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O direito sucessório e o instituto da fertilização in vitro post mortem de embriões criopreservados

O direito sucessório e o instituto da fertilização in vitro post mortem de embriões criopreservados

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Propõe um estudo sobre a evolução da ciência conjugada ao direito, mais especificamente sobre a partilha da legítima e a fecundação de embriões criopreservados, post mortem ao de cujus.

RESUMO: É característica da sociedade moderna o surgimento de novos conceitos e parâmetros. Com o direito não é diferente, tendo em vista seu caráter social, bem como seus escopos de atuação que vão muito além do jurídico. Dessa forma, tal ciência deve ser adequada ao caso concreto e evoluir juntamente com a sociedade que a aplica, acompanhando, inclusive, evoluções no campo científico, sob pena de se tornar um ramo defasado. No presente trabalho, busca-se alternativas ao que foi acima delineado, mais especificamente no campo dos direitos sucessórios. De mais a mais, é imperioso registrar que se fará uma abordagem sistêmica desta seara do Direito, correlacionando-se com o recente avanço tecnológico referente à questão da reprodução artificial, analisando-se os efeitos de tal reprodução quando esta ocorre posteriormente ao falecimento do genitor. Como no Direito toda situação tem uma conseqüência, serão analisado possíveis soluções para o caso em comento, sob o ponto de vista sucessório, onde será analisado, também, o prisma filosófico e moral que envolve o tema.

Palavras-chave: Direito. Reprodução artificial. Sucessões.

SUMÁRIO:1. INTRODUÇÃO.2. FERTILIZAÇÃO IN VITRO. 2.1. O BIODIREITO. 2.2. UM BREVE HISTÓRICO SOBRE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL. 2.3.CONCEITUAÇÃO.. 2.4. OS EMBRIÕES CRIOPRESERVADOS.3. CONCEPÇÕES FILOSÓFICAS SOBRE O TEMA.  3.1. CONCEPÇÃO. 3.2. DIREITO À VIDA.  3.3. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 3.4. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. 3.5. IGUALDADE ENTRE FILHOS. 3.6. PLANEJAMENTO FAMILIAR.4. A QUESTÃO SUCESSÓRIA RELACIONADA COM A FERTILIZAÇÃO IN VITRO POST MORTEM DE EMBRIÕES CRIOPRESERVADOS. 4.1. A FILIAÇÃO. 4.2. VISÕES DOUTRINÁRIAS ACERCA DA SUCESSÃO POST MORTEM. 4.3. COMPARATIVO COM PROLE EVENTUAL. 4.3.1. Segurança Jurídica e Deixa Testamentária.5. CONCLUSÃO.6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.


INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da ciência modificou muitos conceitos já formulados, sendo um destes conceitos o de família. Como conseqüência, mudaram-se também os conceitos de maternidade, paternidade e parentesco. Tal fato sobrelevou-se quando surgiu o instituto da reprodução assistida.

Os casais que enfrentavam problemas de fertilidade puderam, com o avanço tecnológico, realizar o sonho de obter êxito na concepção. Ocorre que, com essa possibilidade, deu-se azo para que os casais também pudessem escolher o melhor momento para gerar uma criança e possível herdeiro.

Nesse diapasão, a biotecnologia desenvolveu métodos artificiais para solucionar tais situações. É assim que surge a inseminação artificial, e como sua conseqüência surgiram também inúmeras questões a serem ainda enfrentadas, principalmente no que se refere a fertilização in vitro post mortem  cumulada com a situação de uma exclusão hereditária.

Esclarecer-se-á, portanto, o leitor sobre o que seja a reprodução medicamente assistida, em especial a inseminação artificial homóloga post mortem e as controvérsias decorrentes desse método de concepção para a criança, que poderá mesmo ficar sem ter seus direitos sucessórios reconhecidos.           

Com relação ao biodireito a doutrina pátria ainda encontra muitas controvérsias quando do enfrentamento do tema em questão. Os dispositivos inseridos no Códex Civilista tem se mostrado infrutíferos, uma vez que não prescrevem literalmente a situação da fertilização artificial, mas apenas fazem uma constatação, o que demonstra o quão novo é o tema e quanto é carecedor de uma maior atenção, haja vista ser uma realidade muito presente na sociedade.

O presente tema reveste-se de suma importância, tendo em vista o crescente avanço tecnológico enfrentado pela ciência e como esta surge, necessariamente, para ser aplicada na sociedade, resulta daí que ao direito também serão aplicados seus reveses, fazendo com que rotineiramente proceda-se a uma nova roupagem nas ciências jurídicas. Dessa forma, o esclarecimento das questões relacionadas ao tema sucessório quando da realização de fertilização in vitro é ponto essencial para a afirmação de preceitos constitucionais, e, por isso, faz-se necessário um estudo detalhado sobre o tema.

O objetivo geral do trabalho é traçar um panorama doutrinário acerca do tema, fazendo-se comparações entre diversas posições jurisprudenciais, para, após, levantar-se uma opinião  para o caso em comento.

Os objetivos específicos revestem-se da necessidade de serem abordadas questões tais como as concepções que englobam o instituto da fertilização in vitro sob o prisma do direito sucessório, abordando-se diversos escopos, quais sejam o científico, e por que não dizer biológico, o filosófico e social, e, finalmente, o jurídico.

Nessa quadra abordar-se-ão questões que envolvam o conceito de concepção, direitos fundamentais, princípios constitucionais, origem da vida, bem como questões de cunho eminentemente jurídicas, se é que possam existir questões com apenas esta roupagem. 

Atualmente, o posicionamento doutrinário inclina-se para uma divergência muito grande, mesmo porque não existem ainda muitos casos concretos, ficando a discussão sob um manto de abstração, o que dificulta chegar a conclusões passíveis de serem aplicadas. Assim, faz-se necessário que o meio acadêmico traga à baila a questão, no sentido de chamar atenção para uma posição legislativa sobre o tema, a fim de serem sanadas controvérsias que futuramente poderão ir de encontro mesmo com outras questões já pacificadas, o que poderá, inclusive, ferir direitos já outorgados e consagrados.

Será feita uma apurada análise da literatura sobre o tema, com base em posicionamentos da doutrina especializada como a citação de seus entendimentos, assim como a análise de artigos publicados em revistas científicas impressas ou digitais.

Com o objetivo de estudar o instituto da fertilização in vitro sob o prisma do direito sucessório, realizar-se-á um estudo de natureza qualitativa e exploratória, por meio da utilização de pesquisa bibliográfica, com enfoque no posicionamento doutrinário e nas mais recentes decisões sobre o tema.

As pesquisas qualitativas não priorizam dados numéricos para enumerar ou mensurar o objeto em análise e partem de questões ou focos de interesse amplos, que se definem à medida que o estudo se realiza.

A partir das classificações de pesquisas estabelecidas por Antônio Carlos Gil (1987), quanto ao nível, o estudo proposto é do tipo exploratório, aconselhável quando a situação é pouco conhecida e quando a intenção do pesquisador é fornecer uma visão geral do tema, cumprindo objetivos como: contribuir para o conhecimento do assunto; estabelecer possibilidades para novas pesquisas; e, ainda, abrir espaço para a criação de hipóteses que direcionem outros estudos.

Para Selltiz (1984), o primeiro passo da pesquisa exploratória é o exame da literatura. Nesse caso, serão fontes da pesquisa bibliográfica: Constituição Federal, doutrina, jurisprudência, princípios e artigos publicados em revistas científicas impressas ou digitais.


FERTILIZAÇÃO IN VITRO

2.1. O BIODIREITO

Biodireito é um ramo do saber que, se relacionando com o Direito Civil, Penal, Ambiental e Constitucional, busca estudar as associações entra tais ciências e os avanços tecnológicos. Em função disso tenta estabelecer peculiaridades referentes às garantias fundamentais tais como a dignidade da pessoa humana e o direito de liberdade, mais especificamente a liberdade da atividade científica, trazendo as conclusões para a prática.

Os avanços tecnológicos exigem que haja a criação de uma regra jurídica que discipline a conduta dos participantes da relação em que eles se inserem. Isto é conseqüência da interdisciplinaridade que permeia a Ética, a Medicina, o Direito e as relações Sociais.

Com as ciências médicas, o que vem se observando, é que elas estão avançando a passos mais largos que os dados pelas ciências jurídicas. Só para exemplificar o que se disse, tem-se que clonagem, mudança de sexo, aluguel de útero e inseminação artificial, são temas que ainda não foram enfrentados exaustivamente pelo Direito.

Deve-se levar em consideração que, uma norma não deve ser considerada isoladamente, mas inserida no conjunto de normas vigentes numa sociedade. Se considerarmos que, pela harmonia do ordenamento jurídico, as normas diferentes devem coadunar-se, deve-se analisar os caso concretos afastando-se a residualidade das lei. Em consequência, fácil seria a aplicação no ramo jurídico de diretrizes no sentido de acolher determinadas descobertas científicas.

Em virtude da aplicação desse método, o avanço tecnológico e científico seria acompanhado pelo Direito. A aplicação de soluções interdisciplinares surge como modo de aprimorar a qualidade de vida. Para o Biodireito, a resposta seria extremamente positiva, pois para o operador ficaria mais fácil se libertar dos impasses levantados em cada caso.

Deve-se adotar a consciência que o Direito não é um sistema hermeticamente fechado. Ele sofre influências irrefutáveis dos anseios sociais, pois fácil é constatar atitudes, principalmente no campo da medicina, como é o caso do instituto analisado nesta monografia, que reflitam nas ciências jurídicas.

Se não fosse assim, questões já pacificadas, como é a maternidade, não sofreriam impasses quando inovadas, neste caso, a título de exemplo, quando ocorre a inseminação artificial ou a barriga de aluguel. Desta feita, quando da resolução dessa inovações, necessário se faz observar também o que preleciona a bioética.

A bioética é uma ciência que surgiu na década de 1970. Seu maior objetivo é propor uma reflexão axiológica, bem como a elaboração de normas para regular as relações que o desenvolvimento da ciência médica traz para a sociedade. Esta ciência apontava como ramo da Medicina que se preocupava com a moral, tendo, posteriormente, se transformado em Biodireito.

Com esta nova roupagem, passou a contar com a característica da coercibilidade e fez com que alguns pesquisadores afastassem a idéia que ela seria ramo do Direito, para afirmar que, em verdade, se configurava em ciência autônoma. Assim é que, o Biodireito surge justamente para tentar “controlar” algumas ânsias sociais. É inegável que a vontade de prolongar a vida e exterminar os males trazidos pelas doenças é desejo inexorável do homem, porém nem tudo que é tecnicamente possível é ético.

À ciência que ora se comenta, cabe atuar no sentido de enfrentar discussões e contornos de até quando os avanços conquistados podem influir sobremaneira na vida humana. Nessa esteira é que, ao Biodireito, resta tentar elucidar casos ainda não pacificados, no que se refere à aplicação de normas quando em conseqüência de atos que ainda não foram previstos.

O caso da inseminação artificial se insere neste rol de competência, e muito mais ainda quando realizada após a morte de um dos progenitores, hipótese que adiante se estudará.

2.2. UM BREVE HISTÓRICO SOBRE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL

Segundo alguns dados, a técnica da inseminação artificial data de 1332, quando foi utilizada ineditamente em eqüinos. Esta afirmação, porém, carece de comprovação científica, adotando-se com marco da técnica o ano de 1784, quando Lázaro Spallanzani, monge italiano, demonstrou pela primeira vez ser possível a fecundação de uma fêmea sem a presença de um macho.

Nessa experiência, Spallanzani colheu, através de excitação mecânica, material reprodutor de um cachorro e o aplicou em fêmea, levando esta a um parto de três filhotes sessenta e dois dias depois. Surge assim, a técnica que séculos mais tarde seria amplamente utilizada por seres humanos desprovidos da capacidade de gerar.

Há relatos, porém, de que ainda na idade média já se havia realizado a experiência em seres humanos feita pelo médico Arnaud Villeneuve, porém, segundo Elida Séguin (2005),o fato só se comprovou mesmo em junho de 1978, quando nasceu a primeira criança de proveta, concebida através do método da fertilização in vitro. Esta criança chamava-se Louise Brown e nasceu na Inglaterra.

Imperioso também se faz registrar, nessa quadra, o polêmico caso “AFFAIR PARPALAIX”, quando Corine Richard e Alain Parpalaix desafiaram a justiça francesa.

O caso ocorreu quando o casal, muito apaixonado, descobriu que Alain estava com câncer nos testículos e a doença era incurável. O amor dos dois, entretanto, era muito intenso e fez surgir em ambos a vontade de deixar herdeiros, mas a doença e o tratamento conduziriam Alain à infertilidade.

Na tentativa de ver o desejo realizado, o casal recorreu à ciência, e procurando um banco de sêmen, Alain depositou seu esperma para utilização futura. Ocorre que, neste interregno, e após casamento, a doença avançara e Alain veio a óbito.

O desejo de ver os planos, que fizera anteriormente com seu amado, realizados despertou em Corine a vontade de se submeter ao tratamento de inseminação artificial, o que de pronto foi negado pelo banco de sêmen que alegava a falta de previsão legal.

Coube, então, à justiça francesa decidir que o material deveria ser entregue ao médico indicado pela viúva, para que este procedesse com o tratamento. O Tribunal francês de Créteil cominou, inclusive, sanção pecuniária caso o procedimento não fosse realizado. Abaixo o transcrito do julgado, trazido a lume por Eduardo Oliveira Leite (apud Séguin, 2005; p. 121):

Cabe fixar os limites da questão. Tal questão se refere a devolução à viúva do esperma de seu falecido marido, a questão relativa a inseminação dependeria obviamente do pedido ser acolhido e, mais particularmente, da consciência da viúva e do médico que lhe assistirá para a dita inseminação.

A questão quanto à filiação da criança ainda por nascer, não se encontra presente no caso. Sobre a interpretação das vontades de Alain Parpelaix e do Cecos: as diferentes declarações apresentadas nos debates e especialmente as de Pierre e Danielle R., pais de Corinne P. e atitudes de Alain que durante a doença, e com a concordância da companheira, quis preservas suas chances de procriar; atitude solenemente confirmada dois dias antes de sua morte através de um casamento religioso civil; a tomada de posição dos pais de Alain nesse procedimento, que tiveram condições de conhecer as intenções profundas de seu filho, constituem um conjunto de testemunhos e de presunções que estabelecem, com certeza, a vontade formal do marido de Corinne P., de tornar sua esposa mãe de um filho comum, quer a concepção dessa criança ocorresse em vida ou após sua morte.

Cecos não provou nem alegou que preveniu Alain sobre sua oposição a devolver o esperma, após sua morte, aceitou a vontade de Alain. Aliás, houve a respeito do tema uma mudança de atitude dessa associação que só começou a advertir os doadores de sua posição a respeito sobre esse ponto, aproximadamente dois anos após a aceitação de Alain.

Igualmente o acordo estabelecido entre Alain  e Cecos não poderia se submeter ao regime jurídico da doação de órgãos, previsto pela Lei francesa de 22.12.1976, tendo em vista a diferença da natureza entre o esperma e os órgãos do corpo humano.

Tudo indica que o acordo fechado de 1981 entre Alain e o Cecos constitua um contrato específico comportando para Cecos a obrigação de conservação e de restituição ao doador, ou devolução do esperma a quem era destinado.

Nem as condições de conservação ou de devolução do esperma de um marido falecido, nem a inseminação de sua viúva são proibidas ou mesmo previstas por um texto legislativo ou regulamentar. Além disso, eles não se chocam com o direito natural, um dos fins do casamento sendo a procriação.( LEITE apud: SÉGUIN, 2005;p. 121)

É claro que o caso não se reveste de todas as complicações inerentes ao assunto em tela. Não se buscou discutir a deixa testamentária, nem a sucessão propriamente dita, mas tão somente a permissão para que o procedimento fosse realizado. É inegável, todavia, que a autorização concedida foi um marco, especialmente para o Direito, visto que a inovação abriu a roda de discussões sobre a possibilidade de realização deste tipo de fertilização, o que, é claro tem resvalo nas ciências jurídicas, ainda mais porque realizado posteriormente ao falecimento do doador do material genético masculino.

2.3. CONCEITUAÇÃO

Para entender o processo de inseminação in vitro, primeiramente, mister se faz voltar os olhos para o contexto no qual ele está inserido, qual seja o da procriação. Procriar é gerar um ser semelhante, e caminho natural para perpetuação das espécies, sendo este fundamento defendido, inclusive, por muitas instituições religiosas, que abominam o caráter de prazer oriundo da relação sexual.

Ocorre que, com o avanço da sociedade, esta visão foi largamente substituída por outra, despida de preconceitos, e paulatinamente assimilada. Tal posicionamento conferiu aos casais a oportunidade de não ter mais a obrigação de procriar, pois superado este tabu, proporcionou-se aos indivíduos o direito de escolha de, em determinado momento da vida, ter ou não prole.

Entretanto, algumas vezes, essa escolha pode não ser apenas uma opção do casal. Inúmeros são os casos de impossibilidade para procriar. Estima-se que dois entra dez casais sofrem algum problema relacionado à infertilidade, o que é visto, atualmente, como uma doença. Assim, é que se desenvolveram meios para que o problema fosse sanado.

Nesse diapasão surge o instituto da fertilização in vitro. Com o advento desta técnica, possibilitou-se a casais que, possivelmente, e por motivos diversos, enfrentariam dificuldades para gerar um novo ser, a chance de ter seu desejo realizado.

A inseminação in vitro ocorre sempre que o embrião for criado em laboratório. Dessa forma, primeiramente coletam-se gametas femininos, ou seja, óvulos maduros retirados dos ovários, e gametas masculinos, espermatozóides que foram retirados do sêmen. Partindo desse procedimento, ocorrerá a fertilização propriamente dita, quando os óvulos serão colocados em um recipiente com uma micro-agulha juntamente com um único espermatozóide cada, gerando assim um zigoto. Após dois dias de fecundação, ocorrerão as divisões celulares e cada ovo se tornará um embrião de oito a dezesseis células.

Os embriões fecundados serão transportados e introduzidos no útero da mulher, onde ocorrerá a nidação. Nidação consiste em dizer que o embrião fixou-se nas paredes do útero, ou seja, muito provavelmente dentro de alguns meses mais um ser humano chegará ao mundo.

É importante consignar que, nem sempre o sêmen utilizado neste procedimento é daquele que pretende ser o pai da criança. Muitas vezes o material reprodutor masculino provém de um estranho à relação conjugal, nesse caso a inseminação chamar-se-á heteróloga. Caso contrário, quando o sêmen provém do companheiro da futura mãe, a inseminação chamar-se-á homóloga.

Pode acontecer também a hipótese de a mulher doadora do material genético reprodutor não poder naturalmente gerar. Nesse caso, a doutrina discute como ficaria a questão da filiação. É dizer, o filho seria da doadora do óvulo ou daquela que veio, efetivamente, a dar a luz?

Antes, porém, de se responder a tal questionamento, faz-se mister relembrar que esta doação de útero, de acordo com o Conselho Federal de Medicina, só ocorrerá com o envolvimento de parentes diretos da doadora do óvulo e sempre para finalidades altruístas, descartando-se qualquer interesse comercial ou lucrativo.

Dessa forma, a decisão, que já ganhou caráter de unanimidade na doutrina, entende que a gestação em substituição não gera para aquela que emprestou o útero a qualidade de mãe, sendo assim considerada, somente a doadora do material genético reprodutor. Logo, é da doadora do material genético, no campo dos direitos sucessórios, de quem os indivíduos, assim gerados, serão herdeiros. Nas palavras do mestre Sílvio de Salvo Venosa (2007; p. 224) “quanto à maternidade, deve ser considerada mãe aquela que teve o óvulo fecundado, não se admitindo outra solução, uma vez que o estado de família é irrenunciável e não admite transação.”

2.4. OS EMBRIÕS CRIOPRESERVADOS

Com o avanço da tecnologia, tornou-se possível que o sêmen, o óvulo e inclusive o embrião fossem criopreservados. Tal técnica consiste em resfriar e congelar o material escolhido, possibilitando que mesmo após a morte do doador, ou dos doadores, aquele material tenha condições físicas de ser utilizado na reprodução assistida.

O conselho de Medicina, no ano de 1992, ao editar a Resolução nº. 1.358, estabeleceu normas éticas que regessem a reprodução humana com relação à criopreservação. Assim, ficou estabelecido, como se disse alhures, que poderiam ser criopreservados espermatozóides, óvulos e pré-embriões.

Escolhido a qualidade do material a ser criopreservado, e em sendo ele pré-embriões, o número deverá ser, necessariamente, comunicado aos pacientes, para que estes decidam quantos serão transferidos, devendo o excedente ser também criopreservado, sem que haja descarte ou destruição. A escolha, na verdade consiste em apenas escolher quanto dos pré-embriões será utilizado, naquele momento, para que, possivelmente, seja bem sucedida a nidação.

A vontade dos companheiros deve ser também expressa quando da criopreservação, em relação ao destino que se dará aos pré-embriões criopreservados em casos de divórcio, falecimento de um ou ambos e doenças graves, bem como na hipótese de doação.

Todo esse procedimento nas fases iniciais do desenvolvimento do futuro bebê visa permitir que os pré-embriões não utilizados em procedimento de transferência para o útero da paciente possam ser armazenados e implantados posteriormente. Observa-se, então que o objetivo maior é reduzir desconfortos e riscos. Assim, a mulher não precisará colher novamente o material, bem como se assegurará máxima efetividade ao procedimento.

O que ocorre é o que se chama de embriões sedentários, que consiste na produção de mais de um embrião além daquele que será transferido para o útero da mulher. Como somente os embriões de boa qualidade é que tem maior chance de sobrevivência, eles é que serão colocados em uma solução especial com uma substância denominada crioprotetor.

Ficarão os embriões alocados em botijas de azoto líquido a uma temperatura de até 196°C negativos onde o crioprotetor serve justamente para evitar que os embriões sejam danificados pelo frio.

A polêmica levantada em contraposição ao procedimento refere-se ao tempo que os embriões seriam criopreservados e o que se faria com aqueles que não chegassem a ser utilizados. Assim, com o Relatório de Warnock estipulou-se que o tempo máximo de congelamento seria de cinco anos.

Argumenta-se, porém, que tal relatório teria sido elaborado de forma arbitrária, sem que houvessem estudos mais elaborados a respeito da possibilidade de armazenamento de embriões por um período mais longo. Nessa quadra foi que, nos Estados Unidos, procedimentos utilizando embriões que tinham sete e oito anos de congelamento foram realizados com sucesso, gerando crianças sadias, sem que tenha se observado qualquer transtorno em seu desenvolvimento.

Dessa forma, o tema voltou à baila, fazendo com que países como Inglaterra e Espanha fixassem em suas legislações o tempo máximo de oito anos para utilização dos embriões criopreservados, o que vai de encontro ao que preleciona o Relatório de Warnock.

Quanto ao destino dos embriões excedentes, mister se faz elaborar alternativas, tendo em vista que o que mais ocorre é a destruição dos embriões, como por exemplo na Inglaterra e Espanha. Alternativa aplicável seria a utilização dos embriões excedentes em projetos de pesquisa ou em procedimentos com casais estéreis na forma de doação.

O que permeia os entraves para tal aplicação, mais especificamente no caso de pesquisas científicas, é a caracterização do início da vida. Sensível é tal conceito, tendo em vista os aspectos relacionados ao tema, quer sejam biológicas, filosóficas ou jurídicas.

Vê-se que o tema é complicado não só do ponto de vista biológico, mas em função dele e em função de se desenvolverem inúmeras situações que apregoam suma relevância par o estudo. Portanto para cientificar-se das complicações jurídicas, faz-se necessário entender primeiramente os demais escopos que permeiam o caso em tela.

Entendendo primeiramente, e em linhas gerais, em que consiste o procedimento e, posteriormente, entendendo de que questões morais ele se reveste, fica possível adentrar no ramo jurídico, mais especificamente no campo dos direitos sucessórios, quando tal procedimento realizar-se post mortem.

O assunto não é dos mais fáceis. As complicações se revelam não só no Direito Brasileiro, mas também em outras legislações, por se tratar de inovação jurídica.

Na Alemanha e Suécia, a fertilização post mortem é vedada, ao que se coaduna o Direito Francês, que inclusive, estabelece a perda dos efeitos do consentimento externado em vida. Com a Espanha ocorre justamente o contrário, pois é vedada a inseminação artificial post mortem, porém são garantidos os direitos do nascituro, desde que haja declaração por escritura pública ou testamento.

A Inglaterra tem se mostrado a mais vanguardista dentre as nações a abordar o tema, estabelecendo a permissão da fertilização artificial após a morte do titular do material biológico, porém sem efeitos sucessórios, salvo se houver expressa disposição em documento.

No Brasil a discussão doutrinária ainda é grande, o que torna necessário um estudo aprofundado sobre o tema. Todavia o Código Civil de 2002, estabelece em seu art. 3º, que “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo desde a concepção, direitos do nascituro.”

Tal dispositivo não restou totalmente claro, evidenciando verdadeira lacuna, haja vista deixar margem a diversas interpretações. Assim, é que o direito pátrio, de forma superficial até contém dispositivos, como é a hipótese do acima transcrito e do art. 1798, ambos do Códex Civilista, que tentam prever o caso, porém desprovidos de efetividade em virtude da falta de clareza.

Verifica-se que os artigos dizem menos do que queriam dizer, deixando em verdadeira situação de desamparo aqueles que buscam solução em seus textos, ressaltando, mais uma vez, a necessidade de estudos e procedimentos legislativos mais específicos sobre o assunto.

Nessa esteira tem-se que há diferenças entre o início da vida de um ser humano e o início da vida de uma pessoa, o que cria a necessidade de um estudo nesse sentido, a fim de se tronar viável aplicação do Direito ao caso em comento.

Importante se faz registrar que embora novo, o tema já poderia ter sido debatido com mais afinco, pois ainda em 1984 nasceu Zoe Leyland, na Austrália, o primeiro bebê desenvolvido a partir de um embrião criopreservado.

Em 1987, A igreja Católica , repudiou o ocorrido chamando a atenção para a prática que se iniciava através da “Instrução sobre o respeito à vida humana nascente e à dignidade da procriação”. Todavia, ignorando o que aquela instituição religiosa pregava, em1995, um novo caso causou polêmica, quando o bebê Elisabetta, em Roma,  veio ao mundo dois anos após a morte de sua mãe, tendo sido gerada no útero da irmã de seu pai.


CONCEPÇÕES FILOSÓFICAS SOBRE O TEMA

3.1. CONCEPÇÃO

Antes de adentrar profundamente no campo dos direitos sucessórios, necessário se faz compreender os escopos filosóficos, morais e constitucionais que revestem o tema. Assim, e utilizando-se de lições aplicáveis ao estudo, menciona-se a ADI 3510, onde foram levantadas questões amplamente cabíveis para o que ora se comenta.

Na ADI 3510, buscou-se discutir a possibilidade da utilização de embriões criopreservados para pesquisas com células tronco. O tema é completamente diferente da inseminação artificial post mortem, porém analisou questionamentos em comum. Para tanto, necessário foi enfrentar, primeiramente, questões tais como início da vida ou sobre o que seja concepção. No próprio pedido do Procurador Geral da República, requerente da ação, Cláudio Fonteles, houve transcrição de vários cientistas, citados por ele, que em seus estudos conceituavam quando teria início a vida, pensamento corroborado nesta monografia, que para tanto se transcreve:

1. A tese central desta petição afirma que a vida humana acontece na, e a partir da, fecundação.

2. Assim, a lição do Dr. Dernival da Silva Brandão, especialista em Ginecologia e Membro Emérito da Academia Fluminense de Medicina, verbis:

"O embrião é o ser humano na fase inicial de sua vida. É um ser humano em virtude de sua constituição genética específica própria e de ser gerado por um casal humano através de gametas humanos – espermatozóide e óvulo. Compreende a fase de desenvolvimento que vai desde a concepção, com a formação do zigoto na união dos gametas, até completar a oitava semana de vida. Desde o primeiro momento de sua existência esse novo ser já tem determinado as suas características pessoais fundamentais como sexo, grupo sanguíneo, cor da pele e dos olhos, etc. É o agente do seu próprio desenvolvimento, coordenado de acordo com o seu próprio código genético.

O cientista Jérôme Lejeune, professor da universidade de René Descartes, em Paris, que dedicou toda a sua vida ao estudo da genética fundamental, descobridor da Síndrome de Dawn (mongolismo), nos diz: "Não quero repetir o óbvio, mas, na verdade, a vida começa na fecundação. Quando os 23 cromossomos masculinos se encontram com os 23 cromossomos da mulher, todos os dados genéticos que definem o novo ser humano estão presentes. A fecundação é o marco do início da vida. Daí para frente, qualquer método artificial para destruí-la é um assassinato". (publicação: VIDA: o primeiro direito da cidadania – pg. 10 – em anexo, grifei)

3. E prossegue o Dr. Dernival Brandão, verbis:

A ciência demonstra insofismamavelmente – com os recursos mais modernos – que o ser humano, recém-fecundado, tem já o seu próprio patrimônio genético e o seu próprio sistema imunológico diferente da mãe. É o mesmo ser humano – e não outro – que depois se converterá em bebê, criança, jovem, adulto e ancião. O processo vai-se desenvolvendo suavemente, sem saltos, sem nenhuma mudança qualitativa. Não é cientificamente admissível que o produto da fecundação seja nos primeiros momentos somente uma "matéria germinante". Aceitar, portanto, que depois da fecundação existe um novo ser humano, independente, não é uma hipótese metafísica, mas uma evidência experimental. Nunca se poderá falar de embrião como de uma "pessoa em potencial" que está em processo de personalização e que nas primeiras semanas pode ser abortada. Porque? Poderíamos perguntar-nos: em que momento, em que dia, em que semana começa a ter a qualidade de um ser humano? Hoje não é; amanhã já é. Isto, obviamente, é cientificamente absurdo."

(publicação citada – pg. 11, grifei)

4.O Dr. Dalton Luiz de Paula Ramos, livre-docente pela Universidade de S.Paulo, Professsor de Bioética da USP e Membro do Núcleo Interdisciplinar de Biotética da UNIFESP acentua que, verbis:

"Os biólogos empregam diferentes termos – como por exemplo zigoto, embrião, feto, etc-, para caracterizar diferentes etapas da evolução do óvulo fecundo. Todavia esses diferentes nomes não conferem diferentes dignidades a essas diversas etapas.

Mesmo não sendo possível distinguir nas fases iniciais os formatos humanos, nessa nova vida se encontram todas as informações, que se chama "código genético", suficientes para que o embrião saiba como fazer para se desenvolver. Ninguém mais, mesmo a mãe, vai interferir nesses processos de ampliação do novo ser. A mãe, por meio de seu corpo, vai oferecer a essa nova vida um ambiente adequado (o útero) e os nutrientes necessários. Mas é o embrião que administra a construção e executa a obra. Logo, o embrião não é "da mãe"; ele tem vida própria. O embrião "está" na mãe, que o acolhe pois o ama.

Não se trata, então, de um simples amontoado de células. O embrião é vida humana.

A partir do momento que, alcançando maior tamanho e desenvolvimento físico, passamos a reconhecer aqueles formatos humanos (cabeça, tronco, mãos e braços, pernas e pés, etc), podemos chamar essa nova vida humana de "feto"."

(publicação citada – pg. 12/13 grifei)

5. A Dra. Alice Teixeira Ferreira, Professora Associada de Biofísica da UNIFESP/EPM na área de Biologia Celular-Sinalização Celular afirma, verbis:

"Embriologia quer dizer o estudo dos embriões, entretanto, se refere, atualmente, ao estudo do desenvolvimento de embriões e fetos. Surgiu com o aumento da sensibilidade dos microscópios. Karl Ernst Von Baer observou, em 1827, o ovo ou zigoto em divisão na tuba uterina e o blastocisto no útero de animais, Nas suas obras Ueber Entwicklungsgeschiechteb der Tiere e Beabachutung and Reflexion descreveu os estágios correspondentes do desenvovimento do embrião e quais as características gerais que precedem as específicas, contribuindo com novos conhecimentos sobre a origem dos tecidos e órgãos. Por isto é chamado de "Pai da Embriologia Moderna".

Em 1839 Schleiden e Schwan, ao formularem a Teoria Celular, foram responsáveis por grandes avanços da Embriologia. Conforme tal conceito o corpo é composto por células o que leva à compreensão de que o embrião se forma à partir de uma ÚNICA célula, o zigoto, que por muitas divisões celulares forma os tecidos e órgãos de todo ser vivo, em particular o humano.

Confirmando tais fatos, em 1879, Hertwig descreveu eventos visíveis na união do óvulo ou ovócito com o espermatozóide em mamíferos. Para não se dizer que se trata de conceitos ultrapassados verifiquei que TODOS os textos de Embriologia Humana consultados (as últimas edições listadas na Referência Biográfica ) afirmam que o desenvolvimento humano se inicia quando o ovócito é fertilização pelo espermatozóide. Todos afirmam que o desenvolvimento humano é a expressão do fluxo irreversível de eventos biológicos ao longo do tempo que só para com a morte. Todos nós passamos pelas mesmas fases do desenvolvimentos intrauterino: fomos um ovo, uma mórula, um blastocisto, um feto.

Dito isto, entende-se que a vida começa no momento da fecundação, o que é reiterado pelos estudiosos da medicina e biologia. Inegável é que, estes especialistas conhecem com profundidade o tema. Se, portanto, a vida começa com a penetração do espermatozóide no óvulo, decorre daí que o embrião criopreservado é, em verdade, nascituro, devendo ter seus direitos protegidos pela lei.

Sendo assim, a interpretação do art. 3º do Código Civil de 2002 deve ser interpretada beneficamente ao embrião, que embora congelado, já é detentor de direitos , merecendo a proteção jurídica pertinente.

3.2. DIREITO À VIDA

Segundo a nossa Carta Magna, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Tem-se que para o exercício de todos os demais direitos, fundamental se faz a presença do direito à vida, pois sem este não há como existirem aqueles.

Assim, é função do Estado garantir o pleno gozo desse direito, assegurando que sejam obedecidas as duplas acepções de vida, quais sejam o direito de continuar vivo, e em continuando, o direito de ter uma existência digna.

Como se disse no início deste capítulo, cabe aos cientistas do ramo da medicina, biologia e ciências afins estabelecerem quando a vida começa, haja vista ser este o objeto de seus estudos. Ao profissional das ciências jurídicas cabe tão somente garantir direitos aos indivíduos. Dessa forma, repita-se, a vida começa com a concepção, ou seja, fecundação do espermatozóide no óvulo, o que resulta num zigoto.

Nessa esteira, aquele embrião, embora criopreservado, tem direito de continuar existindo, posto que sua vida independe da vida de seus progenitores. É dizer, o embrião tem vida própria e representa um ser individualizado, tendo, inclusive, carga genética própria. E é por isso mesmo que devem ser resguardados pela legislação.

3.3. PRINCIPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Anteriormente ao estudo do que seja dignidade da pessoa humana, faz-se necessário tentar compreender o que seja princípio. Assim, é que muitos estudiosos na esteira de tentar entender o axioma, fizeram ilações acerca do tema. Pode-se, sumariamente dizer que, mesmo pela etimologia da palavra, princípio é aquele que vem antes. A palavra dá uma idéia de origem, começo. Abaixo se trará à tona várias conceituações do que seja o instituto que ora se analisa. Nessa esteira, Paulo Bonavides (1996; p. 230) preleciona:

 [...] devem considerar como princípios do ordenamento jurídico aquelas orientações e aquelas diretivas de caráter geral e fundamental que possam deduzir da conexão sistemática, da coordenação e da íntima racionalidade das normas que concorrem para formar assim, num dado momento histórico, tecido do ordenamento jurídico. Os princípios apresentam não somente a generalidade como característica acentuada, mas deverão marcar também a fecundidade, pois as duas são verdadeiras matrizes de normas jurídicas, além de constituírem a base de aplicabilidade das normas aos casos concretos, proporcionando o equilíbrio ao sistema jurídico.

No mesmo diapasão, José Joaquim Gomes Canotilho (1998; p. 1124-1125), em sua obra aduz que o princípio:

... associa a norma jurídica ao processo de concretização normativoconstitucional. Fora deste plano, as normas nada mais são do que enunciados lingüísticos, fazendo parte do domínio normativo, podendo ser consideradas como regras gerais e abstratas. A norma jurídica somente adquire normatividade quando, no processo de concretização, assume o caráter de norma decisória [...] as normas passaram a constituir um gênero que pode ser subdividido e no qual podem ser identificadas duas espécies diferenciadas: os princípios e as regras. Há que se constituir alguns critérios para que se possa distinguir o que são regras e o que são princípios, 1. Grau de abstração: os princípios são normas com grau de abstração elevado; as regras são normas com grau de abstração reduzido. 2. Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: é dificultosa a aplicação direta dos princípios aos casos concretos, ao contrário do que ocorre com as regras, cuja aplicação é facilmente identificável ao caso concreto. 3. Caráter de fundamentabilidade no sistema das fontes do direito: os princípios são normas com um caráter fundamental no ordenamento jurídico, verificável por sua posição hierárquica ocupada no sistema das fontes. Um exemplo de fontes: os princípios constitucionais. 4. Proximidade da idéia de direito: os princípios são normas juridicamente vinculantes à idéia de direito ou nas exigências de justiça; as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo funcional. 5. Natureza normogenética: os princípios são fundamentos de regras, isto é, constituem a razão da existência de regras jurídicas.

Para Ruy Samuel Espíndola (2002; p. 53) princípio é:

... a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam. Os princípios gerais de direito estão elencados na Lei de Introdução ao Código Civil artigo 4º, prevendo que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Segundo informa Miguel Reale (2002; p. 304 e p. 316-317), princípios são:

enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas. [...] bases teóricas ou as razões lógicas do ordenamento jurídico, [...] modelo teórico ou dogmático que diz qual é o significado do modelo jurídico (legais, costumeiros, jurisprudenciais ou negociais).

Desta feita, a dignidade da pessoa humana é requisito essencial da ordem jurídica e verdadeiro princípio constitucional a ser observado, principalmente no campo do direito de família, pois é dentro desta que se desenvolve a existência de um ser. Entende-se que jamais poderá um indivíduo ter existência digna se não lhes forem salvaguardados o direito à própria existência.

A própria Constituição Federal reconhece a importância de tal princípio, asseverando que o mesmo é princípio fundamental da República Federativa Brasileira, e que segundo Guilherme Calmon Nogueira da Gama (2003) outorgam ao Estado funções outras, tais como:

a de proteção à pessoa humana, no sentido de defendê-la de qualquer ato degradante ou de cunho desumano, contra o Estado e a comunidade em geral; b) a de promoção da participação ativa da pessoa humana nos destinos da própria existência e da vida comunitárias, em condições existenciais consideradas mínimas para tal convivência.( GAMA, 2003, p. 163)

Passado esse primeiro entendimento, mister se faz compreender a expressão dignidade, que nas palavras de De Plácido e Silva (1998; p.526):

Derivado do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral que, possuída por uma pessoa, serve ao próprio respeito em que é tida. Compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa, pelo qual se faz merecedora do conceito público. Mas, sem sentido jurídico, também se entende como a distinção ou honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta graduação.

No entendimento de José Joaquim Gomes Canotilho (1998), a dignidade da pessoa humana tem um fundamento filosófico, agregando fatores como:

1- Afirmação da integridade física espiritual do homem como dimensão irrenunciável da sua individualidade autonomamente responsável; 2 – Garantia da identidade e integridade da pessoa através do livre desenvolvimento da personalidade; 3- Libertação da “angústia da existência” da pessoa mediante mecanismos de socialidade, dentre os quais se inclui uma possibilidade de trabalho; 4 – A garantia e defesa da autonomia individual através da vinculação dos poderes públicos e conteúdos, formas e procedimentos do Estado de Direito; 5 – Igualdade dos cidadãos expressa na mesma dignidade social e na igualdade de tratamento normativo, isto é, igualdade perante a lei.

Segundo Ingo Wolfgang Sarlet (2001; p. 60) a dignidade da pessoa humana é:

A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. Tratando-se do princípio da dignidade da pessoa humana no direito de família, este irá apresentar-se nas relações entre os membros de determinada família, atuando como “parâmetro (tanto limitador quanto protetor) quando há colisão entre direitos fundamentais ou entre princípios.

Conclui-se, do anotado acima que, o princípio da dignidade da pessoa humana se configura em princípio universal, haja vista consagrar um direito fundamental, tutelado pelo regime jurídico das sociedades democráticas, onde se assegura, ou pelo menos se preceitua, que a existência deverá ser livre de tratamentos desumanos ou degradantes.

O entendimento se consolida no ramo dos direitos sucessórios quando da realização da fertilização in vitro post mortem a partir do momento em que se deva assegurar àquele embrião criopreservado a existência digna. Para aquele indivíduo, existência digna significa o direito de ser considerado ser humano, detentor de direitos, e principalmente igual aos demais seres humanos. Dessa forma presente se faria a igualdade protegida pelo princípio que ora se analisa, afastando-se o preconceito da diferenciação, que não se coaduna com o instituto em comento.

3.4. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA

Entendido o que seja princípio, deve-se levar em conta que tal fonte do direito tem várias facetas. Assim é que existem inúmeros princípios que se aplicam a uma dada situação com a pertinência que o caso pede. No presente estudo, necessário se faz atentar para o princípio do melhor interesse da criança.

O princípio do melhor interesse da criança, não é apenas um princípio geral. Em se tratando de criança e adolescente ele deverá ser sempre observado, pois funciona como critério de aplicação e interpretação das normas atinentes ao assunto. Verifica-se, desta feita, que sua aplicabilidade é plena em nosso ordenamento, e que seu caráter de princípio o institui em diversas outras legislações.

Reconhecer a criança como sujeito de direitos é um avanço, levando-se em consideração que os direitos inerentes a este indivíduo também serão protegidos. Ainda que em desenvolvimento, a criança já é um ser, e como corolário, mesmo, do direito à vida e da dignidade da pessoa humana, mister se faz sua salvaguarda.

Dessa forma, todos os direitos inerentes à pessoa humana são outorgados à criança, ainda que em formação, ainda que em desenvolvimento primário, a fim de lhes ser garantido o pleno desenvolvimento físico, mental, moral, psicológico, etc.

No que tange ao desenvolvimento da criança, importante se faz registrar que o princípio em comento foi, inclusive, recepcionado pela ONU (1989) na Convenção Internacional dos Direitos da Criança prevendo que:

Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança. 2- Os Estados Partes comprometem-se a assegurar à criança a proteção e o cuidado que sejam necessários ao seu bem-estar, levando em consideração os direitos e deveres de seus pais, tutores ou outras pessoas responsáveis por ela perante a lei e, com essa finalidade, tomarão todas as medidas legislativas e administrativas adequadas. 3- Os Estados Partes certificar-se-ão de que as instituições, os serviços e os estabelecimentos encarregados do cuidado ou da proteção das crianças cumpram os padrões estabelecidos pelas autoridades competentes, especialmente no que diz respeito à segurança e à saúde das crianças, ao número e à competência de seu pessoal e à existência de supervisão adequada.

Observa-se, desta forma, a preocupação do legislador em estabelecer que crianças e adolescentes tivessem garantidas as iniciativas de políticas públicas em atenção ao seu estado de desenvolvimento, delimitando o campo de responsabilidade a todos os que deverão de forma direta ou indiretamente garantir a efetividade desse direito.

Inegável se faz aplicar o mencionado princípio aos embriões criopreservados. A proteção e outorga de direitos se estendem aos embriões, pois sem eles não haveria criança, muito menos adolescente. Logo, ao embrião, embora congelado, também se aplica o princípio em comento.

3.5. IGUALDADE ENTRE FILHOS

Segundo o art. 3º, inciso IV da Constituição Federal de 1988, “ Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Verifica-se, portanto, que o direito a igualdade é preceito fundamental da RFB, e sendo um de seus objetivos, o Estado busca formas de serem assegurados o cumprimento e satisfação de tal preceito.

Conforme ensina José Afonso da Silva (2005; p. 211) “A Constituição de 1988 abre o capítulo dos direitos individuais com o princípio de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (art. 5º, caput)”. São, portanto, abrangidos pela proteção que o princípio confere, todos os seres humanos, independentemente do estado em que se encontram, e segundo Jussara Maria Leal de Meirelles (apud SÁ; NAVES, 2004; p. 177):

[...] o valor da pessoa humana que informa todo o ordenamento estende-se, pelo caminho da similitude, a todos os seres humanos, sejam nascidos, ou desenvolvendo-se no útero, ou mantidos em laboratório, e o reconhecimento desse valor dita os limites jurídicos para as atividades biomédicas. A maior ou menor viabilidade em se caracterizarem uns e outros como sujeitos de direito não implica diversificá-los na vida que representam e na dignidade que lhe é essencial. Reconhecer esse dado significa respeitar o ser humano em si mesmo, durante todo o seu desenvolvimento, e para além dele próprio, nos seus semelhantes.(MEIRELLES apud SÁ; NAVES, 2004; p. 177)

A própria Constituição Federal, em seu bojo estabelece que não haverá essa distinção, proclamando em seu art. 227, § 6º que  “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmo direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.”

Não é exclusividade da Carta Magna, o preceito, tendo por base que o Código Civil recepcionou o que acima se mencionou, transcrevendo ipsis literis o dispositivo Constitucional em seu art. 1.596. Nessa guarida, importante mencionar o que destaca Carlos Roberto Gonçalves (2005; p. 08) quando diz que não “... admite distinção entre filhos legítimos, naturais e adotivos, quanto ao nome, poder familiar, alimentos e sucessão”.      Entende-se, portanto, que como resta evidenciado nos dispositivos legais, é vedada qualquer discriminação entre filhos, quer seja pelo meio que foram gerados, quer seja pela forma como se instituiu a filiação. Logo, e como conseqüência natural desta interpretação, diferenciar ou discriminar os filhos havidos por inseminação artificial post mortem é, terminantemente, proibido pelo Códex Civilista e pela própria Carta Maior.

3.6. PLANEJAMENTO FAMILIAR

Um dos direitos fundamentais assegurados constitucionalmente é o direito de liberdade. Como corolário deste princípio faz-se necessário tecer algumas anotações sobre o planejamento familiar.

Tem se observado em muitas sociedades atuais que, cada vez mais os casais têm menos filhos. A maternidade tem sido postergada em função de inúmeros paradigmas comportamentais, principalmente em relação ao papel da mulher moderna na sociedade contemporânea. Este fator demonstra um indicativo de responsabilidade, pois confere à nova vida que se iniciará, um mínimo de dignidade, tendo em vista que um filho planejado terá mais condições, inclusive econômicas, de ser melhor provido.

O Estado assumiu, portanto, o dever de assegurar que tal premissa fosse devidamente cumprida. Dessa forma o Estado avocou para si a função de proporcionar meios educacionais e científicos suficientes para que este direito seja preenchido.

Com o conhecimento humano, novas técnicas nos diversos segmentos sociais foram implementados, o que, consequentemente, resvalou na aplicação das ciências jurídicas. Um exemplo disso é o papel que a mulher vinha desempenhando ao longo dos anos, pois anteriormente algumas condutas, só pelo fato de serem praticadas por alguém do sexo feminino, já ensejavam uma maior recriminação.

Diante destas mudanças, a mulher assumiu novos papéis e conquistou novos espaços, participando mesmo da vida política e econômica. Nesse diapasão, surgiu a necessidade de se inserir no mercado de trabalho, e se tornar responsável pela sua própria subsistência.

Como conseqüência, a questão familiar também ganhou nova roupagem e a presença nos lares tornou-se cada vez menor. A mulher começou a trabalhar e a ter menos tempo para se dedicar a família. Em função disso, a própria família se modificou.

Hodiernamente, o homem não é mais o provedor. As responsabilidades são dividas igualitariamente, e em muitos casos, a mulher passou a ser a mantenedora do lar. Continuando nessa quadra, a união também deixou de ser uma responsabilidade para se tornar um acordo, de modo que os casais permanecem juntos não por uma obrigação, mas por mera vontade.

O objetivo da união familiar é o bem estar, vinculando ao companheirismo a divisão de responsabilidades, afastando, assim, o caráter patrimonialista que era conferido à instituição familiar.

Como dito, as mudanças não foram apenas sociais, elas influenciaram principalmente o campo das ciências tecnológicas. O desejo de controlar as tecnologias fez surgir no homem o desejo de controlar também o seu desenvolvimento, incluindo-se aí o controle mesmo da capacidade reprodutiva.

Dessa forma surgiram técnicas que entravaram a procriação como é o caso da esterectomia e vasectomia. Ambas as técnicas foram conseqüências da nova atitude dos casais de restringir a quantidade de filhos, o que foi largamente acompanhado por inovações, também, no ramo farmacológico com o advento dos anticoncepcionais.

Percebe-se, que todas essas mudanças giram em torno do planejamento familiar, pois com estas alterações os casais poderiam escolher o melhor tempo para gerar uma criança, além de escolher também quantas crianças gerar.

À luz do exposto, também surgiram técnicas capazes de preservar materiais genéticos para possível procriação, posteriormente, em virtude de fatores de cunho pessoal. Dessa forma o planejamento familiar assumiu posição séria na constituição da própria sociedade.

Assim, o direito teve de se adaptar a essas novas concepções, e mesmo sendo difícil, em virtude da não previsibilidade do que aconteceria, teve de enfrentar casos inesperados, como foi o que ocorreu na França.

Passou-se a exigir do Estado condutas no sentido de que fossem asseguradas condições fáticas e jurídicas de se realizarem os procedimentos que a ciência deixava à mão. As Constituições também acompanharam essa evolução, o que não foi diferente no Brasil. Muito embora não prescrevendo minunciosamente tais fatos, as Cartas Maiores trataram de garantir que todos tivessem suas liberdades e individualidades respeitadas, bem como garantiu o direito de ter planejada sua família.

Destarte, planejar, significa mais do que escolher quantos filhos se terá. O sentido dessa garantia alcança a possibilidade de garantir à prole acesso devido à saúde, à educação, e a um modo de vida seguro e saudável, como reflexo da dignidade da pessoa humana.

No caso do Brasil, podemos citar o que acima se delineou através de alguns dispositivos constitucionais como o art. 1º, incisos I e II, que prevê a cidadania e a dignidade como fundamentos da República Federativa Brasileira; o art. 3º, inciso I, II, IV, que se refere à construção de uma sociedade livre, justa e igualitária, bem como a erradicação da pobreza e repúdio a todas as formas de preconceito; o art. 5º, caput e incisos I e X que trata dos direitos e garantias fundamentais, dentre outros que tratam de maternidade, planejamento familiar, assistência social, etc.

A inseminação artificial se insere nesta premissa constitucional, no devido momento em que um casal, quer seja por motivo de saúde, motivos econômicos, ou qualquer outro motivo relevante para o casal, escolhendo por futura gestação, criopreserva material genético e até mesmo embriões para serem implantados.


4.A QUESTÃO SUCESSÓRIA RELACIONADA COM A FERTILIZAÇÃO IN VITRO POST MORTEM DE EMBRIÕES CRIOPRESERVADOS

. 4.1. A FILIAÇÃO

A filiação, nada mais é que o reconhecimento de paternidade e/ou maternidade conferido a um indivíduo, quer seja por laços biológicos, quer por laços afetivos. Assim, tem-se que não há diferenças entre os filhos havidos ou não na constância do casamento, bem como entre os filhos adotivos, pois o próprio Código Civil veda a discriminação entre eles. Como corolário dessa premissa, observa-se que os filhos, não importando de que modo tenham se inserido no seio familiar, são todos iguais para o Direito.

Para se determinar a paternidade e maternidade de uma criança deve-se levar em consideração muitos fatores de cunho moral benéficos ao filho. O ser gerado não pode ser responsabilizado, muito menos suportar os ônus daqueles que o conceberam.

.Se, para o Código Civil de 2002, a procriação artificial realizada após a morte do de cujus, origina filhos como se concebidos fossem na constância do casamento, é no mínimo lacunoso, dizer que estes mesmos filhos não tem capacidade para suceder, pois não estavam vivos na época da abertura da sucessão.

Como já debatido anteriormente, o filho existe desde o momento da fecundação, e, se naquele momento já havia vida, é óbvio que também a ele já eram assegurados os direitos.

.Não se pode esquecer que a herança genética é verdadeiro direito da personalidade, assim como o nome, devendo por isso mesmo ser protegida. Tal herança não pode ser disponível, nem tampouco renunciável, pois, assim sendo, constitui fator integrante da dignidade da pessoa humana.

Como visto alhures, a inseminação artificial post mortem consiste na utilização de material genético reprodutor de um homem e de uma mulher. Assim, tem-se que tal procedimento difere-se do que ocorre, quando ainda vivo o doador dos gametas masculinos, apenas quanto ao momento da fecundação propriamente dita.

Destarte, tanto em uma como em outra situação, existente se faz a herança genética, e, consequentemente, os laços sanguíneos. A origem genética vai muito além do momento de realização do procedimento, sendo tal ponto irrelevante para a configuração da filiação, principalmente quando realizada com o pleno consentimento do de cujus.

Não poderia ser diferente o raciocínio, tendo em vista que a própria legislação civilista prevê a presunção de paternidade dos gerado via fertilização in vitro. Dessa forma, afastar um direito já pacificado por mero fator cronológico traz certa insegurança jurídica, principalmente quanto aos direitos sucessórios e de filiação de uma pessoa que, como se disse acima, não pode nem deve suportar o peso de uma omissão legislativa e interpretativa dos aplicadores do direito.

Faz-se imperioso registrar que, o direito vem instituindo, hodiernamente, novos paradigmas de sua aplicação, ressaltando cada vez mais a função social. Assim, tem-se que não se pode deixar à margem esses conceitos quando se trata de pessoas, mesmo porque mais importante se faz mensurar, neste caso, o caráter social do que a pura legalidade, tendo em vista o que diz a hermenêutica jurídica.

O direito das sucessões, em sua acepção jurídica, tem como fundamento o direito da propriedade. Desta feita, no momento da morte surge o direito hereditário, com a substituição do falecido pelos seus sucessores nas relações jurídicas em que o de cujus figurava. Tal sucessão é regida pelo princípio da saisine, o qual, seguindo um critério cronológico, transmite o domínio e a posse dos bens do falecido, no momento do óbito, aos herdeiros. Esse patrimônio, nesse momento é indivisível e chama-se espólio.

O patrimônio mencionado é a herança, composta pelos bens, direitos e obrigações do de cujus. Tem-se, portanto, que são pressupostos da sucessão tanto a morte do autor da herança quanto a vocação hereditária. Somente após aberta a vocação e respeitada sua ordem é que se adjudicará os bens a cada herdeiro, recebendo cada um o seu quinhão, ou seja, sua quota parte.

Dito isto, fácil é observar que para o direito das sucessões, o fator temporal é muito importante, o que não deveria ocorrer, tendo em vista que a filiação não se define pelo tempo, mas por laços genéticos. Ora, se o objetivo é proteger o patrimônio do falecido, outorgando-o aos seus herdeiros, que são quem mais provavelmente protegeriam este patrimônio, não faz sentido excluir deste rol os filhos havidos pelo procedimento que neste ensaio se delineia, simplesmente por uma questão cronológica.

Tal assertiva se fortalece muito mais quando a autorização para a fertilização in vitro post mortem ocorre com a aquiescência do progenitor, o que se configura em verdadeira manifestação de vontade. Diversos são os posicionamentos doutrinários sobre o tema, o que revela o quão complicada é a celeuma. Portanto, necessário se faz entender como os jurisconsultos tem enfrentado o caso, para, posteriormente, tecer breves anotações.                                  

4.2. VISÕES DOUTRINÁRIAS ACERCA DA SUCESSÃO POST MORTEM

O Código Civil de 2002 ao estabelecer, em seu artigo 1798, que somente as pessoas vivas e já concebidas podem herdar no momento de aberta a sucessão, gera verdadeira polêmica em se tratando de reprodução assistida. Tal Códex, ao tratar do assunto nem autoriza nem regulamenta este tipo de reprodução, mas apenas constata sua existência de forma lacunosa. Nessa seara de discussões, a doutrina basicamente se divide m dois ramos.

A primeira vertente doutrinária aduz que deve ser proibida a ocorrência da fertilização in vitro post mortem, porque mesmo havendo o laço genético entre os progenitores e a criança, esta filiação é juridicamente extramatrimonial. Segundo afirmam, o gerado não terá pai e nem poderá ser registrado como filho matrimonial do doador, já que nascido 300 dias após a cessação do vínculo conjugal, em função da morte de um dos consortes.

De mais a mais, prelecionam que a prática causaria verdadeira insegurança jurídica aos gerados anteriormente a época da sucessão, pois estes teriam que esperar, sem saber quanto tempo, pelo nascimento de alguém, ficando até então o patrimônio indivisível.

Partidário desta posição é o doutrinador Guilherme Calmon Nogueira (2003; p. 1000), que diz:

É inegável a vedação do emprego de qualquer das técnicas de reprodução assistida no período pós-falecimento daquele que anteriormente forneceu seu material fecundante e consentiu que o embrião formado ou seu material fosse utilizado para formação de nova pessoa humana. A violação aos princípios da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da futura criança, além da própria circunstância de ocorrer afronta ao princípio da igualdade material entre os filhos sob o prisma (principalmente) das situações jurídicas existenciais, não autoriza a admissibilidade do recurso a tais técnicas científicas. Assim, a questão se coloca no campo da inadmissibilidade, pelo ordenamento jurídico brasileiro, das técnicas de reprodução assistida post mortem. Daí não ser possível sequer a cogitação da capacidade sucessória condicional (ou especial) do embrião congelado ou do futuro embrião (caso fosse utilizado o material fecundante deixado pelo autor da sucessão) por problemas de inconstitucionalidade.

Na mesma esteira de raciocínio, o jurista Sílvio de Salvo Venosa (2007) entende que nas inseminações após a morte, o Código civil não focou diretamente do Direito Hereditário dos seres assim gerados, pois para a sucessão continuam sendo herdeiros aqueles vivos ou concebidos quando da morte.

Também adepto dessa corrente é o renomado autor Eduardo Oliveira Leite (2003), que entende se tratar de situação anômala, tanto no aspecto da filiação quanto no campo dos direitos sucessórios, e aduz:

Quanto à criança concebida por inseminação post mortem, ou seja, criança gerada depois do falecimento dos progenitores biológicos, pela utilização de sêmen congelado, é situação anômala, quer no plano do estabelecimento da filiação, quer no do direito das sucessões. Nesta hipótese a criança não herdará de seu pai porque não estava concebida no momento da abertura da sucessão.(LEITE, 2003; p. 110)

Continua, dizendo em outra obra:

A inseminação post mortem (também denominada inseminação intermediária, já que não é homóloga nem heteróloga) não se justifica porque não há mais o casal, e poderia acarretar perturbações psicológicas graves em relação à criança e à mãe, daí a conclusão quanto ao desaconselhamento de tal prática. (LEITE, 1995; p.154-155)

Posição semelhante é do doutrinador José Roberto Moreira Filho que se manifesta da seguinte forma:

Quanto à inseminação post mortem, temos que atualmente ela se faz quando o sêmen ou o óvulo do de cujus é fertilizado após sua morte. Nestes caso, por ter sido a concepção efetivada após a morte do de cujus, não há que se falar em direitos sucessórios a ele. Há tendências doutrinária admitindo que tanto o não concebido quanto o não nidado, possam ter direitos sucessórios e o reconhecimento de sua filiação, desde que a pessoa assim lhe assegure através de testamento. O direito sucessório, portanto, decorre da filiação e, a partir da determinação do vínculo de paternidade , será resolvido. Destaca-se que o consentimento dado em vida é essencial para se determinarem os direitos do nascituro e para formação do vínculo de filiação.( MOREIRA FILHO, 2002.)

Vertente semelhante é a que segue a ilustre Maria Helena Diniz (1995; p. 91)  quando afirma:

É preciso evitar tais práticas, pois a criança, embora possa ser filha genética, por exemplo, do marido de sua mãe, será juridicamente, extramatrimonial, pois não terá pai, nem poderá ser registrada como filha matrimonial em nome do doador, já que nasceu 300 dias da cessação do vínculo conjugal em razão da morte de um dos consortes, E, além disso, o morto não mais exerce direitos, nem deveres a cumprir. Não há como aplicar a presunção de paternidade, uma vez que o matrimônio se extingue com a morte, nem como conferir direitos sucessórios ao que nascer por técnica conceptiva port mortem, pois não estava gerado por ocasião da morte de seu pai genético (...). Por isso, necessário será que se proíba legalmente a reprodução assistida post mortem ,e se, porventura, houver permissão legal, dever-se-á prescrever quais serão os direitos do filho, inclusive sucessórios.

Entretanto, existe uma segunda corrente que valoriza mais os princípios constitucionais da igualdade entre os filhos e a liberdade de escolha do casal, bem como o planejamento familiar. Para esta corrente o embrião poderá sim herdar. Um dos defensores desta corrente é o magistrado José Luiz Gavião de Almeida (2003; p. 104), para quem:

E reconhecendo o legislador efeitos pessoais ao concepturo (relação de filiação), não se justifica o plurido de afastar os efeitos patrimoniais, especialmente o hereditário. Essa sistemática é reminiscência do antigo tratamento dado aos filhos, que eram diferenciados conforme a chancela que lhes era aposta no nascimento. Nem todos os ilegítimos ficavam sem direitos sucessórios. Mas aos privados desse direito também não nascia relação de filiação. Agora, quando a lei garante o vínculo, não se justifica privar o infante de legitimação para recolher a herança.

Na mesma linha de pensamento, encontra-se a professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka que entende que o conceito de nascituro compreende o conceito de embrião, sendo desastrosa a separação entre ambos e conclui:

Supondo que tenha havido a autorização e que os demais requisitos tenham sido observados, admitindo-se, assim, a inseminação post mortem, operar-se-á o vínculo parental de filiação, com todas as conseqüências daí resultantes, conforme a regra basilar da Constituição Federal, pelo seu art. 226, § 6º, incluindo os direitos sucessórios relativamente à herança do pai falecido. (HIRONAKA, 2007)

Também partidários desta corrente, Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka (2003), salientando que era inadmissível a constituição de vínculo de parentesco entre a criança gerada e o falecido, doador do material genético, tendo em vista que a morte extinguia a personalidade, porém com o Código Civil de 2002, essa aplicação torna-se obsoleta, e asseveram:

Nesse contexto, embora a contragosto, concluímos terem os filhos assim concebidos o mesmo direito sucessório que qualquer outro filho, havido pelos meios naturais. E estaremos diante de tormentoso problema quando verificado o nascimento após anos do término do inventário, pois toda a destinação patrimonial estará comprometida. [...] Por isso, quer parecer que a solução que melhor se amolda à hipótese é a que determina o rompimento do testamento na hipótese de virem um ou mais desse embriões a aderir a um útero apto a garantir-lhes desenvolvimento saudável e posterior nascimento. Com isso, estar-se-á adequando a norma legal às novas exigências sociais decorrentes da evolução científica. E o mesmo se alcançará quando, inexistindo testamento, vier o herdeiro nascido ao depois pleitear e receber seu quinhão hereditário, como se fosse um filho reconhecido por posterior ação de investigação de paternidade.(CAHALI; HIRONAKA, 2003)

 Muito embora a posição doutrinária contrária ao reconhecimento dos direitos sucessórios do concebido via inseminação artificial post mortem pareça ser majoritária, o que se verifica, em verdade, é uma cisão muito grande entre os doutrinadores, razão pela qual o presente tema se demonstra carecedor de previsão legal, ou mesmo de uma nova roupagem quando da interpretação dos dispositivos legais já existentes.

4.3. COMPARATIVO COM PROLE EVENTUAL

Segundo o que ensina o Direito Civil, o de cujus, poderá deixar, em forma de testamento, bens àquele que embora ainda não vivo, possa ser gerado. O instituto chama-se prole eventual e quer dizer que os filhos ainda não concebidos de pessoas vivas, poderão herdar, desde que esse nascimento ocorra em até dois anos da abertura da sucessão. Assim dizem os arts. 1.799 e 1.800 do CC 2002:

Código Civil:

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão;

II - as pessoas jurídicas;

III - as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de fundação.

Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

§ 1º - Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo filho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no art. 1.775.

§ 2º - Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado, regem-se pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no que couber.

§ 3º - Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador.

§ 4º - Se decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.

Dito isto, entende-se que em não ocorrendo o nascimento da prole esperada, os bens reservados, salvo disposição em contrário, caberão aos herdeiros legítimos. Assim, verifica-se que o legislador considerou a vontade do testador, dando azo para que ele procedesse à divisão de seus bens como imaginado, prevendo, inclusive, o presente instituto.

 Considerando-se o que se disse acima, verifica-se que há um contracenso muito grande na legislação pátria, pois poderá ocorrer a situação de ser beneficiado herdeiro de um terceiro, através da prole eventual, mas o filho legítimo, que teve seu congelamento, para posterior gestação, autorizada pelo falecido, poderá ser excluído da herança simplesmente por falta de previsão legal.

Explicando o tema, Jussara Maria Leal de Meirelles, assevera, deixando cristalina a situação:

Em suma, se os denominados embriões pré-implantatórios não são pessoas a nascer (nascituros), nem por isso é possível classificá-los como prole eventual (a ser concebida) posto que concepção já houvesse. De outro lado, por serem em si mesmos portadores de vida, não podem ser tidos por bens suscetíveis de subordinação a interesses econômicos dos mais diversos. Conclui-se, pois, que a questão do destino dos embriões humanos não utilizados para implantação em útero não encontra acolhida nas categorias impostas pelo Código Civil. Desse modo, impõe-se distanciá-los da categorização estabelecida tradicionalmente bem como, sob enfoque da proteção, equipará-los aos demais seres humanos.(MEIRELLES apud MOREIRA FILHO)

Necessário se faz, portanto delimitar o status jurídico dos embriões criopreservados. São eles, conforme já defendido nesta monografia, seres humanos detentores de carga genética própria e existência medicamente comprovada. Assim, necessitam estes embriões, de proteção jurídica, pois a eles não se pode imputar as consequências desgostosas da omissão legislativa, que o deixa desamparado frente a outras categorias já contempladas pelo ordenamento pátrio.

Não se verifica dignidade da pessoa humana quando não está presente a proteção Estatal.

Em conseqüência da ausência de previsão legal, não tem se considerado nascituro, embora erroneamente, o embrião criopreservado que ainda não foi nidado. Demonstra-se, nessa quadra a lacuna existente, carecedora de proteção. Noutro diapasão, se este embrião, anteriormente congelado, for implantado no útero feminino, será ele filho legítimo e terá direitos sucessórios.

Ora, o filho criopreservado ainda não inserido no útero materno em nada difere do já inserido. Ambos tem a mesma carga genética e ambos possuem o direito de serem protegidos. Sem observância da vontade do testador, que consentiu com a realização do procedimento, este embrião, futura criança, se desenvolverá à margem, sem saber em que consiste juridicamente sua situação.

O que deveria ocorrer seria uma aplicação analógica ao conceito de prole eventual, podendo o conceito em tela enquadrar o que aqui se defende. Nesse caso, o embrião congelado poderia herdar de seu progenitor, conseqüência indubitável decorrente da filiação. Deve-se almejar a vontade expressa do testador em deferir-lhe a herança e conjugar sua última vontade com a de quem gestará o embrião, pois, as duas vontades devem, necessariamente, estarem vinculadas, haja vista ser juridicamente impossível que a manifestação de vontade do falecido seja o único fator para quem vai, de fato gerar a criança, e futuro herdeiro e, também será, do mesmo modo, ineficaz que alguém venha aproveitar-se de uma gestação futura, e aproveitando-se da própria torpeza, venha a realizar o procedimento com finalidades outras, que não as inerentes ao sonho de gerar um filho, sem que o de cujus  tenha consentido. Entretanto a aplicação da analogia com o caso de prole eventual merece algumas ressalvas, como se abordará mais adiante.

Observa-se que, a questão toda vai muito além de interesses patrimoniais, mas sim em saber que laços unirão este novo indivíduo a família a qual está inserido, decorrentes da filiação, ainda que esta se dê posteriormente ao falecimento do progenitor. É óbvio que tal fato faz surgir alteração na vocação hereditária, mas o argumento pode ser facilmente afastado se for levado em consideração que a hipótese é semelhante ao caso de quando é ajuizada ação de petição de herança.

Petição de herança é a ação cabível quando o herdeiro, ainda não reconhecido e não trazido à partilha, intente, após comprovar a filiação, demandar reconhecimento de seu direito sucessório para obter restituição de herança ou parte dela. É espécie de ação pertinente tanto para sucessão legítima quanto testamentária. Destarte, o interessado teria à mão, modo de reivindicar o reconhecimento de uma qualidade pessoal e inerente à sua condição de herdeiro.

Neste caso, caberá, é claro, a quem tem interesse, a reserva da herança até a partilha, nesse caso a mãe do embrião criopreservado, como sua representante legal. Inegável é o que se disse, pois em havendo um filho consangüíneo, tal fato configura causa de inserção na ordem de vocação hereditária como descendente. Dessa forma, solucionados ficariam os problemas quanto a vontade respeitada do de cujus, bem como os transtornos psicoemocionais possivelmente enfrentados pela criança, que restariam afastados.

Além do que se disse, deve-se lembrar que a ação de petição de herança é imprescritível, porque também é imprescritível a condição de filho e de herdeiro, logo fácil seria a solução para o herdeiro ainda não concebido. O que se questiona é se tal postura não estaria indo de encontro com a segurança jurídica daqueles que já se encontram vivos e concebidos no momento da abertura da sucessão, para o que se faz necessário observar o que adiante se anota.

4.3.1. Segurança Jurídica e Deixa Testamentária

Nessa quadra discutir-se-á a questão da segurança jurídica dos demais herdeiros, já existentes ou pelo menos já concebidos no momento da abertura da sucessão, bem como a segurança jurídica da relação como um todo, ponderando sob que prisma ela deva ser considerada.

A segurança jurídica, nada mais é que a garantia que se confere aos indivíduos de que no corpo dos textos jurídico, estejam incluídos os princípios fundamentais conquistados pelas lutas sociais. Dessa forma, significa mais que a simples certeza e obediência a um conjunto de leis que tipifiquem o que é permitido ou não. Tal instituto existe, em verdade para que a finalidade maior do Direito se concretize.

Primeiramente, imperioso o registro de que a questão da segurança jurídica no processo sucessório é com certeza relativa. Em exemplo ao que se disse podemos exemplificar com ocaso do falecido que não deixa descendentes. Sua herança será, em obediência ao que diz o código civil, repartida entre seus ascendentes e cônjuge. Entretanto, sobrevindo investigação de paternidade post mortem, e, em sendo esta paternidade confirmada, a vocação se modificará, deixando à margem os ascendentes e possivelmente o cônjuge, dependendo do regime jurídico de casamento.

Nesse caso não se questionará o desejo de ter aquele filho, pois o simples fato desta criança existir já lhe confere o direito de participar da herança, haja vista ser um herdeiro legítimo. Este filho não será tratado, pela lei, de forma diferente pelo simples fato de não ter sido planejado.

Não é o que ocorreria, todavia, se a criança tivesse sido gerada posteriormente ao falecimento do de cujus, ainda que em obediência a uma vontade sua. Percebe-se que, a confusão é levantada pela própria legislação, que prevê casos equivalentes de modo desigual. Dessa forma passa-se a confrontar o art. 1.597, inciso III do Código Civil, que trata da presunção de filiação no caso de inseminação artificial homóloga realizada após a morte do genitor com a descrita no artigo 1.798 do mesmo Código, no sentido de que só tem legitimidade para suceder quem já estava vivo, ou, ao menos, já era concebido no momento da abertura da sucessão.

Como já debatido, o ordenamento jurídico é uno, porém não é um sistema fechado. Deve-se, quando da interpretação de uma norma, considerá-la dentro do corpo normativo maior em que se insere, e não interpretá-la isoladamente, sob pena de se aplicar a uma dada hipótese, entendimento gramatical e sem sistematicidade.

Assim, mister se faz analisar as demais fontes do Direito e não somente as leis. A aplicação dos princípios, costumes e demais fontes é de grande utilidade para o aplicador. Quanto aos princípios, importante lembrar do princípio da legalidade, aplicável tanto à administração pública quanto aos particulares.

No primeiro caso, estabelecendo que a administração só pode fazer aquilo que vier prescrito na lei. Já quanto ao particulares, o princípio em tela reconhece que estes podem fazer tudo aquilo que a lei não proíba. Em não existindo lei proibitiva, cristalino é o entendimento que ao particular não é vedada certa conduta.

Desta feita conclui-se que a ausência de legislação que proíba a inseminação artificial deixa margem para que a conduta seja realizada. Em conseqüência não se pode punir aquele que opte por adotar o procedimento, excluindo os direitos inerentes ao assunto. O filho resultante da inseminação artificial homóloga post mortem deve ter exatamente os mesmos direitos que são assegurados ao seu irmão biológico concebido ou nascido antes da morte do pai. A interpretação é consentânea com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os filhos, do planejamento familiar etc.

Complementando o que ora se argumenta, vale lembrar que a própria Constituição Federal estabelece, em seu art. 5º, inciso XXX, que é garantido, sem restrições, o direito de herança. Dessa forma interpretar o art. 1.798 do código Civil restritivamente, vai de encontro mesmo com a Carta Maior.

Pensar dessa forma não ofende a segurança jurídica por se tratar de caso excepcional. Bastaria, na ocorrência do fato, pensar constitucionalmente, e estender àquele filho, os direitos dos demais, ponderando tanto o princípio da dignidade da pessoa humana (para a viúva e o filho concebido via inseminação artificial post mortem) quando o da segurança jurídica (para os demais filhos).

Como os direitos fundamentais não são absolutos, em muitos casos pode até mesmo haver uma colisão entre eles. Nesse momento deve-se analisar, qual das garantias merece maior atenção, e qual merece ser aplicada.

Essa discussão não é nova, e as cortes superiores tem enfrentado sobremaneira o assunto, tendo se instituindo, hodiernamente, o instituto da relativização da coisa julgada, pois importante é equilibrar as exigências de segurança jurídica com os resultados das experiências profissionais.

Assim segurança jurídica quer dizer mais a segurança do ordenamento como um todo, que a sua aplicação a um grupo de indivíduos com direitos já protegidos. Com o advento de uma inseminação artificial póstuma ao de cujus, ninguém perde. Os filhos já havidos não perderão a qualidade de filhos legítimos nem os direitos inerentes a ela. O falecido verá sua vontade realizada, o que deve ser observado e obedecido, inclusive, por aqueles que ele já havia gerado. E o direito também não perde, pois cumprirá sua função precípua: fazer justiça.

Também sobre a segurança jurídica, caso venha a ser aplicado analogicamente o conceito de prole eventual, não se pode estipular o prazo máximo de dois anos conferido àquele instituto, pois não se pode impor um limite temporal à realização da referida técnica, pois se estaria ferindo os princípios constitucionais antes defendidos.

Caso contrário, a segurança jurídica restaria afastada, pois se estaria postergando a vontade do falecido em benefício da vontade de quem sobreviveu a ele. O patrimônio deve ser distribuído de acordo com a vontade de quem o conquistou, nesse caso o de cujus, por isso sua manifestação deve ser obedecida, sob pena de afastar a segurança jurídica conferida a ele.

Não se pode esquecer também que o caso da prole eventual impõe que os bens sejam deixados em forma de testamento, o que, nesse caso, violaria a igualdade entre os filhos como adiante se explicará.

Nos termos do art. 1.799, inciso I do CC de 2002 “na sucessão testamentária, podem ainda ser chamados a suceder os filhos ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testados, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão”. Assim, defende-se que se o testador pode deixar patrimônio seu para prole eventual de terceiros, também pode deixar para prole sua.

Entretanto, ao considerar que o filho havido por inseminação artificial post mortem, só poderá herdar através de testamento, criando-se está, discriminação vedada pela própria lei. Mais uma vez, invocando o princípio constitucional da absoluta igualdade entre filhos, não poderá ser feita tal distinção.

Assim, configura-se em inconstitucionalidade considerar que os filhos naturais, os adotivos, e até de fecundação in vitro terão direito à sucessão legítima, enquanto os havidos de inseminação artificial post mortem somente terão direito à sucessão testamentária.

O que ocorre é que a regra que disciplina a hipótese apenas repetiu o que prelecionava o Código de 1916, que só beneficiava o concepturo com testamento porque, naquela época, era impossível imaginar que se poderia gerar um filho após a morte. Porém, a ciência evoluiu ao ponto de possibilitar a quem tenha tal vontade, ou a quem, por qualquer outro motivo, tenha nessa possibilidade a única chance de gerar uma criança, a oportunidade de ver o desejo concretizado.

Ademais, a própria legislação reconhece os efeitos pessoais da filiação a este ser. Logo, não há porque diferenciar os iguais pela condição que lhe é aposta quando do nascimento.

Outro fator que prejudica o herdeiro concebido da forma que se aborda neste trabalho é o fato de a tradição do testamento não ser amplamente utilizada no Brasil. Por motivos, inclusive, de cunho cultural, neste país não se tem o hábito de planejar os termos posteriores a morte, porque se evita falar sobre ela. O que se evidencia é que assuntos referentes a este fatídico momento são evitados, o que dificulta sobremaneira seja utilizado a deixa testamentária para benesse do herdeiro.

Verifica-se, que na legislação o que se encontra é real omissão e por que não dizer, contradição quando da aplicação dos ralos dispositivos existentes, quando se fala de direitos sucessórios dos filhos havidos por inseminação artificial post mortem.

Sendo assim, e aplicando o que diz a Lei de Introdução ao Código Civil de 2002, deve-se em caso de omissão legislativa, decidir-se segundo os costumes, e quando da aplicação destes costumes estes devem ser aplicados de forma integrativa, ou seja, praeter legem.

Pensando desta forma, resguardados estariam os direitos de todos. De mais a mais, deve-se mensurar que com o que aqui se defende, não está se buscando prejudicar os demais herdeiros, já que estes continuarão detentores de seus direitos, mas garantir-se-á, a todos, a reivindicada segurança jurídica.

Ainda nesse diapasão, não se pode esquecer que a segurança jurídica serve para abarcar a situação como um todo, e que concomitante a sua presença, devem estar presentes o bom senso e a boa fé entre os sujeitos da relação que se delineia.

Presentes os princípios que norteiam a aplicação do direito Civil Brasileiro, tais como a eticidade e socialidade, não há como dizer que esta seara jurídica estaria sendo mal aplicada. Assim afastada estaria a individualidade, em benefício da coletividade, e afastada também estaria a injustiça, em benefício da função social.

Trazendo para o que ora se estuda, tem-se que função social, e ética, do caso em comento significa proteger direitos de indivíduos que a própria lei reconhece como detentores. Dizer que um filho é filho, não importa como e quando foi gerado, e, posteriormente, dizer que um desses filhos não tem direitos sucessórios é no mínimo controverso, merecendo por isso mesmo, maior atenção do legislador e maior sensibilidade do aplicador do Direito, que antes de considerar a legalidade de uma norma deve atentar para o ordenamento na qual ela está inserida, sob pena de não ser aplicada justiça aos casos concretos.

Dessa forma, para o presente estudo aponta-se como solução o entendimento da necessidade de uma prestação legislativa correspondente, ou pelo menos uma interpretação favorável ao indivíduo detentor de vida, que por ora fica a margem das benesses conferidas pelo Estado Democrático de Direito.


CONCLUSÃO 

Os avanços tecnológicos provocaram uma mudança nos paradigmas sociais. Em relação ao campo das ciências, estas evoluíram ao ponto de possibilitar que fossem concretizadas experiências nunca imaginadas, sendo uma dessas inovações a técnica da reprodução assistida.

Com a inseminação artificial possibilitou-se a inúmeros casais, que enfrentavam problemas quanto à fertilização, que estes obtivessem êxito em procedimento reprodutório. Assim, a inseminação artificial consiste em propiciar a fecundação, através de uma microagulha, do espermatozóide no óvulo maduro dentro de um recipiente.

Após realizado tal procedimento, existe a possibilidade do material ser de pronto implantado no útero daquela que dará a luz ao novo ser que se desenvolve. Em não sendo escolhida esta possibilidade, poderá ocorrer de o casal optar por criopreservar aquele embrião para que seja inserido em momento oportuno.

Em conseqüência, claro fica que, o momento de alocar o embrião, para que este venha a nascer é livre decisão do casal, muito embora em alguns casos esta seja a única opção dos consortes. Desta feita, aufere-se que, com tal procedimento, criou-se a possibilidade de escolher o melhor momento para gerar.

Observou-se, no presente ensaio, que o caso em comento, embora trate de inovação, já tem ocorrido em alguns países o que obrigou a legislação desses Estados se manifestarem sobre a permissão ou vedação para utilização de tal prática, prevendo seus efeitos sobre as demais normas. Não é o caso do Brasil.

A legislação pátria apenas superficialmente aborda a possibilidade da realização de inseminação artificial quando reconhece os direitos de filiação aos gerados por tal modo, ainda que o procedimento tenha se realizado posteriormente ao falecimento do doador do material genético masculino.

Nessa esteira, e principalmente no que se refere a realização post mortem da técnica quando se utiliza embriões criopreservados, buscou-se, nesta monografia, chamar atenção para o fato da omissão legislativa causar verdadeira contradição quando da aplicação da lei, o que se verifica pelas diversas posições doutrinárias abordadas no presente trabalho.

Veja-se que, muito embora reconheça a filiação ao filho havido após a morte do de cujus, quando se tenha utilizado a criopreservação, a lei não confere, a este indivíduo, direito sucessório algum, deixando à margem de apreciação, inclusive, princípios constitucionais relevantes ao caso.

Logo, a pesquisa tentou demonstra quais princípios constitucionais não poderiam ser afastados daquele embrião, que embora congelado, já era considerado com vida, identidade e carga genética própria, chamando-se a atenção para outras garantias fundamentais como é o caso do direito ao planejamento familiar e direito à vida.

Ao passo que demonstrou o quanto aquele indivíduo era detentor de direitos, no presente trabalho buscou-se certificar o leitor da omissão legislativa que gerava verdadeiro contrassenso no corpo do ordenamento jurídico como um todo.

Nesse diapasão apontou-se como solução a aplicação analógica do conceito de prole eventual, porém com ressalvas. O que se concluiu é que mesmo se aplicando o conceito em tela, não se poderia estipular o prazo de dois anos tipificado nos artigos 1.799 e 1.800 do Código Civil de 2002.

O que se constatou é que o prazo seria inconstitucional, pois afastaria a segurança jurídica conferida à relação, quando trataria filhos legítimos desigualmente, em função de mero fator cronológico, o que é vedado pela Carta Maior. Destarte, apontou-se a solução da utilização da petição de herança par que fossem preservados os bens do falecido até a efetiva partilha.

Com a solução apontada concluiu-se que, dessa forma, todos os sujeitos envolvidos na relação estariam sob o manto a proteção jurídica, pois o falecido teria sua manifestação de vontade respeitada, os filhos já havidos não perderiam tal condição, e o embrião teria seus direitos reconhecidos, preservando-se a segurança jurídica como um todo e não isoladamente.

As respostas obtidas na pesquisa foram a de que com a aplicação do conceito de prole eventual, sem levar em consideração a legitimidade do filho havido por inseminação artificial post mortem, e após criopreservação, estaria se cometendo afronta à Constituição Federal, pois com tal instituto o filho assim gerado, que é legítimo, só herdaria por testamento. Portanto, resta dizer que impor esta forma de herança não coaduna com os princípios constitucionais, antes levantados.

Com tudo que se analisou nesta monografia conclui-se que o caso carece de uma definição legislativa, a fim de afastar as contrariedades interpretativas erigidas pela doutrina. Ou, ainda, que seja aplicada, em sentido definitivo, a interpretação mais benéfica, que é aquela que busca satisfazer o máximo de sujeitos da relação, interpretação esta defendida no corpo do trabalho.


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Informações sobre o texto

Monografia apresentada à Coordenação do Curso de Bacharelado em Direito da Universidade Estadual do Piauí. Aplicada como requisito para a obtenção do diploma de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª. Ms. Geloesse Gomes Correia Freitas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACÊDO, Jéssica Leal e Silva. O direito sucessório e o instituto da fertilização in vitro post mortem de embriões criopreservados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4262, 3 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31265. Acesso em: 27 abr. 2024.