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Por uma nova interpretação da regra contida no art. 526 do CPC

Por uma nova interpretação da regra contida no art. 526 do CPC

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SUMÁRIO: 1. À guisa de introdução- 2. Conteúdo do art. 526 do CPC; 2.1. Conteúdo do caput do art. 526; 2.2. Conteúdo do par. ún. do art. 526- 3. Finalidade da comprovação de interposição do agravo de instrumento; 3.1. Acerca da importância do estudo da finalidade da norma para a interpretação proposta; 3.2. As (duas) finalidades da comprovação de interposição do agravo de instrumento- 4. Por uma nova interpretação da regra contida no art. 526 do CPC- 5. Conclusão.

 RESUMO: Lastreando-se numa interpretação predominantemente teleológica e sistemática, propõe-se uma nova interpretação ao art. 526 do CPC, segundo a qual a demonstração de prejuízo pelo agravado no exercício de seu direito de defesa impõe-se como requisito para aplicação da sanção de inadmissibilidade do recurso ao agravante por ausência de comunicação ao juízo a quo da interposição do agravo de instrumento.

PALAVRAS-CHAVE: Art. 526 do CPC- interpretação teleológica e sistemática- nova interpretação- comprovação de prejuízo pelo agravado- requisito para a inadmissibilidade.


1. À guisa de introdução

            Estabelece o Código de Processo Civil (CPC), quando disciplina a sistemática recursal do agravo de instrumento, que "o agravante, no prazo de três dias, requererá juntada, aos autos do processo, de cópia da petição do agravo de instrumento e do comprovante de sua interposição, assim como a relação dos documentos que instruíram o recurso" (art. 526, caput). Mais à frente, dispõe que "o não cumprimento do disposto neste artigo, desde que argüido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo" (art. 526, parágrafo único).

            Em suma, prescreve a comunicação da interposição do agravo de instrumento ao juízo a quo, atribuindo-lhe, expressamente, a natureza de requisito de admissibilidade do recurso, desde que argüido e provado pelo agravado.

            Desde a modificação operada pela Lei n. 10.352/2001, que acrescentou o par. ún. ao art. 526, tem-se engendrado interpretação literal do dispositivo, ignorando-se a finalidade do texto. O resultado declarativo proveniente de tal interpretação, contudo, não se coaduna com o Processo Civil que se pretende atualmente, guiado que é muito mais pela finalidade do que pelo formalismo exacerbado. Neste cenário, a não comprovação de interposição do agravo de instrumento implica, sempre, na inadmissibilidade do recurso, gerando, muitas vezes sem razão, prejuízo ao agravante.

            Doravante, lastreando-se numa interpretação predominantemente teleológica e sistemática [01], pretender-se-á alcançar resultado extensivo, a comprovar que a regra contida no par. ún. do art. 526 poderá ser flexibilizada, sempre à luz do caso concreto posto sob apreciação. Afinal, a melhor interpretação é aquela orientada pela razoabilidade.


2. Conteúdo do art. 526 do CPC

            2.1. Conteúdo do caput do art. 526

            Como dito alhures, o art. 526 do CPC exige do agravante a comunicação da interposição do agravo de instrumento, o que deverá ser feito no prazo de três dias, a contar da interposição do recurso.

            A comunicação de interposição do agravo de instrumento será feita por petição, que deverá ser instruída, necessariamente: (i) com cópia da petição do agravo de instrumento, (ii) com cópia do comprovante de sua interposição e (iii) com a relação dos documentos que instruíram o recurso.

            Vê-se, portanto, que não basta a simples comunicação. Exige-se, também, que sejam anexadas à petição de comunicação as referidas cópias- da petição do agravo de instrumento e do comprovante de sua interposição- bem como da relação (e não cópias, porque já presentes nos autos) das peças que instruíram o recurso, tudo a comprovar a interposição do mesmo.

            Daí preferir-se falar em comprovação de interposição do agravo de instrumento, e não em comunicação. À comunicação bastaria a simples petição. A exigência de comprovação de interposição leva a crer que não basta informar, comunicar; impõe-se provar que o agravante interpôs o recurso.

            Ainda sobre os documentos que necessariamente devem vir anexados à petição de comprovação, insta salientar que a demonstração da interposição do agravo de instrumento poderá ser feita com o carimbo na própria cópia da petição ou, se interposto pelo correio, com o registro de postagem. Desta forma, torna-se dispensável a emissão pelo escrivão ou chefe de secretaria de certidão.

            2.2. Conteúdo do par. ún. do art. 526

            Como já visto também, o par. ún. do art. 526 dispõe que o não cumprimento da comprovação de interposição do agravo de instrumento pelo agravante, desde que argüido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo [02].

            Importa observar, desde já, que o par. ún. do art. 526 surgiu como exceção à regra da natureza de ordem pública dos requisitos de admissibilidade dos recursos [03], uma vez que, para a aplicação da sanção de não conhecimento do recurso, o agravado deverá argüir e provar que o agravante não cumpriu com a comprovação de interposição do agravo de instrumento na forma da lei, sendo defeso ao magistrado reconhecê-lo de ofício.

            Na falta de previsão legal, o agravado deverá argüir o descumprimento do encargo pelo agravante na primeira oportunidade que lhe couber falar nos autos, ou seja, em suas contra-razões, conforme a sistemática do CPC revelada no art. 245. Quanto à prova, a juntada de certidão do juízo de primeiro grau asseverando a não comprovação de interposição do recurso pelo agravante será bastante.

            De acordo com o art. 526, portanto, de um lado cabe ao agravante comprovar a interposição do agravo de instrumento e, não o fazendo, do outro caberá ao agravado argüir e provar que aquele não o fez, ou não o fez conforme disposto em lei, para que, só assim, o magistrado possa aplicar a sanção de inadmissibilidade do recurso.

            Constitui-se, pois, a regra do art. 526 em verdadeiro ônus, a ser assumido, conforme o caso, pelo agravante ou pelo agravado [04]. Assim, nem o agravante nem o agravado estão obrigados a cumprir com seu encargo. A omissão, no que diz respeito a um ônus, gera gravame exclusivamente à parte omissa e o cumprimento do encargo só a ela beneficia; por isso não pode ser exigível, como acontece com a obrigação.


3. Finalidade da comprovação de interposição do agravo de instrumento

            3.1. Acerca da importância do estudo da finalidade da norma para interpretação proposta

            Neste momento, impõe-se como indispensável trazer ao tablado das discussões aquela que constitui a mais importante premissa para a compreensão e defesa da nova interpretação da regra inserta no art. 526 do CPC: a finalidade da comprovação de interposição do agravo de instrumento.

            Deve-se, pois, valer-se de uma interpretação predominantemente teleológica, a fim de se alcançar a razão de ser da lei (ratio legis). Por mais ultrapassada que a interpretação proposta possa parecer, ela serve perfeitamente ao entendimento aqui defendido. A descoberta da finalidade da comprovação de interposição do agravo de instrumento ao juízo a quo justificará a interpretação proposta do art. 526 do CPC, tornando descabida eventual acusação de interpretação contra legem, porquanto, em verdade, estar-se-á cumprindo com seu fim original.

            Afaste-se, oportunamente, a idéia de que a lei optou pelo formalismo em detrimento da finalidade. Qualquer opção só poderá ser feita diante do caso concreto. Afinal, a norma só existe em face do conflito em si considerado. Sem este, é só texto, aberto a interpretações várias, desde que razoáveis, diante da diversidade infinita de casos passíveis de interpretação.

            Logo, abrem-se duas vias ao intérprete: a aplicação literal (fria e cega) do texto, privilegiando o formalismo, a despeito das peculiaridades do caso concreto; ou a aplicação sensível do dispositivo, sempre tendo em órbita o caso específico, buscando-se o atendimento da finalidade do texto, a preservar o sistema do CPC, que adotou uma ordem de valores e princípios ligados à finalidade e não ao formalismo, como faz prova os arts. 154 e 244 do mesmo CPC.

            Nada obstante, o intérprete-julgador, em face do caso concreto, deve dar ao texto da lei aquele significado mais razoável, produzindo a norma que se mostre mais próxima possível da justiça [05].

            3.2. As (duas) finalidades da comprovação de interposição do agravo de instrumento

            Feitas tais considerações, passa-se à exposição das duas finalidades da comprovação de interposição do agravo de instrumento. Uma finalidade interessa ao agravante; outra ao agravado.

            A primeira finalidade é propiciar o juízo de retratação por parte do juiz de primeiro grau, o que beneficia, por óbvio, o agravante. A segunda finalidade é facilitar o direito de defesa do agravado, que não precisará deslocar-se até o tribunal do juízo ad quem. Trata-se, esta última, de devida obediência ao contraditório e a ampla defesa, que se traduz no binômio comunicação/oportunidade. Comunicação de todos os atos do processo às partes, bem como oportunidade a estas de se manifestarem sobre aqueles que lhe causarem gravame [06].

            Sobreleva-se, aliás, que a segunda finalidade aqui referida apresenta-se como a mais importante. Basta, para tanto constatar, que se veja o prazo de três dias estabelecido para que o agravante comprove a interposição do recurso. Ora, "se o intuito fosse apenas o de dar ensejo à retratação (ou dar ciência ao magistrado), não haveria sentido de estabelecer-se prazo para isso" [07]. O estabelecimento do prazo serve, pois, à proteção do interesse do agravado.

            Inobstante, o par. ún. do art. 526, ao prever a sanção de não conhecimento do recurso e condicioná-la a argüição por parte do agravado, acolhe expressamente a facilitação do direito de defesa do recorrido como a mais importante finalidade, se não a única, do art. 526.

            O juízo de retratação, por sua vez, só interessa ao agravante. Se este o frustrou, por isso não pode ser punido. Dessa forma, a sanção pune o atentado ao exercício pleno do direito de defesa do agravado.

            Demonstrando a opção pela facilitação do direito de defesa do agravado como a finalidade mais importante do art. 526 do CPC, o legislador deixou consignado na Exposição de Motivos do Projeto de Lei n. 3.474/2000 que:

            Aliás, a comunicação prevista no art. 526 tem por objetivo maior o de proporcionar ao agravado imediato e perfeito conhecimento dos termos do agravo, de molde a habilitá-lo a bem oferecer sua resposta sem a necessidade de deslocar-se para consultar os autos do processo na secretaria do tribunal.

            Compreendidas as finalidades da regra contida no art. 526 do CPC, fica fácil entender a razão da necessidade de argüição e comprovação pelo agravado da não comunicação de interposição do recurso pelo agravante para que o magistrado possa aplicar a sanção de inadmissibilidade do recurso. A norma alberga interesses exclusivamente particulares.

            Não por outro motivo, também, constitui ônus do agravante comprovar a interposição do agravo e, não o fazendo, do agravado de alegá-lo e prová-lo. A desincumbência do encargo só a uma ou outra parte beneficia, não prejudicando interesses de ordem pública, sendo, por isso, vedada a aplicação de oficio pelo magistrado da sanção de inadmissibilidade do recurso.

            Tem-se, em resumo, como finalidades da regra contida no art. 526 do CPC, propiciar o juízo de retratação por parte do juiz de primeiro grau e, mais importante, assegurar o direito de defesa do agravado.


4. Por uma nova interpretação da regra contida no art. 526 do CPC

            Finalmente, chega-se ao ponto em que se defenderá uma nova interpretação e aplicação da regra contida no art. 526 do CPC. Nova interpretação porque referida regra tem sido interpretada de forma literal e absoluta, ignorando-se as peculiaridades do caso concreto e as finalidades da norma ultracitada: se o agravante não comprovar a interposição do agravo de instrumento na forma da lei, ser-lhe-á imposta a sanção de não conhecimento do recurso, bastando, para que isso ocorra, que o agravado alegue e prove tal fato. Vê-se que ao agravado é suficiente a argüição e prova. Argüição que se dará em sede de contra-razões e prova que se constituirá com certidão do juízo a quo.

            Com efeito, parece não ser esta a interpretação mais condizente com a finalidade da norma [08]. Se a regra tem como principal finalidade facilitar a defesa do agravado, o não conhecimento do recurso por ausência de comprovação de interposição só se justificará se de tal ato advier prejuízo à recorrida. Ora, conforme clássico adágio, não há nulidade sem prejuízo.

            Haverá prejuízo, por sua vez, quando a distância entre a sede do juízo a quo e a do tribunal impuser ao agravado um deslocamento demorado e custoso de tamanho jaez que atrapalhe o exercício de seu direito de defesa, que, no caso, constitui-se no conhecimento "imediato e perfeito" dos termos do agravo, para que possa elaborar suas contra-razões.

            A título de exemplo, imagine-se processo que tramite em uma das Varas Especializadas de Defesa do Consumidor da comarca de Salvador, capital do estado da Bahia, todas elas situadas no Fórum Ruy Barbosa. Eventual interposição de agravo de instrumento será feita perante o Tribunal de Justiça, localizado na mesma cidade. Ora, à toda evidência, em casos como este, a não comprovação de interposição do agravo de instrumento pelo agravante não traz nenhum prejuízo ao agravado. Aliás, nota-se que freqüentemente a consulta a ser feita na secretaria do Tribunal se mostra muito mais fácil que o exame dos autos no cartório do juízo a quo. Descabido, portanto, falar-se em aplicação da sanção de não conhecimento do recurso, uma vez que ausente qualquer prejuízo.

            De modo diverso, pense-se em processo que tramite na Justiça Federal da mesma cidade de Salvador. A interposição do agravo de instrumento se dará perante o Tribunal Regional Federal da 1° Região, com sede em Brasília. Neste caso, a distância entre as duas cidades (Salvador-Brasília) traria manifestos prejuízos ao exercício do direito de defesa do agravado, que precisaria se deslocar até Brasília a fim de conhecer as razões do agravante. Agora, sim, a aplicação da sanção de inadmissibilidade do recurso do agravante cumpriria a finalidade da norma.

            A fim de ressaltar ainda mais o quanto dito, figure-se mais dois exemplos. O processo tramita numa comarca do interior e o agravo de instrumento é interposto no tribunal, situado na capital [09]. Se o agravante não comprovasse a interposição do recurso no juízo a quo, o agravado teria que se deslocar até a capital para consultar os autos na secretaria do tribunal. O tempo perdido no deslocamento e as dificuldades operacionais advindas certamente acarretariam prejuízo ao agravado. Justifica-se, pois, o não conhecimento do recurso, como sanção àquele que apresenta suas razões mas atrapalha que a parte adversa ofereça as suas, violando o contraditório e comprometendo a marcha segura do processo.

            O mesmo não se daria se o processo tramitasse numa das Varas Cíveis da comarca do Rio de Janeiro e o agravo de instrumento fosse interposto no Tribunal de Justiça. Tanto a Vara Cível como o Tribunal localizam-se no mesmo prédio, a alguns andares de distância. Este emblemático exemplo, concebido por Alexandre Freitas Câmara [10], dá a exata idéia do que se está aqui a defender. A finalidade maior da regra inserta no art. 526 do CPC teria sido cumprida: facilitar o direito de defesa do agravado. A imposição da sanção de inadmissibilidade do recurso, no caso, seria completamente imotivada, abusiva e desproporcional. A alegação, pelo agravado, de não comprovação de interposição do agravo de instrumento se apresentaria verdadeiramente como medida ardilosa e, quiçá, como abuso de direito, restando violado, desta feita, o direito de defesa do agravante, que não teria seu recurso conhecido porquanto a finalidade da lei fora desvirtuada.

            Defende-se, então, uma nova interpretação da regra do art. 526 do CPC. Nestes termos, a aplicação da sanção de não conhecimento do recurso só será possível quando, além de alegar e provar a não comprovação de interposição do recurso pelo agravante, o agravado demonstrar o prejuízo sofrido em razão de tal desídia [11]. Ao agravado não bastará, pois, somente alegar e provar, terá que demonstrar o prejuízo. Se assim não for, estar-se-á admitindo a declaração de nulidade sem a comprovação de prejuízo, contrariando a sistemática do CPC.

            A rebater possíveis críticas de interpretação contrária à lei, insiste-se que tal entendimento é o único que se apresenta em consonância com o art. 526, uma vez que dá ao dispositivo a destinação imaginada quando de sua criação. Em última análise, trata-se de uma interpretação inteligente, pois, considerando as vicissitudes do caso concreto, cumpre perfeitamente as finalidades da lei.

            Caso contrário, ter-se-ia soluções injustas e violações a princípios processuais maiores, como a isonomia (tratamento desigual dado a ambos os litigantes na desincumbência de seu ônus), o contraditório e a ampla defesa (um e outro vilipendiados com o não conhecimento do recurso, injustificadamente) e a motivação das decisões judiciais (a simples referência ao dispositivo de lei é insuficiente para uma motivação que se busca lógica e racional).

            Desta maneira, a demonstração de prejuízo no exercício de seu direito de defesa pelo agravado exsurge como requisito para a aplicação da sanção de inadmissibilidade do recurso ao agravante por ausência de comprovação de interposição do agravo de instrumento na forma da lei.


5. Conclusão

            Em face do quanto explicitado, conclui-se que a regra inserta no art. 526 do CPC não deve ser interpretada da forma como tem sido feita, tanto pelos tribunais como majoritariamente pela doutrina, de forma absoluta e literal, a contrariar a sistemática do CPC, bem como a própria finalidade do texto da lei.

            Tendo como principal finalidade facilitar o exercício do direito de defesa pelo agravado, proporcionando-lhe o conhecimento pleno e imediato dos termos do agravo, sem necessidade de se deslocar até a sede do tribunal para tanto, a regra do art. 526 do CPC deve ser aplicada, juntamente com a sanção de não conhecimento do recurso prevista no par. ún. do art. 526, sempre que tal fim último não seja atingido, acarretando, pois, prejuízo ao agravado.

            Sendo assim, diante da ausência de comprovação de interposição do recurso de agravo de instrumento, deverá o agravado não apenas alegar e provar o descumprimento do encargo pelo agravante, mas também demonstrar o prejuízo por ela sofrido.

            Caso contrário, ter-se-ia, como se tem, a aplicação da sanção de não conhecimento de recurso prevista no par. ún. do art. 526 sem razão de ser, impondo ao agravante punição desmerecida e injustificável, uma vez que o direito de defesa do agravado permaneceria intocável.

            A interpretação que deve prevalecer é sempre aquela mais razoável revelada diante do caso concreto. Decerto, haverá situações que o prejuízo restará flagrante, em razão da longa distância que separa o juízo a quo e o tribunal; noutras, contudo, o gravame não poderá ser absolutamente presumido, cabendo à parte, além de alegar e provar a não comprovação de interposição do recurso, demonstrar o prejuízo por ela sofrido no exercício de seu direito de defesa. Só assim a finalidade de lei estará sendo cumprida e a sistemática do CPC respeitada, mantendo, como sempre se quer, o sistema íntegro e a ciência coerente e, mais ainda, a justiça nas decisões.


Referências

            CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. II. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

            CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

            CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006.

            DIDIER JR., Fredie. Primeiras impressões sobre o parágrafo único, art. 526, CPC .In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (org.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. v. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

            ________. e CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006.

            DINAMARCO, Cândido Rangel; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

            FUX, Luiz. Depoimento em: Faculdade de Direito da UERJ. Setenta Anos de História e Memória: 1935- 2005. Disponível na Internet em: http://www.direitouerj.org.br/2005/fdir70/depLF.htm. Acesso em 06 de julho de 2006.

            GRINOVER, Ada Pellegrini; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

            NERY JUNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

            ________. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

            ________. e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (org.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. v. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

            WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson (org.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. v. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.


Notas

            01 Diz-se interpretação predominantemente teleológica e sistemática porque, como sabido, o intérprete não se vale, ou ao menos não deve se valer, nunca, somente de um meio interpretativo; não constituindo, aliás, nenhum problema que assim seja. Os meios de interpretação clássicos (histórico, literal, teleológico, comparativo, lógico-sistemático), ainda mais porque rígidos e não satisfativos, devem ser combinados na busca pelo sentido mais razoável (esta sim a palavra de ordem em qualquer interpretação) do texto da lei, sempre à vista do caso in concreto. Assim, na atividade interpretativa predominantemente teleológica e sistemática que aqui se fará, não se desprezará, p.ex., o meio literal, de grande valia, pelo menos inicialmente e como objeto de críticas.

            02 Informa-se que o parágrafo único (par. ún.) do art. 526 foi acrescentado pela Lei n. 10.352/2001, que encerrou definitivamente a controvérsia acerca da conseqüência advinda do não cumprimento da comprovação de interposição do agravo de instrumento no prazo legal. Lê-se na Exposição de Motivos do Projeto de Lei n. 3.474: "Ao art. 526, relativo à comunicação do agravo de instrumento perante o juízo de primeiro grau, propõe-se acrescentar parágrafo único, a fim de dar solução às controvérsias surgidas sobre se tal providência, a cargo do agravante, é meramente facultativa ou se constitui condição de admissibilidade do recurso".

            03 Nesse sentido, por todos: NERY JUNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 262; onde se lê: "A peculiaridade do caso é que o CPC 526 par. ún. somente permite a imposição da pena de não conhecimento do agravo, pelo não cumprimento de seu comando, ´desde que argüido e provado pelo agravado`. Criou-se, portanto, uma matéria de juízo de admissibilidade de recurso que não é de ordem pública, mas de ordem privada, já que necessita de provocação (e prova) da parte a quem aproveita (agravado), para que seja apreciada pelo juiz. Trata-se de uma exceção ao sistema do Código."

            Atentando para a excepcionalidade do caso e suas repercussões na Teoria Geral dos Recursos, Fredie Didier Jr.: "Agora, as nossas lições de teoria geral dos recursos devem apontar esta situação, no mínimo excepcional em comparação com o restante do sistema recursal." in DIDIER JR., Fredie. Primeiras impressões sobre o parágrafo único, art. 526, CPC .In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (org.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. v. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 225.

            04 Em conformidade com o que vai no texto, Fredie Didier e Leonardo da Cunha prelecionam: "Há, como se vê, uma distribuição do ônus entre o agravante e o agravado: o primeiro deve apresentar a petição; apresentada a peça, não haverá possibilidade de conseqüência que lhe seja prejudicial; se não o fizer, o agravado passa a ter o ônus de alegar e comprovar a ausência de ajuizamento da petição." in CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006. p. 118.

            05 Nesse sentido, exemplares são as palavras do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Fux: "Como magistrado, primeiro procuro ver qual é a solução justa. E, depois, procuro uma roupagem jurídica para essa solução. Não há mais possibilidade de ser operador do Direito aplicando a lei pura." Faculdade de Direito da UERJ. Setenta Anos de História e Memória: 1935- 2005. Disponível na Internet em: http://www.direitouerj.org.br/2005/fdir70/depLF.htm . Acesso em 06 de julho de 2006.

            De citação obrigatória são as lições de Dinamarco, Cintra e Grinover: "Entre duas interpretações aceitáveis, deve pender por aquela que conduza a um resultado mais justo, ainda que aparentemente a vontade do legislador seja em sentido contrário (a mens legis nem sempre corresponde à mens legislatoris); deve ´pensar duas vezes antes de fazer injustiça` e só mesmo diante de um texto absolutamente sem possibilidades de interpretação em prol da justiça é que deve conformar-se" in CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 35. Com a devida vênia, discorda-se somente em um ponto: conformar-se jamais.

            06 Assim, Nelson Nery: "Por contraditório deve entender-se, de um lado, a necessidade de dar conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes, e, de outro, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhe sejam desfavoráveis." in NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 131 e 132.

            07 CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006. p. 119.

            08 Observe-se que a única finalidade aqui analisada, a fim de admitir uma nova interpretação da regra contida no art. 526, é a de facilitação da defesa do agravado. A finalidade de propiciar o juízo de retratação só ao agravante interessa e a culpa por sua não realização só será atribuída a ele mesmo, que não cumpriu com seu ônus. O não conhecimento do recurso constitui, como dito alhures, sanção à frustração da finalidade maior, de facilitação da defesa por parte do agravado.

            09 Como sabido, toda norma é pensada em face de um caso concreto. E este parece ter sido o que levou à criação do referido art. 526 do CPC, que visa não criar dificuldades ainda maiores às já existentes àqueles que advogam no interior dos estados. Nesse sentido, CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006. p. 119.

            10 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. II. 13 edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 113.

            11 Destacando-se como um dos únicos defensores da flexibilização aqui proposta, Alexandre Câmara sugere: "Entendemos, pois, pelos motivos expostos, que a ausência de comunicação da interposição do agravo de instrumento prevista no art. 526 do CPC só acarretará o não-conhecimento do recurso, nos termos do parágrafo único desse artigo, quando o agravado argüir a questão, cabendo-lhe comprovar não só a ausência da comunicação, mas também o prejuízo que daí decorreu para ele" in CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. II. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 113. Assim também Fredie Didier e Leonardo Cunha: "Como se trata de requisito formal criado com o objetivo de favorecer o agravado, quando o seu desrespeito não gerar prejuízo (art. 244 do CPC)- no caso, a dificuldade de acesso ao conteúdo do agravo-, não será possível considerar-se inadmissível o agravo de instrumento interposto" in CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. v. 3. Salvador: Juspodium, 2006. p. 120.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Ticiano Alves e. Por uma nova interpretação da regra contida no art. 526 do CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1377, 9 abr. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9711. Acesso em: 26 abr. 2024.