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Direito de procriar

a reprodução assistida em face do princípio da dignidade humana

Direito de procriar: a reprodução assistida em face do princípio da dignidade humana

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A problemática surge quando a reprodução assistida transforma-se em uma verdadeira mercantilização. Em 1999, ocorreu o 1º leilão via internet de óvulos modelos para pais que gostariam de ter filhos bonitos.

“A vida tem uma história muito comprida, mas cada indivíduo tem um começo muito preciso: o momento da sua concepção”.(Jérôme Lejeune)

A evolução da ciência tem proporcionado inúmeros benefícios sociais em um ritmo muito rápido. Os desejos, as necessidades humanas fazem com que o homem intensifique a exploração tecnológica para o suprimento dos anseios pessoais.

Nos anos 70, uma revolução biológica veio solucionar um dos maiores problemas da humanidade, qual seja, a infertilidade. O avanço da ciência possibilitava a procriação sem relação sexual, desvinculando a descendência da cópula.

O marco teórico de tal revolução foi o caso Louise Brown ocorrido especificamente em 1978. O nascimento do primeiro bebê de proveta revolucionou o meio científico, com repercussões mundiais.  Esta gestação foi obtida após mais de dez anos de experimentos em embriões, realizados pela equipe dos Drs. Edwards e Steptoe. A menina nasceu em junho de 1978, em Oldham/Inglaterra. A publicação do caso foi feita em agosto de 1978, ou seja, apenas dois meses após o seu nascimento. Uma importante questão levantada foi a da confidencialidade e da privacidade da família e, em especial, da criança. Todos os anos a imprensa noticia algum fato a respeito da sua vida. Quando completou dezoito anos, em 1996, ela era professora de uma creche em Bristol/Inglaterra. 

“O casal Brown não poderia ter filhos. As trompas da Senhora Brown eram obstruídas, uma causa muito freqüente de infertilidade. Através de um laparoscópio, o Dr. Steptoe retirou cirurgicamente os óvulos não fertilizados dos ovários da Senhora Brown. Os óvulos foram fertilizados com o esperma do Senhor Brown e passados para uma proveta, com o ambiente artificial cuidadosamente controlado. Cerca de seis dias depois, os óvulos fertilizados tornaram-se uma massa de células que iriam produzir o embrião. A Senhora Brown fez tratamento com hormônios, preparando o útero para receber o óvulo. Dr. Steptoe implantou o embrião no útero, onde ele se desenvolveu normalmente até a hora do nascimento.”[1]

O homem conquista um novo espaço, que viria a suprir-lhe um desejo antigo. O homem necessita extrapolar as suas necessidades físicas. Outros elementos são importantes, tais como a auto-estima, o amor, a sexualidade, o desejo de manter contato íntimo e afetivo, a expressão artística e emocional, a reprodução e o desejo de perpetuar a espécie. São desejos que devem ser implementados com fundamento na dignidade da pessoa humana. Dentro dessas inquietudes, encontram-se a sexualidade e a reprodução como direitos humanos fundamentais e, para serem inseridos na vida de muitos, os métodos artificiais são utilizados. A decisão de gerar um filho muitas vezes esbarra em barreiras naturais. Em casais estéreis, a concepção de uma criança depende de fatores alheios à vontade de procriar. Por isso, a medicina engendrou várias técnicas para unir artificialmente os gametas masculino e feminino, dando origem a um novo ser, propiciando a felicidade dos seres humanos.

Indaga-se o motivo de se recorrer a técnicas de reprodução assistida, ao passo que podemos utilizar o instituto da adoção.  A opção pela reprodução assistida é muito mais aprazível do que a adoção. Ter algo produzido com material genético próprio é mais real, torna mais perceptível o vínculo de filiação.

A problemática surge quando a reprodução assistida transforma-se em uma verdadeira mercantilização. Em 1999, ocorreu o 1º leilão via internet de óvulos modelos para pais que gostariam de ter filhos bonitos. Tal anúncio chocou a muitos, fazendo-os questionar sobre o destino que será dado às técnicas de reprodução assistida.

A busca pela beleza dos filhos, a idolatria do ego humano transforma o ser humano, pessoa dotada de dignidade, em um ser massificado pelo consumo.

O organizador do Leilão tentou justificá-lo com o seguinte argumento publicado no Jornal o Globo:

“Ron Harris tentou justificar o leilão dizendo que ele é o desdobramento natural do desejo dos seres humanos de terem filhos mais bonitos e inteligentes. Para ele a beleza é uma vantagem evolutiva. Se você pode ter um filho bonito, que terá mais vantagens numa sociedade como a americana, obcecada pela beleza, por que não tentar? Há mulheres que não cobram por seus óvulos, porém nem todas oferecem vantagens como a beleza. As pessoas bonitas conseguem mais empregos e são mais valorizadas. Você também pode querer ter um filho de acordo com o padrão de beleza que você considere ideal, mesmo que seja diferente do seu. Já fomos procurados por um casal asiático interessado nos óvulos de uma loura com ascendência escandinava.” [2]

Assiste-se, portanto, a uma verdadeira mercantilização do ser humano que se torna um ser comercial que privilegia o culto à beleza, esquecendo-se das reais virtudes do ser humano. 

Além disso, outros problemas de ordem jurídica se instauram na seara da reprodução assistida, principalmente no que tange à fecundação artificial heteróloga, pois vários óvulos são fecundados através de uma superovulação, ocasionando a produção in vitro de mais de um embrião. O que fazer com os embriões não inseridos na receptora? Seria possível o congelamento de tais embriões? E se, posteriormente, o marido e a esposa desejarem fecundá-los? E o Direito sucessório, post mortem? Teria o embrião direito à herança que já se tenha partilhado? Qual o período para a eliminação desses embriões?

Outra problemática refere-se à escolha do doador. Seria possível escolher o doador com as características fenotípicas que a pessoa deseja? Não estaríamos instaurando uma espécie de eugenia na humanidade?

E a maternidade substituta? Será que o ordenamento jurídico brasileiro admite essa forma de reprodução? 

Os métodos de reprodução assistida podem ser aplicados nos casais homossexuais?

Qual a legislação que regulamenta todas essas questões? O que o Novo Código Civil diz a respeito?

De acordo com a professora Maria de Fátima Freire de Sá:

“ A defesa e a proteção da dignidade da pessoa humana e dos direitos de personalidade alcançaram grande importância nos últimos tempos em razão dos avanços científicos e tecnológicos experimentados pela humanidade que, se de um lado, trazem benefícios vários, de outro, potencializam riscos e danos a que podem estar sujeitos os indivíduos. Várias discussões permeiam o tema, tais como: podemos pensar a vida como o simples respirar, como a garantia da “batida de um coração? Quais os limites à redesignação do estado sexual? O embrião é pessoa? Criaremos o bebê a la carte?”[3]

O presente trabalho tentará esclarecer essas indagações, ou, pelo menos, instaurar um questionamento ético sobre a matéria, tendo como epicentro a dignidade da pessoa humana.     


1. ESCORÇO HISTÓRICO

Desde a Antigüidade Clássica Grega e Romana, já eram assegurados aos nascituros os direitos sucessórios, sendo os primeiros estudos acerca da embriologia feitos por Hipócrates e Aristóteles.

Na mitologia grega, vê-se o desejo dos povos em  realizar a reprodução assistida, demonstrando no capítulo do nascimento de Perseu, filho de Dânae e neto de Acrísio. Sua mãe estava enclausurada para evitar a concepção de uma criança que viria a matar o avô, usurpando-lhe o trono. A clausura para nada serviu, pois Zeus transformou seu próprio sêmen em chuva de ouro, inseminando a moça durante o sono.  Dois milênios à frente, a biotecnologia iria transformar tal mito em realidade, servindo-se do engenhoso expediente para viabilizar o exercício da paternidade àqueles a quem a natureza privou da função reprodutora.

“De acordo com o estudioso alexandrino Apolodoro, Perseu, o lendário fundador de Micenas, nunca teria nascido se seu avô tivesse conseguido seu intento. Acrísio, rei de Argos, era pai de uma linda filha, Dânae, mas estava desapontado por não ter um filho. Quando consultou o oráculo sobre a ausência de um herdeiro homem, recebeu a informação que não geraria um filho, mas com o passar do tempo teria um neto, cujo destino era matar o avô. Acrísio tomou medidas extremas para fugir deste destino. Trancou Dânae no topo de uma torre de bronze, e lá permaneceu numa total reclusão até o dia em que foi visitada por Zeus na forma de uma chuva de ouro; assim deu à luz a Perseu. Acrísio ficou furioso, mas ainda achava que seu destino poderia ser evitado. Fez seu carpinteiro construir uma grande arca, dentro da qual Dânae foi forçada a entrar com seu bebê, sendo levados para o mar. Entretanto, conseguiram sobreviver às ondas, e após uma cansativa jornada a arca foi jogada nas praias de Sérifo, uma das ilhas das Ciclades. Dânae e Perseu foram encontrados e cuidados por um honesto pescador, Dictis, irmão do menos escrupuloso rei de Sérifo, Polidectes.”[4]

Na Roma antiga, o reconhecimento do filho era feito pelo pai quando possuía a criança em seus braços que deveria reconhecer, neste momento, o recém-nascido, atribuindo-lhe o status libertatis, o status civitatis e o status familiae. O pai poderia, ainda, matar o filho, expô-lo à venda ou abandoná-lo. Percebe-se que a civilização romana preocupava-se com a filiação.

A primeira reprodução assistida ocorreu no século XIX, pelo método de inseminação artificial, e foi feita pelo americano Willia Pancoast, que obteve êxito.

No século XX, mais precisamente em 20 de julho de 1978, na Inglaterra, ocorre o nascimento do primeiro bebê de proveta, inseminado pelo método da fecundação assistida, também denominada fecundação in vitro. O nasciomento de Louise Brown constitui-se no marco histórico do tema.

No Brasil, em 07 de outubro 1984, nasce Ana Paula Caldeira, da cidade de São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba, fruto das técnicas de reprodução assistida desenvolvidas no Brasil.

Ticho Brahe Fernandes, em seu livro “A reprodução assistida em face da bioética e do Biodireito”, analisa muito bem o fenômeno histórico:

“Saindo da área não-científica, tem-se como marco inicial das técnicas de reprodução assistida as civilizações babilônicas e árabes que polinizavam palmeiras com o objetivo de produzir mais e melhores furtos.  Refere-se, ainda, que já no século XIV se realizava a inseminação artificial em peixes, e, no século XV, no bicho da seda. Afirma-se que em 1332 se teria obtido a fecundação de uma égua com interferência humana, sendo relatado que a técnica era utilizada como artifício de guerra, seja pela inseminação de éguas dos inimigos com sêmen de cavalos velhos ou doentes, seja por furto do sêmen dos bons cavalos dos adversários. (...) No século XVIII foram produzidas algumas experiências nesta área, sendo que em 1767 o alemão Ludwig Jacobi trabalhava com a reprodução de peixes, enquanto o abade italiano Lazzaro Spallanzani, em 1777, logrou obter a fecundação de uma cadela por meio da inseminação artificial, nascendo, daí, três crias. Já no século XIX a inseminação artificial foi aplicada em outros mamíferos como éguas, vacas e ovelhas, destacando-se nas pesquisas com mamíferos o russo Elie Ivanoff. Especificamente no ser humano, as primeiras notícias históricas datam do século XV, quando a técnica teria sido utilizada por D. Joana de Portugal, casado com Henrique IV di Castelo, “o Impotente”. Posteriormente, em 1785, Thouret, decano da Faculdade de Medicina de Paris, fecundou sua mulher estéril, aplicando-lhe uma injeção intravaginal de esperma. Em 1790, o inglês John Hunter obteve a gravidez de uma mulher aplicando-lhe na vagina o esperma do marido hipospádico. O francês Girauld, em 1838, relatou o sucesso em oito casos experimentados, um dos quais com gravidez gemelar.  Jaime Marion Sims, no ano de 1866, obteve sucesso em experimento com a introdução do líquido seminal no canal servical de mulher o que foi repetido em 1871 por Gigon d´Angulême. (...) Durante a II Guerra Mundial milhares de crianças norte-americanas foram geradas com o sêmen de soldados que lutavam no pacífico, tendo o mesmo ocorrido com soldados ingleses durante a Guerra da Coréia. Nos Estados Unidos a Suprema Corte de Nova Iorque declarou a legitimidade dessas crianças, porém, na Inglaterra a Câmara dos Comuns, proibiu a inscrição, como legítimas, de crianças nascidas em razão da doação de sêmen de doador anônimo.  (...)  em 25 de julho de 1978 nasceu na Inglaterra Louise Brown, o primeiro ser humano fruto de uma reprodução in vitro, foi extremamente importante o desenvolvimento de crioconservação, primeiro de esperma, depois de embriões e, recentemente, de óvulos, sendo que a primeira gestação com um embrião congelado foi obtida na Austrália, no ano de 1983, por equipe dirigida pelo cirurgião Wood.”[5]


2. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Inicialmente, é preciso diferenciar determinados conceitos que muitos acabam  confundindo, dentre eles direitos humanos e direitos da personalidade.

Devemos nos referir aos direitos humanos quando desejamos proteger os seres humanos contra as arbitrariedades estatais; em contrapartida, quando dizemos direitos da personalidade, estamos protegendo-os frente aos atentados privados entre eles próprios.

Entretanto, tal dicotomia entre Direito Público (direitos humanos) e Direito Privado (direitos da personalidade) vem sendo superada.  Pietro Perlingieri nos ensina que “a dicotomia entre Direito Civil/Direito Político deve ser superada, porque ambos são conexos e imprescindíveis à realização da pessoa”[6].

A personalidade adquire um valor unitário. Os regimes nazistas e totalitários do pós-guerra sempre ignoraram a vida humana e a personalidade, sendo necessário proteger a vida  sob todos os aspectos.

A dicotomia entre Direito Público e Privado no âmbito dos direitos da personalidade deve ser superada. O Estado não comporta tal tipo de divisão. Temos que analisar os direitos da personalidade como inatos a todas as pessoas. 

A personalidade é a característica essencial dos sujeitos de direito. É o atributo jurídico que dá a um ser status de pessoa.[7] A personalidade é, não um direito, mas um valor (o valor fundamental do ordenamento) e está na base de uma série aberta de situações existenciais, nas quais se traduz a sua incessante e mutável exigência de tutela.[8]

No caso dos embriões urge salientar que o embrião de laboratório não é pessoa natural, visto que não nasceu. Não é nascituro, visto que não se encontra em desenvolvimento em ambiente favorável, nem tampouco prole eventual, visto que já se encontra concebido.

Jussara Maria Leal da Silva realiza o seguinte questionamento:

“será que poderemos comparar o embrião a um órgão do corpo humano e equipará-lo a um coração ou a um rim, o que se pode transplantar, ceder, conservar ou experimentar? Poder-se-á qualificar o embrião como um órgão, logo, como objeto de propriedade da mulher que transporte ou, pelo contrário, uma substância de origem humana sujetito de direitos ou de proteção legal? Ou, corroborando a posição do Comitê Nacional de Ética francês, como uma potencial pessoa humana?” [9]

O embrião deve ser comparado à pessoa, pelo menos em potencial, devendo ser respeitado e lhe atribuídos todos os direitos inerentes à personalidade. Completa a Dra. Jussara Maria Leal de Meirelles:

“Seja pela extrema proximidade individual à pessoa humana que já existe e que se encontra em fase inicial de seu desenvolvimento, seja pela necessidade de se respeitar igualmente os embriões humanos e as pessoas já nascidas, posto que essas também já foram embriões e, portanto, a eles se assemelham, fato é que o embrião tem direito de ser tratado como pessoa, e, desse modo, merece respeito à dignidade.”[10]

Na esteira de Perlingieri,

“A personalidade é, portanto, não um direito, mas um valor (o valor fundamental do ordenamento) e está na base de uma série aberta de situações existenciais, nas quais se traduz a sua incessante mutável exigência de tutela. Tais situações subjetivas não assumem necessariamente a forma do direito subjetivo e não devem fazer perder de vista a unidade do valor envolvido. Não existe um número fechado de hipóteses tuteladas: tutelado é o valor da pessoa sem limites, salvo aqueles colocados no seu interesse e naqueles de outras pessoas. A elasticidade torna-se instrumento para realizar formas de proteção também atípicas, fundadas no interesse à existência e no livre exercício da vida de relações.”[11]

Os direitos da personalidade devem ser tratados de forma ampla e irrestrita no que tange as técnicas capazes de reprodução assistida. Perlingieri, assim doutrina:

“a esta matéria não se pode aplicar o direito subjetivo elaborado sobre a categoria do “ter”. Na categoria do 'ser' não existe a dualidade entre sujeito e objeto, porque ambos representam o ser – a titularidade é institucional, orgânica. Onde o objeto da tutela é a pessoa, a perspectiva deve mudar; torna-se necessidade lógica reconhecer, pela especial natureza do interesse protegido, que é justamente a pessoa a constituir ao mesmo tempo o sujeito titular do direito e o ponto de referência objetivo da relação.”[12]


3. A DIGNIDADE DO SER HUMANO

O conceito de dignidade fornecido pelos dicionários esclarece-nos que dignidade significa “qualidade moral que infunde respeito; consciência do próprio valor, honra, autoridade, nobreza”.[13]

Tal conceito é de extrema importância para todos os seres humanos. A Constituição Federal de 1988 elencou como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana.

De Acordo com Maria de Fátima Freie Sá:

“Portanto, especificamente quanto à proteção da pessoa humana, a Constituição Federal fixou “cláusula geral de tutela”, prevista no art. 1º, II e III; caput do art. 5º e seu parágrafo 2º. Também o art. 4º, II, da Constituição Federal privilegia o ser humano em sua dignidade, ao afirmar que suas relações internacionais têm como princípio a prevalência dos direitos humanos.”[14]

Para o professor Gustavo Tepedino:

“Pretendeu, portanto o constituinte, com a fixação da cláusula geral (...) e mediante o estabelecimento de princípios fundamentais introdutórios, definir uma nova ordem pública, da qual não se podem excluir as relações jurídicas privadas, que eleva ao ápice do ordenamento a tutela da pessoa humana, funcionalizando a atividade econômica privada aos valores existenciais e sociais ali definidos.”[15]

Muito bem nos explica o conceito de dignidade humana o professor Gustavo Tepedino, com o seu famoso exemplo do anão que era arremessado em um espetáculo francês, na cidade de Mor-sang-sur-Orge, quando o Prefeito proibiu a realização do inusitado evento, que ocorria em determinada discoteca da cidade, chamado de “arremesso de anão”. O homem de pequena estatura era arremessado como um projétil pela platéia, de um lado para outro, enquanto todos riam e debochavam.

O Tribunal Francês, primando pela dignidade humana, ratificou o decreto do prefeito, proibindo o famigerado arremesso de anão.

A dignidade humana é vista como uma unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente à personalidade humana. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se num mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

Pode-se conceituar a dignidade humana como o valor maior, epicentro de todos os direitos atribuídos pela Constituição Federal aos cidadãos brasileiros.

Vaclav Havel, dramaturgo e estadista tcheco, enfatiza a dignidade humana como elemento diferenciador em relação às demais espécies; literalmente:

"Tomemos o conceito de dignidade humana. Ele permeia todos os direitos humanos fundamentais e os documentos relativos aos direitos humanos. Para nós, isso é tão natural que achamos que nem sequer faz sentido indagar o que realmente significa a dignidade humana, ou por que a humanidade deveria possuí-la, nem tampouco nos indagamos por que razão faz sentido que todos nós a reconheçamos uns nos outros e uns para os outros.  As raízes mais profundas do que chamamos direitos humanos se encontram além e acima de nós, em algum lugar mais profundo do que o mundo dos contratos e acordos humanos. Elas têm sua origem no âmbito metafísico. Embora muitos não se dêem conta disso, os seres humanos - as únicas criaturas totalmente conscientes de seu próprio ser e da mortalidade, que enxergam aquilo que as cerca como um mundo e mantêm uma relação interna com esse mundo - derivam dignidade, além de responsabilidade, do mundo como um todo; ou seja, daquilo no qual identificam o tema central do mundo, sua espinha dorsal, sua ordem, sua direção, sua essência, sua alma - chame-o como quiser. Os cristãos formulam a questão em termos simples: o homem foi colocado no mundo à imagem de Deus."[16]

A professora Maria Berenice Dias doutrina:

“ O princípio da dignidade da pessoa humana é o princípio maior, afirmado já no primeiro artigo da Constituição Federal e fundante do Estado Democrático de Direito. A preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional. Sua essência é difícil de ser capturada em palavras, mas incide sobre uma infinidade de situações que dificilmente se podem elencar de antemão. Talvez possa ser identificado como sendo o princípio de manifestação primeira dos valores constitucionais, carregado de sentimentos e emoções. É impossível uma compreensão exclusivamente intelectual e, como todos os outros princípios, também é sentido e experimentado no plano dos afetos. O princípio da dignidade humana representa o epicentro axiológico da ordem constitucional, irradiando efeitos sobre todo o ordenamento jurídico e balizando não apenas os atos estatais, mas toda a miríade de relações privadas que se desenvolvem no seio da sociedade. É o mais universal de todos os princípios, pois serve de baliza aos demais. É um MACROCÍPIO do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade, e solidariedade, uma coleção de princípios éticos.           Na medida em que a ordem constitucional elevou a dignidade da pessoa humana a fundamento, houve uma opção expressa pela pessoa, ligando todos os institutos à realização de sua personalidade. Tal fenômeno  provocou a despatrimonialização e a personalização dos institutos jurídicos de modo a colocar a pessoa humana no centro protetor do Direito. O princípio da dignidade humana não representa apenas um limite à atuação do Estado, mas constitui também um norte a sua ação positiva. O Estado não tem apenas o dever de se abster de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, também deve promover essa dignidade através de condutas ativas, garantindo o mínimo existencial para cada ser humano em seu território. O Direito de família está umbilicalmente ligado aos direitos humanos, que têm por base o princípio da dignidade da pessoa humana, versão axiológica da natureza humana. O princípio da dignidade humana significa, em última análise, uma igual dignidade para todas as entidades familiares. Assim é indigno dar tratamento diferenciado às várias formas de filiação ou aos vários tipos de constituição de família, com o que se consegue visualizar a dimensão do espectro desse princípio que tem contornos cada vez mais amplos. A dignidade da pessoa humana encontra na família o solo apropriado para florescer. A  ordem constitucional dá especial proteção à família, independentemente de sua origem. A multiplicação das entidades familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre os familiares: o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto de vida comum, permitindo o pleno desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe, com base em ideais pluralistas, solidaristas, democráticos e humanistas. Ora, se é direito da pessoa humana constituir núcleo familiar, também é direito seu não manter a entidade formada, sob pena de comprometer-lhe a existência digna. É direito constitucional do ser humano ser feliz e dar fim àquilo que o aflige sem inventar motivos.”[17]

O princípio da dignidade da pessoa humana é fundamento do Estado, significando, não só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, como também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio. O termo dignidade designa o respeito que merece qualquer pessoa, e é um parâmetro para todos os demais princípios e direitos.

E é com base neste princípio que mulheres e homens utilizam-se da inseminação artificial. A família monoparental, proveniente de inseminação em mulheres solteiras, pelo fato de a criança já nascer sem pai, tem gerado opiniões controversas.

Segundo Maria Berenice Dias:

“É no mínimo preconceituosa a postura doutrinária que sustenta que a mulher solteira não deve fazer uso de método reprodutivo assexual, por se prestar a interesses egoísticos. Como não lhe é vedado o direito à adoção, nada a impede de gerar no próprio ventre um filho, o reconhecimento da igualdade não admite negar a uma mulher o uso de técnicas de procriação assistida somente pelo fato de ser solteira. Como o planejamento familiar é um direito constitucionalmente assegurado, não comporta limitações. Ao depois, está comprovado que o filho não tem o seu desenvolvimento prejudicado por ter sido gerado por inseminação artificial. O interesse da criança deve ser preponderante, mas isso não implica concluir que não possa vir a integrar uma família monoparental, desde que o genitor isolado forneça todas as condições necessárias para que o filho se desenvolva com dignidade e afeto.”

No que tange ao embrião, a ele deve ser atribuído o direito à dignidade humana, porque como veremos ao longo do presente trabalho, o embrião é vida humana e tem o direito de se desenvolver como um futuro ser sujeito de direito. Veja o pensamento do Dr. Gonzalo Herranz, Diretor do Departamento de Humanidades Biomédicas da Universidade de Navarra, verbis:

“El núcleo ético del argumento es este: no todos los seres humanos son iguales, pues unos tienen más valor y más dignidad que otros. En concreto, ciertos seres humanos, y los embriones congelados caducados se cuentam entre ellos, valen muy poço y podemos intercambiarlos por cosas más valiosas. No tienen nombre, ni son personas como lãs otras. Están condenados a morir y nadie los llorará  ni celebrará funerales por su muerte, inevitable y autorizada por la ley. Pero, como democratas, se há de replicar que no es justo ni razonable dividir a los seres humanos em grupos de valor diferente. Los embriones sobrentes son, ante todo, hijos, que forman parte de una família. Formában parte de un grupo de hermanos. De ellos, unos fueron considerados dignos de ser transferidos al seno de su madre y son ahora ninos llenos de alegría de vivir. Pero, por um azar trágico, los otros fueron dejados de lado. La humanidad há madurado trabajosamente la Idea de que a todos los miembros de la familia humana se há de conferir la misma dignidad, aunque sus ideas o su apariencia difieran radicalmente de lãs propias”[18]


4. A BIOÉTICA COMO FORMA DE ORIENTAÇÃO

Uma das grandes preocupações no campo da ética biomédica é a hipótese de melhorias para a raça humana no que se refere aos seus aspectos físicos. Trata-se da eugenia e “qualidade de vida”.

Francis Galton é considerado o pai da pesquisa moderna para melhorar a raça humana através da aplicação das leis de hereditariedade. Foi ele quem cunhou o termo “eugênico” para designar os “bem-nascidos”. O movimento eugênico espalhou-se rapidamente da Inglaterra para a Europa continental, Estados Unidos e Japão.

Quando o biólogo Alemão Augusto Weismann provou que características adquiridas não são transmitidas por hereditariedade, a conclusão óbvia dos eugenistas foi a de que reformas sociais não podem melhorar as condições da raça humana; esta pode ser melhorada unicamente através da procriação seletiva, isto é, impedindo que indivíduos inferiores procriem e tenham filhos.

Observa Vargas que, em decorrência dos avanços na genética, os eugenistas contemporâneos se utilizam do aconselhamento genético para atingir os objetivos do momento eugênico. Lembra ainda o citado autor que o exame genético se refere a vários procedimentos pelos quais as anormalidades herdadas podem ser descobertas. Os métodos podem ser aplicados nos vários estágios da vida da pessoa. Grandes discussões decorrem daí, quando se menciona o exame genético em massa e o problema da estigmatização que possa acionar.

A ciência, conforme muito bem analisa Fátima de Oliveira, é socialmente construída. Desse modo, todas as faces de gênero e do racismo estão nela fortemente representadas. Argumenta, ainda, que apesar dos limites e a impotência da reflexão e ação da Bioética nas condições das sociedades atuais, essa reflexão e ação são necessárias para criarmos alternativas. “As biotecnologias contemporâneas, inegavelmente, evidenciaram que as regras de controle social e as relações atuais entre ciência, governo e sociedade estão superadas. É emergencial que criemos novas regras de convivência.”[19]

Daí a importância da bioética, no sentido de suscitar um debate necessário e franco, para que determinadas ações sejam coibidas, no sentido de se preservar a dignidade da pessoa humana. Sob o argumento de que o bem da sociedade deve estar em primeiro plano, pessoas são violadas em sua integridade, como os embriões que são utilizados em laboratório para pesquisas científicas.

A fertilização in vitro e a transferência de embriões; experimentação com animais; fertilização interespécies e as formas anômalas de procriação (fusão celular, partenogênese e clonagem) são métodos que precisam ser regulamentados pelo Direito.  É a partir dessas técnicas procriativas que o homem vem demonstrando ser capaz de substituir a natureza na concepção da vida, ou pelo menos vem tentando imitá-la.

Gena Corea, Diretora associada do Institute for Women and Technology, Massachusetts, Estados Unidos, chama a atenção para o fato de que, à medida que as tecnologias conceptivas se expandem, sua concepção industrial também cresce, e alerta:

“Os óvulos tornam-se matéria-prima e são tirados do ovário de uma mulher para serem implantados no útero de outra. Essas mulheres serão consideradas procriadoras, como animais de procriação, vendidas como tais. Contra tal método, a citada autora, ao dizer que esta seja uma nova forma de prostituição reprodutiva, da qual muitos médicos são os estimuladores.”[20]

As novas tecnologias são desenvolvidas a partir de grandes investimentos, que, por sua vez, esperam por retornos, a fim de se realizarem os lucros dos vultosos investimentos empregados. Assim, necessariamente há que se fazer a ligação entre ciência, indústria e mercado, com as normas éticas de conduta humana, fundamentadas na dignidade do homem.

É preciso entender que as condutas, que porventura venham ocasionar algum dano, devem ser reprovadas tanto no nível ético como no contexto jurídico.

No que se refere à responsabilidade do cientista, podemos até mesmo pensar numa responsabilidade sem culpa, na hipótese de o dano ter sido ocasionado sem a intenção dolosa, ou quando não caracterizada a culpa por negligência, imperícia ou imprudência. Põe-se em perspectiva a responsabilidade ética.

Em decorrência do desenvolvimento biotecnológico, novas perspectivas jurídicas se colocam como necessárias ao tratamento dessas questões tão novas no contexto humano. Surgem novos direitos que devem ser regulamentados. É o próprio homem, como espécie, que está em jogo e é preciso haver disciplina jurídica para evitar que danos possam deturpar a espécie humana.

A pessoa é o ser humano individualizado, concebido como tendo existência própria, caracterizado essencialmente por sua unicidade – individualidade e racionalidade. A qualidade de pessoa não é compatível com a de animal ou coisa. A pessoa é entidade racional, orgânica, psíquica e simbólica. No plano jurídico, a pessoa passa a ser compreendida como sujeito de direito, capaz de ser titular de direitos e obrigações. A todo ser humano vivo se reconhece a personalidade jurídica.

Sujeito de direito é o ser a quem a ordem jurídica assegura o poder de agir, contido no Direito. Quando a ordem jurídica reconhece personalidade jurídica às pessoas, tem em vista a pessoa humana ou os interesses humanos. Sujeito de direito é o homem e, em razão dele, e por causa dele, o Direito se constitui, ensina Beviláqua.[21]

No quadro do paradigma bioético, a pessoa não é vista conforme essa perspectiva jurídica. A pessoa humana é concebida na qualidade de um “eu” único, autônomo, dotado de dignidade. Os princípios bioéticos procuram resguardar valores que protejam o sentido de pessoa humana dotada de dignidade.

Com o domínio da natureza, incrementado pelo progresso científico, valores como identidade, unicidade e autonomia – entendidos como valores inestimáveis da pessoa humana – são colocados em risco. Os princípios bioéticos estabelecem as bases sobre as quais as ciências da vida devem se pautar. Nesse momento é que percebemos a importância e a necessidade do Direito. É a partir de um raciocínio jurídico que se estabelecem as fronteiras ou os limites que determinam o início e o fim da personalidade jurídica. A bioética pode informar ao Direito, por exemplo, se a vida pré-natal ou se a vida degradada ou terminal deve ser protegida contra a livre disposição de alguém.

Conforme salienta Oliveira Baracho, com indicações em torno das questões da vida, da morte e da consciência, “a bioética está em permanente evolução, devido ao constante progresso da ciência”[22]. Nesse sentido, os princípios que garantem a liberdade, a igualdade e o respeito à dignidade humana, conforme muitas constituições, devem ser judicialmente tutelados. Baracho afirma com veemência que “precisamos de um novo discurso regulador dos princípios fundamentais”, tendo em vista que a Bioética está criando novidades no campo da ética e do Direito, que possibilitarão novas atitudes reflexivas para a sociedade contemporânea.

O Biodireito, um novo ramo do Direito que vem despontando, refere-se aos fatos, eventos que surgem a partir das pesquisas das ciências da vida; que nascem a partir do “aumento do poder do homem sobre o próprio homem, que acompanha inevitavelmente o progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e os outros homens, ou criar novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permitir novos remédios para as suas indigências”.[23]

O Biodireito é um novo ramo do Direito que trata da teoria, dos princípios, da legislação e da jurisprudência relativas às normas reguladoras da conduta humana, em face dos avanços da biologia, da biotecnologia e da medicina. O Biodireito concede tratamento ao homem não como ser individual, mas, acima de tudo, como espécie a ser preservada.

O Biodireito surge na esteira dos direitos fundamentais e, nesse sentido, inseparável deles. O Biodireito contém os direitos morais relacionados à vida, à dignidade e à privacidade dos indivíduos, representando a passagem do discurso ético para a ordem jurídica, não podendo, no entanto, representar “uma simples formalização jurídica de princípios estabelecidos por um grupo de sábios, ou mesmo proclamado por um legislador religioso ou moral. O Biodireito pressupõe a elaboração de uma categoria intermediária, que se materializa nos direitos humanos, assegurando os seus fundamentos racionais e legitimadores.”[24]

A fecundação assistida e a doação de óvulos e espermatozóides também reclamam grandes e profundas reflexões, que tangenciam os princípios da isonomia, da privacidade e da dignidade humana. Entende-se por fecundação a palavra em sua mais radical e despojada significação: dar origem a uma nova vida em que esteja aprioristicamente assegurado ao nascituro, por exemplo, o direito a uma convivência familiar e social indene de desconforto ou desajuste.

Os métodos de reprodução assistida são aceitáveis apenas e tão-somente para fins que se estabeleçam como razoáveis, ligados ao princípio da preservação da vida e de uma vida saudável. Uma manipulação que  se estabeleça como utilização sábia da técnica.

Vale ressaltar que nos processos éticos não há a figura do acusador e do defensor como ocorre no contexto da jurisdição estatal. Nas operações éticas deve-se buscar a preservação da dignidade da pessoa humana e o respeito ao valor maior, que é a vida. Deve-se atentar para a autonomia da vontade do usuário das técnicas de reprodução, que deve, necessariamente, ser informado sobre as probabilidades de toda a terapêutica a ser adotada, destacando-se os riscos e benefícios de cada uma.

Ética constitui-se, antes de tudo, em honestidade. Todo e qualquer procedimento deve ter o consentimento informado. Toda decisão a ser tomada, em que não haja a possibilidade de o paciente se manifestar a respeito, deve ser orientada pelos princípios éticos, pela legislação e princípios constitucionais.

Oliveira Baracho atenta para o fato de que a “experimentação sobre o homem situa-se na confluência de vários direitos, inclusive no que se refere à integridade física, protegida pelo Direito Penal. Alerta, ainda, o constitucionalista mineiro que a inviolabilidade da pessoa humana se vê ameaçada por manipulações excepcionais, com a utilização de técnicas gerais para o desenvolvimento da pesquisa científica, muitas vezes decorrentes das lógicas do desejo e do lucro.  Em face desse perigo, torna-se necessária a produção de normas de emergência, assentadas em regras bioéticas e deontológicas. Nesse sentido, bioética e biodireito estabelecem-se no terreno da cidadania, que hoje engloba em seu conceito, os princípios garantidores dos direitos humanos.”[25]

As incertezas dos casos inéditos devem ser enfrentadas pelo Poder Judiciário, a partir de uma interpretação bioética, pondo sempre em perspectiva a prudência diante dos princípios basilares em torno da dignidade, privacidade e direito à vida. Deve-se ter em mente a necessidade da proteção integral da pessoa.

A nova biotecnologia representa um desafio para o Direito, tendo este por tarefa primordial não somente assegurar o direito à vida e à dignidade humana, mas também a de garantir a integridade das gerações futuras.

Como bem asseverou Sloterdijk, “são temas arriscados, que imprimem um agudo sentimento do perigo representado por uma antropotécnica política, cuja finalidade pode ser a neocriação sistemática de exemplares humanos mais próximos dos protótipos ideais”[26].

O Biodireito deve estabelecer mecanismos para que se evite uma predeterminação genética, sob pena de cairmos nos abismos de uma sociedade de inumanos.

É preciso coragem dos nossos legisladores para enfrentar esses desafios que se impõem ao nosso tempo. A Alemanha, em 13 de dezembro de 1990, adotou a Lei de Proteção ao Embrião, que regulamenta a procriação assistida. Trata-se de uma lei de grande precisão técnica, tendo por principais destinatários os médicos e os biólogos. Conforme a citada lei, desde o começo da vida humana, a manipulação desta deve encontrar limites claros.

Todos esses aspectos legais impedem, por sua vez, a manipulação das gerações futuras, impondo respeito à alteridade, sem contar que algum erro cometido em tais manipulações poderia provocar sérios danos, que hereditariamente poderiam vir a ser transmitidos às gerações vindouras.

A eticidade do jurídico deve inclinar-se a estabelecer a conciliação de valores que possam admitir o Direito como algo além de um fenômeno ligado ao poder social estabelecido. 

Perelman adverte:

 “Ao integrar no direito positivo regras e valores diferentes daqueles reconhecidos pela lei, o juiz procura conciliar a lei com a justiça, ou seja, aplicar a lei de forma que suas decisões possam ser socialmente aceitáveis. É seguindo o mesmo espírito que após a Segunda Guerra várias constituições européias introduziram em seu texto artigos que protegessem os valores fundamentais de uma sociedade democrática  e, de modo mais especial, dos direitos humanos.”[27]

Ressalte-se, também, que os textos legais não contêm todo o Direito. Cabe aos julgadores realizar as escolhas nessa imbricada relação. Deve ser uma escolha com base em princípios; uma escolha ética. No que se refere ao plano dessa pesquisa, entendemos que mesmo que a legislação ainda não se tenha manifestado sobre algum tema da Bioética em específico, os estudos elaborados pelos comitês de Bioética podem servir de base para os operadores do Direito para a fundamentação de suas petições e decisões. No entanto, toda e qualquer decisão deve-se alinhar ao conteúdo dos direitos humanos e fundamentais, entendidos como direitos morais, que, por essa qualidade, devem merecer a proteção do Estado.

A vida e a dignidade encontram-se acima das leis. Uma decisão ética é toda aquela que busca preservá-las. O Biodireito nasce da necessidade de preservação do homem diante dos perigos de suas próprias conquistas, proporcionadas pelo conhecimento racional, manifestado na tecnologia. O Biodireito enquadra-se no contexto paradigmático de uma cultura que se constrói  a partir da técnica, da previsibilidade. O Biodireito eleva-se como construção teórica que expressa a consciência moral de um novo homem, que vem forjando e delineando uma nova civilização. Os conflitos que daí advirão não são simples conflitos, são conflitos pertinentes a uma nova sociedade que se vem configurando. No entanto, a despeito de todas as improbabilidades, o Biodireito coloca-se como o intermediador desses novos conflitos, no sentido de se possibilitar a passagem pacífica para esse novo tempo, no qual nos encontramos. Conforme as palavras da professora Maria Helena Diniz:

 “tanto a Bioética como o Biodireito deverão contribuir para o desenvolvimento das ciências da vida, garantindo o respeito à dignidade da pessoa humana na transformação das condições da existência, constituindo o núcleo de um projeto de formação para a ética das ciências e o componente essencial da cultura geral do século XXI."[28]


5. TUTELA LEGAL

Antes de adentrarmos os problemas jurídicos decorrentes da reprodução assistida é mister observar que não temos uma legislação que regulamente o assunto. Não existe um estatuto sistematizado sobre o tema.

“Há verdadeiramente, uma grande vocacio legis em relação à possibilidade de se constituir família por meio da reprodução assistida. A única normatização existente é do Conselho Federal de Medicina, que não impõe qualquer limitação à mulher solteira. Se a mulher é casada ou vive em união estável, é necessária a concordância do cônjuge ou do companheiro para que se submeta ao procedimento reprodutivo. Aliás, a própria lei (1597) autoriza a formação da monoparentalidade ao permitir a utilização do esperma do marido pré-morto na fecundação post-mortem.[29]

A regulamentação jurídica dos eventos que envolvem o Biodireito constitui empenho necessário e de grande responsabilidade. A atividade legiferante nesse terreno, mesmo que ainda de forma acanhada, já se vem manifestando. A liberdade científica não deve ser censurada, o que não quer dizer que a sua atuação possa ir às raias da transgressão aos princípios do direito à vida e da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, a importância do Direito na Biologia. Contudo, o tratamento global dessas questões ainda não alcançou uma projeção satisfatória, tendo em vista a amplitude das temáticas envolvendo a tecnociência no âmbito da vida.

Vale dizer que não basta uma legislação específica em torno dos problemas bioéticos. Faz-se necessário que tal legislação encontre amparo e condições de eficácia no âmbito do ordenamento compreendido como sistema.

A dicotomia liberdade-coação deve estar em consonância com os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, tendo na Constituição o vértice de onde deve irradiar toda produção normativa, legítima e válida.

No que se refere à autonomia individual, esta deve pautar-se pela legalidade. A constituição impõe múltiplas tarefas ao Estado, cuja realização depende da sua intervenção. Não obstante a necessidade de uma legislação que venha possibilitar a implementação dessas tarefas, os valores ali sintetizados podem ser observados nas condutas individuais, no sentido de transformar aquilo que se encontra como uma diretriz para o Estado também em diretriz para as condutas no âmbito do privado.

Atualmente, no Brasil, a matéria está regulamentada pela Resolução nº 1.358/92 do Conselho Federal de Medicina, podendo ser questionada a sua validade perante a principiologia constitucional e, também, no que tange à hierarquia.

No que diz respeito à hierarquia, questiono a validade de uma resolução regulamentar matéria tão séria, de âmbito tão abrangente. A ausência de uma legislação condensada sobre o assunto ocasiona uma insegurança jurídica para todos os cidadãos.

O conteúdo da resolução, muitas vezes, entra em conflito com o princípio constitucional da dignidade humana, conforme veremos no presente estudo.


6. O INÍCIO DA VIDA HUMANA

Imperioso determinar qual o momento em que o ser humano inicia a sua existência. Inúmeras teorias são colocadas para solucionar a questão, entretanto nenhuma obteve êxito pleno.

A TEORIA CONCEPTUALISTA apregoa que a vida humana inicia desde o momento da concepção, da fecundação do óvulo, momento em que o ovo ou zigoto apresenta um código genético próprio. Tal teoria é baseada em princípios biológicos e morais.

 “O gameta feminino, chamado óvulo ou ovócito, é expelido, maduro, pelo ovário e captado pelas trompas de Falópio, onde inicia seu trajeto até o útero. Viável por um ou dois dias, é fecundado ainda no terço distal das trompas.  Este fato representa o início da gravidez. Neste momento forma-se uma célula completa, com o número certo de cromossomos e a ativação do zigoto, iniciando-se uma série de divisões celulares e a segmentação.” [30]

A TEORIA DA NIDAÇÃO defende que o nascituro surge com o fenômeno da nidação, ou seja, da fixação do ovo na parede do útero materno. Com isso sua viabilidade estaria garantida, num estágio de sobrevida. Esta teoria é também conhecida como  desenvolvimentistas. Afirmam que a fecundação, mesmo estabelecendo as bases genéticas, o novo ser necessita de um certo grau de desenvolvimento e, por isso, a vida começaria da nidação.

“o início da vida dá-se a partir do momento em que o embrião faz a sua ligação com o útero materno, ou seja, fixa-se, o que acontece por volta do 6º dia a partir da fecundação, passando a receber dele irrigação sangüínea. Somente a partir de então, o ovo ou zigoto tonar-se-ia viável e definitivamente em evolução. Esta variante não considera, então, os embriões que não estão nesta posição ótima de desenvolvimento, tais como os fecundados in vitro e os congelados.”[31]

A TEORIA GENÉTICA admite como ser humano aquele que tem código genético definido, ou seja, a partir da concepção.

Alguns ainda defendem a teoria do 14º dia. Para eles, surge aí a formação do plano construtivo do embrião rudimentar, organização do sistema nervoso central. Nesse prazo, pode ocorrer também o desdobramento do embrião em partes idênticas, dando lugar a gêmeos monozigóticos, não se podendo falar em indivíduo, tendo em vista que poderá ainda se dividir.

Existem outras teorias, tais como a infusão da alma no corpo e a configuração dos órgãos, que não possuem relevância jurídica.

Entendo que a teoria conceptualista é a que melhor explica o momento do nascimento, tendo em vista que o óvulo fecundado é a primeira célula do novo ser. Não tendo a medicina conseguido responder de forma satisfatória quanto ao início da vida humana, acredito que devemos seguir a teoria que implique maior preservação ao ser humano. Adotando a teoria concepcionista, estamos excluindo todas as possibilidades de extermínio humano. Aqueles que optam por utilizar métodos de reprodução assistida não podem e olvidar do fato de que estão criando seres humanos que devem ser preservados em sua excelência.

Dernival da Silva Brandão, especialista em Ginecologia e embriologia, emérito da academia fluminense de medicina, afirma:

“O embrião é um ser humano na fase inicial de sua vida. É um ser humano em virtude de sua constituição genética específica, própria e de ser gerado por um casal humano – espermatozóide e óvulo. Compreende a fase de desenvolvimento que vai desde a concepção (grifo nosso), com a formação do zigoto na união dos gametas, até completar a oitava semana de vida. Desde o primeiro momento de sua existência esse novo ser já tem determinadas as suas características pessoais fundamentais como sexo, grupo sanguíneo, cor da pele e dos olhos, etc. É o agente do seu próprio desenvolvimento, coordenado de acordo com o seu próprio código genético. A ciência demonstra insofismavelmente – com os recursos mais modernos – que o ser humano, recém-fecundado, já tem o seu próprio patrimônio genético e o seu próprio sistema imunológico diferente da mãe. É o mesmo ser humano – e não outro – que depois se converterá em bebê, criança, jovem, adulto e ancião. O processo vai-se desenvolvendo suavemente, sem saltos, sem nenhuma mudança qualitativa. Não é suficientemente admissível que o produto da fecundação seja, nos primeiros momentos, somente uma matéria germinante. Aceitar, portanto, que depois da fecundação existe um novo ser humano, independente, não é uma hipótese metafísica, mas uma evidência experimental. Nunca se poderá falar de embrião como ‘uma pessoa em potencial’ que está em processo de personalização e que nas primeiras semanas pode ser abortada. Por quê? Poderíamos perguntar-nos: em que momento, em que dia, em que semana começa a ter a qualidade de um ser humano? Hoje não é; amanhã já é. Isto, obviamente, é cientificamente absurdo.” [32]

O cientista francês Jérôme Lejeune doutrina:

“Não quero repetir o óbvio, mas, na verdade, a vida começa na fecundação. Quando os 23 cromossomos masculinos se encontram com os 23 cromossomos da mulher, todos os dados genéticos que definem o novo ser humano estão presentes. A fecundação é o marco inicial da vida humana, daí para frente, qualquer método artificial para destruí-la é um assassinato.”[33]

O Doutor Dalton  Luiz de Paula Ramos, livre docente da Universidade de São Paulo, professor de Bioética da USP, assim se manifesta sobre a temática:

“Os biólogos empregam diferentes termos – como por exemplo zigoto, embrião, feto, etc, para caracterizar diferentes etapas da evolução do óvulo fecundado. Todavia esses diferentes nomes não conferem diferentes dignidades a essas diversas etapas. Mesmo não sendo possível distinguir nas fases iniciais os formatos humanos, nessa nova vida se encontram todas as informações, que se chamam código genético, suficientes para que o embrião saiba como fazer para se desenvolver. Ninguém mais, mesmo a mãe, vai interferir nesses processos de ampliação do novo ser. A mãe, por meio do seu corpo, vai oferecer a essa nova vida um ambiente adequado (o útero) e os nutrientes necessários. Mas é o embrião que administra a construção e executa a obra. Logo, o embrião não é da mãe, ele tem vida própria. O embrião está na mãe, que o acolhe pois o ama. Não se trata, então, de um simples amontoado de células. O embrião é vida humana.

A partir do momento que alcançando maior tamanho e desenvolvimento físico, passamos a reconhecer aqueles formatos humanos (cabeça, tronco, mãos e braços, pernas e pés, etc. ) podemos chamar essa nova vida de feto.”[34]

A Dra. Alice Teixeira Ferreira, professora da UNIFESP/EPM na área da biologia celular, afirma, verbis:

“Em 1839, Schleiden e Schwan, ao formularem a teoria Celular, foram responsáveis por grandes avanços da embriologia. O corpo é formado  por células que levam a compreensão de que o embrião se forma a partir de uma única célula, o zigoto, que por muitas divisões celulares forma os tecidos e órgãos de todo ser vivo, em particular o humano.  Confirmando tais fatos, em 1879, Hertwig descreveu eventos visíveis na união do óvulo  ou oócito com o espermatozóide em mamíferos. Para não se dizer que se trata de conceitos ultrapassados verifiquei que todos os textos de embriologia humana consultados afirmaram que o desenvolvimento humano se inicia quando o oócito é fertilizado pelo espermatozóide. Todos afirmam que o desenvolvimento humano  é a expressão do fluxo irreversível de eventos biológicos ao longo do tempo que só pára com a morte. Todos nós passamos pelas mesmas fases do desenvolvimento intra-uterino: fomos um ovo, uma mórula, um blastocisto, um feto.”[35]

A doutora Elizabeth Cerqueira, perita em sexualidade humana, assim se manifesta:

“O zigoto, constituído por uma única célula, produz imediatamente proteínas e enzimas humanas, e não de outra espécie. É biologicamente um indivíduo único e irrepetível, um organismo vivo pertencente à espécie humana. O tipo genético, as características herdadas de um ser humano individualizado é estabelecida no processo de concepção e permanecerá em vigor por toda a vida daquele indivíduo. O desenvolvimento humano se inicia com a fertilização, o processo durante o qual um gameta masculino ou espermatozóide se une a um gameta feminino ou oócito para formar uma célula única chamada zigoto. Esta célula altamente especializada e totipotente marca o início de cada um de nós, como indivíduo único.”[36]

O ordenamento jurídico atual não reconhece direitos ao embrião. Reconhece ao nascituro. Também não o qualifica. Ele não é pessoa natural, visto que não nasceu. Não é nascituro, visto que não se encontra em ambiente apropriado ao seu desenvolvimento, o ventre materno. Também não é prole eventual, uma vez que se encontra concebido e, desta forma, afasta a eventualidade. Poder-se-ia tentar equiparar o embrião de laboratório ao nascituro, entretanto, tal não poderia corresponder à verdade, uma vez que, em laboratório, o embrião encontra-se sem condições de desenvolvimento pleno e autônomo capaz de torná-lo pessoa natural. Contudo, conforme diz Maria Helena Diniz, é comprovado pela fetologia e as modernas técnicas da medicina que a vida se inicia no ato da concepção, ou seja, da fecundação do óvulo pelo espermatozóide, dentro ou fora do útero. [37] Segundo a mesma autora, a vida humana inicia-se com a concepção. Desde esse instante, tem-se um autêntico ser humano e, seja qual for o grau de evolução vital em que se encontre, precisa, antes do nascimento, do útero e do respeito á vida.[38]

O feto é um ser com individualidade própria; diferenciando-se, desde a concepção, tanto de sua mão como de seu pai e de qualquer pessoa, e, independentemente do que a lei estabeleça é um ser humano. Em poucos dias, seus órgãos estão formados e funcionado, aumentando apenas de tamanho com o passar do tempo, já percebe ruídos desagradáveis que o inquietam.

Szaniawsky, citado por Maria de Fátima Freire Sá:

“Não se pode discriminar, não se pode criar categorias de pessoas em desenvolvimento, dividindo-as em um embrião inserido no útero de mulher e em um embrião que está se desenvolvendo in vitro, considerando o primeiro embrião uma pessoa e o segundo não! Não pode a lei garantir a um embrião a vida plena, punindo penalmente àquele que interromper seu desenvolvimento e, de outro lado, autorizar legalmente a faculdade de matar o outro embrião. Ambos os embriões possuem o mesmo grau de personalidade, são sujeitos de dirieto e possuem idêntico direito à vida e de nascer.”[39]

A nomeclatura dos diversos estágios de desenvolvimento (zigoto, embrião, feto) tem apenas o sentido de caracterizar estágios não-escalonados ou novos impulsos de desenvolvimento, devendo ser protegido em sua integralidade. O embrião possui vida humana desde o momento da fertilização, possuindo a possibilidade de desenvolver plenamente essa vida humana, desde que lhe sejam dadas as condições ambientais necessárias para isso.

Immanuel Kant, em seu livro Metafísica dos Costumes, publicada em 1797, forneceu a fundamentação filosófica a um decreto do Direto Geral Prussiano (DGP), afirmando que os Direitos da humanidade cabem inclusive às crianças ainda em gestação a partir da sua concepção.


7. DAS TÉCNICAS BIOLÓGICAS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA

O que vem a ser técnicas de reprodução assistida? Podemos conceituá-la como o conjunto de métodos que proporcionam a manipulação de gametas e embriões, com a finalidade de lutar contra a infertilidade humana, com probabilidade de sucesso.

Existem várias técnicas de reprodução assistida no Direito Brasileiro, dentre elas podemos citar, principalmente, a inseminação artificial (GIF) e a fecundação artificial in vitro (FIT).

7.1 - FORMAS DE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL:

7.1.1 HOMÓLOGA

Maria Berenice Dias explicita-nos:

“Existem duas formas de inseminação artificial: a homóloga e a heteróloga. Na inseminação homóloga o material genético pertence ao par. É utilizada nas situações em que o casal possui fertilidade, mas não é capaz da fecundação por meio do ato sexual. A gravidez de uma mulher casada decorrente da inseminação artificial leva à suposição de que o marido é o cedente do espermatozóide, pois gera a presunção de paternidade. ( 597 II), Mesmo depois do falecimento do cônjuge, persiste a presunção de paternidade, em sendo usados embriões excedentários (1597, III).” [40]

7.1.2- HETERÓLOGA

Na inseminação heteróloga, o esperma é doado por terceiro. É doado nos casos de esterilidade do marido. Tendo havido a prévia autorização, também se estabelece a presunção pater est (1597, III), ou seja, tendo o varão concordado de modo expresso com o uso da inseminação artificial, assume ele a condição de pai ou filho que venha a nascer.

7.2 – MÉTODOS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA

7.2.1 - A INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL (GIFT)

É um método artificial na qual é colhido o material genético do homem, através de masturbação em laboratório, e congelado em solução de azoto líquido para posterior implantação no colo do útero (inseminação intracervical), diretamente na vagina (inseminação intravaginal) ou, ainda, na cavidade do útero (inseminação intra-uterina). Observa-se que, no caso de inseminação artificial, a fecundação ocorre dentro do próprio corpo da mulher.

Quanto ao que seja inseminação artificial, Reinaldo Pereira e Silva leciona:

"A inseminação artificial consiste em técnica de procriação assistida mediante a qual se deposita o material genético masculino diretamente na cavidade uterina da mulher, não através de um ato sexual normal, mas de maneira artificial. Trata-se de técnica indicada ao casal fértil com dificuldade de fecundar naturalmente, quer em razão de deficiências físicas (impotentia coeundi, ou seja, incapacidade de depositar o sêmen, por meio do ato sexual, no interior da vagina da mulher; má-formação congênita do aparelho genital externo, masculino ou feminino; ou diminuição do volume de espermatozóides [oligoespermia], ou de sua mobilidade [astenospermia], dentre outras), quer por força de perturbações psíquicas (infertilidade de origem psicogênica” [41].

Nas palavras de Álvaro Villaça Azevedo:

 “a inseminação artificial intra-uterina consiste na inserção de sêmen, por meio de uma sonda de plástico, na cavidade uterina da mulher. Logo após sua inserção, os espermatozóides, naturalmente, dirigem-se para as trompas de falópio na busca de um óvulo para fecundar. Ressalte-se que dos milhares de espermatozóides inseridos no anterior do corpo feminino apenas um poderá fecundar o óvulo”.[42]

Para aumentar a probabilidade efetiva de uma gravidez, a aplicação é feita em períodos em que a mulher está hiperestimulada, ou seja, no período em que produz um número de óvulos maior.

O procedimento de inseminação artificial é de baixo custo e complexidade, ocasionando impactos menores ao casal, se comparada com outras técnicas de reprodução.

Existe uma grande coincidência entre a maternidade biológica e a gestação, em outras palavras, a mãe recebe o esperma do doador dentro do próprio corpo, que abriga sua célula e começa a gestação do feto.         

Tal método é indicado nos casos de hipofertildade, problemas ocorridos no momento do ato sexual e esterilidade.

A inseminação é classificada em homóloga ou heteróloga. A primeira ocorre com o material genético colhido do marido ou companheiro; a segunda ocorrerá quando retirar material genético de terceiro diverso do marido ou companheiro da mulher inseminada.

A inseminação artificial homologa é uma técnica de reprodução assistida, indicada em casos de hipofertildade, perturbação das relações sexuais e esterilidade secundária (após tratamento esterilizante). Nesse caso as células germinais a serem utilizadas serão aquelas pertencentes ao marido da própria paciente.

7.2.2 - A FECUNDAÇÃO ARTICIAL (ZIFT)

A fecundação artificial dá origem aos chamados bebês de proveta. Deve ser utilizada nos seguintes casos: esterilidade tubária feminina, hipofertildade masculina, endometriose e esterilidade sem razão aparente ou quando não se consegue detectar a origem. [43]

Tal método pode ser utilizado em duas hipóteses: A primeira, quando a mulher não pode gerar por possuir problemas com a gestação, caso em que ocorrerá a retirada do óvulo da mulher para a implantação em uma terceira mulher, chamada de doadora. O outro caso em que poderá ser utilizada a fecundação artificial será quando a mulher é capaz de gerar, entretanto é estéril, sendo necessário uma doadora de óvulos.

No primeiro caso acima citado, teremos o chamado bebê de proveta, a também chamada como maternidade substituta.

Percebe-se, portanto, que o método supre a carência de óvulo e a carência de gestação.

Este fenômeno também é considerado como fertilização in vitro que consiste na fusão de gametas humanos em ambientes artificialmente produzidos e a posterior transferência do embrião para o útero.

O procedimento inicia-se com a estimulação ovariana. Em seguida, através de uma punção no ovário realiza-se a coleta do óvulo, que é, posteriormente, colocado num recipiente em meio de cultura.

Os espermatozóides são preparados e selecionados em laboratório e, depois, colocados em meio de cultura.

Depois de preparados, os dois materiais genéticos eles serão inseridos em um recipiente que deve reproduzir fielmente as trompas de falópio. Aqui, espera-se fusão dos gametas que originará o embrião para ser, logo em seguida, inserido dentro do útero para a gestação.

Para que tal técnica obtenha sucesso, faz-se, geralmente, a transferência de até quatro embriões para o útero, aumentando as chances de gravidez.

Este procedimento é um pouco mais complexo do que a inseminação artificial.

A biologia nos ensina que a fecundação ocorre nas trompas uterinas em sua porção mais longa e larga, denominada ampola da trompa uterina. Feita a fusão dos gametas o embrião irá fixar no útero. A este fenômeno dá-se o nome de nidação. Se não conseguir nidar, a criança não terá condições de se desenvolver.


8. AS IMPLICAÇÕES JURIDICAS DECORRENTES DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL E DA FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL

8.1– HOMÓLOGA

8.1.1 – A inseminação/fecundação post mortem

A fertilização homóloga é socialmente aceita, embora possa acarretar problemas ético-jurídicos, tais como a inseminação post mortem. Geralmente, a mulher é submetida a tratamento hormonal para obter superovulação. Os óvulos produzidos são fertilizados in vitro, formando vários embriões. Como não é viável implantar no útero todos os embriões de uma só vez, os excedentes são congelados para tentativas futuras, caso não ocorra a nidação. Nada obsta que um casal congele todos, protelando os planos da gravidez. O problema ocorre quando um dos consortes morre ou um casal se divorcia sem definir o destino dos embriões congelados. No segundo caso, terá o casal que tomar tal decisão durante a separação.

Outros questionamentos se apresentam: Quais os direitos da viúva divorciada sobre o material fertilizado? Poderia a clínica que coletou o material a inseminá-la, mesmo sem anuência do marido falecido ou do ex-consorte?

Por certo que não, pois a paternidade deve ser desejada, não imposta. A responsabilidade pela concepção é compartilhada pelo casal, visto que uma decisão dessa grandeza afetará tanto o homem quanto a mulher. É por isso que as cortes européias têm negado os pedidos de implantação ovular em mulheres viúvas ou recém divorciadas. É por isso também que Suécia e Alemanha vedam a inseminação post mortem.

8.1.2 – O CONSENTIMENTO INFORMADO  

Outro problema refere-se à recusa do pai que concordou com a inseminação artificial e, posteriormente, se recusa a fazê-la.  Um exame de DNA negaria a paternidade. Como então atribuir a paternidade a alguém?

Neste aspecto podemos afirmar que o marido deverá firmar um termo de consentimento informado, manifestando a sua vontade em realizar a inseminação artificial com a utilização do material genético de terceiro.

A resolução do Conselho Federal de Medicina, nº 1.358 de 11 de novembro de 1992 estabelece a obrigatoriedade do termo de consentimento informado, em seu capítulo sobre princípios gerais, nº 3:

“O consentimento informado será obrigatório e extensivo aos pacientes inférteis e doadores. Os aspectos médicos envolvendo todas as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão detalhadamente expostos, assim como os resultados já obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta. As informações devem também atingir dados de caráter biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento informado será em formulário especial, e estará completo com a concordância, por escrito, da paciente ou do casal infértil”.[44]

A manifestação de vontade, através do consentimento informado, acarreta uma obrigação de caráter irrevogável, não podendo o pai, em momento posterior, declarar a sua discordância em reconhecer a paternidade. O documento assinado pelo doador deverá, em minha opinião, atribuir ao pai todas as responsabilidades jurídicas, como direito à pensão alimentícia, direitos sucessórios, etc.

8.1.3 – EMBRIÕES EXCEDENTES

E quanto aos embriões excedentes? Aqueles que foram fecundados mas não são utilizados? O que fazer com eles? A professora Ana Cristina Rafful doutrina nos seguintes termos:

“A fertilização assistida ou fecundação in vitro (FIV) é uma técnica empregada com o escopo de solucionar a esterilidade humana, e se processa através da extração de óvulo maduro que se encontra ainda dentro do ovário da mulher, misturando-se ao espermatozóide do marido a fim de que ocorra a fecundação. O óvulo fecundado, por sua vez, é novamente transferido para o útero da mulher, sendo esta parte mais incerta de todo o procedimento. Para garantir maiores possibilidades de se obter uma gravidez através dessa técnica, os médicos implantam no útero da mulher mais de um embrião, mas para que isto efetivamente ocorra, é necessário que antes se extraia da mulher não um óvulo, mas vários deles, o que é conseguido através de uma estimulação artificial ou uma superovulação, para que então esse material extraído seja misturado aos espermatozóides, dando origem aos embriões. Em ocorrendo à fecundação de vários óvulos, por um lado à mulher tem mais chance de obter uma gravidez, mas por outro lado, isto faz gerar tanto o problema das gravidezes múltiplas o que pode acarretar inúmeros riscos para a saúde e a integridade física da mulher e do próprio conceito, como também o problema dos embriões excedentes, questão esta, ainda não resolvida pela ética e pelo direito.[45]

Tem-se, portanto, o problema que carece de solução.

Algumas sugestões são apresentadas pela doutrina dentre elas a utilização dos embriões para a doção; ou as próprias pessoas ficarem com a responsabilidade desses, netretanto, não existe ainda uma resposta satisfatória..

Outro problema diz respeito ao número de oócitos que serão inseridos na mulher. A resolução do Conselho Federal de Medicina estabelece, em seus princípios gerais nº4: “O número ideal de oócitos e pré-embriões a serem transferidos para a receptora não deve ser superior a quatro, com o intuito de não aumentar os riscos já existentes" [46].

Nos Estados Unidos, mais especificamente Estado da Louisiana, o embrião é denominado de “pessoa sob implantação”, não podendo ser intencionalmente destruído, mas vários embriões são adotados para que se tenha probabilidade de sucesso e não se sabe o que fazer com os restantes.

O problema jurídico que se instaura é a seguinte indegação: os embriões possuem personalidade jurídica? Se a resposta for negativa, podemos jogá-los fora, entretanto, se a resposta for positiva, temos que dar um destino, sob pena de ferirmos o princípio da dignidade humana.

Há Juristas que aceitam a destruição, a doação a casais estéreis, a crioconservação ou a utilização em pesquisas científicas, outros não toleram quaisquer das práticas enunciadas ante a certeza de que o embrião é um ser humano em formação, chegando a equiparar sua eliminação a um autêntico “embriocídio eugênico”, já que a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção, pouco importando se a inseminação deu-se in vitro.

Explica Maria Helena Diniz :

"Via de regra, antes da fecundação, a mulher é submetida a tratamento hormonal, para ter uma superovulação, para que vários óvulos sejam fertilizados na proveta, implantando-se, porém, dos quinze liberados, no máximo quatro deles no útero”

A resolução médica, mais uma vez, disciplina a matéria, afirmando que “o número total de pré-embriões produzidos em laboratório será comunicado aos pacientes, para que se decida quantos pré-embriões serão transferidos a fresco, devendo o excedente ser crio preservado, não podendo ser descartados ou destruídos” [47].

8.1.3.1 – A lei 11.105/2005 e o destino dos embriões

Com a aprovação da lei nº 11.105/2005, o legislador permitiu que os embriões inviáveis obtidos pela reprodução assistida in vitro pudessem ser utilizados para fins de pesquisa e terapia, dando-lhes, dessa forma, destinação. Entretanto, a solução encontrada pelo legislador não seguiu um parâmetro científico concreto, chegando alguns a afirmar a inconstitucionalidade do art. 5º da lei em comento.

Veja o conteúdo e os requisitos que a legislação impõe:

 “Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

        I – sejam embriões inviáveis; ou

        II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

        § 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

        § 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

        § 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997”.[48]

A mesma lei tipificou como crime em seu art. 24, a forma inadequada de utilização desses embriões humanos, in verbis: “art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que dispõe o art. 5º desta Lei: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”[49].

O art. 5º acima exposto, ao permitir, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células tronco embrionárias obtidas de embriões humanos, produzidos por fertilização in vitro e que sejam inviáveis pode ferir o princípio da dignidade humana.

   O legislador foi bem claro ao estatuir que poderão ser utilizados os embriões inviáveis. A questão que se põe é definir o conceito de “inviáveis”. Seriam aqueles embriões não inseridos na mulher? Ou seriam embriões que biologicamente não teriam condições de desenvolvimento? 

   É preciso ter em mente que o Brasil é adepto da teoria concepcionista, o embrião já é um ser humano dotado de personalidade jurídica a partir de sua concepção.

O embrião   esteja ou não acolhido no ventre materno, é um ser humano, e como tal, dotado de dignidade. Se analisarmos os cromossomos presentes nas células de um embrião produzido por fertilização in vitro, restará constatado tratar-se de um membro da espécie Homo sapiens, portanto, ser humano.

Na Itália publicou-se um documento denominado de "Identità e Statuto dell’Embrione Umano (Identidade e Estatuto do Embrião Humano), apresentado à imprensa pelo Dr. Francesco D’Agostinho, presidente do Comitê, que conclui“O Embrião é um de nós, é uma pessoa, é gente. Mais explicitamente aí se lê:

"O Comitê chegou unanimemente a reconhecer o dever moral de tratar o embrião humano, desde a fecundação, segundo os critérios de respeito e tutela que se devem adotar em relação aos indivíduos humanos aos quais se atribui comumente a característica de pessoa. Além de reconhecer como ilícita, dentre outras condutas, a produção de embriões para fins de experimentação médica ou para fins comerciais ou industriais, reconheceu o Comitê a iliceidade da supressão ou manipulação nociva de embriões, e o diagnóstico anterior ao implante, destinado a suprimir os embriões, caso sejam tidos como ineptos para a vida ”[50].

A expressão utilizada pelo legislador no inciso I do art. 5º possibilitará abertura muito grande para os cientistas ou pesquisadores podendo ocasionar supressão sumária de muitas vidas.

O elemento normativo denota a superficialidade do estudo da questão, o descaso para a regulamentação eficaz da matéria, desprezando as possibilidades que possam vir a ocorrer.

Se entendermos como inviáveis como sendo o embrião que mesmo sendo inserido no corpo da mulher não possibilitaria a gestação de um ser humano, o legislador andou muito bem. Entretanto, outras interpretações podem surgir vindo a ferir o conceito de dignidade humana.

A personalidade civil no Direito Brasileiro é protegida pelo Código Civil, em seu art. 2º que determina: a personalidade civil da pessoa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.[51] Dessa forma, adotou-se a teoria concepcionista, ou seja, o ser humano é protegido desde o momento da concepção. Antes do nascimento com vida, o ser gerado não possui personalidade civil, mas, como nascituro (gerado, mas ainda não nascido), todos os seus direitos, desde a concepção, são resguardados pela lei, principalmente o direito à vida, primando pela dignidade humana.

O embrião é um ser humano, mas não tem capacidade de dar seu consentimento. Esse consentimento implica capacidade para entender e decidir, e voluntariedade na decisão. Não se pode alegar que o consentimento dos genitores exigido no § 1º da Lei 11.105/2005, possa vir a suprir essa incapacidade, isto porque se trata do direito à vida, não legitimando a matança de seres humanos o consentimento das pessoas mencionadas no dispositivo. Por se tratar de direito indisponível, cumpre ao Estado preservar esse direito, e não transferir a responsabilidade a terceiros.

A inconstitucionalidade do art. 5º da Lei 11.105/2005 é manifesta pois ele vai de encontro ao princípio maior da nossa constituição, a dignidade da pessoa humana. A vida humana foi reduzida à categoria de "coisa", um bem do qual se pode dispor, manipular, destruir, trocar, tudo conforme os interesse dominantes. O art. 5º da Constituição Federal prioriza a inviolabilidade do direito à vida, colocando-o em primeiro lugar no elenco de outros direitos ali tutelados. Trata-se de um direito fundamental de primeira geração, assim denominados pela doutrina os direitos que têm como preocupação a defesa do indivíduo contra o arbítrio estatal. São os direitos negativos, que impõem o afastamento do Estado da área de domínio individual, permanecendo, entretanto, com a incumbência de guardião das liberdades individuais. Como direito subjetivo que é, o direito à vida impõe ao Estado a prática de um ato, qual seja, a sua proteção.

A Constituição Federal de 1988, ao assegurar a inviolabilidade do direito à vida, proibiu, terminantemente, a adoção de qualquer mecanismo que venha a interromper o processo vital do ser humano.

Esta nova lei, denominada de Lei do Biocrime, ao permitir experimentos com embriões humanos fertilizados in vitro, afrontou o art. 5º da Constituição Federal.

A procuradoria da República instaurou a ação Direta de Inconstitucionalidade contra o art. 5º da lei em comento. A liminar foi negada, carecendo, ainda, de decisão jurídica.

8.2.2 – PENSÃO ALIMENTÍCIA POST MORTEM NA FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL

Outra problemática pode ocorrer quando o doador venha, posteriormente, a realizar um pedido de pensão alimentícia contra o filho biológico ou almejar ser seu sucessor em caso de morte.

Nessa hipótese, o próprio doador, anos após a doação do esperma, resolve vasculhar e descobrir a identidade de seus filhos, afim de pedir pensão alimentícia, ou por outro motivo qualquer. É o que ocorreria se um doador, por exemplo, após descobrir ter uma doença grave e necessitar de um transplante, saísse em busca da identidade dos filhos biológicos com o objetivo de detectar um possível doador.

O Conselho Federal de Medicina, através da Resolução n. 1.358, de 11 de novembro de 1992, estabeleceu uma série de normas éticas para as técnicas de reprodução assistida e determinou no art. 2º, 1 e 2, que:

“Toda mulher, capaz nos termos da lei, que solicitado e cuja indicação não. Se afaste dos limites desta resolução, pode ser receptora das técnicas de RA, desde que tenha concordado de maneira livre e consciente em documentos de consentimento informado. Estando casada ou em união estável, será necessária a aprovação do cônjuge ou companheiro, após processo semelhante de consentimento informado[52]".

8.2.3 – DADOS PESSOAIS DO DOADOR NA FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL

Com relação, ainda, à inseminação artificial heteróloga, é preciso investigar se o filho tem o direito de obter os dados pessoais do doador do esperma em contraposição ao sigilo que normalmente os doadores exigem. Trata-se de um caso de violação do direito à própria imagem. Todo ser humano possui, além do desejo investigatório natural, o direito de conhecer suas origens, de onde herdou determinadas características etc. Esse direito vai muito além do recebimento de um relatório médico frio que informe ao filho as características genéticas do pai biológico, como predisposição ao desenvolvimento de doenças etc. Cuida-se da necessidade e do direito indisponível que todo ser humano possui à própria imagem.

A supracitada Resolução n. 1.358, de 11 de novembro de 1992, dispõe que será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores para resguardar a identidade civil dos mesmos, não obstante haja um cadastro de informações clínicas e uma amostra de material celular dos doadores que podem ser passados exclusivamente para médicos, sem a revelação da identidade civil do doador.

Segundo determina o douto Luiz Roldão de Freitas, em sua obra:

“Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e pré-embriões, assim como dos receptores. Em situações especiais, as informações sobre doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil do doador. As clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores” [53].

Guilherme Calmon Nogueira da Gama prescreve:

 "Apesar do anonimato dos doadores ser a regra em praticamente todos os países que possuem legislação a respeito, atendendo aos interesses da criança ou do adolescente, a lei sueca exatamente não prevê o sigilo, o anonimato, tendo em vista a necessidade de prevenir doenças genéticas, além de permitir que a pessoa possa, com a maioridade, conhecer o genitor biológico. Na França, há a discussão a respeito do anonimato em três esferas: a) se é conveniente permitir à criança, fruto de reprodução heteróloga, a identificação de seu pai biológico, ou deve haver segredo da concepção por uma técnica de reprodução assistida; b) se tal identificação deve conduzir à criação de vínculo jurídico entre a criança e o doador do material genético; c) se, em casos excepcionais, pode ser levantado o segredo da identidade do doador, como por exemplo, em casos de doenças hereditárias. Será que o sigilo deve ser absoluto ou relativo, permitindo o seu afastamento na eventualidade da pessoa concebida por meio de técnica de reprodução assistida pretender conhecer a sua ascendência genética, e tão-somente em relação a ela? Há direito à identidade genética, em havendo pais socioafetivos estabelecidos? Caso a resposta seja afirmativa, tendo sempre em mira o critério "the best interest of the child", necessariamente deve ficar afastado qualquer efeito jurídico no sentido de estabelecer direitos e deveres entre tais pessoas. Na Bélgica, no entanto, NATHALIE MASSAGER observa que inexiste qualquer disposição que impeça o estabelecimento da paternidade do doador, motivo pelo qual sugere uma urgente modificação nas regras em vigor em matéria de direito de filiação. O anonimato do doador de material genético deve realmente existir em matéria de reprodução assistida, mas não dentro de uma noção absoluta. No Direito europeu, mesmo em alguns países que seguem o sistema do Direito continental, filiando-se à tradição romana, há divergência de tratamento. Assim, há, em alguns textos normativos de países, previsão acerca de exceções ao anonimato, ora para prevenir ou curar doenças genéticas, ora para reconhecer o interesse da pessoa gerada por meio de reprodução assistida em conhecer a sua ascendência (identidade) biológica, mas sem qualquer atribuição de benefícios ou vantagens econômicas. Mas, na maior parte dos textos legislativos em vigor, nos países europeus, há a regra do anonimato. No caso brasileiro, apesar de qualquer regra expressa a respeito, em observância aos princípios, objetivos e fundamentos de Direito de Família, eventualmente o sigilo poderá ser afastado, cedendo lugar à proteção de interesses de maior relevância.”[54]     

O sigilo deverá ser preservado, com exceção dos casos em que a vida reclama por transplantes fazendo imperar o princípio maior que é a dignidade humana.

Em sentido contrário a doutrinadora Daniela Soares Hatem, afirma:

“A resolução em pauta, pode-se deduzir, não cogitou quanto ao respeito do direito personalíssimo à identidade moral que todo homem detém. Além desse cadastro de natureza médica é plenamente possível que o indivíduo concebido a partir da inseminação artificial ou fecundação artificial na qual houve doação de esperma queira, quando se tornar adulto, conhecer aquele de quem herdou suas características biológicas. Trata-se de um querer de fácil compreensão. Qual seria a pessoa, mesmo feliz em suas relações familiares, que diante do conhecimento de possuir um pai biológico diverso do sócio-afetivo não ficaria desejoso de conhecer aquele de quem adquiriu a voz, a altura, a cor dos olhos, os cabelos, talvez a personalidade, saber do que o pai biológico gostava, a contribuição do mesmo para a formação da estrutura emocional do filho etc” [55].

        O Direito ao conhecimento da identidade biológica Poe ser entendido como direito de personalidade, gozando, pois, de todas as características inerentes aos direitos inseridos em tal categoria, tais como, entre outras: intransmissibilidade, inalienabilidade, imprescritibilidade e indisponibilidade, atribuído ao indivíduo a partir de reprodução heteróloga, em razão do qual lhe é conferida a possibilidade de conhecer sua origem genética, contribui de forma decisiva para a realização do aludido procedimento, possibilitando, assim, seu nascimento. Desse modo, o reconhecimento de tal direito apresenta-se de suma importância, uma vez que este representa a possibilidade de o indivíduo se conhecer integralmente, ter ciência de sua origem, de sua própria história, aspecto inerente à própria essência, à individualidade pertinente a toda e qualquer pessoa.

        Considerando o princípio da dignidade humana, protegido pela Constituição da República de 1988, depreende-se que a vedação ao conhecimento da identidade dos doadores de gametas e pré-embriões, afronta manifestamente direito de personalidade sendo, portanto, inconcebível em face do paradigma do Estado Democrático de Direito.

        Perlingieri doutrina:

“O menor tem o direito de conhecer as próprias origens não somente genéticas, mas culturais e sociais. O patrimônio genético – de acordo com a concepção pela qual a estrutura se adapta à função – não é totalmente insensível no seu futuro às condições de vida nas quais a pessoa opera. Conhecê-lo significa não apenas evitar o incesto, possibilitar a aplicação da proibição de núpcias entre parentes, mas, responsavelmente, estabelecer uma relação entre o titular do patrimônio genético e quem nasce. Pode-se objetar que essa solução comporta a atribuição ao menor de um status diverso daquele legítimo (se não fosse consentido o anonimato do doador do sêmen, resultaria que o marido da mulher que deu à luz não é o pai da criança: ela não poderia, portanto, ser considerada filho legítimo); objeção ligada a uma concepção que acredita que o status de legítimo seja privilegiado em relação àquele de filho natural: isso não é mais respondente nem ao ditame constitucional nem à legislação ordinário, na qual desapareceu qualquer discriminação. Poder-se-ia pensar em um especial tipo de filiação natural para aqueles sujeitos nascidos mediante o emprego da técnica da inseminação artificial. Dúvidas surgem sobre a possibilidade de o doador reconhecer o nascido somente para fins patrimoniais e sucessórios, mas sempre deverá lhe ser atribuído o direito ao reconhecimento”.[56]

         Para que o inseminado possa preservar a sua identidade como ser humano não poderá ser atribuído nenhum direito ao doador do material inseminado. O que importa, no direito de família contemporâneo, são os laços afetivos formados ao longo da convivência.

8.2.4 – DA COMERCIALIZAÇÃO DO MATERIAL GENÉTICO

A possibilidade de adquirir um bebê tal qual um produto no supermercado é cada vez mais concreta. Apenas para se ter uma idéia, o banco de sêmen mais antigo dos Estados Unidos, o Idant Laboratories, com pouco mais de 30 anos de atuação, já engravidou 18 mil mulheres e oferece catálogos variados de doadores de sete etnias diferentes. Na maioria dos casos, a inseminação com esperma saído de uma temperatura de 178 graus negativos não demora mais de quinze minutos, e sai a preços convidativos, que variam entre UU$ 100 e UU$ 500.

No Brasil a lei 11.105/2005, no parágrafo 3º, artigo 5º, proibiu expressamente a comercialização de embriões, classificando a transgressão como crime: § 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.[57]

A citada lei é de 04 de fevereiro de 1997 e o art. 15 tipifica como crime:

“Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano:

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita ou aufere qualquer vantagem com a transação.”[58]

Dessa forma houve uma equiparação dos embriões humanos aos tecidos, órgãos ou parte do corpo humano. Não há, portanto, dúvidas a respeito da proibição da venda de material biológico no Brasil.

Tal conduta enobrece o princípio da dignidade humana, protegendo a todos, evitando que o nascimento de bebês resulte no fenômeno em que podemos denominar  “patrimonialização da raça humana”, despindo a humanidade de caráter.


9. DA AFETIVIDADE NA RELAÇÃO FAMILIAR

A família não se fundamente nos laços biológicos, mas sim no amor e na convivência.

Maria Berenice Dias doutrina:

“A família deste novo século não se define mais pela triangularização clássica: pai, mãe e filho, sendo que o critério biológico, ligado aos valores simbólicos da hereditariedade, deve ceder lugar à noção de filiação de afeto, de paternidade social ou sociológica. Biológica ou não, oriunda do casamento ou não, matrilinear ou patrilinear, monogâmica ou poligâmica, monoparental ou poliparental, não importa. Nem importa o lugar que o indivíduo ocupe no seu âmago, se o de pai, se o de mãe, se o de filho: o que importa é pertencer ao seu âmago é estar naquele idealizado lugar onde é possível integrar sentimentos, esperanças, valores e se sentir, por isso, a caminho da realização de seu projeto de felicidade pessoal.” [59]

Aquele que assume a condição de pai ou mãe deverá ter a responsabilidade integral sobre o material genético inseminado, responsabilizando-se por todos os direitos que posteriormente forem requeridos, tais como alimentos, pensão, sucessão.

A paternidade se constitui no momento da concepção e início da gravidez. Desse modo mesmo que o marido pretenda impugnar a paternidade relacionada ao filho não será possível. A paternidade se torna certa e indiscutível no momento da manifestação de vontade do marido. A reprodução carnal que ocasiona o vínculo biológico é substituída pela vontade qualificada e juridicamente responsável.

Na jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal em Brasília, no ano de 2002 chegou-se a seguinte conclusão:

“No âmbito das técnicas de reprodução assistida envolvendo o emprego de material fecundante de terceiros, o pressuposto fático da relação sexual é substituído pela vontade (ou eventualmente pelo risco da situação jurídica matrimonial) juridicamente qualificada, gerando presunção absoluta ou relativa de paternidade no que tange ao marido da mãe da criança concebida, dependendo da manifestação expressa (ou implícita) de vontade no curso do casamento” [60].

LUIZ EDSON FACHIN professa, com absoluta razão, o seguinte:

 "Ressente-se o Brasil de um necessário movimento de reforma legislativa que, partindo de um novo texto constitucional, possa organizar, no plano da legislação ordinária, um novo sistema de estabelecimento da filiação. Pai também é aquele que se revela no comportamento cotidiano, de forma sólida e duradoura, capaz de estreitar os laços de paternidade numa relação sócio-afetiva, aquele, enfim, que, além de emprestar o nome de família, o trata como sendo verdadeiramente seu filho perante o ambiente social. E no fundamento da posse de estado de filho é possível encontrar a verdadeira paternidade, que reside no serviço e no amor que na procriação. Esse sentido da paternidade faz eco no estabelecimento da filiação e, por isso, reproduzindo a modelar frase do Professor João Batista Villela, é possível dizer que, nesse contexto, há um nascimento fisiológico e, por assim dizer, um nascimento emocional.  Não se pode edificar diferença jurídica entre o filho biológico (de direito) e o filho de criação (de fato), pois, em ambos os casos, são reconhecidos como filhos, vivendo em ambiente familiar que os acolheu gerando a posse de estado e constituindo, conforme diz João Batista Villela, um nascimento emocional entre pais e filho. Não há diferença de criação, educação, destinação de carinho e amor entre os filhos sociológicos e biológicos, não se podendo arquitetar conceitos jurídicos desiguais em relação a quem vive em igualdade de condições, sob pena de revisitar a odiosa discriminação entre os filhos, o que seria, sem dúvida, inconstitucional ”[61].

 Atualmente impõe-se a distinção entre origem biológica e paternidade/maternidade. Em outros termos, a filiação não é um determinismo biológico, ainda que seja da natureza humana o impulso à procriação. Na maioria dos casos, a filiação deriva da relação biológica; todavia, ela emerge da construção cultural e afetiva, permanente, que se faz na convivência e na responsabilidade.

No estágio em que nos encontramos, há de se distinguir o direito de personalidade ao conhecimento da origem genética, com esta dimensão, e o direito à filiação e à paternidade/maternidade nem sempre genético.

A questão da filiação afetiva é muito antiga. Veja o seguinte relato bíblico:

“Duas prostitutas foram até o rei e se apresentaram. Uma das mulheres disse: ‘Meu senhor, eu e esta mulher moramos na mesma casa. Eu tive um filho. Três dias depois que dei à luz, ela também teve uma criança. Não havia mais ninguém conosco. Nós estávamos sozinhas em casa. Aconteceu que certa noite essa mulher se deitou sobre o próprio filho e ele morreu. Ela se levantou durante a noite e, enquanto eu dormia, pegou o meu filho que estava junto comigo, e o colocou ao lado dela. Depois, colocou do meu lado o seu filho morto. Quando acordei de manha, para dar de mamar ao meu filho, vi que estava morto. Olhei bem e notei que não era o filho que eu tinha dado à luz’. A outra mulher retrucou: ‘Não é verdade! O meu filho está vivo. É o dela que morreu.’ A primeira contestou: ‘É mentira! Seu filho está morto e o meu está vivo’. E começaram a discutir diante do rei. Então o rei interveio: ‘Uma diz: ‘Meu filho está vivo e o seu esta morto’. A outra diz: ‘Mentira! Seu filho está morto e o meu está vivo”. Então o rei ordenou: ‘Tragam uma espada’. E levaram a espada. O Rei disse: ‘Cortem o menino vivo em duas partes e dêem metade para cada uma’. Então a mãe do menino vivo sentiu as entranhas se comoverem pelo filho, e suplicou: ‘Meu senhor, dê a ela o menino vivo. Não o mate’. A outra, porém, dizia: “Nem para mim, nem para você. Dividam o menino ao meio’. Então o rei deu a sentença: ‘Entreguem o menino vivo à primeira mulher. Não o matem. Ela é a sua mãe.’ Todo Israel ficou sabendo da sentença que o rei tinha dado. E o respeitavam, pois viram que ele possuía sabedoria divina para fazer justiça.[62]

A solução encontrada para o caso dispensou qualquer critério biológico utilizando-se o rei da afetividade para a aplicação da justiça. É preciso dissociar a filiação da procriação como nos ensina João Batista Villela: “ser pai ou ser mão não está tanto no fato de gerar quanto na circunstância de amar e servir” [63] . O mesmo autor completa que “a paternidade em si mesma, não é um fato da natureza, mas um fato cultural.”[64]

Não existe qualquer impedimento para se atribuir paternidade/maternidade às pessoas que se utilizam as técnicas de reprodução assistida. A filiação está relacionada ao afeto fornecido de forma cotidiana. Conforme afirma de maneira brilhante Luiz Edson Fachin “a filiação é uma moldura a ser preenchida, não com meros conceitos jurídicos ou abstrações, mas com vida, na qual pessoas espelham sentimentos” [65]. E no mesmo sentido Eduardo de Oliveira Leite, “a verdadeira filiação só pode vingar no terreno da afetividade, da intensidade das relações que unem pais e filhos, independentemente da origem biológica-genética” [66].


10. A MATERNIDADE SUBSTITUTA

A conhecida e polêmica questão da barriga de aluguel provoca repulsa pela maioria dos doutrinadores. O método consiste em remunerar uma mulher pelo aluguel de seu útero para a gestação. Neste caso a criança teria duas mães, a de gestação e a biológica. Esta seria aquela que forneceu o material genético para a fecundação do óvulo que será implantado em uma outra mulher, mãe de gestação. Seguindo este raciocínio poderia haver a participação na relação de três pessoas. A doadora do óvulo, a mãe de gestação e um terceiro ser humano que criará a criança.

Veja o que a melhor doutrina nos explicita:

“Para se alcançar à magnitude e profundidade do tema, a dizer com a essência do Homem, sua Existência e Criação, perscrutando os arcanos da Vida e da Morte, transcrevam-se quinze indagações formuladas por um jurista norte-americano a propósito da “maternidade substituta”, uma das formas que pode revestir a fecundação artificial: 1º Quem pode participar? 2º) Como pode a aptidão dos participantes individuais ser determinada? 3º) Que espécie de atos deveria ocorrer no escopo de qualquer regulamentação proposta? 4º) Que tipo de supervisão médica deve ser exigida? 5º) Quais são os direitos e obrigações da mãe substituta durante a gravidez? 6º) 6º) Quais são os direitos e obrigações do pai natural (e sua esposa for casado) durante a gravidez? 7º) Quais os direitos e obrigações das respectivas partes após o nascimento com vida? 8º) E se  vier a ser natimorto? 9º) Pode a mãe substituta receber compensação financeira? 10º) Qual o estatuto legal da criança ao nascer? 11º) Que medidas deve a “mãe substituta tomar para abdicar de seus direitos como mãe? 12º) Quais providências, por outro lado, deve o pai adotar para assegurar ou reivindicar seus direitos como pai? 13º) Que medidas deve, de outra feita, promover a esposa do pai natural para obter ou reivindicar direitos de maternidade? 14º) Que procedimentos deve a mãe substituta seguir se decide manter a criança? 15º) Quais os direitos e obrigações do pai natural se a mãe substituta decide manter a criança?[67]

Enfim, não são somente estas as questões que envolvem a matéria. Várias indagações surgem. Qual seria a relação jurídica existente entre a criança e a mãe substituta? A criança teria duas mães?

O Direito Brasileiro admite a maternidade substituta somente utilizando-se como mãe de gestação parente até o 2º grau, ou seja, irmão. É o que a resolução nº 1.358/92, VII, 1 e 2 nos esclarece:

 “VII- Sobre a gestação de substituição (doação temporária do útero). As clínicas, Centros ou Serviços de Reprodução Humana podem usar técnicas de reprodução assistida para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contra-indique a gestação na doadora genética.

1. As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família da doadora genética, num parentesco de até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina.

2. A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial”[68].

A conclusão a que chegamos é que a maternidade substituta é possível somente nos casos de necessidade médica e, mesmo assim, com o parentesco restringido ou com autorização do Conselho Regional de Medicina.


11. A REPRODUÇÃO ASSISTIDA E OS PARCEIROS HOMOSSEXUAIS

É controversa a opinião dos doutos sobre o assunto. Maria Berenice Dias postula:

“Também os parceiros homossexuais, a quem a justiça insiste em não admitir a adoção, têm, cada vez mais, feito uso dos métodos modernos de inseminação artificial para constituírem uma família. Assim, as lésbicas utilizam o óvulo de uma que, fertilizado in vitro, é implantado no útero da outra. A parceira que dá a luz não é a mãe biológica, mas acaba sendo ela a mãe registral. Assim, ainda que a criança vá viver em um lar com duas mães, como o vínculo jurídico se estabelece exclusivamente com relação a que procedeu ap registro, trata-se de uma família monoparental. Os gays, igualmente utilizam técnicas reprodutivas para terem um filho. Muitas vezes é colhido esperma de ambos, até para não sanearem quem é o pai da criança que irá nascer. Feira a fecundação em laboratório, faz o par uso do que se chama barriga de aluguel. Ainda que o filho tenha dois pais, o registro do filho é levado a efeito somente por um dos genitores, constituindo-se uma família monoparental”.[69]

Ainda, no mesmo sentido, a autora doutrina:

“é cada vez mais comum casais homossexuais fazerem uso de bancos de material reprodutivo, o que permite um do par ser o pai ou a mãe biológica, enquanto o outro fica excluído da relação de filiação. Gays utilizam o sêmen de um ou de ambos para fecunda r uma mulher. Também lésbicas extraem o óvulo de uma, que, fertilizado in vitro , é implantado no útero da outra, que vem dar à luz. Não há restrição alguma nem pode haver qualquer obstáculo legal para impedir o uso de tais práticas. Em ambos os casos, torna-se imperioso perguntar, quem são os pais dessas crianças? Qualquer resposta que não reconheça que os bebês têm dois pais ou duas mães está se deixando levar pelo preconceito. Não cabe tentar encontrar alguma justificativa para afastar a criança de seu lar e da companhia de quem considera seus pais. Tais posturas afrontam cânones consagrados constitucionalmente, como o direito à liberdade e o respeito á dignidade da pessoa humana e infirmam o princípio do melhor interesse da criança, que tem direito à convivência familiar. De outro lado, permitir que exclusivamente o pai biológico tenha um vínculo jurídico com o filho assim gestado é olvidar tudo o que vem a Justiça construindo com relação aos vínculos familiares através de uma visão ampliativa da estrutura da família. Diante da maior visibilidade e melhor aceitabilidade dos vínculos familiares formados por pessoas do mesmo sexo, impositivo reconhecer a possibilidade de estabelecer vínculo jurídico ao companheiro do genitor (1626, parágrafo único). Para a identificação do vínculo parental, basta questionar se goza a criança da posse do estado de filho. Reconhecida a existência de uma filiação socioafetiva, com relação aos dois parceiros, imperativo afirmar a possibilidade- ou melhor, a necessidade, de ambos, ainda que sejam do mesmo sexo, estabelecerem um vínculo jurídico visando, principalmente, a proteção de quem, afinal, é filho dos dois. O ECA regula de forma minuciosa uma gama extensa de situações para reforçar os vínculos parentais, possibilitando a colocação de menores em família substituta mediante guarda, tutela ou adoção (ECA 28). Não define a estrutura ou a forma das famílias substitutas, o que permite concluir que não necessita corresponder ao que o próprio estatuto chama família natural (ECA25): comunidade formada pelos pais, ou qualquer deles e seus descendentes. Assim, é possível reconhecer como família substituta uma, duas ou mais pessoas. Não se pode fugir desta conclusão, quer porque a constituição considera família também o vínculo monoparental, quer porque o ECA autoriza que uma só pessoa adote, bastando ser maior de idade (ECA42), independentemente de estado civil e de orientação sexual do adotante “[70]

A realidade é que não se pode mais fechar os olhos e tentar acreditar que os casais homossexuais não irão ter direito à reprodução. Quando o casal fruto de uma união homoafetiva resolve assumir a sua posição, com relação aos filhos ocorrerá a função parental.  Mais uma vez Maria Berenice Dias nos esclarece:

 “Não raro, o parceiro do genitor participa de sua criação, desenvolvimento e educação, assumindo inclusive o seu sustento e exercendo o papel de pai. Inquestionável que estão presentes todos os requisitos para o reconhecimento de uma filiação socioafetiva. Apesar de a ideologia da família parental de origem patriarcal pensar o contrário, não é requisito indispensável para haver família que haja homem e mulher, pai e mãe. Vetar a possibilidade de juridicizar dito envolvimento, só traz prejuízo à própria criança, pois, ainda que detenha a posse do estado de filho, não vai conseguir cobrar qualquer responsabilidade e nem fazer valer qualquer direito com relação a quem de fato exercita o poder familiar” [71].

Defendo a utilização das técnicas de reprodução pelos homossexuais. De acordo com a melhor doutrina, “com base nessa tese de que masculino e feminino, ativo e passivo, respectivamente, são na verdade papéis exercidos por homens e mulheres de modo alternado, com base nisso, a concepção de família vem mudando. Há ordenamentos jurídicos que já reconhecem a união entre indivíduos do mesmo sexo como entidade familiar, conferindo-lhe proteção legal adequada. Devemos ter em mente que, se por um lado sexo genital é o mesmo, por outro lado os papéis desempenhados pelo casal são diferentes, ou seja, masculino e feminino, alternadamente, ora por um, ora por outro[72] .


12. O CÓDIGO CIVIL

O  CÓDIGO CIVIL foi completamente silente no que tange a reprodução assistida regulamentando somente a presunção de paternidade advinda da utilização dos métodos.

Ante a impossibilidade de se demonstrar diretamente à paternidade, o NCC assentou relativamente à questão da filiação, algumas presunções fundadas em probabilidades, que por admitirem prova em contrário, serão relativas, ou seja, iuris tantum.

Para que a presunção de paternidade tenha a sanção de verossimilhança, a lei determina período no qual ela começa e termina e certas circunstâncias motivadas pelos avanços da biotecnologia, estabelecendo que foram concebidos na constância do casamento: a) os filhos nascidos 180 dias depois de estabelecida à convivência conjugal não se contando a celebração do dia do ato nupcial, ante a possibilidade de haver casos em que se deu o casamento por procuração (c.c 1542);

b) os filhos nascidos dentro de 300 dias após a dissolução da sociedade conjugal por morte, separação judicial, nulidade ou anulação, e também, de lege ferenda, por separação de fato (cc. 1723, parágrafo 1º), porque a gestação não vai além desse prazo;

c) os filhos havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido de sua mãe;

Na jornada de Direito Civil realizada no Superior Tribunal de Justiça no mês de junho de 2002, aprovou-se a proposição para que se intérprete o inciso III do citado artigo no sentido de ser obrigatório, para que se presuma a paternidade do marido falecido, que a mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com o material genético do falecido, esteja ainda na condição de viúva, devendo haver ainda autorização escrita do marido para que se utilize seu material genético após sua morte.

Adverte Caio Mario que não se pode falar em direitos sucessórios daquele que foi concebido por inseminação artificial post mortem, uma vez que a transmissão da herança se dá em conseqüência da morte e dela participam as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.

Enquanto não houver uma reforma legislativa, até mesmo para atender ao princípio constitucional da não-discriminação de filhos, caberá à doutrina e à jurisprudência fornecer subsídios para a solução dessa questão.

d) os filhos havidos, em qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentes, decorrentes de concepção artificial homóloga, isto é, advindos dos componentes genéticos do marido da mulher e preservados, por congelamento, numa clínica de reprodução assistida;

O embrião é o ser oriundo da junção de gametas humanos, sendo que há basicamente dois métodos de reprodução artificial: a fertilização in vitro, na qual o óvulo e o espermatozóide são unidos em uma proveta, ocorrendo à fecundação fora do corpo da mulher, e a inseminação artificial, consistente na introdução de gameta masculino, por meio artificial, no corpo da mulher, esperando-se que a própria natureza faça a fecundação. O embrião é excedentário quando é fecundado fora do corpo (in vitro) e não é introduzido prontamente na mulher, sendo armazenado por técnicas especiais.

Considera-se embrião, diz Paulo Luiz Netto Lobo, “o ser humano durante as oito primeiras semanas de seu desenvolvimento intra-uterino, ou em proveta e depois no útero, nos casos de fecundação in vitro, que é a hipótese cogitada no inciso IV do artigo em comento” [73].

Apenas é admitida a concepção de embriões excedentários se estes derivarem de fecundação homóloga, ou seja, de gameta da mãe e do pai, sejam casados ou companheiros de união estável. Por conseqüência, está proibida a utilização de embrião excedentário por homem e mulher que não sejam os pais genéticos ou por outra mulher titular de entidade monoparental. O que ocorrerá, contudo, se a vedação for descumprida e ocorrer à concepção no útero da mulher que não seja a mãe genética? O filho será juridicamente daquela e, no caso de par casado, do marido, neste caso em virtude do princípio pater is est e da presunção de maternidade da mulher parturiente, além da circunstância de não ter o Brasil, ao lado da maioria dos países, acolhido o uso instrumental do útero alheio, sem vínculo de filiação (popularmente conhecido como ‘barriga de aluguel’).

A mencionada Jornada de Direito Civil, realizada em Brasília em Junho de 2002, aprovou proposição no sentido de que, “finda a sociedade conjugal na forma do art. 1571, deste código, a regra do inciso IV somente poderá ser aplicada se houver autorização prévia, por escrito dos ex-cônjuges, para a utilização dos embriões excedentários, só podendo ser revogada até o início do procedimento de implantação destes embriões” [74] .

e) os filhos havidos de inseminação artificial heteróloga, desde que tenha havido prévia autorização do marido. Tal presunção visa tão somente, baseada na doutrina dos atos próprios de Diez-Picazo, fundada no princípio da boa-fé e na lealdade de comportamento, instaurar a vontade procracional do marido, como meio de impedi-lo de desconhecer a paternidade do filho voluntariamente assumido ao consentir na inseminação heteróloga de sua mulher. A paternidade, nesta última hipótese, apesar de não ter fundamento genético, terá o moral, privilegiando-se a relação socioafetiva.

Ocorre tal modalidade de inseminação quando é utilizado sêmen de outro homem, normalmente doador anônimo, e não o do marido, para a fecundação do óvulo da mulher. A lei não exige que o marido seja estéril ou, por qualquer razão física ou psíquica, não possa procriar. A única exigência é que tenha o marido previamente autorizado à utilização de sêmen estranho ao seu. A lei não exige que haja autorização escrita, apenas que seja ‘prévia’, razão por que pode ser verbal e comprovada em juízo como tal.

A presunção em apreço visa, segundo MARIA HELENA DINIZ[75] impedir o marido de desconhecer a paternidade do filho voluntariamente assumido ao autorizar a inseminação heteróloga de sua mulher. A paternidade, então, “apesar de não ter componente genético, terá fundamento moral, privilegiando-se a relação socioafetiva”. Se o marido “anui na inseminação artificial heteróloga, será o pai legal da criança assim concebida, não podendo voltar atrás, salvo se provar que, na verdade, aquele bebê adveio da infidelidade de sua mulher (CC, arts. 1.600 e 1.602). A impugnação da paternidade conduzirá o filho a uma paternidade incerta, devido ao segredo profissional médico e ao anonimato do doador do sêmen inoculado na mulher. Por isso, há quem apregoe como Holleaux, que tal anuência só será revogável até o momento da inseminação; feita essa não poderá desconhecer a paternidade do filho de sua esposa.

Vê-se que se impugnar fecundação heteróloga consentida, estar-se-á agindo deslealmente, uma vez que houve deliberação comum dos consortes, decidindo que o filho deveria nascer. Essa foi à razão do artigo 1597, V, que procurou fazer com que o princípio de segurança das relações jurídicas prevalecesse diante do compromisso vinculante entre os cônjuges de assumir paternidade e maternidade, mesmo com componente genético estranho, dando-se prevalência ao elemento institucional e não ao biológico.

Em regra a presunção de paternidade do art. 1.597 do Código Civil é iuris tantum, admitindo prova em contrário. Pode, pois, ser elidida pelo marido, mediante ação negatória de paternidade, mediante ação negatória de paternidade, que é imprescindível (art. 1601). Não incidirá se o filho nascer antes de a convivência conjugal completar cento e oitenta dias. O Código Civil de 1916, todavia, considerava absoluta tal presunção, inadmitindo contestação quando o filho nascia antes do referido prazo e o marido, antes de casar, tivera ciência da gravidez da mulher ou assistira a lavrar-se o termo de nascimento, sem contestar a paternidade.

O código civil de 2002 optou pelo critério biológico, suprimindo as limitações à contestação.

Enfim, as proposições para a interpretação desse artigo resumem-se nas regras abaixo exaradas na Jornada de Direito Civil em 2002:

a) No âmbito das técnicas de reprodução assistida envolvendo o emprego de material fecundante de terceiros, o pressuposto fático da relação sexual é substituído pela vontade (ou eventualmente pelo risco da situação jurídica matrimonial) juridicamente qualificada, gerando presunção absoluta ou relativa de paternidade no que tange ao marido da mãe da criança concebida, dependendo da manifestação expressa (ou implícita) de vontade no curso do casamento (enunciado 104);

b) As expressões fecundação artificial, ‘concepção artificial’ e ‘inseminação artificial’ constantes, respectivamente, dos incisos III, IV e V do art. 1597 deverão ser interpretadas como “técnica de reprodução assistida” (enunciado n. 105);

c) Para que seja presumida a paternidade do marido falecido, será obrigatório que a mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com material genético do falecido, esteja na condição de viúva, sendo obrigatório, ainda, que haja autorização escrita do marido para que se utilize seu material genético após a sua morte (enunciado n. 106);

d) Finda a sociedade conjugal, na forma do art. 1571, a regra do inciso IV somente poderá ser aplicada se houver autorização prévia, por escrito, dos ex-cônjuges, para a utilização dos embriões excedentários, só podendo ser revogada até o início do procedimento de implantação desses embriões (enunciado n. 107).


13. CONCLUSÃO

A evolução da ciência e, especificamente, das técnicas de reprodução assistida, evidenciou, ainda mais, a necessidade de postura dos operadores do Direito. Mister que se tenha como parâmetro que o Direito Civil não mais pode ser considerado em sua natureza exclusivamente privada, devendo ser tratado à luz das normas insertas na Constituição, atentando-se, sobretudo, para os princípios jurídicos sufragados por este documento.

É importante que os operadores do Direito afastem posicionamentos radicais, de caráter absoluto, para evitar injustiças. Ao se analisar as técnicas de reprodução assitida, faz-se necessário considerar as peculiaridades do caso concreto, buscando-se a efetivação dos direitos de personalidade, tendo em mente o respeito ao princípio da dignidade humana.

Diante dos referidos direitos fundamentais constitucionalmente assegurados, considerando-se, sobretudo, o respeito à dignidade humana e, por conseguinte, o bem-estar psicofísico desta, pode-se concluir pela existência do direito de procriar. Conseqüentemente, deve-se reconhecer a possibilidade do emprego da reprodução assistida para os seres humanos, desde que respeitados os limites éticos e jurídicos impostos. Antes de tudo, mostra-se imperioso preservar a dignidade de todos aqueles que participem do processo de reprodução assistida, observando, em especial, o bem-estar da criança a ser concebida e a manutenção da harmonia familiar.

Considerando as intricadas situações que podem advir das referidas técnicas, pugna-se pela necessidade de se estabelecer limites éticos e jurídicos à prática da procriação assistida, especialmente em relação à inseminação artificial e fertilização in vitro heterólogas, tendo em vista a proteção da dignidade de todas as pessoas envolvidas, sobretudo, no que se refere à criança a ser concebida.

Os métodos proporcionam aos seres humanos a fecundidade. Muitos, outrora ficavam eternamente condenados a não ter descendentes, o que hoje é possível com a utilização da reprodução assistida.

Polêmicas, dúvidas e questionamentos ainda existem como é o caso do destino a ser dado aos embriões, não encontrando, nem a biologia verdade absoluta, mas a sua utilização faz com o direito de procriação se implemente. 

Nos procedimentos que não prevêem a intervenção de terceiro além do casal como é o caso da inseminação artificial homóloga, não há dificuldades de aceitação ética. Entretanto, a técnica de fertilização com o material genético de terceiro deve ser utilizada de forma cometida, com cuidados, assegurando os direitos inerentes à personalidade humana.

Tenho a certeza de que o progresso tecnológico não pode ficar sem controle. A parte científica e técnica da Medicina se degeneraria sem rumo, não fosse o componente filosófico-ético a irradiar seus princípios de respeito à dignidade da vida humana, à dignidade do corpo humano e de suas funções.

É preciso que o Congresso Nacional regulamente a reprodução assistida tendo como meta a dignidade humana, tendo como parâmetro que o Direito à vida é o primeiro de todos os direitos; o direito à vida funda todos os direitos constitutivos da pessoa, o direito de ser respeitada na sua identidade, o direito de não ser manipulada, o direito de ser considerada portadora de uma específica dignidade, irrenunciável, o direito, em conclusão, de ser reconhecida como pessoa.

As técnicas estão em constante evolução e o homem precisa regulamentá-las. Citando o pensamento do brilhante filósofo grego Aristóteles, “o abuso não pode eliminar o uso. A possibilidade de um uso eticamente inaceitável de uma técnica, fruto do saber humano não pode eliminar o seu uso se ela é de benefício para os demais membros dessa sociedade. O que procede é seu estrito regulamento no marco do bem comum. Esse marco é a lei”.[76]

Enfim, o assunto é complexo e não se esgota na análise jurídica, que apenas contribui para a solução dos conflitos sociais. Os nossos legisladores, embasados na ciência jurídica, devem criar uma legislação fundamentada em conceitos éticos. A regulamentação deve proibir, baseada na dignidade humana, a destruição dos embriões congelados. A lei deverá assegurar ao inseminado o direito de conhecer a sua origem genética no momento em que possuir a maturidade suficiente para a situação. A maternidade substituta deve ser autorizada com restrições ao parentesco e, somente nos casos de necessidade médica. Aos homossexuais tal direito deve ser atribuído sob pena de instituirmos uma discriminação legalizada pois os papéis desempenhados pelo pai e pela mãe são independentes do relacionamento sexual entre os parceiros.

A família brasileira mudou e deve ser assegurado a qualquer ser humano o direito de perpetuar a sua espécie, bem como a preservação do ser já concebido.

Nunca podemos nos esquecer que qualquer técnica utilizada pela medicina para a perpetuação da espécie deve estar fundamentada na bioética.


14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

[1] BEBE DE PROVETA , disponível em http: // www.tvcultura.com.br/  aloescola/ historia/cenasdoseculo/ internacionais/bebedeproveta.htm

[2]1 O Globo, 26 de outubro de 1999, p.27

[3] FREIRA SÁ, Maria de Fátima. Biodireito. In.: A dignidade do ser humano e os direitos de personalidade: uma perspectiva civil-constitucional. p. 84 . Ed.: Del rey.

[4] MADJAROF, Rosana. Perseu e Meduza. São Paulo, 08 out. 2005. Disponível em: <www.mundodosfilosofos.com.br/perseu.html

[5]7FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000, p. 49.

[6] PERLINGIERI, Pietro. La personalitá umana nell´ordinamento giuridico. Camerino: Università degli di Camerino, p.44-45.

[7] FIUZA, César. Direito Civil: Curso completo. 5. ed. de acordo com o Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 129

[8] PERLINGIERI, Pietro. Perfis de Direito Civil. Tradução de Maria Cristina de Cicco. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 155-156

[9] MEIRELLES, Jussara Maria Leal de. A vida humana embrionária e sua proteção jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 161

[10] MEIRELLES, Jussara Maria Leal de. A vida humana embrionária e sua proteção jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 164

[11] PERLINGIERI, Pietro. Perfis de Direito Civil: um introdução ao direito civil constitucional. Tradução de Maria Cristina de Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 155-156.

[12] PERLINGIERI, Pietro. Perfis de Direito Civil. Uma introdução ao direito civil constitucional. Tradução de Maria Cristina de Cicco. Rio de Janeiro: renovar, 2002. p. 155

[13] HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionários Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 1040.

[14] FREIRA SÁ, Maria de Fátima. Biodireito. In.: A dignidade do ser humano e os direitos de personalidade: uma perspectiva civil-constitucional. P. 93 Ed.: Del rey

[15] TEPEDINO, Gustavo. Direitos humanos e relações jurídicas privadas. In: Temas de direito civil. Rio de Janeiro:  Renovar, 1999, p. 67.

[16]  O Tribunal da humanidade. in Folha de S.Paulo, de 28.06.1998, p. A-3.

[17] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. In ____________Princípios do Direito de Família. Ed. Livraria do Advogado. p. 57,  5. ed.

[18] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília, disponível em www.stf.gov.br, p.3.

[19] OLIVEIRA, Fátima. Expectativa, falências e poderes da medicina da procriação: gênero, racismo e bioética. In: SCAVONE, Lucila (Org). Tecnologias reprodutivas. São Paulo: Unesp, 1996, p.  196.

[20] COREA, Gena. Os riscos da fertilização in vitro. In: Tecnologias... cit., São Paulo, 1996, p. 165, Cf. também: BARBOSA, Heloisa Helena. A filiação em face da inseminação artificial e da fertilização “in vitro”. Contém Resolução: 1358/92 do Conselho Federal de Medicina. Rio de Janeiro: Renovar, 1993.

[21] BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria Geral do direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980, p. 58, notas de rodapé.

[22] BRACHO, José de Oliveira.O Direito de Experimentação Sobre o Homem e a Bioética. Belo Horizonte, 2004. Disponível em: < http://www.geocities.com/CollegePark/Union/6478/bioetica.html>. Acesso em outubro de 2005.

[23]  BOBBIO, Norberto, 1992, p.6. 

[24]  Barreto, Vicente de Paulo. Bioética, biodireito e direitos humanos. In: MELLO, Celso de Albuquerque et. al. Teoria dos Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro. Renovar, 1999, p. 410.

[25] BARACHO, José de Oliveira.O Direito de Experimentação Sobre o Homem e a Bioédica. Belo Horizonte, 2004. Disponível em: < http://www.geocities.com/CollegePark/Union/6478/bioetica.html>. Acesso em outubro/2005.

[26] SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano, 2000, p. 50.

[27] PERELMAN, Chaïm. Ética e direito, 1996, p. 454 

[28]  DINIZ, Maria Helena. O estado atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 15-16.

[29] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. In: Família Monoparental. p. 202, 203.

[30] NACIF DE FARIA, Guilherme. Personalidade:  do início ao fim. In: FIUZA, César. Curso Avançado de Direito Civil. São Paulo:IOB Thomson, 2004. p. 50.

[31] NACIF DE FARIA, Guilherme. Personalidade:  do início ao fim. In: FIUZA, César. Curso Avançado de Direito Civil. São Paulo:IOB Thomson, 2004. p. 54.

[32]  BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília, disponível em www.stf.gov.br, p.2.

[33] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília, disponível em www.stf.gov.br, p.2.

[34] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília, disponível em www.stf.gov.br, p.3.

[35] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília. Disponível em www.stf.gov.br, p. 4.

[36] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília. Disponível em <www.stf.gov.br>, p. 5.

[37] DINIZ. Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 27.

[38] DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 27.

[39]SZANIAWSY apud SÁ, Maria de Fátima Freire de. Princípios e limites da investigação com embriões humanos. In: Revista do Curso de Direito do Unicentro Metodista Izabela Hendrix. Nova Lima, v. 2, 2003. p. 116.

[40]DIAS, Maria Berenice. Estatuto do Direito das Famílias. In:  Família Monoparental. P. 203, 204.

[41] SILVA, Reinaldo Pereira e. Os direitos humanos do concebido. Análise biojurídicas das técnicas de reprodução assistida. Porto Alegre: Síntese Publicações, 2002, CD-Rom n. 40. Produzida por Sonopress Rimo Indústria e Comércio Fonográfico Ltda

[42]AZEVEDO, Álvaro Villaça. Ética, Direito e Reprodução Humana Assistida. Revista dos Tribunais, vol.729, ano 85, jul. 1996.p.44

[43] ASCENSÃO, José de Oliveira. Problemas Jurídicos da procriação assistida. Revista Forense, Rio de Janeiro, v.328, out./dez. 1994, p.70

[44] BRASIL. Resolução nº 1.358, de 11 de novembro de 1992. Conselho Federal de Medicina.Diário Oficial da União. Poder Executivo. Brasília, DF, 19 nov. 1992. Seção 1, p. 16053.

[45] RAFFUL, Ana Cristina. A reprodução artificial e os direitos da personalidade. São Paulo: Themis, 2000, p. 40.

[46] BRASIL. Resolução nº 1.358, de 11 de novembro de 1992. Conselho Federal de Medicina.Diário Oficial da União. Poder Executivo. Brasília, DF, 19 nov. 1992. Seção 1, p. 16053. Resolução nº 1358/92 do Conselho Federal de Medicina

[47] BRASIL. Resolução nº 1.358, de 11 de novembro de 1992. Conselho Federal de Medicina.Diário Oficial da União. Poder Executivo. Brasília, DF, 19 nov. 1992. Seção 1, p. 16053.esolução nº 1358/92 do Conselho Federal de Medicina

[48] BRASIL. Lei nº 11.105, de 24.03.2005. Dispõe sobre a regulamentação dos incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 24 mar. 2005.

[49] BRASIL. Lei nº 11.105, de 24.03.2005. Dispõe sobre a regulamentação dos incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 24 mar. 2005.

[50] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin nº 3510, da Procuradoria Geral da República, Brasília. Disponível em <www.stf.gov.br>, p. 4.

[51] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10.01.2002. Institui o Novo Código Civil, art. 2º.

[52] GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Questões jurídicas em torno da inseminação artificial. Revista dos Tribunais, ano 81, v. 678, p. 272, abr. 1992.

[53] GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Questões Jurídicas em torno da inseminação artificial. Revista dos Tribunais, ano 81, v. 678, p. 271, abr. 1992.

[54] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Filiação e reprodução assistida: introdução ao tema sob a perspectiva do direito comparado. Revista dos Tribunais, São Paulo. v. 89, n. 776, p.60-84, jun. 2000.

[55] HATEM, Daniela Soares. Questionamentos Jurídicos diante das novas técnicas de reprodução assistida. Biodireito. Belo Horizonte, 2002 ,  p. 185.

[56] PERLINGIERI, Pietro. Perfis de Direito Civil: uma introdução ao direito civil constitucional. Tradução de Maria Cristina de Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.177.

[57] BRASIL. Lei nº 11.105, de 24.03.2005. Dispõe sobre a regulamentação dos incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 24 mar. 2005

[58] BRASIL.  Lei nº  9434, de 04 de fevereiro de 1997. Dispõe sobre Dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências.Diário Oficial da União, 04 fev. 1997.

[59] DIAS, Maria Berenice. Estatuto do Direito das Famílias. In: __________ Família Monoparental. P. 203, 204.

[60] DA GAMA, Guilherme Calmon Nogueira. A reprodução Assistida heteróloga sob a ótima do Novo Código Civil. Revista dos Tribunais, Rio de Janeiro, v. 817, p.15, nov. 2003.

[61] FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e paternidade presumida, Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1992, p. 21.

[62] BIBLIA SAGRADA, Primeiro Livro dos Reis, Capítulo 3, versículos 16 a 28.

[63] VILLELA, João Batista. Desbiologização da paternidade. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 271, p. 50, jul./set. 1980.

[64] VILLELA, João Batista. Desbiologização da paternidade. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 271, p. 45, jul./set. 1980.

[65] FACHIN, Luiz Edson. Da paternidade: relação biológica e afetiva. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p.28.

[66] LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos. São Paulo: RT, 1995, p. 202.

[67] GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Questões jurídicas em torno da inseminação artificial. Revista dos Tribunais, ano 81, v. 678, p.272.

[68] BRASIL. Resolução nº 1.358, de 11 de novembro de 1992. Conselho Federal de Medicina.Diário Oficial da União. Poder Executivo. Brasília, DF, 19 nov. 1992. Seção 1, p. 16053.esolução nº 1358/92 do Conselho Federal de Medicina

[69] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. In: __________Família Monoparental. P. 201,202.

[70] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias In: _____________ Filiação. P. 343,344,345.

[71] Dias, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. In: _______. Filiação.p. 343,344,345

[72] FIUZA, César. Direito Civil – Curso Completo, 6. ed, p. 797.

[73]  NETO LOBO, Paulo Luiz, A repersonalização das Relações de Família e a Constituição. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 54.

[74] GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de Direito Civil Brasileiro. 2. ed. , São Paulo, Saraiva, 2004, p. 257

[75] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v.5, p. 380

[76] ARISTÓTELES, A política. São Paulo: Ediouro, 1987. p. 42.


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MARQUES, Emanuel Adilson Gomes. Direito de procriar: a reprodução assistida em face do princípio da dignidade humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4007, 21 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29622. Acesso em: 5 maio 2024.