Distrato/Rescisão Contratual de imóvel na planta: Justiça paulista condena incorporadora EZ TEC (EZTEC) na restituição de 90% sobre os valores pagos + 100% da corretagem

21/11/2016 às 15:44
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Decisão do Foro Central de SP enfrenta nova determinação do STJ sobre devolução de comissão de corretagem e condena incorporadora na devolução de parte expressiva dos valores pagos a título de parcelas contratuais e a totalidade da corretagem, à vista

Um casal de adquirentes de imóvel residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Massimo Residence Nova Saúde, em São Paulo, perante a incorporadora EZ TEC / EZTEC (o nome da SPE era: Paraíso Empreendimentos Imobiliários Ltda.), obteve vitória total na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Contrato de Compromisso de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato dos próprios adquirentes, que já não mais suportavam arcar com as parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato + 100% das comissões de corretagem, tudo acrescido de correção monetária desde cada pagamento (correção retroativa) + juros de 1% ao mês.

A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em maio de 2014, quando então os pretensos compradores assinaram o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 1,5 anos pagando as parcelas, decidiram por não mais seguir com o contrato e procuraram a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.

Porém, a incorporadora informou que devolveria somente o equivalente a 30% (trinta por cento) dos valores pagos em contrato e recusou a devolução integral das importâncias pagas a título de comissão de corretagem.

Inconformados com a resposta obtida perante a vendedora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.

O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos adquirentes, bem como a condenação da incorporadora na restituição de parte considerável dos valores pagos e a totalidade das importâncias pagas a título de comissão de corretagem.

A Juíza de Direito da 39ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, Dra. Daniela Pazzeto Meneghine Conceição, em sentença datada de 31 de outubro de 2016, JULGOU TOTALMENTE PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato dos compradores, amparados pela súmula nº 1 do Tribunal de Justiça de São Paulo, além de condenar a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato e 100% (cem por cento) das importâncias pagas a título de comissão de corretagem, acrescidos de correção monetária sobre cada um dos pagamentos e juros de 1% ao mês.

A Juíza fundamentou sua decisão no sentido de que o comprador de imóvel na planta pode procurar a Justiça para solicitar a rescisão do contrato a qualquer tempo, independentemente de mora do credor ou do devedor (comprador), sendo certo que a vendedora deve restituir parte considerável dos valores pagos.

Também enfrentou o tema da comissão de corretagem frente à nova determinação do STJ datada de 24 de agosto de 2016 e impôs à incorporadora a restituição integral daqueles valores pagos pelos compradores.

Nas palavras da magistrada em robusta fundamentação:

  • A preliminar de ilegitimidade de parte alegada pela requerida quanto à cobrança de comissão de corretagem não merece acolhida e, por conseguinte, a denunciação da lide formulada. Isto porque, a requerida foi a responsável pela terceirização de tal serviço ao permitir que a terceira TEC VENDAS procedesse à tal cobrança. Tudo isso com stand e publicidade patrocinados pela própria ré, que deverá ser a responsável pelos prejuízos causados.
  • Ademais, não vislumbro a presença dos requisitos do art. 125 a ensejar o deferimento da denunciação pleiteada. Note que o simples direito genérico de regresso, ou seja, fundado em garantia imprópria, não enseja a denunciação da lide, sob pena de ofenderem-se os princípios da celeridade e economia processual.
  • Superadas as preliminares, a ação é procedente.
  • A solução da controvérsia encontra-se, sem sombra de dúvidas, na interpretação dos fatos à luz dos preceitos gizados pelo Código de Defesa do Consumidor, aplicável na espécie, por força da inequívoca caracterização de relação de consumo entre as partes.
  • Tem-se, de um lado, os autores, na qualidade de consumidores, destinatário final da unidade condominial que lhes foi compromissada à venda e, de outro, a ré, na qualidade de fornecedora do produto, mostrando-se, por conseguinte, cristalina a subsunção fática ao quanto disposto nos arts. 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor.
  • Mais que isso, deve-se ter em consideração, na interpretação dos fatos, a natureza adesiva do vínculo jurídico firmado entre as partes, porquanto se trata daqueles contratos em que se verifica cristalinamente, o preestabelecimento das cláusulas e condições impostas ao co-contratante, sem que o mesmo tenha a menor condição de acesso à discussão de seu conteúdo.
  • Prevalece a imposição do parceiro contratual economicamente mais forte (fornecedor), não sendo dado ao parceiro economicamente fragilizado (consumidor) e, por isso mesmo vulnerável ao poderio de fogo do co-contratante, em hipótese alguma, modificar substancialmente o conteúdo do contrato já previamente escrito, a ser preenchido, tão somente em seus dados.
  • Este, em última análise, o conteúdo do dispositivo gizado pelo art. 54 do Código de Defesa do Consumidor, ao definir o contrato de adesão, estipulando, para o mesmo, um regime próprio, todo especial, inclusive no que toca aos métodos de interpretação, considerando neste panorama, entre outros aspectos, o fenômeno da relativização da autonomia da vontade.
  • Insta ponderar que o caráter adesivo do vínculo contratual reflete suas consequências, não só no momento do enlace contratual, mas também no curso de toda a relação.
  • Postas tais considerações de caráter preliminar, insta voltar os olhos ao contrato objeto do litígio, do qual se extrai nulidade genética ictu oculi, por força da inequívoca iniquidade representada pela cláusula 10ª, item 2.2 (fls. 44/45), ao estabelecer, em detrimento do promissário comprador, a perda de mais de 30% do valor pago, embora tal porcentagem não esteja totalmente explícita.
  • Vê-se claramente a abusividade com que fora redigida. Isto porque, não só previu a retenção de custos administrativos no importe de 10% sobre os valores pagos, como também impostos incidentes sobre tal operação e outras despesas.
  • Salta aos olhos a onerosidade excessiva que resulta de tal imposição contratual, daí decorrendo a nulidade genética supra referida, por colocar o consumidor em desvantagem absoluta, na contramão da função social do contrato, mormente à consideração de seu objeto específico aquisição da casa própria.
  • Antes mesmo do advento do Código de Defesa do Consumidor, por certo que a aludida cláusula contratual não passaria pelo crivo do Judiciário, como jamais passou, como se verifica de inúmeros precedentes jurisprudenciais nos quais corrigidas abusividades análogas à presente, nos precisos termos do art. 924 do Código Civil.
  • Daí porque viciado, por sem dúvida, o consentimento manifestado, maculado pelo vício da cláusula contratual originária, fulminando-a, vez que a iniquidade se faz presente, atentando contra o padrão ético de conduta que seria de se exigir da ré, por conta da boa-fé objetiva que deve, necessariamente presidir relações que tais.
  • Ademais, se revela razoável a pretensão dos autores em serem parcialmente reembolsados, vez que em situações contratuais como a presente normalmente há a estipulação de multa compensatória, ou ainda arras confirmatórias, institutos do direito material em absoluto proscritos do ordenamento jurídico com o advento do Código de Defesa do Consumidor.
  • Logo, reconhecida a abusividade da estipulação contratual em questão, faz-se de rigor o acionamento da atividade integrativa do juízo, no sentido de buscar restabelecer o equilíbrio contratual, o que já se viabilizava à luz do preceito gizado pelo art. 924 do Código Civil, conforme referido alhures.
  • Assim, tenho como razoável limitar a 10% do preço pago, e somente a 10%, a perda dos autores em favor da ré, por força da resolução contratual a que aqueles deram causa, por não mais suportar o adimplemento do compromisso assumido.
  • Não obstante, incabível o parcelamento da restituição das quantias pagas, que devem ser devolvidas de forma imediata e de uma só vez, nos termos forma do art. 53, do CDC. Inclusive, esta é a orientação da Corte Paulista, conforme Súmula 2: “A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.”.
  • O E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento neste sentido ao firmar a Súmula 543, que diz que “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”.
  • Ademais, os autores efetuaram ainda, o pagamento de valores referentes à comissão de corretagem, no valor total de R$ 21.850,00, conforme planilha de fls. 63.
  • Em relação à legalidade de tais pagamentos, a Segunda Seção do E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no julgamento dos REsp's nº 1599511/SP e 1551956/SP, afetados em relação ao Tema 938, ocorrido em 24/08/2016, acolhendo de forma unânime o voto do Relator Min. Paulo de Tarso Sanseverino.
  • Contudo, extrai-se do documento de fls. 32/60 que não há qualquer previsão específica acerca da cobrança de valores relativos à corretagem, tendo eles sido “embutidos” no valor total negociado, de forma simulada.
  • Dessa forma, não havendo previsão contratual neste sentido, é dever da parte ré arcar com a obrigação de custear os valores relativos à corretagem, sendo forçoso o acolhimento do pedido formulado pela parte autora para a sua devolução.
  • Cumpre salientar que os valores cobrados deverão ser restituídos de forma simples, ante a ausência de demonstração de má-fé pela parte requerida.
  • Por tudo o quanto exposto, JULGO PROCEDENTE a ação contra PARAÍSO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA para:
  • 1) DECLARAR rescindido o contrato firmado entre as partes, a partir do ajuizamento da ação;
  • 2) DECLARAR a nulidade da cláusula 10ª, item 2.2 (fls. 44/45), com o que CONDENO a ré a reembolsar os autores o correspondente a 90% do preço pago por estes àquela, e à vista, a ser monetariamente corrigido a contar de cada desembolso e acrescido de juros moratórios de 1% ao ano, estes devidos a contar da citação, a ser apurado por mero cálculo aritmético;
  • 3) CONDENAR a ré a ressarcir os autores no montante de R$ 21.850,00 (vinte e um mil e oitocentos e cinquenta reais), relativos à corretagem, devidamente atualizados pela Tabela do Tribunal de Justiça a partir do desembolso e com a incidência de juros de mora de 1% ao mês, este a partir da citação.”

Processo nº 1067938-64.2015.8.26.0100

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)

www.mercadanteadvocacia.com

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http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/

* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.

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Sobre o autor
Ivan Mercadante Boscardin

OAB/SP 228.082Advogado especialista em Direito Imobiliário e Consumidor • São Paulo (SP). Advogado atuante há mais de dez anos no Estado de São Paulo Formado pela Universidade São Judas Tadeu Especialista em: Direito Civil com ênfase em Direito Empresarial (IASP) Direito Processual Civil (PUC SP) Direito Imobiliário e Registral (EPD) Arbitragem nacional e estrangeira (USA/UK) Autor do livro: Aspectos Gerais da Lei de Arbitragem no Brasil Idiomas: Português e Inglês. E-mail: [email protected]: www.mercadanteadvocacia.com - Telefones: 11-4123-0337 e 11-9.4190-3774 (cel. Vivo) - perfil também visualizado em: ivanmercadante.jusbrasil.com.br

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