jurisdicional trabalhista apresenta-se de maneira ainda mais contundente quando nos deparamos com a tutela executiva. É que, em se tratando de desencadeamento dessa fase procedimental, há previsão expressa de atuação de ofício do Juiz, não só para iniciar o procedimento de liquidação (CLT, art. 879), como também da própria prática dos atos executivos (CLT, 878). Segundo preleciona Manoel Antônio Teixeira Filho, "...quando a norma processual trabalhista (CLT, art. 878, caput) atribui ao juiz o poder-faculdade de promover a execução, não se deve pensar que essa iniciativa judicial se esgota no ato de dar início a esse processo, se não se estende ao conjunto dos atos integrantes do procedimento executivo – exceto se , em dado momento, a atuação da parte for indispensável." [19]

Vê-se, pois, que a atividade jurisdicional, nos limites da tutela executiva, não se exaure no simples desencadeamento dos atos de concretização do comando constante no título executivo. Envolve igualmente a prática de todos os atos executórios necessários à integral prestação da tutela jurisdicional.

Não é demais mencionar que o impulso oficial para a prestação da tutela jurisdicional de cunho executivo consagrou-se como característica intrínseca do direito processual do trabalho, quando da previsão da possibilidade de execução de ofício das contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho. A instituição dessa providência executória ex officio deu-se, inicialmente, por intermédio da Emenda Constitucional nº. 20, de 15 de dezembro de 1998, que acresceu o parágrafo terceiro ao antigo art. 114 do texto constitucional. A Emenda Constitucional nº. 45, de 08 de dezembro de 2004 manteve a mesma redação do dispositivo apenas procedendo ao deslocamento para o atual inciso VIII do art. 114.

A auto-provocação da tutela executiva é, portanto, procedimento típico e específico do direito processual do trabalho. Trata-se de característica absolutamente ausente no direito processual civil que, mesmo eliminando com maestria a necessidade de um procedimento autônomo para a execução de títulos judiciais, manteve a exigência de provocação do devedor (CPC, art. 475-J, caput) como requisito para a concretização da tutela executiva. Essa particularidade prevista no âmbito do processo laboral não se esvai pela simples aplicação subsidiária das normas de direito processual comum, que deverá preservar as características essenciais do regramento trabalhista (CLT, art. 765) [20].

Ora, se a auto-provocação da tutela executiva é admissível no âmbito da execução dita definitiva, qual é a razão de não ser possível em sede de execução provisória. Frise-se que, do ponto de vista ontológico, não há qualquer distinção entre as execuções provisória e definitiva. Ambas implicam na prática de atos sub-rogatórios buscando a satisfação da pretensão reconhecida em juízo. Apenas a possibilidade de suspensão dos atos executórios e de reversibilidade do conteúdo do título executivo estabelecem o marco divisório entre as espécies de execução acima citadas. Se não existem distinções essenciais nas modalidades executivas, não há fundamento lógico para se vedar a auto-provocação da tutela executiva provisória.

Não se argumente que essa possibilidade não é contemplada pelo direito processual civil, conforme preceitua o CPC, art. 475-O, caput e I . Esse não é o argumento essencial para se afastar a provocação de ofício da execução provisória, posto que, conforme já afirmamos, no ambiente do direito processual do trabalho a auto-provocação da tutela executiva ostenta a qualidade de característica essencial. Não se vislumbra, por conseguinte, qualquer óbice para que seja aplicado à sistemática da execução provisória trabalhista o contido na CLT, art. 878, tendo início o procedimento executivo precário por determinação do Juízo.

Dificuldades de ordem prática, no entanto, podem inviabilizar a auto-provocação da tutela executiva provisória. Dependendo da modalidade recursal manejada pela parte, os autos principais podem ou não permanecer no âmbito do juízo condutor da execução, havendo na segunda hipótese a necessidade de expedição da chamada carta de sentença [21]. Assim, por exemplo, o processamento da execução provisória na pendência de recurso ordinário ou de revista pressupõe, necessariamente, a expedição de autos suplementares para a concretização da execução provisória. O mesmo não ocorre quando, por exemplo, a parte intenta agravo de instrumento buscando discutir a decisão interlocutória que nega seguimento a recurso (CLT, art. 897, b). Nesse caso, os autos principais permanecem no juízo de primeiro, não havendo necessidade da expedição de autos suplementares, tendo em vista que a execução poderá ser processada nos autos principais.

Não havendo necessidade de processamento da execução em autos apartados, não há qualquer óbice para o início da execução provisória, o que, inclusive, deveria ser a regra no âmbito da Justiça do Trabalho. Por outro lado, quando houver a necessidade de expedição de carta de sentença, a provocação de ofício da execução provisória depende de atuação direta da Secretaria da Vara do Trabalho na extração das peças necessárias (CPC, art. 475-O, § 3º). É possível que as limitações de ordem material impeçam a prática desse ato e, portanto, inviabilizem a concretização da provocação de ofício da execução provisória. De toda forma, não se vislumbra qualquer tipo de impedimento para que a execução provisória seja provocada de ofício pelo Juiz.


5. Da responsabilidade do exeqüente pela execução provisória e da prestação de caução.

Muito embora, conforme defendemos no item anterior, seja possível o desencadeamento da execução provisória de ofício, o exeqüente será sempre responsabilizado por eventuais modificações no título executivo. O caráter provisório da tutela executiva permite que, diante do provimento do meio recursal manejado pelo executado, o conteúdo do título sofra alterações nos limites estabelecidos na condenação.

O exeqüente, por conseguinte, responsabiliza-se integralmente por eventuais alterações no âmbito da condenação trazida pela condenação. O caráter protecionista ínsito ao direito processual do trabalho não retira, portanto, a possibilidade de reversibilidade do julgado objeto da execução provisória. Nesse sentido, a legislação processual civil preconiza que o exeqüente "...se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido" (CPC, art. 475-O, I). Isso significa que a responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos decorrentes da reversibilidade é de índole objetiva e não envolve apenas a devolução dos valores, porventura, recebidos indevidamente, mas sim os efetivos prejuízos que venham a ser causados ao devedor. Esses prejuízos devem ser liquidados nos próprios autos, voltando-se a tutela executiva contra o próprio exeqüente (CPC, 475-O, II).

Não visualizamos qualquer óbice para a adoção desse procedimento ao direito processual do trabalho. É certo que a maioria esmagadora daqueles que buscam a Justiça do Trabalho é formada por indivíduos destituídos de patrimônio ou mesmo de qualquer meio de sobrevivência. Esse dado grave do ponto de vista social, no entanto, não é, por si só, entrave para o reconhecimento da responsabilidade objetiva no âmbito da execução provisória. Caso o credor trabalhista, diante da reversão do conteúdo do julgado que desencadeou a execução provisória, não disponha de patrimônio para responder pelo ressarcimento dos danos, teremos mais uma execução paralisada diante a inexistência de bens passíveis de penhora [22]. De toda forma, a reforma parcial ou total do julgado gera a obrigatoriedade de ressarcimento dos prejuízos ao devedor, independentemente da demonstração de culpa ou dolo.

O processo civil, no entanto, é bem mais abrangente nesse particular, responsabilizando integralmente o exeqüente pelas despesas decorrentes da atuação executiva provisória, conforme se vê da primeira parte do inciso I do art. 475-O do CPC. Essa regra inclui todo e qualquer dispêndio necessário à condução do processo de execução, como por exemplo, custas, emolumentos e pagamento de diligências dos Oficiais de Justiça. A referida normatização, no entanto, revela-se incompatível com a sistemática do direito processual do trabalho. Nesse ramo da processualística das despesas gerais da execução, consistentes no pagamento das custas e das diligências dos Oficiais de Justiça, são pagas ao término da tramitação processual sendo invariavelmente de responsabilidade do devedor (CLT, art. 789-A, caput).

Não se exime, no entanto, o credor trabalhista da prestação da caução quando esta for exigida pela lei processual civil. Não vejo qualquer tipo de incompatibilidade na aplicação da vigente regulamentação do caucionamento para fins de execução provisória.

Originalmente a legislação processual civil preconizava a necessidade de prestação de caução como pressuposto para desencadeamento da execução provisória [23]. Essa exigência, no entanto, foi subtraída pelo advento da Lei nº. 10.444, de 07 de maio de 2002, que passou a exigir a prestação de caução apenas para a prática de atos de alienação ou de levantamento de dinheiro (antiga redação da CPC, art. 588, I). O texto vigente manteve a mesma exigência, apenas com o deslocamento físico da norma para o 475-O, III. Logo, a prestação de caução só será exigível quando forem praticados atos que importem em alienação judicial de bens ou levantamento de dinheiro.

A despeito de opiniões em contrário, não existe óbice para se exigir do credor trabalhista o caucionamento da execução provisória para que ele atinja os atos de conversão do patrimônio em pecúnia, ou mesmo do levantamento de numerário, porventura, depositado. Muito embora não seja prática corriqueira nos foros trabalhistas (até pela condição econômico-financeira dos autores das ações trabalhistas), nada obsta que, após o integral aperfeiçoamento da penhora de bens, ou mesmo depositado o valor da execução, proceda o exeqüente à prestação de garantia visando à continuidade da execução.

Essa garantia será prestada nos próprios autos onde tramita a execução provisória e arbitrada pelo Juiz condutor do feito (CPC, art. 475-O, III). A aceitação da caução oferecida pelo exeqüente e a determinação de continuidade da execução provisória é decisão de caráter interlocutório e, nessa categoria, não pode ser objeto de recurso imediato, nos termos da CLT, art. 893, § 1º. Caso a caução não se afigure idônea a único remédio possível para o executado é lançar mão do mandado de segurança, visando à tutela de pretenso direito líquido e certo atingido.


6. Das hipóteses de dispensa da caução.

Além de postergar a exigência da caução para a concretização das fases finais da liquidação, a normatização vigente da execução provisória cível preconiza duas hipóteses de dispensa da prestação de garantia por parte do exeqüente (CPC, art. 475-O, § 2º). A legislação processual civil [24] descreve duas situações em que, a despeito da provisoriedade da execução, é possível concretizarem-se integralmente os atos executórios, mesmo sem garantia dada pelo credor.

Trata-se de medida extremamente lúcida e sintonizada com uma realidade processual que necessita se apresentar dinâmica e efetiva. Ao se impedir a implementação integral dos atos executórios com a finalidade de se aguardar o pleno exaurimento das instâncias recursais, estar-se-ia atribuindo exclusivamente ao credor o ônus pelo retardo processual. O direito processual contemporâneo busca, de certa forma, ratear entre o autor e o réu os contratempos pela demora na prestação jurisdicional que, na maioria das vezes, ocorre pelo manejo desnecessário de medidas defensivas.

Assim, ao se tornar relativa a exigência de garantia para a continuidade da execução provisória, o direito processual faz com que o retardo na obtenção da coisa julgada não seja situação beneficiadora apenas do executado. Distribuem-se, de forma equânime, entre credor e devedor os resultados indesejados da manipulação excessiva e irracional dos meios recursais. Generalizar essa possibilidade é, portanto, medida que visa a integralizar o ideal de efetividade da prestação jurisdicional em relação a todos os envolvidos na relação processual. Essa constatação ganha ainda mais pujança quando nos defrontamos com a tutela executiva decorrente de título judicial, já devidamente referendado pelo poder judiciário. Permitir que apenas venham a ser prevenidos os danos causados ao devedor é, no mínimo, solapador do princípio da isonomia tão eloqüentemente descrito no caput do art. 5º da CF.

Nesse sentido, a legislação processual civil permite que sejam praticados todos os atos executivos de desapossamento e de conversão quando o devedor prestar caução (CPC, art. 475-O, III). No entanto, admite a legislação processual civil que, mesmo sem a garantia oferecida pelo exeqüente, os atos executivos possam envolver ações relativas à alienação do patrimônio penhorado, bem como o próprio levantamento, por parte do exeqüente, dos valores depositados. Essa dispensa do caucionamento só poderá ser observada em duas situações bem delimitadas pelo legislador (CPC, art. 475-O, §2º).

A primeira hipótese diz respeito à própria natureza do crédito objeto da condenação. Tratando-se de obrigações de caráter alimentar ou decorrentes da reparação de atos ilícitos, é dispensada a prestação da caução para continuidade da execução provisória. Nessa situação não é bastante que a natureza do crédito seja alimentar, devendo ainda não ultrapassar o montante de sessenta salários mínimos e demonstrar o exeqüente encontrar-se em situação de necessidade (CPC, art. 475-O, §2º, I).

A segunda hipótese apresenta-se bem mais simples e objetiva. Basta que a execução provisória seja promovida na pendência de agravo de instrumento no qual se discute a admissibilidade de recurso extraordinário e especial (CPC, art. 475-O, § 2º, II).

Não visualizamos qualquer impedimento quanto à aplicação das mencionadas excludentes ao direito processual do trabalho. Analiso, tendo em vistas as diversas variáveis do tema, cada uma das hipóteses de forma isolada.

6.1 Da dispensa de caução em função da natureza da dívida.

Conforme já adiantamos anteriormente, a legislação processual isenta da prestação de caução a execução provisória fundada em dívida de caráter alimentar ou fundada em reparação de ato ilícito. A hipótese preconizada pela legislação processual civil adéqua-se perfeitamente ao direito processual do trabalho, onde os créditos postulados gozam de caráter indubitavelmente alimentar. É relevante observar que a simples menção ao caráter alimentar ao crédito trabalhista já seria suficiente para permitir o enquadramento nas disposições do CPC, art. 475-O, §2º, I. No entanto, com a consagração da competência da Justiça do Trabalho para o processamento das ações reparatórias de danos decorrentes da relação de trabalho (CF, art. 114, VI), estamos diante de um duplo fundamento para a aplicação da excludente acima tipificada.

Ressalve-se que as posições doutrinárias quanto à aplicação do mencionado dispositivo legal ao processo do trabalho exaurem-se nas alegações de que a matéria é tratada pela legislação trabalhista, não podendo a execução ultrapassar a fase da penhora, conforme dicção da CLT, art. 899, tese essa refutada nos itens anteriores. Ultrapassada essa objeção, vê-se que o dispositivo em questão se apresenta em plena sintonia com o direito processual do trabalho, tendo em vista que não existe nada mais alimentar do que o crédito trabalhista. Proveniente da alienação da força de trabalho, as condenações trabalhistas enquadram-se perfeitamente no perfil do crédito judicial de caráter alimentar.

A lei, no entanto, limita o valor da condenação a sessenta salários míninos, o que gera um requisito adicional para se deferir a dispensa da prestação da caução para continuidade da execução provisória. O valor há de ser aferido quando o montante da condenação se tornar líquido, o que pode acontecer tanto no ato de prolação da sentença de primeiro grau ou após a concretização do incidente de liquidação. De toda forma, no momento em que a condenação se torna líquida é que se torna aferível a dispensa ou não da prestação da caução.

Constatado o enquadramento do crédito trabalhista nos limites preconizados pela legislação processual, a execução provisória concretiza-se, com a ampla possibilidade de serem praticados atos de alienação patrimonial e de levantamento de numerário. Observe-se, entretanto, que a ausência de liquidez do provimento jurisdicional não é óbice para que se inicie a prática dos atos de índole executória. Nesse caso, a efetivação dos atos iniciais de execução provisória será precedida da liquidação do julgado, nos precisos termos da CLT, art. 879 e CPC, art. 475-A, § 2º, tendo em vista que tais atos, conforme já vimos, não dependem de prestação de caução para a sua realização. Após a liquidação do feito, diante do valor encontrado, deliberará o Juiz se a execução provisória continuará em relação aos atos de disposição patrimonial, mesmo sem a prestação de caução.

Outras questões interessantes podem surgir em relação ao limite de sessenta salários mínimos, fixado em lei. A primeira delas consiste em indagar que, em se tratando de condenações superiores a sessenta salários mínimos, seria possível ao credor vindicar a continuidade da execução apenas em relação à parcela mínima preconizada pelo legislador. Na realidade, o limite fixado pelo legislador buscou o atendimento de necessidades mínimas provenientes do crédito alimentar. A norma em questão não fixou os parâmetros buscando prevenir a eventual dificuldade de reversibilidade dos atos executórios, mas sim de atender às necessidades vitais com crédito de natureza alimentar.

Sendo assim, quando for possível o fracionamento da execução, sem prejuízo da reversibilidade da execução provisória, o Juiz poderá determinar a prática dos atos processuais necessários à efetivação do comando, até o limite imposto por lei. Nesse caso, tratando-se de depósito em dinheiro, não se vislumbra qualquer impedimento de que se proceda à liberação até o limite de sessenta salários mínimos, permanecendo intacto o limite que sobejar. Tal situação não se revela tão cômoda quando a execução superior a sessenta salários mínimos se encontrar garantida por um bem, pois a dificuldade de reversão se apresenta pela possibilidade de alienação de bem de grande valia. Nessa hipótese, tendo em mira o critério esboçado pelo legislador, não vislumbramos a possibilidade de continuar a execução provisória apenas em relação ao montante máximo preconizado pela norma processual.

Outra questão que deflui da execução provisória diz respeito à cumulatividade ou não da execução previdenciária para o fim de fixação do limite de sessenta salários míninos. A ordem constitucional vigente atribui à Justiça do Trabalho a competência de processar de ofício a execução das contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças que proferir (CF, art. 114, VIII). É possível ocorrer situação na qual o crédito trabalhista não atinja o montante de sessenta salários mínimos, no entanto o acréscimo decorrente dos valores relativos às contribuições previdenciárias ultrapasse o limite preconizado pela legislação processual. Nesse caso, o valor a ser considerado é apenas do crédito trabalhista, ignorando o montante atribuído ao crédito de índole previdenciária. Notem que estamos diante de execuções diferentes e que não ostentam os mesmo titulares. Muito embora tenham origem no mesmo ato jurisdicional, ostentam títulos executivos diferentes e características díspares [25]. É certo que as execuções são processadas de forma conjunta (CLT, art. 880), no entanto apresentam créditos absolutamente distintos e desvinculados, não sendo possível o seu acréscimo para fins de tipificação de limites legais. Além do mais, tendo em vista a natureza jurídica do débito previdenciário, não se lhe aplicam as disposições concernentes aos créditos de caráter alimentar.

O disposto no CPC, art. 475-O, §2º, I não delimita apenas a natureza do débito (alimentar ou decorrente da reparação de ilícito) e seu montante (até sessenta salários mínimos). Exige, para o fim de dispensa da prestação de caução, que o credor demonstre "...situação de necessidade". Essa insólita expressão já constava do texto revogado pela Lei nº. 11.232/05, que no entanto não exigia a demonstração de uma "...situação...", mas sim de um "...estado de necessidade". Necessidade ou estado, o certo é que o legislador não foi feliz ao estabelecer a obrigatoriedade de o credor demonstrar que passa por privações para poder exigir do devedor a satisfação de seu crédito alimentar. Trata-se realmente de uma situação paradoxal, posto que, mesmo reconhecendo a necessidade de rapidez na concretização do crédito de índole alimentar, se exige do credor a demonstração inequívoca que esteja passando por privações. A necessidade premente é decorrência da própria natureza do crédito e o fato de eventualmente o devedor não depender daqueles recursos para o atendimento de suas necessidades básicas não tem o condão de retirar a essencialidade dos créditos guerreados.

Tratando-se de créditos alimentares reconhecidos no âmbito da Justiça do Trabalho, a ocorrência da situação de necessidade é praticamente inerente aos demandantes. A realidade social espelhada pela Justiça do Trabalho demonstra que aqueles que esperam anos pela integralização de seus créditos alimentares normalmente estão desempregados ou, quando muito, submetidos a subempregos, tendo em vista a pouca expectativa de retornarem ao mercado de trabalho formal. Nesse sentido, a existência da situação de necessidade é uma característica indelével do exeqüente da Justiça do Trabalho, sendo exceção a plenitude da capacidade econômica em tais situações. É sob essa ótica que deve se debruçar o magistrado, presumindo a existência da necessidade premente do exeqüente e indeferindo a postulação de continuidade da execução provisória apenas naquelas hipóteses onde se escancara a higidez econômica do postulante.

6.2 Da dispensa de caução na pendência de agravo de instrumento.

Trouxe a Lei nº. 11.232/05 uma salutar modificação na sistemática da execução provisória civil, ao admitir a dispensa de caucionamento quando o recurso que torna a execução provisória seja agravo de instrumento manejado contra despacho denegatório de subida de recurso especial ou extraordinário (CPC, art. 475-O, § 2º, II). O uso excessivo de recursos de natureza extraordinária perante os nossos tribunais superiores é uma da causas principais para o congestionamento do poder judiciário [26]. Essa verdadeira banalização dos recursos certamente representou a principal motivação para que se procedesse à modificação acima descrita, pois torna menos atrativo o retardo na tramitação dos feitos, tendo em vista a possibilidade de o devedor impulsionar a execução até seus últimos atos.

Nesta hipótese de dispensa do caucionamento, não é necessário pesquisar a natureza ou o montante da execução, bastando a pendência de agravo de instrumento onde se discuta a decisão que trancou o recurso de natureza extraordinária. É imperioso destacar que a tessitura da execução provisória na pendência de recurso extraordinário não é diferente daquela processada na pendência dos outros recursos. A falta de pronunciamento definitivo nos recursos endereçados aos tribunais superiores impede o trânsito em julgado da decisão e a conseqüente definitividade da tutela executiva. O que preconiza a legislação processual civil é, tão-somente, a dispensa do caucionamento quando a parte, diante da negativa de seguimento recurso, intenta agravo de instrumento.

Configurando-se a hipótese apresentada, a atividade executiva, mesmo sendo de caráter provisório, implica na autorização da prática de atos de alienação ou levantamento de numerário. Notem que nessa hipótese o legislador foi claro ao estabelecer a dispensa de caução como regra geral, só sendo vedada quando a "...dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação.". Sem que essa situação de risco se manifeste nos autos, não há como obstar a continuidade da tutela executiva, mesmo sem a respectiva garantia. A lógica trazida pelo legislador, portanto, afigura-se clara: a prática da plenitude dos atos executivos sem caução só não ocorrerá se restar demonstrado nos autos que ocorrerá dano de difícil ou incerta reparação. Esse risco deve ser aferido diante da efetiva possibilidade de reforma do julgado pelos recursos de natureza extraordinária.

Essa salutar inovação trazida pela Lei nº. 11.232/05 é plenamente aplicável à sistemática do direito processual, tendo em vista não contrariar qualquer tipo de garantia ou característica basilar deste ramo da processualística. Não se argumente que o texto do CPC, art. 475-O, § 2º, II se reporta expressamente a modalidades recursais alheias ao direito processual do trabalho. Na verdade, o legislador procedeu à indicação de recursos de natureza extraordinária manejáveis perante o direito processual civil. É certo que, no âmbito do direito processual do trabalho, não é possível o manejo do recurso especial, no entanto este ramo da processualística também ostenta um meio recursal de natureza extraordinária, ou seja, o recurso de revista (CLT, art. 897). Ressalte-se que a função exercida pelo recurso de revista no âmbito do processo do trabalho é até mais ampla do que aquela exercida pelo recurso especial na sistemática do processo civil. As hipóteses de cabimento do recurso de revista envolvem a divergência jurisprudencial (CLT, art. 896, a e b), a violação de lei federal (CLT, art. 896, c) e afronta ao texto constitucional (CLT, art. 896, c). Já no âmbito do recurso especial, as hipóteses de cabimento limitam-se à divergência jurisprudencial (CF, art. 105, III, c) e à validade de legislação federal e de tratado internacional (CF, art. 105, III, a e b).

A única distinção entre as modalidades recursais reside no fato de que, no âmbito do recurso especial, não é possível a discussão da matéria constitucional, enquanto que, no recurso de revista, o maltrato do texto constitucional faz parte de seu conteúdo. Essas diferenças pontuais, portanto, não são capazes de afastar a aplicação subsidiária do processo civil.

O mencionado problema, no entanto, não existe em relação ao recurso extraordinário, tendo em vista que esta modalidade recursal exerce no âmbito da justiça do trabalho as mesmas funções desempenhadas nos limites dos demais ramos do poder judiciário (CF, art. 102, III, a e b).

Além do mais, sob a ótica do direito processual do trabalho, a única função exercida pelo agravo de instrumento é exatamente atacar a decisão interlocutória que nega seguimento a recurso (CLT, art.897, b). Vê-se, portanto, que não há qualquer tipo de incompatibilidade para a absorção deste procedimento ao direito processual do trabalho.

Do ponto de vista estritamente prático, a condução da execução provisória na pendência do agravo de instrumento é procedimento amplamente facilitado pela desnecessidade de formação de autos suplementares. A execução processar-se-á no âmbito dos autos principais, que permanecem perante o órgão competente para a prática dos atos processuais de cunho executório.

Como já afirmamos anteriormente, a pendência do agravo de instrumento autoriza, de forma genérica, a plenitude dos atos executivos, sem a prestação de caução. Apenas se restar demonstrada a possibilidade de ocorrência de grave dano, cuja reparação seja improvável, o juízo obstará a continuidade da execução até seus trâmites finais. Esse prejuízo ou gravame deve ser demonstrado de maneira clara e inequívoca, pelo que a simples possibilidade de reforma dos julgados proferidos pelos órgãos jurisdicionais de primeiro e segundo graus não é suficiente para afastar a incidência do dispositivo legal em questão. Como bem assevera Athos de Gusmão Carneiro, "...são igualmente incluídos, agora sem limite quantitativo e sem exigência de pobreza, os casos de execução provisória requerida na pendência e agravo de instrumento ao STF ou ao STJ (agravos não impugnados a não-admissão, pela presidência do tribunal a quo, de recurso extraordinário ou recurso especial); com isso busca-se desestimular a utilização de tal agravo apenas para ‘ganhar tempo’. Todavia, é ressalvada a hipótese em que a execução provisória possa ‘manifestamente’ resultar grave e irreparável dano ao executado (suposto, é claro, um exame, embora superficial, da ‘verossimilhança’ das alegações do recorrente; se o agravo aparente ser procrastinatório, não irá ser imposta caução ao devedor...)" [27].

Ora, se pela análise do tema debatido no recurso manejado verifica-se a reduzida probabilidade de êxito no recurso de revista ou extraordinário, não se afigura o risco de se causar gravame ao devedor. Nesse mesmo sentido, caso a decisão proferida no âmbito da instância ordinária contrariar a jurisprudência dominante nos Tribunais Superiores, a probabilidade de êxito afigura-se palpável, sendo recomendável o indeferimento da continuidade da execução. Nessa situação, existe a possibilidade de reforma do julgado e, conseqüentemente, evidencia-se o risco da reforma do título lastreador da execução, o que tornaria o provável desfazimento da execução um argumento relevante para a sustação dos atos executórios de caráter provisório. Observe-se, por outro lado, que a situação acima relatada não é corriqueira no âmbito da Justiça do Trabalho. A maioria esmagadora dos recursos submetidos à análise do Tribunal Superior do Trabalho não consegue a reforma das decisões proferidas pelas instâncias inferiores [28].

Da mesma forma, o mero temor de o credor beneficiado pela execução provisória não poder ressarcir os valores recebidos após a reforma da decisão não justifica o indeferimento da dispensa do caucionamento. A possibilidade de não existir patrimônio capaz de garantir a obrigação é risco inerente à própria atividade executiva. Ora, o credor, no âmbito da atividade executiva, não tem certeza quanto ao recebimento do seu crédito, tendo em vista que a insolvência do devedor torna inócua a tutela executiva. Mesma situação enfrentará o devedor que, diante da reforma do julgado lastreador da execução, busque a devolução dos valores recebidos pelo credor em sede de execução provisória. Caso não exista patrimônio para a satisfação do crédito revertido, há de se conformar com a impossibilidade de concretização da execução. Infelizmente será mais uma ação adicionada na triste estatística dos créditos não adimplidos perante a Justiça do Trabalho.

Nesse sentido, a análise da possibilidade de ocorrência de dano deve ser aferida in concreto pelo magistrado, em função da matéria debatida em sede de recurso de natureza extraordinária. O perigo da irreversibilidade da situação criada pela execução provisória deverá ser aferido, por conseguinte, do ponto de vista processual e não levando em consideração a pujança econômica do devedor e a possibilidade de um eventual ressarcimento dos valores, porventura, recebidos. A irreversibilidade não deve ser, nesse caso, avaliada nos mesmo termos dos provimentos antecipatórios ou cautelares, onde se pontifica a própria instabilidade e a provisoriedade da medida. Não se confunde execução provisória com antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional ou provimentos cautelares. Como bem acentua José Roberto Bedaque, "Não tem caráter provisório e não guarda relação de instrumentalidade com outra tutela...Também inexiste nexo entre a execução provisória e eventual risco de inutilidade da tutela futura. O periculum in mora, embora possa justificar medidas de natureza não cautelar, é requisito inafastável dessa modalidade de tutela urgente. ...Para explicar-se a execução provisória não se leva em consideração esse elemento. Pensa tão-somente na eficácia imediata da sentença ainda sujeita a recurso, o que se deve a mera opção político-legislativa, e na conveniência de não permitir que ela gere efeitos no plano material enquanto não se tornar definitiva." [29].

Não sendo a execução provisória uma tutela de urgência, a irreversibilidade dos atos jurisdicionais não pode ser aferida nos mesmos moldes desse instituto. Ou seja, não há de se mensurar a irreversibilidade no seu plano fático, mas sim estritamente processual. Logo, quando a legislação processual se reporta à incerteza e à dificuldade da reparação do dano proveniente da reversão do julgado (CPC, art. 475-O, § 2º, II), ela não se refere à viabilidade econômica da reposição pecuniária por parte do devedor, mas sim à probabilidade de tal modificação ocorrer.

Finalmente, ressalte-se que não é possível aplicar o disposto no CPC, art. 475-O, §2º, quando o agravo de instrumento discutir o trancamento de outra modalidade recursal, como o recurso ordinário ou agravo de petição. O espectro do dispositivo legal analisado envolve apenas os recursos de natureza extraordinária, sendo bem expressa essa delimitação. Nesse sentido, a pendência do agravo de instrumento em modalidades recursais que não sejam o recurso de revista ou extraordinário enseja a execução provisória, mas não a dispensa imediata da garantia, salvo se for configurada a hipótese de CPC, art. 475-O, § 2º, I.


7. Da formação de autos suplementares.

Mesmo manejado em seu efeito meramente devolutivo, o ajuizamento do recurso pressupõe a remessa dos autos principais ao tribunal competente para o seu julgamento. Sendo assim, surge a necessidade de serem formados autos suplementares que viabilizam a prática dos atos executivos. Na sistemática anterior a Lei nº. 11.232/05 era exigida a formação de carta de sentença para a concretização da execução provisória. Essa carta de sentença apresentava requisitos mais rígidos para sua formação, os quais eram relacionados pelo antigo art. 590 do CPC [30]. Na realidade o termo carta de sentença ainda continua a ser utilizado pelo CPC (art. 484) e pela própria CLT (art. 897, §§ 1º e 3º). Não se afigura, no nosso entender, relevante a discussão quanto ao termo carta de sentença ou autos suplementares. Mesmo quando a legislação processual era expressa ao se reportar ao termo carta de sentença, não se pode dizer que o instituto poderia ser categorizado de forma autônoma, bem como que pudesse alterar a natureza jurídica da execução provisória.

Observe-se que a formação da carta de sentença é apenas uma exigência de natureza prática, tendo em vista que, com a subida dos autos, a execução só poderá ser operacionalizada com as peças dos autos principais. Ou seja, a falta de cópias das principais partes dos autos principais inviabiliza a própria execução provisória. Por outro lado, é possível que a execução provisória se processe mesmo sem a formação de autos suplementares, como é o caso da execução provisória na pendência de agravo de instrumento.

De toda forma, a legislação processual civil estabelece as peças obrigatórias para a formação dos autos da execução provisória, nos termos dos incisos do § 3º do art. 475-O do CPC. Essas peças obviamente incluem a sentença ou acórdão a ser executado (inciso I), certidão relatando a interposição de recurso com efeito meramente devolutivo (inciso II), procurações atribuídas aos advogados do exeqüente e do executado (inciso III) e a decisão de habilitação, no caso de substituição do exeqüente ou do executado (inciso IV). A norma jurídica em questão ainda se reporta a peças que sejam, a critério do exeqüente, consideradas essenciais para a execução provisória (inciso V).

Observe-se que, muito embora, a norma processual deixe ao alvedrio do exeqüente a juntada das peças não obrigatórias, é importante ressaltar que algumas peças não expressamente relacionadas no texto podem ser essenciais para a efetivação da execução provisória. Nesse caso, é possível que o Juiz determine a juntada de cópias complementares, como por exemplo, o memorial de cálculos homologados (CLT, art. 879, § 2º).

Tratando-se de execução provisória determinada de ofício , conforme expusemos no item 04, as cópias poderão ser requisitadas pelo Juízo e até providenciadas pela Secretaria da Vara, em situações excepcionais.


8. Os efeitos da reversibilidade da sentença perante terceiros.

Já foi exposto anteriormente que o exeqüente deverá responder de forma objetiva pelos prejuízos decorrentes da reversibilidade do julgado na pendência da execução provisória. Isso significa dizer que o exeqüente deverá devolver os valores, porventura recebidos em sede de tutela executiva provisória, bem como a ressarcir os prejuízos enfrentados pelo devedor. Os limites e os efeitos da responsabilidade do devedor, portanto, acham-se plenamente definidos na legislação processual.

Não há, no entanto, regramento específico em relação aos terceiros eventualmente atingidos pelos efeitos da execução provisória. Nesse caso, o exemplo mais eloqüente é a situação do arrematante que venha a adquirir bem alienado judicialmente na pendência da execução provisória. Ora, essa situação pode ocorrer quando a execução provisória atinja atos que impliquem em alienação do patrimônio, seja porque houve o oferecimento de caução (CPC, art. 475-O, III), ou porque a hipótese se enquadra em uma das exceções preconizadas pelo CPC, art. 475-O, § 2º, I e II.

Sobrevindo a modificação da sentença ou do acórdão, como fica a situação do arrematante que tenha adquirido bem em hasta pública, inclusive com a transferência do domínio através da expedição da carta de arrematação (CPC, art. 703)? A doutrina [31] se divide em relação a este problema, buscando definir a questão por intermédio de duas correntes. A primeira advoga a tese pela qual o terceiro também será atingido pela reversibilidade do julgado, sendo desfeita a arrematação com a entrega do bem arrematado ao executado [32]. A segunda corrente posiciona-se no sentido de que o terceiro não poderá ser responsabilizado pela alteração do conteúdo do título executivo e, tendo agido de boa-fé, não poderá ser privado do bem arrematado, restando ao executado a responsabilização do exeqüente pelos danos [33].

O problema, a despeito das prestigiosas opiniões colacionadas, não é de fácil solução. De fato o intérprete coloca-se em uma encruzilhada onde se chocam os interesses do terceiro e do próprio devedor. Privilegiar o devedor significa restituir a situação ao seu status quo ante, mediante a preservação in natura do patrimônio desapossado do devedor. Por outro lado, a preservação dos interesses do arrematante significa não imputar a terceiro responsabilidade pela reforma de uma decisão judicial que não teve sua participação direta .

A solução do problema não pode deixar de lado a visão teleológica que deve nortear a atividade executiva. Muito embora, a tutela executória deva ser promovida da maneira menos gravosa para o devedor, isso não poderá significar o desrespeito aos interesses dos terceiros, especialmente o arrematante. Com efeito, não se pode transferir ao arrematante o ônus de uma reversibilidade para qual não contribuiu. O oferecimento dos bens a serem arrematados é feito pelo próprio Poder Judiciário que, de certa forma, responsabiliza-se pela concretização do negócio jurídico. É certo que a própria legislação processual vigente (CPC, art. 686, V) determina a indicação, já no edital de arrematação, de que existem recursos pendentes de julgamento. Essa informação, no nosso entender sempre indispensável, não pode atribuir ao arrematante o integral risco de perder a titularidade do bem já transmitida pelo Poder Judiciário.

Assim, se a alteração do conteúdo do título judicial representar a perda do bem adquirido pelo arrematante, haverá um desestímulo para que novas pessoas licitem perante os procedimentos de arrematação. A melhor interpretação, tendo em vista a finalidade precípua da tutela executiva, é isentar o arrematante de qualquer ônus pela reestruturação do título judicial, relegando ao exeqüente a inteira responsabilidade pelo ressarcimento ao executado.


9. A execução provisória e o cumprimento das obrigações de fazer e de não-fazer.

Questão que aflige os processualistas e ainda não foi plenamente resolvida diz respeito à execução provisória de sentenças que contemplam obrigações de fazer e de não-fazer. Tradicionalmente defendeu-se a posição de que as obrigações de fazer e de não-fazer não poderiam ser objeto de execução provisória. O argumento central dessa proposição residia no fato de que essa modalidade de obrigações é, na sua essência, irreversível, só podendo ser concretizada diante do trânsito em julgado da sentença [34]. Observe-se, inclusive, que o próprio Tribunal Superior do Trabalho já partilhou do referido ponto de vista [35], muito embora tenha reformulado sua jurisprudência nesse particular.

Não há dúvidas de que o cumprimento das obrigações de fazer e de não-fazer não se insere com facilidade no âmbito de atuação da execução provisória. Esse instituto foi formulado buscando a aplicação precípua em relação à obrigação de pagar, e as atuais disposições são mais adequadas ao trato da execução por quantia certa contra devedor solvente.

Essa aparente incompatibilidade, no entanto, não pode impedir a concretização temporária das obrigações de fazer e de não-fazer, diante da pendência de recurso sem efeito suspensivo. A diferença substancial entre a execução provisória de obrigação de pagar e de obrigação de fazer é que, nesta hipótese, a execução se opera in natura, por intermédio dos instrumentos próprios das tutelas específicas explicitados no âmbito do CPC, art. 461 e aplicados de forma subsidiária ao processo do trabalho. Como não são adotadas medidas sub-rogatórias buscando o ataque ao patrimônio do devedor, mas sim medidas destinadas ao cumprimento específico da obrigação, conclui-se que é inadequada a discussão acerca da continuidade ou não da execução provisória. Não haverá, portanto, retardamento do cumprimento da referida obrigação, mas apenas a provisoriedade da obrigação de fazer ou de não-fazer cumprida pelo devedor.

É óbvio que, revertida a decisão, se restabelece o status quo ante, inclusive, com o pagamento de indenização ao devedor. No âmbito do direito processual do trabalho a obrigação de fazer corriqueiramente reconhecida nas decisões judiciais consiste na reintegração do empregado. Nessa situação, não se pode falar em pagamento de indenização em favor do empregador, tendo em vista que a prestação dos serviços do empregado reintegrado assume caráter sinalagmático e, nesse caso, as obrigações prestação de serviços e pagamento de salários acham-se mutuamente quitadas. O restabelecimento da situação primígena resume-se à paralisação da prestação dos serviços e do pagamento dos respectivos salários.

Como não existem atos de alienação patrimonial ou mesmo liberação de numerário da execução de obrigações de fazer e de não-fazer, resta claro a inaplicabilidade do inciso II e do parágrafo segundo do art. 475-O do CPC. Assim, na hipótese de pendência de recurso sem efeito suspensivo contra decisão que determina o cumprimento de obrigação de fazer e de não-fazer, resta ao credor (e até mesmo ao Juiz de ofício) dar início ao procedimento executivo provisório, segundo o procedimento acima descrito.

Finalmente, não se deve confundir a execução provisória de obrigação de fazer ou de não-fazer com a efetivação das decisões antecipatórias que contemplem obrigações de idêntica estirpe. Quando o Juiz antecipa os efeitos da tutela e impõe condenação ao réu (CPC, art. 273; CLT, art. 659, IX e X), o cumprimento dessa decisão antecipatória não se consubstancia em uma execução provisória, mas sim em procedimento executivo próprio e autônomo. Nesse caso, a tutela executiva não é provisória, mas sim baseada em título precário. Segundo o processualista Luiz Guilherme Marinoni: "Se é o título que é provisório, pode existir, em tese, execução completa e execução incompleta fundadas em título provisório. O título provisório enquanto a cognição não é definitiva, razão pela qual é correto falar de execução (completa ou incompleta) fundada em título provisório ou de execução (completa ou incompleta) fundada em cognição exauriente, mas não definitiva, bastando lembrar, para demonstrar o equívoco da doutrina tradicional, que a chamada execução provisória do despejo é exatamente uma execução completa fundada em cognição exauriente, mas não definitiva." [36].

Quando a legislação processual se refere ao cumprimento das decisões antecipatórias (CPC, art. 273, § 3º), determina a aplicação "...no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588 [37], 461, §§ 4º e 5º, e 461-A.". Vê-se que, nessa situação, em se tratando de obrigações de fazer e de não fazer, optou o legislador a determinar de forma direta as regras relativas à tutela específica de tais obrigações, preconizadas pelo art. 461 do CPC e aplicáveis, sem qualquer impedimento ao direito processual do trabalho. Ao optar por essa indicação expressa, relegou-se a aplicação das normas relativas à execução provisória ao cumprimento das obrigações de pagar, deixando aos demais tipos de obrigações a aplicação das normas de execução direta.

Nesse sentido, a efetivação das obrigações de fazer e de não-fazer reconhecidas em decisão antecipatória não é hipótese de execução provisória, mas sim de tutela autônoma visando ao cumprimento das obrigações ali reconhecidas. Nesse sentido, Joel Dias Figueira Júnior afirma: "...que os mecanismos coercitivos, punitivos ou assecuratórios capazes de tornar muito mais eficaz a execução da tutela antecipada genérica, a exemplo do que se verifica com o regime das antecipatórias específicas (obrigações de fazer ou não fazer – art. 461), notadamente as regras de fixação das penas de multa – astreintes – (§ 4º), e utilização das medidas necessárias à efetivação da tutela ou obtenção do resultado prático equivalente..." [37].

Além do mais, tratando-se de decisão antecipatória, seja pautada no poder geral antecipatório atribuído ao Juiz (CPC, art. 273) ou nas hipóteses específicas do direito processual do trabalho (CLT, art. 659, IX e X), a questão da irreversibilidade da medida deve ser aferida na prolação da decisão de antecipação e não no seu cumprimento.


Notas

01 Esse fenômeno se agrava quando a parte intenta o recurso de revista perante o Tribunal Superior do Trabalho. Diante de um sistema extremamente acessível para o manejo de pretensões recursais de natureza extraordinária, a mais alta corte trabalhista do país tem recebido um número verdadeiramente insano de recurso. A título de ilustração, no ano de 2005, o Tribunal Superior do Trabalho julgou a assombrosa cifra de 116.294 processos e mesmo assim deixou o ainda mais assombroso resíduo de 272.424 processos (vide Relatório Geral da Justiça do Trabalho – disponível em www.tst.gov.br)

02 O Código de Processo Civil de 1939 já trazia regras semelhantes às atuais quanto à execução provisória, verbis: Art. 883. A execução provisória da sentença obedecerá aos princípios seguintes: I) a execução provisória ficará sem efeito, desde que sobrevenha sentença pela qual se modifique ou anule a que constituir objeto da execução; II) a reparação dos danos que, em conseqüência da execução, sofrer o executado, se reclamará e liquidará nos próprios autos da ação; III) a execução provisória não abrangerá os atos que importarem alienação de domínio, nem autorizará, sem caução idônea, o levantamento de depósito em dinheiro. Observe-se, no entanto, que a preocupação principal do legislador da primeira metade do século passado era apenas de preservar o patrimônio do devedor e viabilizar a reparação dos danos porventura causados.

03 O mestre Ovídio Batista assevera que "...esta é uma das particularidades que torna anacrônico o direito brasileiro em comparação com os sistemas europeus contemporâneos, especialmente o italiano, em geral fonte inspiradora de nosso legislador. Tanto na Itália quanto na França, a execução provisória pode ser de duas espécies. Pode ocorrer de um preceito de lei, que permite (ex lege) , como se dá no direito brasileiro, e pode ter origem na própria sentença (ope iudicis), quando o Juiz independentemente de previsão legal, autoriza a execução provisória, através da ‘cláusula executiva’ à própria sentença...(In: Curso de processo civil, v. 02, 4ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 51/52). Na seara trabalhista, também se pronuncia o eminente Manoel Antônio Teixeira Filho: "...o mundo ocidental conhece três sistemas concernentes à admissibilidade da execução provisória da sentença:a) os que afirmam a mera devolutividade dos recursos, sendo a suspensividade admitida, em conseqüência, apenas quando declarada de maneira expressa;b) aqueles em que a própria norma legal concede ao juiz poderes para autorizá-la, desde que haja requerimento do vencedor-recorrido, pela situação particular da causa (logo, da sentença);c) aqueles em que a execução provisória é a regra, só derrogada por manifesta dicção legal contrária."(In: Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 2000)

04 Assim dispunha o Código de Processo Civil em sua redação vigente

Art. 588. A execução provisória da sentença far-se-á do mesmo modo que a definitiva, observados os seguintes princípios:

I - corre por conta e responsabilidade do credor, que prestará caução, obrigando-se a reparar os danos causados ao devedor;

II - não abrange os atos que importem alienação do domínio, nem permite, sem caução idônea, o levantamento de depósito em dinheiro;

III - fica sem efeito, sobrevindo sentença que modifique ou anule a que foi objeto da execução, restituindo-se as coisas no estado anterior.

Parágrafo único. No caso do nº. III, deste artigo, se a sentença provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa parte ficará sem efeito a execução.

05 Com a edição da mencionada lei, o art. 588 do CPC passou a ter a seguinte redação:

"Art. 588. A execução provisória da sentença far-se-á do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas:

I - corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os prejuízos que o executado venha a sofrer;

II - o levantamento de depósito em dinheiro, e a prática de atos que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependem de caução idônea, requerida e prestada nos próprios autos da execução;

III - fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior;

IV - eventuais prejuízos serão liquidados no mesmo processo.

§ 1o No caso do inciso III, se a sentença provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa parte ficará sem efeito a execução.

§ 2o A caução pode ser dispensada nos casos de crédito de natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo, quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade. "

06 O verdadeiro ciclo de mudanças na legislação processual civil começou a partir da edição da Lei nº. 8.952, de 13 de dezembro de 1994 que, entre outras medidas, instituiu a generalização da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional (art. 273) e da tutela específica das obrigações de fazer (art. 461).

07 Vide MARTINS, Sérgio Pinto.Direito processual do trabalho, 26ª ed. São Paulo, Atlas, 2006, p. 653; GILGIO, Wagner. Direito processual do trabalho, 15ª ed. São Paulo, Saraiva, 2005, p. 534; TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 207/210; MALLET, Estevão. O processo do trabalho e as recentes modificações do código de processo civil. In: Revista LTr, v. 70, nº. 06, p. 668-675. São Paulo, LTr, 2006, p. 670.

08 In: Execução trabalhista, 11ª ed. São Paulo, LTr, 2006, p. 72.

09 In: Instituições de direito processual civil, v. 04. São Paulo, Malheiros, 2004, p. 761.

10 Nesse sentido prelecionava, logo após a promulgação do CPC de 1973, o eminente José Carlos Barbosa Moreira, verbis: "A execução provisória, que se baseia sempre em sentença condenatória civil, poder ser promovida a partir do recebimento do recurso no efeito meramente devolutivo (art. 521, 2ª parte), e não difere pelo modo como se processa (art. 588, princípio), mas, fundamentalmente, por sua menor estabilidade, devida à circunstância de estar ainda sujeito o título em que se funda à anulação ou reforma pelo órgão competente para julgar o recurso." (In: O novo processo civil brasileiro, v.02. Forense, Rio de Janeiro, 1976, p. 11).

11 In: Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos, 3ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1996, p. 375.

12 Súmula Nº. 414 do TST

MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA (OU LIMINAR) CONCEDIDA ANTES OU NA SENTENÇA

I - A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. (negrito nosso)

................................................................................................................

13 Na sistemática recursal cível não existe a previsão de meios recursais próprios para atacar os atos decorrentes da tutela executiva. Os mesmo recursos usados para enfrentar as decisões proferidas no âmbito da tutela de cognição são manejados para a discussão da legalidade das decisões em sede de tutela executiva. Sendo assim, a apelação (CPC, art. 513 e segs.) e o agravo (CPC, art. 522 e segs.) são os recursos típicos e gerais do processo civil destinados a discutir as decisões proferidas em sede de execução. Tratando-se de tutela executiva de títulos judiciais, na forma regulada pelo CPC, art. 475-A, os atos executivos são discutidos basicamente pelo recurso de agravo, sendo a apelação, hoje em dia, restrita quase que exclusivamente à execução de títulos extrajudiciais e em face da Fazenda Pública.

14 Admitem a possibilidade de execução provisória na pendência de agravo de petição, entre outros, José Augusto Rodrigues Pinto (Execução trabalhista, 11ª ed. São Paulo, LTr, 2006, p. 417), Manuel Antônio Teixeira Filho (Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 202-203). Não admitem a execução provisória na pendência do agravo de petição, entre outros, Sérgio Pinto Martins (Direito processual do trabalho, 23ª ed. São Paulo, Atlas, 2005, p. 451) , Isis de Almeida (Manual de direito processual do trabalho, v. 02, 9ª ed. São Paulo, LTr, 1998, p. 428-430).

15 Pela redação do CPC, art. 739, §1º, os embargos do devedor sempre teriam efeito suspensivo em relação à execução, sendo essa regra, até o advento da Lei nº. 11.232/2005, aplicável à "execução de títulos judiciais".

16 Nesse sentido, merece transcrição atualizada doutrina sobre o tema: "Assim, a suspensão da execução da sentença, que antes era ope legis, dependendo da simples apresentação dos embargos à execução, hoje é ope juidicis, isto é decorre de decisão proferida pelo juiz à luz dos requisitos estabelecidos no caput do art. 475-M do CPC. O novo critério para suspensão da execução aproxima-se do estabelecido no art. 624 do CPC italiano, segundo o qual, apresentada oposição à execução, pode o juiz suspendê-la, concorrendo graves motivos. Os requisitos estabelecidos pelo art. 475-M do CPC para a atribuição de efeito suspensivo à impugnação são os seguintes: relevância da fundamentação e risco de dano grave de difícil ou incerta reparação. Ambos os requisitos devem estar presentes para que se atribua efeito suspensivo à impugnação." (MEDINA, José Miguel et al. Sobre a impugnação à execução de título judicial (arts. 475-L e 475-M do CPC). In: Teresa Arruda Alvim Wambier (Org.) Aspectos polêmicos da nova execução de títulos judiciais – Lei Nº. 11.2.32/2005. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006, p. 396-415(412).

17 Devemos observar que a redação original do CPC preconizava a suspensividade dos embargos do devedor em execução fundada em título judicial no caput do art. 741, alterado pela Lei Nº. 8.953, de 13 de dezembro de 1994. Mesmo antes da vigência do atual Código, o diploma processual de 1939 trazia regra similar em seu art. 1.010.

18 In:Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 141-142.

19 Esse fato, por si só, já afasta a infundada preocupação externada por alguns juristas quanto ao pretenso desvirtuamento do direito processual do trabalho pela aplicação ostensiva do direito processual civil. Alguns caracteres são elementares ao processo do trabalho e sempre serão preservados, a despeito da profunda evolução ocorrida nos fundamentos do processo civil brasileiro.

20 Ressalte-se que o advento da Lei nº. 11.232/20025 eliminou a utilização da expressão carta de sentença do direito processual civil. Isso não significa a extinção do instituto, tendo em vista que, com a subida dos autos principais para o julgamento do recurso sem efeito suspensivo, há necessidade de que os documentos necessários ao provimento executivo provisório sejam manuseados e colacionados.

21 São milhares as execuções trabalhistas movidas contra empresas que restam infrutíferas todos os anos, tendo em vista a inexistência de patrimônio das empresas a ser penhorado, ou mesmo por conta de atitudes ardilosas de alguns inescrupulosos devedores trabalhistas. A situação inversa, ou seja, a impossibilidade da execução movida em face do trabalhador, portanto, não seria novidade no panorama judiciário brasileiro.

22 A redação original do CPC era a seguinte: Art. 588. A execução provisória da sentença far-se-á do mesmo modo que a definitiva, observados os seguintes princípios: I - corre por conta e responsabilidade do credor, que prestará caução, obrigando-se a reparar os danos causados ao devedor. Ressalte-se, no entanto, que essa exigência, mesmo na vigência da referida norma, era relativizada pela doutrina e jurisprudência.

23 É importante observar que essa relativização da exigência da caução foi inicialmente trazida pela Lei nº. 10.444/02, que alterou a redação do antigo art. 588 do CPC.

24 Já tivemos oportunidade de discorrer sobre a natureza da execução previdenciária. Na ocasião afirmávamos que : "a força executiva do título não nasce de seu caráter estritamente formal . Logo, a sentença trabalhista ao condenar o empregador no crédito trabalhista ou ao declarar a existência do contrato de trabalho, faz nascer um crédito previdenciário autônomo em relação à obrigação da ação geradora da sentença. O único vínculo entre a decisão trabalhista e a formação do crédito previdenciário decorre dos limites fáticos e temporais trazidos pelo pronunciamento jurisdicional laboral. Toda a construção do crédito previdenciário é conduzida de maneira autônoma, não se concebendo qualquer resquício de acessoriedade nessa construção. O caráter autônomo do crédito trabalhista, portanto, pode ser demonstrado com o fato de que a eventual conciliação havida entre o credor e o devedor trabalhista não tem o condão de afetar o crédito previdenciário. Caso o crédito previdenciário fosse apenas um efeito anexo da sentença trabalhista, certamente a conciliação havida entre os litigantes teria o condão de alterar a natureza do crédito de natureza previdenciária. Não é isso que acontece. A conciliação havida entre os litigantes da ação trabalhista não atinge o crédito previdenciário já constituído, até porque temos a caracterização de obrigação nitidamente autônoma. Nesse sentido, a sentença trabalhista gera dois títulos executivos distintos. O primeiro, representando os créditos de natureza estritamente trabalhista, enquadra-se com perfeição no conceito tradicional de título judicial, posto que nasceu da atividade do poder judiciário, tendo os integrantes da relação executiva participado diretamente da relação jurídica originadora. O problema maior reside em tipificar o segundo título executivo, já que representa uma relação executiva que não se confunde com a relação processual que resultou na sentença trabalhista. Não tenho dúvida de que a execução previdenciária é lastreada por um título executivo e que esse título é materialmente representado pela sentença trabalhista. No entanto, o grande desafio é proceder à classificação desse título executivo dentro da insípida categorização dual trazida por nosso direito processual, conforme já dissemos anteriormente"(In: Os limites da cognição dos embargos do devedor no âmbito da execução atípica do processo do trabalho. Revista LTr, Ano 70, Nº 03, São Paulo, LTr, março de 2006, p. 335-346 (339-340).

25 Da mesma forma como ocorre em relação ao Tribunal Superior do Trabalho, o Superior Tribunal de Justiça, no ano de 2005, recebeu o assombroso número de 93.353 recursos especiais e de 82.500 agravos de instrumento (vide Boletim Estatístico do STJ – Ano 2005 – www.stj.gov.br). A situação não é diferente em relação ao Supremo Tribunal Federal que, no mesmo ano, recebeu 57.317 agravos de instrumento e 39.768 recursos extraordinários (vide Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário – BNDPJ – www.stf.gov.br).

26 Do ‘cumprimento da sentença’, conforme a Lei 11.232/2005.Parcial retorno ao medievalismo? Por que não. In: Teresa Arruda Alvim Wambier (Org.) Aspectos polêmicos da nova execução de título judiciais-3 – Lei 11.232/2005. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006, p. 52-91 (81-82).

27 Nesse mesmo sentido assevere o magistrado e professor Jorge Luiz Souto Maior, verbis: "Assim, não há o menor sentido em se considerar ainda provisória a execução, quando penda sobre o título executivo, apenas o resultado de um agravo de instrumento, interposto contra decisão do Regional que denegou o recurso de revista, pois a fixação dessa regra, no cômputo geral da prestação jurisdicional, causa um dano muito maior do que o eventual risco de não se conseguir reverter uma situação fática, determinada por uma execução cujo título foi reformado, total ou parcialmente, pelo TST." (In: Reflexos das alterações no Código de Processo Civil no processo do trabalho. Revista LTr, Ano 70, v. 08. São Paulo, LTr, agosto de 2006, p. 920/930 (925/926).

28 In: Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização), 3ª ed. São Paulo, Malheiros, 2003, p. 403.

29 Art. 590. São requisitos da carta de sentença:

I - autuação;

II - petição inicial e procuração das partes;

III - contestação;

IV - sentença exeqüenda;

V - despacho do recebimento do recurso.

Parágrafo único. Se houve habilitação, a carta conterá a sentença que a julgou.

30 Como a doutrina processual laboral reluta em ampliar a dimensão da execução provisória, praticamente não existem pronunciamentos específicos sobre o tema em relação a esta disciplina. Os escólios doutrinários referem-se especificamente ao direito processual civil.

31 Seguindo essa linha de raciocínio, preconiza José Miguel Garcia Medina: "...De todo modo, pensamos que a soma dos dois fatores mencionados acima, extraídos do próprio sistema processual civil (quais sejam: a possibilidade expressa do desfazimento da arrematação ex 694, parágrafo único do CPC e necessidade de advertir, no edital, acerca da existência de recurso contra a decisão executada, cf. art. 686, inc. V do CPC) permitem entrever que, no direito processual civil brasileiro – distintamente do que sucede no italiano, portanto, preferiu o legislador proteger os interesses do executado, na hipótese de modificação ou anulação da decisão exeqüenda , em detrimento daquela que o arremata, em hasta pública, que terá direito de haver o que pagou." (In: Execução civil – teoria geral – princípios fundamentais, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 366)

32 Nesse sentido é a opinião de Araken de Assis: "...parece pouco razoável sujeitar o arrematante, conquanto advertido da pendência de recurso (art. 686, V), às reviravoltas da atividade jurisdicional. Ninguém sensato adquire um bem móvel ou imóvel, e pelo preço justo (o art. 692, caput proíbe a arrematação por preço vil), ou seja, de acordo com o mercado, sob o risco de ulterior devolução e da difícil recuperação da quantia depositada, teoricamente atendida pela caução prestada pelo exeqüente (art. 475-O, III), perante a qual concorrerá com o antigo executado. Na prática, atingido o dever de restituição ao estado anterior terceiros, esterilizar-se-á a execução provisória ‘completa’ por falta de candidatos a arrematar o bem penhorado" (In: Cumprimento da sentença. Forense, Rio de Janeiro, 2006, p. 159). Também discorre Teori Albino Zavascki: "O retorno ao status quo ante não se opera necessariamente in natura. Ele deve, é certo, ser o mais específico possível, respeitadas, todavia, as circunstâncias de fato – não raro irreversíveis, como é o caso da deterioração ou do consumo dos bens expropriados – e de direito, como é o caso da situação jurídica de terceiros, que deve ser respeitada. Não é razoável que o retorno ao status quo ante em relação às partes comprometa os direitos e interesses de terceiros, como os dos arrematantes e de seus sucessores. Em tais casos, inviabilizado jurídica ou faticamente o retorno in natura ao estado anterior, converte-se a restituição específica em prestação de equivalente em dinheiro." (In: Processo de execução – parte geral, 3ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 446).

Seguem essa linha de raciocínio preconiza José Miguel Garcia Medina: "...De todo modo, pensamos que a soma dos dois fatores mencionados acima, extraídos do próprio sistema processual civil (quais sejam: a possibilidade expressa do desfazimento da arrematação ex 694, parágrafo único do CPC e necessidade de advertir, no edital, acerca da existência de recurso contra a decisão executada, cf. art. 686, inc. V do CPC) permitem entrever que, no direito processual civil brasileiro – distintamente do que sucede no italiano, portanto, preferiu o legislador proteger os interesses do executado, na hipótese de modificação ou anulação da decisão exeqüenda , em detrimento daquela que o arremata, em hasta pública, que terá direito de haver o que pagou." (In: Execução civil – teoria geral – princípios fundamentais, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 366)

33 Vide TEXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 217.

34 A antiga Orientação Jurisprudencial Nº. 87 da Seção de Dissídios Individuais II do TST assim dispunha:

MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO EM EXECUÇÃO PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. O art. 899 da CLT, ao impedir a execução definitiva do título executório, enquanto pendente recurso, alcança tanto as execuções por obrigação de pagar quanto as por obrigação de fazer. Assim, tendo a obrigação de reintegrar caráter definitivo, somente pode ser decretada, liminarmente, nas hipóteses legalmente previstas, em sede de tutela antecipada ou tutela específica.

35 In: Manual do processo de conhecimento, 5ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006, p. 503.

36 O art. 588 foi revogado pela Lei nº. 11.232/2005 e a matéria acerca da execução provisória é tratada pelo art. 475-O.

37 In: Comentários ao Código de Processo Civil, v. 04, Tomo I. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 245.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORDEIRO, Wolney de Macedo. A execução provisória trabalhista e as novas perspectivas diante da Lei nº 11.232/2005. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1365, 28 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9663. Acesso em: 29 mar. 2024.