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Manifesto abolicionista penal.

Ensaio acerca da perda de legitimidade do sistema de Justiça Criminal

Manifesto abolicionista penal. Ensaio acerca da perda de legitimidade do sistema de Justiça Criminal

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"A transformação contínua da produção, o abalo incessante de todo o sistema social, a

insegurança e o movimento permanentes distinguem a época burguesa de todas as demais. (...)

Tudo o que era sólido desmancha no ar, tudo que era sagrado é profanado (...).

Ao invés das necessidades antigas, satisfeitas por produtos do próprio país, temos novas

demandas supridas por produtos dos países mais distantes, de climas os mais diversos.

No lugar da tradicional auto-suficiência e do isolamento das nações surge uma

circulação universal, uma interdependência geral entre os países."

Marx e Engels, 1848. [1]

"A história da pena é a história de sua constante abolição."

Von Ihering [2]


Parte primeira - Do sistema penal e da

sua investigação

SUMÁRIO: CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS1. Do Movimento Iluminista – 1.1 Direito Penal contemporâneo – 1.2 Direito Penal e Sistema Penal – 1.3 Direito Penal e Constituição – 2. Direito Penal – da busca por legitimidade – 2.1 Legitimidade e Legalidade – 2.2 Da deslegitimidade – negação à legalidade – 2.3 Da atuação ilícita do sistema penal – 3. Sistema Penal e Marxismo – 3.1 A identificação do marco teórico marxista – 3.2 A crítica e a sociedade – 3.3 PASUKANIS, QUINNEY e PAVARINI – por ZAFFARONI – 3.4 O "minimalismo" penal de BARATTA.

Parte segunda - Da politica criminal, do abolicionismo e do clamor marginal

SUMÁRIO: 4. Do Plano Político Criminal – 4.1 Intervenção Penal Mínima e Direito Penal Mínimo – 4.2 O abolicionismo penal – por ZAFFARONI – 4.3 O movimento e as variantes do abolicionismo penal – 4.3.1 O abolicionismo de LOUK HULSMAN – 4.3.2 O abolicionismo de THOMAS MATHIESEN – 4.3.3 O abolicionismo de NILS CHRISTIE – 4.3.4 O abolicionismo de MICHEL FOUCAULT – 4.4 As dúvidas e as propostas abolicionistas – 5. O clamor por uma resposta marginal – uma teoria zaffaroniana – 5.1 Um imperativo jus-humanista – 5.2 Um imperativo ético – 5.3 Uma indagação: o que é marginal? – 6. Considerações conclusivas7. Referências bibliográficas- 8. Notas


CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

O presente ensaio denominado manifesto abolicionista penal objetiva o levantamento de alguns pontos (talvez fundamentais) de um movimento de contra-pensamento dominante do sistema de justiça criminal, que ao longo da história da humanidade caracteriza-se como uma das mais agudas formas de injustiça praticadas contra o homem.

No início dos anos oitenta (1982) o professor da Universidade de Rotterdam LOUK HULSMAN em co-autoria com a professora JACQUELINE BERNAT DE CELIS, trás ao conhecimento do universo acadêmico penalista a obra denominada Penas Perdidas – o sistema penal em questão. Ao final dos mesmos anos oitenta (1989) o referido universo acadêmico recebe de braços abertos a obra daquele, reconhecidamente, o maior penalista latino-americano do século vinte, o professor da Universidade de Buenos Aires EUGENIO RAÚL ZAFFARONI, denominada Em busca das penas perdidas – a perda de legitimidade do sistema penal. Obra esta dedicada ao professor LOUK HULSMAN, em reconhecimento e gratidão pelo enriquecimento intelectual auferido quando da leitura de sua obra abolicionista.

O modesto ensaio não tem a pretensão de dedicar, ou mesmo homenagear os autores do "Manifesto Comunista", KARL MARX e FRIEDRICH ENGELS. Pois, não seria possível, em face de tamanha distância intelectual apresentada. No entanto, procura-se demonstrar a origem remota de nosso pensamento abolicionista em matéria penal. É à luz do pensamento marxista que, em sua maior parte, procuramos fundamentar nossa veia abolicionista, enxergando no Direito Penal um instrumento, extremamente, eficaz de opressão, de tratos desumanos, de cessação da liberdade (em alguns momentos, da vida) e de injustiça, a serviço das elites e do Estado. Este último controlado pela primeira.

O ensaio abolicionista é dividido em duas partes: numa primeira, denominada Do sistema penal e da sua investigação, buscando, num primeiro item, um levantamento do direito penal (mais aprofundado) a partir do movimento iluminista que veio proporcionar o nascimento de um novo direito penal fundado numa concepção mais humanista; procura-se demonstrar, através do item Direito Penal – da busca por legitimidade, a ausência total desta e, conseqüentemente, sua arbitrariedade; e, para finalizar a primeira parte, no item Sistema Penal e Marxismo, o relacionamento existente entre uma ciência da economia política e uma ciência do comportamento humano, identificando-se como sendo ambas ciências antropocentristas.

Numa segunda, que procuramos chamar Da política criminal, do abolicionismo e do clamor marginal, num primeiro item Do plano político criminal, procura-se traçar algumas premissas e etapas percorridas para chegar-se ao abolicionismo penal e adiante uma introdução ao próprio abolicionismo penal com análise de suas variantes e os mais diversos abolicionismos penais e o levantamento de dúvidas e propostas acerca da doutrina; num segundo e último item O clamor por uma resposta marginal – uma teoria zaffaroniana, disserta-se sobre os imperativos jus-humanistas e ético e levanta-se a indagação: o que é marginal?

E, por fim, procura-se demonstrar com o minúsculo ensaio que o sistema de justiça criminal não tem por missão a proteção do homem, ou da sociedade (mas sim de uma classe determinada) e, nem tão pouco objetiva a prevenção ou o controle da criminalidade. Mas sim, fora criado com a intenção de estabelecer-se como instrumento de prática de opressão, estigmatização, exclusão e dominação de classe.


1. Do Movimento Iluminista

1.1 Direito Penal contemporâneo

Pode-se afirmar a existência de uma unanimidade acerca de que o movimento iluminista [3] provocou o nascimento do Direito Penal moderno, em substituição às formas precedentes de justificação do jus puniendi, o que de maneira fundamental vem enobrecer, de forma impar, tal movimento para o desenvolvimento da ciência penal.

Alguns autores vão identificar tal nascimento no movimento artístico, literário e político, que veio a ficar conhecido como renascimento, da Itália do século XV, movimento este em que artistas, cientistas e filósofos, de forma efetiva, criaram e desenvolveram novas idéias fundadas nas culturas grega e romana. Muito além de uma provocação direta exercida sobre a música, a pintura, a literatura, a escultura, a arquitetura, o movimento renascentista exerceu uma influência fundamental quanto ao viver e enxergar o mundo.

Os pensadores humanistas desenvolveram idéias de forma a questionar os ditames do poder eclesiástico, colocando o homem como o ente mais importante nas relações humanas. O renascimento alcançou seu apogeu no século XVIII, que ficou conhecido como o século das luzes, tendo como principal acontecimento a Revolução Francesa de 1789, com a conseqüente edição da Declaração Francesa dos Direitos do Homem.

Pois, as legislações penais da Europa de meados do século XVIII, pautavam-se em procedimentos de crueldade, de castigos corporais e da pena de morte. "O Direito era um instrumento gerador de privilégios, o que permitia aos juízes, dentro do mais desmedido arbítrio, julgar os homens de acordo com a sua condição social. Inclusive os criminalistas mais famosos da época defendiam em suas obras procedimentos e instituições que respondiam à dureza de um rigoroso sistema repressivo". [4]

Tal cenário veio justificar a intervenção de alguns filósofos que em uma verdadeira reunião configurando um movimento de idéias voltadas para a razão e a humanidade, deram início as idéias iluministas e humanitárias, mais precisamente os pensadores franceses VOLTAIRE, MONTESQUIEU e ROUSSEAU, em defesa da liberdade, igualdade e justiça. Para o Direito Penal pode-se afirmar como autores das primeiras idéias penais BECCARIA, HOWARD e BENTHAM. O primeiro caracterizando-se como o principal autor contestador dos sistemas repressivos, inspirado nas idéias dos pensadores franceses, em especial de MONTESQUIEU e ROUSSEAU.

Tais conquistas do renascimento, provocou a substituição da razão da autoridade pela autoridade da razão e, nesse brocardo, fundou-se o Direito Penal moderno. A partir de BECCARIA, com sua obra fundamental Dei Delitti e delle Pene (1764), objetivou-se humanizar o direito penal, procurando-se uma identificação – conseqüentemente uma amenização, ou conserto – para alguns preceitos dentre eles, a origem da pena, para o poder/dever ou direito de punir, para a finalidade da pena, para uma análise da proporção entre delitos e penas, para uma divisão dos delitos, para as formas de julgamento, para uma revisão da prisão, para a pena de morte, para a interpretação e obscuridade das leis, etc.

O movimento iluminista, que propugna uma reforma dos sistemas penais repressivos que teve sua maior repercussão com o trabalho de BECCARIA recebeu o nome de humanitário, por alguns motivos, dentre eles, por sua ênfase a idéia de respeito à dignidade humana, a concepção de piedade e compaixão às pessoas submetidas as mais diversas formas de penas cruéis.

Mais precisamente, sobre a pena privativa de liberdade, cabe ressaltar os trabalhos (dos que poderiam ser chamados de: os últimos iluministas) de JOHN HOWARD e JEREMIAS BENTHAM. O primeiro, com uma preocupação voltada para as questões penitenciárias, no sentido de proporcionar o cumprimento de uma pena de prisão em estabelecimentos condizentes. O segundo, com a idéia de utilidade da pena, contribuiu com a ciência penal no campo da penologia, com a edição de idéias que vigem até os dias atuais, entendendo a pena como um sacrifício necessário e a prevenção como a finalidade que proporciona a legitimidade da pena.

No entanto, com a chegada do século XIX teve-se a criação dos suportes ideológicos do Direito Penal, que proporcionaram a codificação do Direito Penal, caracterizando uma reformulação ou redefinição das relações existentes entre os indivíduos e o Estado. "Pode-se afirmar que a base do sistema legal está dada por quatro vetores fundamentais. Em primeiro lugar pelo princípio nullum crimen, nulla poena sine lege. Em segundo, pela fundamentação racional da pena, da qual se deduz a necessidade de proporcionalidade da mesma ao fato cometido. Em terceiro, a concepção do delito como algo diferente do pecado e, conseqüentemente, um tratamento diverso dos delitos contra a religião e contra a moral e bons costumes. Por fim, a humanização das penas sob a preponderância da pena privativa de liberdade." [5]

O marco da codificação do Direito penal legislado no século XIX, se encontra na fórmula do Código Penal francês de 1810, que representava a passagem de página da ciência penal medieval.

Mais a frente surgiu, então, as concepções de ligação (já que durante um bom tempo perdurou um paralelismo) entre a Constituição Federal e o Direito Penal. Apontamentos no sentido de uma ligação umbilical entre o Direito Penal e o Direito Constitucional, sendo ambos ramos do Direito Público, chegando-se a afirmar as mais diversas relações de diálogos existentes, num sistema positivista, residindo sempre numa visualização de hierarquia de valores, que funciona como suporte de validade (legalidade) das leis penais.

Por tal razão alguns autores passaram a afirmar que "o Direito Penal se legitima formalmente mediante a aprovação das leis penais conforme a Constituição." [6]

Não pode negar-se que o Direito Penal legislado e operado na era medieval era um direito desumano e sua finalidade era exatamente essa, a prática de tortura, atos cruéis e de efetivação da morte. Com o iluminismo ocorre a identificação do embrião humanitário nas ciências penais. No entanto, deve-se lembrar que tal movimento não passou de uma revolta burguesa, que não mais satisfeita com o sistema vigente propugnou pela sua queda.

É verdade que, também, não há de ser esquecido os trabalhos de todos os filósofos da época, franceses, italianos, alemães, ingleses, etc., porém, o iluminismo teve sua limitação em si mesmo. Há de ser reconhecido um avanço nas relações humanas a partir de tal movimento, um avanço nas relações entre o cidadão e o Estado. Nos dias atuais resta pouco do encanto daquele movimento, de lá para cá o mundo sofreu diversas transformações, e as lições do iluminismo foram sendo deixadas de lado, pouco a pouco, o embrião humanitário identificado nas ciências penais foi morrendo. E, hoje, constata-se sua morte.

Infelizmente o iluminismo não sobreviveu as intenções do Estado e da classe que o controla. Os acontecimentos revolucionários da economia no século XIX, os Estados totalitários, as guerras e as ditaduras (principalmente latino-americanas) do século XX, e, os eventos (11 de setembro) do início do século XXI, sepultaram o que ficou conhecido como o movimento humanitário das ciências penais.

O movimento iluminista que tem no renascimento o seu marco inicial só pode ser enxergado atualmente como etapa (inaugural) do movimento abolicionista de meados do século XX. O iluminismo tem que ser estudado e visto como um movimento de antecipação (como outros que à frente mencionaremos) da abolição do sistema penal.

1.2 Direito Penal e Sistema Penal

O que é o Direito Penal? O que é o Sistema Penal? Torna-se imprescindível realizar tal distinção para compreensão tanto de um quanto do outro. Mas, principalmente, para entender a visão abolicionista.

Tem-se por Direito Penal, a priori, um conjunto de normas jurídicas penais que delimitam as condutas denominadas (crimes) criminosas, imputando-lhes sanções, assim como, um controle de validade das referidas normas, a criação e manutenção da estrutura geral de tais condutas e, finalizando com a aplicação e execução das (penas) sanções cominadas. No entanto, pode-se constatar outros conjuntos de normas integrantes do Direito Penal, que encontram-se na esfera forense, são eles: o Direito Processual Penal, a Organização Judiciária, a Lei de Execução Penal e os Estatutos Penitenciários.

Para a efetivação de ambos os conjuntos, ou seja, a prevenção da criminalidade, pode-se dizer que existem "as polícias militares que exercem uma atividade preventiva, encarregadas do policiamento ostensivo e da preservação da ordem pública. O exercício da polícia judiciária e a apuração das infrações penais é atribuição adequada ao perfil da polícia civil, igualmente órgão integrante da estrutura constitucional da segurança pública (...) Um e outro têm por vertedouro obrigatório o Poder Judiciário, a quem incumbe o controle da legalidade de todas as detenções. Intervém obrigatoriamente, como titular exclusivo na maior parte dos casos e como custos legis nesses e nos demais, o Ministério Público (...)." [7]

Portanto, diante dos referidos conjuntos de normas que formam o Direito Penal, pode-se afirmar que o indivíduo autuado – até ser submetido ao cumprimento de uma sanção criminal – percorre as seguintes etapas: policial, judiciária, Ministério Público e penitenciária. Atribui-se ao conjunto dessas instituições, que têm por finalidade a efetivação do Direito Penal, a denominação de Sistema Penal.

No entanto tal descrição não se apresenta de forma unânime, existindo aqueles que lecionam com base em outras regras, para identificar o que seja o sistema penal. "Entende por sistema penal o controle social punitivo institucionalizado, concernente a procedimentos estabelecidos, ainda que não sejam estritamente legais. Isso lhe permite incluir no conceito de sistema penal casos de ilegalidade estabelecidas como práticas rotineiras, mais ou menos conhecidas ou toleradas." [8]

Há, ainda, no campo da criminologia e da sociologia, diferentes conceituações do significado do sistema penal. Para alguns, trata-se de mecanismos de seletividade, no exercício de atividades arbitrárias, em que ocorre o fenômeno – para utilizar a expressão de BARATTA – da clientela do direito penal, ou seja, o recrutamento dos mais débeis, numa forte criminalização, de maneira a estabelecer uma lição implícita do espaço social de cada um. Já em outra definição – assumida pelos autores marxistas – o sistema penal tem por finalidade realizar a missão de hegemonia de um setor sobre o outro.

1.3 Direito Penal e Constituição

Sem dúvida tem-se buscado a legitimação do Direito Penal nos diplomas constitucionais, a priori, uma legitimidade formal das normas penais, como etapa de desenvolvimento. O Direito Penal caracteriza-se como ciência subsidiária e fragmentária, faz parte de toda a ordem jurídica, relaciona-se com todos os outros ramos, mas, principalmente, presta obediência ao Direito Constitucional. O que não quer significar sua legitimidade. No máximo efetiva sua legalidade.

É submetendo-se ao diploma constitucional, para adquirir sua legalidade estatal, que o Direito Penal assume os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, trata-se de uma maneira inteligente de visualizar-se e colocar-se como legítimo, apenas sendo legal. É a visão do virtual como se fosse real. No entanto, de real só existe a atuação arbitrária e ilegítima do Direito Penal. Fundamentalmente no exercício da sua principal atuação, qual seja, a pena privativa de liberdade.

Daí cria-se as mais diversas formas de diálogos entre o diploma constitucional e o Direito Penal, primeiramente, numa concepção do sistema positivista [9], depois na elaboração e prática de uma política criminal [10], em seguida colocando a Constituição como estrutura fundante [11], como fonte [12], como filtro [13], e, finalmente, como fator de evolução [14], do Direito Penal.

O movimento constitucional penal, que acelera seu desenvolvimento a partir de meados da segunda metade do século XX, procura fundar sua legitimidade num discurso de evolução chamado de "sensibilidade constitucional da ciência penal." [15] É verdade que as idéias constitucionais penais, não representam as idéias dominantes no Direito Penal, mas, porém, estas são utilizadas de forma inteligente por aqueles que não pertencem à clientela do direito penal, pois, os recrutados pelo Direito Penal não têm a oportunidade de uma defesa conhecedora de tais idéias. O exercício da defesa no Direito Penal, apenas não é desproporcional é, realistamente, inconstitucional e injusto.

Quando se afirma que a legitimidade buscada pelo Direito Penal na Constituição, não passa de uma legalidade, de uma visão virtual da legitimidade que não se concretiza, quer-se por outras palavras expressar a busca do conhecimento na história. Assim como conhecemos da morte do movimento iluminista, presenciaremos o falecimento do constitucionalismo penal. O Direito Penal é como um vírus de alta resistência, quando se pensa que o aniquilou, reaparece mais forte e potente.


2. Direito Penal – da busca por legitimidade

2.1 Legitimidade e Legalidade

A busca da legitimidade pelo sistema penal, quando um pouco mais aprofundada constata-se não passar de uma ficção jurídica, que, o sistema penal utilizando-se da legalidade, procura fundir os dois conceitos. A intenção do sistema penal é de uma fusão entre os princípios da legalidade e legitimidade, de forma, a criar uma visão virtual da legitimidade. Passa-se a enxergar, puramente, a legalidade, como sendo a legitimidade.

Para ZAFFARONI [16], o que existe é uma utópica legitimidade do sistema penal. O sistema penal é uma complexa manifestação do poder social. Por legitimidade do sistema penal entende-se a característica outorgada por sua racionalidade. O poder social não é algo estático, que se "tem", mas algo que se exerce – um exercício – e o sistema penal quer se mostrar como um exercício de poder planejado racionalmente.

O debate em torno do discurso jurídico penal de racionalidade não suporta uma construção teórica de um planejamento, o qual, o sistema penal procura demonstrar para expor sua legitimidade, seja através da ciência penal, do discurso jurídico-penal, ou da ciência do direito penal, o sistema penal não consegue provar sua racionalidade, pois, ele próprio não atua em conformidade com aquele planejamento proposto. O sistema penal desdiz o próprio sistema penal, pregando e negando, ao mesmo tempo, o próprio planejamento, o que faz com que, exponha a sua própria ilegitimidade.

Há de ser identificado que, a "expressão ‘racionalidade’ requer sempre uma precisão, por ensejar uma alta margem de equívoco. O uso abusivo dessa expressão obriga-nos a prescindir aqui da totalidade da discussão a respeito, para reduzir o conceito de racionalidade com que trabalhamos: a) à coerência interna do discurso jurídico-penal; b) ao seu valor de verdade quanto à nova operatividade social. O discurso jurídico-penal seria racional se fosse coerente e verdadeiro." [17]

Há de se proclamar o entendimento de que a coerência interna do discurso jurídico-penal identificada por ZAFFARONI, não tem seu momento de esgotamento em sua própria complexidade lógica, mas, precisa de uma análise antropológica, que de maneira fundamental, exige uma permanente situação de não-contrariedade, para usar uma expressão do pensador latino-americano o direito serve ao homem, e não o contrário. O que faz surgir o entendimento, de que o exercício do poder do sistema penal, requer sempre, a identificação e constatação dessa antropologia filosófica básica ou ontológica regional do homem. [18]

O que ocorre aqui não é uma viagem ao passado para sustentar – nos dias atuais – uma supremacia metafísica em relação à positivação jurídica da referida antropologia. Mesmo, por que, não é possível negar a existência de uma materialização existente em diversos diplomas internacionais de proteção e defesa dos direitos humanos.

O que se pode afirmar é que, a coerência interna do discurso jurídico-penal é questionada – de forma contundente – por uma fundamentação antropológica, pois, evidencia-se a negação da coerência de tal discurso jurídico, "quando se esgrimem argumentos tais como: ‘assim diz a lei’, ‘a faz porque o legislador o quer’, etc." [19] O que faz constatar que tais expressões produzem prova da ausência total de construção racional, mandato de legitimidade, para o gozo e exercício de poder por parte do sistema penal.

Porém, a negação da construção de coerência do discurso jurídico-penal voltada para uma racionalidade, não pode esgotar-se em si mesmo. Ainda, que tenha uma fundamentação antropológica, o esgotamento de sua racionalidade deve está numa esfera externa, por constatar-se uma impossível realização social – discurso jurídico-penal – de seu programa.

É de lembrar-se que, "o discurso jurídico-penal é elaborado sobre um texto legal explicitando, mediante os enunciados da ‘dogmática’, a justificativa e o alcance de uma planificação na forma do ‘dever ser’, ou seja, como um ‘ser’ que ‘não é’. Para que este discurso seja socialmente verdadeiro, são requeridos dois níveis de ‘verdade social’: a) um abstrato, valorizado em função da experiência social, de acordo com o qual a planificação criminalizante pode ser considerada como o meio adequado para a obtenção dos fins propostos (não seria socialmente verdadeiro um discurso jurídico-penal que pretendesse justificar a tipificação da fabricação de caramelos entre os delitos contra a vida); b) outro concreto, que deve exigir que os grupos humanos que integram o sistema penal operem sobre a realidade de acordo com as pautas planificadoras assinaladas pelo discurso jurídico-penal (não é socialmente verdadeiro um discurso jurídico-penal quando os órgãos policiais, judiciais, do ministério público, os meios massivos de comunicação social, etc., contemplam passivamente o homicídio de milhares de pessoas)." [20]

O que pode ser falado, também, é que tanto o nível abstrato como o concreto pode receber diferentes expressões com uma ampliação do seu significado, o "nível abstrato de requisito de verdade social poderia chamar-se adequação de meio a fim, ao passo que o nível concreto poderia denominar-se adequação operativa mínima conforme planificação. O discurso jurídico-penal que não satisfaz estes dois níveis é socialmente falso, porque se desvirtua como planificação (deve ser) de um ser que ainda não é para converter-se em um ser que nunca será, ou seja, que engana, ilude ou alucina."

A ausência de legitimidade do sistema penal é materializada quando este se refugia no dever ser e abandona, separa-se e divorcia-se do ser.

Diante de tal constatação, o sistema penal procura suprir a legitimidade com a legalidade, que quer significar, a produção de normas reguladoras à luz de mecanismos antecipadamente determinados. A legalidade formal que serve como instrumento legitimador do sistema penal, sofre de um vazio legitimador inequívoco, por ora, procura um ponto de representação democrática para a produção da dogmática penal, por ora, um segundo ponto para a formulação de uma dogmática penal fundamental.

A legalidade formal como instrumento legitimador do sistema penal, vem ratificar a tese de que o sistema – por uma ausência total de legitimidade – não conseguiria manter-se em funcionamento. Diante de um Estado Democrático de Direito, a legalidade formal apresenta-se como a pilastra principal e fundamental de sustentação do sistema penal.

Para finalizar, comprova-se a realidade da tese de insustentável situação do sistema penal, quando se nota uma ausência total de proposituras no sentido de legitimar o sistema penal fora da legalidade formal, ou da dogmática penal.

2.2 Da deslegitimidade – negação à legalidade

Identifica-se que o termo "legalidade" suporta uma pluralidade semântica de maneira a extrair-se um sentido inequívoco para o sistema penal, qual seja, o de operacionalidade. Daí dizer-se que "o sistema penal não atua de acordo com a legalidade (...) a operacionalidade real do sistema penal seria "legal" se os órgãos que para ele convergem exercessem seu poder de acordo com a programação legislativa tal como a expressa o discurso jurídico-penal." [21]

Portanto, é da legalidade formal que o sistema penal retira sua sobrevivência, pois, diante de tal constatação urge uma irrefutável ilegitimidade do exercício do poder. Nem mesmo, a legalidade formal, consegue estabelecer um exercício de poder do sistema penal, que se possa afirmar ser "legal" e "legítimo" ao mesmo tempo, em face, principalmente, de uma nítida contradição na sua programação legislativa.

Sabedor disso o sistema penal, através do discurso jurídico-penal, procura retirar do conceito de legalidade formal – numa busca pela legitimidade de exercício de poder – o que pode identificar-se como "dois princípios: o de legalidade penal e o de legalidade processual (aos quais poder-se-ia somar o de legalidade executiva, ainda insuficientemente elaborado). O princípio de legalidade penal exige que o exercício do poder punitivo do sistema penal aconteça dentro dos limites previamente estabelecidos para a punibilidade. O princípio de legalidade processual exige que os órgãos do sistema penal exerçam seu poder para tentar criminalizar todos os autores de ações típicas, antijurídicas e culpáveis e que o façam de acordo com certas pautas detalhadamente explicitadas." [22]

Porém, uma análise um pouco mais aprofundada, da legislação penal, demonstra uma inequívoca situação de renúncia ou contrariedade à legalidade, situação esta, não identificada pelo discurso jurídico-penal. Isso acontece quando diante de uma efetiva minimização dogmática, de uma ambição pela administrativização, de exclusão de tutelas determinadas, de assistencialismos.

É de notar-se que o próprio sistema penal através de seu discurso jurídico-penal, efetua a exclusão de uma série de requisitos do poder de legalidade. "O exercício do poder de seqüestro e estigmatização que, sob pretexto de identificação, controle migratório, contravenções, etc., fica a cargo de órgãos executivos, sem intervenção efetiva dos órgão judiciais. A lei permite, deste modo, enormes esferas de exercício arbitrário do poder de seqüestro e estigmatização, de inspeção, controle, buscas irregulares, etc., que exercem cotidiana e amplamente, à margem de qualquer legalidade punitiva contemplada no discurso jurídico-penal." [23]

Diante de tal (renúncia expressa à legalidade) realidade constata-se que o poder repressor exercido pelos órgãos judiciais do sistema penal não é o poder repressor punitivo, mas sim, o sistema penal utiliza-se de espécies de controle social extensivo, de forma reiterada, mas precisamente, cotidiana, de manutenção periódica na vida social.

2.3 Do sistema penal formal – desrespeito à legalidade

O discurso jurídico-penal nem sequer consegue evitar um total desrespeito à legalidade no sistema penal formal. É o que acontece quando se examina a sua operacionalidade no âmbito social. Deve-se ter em mente que o aspecto formal do sistema serve apenas como justificação para o exercício real do poder dos órgãos executórios do sistema penal.

No entanto, "a estrutura de qualquer sistema penal faz com que jamais se possa respeitar a legalidade processual. O discurso jurídico-penal programa um número incrível de hipótese em que, segundo o ‘dever ser’, o sistema penal intervém repressivamente de modo ‘natural’ (ou mecânico). No entanto, as agências do sistema penal dispõem apenas de uma capacidade operacional ridiculamente pequena se comparada à magnitude do planificado." [24]

O sul-realismo que vive o sistema penal, no que concerne ao abismo existente entre o exercício de poder pautado numa programação previamente determinada e a capacidade operativa suportada pelos órgãos executórios, só pode ser comparado aos mais desenvolvidos desenhos animados japoneses. No entanto, por outro lado, caso ocorresse uma associação efetiva, uma congruência real entre ambos os pólos, ter-se-ia a produção indesejável, a partir de um determinado momento, de uma reincidência da criminalização, chagar-se-ia o momento em que toda e qualquer conduta seria considerada criminalizada.

É diante da pintura de um quadro como esse, que a "realização da criminalização programada de acordo com o discurso jurídico-penal é um pressuposto tão absurdo quanto a acumulação de material bélico nuclear capaz de aniquilar várias vezes toda a vida do planeta. Estes dois paradoxos são reveladores de um sintoma da civilização industrial levado a seu absurdo máximo pela atual – ou nascente – civilização ‘tecnocientífica’." [25]

Para um teórico do sistema de justiça criminal – entre tantos – um pouco mais atento, torna-se irrefutável não reconhecer que o sistema penal está montado para uma não-funcionalidade, para uma não-operacionalidade, com a intenção nítida e real do exercício de poder fundado numa arbitrariedade voltada para a clientela do direito penal. Torna-se impossível não reconhecer a seletividade do sistema penal.

Sábia é a lição do pensador argentino, quando leciona no sentido de que "os órgãos legislativos, inflacionando as tipificações, não fazem mais do que aumentar o arbítrio seletivo dos órgãos executivos do sistema penal e seus pretextos para o exercício de um maior poder controlador". Continua o mestre numa inteligente ironia, ao dizer que "ninguém compra um apartamento impressionado por uma bela maquete apresentada por uma empresa notoriamente insolvente; no entanto, compramos a suposta segurança que o sistema penal nos vende, que é a empresa de mais notória insolvência estrutural em nossa civilização." [26]

Obrigatório, também, é reconhecer que a violação praticada pelo sistema penal, ocorre tanto à legalidade processual quanto à legalidade penal. A despeito desta última são diversas as formas pelas quais o sistema penal pratica a sua violação. Seja pela ausência de celeridade nos processos; seja pela ausência total de critérios de formulação de um sistema de penas; seja pela distorção incorrigível das tipificações e da introdução de elementos moralistas na construção dos tipos penais, ou, seja pela arbitrariedade consumada na atuação das agências executivas do sistema penal, atuação esta direcionada a uma seletividade de pessoas menos favoráveis, com a causa de danos irreversíveis.

2.4 Do sistema penal formal – atuação ilícita

Diante de um desrespeito completo à legalidade penal e processual, seja pelo sistema penal ou pela própria dogmática (lei) penal, torna-se previsível uma atuação arbitrária das agências do sistema penal com poder de execução. Portanto, a atuação ilícita pelo sistema penal começa no campo da arbitrariedade, com a inevitável conseqüência de expansão para outros campos de atuação.

Daí verificar-se "na operacionalidade social dos sistemas penais latino-americanos um violentíssimo exercício de poder à margem de qualquer legalidade. Neste sentido, basta rever qualquer informe sério de organismos regionais ou mundiais de direitos humanos para comprovar o incrível número de seqüestros, homicídios, torturas e corrupção cometidos por agências executivas do sistema penal ou por seus funcionários. A estas violações devem ser acrescentadas a corrupção, as atividades extorsivas e a participação nos benefícios decorrentes de atividades como o jogo, a prostituição, o contrabando, o tráfico de drogas proibidas (...)." [27]

Portanto, diante do exposto, pode-se afirmar que o exercício de poder abertamente ilícito por parte do sistema penal, dar-se por algumas vias de fácil constatação, dentre elas: a) a utilização da legalidade de maneira a criar uma visão virtual da legitimidade, que se transforma numa ficção científica; b) uma negação e desrespeito à legalidade penal e processual, com a nítida intenção de uma atuação arbitrária por parte das agências executivas; c) o exercício de poder do sistema penal através da legalidade, princípio este, negado e desrespeitado em determinados momentos pelo próprio sistema penal; etc.


3. Sistema Penal e Marxismo

3.1 A identificação do marco teórico marxista

É de difícil identificação o marco teórico marxista, de contribuição teórica para a deslegitimação do sistema penal. No entanto, com a intenção de limitação de análise do sentido ideológico do marxismo, objetiva-se traçar algumas linhas correspondentes entre: marxismo e sistema penal.

Existe no Direito Penal uma intenção, seja por parte do poder estatal, seja por parte de uma significativa parcela representativa dos pensadores penalistas, que é expurgar das ciências penais quaisquer fragmentos ideológicos, como se isso fosse possível. A intenção, aqui, é utilizar o sentido ideológico do marxismo. Começando com a seguinte afirmação: as idéias dominantes no direito penal sempre foram as idéias da classe dominante.

Assim como "o paradoxo de uma sociedade que não pode existir sem revolucionar continuamente os instrumentos de proteção e, com eles, o conjunto das relações sociais é próprio do mundo moderno." [28] De forma idêntica ocorre com o sistema penal, uma das suas formas de sobrevivência – além daquelas apontadas anteriormente – é a criação contínua de tipos penais.

O marxismo consegue constatar de forma inquestionável, o processo predatório que a sociedade industrial européia realizava de maneira incisiva com um total desrespeito à vida e a dignidade humana. O sistema penal – principalmente os latino-americanos – com a sua premissa e prática de máxima intervenção penal, com as suas agências executivas e os seus modelos de estabelecimentos penitenciários, têm praticado ao longo da história da humanidade um genocídio inquestionável.

O sistema penal como instrumento de controle social, como instrumento de dominação de classe que se utiliza do Estado para a realização dos seus objetivos, reproduz máximas marxistas com um resultado real impossível de não se reconhecer. Daí ALAIN TOURENE lecionar que "Marx falava em relações sociais de dominação e exploração, nós enxergamos, mais do que isso, exclusão, marginalização, desenraizamento." [29]

Daí reproduzirmos (de forma adaptada ao tema) algumas máximas marxistas: O movimento abolicionista é o movimento autônomo da imensa maioria no interesse da imensa maioria; O sistema penal é como um feiticeiro que não é mais capaz de controlar os poderes do outro mundo que ele conjurou; etc.

Há de ser reconhecido – se já não foi – que Marx "renovou a história porque conhecia bem economia, revolucionou a política porque conhecia a história como poucos, reinterpretou criticamente a economia graças aos seus conhecimentos de política e de história etc." [30] Tal constatação necessariamente tem que ser transportada para o Direito, caso deseje-se uma abolição do sistema de justiça criminal. Para tal propósito faz-se necessário a construção de um grupo de argumentos metodológicos de deslegitimação do sistema penal, pautado na antropologia, na criminologia, na psicologia, na psiquiatria, etc.

Ë de brotar uma enorme tristeza, por constatar-se que "Marx não tenha analisado em profundidade o sistema penal, ao qual foram dedicados escassos e dispersos parágrafos, sujeitos a interpretações muito controvertidas, considerava, obviamente, que tanto seria necessário deslegitimar todo o direito, especialmente o direito penal, relegando-o à categoria de ‘superestrutura ideológica’." [31]

Com o inevitável desaparecimento de Marx, começam a surgir os denominados "marxismos", com as mais diversas linhas de pensamentos deslegitimantes e relegitimantes, relacionadas com o sistema penal. "A mais usual das versões relegitimantes na variável positivista e idealista, aceita uma concepção ontológica do delito e etiológica da criminalidade atribuída, exclusivamente, à pobreza, a miséria, etc. Tais concepções implicam a construção de um círculo fechado, pois se supõe que, suprimidas a pobreza e outras ‘causas’ semelhantes, o delito que subsistir derivará de livre decisão do autor, relegitimando-se, assim, um direito penal retributivo." [32]

3.2 PASUKANIS, QUINNEY e PAVARINI – por ZAFFARONI

A idéia do marxismo no ambiente político faz surgir as mais diferentes interpretações das idéias do pensador alemão do século XIX, emergindo daí as dificuldades de identificação. No entanto, procura-se aqui, o levantamento de teorias pós-marxistas de deslegitimação e relegitimação do Direito, mediante comentários do mestre penalista ZAFFARONI.

A visão inegável em primeiro plano – em face da revolução – é do surgimento de teorias deslegitimantes dos discursos jurídicos e, um dos pensadores mais importantes nesse campo é EUGENIJ PASUKANIS. Leciona ZAFFARONI que para PASUKANIS "o direito era uma mera forma jurídica, produto exclusivo da sociedade capitalista, gerado pelas relações de troca que lhe são próprias. Como o advento do socialismo não extinguiria automaticamente as relações de troca, que continuariam a existir como vestígio da sociedade burguesa, também não se extinguiria a ‘forma jurídica’, que desapareceria somente em uma etapa mais avançada, quando essas relações fossem superadas." [33]

A formulação da crítica do direito – que para alguns se trata de uma visão romântica de Marx – que PASUKANIS procura construir, com uma fé no desaparecimento do direito, quer significar o surgimento de uma sociedade não mais fundada na forma de valor-de-troca. Em contra-posição a tese de PASUKANIS, surge o pensamento relegitimante do direito de STUCKA. Vai dizer ZAFARONI que STUCKA "postulando uma relegitimação do direito mediante a necessidade de um revolucionário, ao qual não poderia renunciar o poder soviético sem privar o proletariado no poder de um inestimável e insubstituível instrumento de luta." [34]

A polêmica discussão envolvendo ambos os pensamentos revela uma relação de abandono por um, e apego por outro, de exercício do poder. Um lado pensando e acreditando numa convivência civil coletiva de evolução continua e, outro, casado com a crença de um necessário exercício de poder através de suas agências executivas. Informa ZAFFARONI que "não obstante, a polêmica conservava certo vôo teórico que se perdeu completamente com a intervenção direta do poder, através de VYSINSKIJ (o pontífice máximo do aparelho jurídico stalinista) que, em nível de deleção, qualificou a tese de PASUKANIS de ‘antimarxista’ (...)." [35]

A teoria de deslegitimação do sistema penal de RICHARD QUINNEY, parte de uma análise do delito direcionada ao sistema penal, propõe em primeiro lugar uma análise do fenômeno do delito, para só depois se debruçar sobre o significado e a função do sistema penal. Para QUINNEY o delito não significa um fenômeno decisivo no sistema penal, mas sim, uma espécie de desdobramento da história e uma forma de exteriorização da atuação da sociedade capitalista.

ZAFFARONI faz o seguinte estudo sobre a teoria de QUINNEY, "observa a existência de uma política econômica do direito penal com custos astronômicos que recaem sobre a população excedente (...) os capítulos dedicados por QUINNEY ao custo do delito, à política econômica do direito penal e ao enorme número de pessoas institucionalizadas nos Estados Unidos são altamente deslegitimantes, embora não apresentem inovações espetaculares no plano teórico e tampouco expliquem claramente como se operaria essa abolição do sistema penal." [36]

A teoria da deslegitimação do sistema penal, formulada por MASSIMO PAVARINI [37] propõe, de forma direta, a identificação de uma má consciência do bom criminólogo. Em outras palavras, quer significar, uma mensagem direta no sentido de confrontar-se com o sistema através de um estudo da criminologia apontando os caminhos para o fim do sistema, ou fingir que a situação é sustentável, legal e legítima, e, continuar vivendo.

Leciona ZAFFARON que, "PAVARINI não se refere a esta atitude apenas em relação à criminologia do conflito e da reação social não marxista, mas também em relação à própria criminologia marxista, afirmando que esta última não apenas supera as anteriores vinculações dos fenômenos que a primeira descreve como conflitos entre capital e trabalho, como também ‘permite tornar óbvio o ceticismo dos criminólogos radicais com um ato de fé numa cada vez mais improvável palingenesia social’. Mas quando os caminhos, nesta sociedade, se fecharem ao ‘bom criminólogo’, não lhe restará outro recurso senão continuar fazendo criminologia, ainda que com ‘má consciência’." [38]

Enfim, nas palavras do pensador portenho a lição de PAVARINI é no sentido de demonstrar que existe "uma disjuntiva: carregar sua má consciência ou enfrentar politicamente o poder, usando os instrumentos de uma criminologia alternativa, embora considere que não exista muito espaço para esta segunda atitude." [39]

3.3 O "minimalismo" penal de ALESSANDRO BARATTA [40]

Falar dos estudos de BARATTA é sempre motivo de enorme alegria e satisfação, pois, é tomar conhecimento daquelas coisas divinas que acontecem no universo jurídico. No entanto, no atual momento, recai sobre este universo jurídico uma tempestade de enorme tristeza pelo seu falecimento no dia 25.05.2002. BARATTA, italiano de nascimento, professor na Universidade de Saarland, a partir dos anos setenta tornou-se conhecido com os seus estudos críticos do Direito Penal e da Criminologia.

O pensador italiano, para sustentar a sua teoria de deslegitimação do sistema penal e da inegável crise do discurso jurídico-penal, em estudos de criminologia crítica, procura enfatiza as diversas correntes existentes: as teorias psicanalíticas, que negam o princípio da legitimidade; as teorias estrutural-funcionalistas, que negam o princípio do bem e do mal; as teorias das subculturas criminais, que negam o princípio da culpabilidade; as teorias da rotulação, que negam o princípio da prevenção alemã da rotulação, que nega o princípio da igualdade; e a ‘sociologia do conflito’, que nega os princípios do interesse social e do ‘direito natural’.

Os estudos de BARATTA são de um aprofundamento criminológico pouco alcançado por outros autores contemporâneos, nas palavras de ZAFFARONI a sua razão é inquestionável quando assinala "não ter sido a criminologia ‘radical’ (denominação normalmente reservada para a criminologia crítica marxista) a responsável pela crise do discurso jurídico-penal, mas que, na verdade, essa crise foi produzida pela própria criminologia ‘liberal’ (conceito reservado para a criminologia da reação social de vertente interacionista e fenomenológica)." [41]

A teoria de BARATTA procura dar sustentação à "adoção do ponto de vista das ‘classes subalternas’ como garantia de uma práxis teórica e política alternativa, afirmando que, enquanto as classes hegemônicas pretendem conter o desvio dentro de limites não muito perturbadores, as classes subalternas estão empenhadas numa luta radical contra os comportamentos socialmente negativos (por comportamentos negativos entendem-se a criminalidade econômica, a poluição, a criminalidade do poder, a máfia, etc.). Para tanto, BARATTA reclama uma ciência que não se limite à descrição da mera desigualdade jurídica no campo penal, mas que compreenda a função real do sistema penal na sociedade tardo-capitalista, como reprodutor das relações sociais de desigualdade, e que explicite que estas relações não se baseiam na distribuição desigual de bens e valores, mas nas próprias relações de produção." [42]

BARATTA, em estudos dirigidos para uma construção teórica dos princípios de direito penal mínimo para uma teoria dos direitos humanos como objetos e limites da dogmática penal, num primeiro momento, realiza a seguinte formulação: princípios intra-sistemáticos de mínima intervenção penal, que são divididos em a) princípios de limitação formal; b) princípios de limitação funcional; e, c) princípios da limitação pessoal ou da limitação da responsabilidade penal. Num segundo, constrói os chamados princípios extra-sistemáticos, divididos em: a) princípios extra-sistemáticos de descriminalização; e, b) princípios metodológicos da construção alternativa dos conflitos e problemas sociais.


4. Do Plano Político Criminal

4.1 Intervenção Penal Mínima e Direito Penal Mínimo

Uma alternativa sempre preconizada diante da constatação da deslegitimação do sistema penal tem sido a denominada intervenção penal mínima, também conhecida como direito penal mínimo. Partindo-se de uma obrigação constitucional de descriminalizar, evoluindo-se para uma utilização da pena privativa de liberdade cada vez menor. Colocando como proposta inegociável à utilização cada vez maior dos substitutivos – mais conhecido como penas alternativas – penais.

Uma intervenção penal mínima como plano ou programa de política criminal afasta-se totalmente dos apontamentos aqui apregoados, só podendo ser admitida como etapa de evolução do projeto abolicionista penal. A intervenção penal mínima, assim como o minimalismo penal, ou o garantismo fundamental ferrajoliano, só podem ser admitidos como programa transitório e de caráter programático.

4.2 O abolicionismo penal – por ZAFFARONI

Ao expressar a intenção de dissertar sobre o abolicionismo penal, tem-se que ter em mente que vai estar a adentrar numa seara que se apresenta em forma de múltipla escolha. O abolicionismo penal não é único, existem diferentes e diversas versões abolicionistas penais, sejam os movimentos pela a abolição da pena de prisão, ou da pena de morte, etc. No entanto, refere-se, aqui, ao abolicionismo do sistema de justiça criminal.

Porém, mesmo à luz do abolicionismo do sistema penal, verifica-se a existência das mais diversas – que será objeto de tópico especifico – variantes abolicionistas. Seja do chamado abolicionismo imediato ao abolicionismo mediato. Daí ZAFFARONI fornecer seu magistério acerca desse abolicionismo.

A lição do representante da escola portenha é que "na verdade, existem diferentes abolicionismos e, sem dúvida, é até possível falar-se de um abolicionismo anárquico, de longa data, resultado, por mais paradoxal que pareça, de uma formidável confiança jusnaturalista; o racionalismo, o positivismo, o cristianismo, etc., cederam lugar aos ‘jusnaturalismos’ que, levados ao extremo, acabam postulados a dispensabilidade do direito positivo na crença de que as leis ‘naturais’, liberadas do poder estatal, seriam suplementos para regular e resolver as relações e conflitos sociais. Assim, BALDWIN deu lugar a um anarquismo liberal, KROPOTKIN a um anarquismo positivista, TOSTOI a uma versão cristã, etc." No entanto, ZAFFARONI utiliza-se dos escritos acima para chegar ao abolicionismo em estudo, diz ele "o abolicionismo aqui referido não é este e, sim, o abolicionismo radical do sistema penal, ou seja, sua radical substituição por outras instâncias de solução dos conflitos, que surge nas duas últimas décadas como resultado da crítica sociológica ao sistema penal." [43]

Para ZAFFARONI, "o abolicionismo atual constitui um movimento que, nos últimos anos, produziu uma literatura considerável sobretudo entre os autores do norte da Europa – principalmente escandinavos e holandeses –, seus mais notórios representantes. Uma das características mais comuns entre seus líderes é a de haverem levado adiante movimentos ou organismos com participação de técnicos, presos, liberados, familiares e simpatizantes, isto é, pessoas com alguma experiência prática no campo da marginalização penalizada." E, conclui "o abolicionismo representa a mais original e radical proposta político-criminal dos últimos anos, a ponto de ter seu mérito reconhecido até mesmo por seus mais severos críticos." [44]

4.3 O movimento e as variantes do abolicionismo penal

No movimento abolicionista penal não existe uma uniformidade na utilização dos métodos, ou das concepções filosóficas, ou ainda de outros instrumentos empregados para o alcance dos objetivos. Ou do objetivo fim que é a abolição do sistema penal. O que existe na prática é uma reunião de pensamentos filosóficos utilizados em particular por cada pensador, objetivando a mesma finalidade dentro de suas peculiaridades.

4.3.1 O abolicionismo de LOUK HULSMAN [45]

A concepção abolicionista de HULSMAN pode ser conceituada como fenomenológica. Pauta seu pensamento abolicionista no entendimento de que o sistema penal caracteriza-se como um problema em si mesmo, trata-se de um sistema de enorme inutilidade e incapacidade de resolução dos problemas para os quais se propõe solucionar. Ou seja, uma ineficácia total para resolver os conflitos existentes na convivência civil.

Diante de tal constatação, sustenta a abolição total do sistema penal, enumerando motivos fundamentais que ensejariam a abolição do sistema, motivos estes a saber: por tratar-se de um sistema que causa sofrimentos desnecessários, e mais ainda, numa distribuição socialmente injusta; acarreta diversos efeitos negativos sobre as pessoas recrutadas; e, apresenta uma ausência total de controle por parte de seu gestor.

HULSMAN sustenta uma abolição do sistema penal imediata. Sua proposta é afastar o Estado de todo e qualquer conflito, apontando a existência de instâncias intermediárias competentes para as resoluções dos conflitos entre as partes; propõe uma supressão das terminologias usadas no ambiente criminal, de forma a realizar uma eliminação dos termos crime e criminalidade, assim como do seu significado. No mérito, sua intenção não é a eliminação do crime – mesmo porque essa é uma missão impossível – mas sim, a sua reestruturação em forma de problemas sociais. A intenção última é a resolução dos conflitos buscada pelas partes num ambiente diferente do que vige até os dias atuais.

4.3.2 O abolicionismo de THOMAS MATHIESEN [46]

A concepção abolicionista de MATHIESEN é fundada no simples estudo esquemático do marxismo. Sem dúvida é o principal nome do abolicionismo penal, utiliza-se (por outros termos) dos argumentos usados pelo poder estatal para pregar a sua teoria de eliminação do sistema penal. Numa concepção marxista procura vincular o sistema penal à organização do sistema capitalista, é nítida a sua idéia de eliminação não apenas do sistema penal, mas também de todo e qualquer processo de repressão existente na sociedade.

MATHIESEN sustenta que não existe teoria, por mais perfeita que possa parecer, acabada. Sua principal argumentação é de um processo teórico sempre inacabado, o movimento abolicionista penal é uma teoria inacabada e em constante evolução, precisando, fundamentalmente, de vivência prática. E, que mesmo assim, sempre estará inacabada. O que quer significar, a sua concepção do abolicionismo penal não imóvel, estática, ou mesmo neutra.

A teoria abolicionista de MATHIESEN sustenta que o Estado é possuidor de uma capacidade extraordinária de sedução, detentor de uma capacidade de transmutação inigualável, exerce sua tática de sedução criando pólos ou posições de aceitação ou recusa, seria o estabelecimento do dentro e do fora, de maneira a controlar e manipular suas passagens de acordo com a sua política de dominação e controle.

Diante da sua teoria abolicionista fundada no marxismo, MATHIESEN cria elementos e condições que vão garantir o desenvolvimento do sistema proposto, que estão representados no seguinte: uma permanente situação de oposição e competição com o poder dominante;

4.3.3 O abolicionismo de NILS CHRISTIE [47]

Pode-se afirmar que a concepção abolicionista de CHRISTIE é fenomenológico-historicista. No entanto, ficando patente sua escolha pela história para construção e fundamentação do seu abolicionismo penal. Enxerga na verticalização do poder uma maneira destrutiva das relações coletivas entre os entes do ambiente social. Afirma não haver apenas perigos com essa verticalização corporativa, mas também danos, estes se apresentando de difícil reparação.

CHRISTIE vai fazer uma crítica veemente aos estudos de DURKHEIN [48] afirmando que sua produção doutrinária é impregnada de preconceito, chegando até mesmo apontar DURKHEIN como um homem branco que só enxerga a igualdade entre os brancos. Como se a humanidade fosse só de homens brancos civilizados. Por outro lado, questiona a afirmação de DURKHEIN de que os processos de modernização sofridos pela sociedade provocam uma inevitável progressão.

4.3.4 O abolicionismo de MICHEL FOUCAULT [49]

Há na doutrina um argumento unânime de que FOUCAULT não era um abolicionista, nem tão pouco seus estudos dão a entender uma via abolicionista. É verdade que em comparação com os autores aqui estudados não poderia ser considerado um abolicionista, mas, talvez nem mesmo FOUCAULT soubesse que era um abolicionista.

Mas, trata-se de um abolicionista de concepção estruturalista.

O abolicionismo penal foucaultiano é pautado numa consideração do sujeito cognoscente como um produto do poder. É bem verdade que não admitia a idéia de um sistema de poder, mas sim, uma reunião de micro-poderes. No entanto, sua idéia do sujeito cognoscente provoca uma relatividade secundária no estudo da antropologia.

Numa mensagem direta a doutrina abolicionista, FOUCAULT "por um lado, assinala, acertadamente, a forma pela qual o poder expropriou os conflitos no momento da formação dos estados nacionais e, por outro, nega o modelo de uma parte sobreposta ao litigante, como instância superior decisória, o que se evidencia em sua discussão com os maoístas, ao criticar o conceito de ‘justiça penal’." [50]

Para ZAFFARONI "embora FOUCAULT [51] não ofereça considerações táticas para avançar rumo ao abolicionismo, permite entrevê-las quando aconselha a ‘técnica do judoca’, ou seja, quando se refere à debilidade que sofre o poder ao utilizar-se de violências, que o deixa apoiado em um só pé. Deve ser observado que a utilização da força do adversário, em substituição ao emprego da própria violência, é um postulado básico de qualquer tese da ‘não-violência’." [52]

4.4 As dúvidas e as propostas abolicionistas

Sendo o abolicionismo penal uma idéia original e, ao mesmo tempo, a proposta mais radical de eliminação do sistema penal, é natural que sofresse as mais incisivas críticas, e estas começaram com FERRAJOLI e PAVARINI. O primeiro, levantando a possibilidade de perigo constante por via policial de um controle físico de conduta destruidor dos espaços sociais de liberdade. O segundo, questionando a capacidade do abolicionismo em ter resposta para as atuações terroristas.

No entanto tais objeções foram maximizadas por ZAFFARONI numa perspectiva de inevitabilidade. "As duas objeções podem ser categorizadas mais amplamente: o avanço tecnológico, ao criar meios físicos muito mais sofisticados que não deixam nenhum espaço de controle de conduta que possa ser invadido, põe, também, em mãos de grupos cada vez mais reduzidos de pessoas e, até, em mãos de indivíduos isolados, instrumentos com formidável poder destrutivo, ampliando a capacidade desses grupos e pessoas para destruir massivamente os bens jurídicos." [53]

Torna-se inevitável a ocorrências das possibilidades levantadas por FERRAJOLI e PAVARINI, no entanto, o mesmo avanço tecnológico (seja a energia nuclear, a engenharia genética, os incrementos químicos, as manipulações nos meios de comunicação, etc.) pode caracterizar-se instrumento de destruição na forma culposa ou dolosa, vindo a sofrer uma intervenção ou controle social que não represente a forma de controle policial ou judicial existente no sistema penal, e que possa ser tão nocivo ou até mesmo pior do que o controle policial ou judicial tradicional.

ZAFFARONI tem proposto o desenvolvimento de um direito de controle de atividade preventiva policial com estrita vigilância judicial, que poderia ser exercido e controlado por órgãos judiciais (não tradicionais) nacionais e até mesmo num convenio com órgãos internacionais, de forma a prevenir e limitar a ingerência preventiva em cada caso. O que é perfeitamente percebido que tal modelo não tem nada em comum com o modelo tradicional.

Tal perspectiva pode ser entendida como um complexo matemático de distante relacionamento com o modelo penal de decisão de conflitos, no entanto, no decorrer do tempo tornar-se-ia necessário a criação de um órgão com funções totalmente diferentes das exercidas pelos atuais sistemas penais. É de ser enfatizado que com a criação de tal órgão (sem nome), este não pode receber a "pecha" por ter sua funcionalidade por órgãos e instrumentos nacionais ou internacionais.

Faz-se necessário lembrar que o atual sistema penal não tem resolvido (sem falar da constatação de insucesso total para o futuro) os problemas tradicionais do sistema de justiça criminal; que o direito penal mínimo ou a intervenção penal mínima, e até mesmo o garantismo fundamental penal, não tem apresentado resultado que lance à humanidade uma perspectiva de segurança jurídica mínima.

O abolicionismo penal terá seu funcionamento com base na concepção do marxismo elaborada por MATHIESEM, trata-se de um sistema inacabado que requer uma constante alimentação social. A realização do abolicionismo penal passa por um processo de evolução não apenas humana, mas, fundamentalmente, de evolução entre as nações. O grande problema é saber até existirá o Estado nação.


5. O clamor por uma resposta marginal – uma teoria zaffaroniana

5.1 Um imperativo jus-humanista

A obra de ZAFFARONI [54]Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal – é um marco na luta contra a ofensa aos direitos humanos, praticada pelos sistemas penais em toda à América Latina. Ao lado do pensador Uruguaio EDUARDO GALEANO figura como um dos mais atuantes defensores da dignidade humana. Poder-se-ia – neste trabalho – até ter escrito sobre o abolicionismo penal de ZAFFARONI, numa concepção histórico-humanista.

A missão do pensador portenho nas ciências penais tem sido, ao longo de sua história, a denúncia da ameaça de um genocídio praticado pelo sistema penal em toda a América Latina. Entende que há uma necessidade de resposta diante dessa ameaça de genocídio praticado pelo tecnocolonialismo e de um outro que se encontra em andamento, procurando evitar o anunciado com a bandeira dos direito humanos, sustentando a deslegitimação do sistema, além de demonstrar a violação dos direitos humanos pelos sistemas penais periféricos, revela que tais violações são da essência e da estrutura de todos os sistemas penais. Chegando a fazer a seguinte afirmação: o exercício de poder dos sistemas penais é incompatível com a ideologia dos direitos humanos. [55]

A teoria zaffaroniana de uma resposta marginal, nasce da constatação de que os direitos humanos, como previstos e consagrados pelos instrumentos internacionais, não podem ser entendidos como ideologia instrumental, mas devem ser reconhecidos como uma ideologia programática para toda a humanidade. Enxerga uma enorme dificuldade em materializar o brocardo: todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Lecionando que a previsão do artigo primeiro da Declaração Universal constitui numa façanha moral.

Denunciar a existência de uma insensatez histórica e de uma expropriação do direito da vítima praticada pelos sistemas penais. Diz que tal insensatez histórica somente pode ser "comparável com a insensatez que pretende a futura existência de um sistema penal que, com a estrutura de qualquer um dos atuais, se inspiraria no princípio da igualdade, quando sabemos que a operatividade seletiva é da essência de qualquer sistema penal." [56]

ZAFFARONI numa investigação histórica, chega a conclusão de que a configuração atua do sistema penal é oriunda da revolução mercantil e da formação dos estados nacionais, que gera o desaparecimento dos instrumentos e mecanismos de solução entre partes conflitantes, o que tem por conseqüência uma expropriação dos direitos da vítima. O que acontece é que o soberano assume a posição de única vítima, fazendo com que o sistema penal converta-se num exercício de poder verticalizante e centralizador.

Num primeiro momento, constata um contraste fundamental entre o sistema penal e a formulação dos direitos humanos, já a configuração dos primeiros provém do século XII com uma reafirmação no século XIX, ao passo que o segundo provém de uma tentativa de limitação deste poder no século XVII. Tal demonstração reafirma a contradição existente entre a ideologia dos direitos humanos e a reafirmação do sistema penal.

Num segundo, leciona que o princípio segundo o qual todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos é próprio dos denominados numes morais, do que se costumou chamar de saber milenário, que tem seu significado nos momentos de mais alta moralidade das culturas arrasadas pelo poder planetário das civilizações mercantil e industrial, assentadas em sua superioridade tecnológica.

Proclama a necessidade e urgência de uma resposta marginal assentada na deslegitimação do sistema penal, que se apresenta na perspectiva de uma programação transformadora que os direitos humanos requerem, principalmente, numa região marginal periférica, do mapa de poder planetário, onde é de fácil constatação a interrupção abrupta do progresso dos direitos humanos, em que o exercício do poder do sistema penal representa o elemento principal do extermínio propugnado.

5.2 Um imperativo ético

ZAFFARONI fala de uma resposta marginal como imperativo ético, afirmando que, aqueles que atuam em uma agência do sistema penal – na região marginal periférica – em especial nas agências de produção de ideologia (entenda-se universidades) quando da reprodução do discurso de justificação do sistema penal formulado por estas agências, tem a missão de enfrentar a questão da deslegitimação do sistema penal.

E, tal enfrentamento tem que se dar no campo de uma urgência de caráter ético, é uma imposição ou imperativo de consciência, seja em razão da violência praticada pelos sistemas penais, seja pela sua atuação no contexto social.

Menciona sobre a crítica de que esse imperativo não teria uma fundamentação objetiva, tratando-se apenas de uma questão de valorização subjetiva. A essa crítica ZAFFARONI responde que a fundamentação existe, e não é nada mais do que o milagre, com o uso da palavra no seu sentido o mais original e etimológico possível. Afirma que na região marginal periférica (especificamente na América Latina) o desempenho de tal função é uma circunstância que deve ser entendida como milagrosa. Pois, trata-se, efetivamente, de uma formidável constelação de casualidades, tão numerosas, que constitui um milagre extremamente privilegiante.

Diz ZAFFARONI que "ser juiz ou catedrático na América Latina significa haver ultrapassado, previamente,muitos riscos: haver nascido (isto é, não ter sido abortado), haver sido alimentado adequadamente, haver superado ou escapado das doenças infantis com seqüelas incapacitantes, haver conseguido alfabetizar-se e, ainda mais, haver ascendido aos níveis médio e superior do ensino, haver escapado das ameaças à vida adulta que os fenômenos naturais catastróficos representam, a violência política e não política, não haver ‘desaparecido’, etc., e outro sem-número de fatores cujo conjunto compõem o milagre que coloca tal individuo numa situação extremamente privilegiada." [57]

5.3 Uma indagação: o que é marginal? [58]

O primeiro significado da expressão marginal utilizada por ZAFFARONI é no sentido de demonstrar a geografia em que se encontra a América Latina – numa posição periférica do poder planetário – em relação aos países centrais. Portanto, a palavra marginal vai receber o significado de periférico. Um segundo significado será o da demonstração de uma necessidade de se adotar a perspectiva de (nossos) fatos de poder na relação dependência com o poder central. Porém, esclarecendo que não há a pretensão de identificar esses fatos com os processos originários do poder central, já que o emprego de algumas analogias – superficialmente consideradas – levam a um equivoco de identificação.

Um terceiro, seria a necessidade de assinalar que a expressão marginal quer significar a imensa maioria dos povos latino-americanos, que sofre uma marginalização por parte do poder. Mas, no entanto, continua como objeto principal da violência do sistema penal. E, um quarto e último significado, quer significar a indicação de uma complexa conceituação do universo urbano diretamente atingido pelos albores do tecnocolonialismo, a identidade de uma situação concretamente generalizada no plano cultural em razão de o colonialismo, o neocolinialismo e o tecnocolonialismo incidente determinarem a origem de uma configuração de todos os povos latino-americanos que sofreu a estigmatização da marginalização.


6. CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

Não há como negar a idéia original do abolicionismo penal como a proposta mais ousada e radical de abolição do sistema penal. O seu surgimento – isso há de ser reconhecido – acontece em face de uma confiança jusnaturalista, que procura ocupar o espaço do racionalismo, do positivismo e do cristianismo. No entanto, suas principais características não deixam esconder sua ligação umbilical com a ciência do marxismo.

O abolicionismo penal como ciência jusnaturalista de intenção declarada de dispensabilidade e sepultamento do direito positivo, depositando todas as suas crenças nas leis naturais, com uma libertação definitiva do poder estatal, procura efetivar todos os seus propósitos em tais bases como forma de suplementos para uma regulação e resolução dos conflitos sociais.

No entanto, o movimento abolicionista não deixa de reconhecer as mais diversas concepções metodológicas e de pressupostos filosóficos de seus representantes, seja na concepção marxista de METHIESEN, seja na fenomenológica de HULSMAN, seja na estruturalista de FOUCAULT, seja na fenomenológico-historicista de CHRISTIE. O que na verdade representa a riqueza do movimento.

O movimento abolicionista do sistema penal, a partir do início da segunda metade do século XX, passou a fornecer uma contribuição literário-científica para as ciências penais de inestimável valor. Porém, os mais diversos movimentos existentes no campo penal se negam a estudar ou aprofundar as proposituras apresentadas pelo abolicionismo.

O abolicionismo penal propõe a realização de uma política criminal que sempre foi proclamada pelo sistema penal, mas nunca realizada de fato. O abolicionismo negando-se ou resistindo a admitir as influências de movimentos penais que procuram estabelecer uma legitimidade parcial do sistema penal, faz com que se torne inegável o seu caráter autônomo.

A admissão declarada pelo abolicionismo penal – seja o movimento da intervenção penal mínima ou direito penal mínimo, seja o minimalismo penal, ou o garantismo fundamental ferrajoliano – é no campo das etapas de evolução. Todos esses movimentos caracterizando um processo de evolução com a finalidade determinada que é: a abolição do sistema penal. E, enfatizando que tal admissão não quer significar um atestado de legitimidade – mesmo que seja parcial – do sistema penal.

A negação declarada pelo abolicionismo à intervenção penal mínima ou direito penal mínimo surge em virtude da veia de legitimidade parcial que tal movimento procura estabelecer para o sistema penal. Quanto ao garantismo fundamental ferrajoliano – que tem sua raiz no iluminismo – por fazer uma análise do fenômeno crime pautada na exclusão das ações do individuo.

As críticas recebidas, desde a atribuição de um movimento romântico, passando por uma atuação policial – diante da ausência do órgão judicial – perniciosa para os espaços sociais, e chegando a afirmação de haver uma ausência de mecanismos para responder às atuações terroristas, só podem ser respondidas da seguinte maneira: o romantismo do abolicionismo penal vem da sua origem utópica, assim como a própria humanidade; a argumentação de ausência de um órgão judicial não corresponde, pois se propõe a criação de órgãos com competência de atuação na proteção social e de caráter nacional e internacional; e, a afirmação de incapacidade para o combate as atuações terroristas é respondida com uma outra indagação, que é, o sistema penal tem sido capaz em tal combate?

A questão é que o garantismo fundamental ferrajoliano e a intervenção penal mínima foram sepultados em 11 de setembro de 2001.

O abolicionismo penal é uma teoria utópica diferenciada, pois não declara a crença de que os conflitos sociais irão desaparecer com a abolição do sistema penal, pelo contrário, reconhecer a manutenção de tais conflitos. No entanto, postula pela abolição do sistema penal por entender – e demonstrar – que este serve apenas como instrumento de falsa resolução dos conflitos sociais.

O movimento abolicionista, por ser uma teoria utópica, acredita fielmente que a humanidade só continua a existir, ainda, porque em um ou outro momento de sua caminhada realiza uma utopia. Uma das primeiras utopias realizada pela humanidade foi sua saída das cavernas e uma das últimas foi a extirpação da figura do príncipe ou soberano. A próxima utopia a ser realiza será a eliminação da lei como instrumento de regulação social e a abolição do sistema penal.

A premissa marxista da luta de classe – que na análise de alguns pensadores não mais subsiste face a nova realidade de poder planetário hegemônico e legitimante – deve e está sendo travada na esfera do sistema penal. O triunfo da sua deslegitimidade com a sua conseqüente abolição significará a vitória da ideologia dos direitos humanos.

O abolicionismo penal – de alguma forma – acredita na lição de FRANZ VON LISZT, de que a melhor política criminal ainda é uma boa política social.


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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8.Notas

1. FOLHA DE SÃO PAULO, 5º Caderno – mais, São Paulo, domingo, 1º de fevereiro de 1998.

2. LINS E SILVA, Evandro. Uma Visão Global da História da Pena. Disponível na Internet: http://www.jus.com.br, 19.11.2001.

3. "É, acima de tudo, uma mentalidade, uma atitude cultural e espiritual, que não é somente de filósofos, mas de grande parte da sociedade da época, de modo particular da burguesia, dos intelectuais, da sociedade mundana e até de alguns reinantes." (BINETTI, Saffo Testoni. In: BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola, e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 5ª edição. Brasília : Edunb, 1993, Vol. 1, p. 608).

4. RIBEIRO LOPES, Maurício Antonio. Teoria Constitucional do Direito Penal. São Paulo : RT, 2000, p. 182.

5. RIBEIRO LOPES, Op. cit., p 192.

6. JAKOBS, Gunther. Derecho penal – Parte general: fundamentos y teoria de la imputación. Madrid : Marcial Pons, 1997, p. 44.

7. RIBEIRO LOPES, Mauricio Antonio. Princípios Políticos do Direito Penal. São Paulo : RT, 1999, p. 36.

8. ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Sistemas penales y derechos humanos en América Latina. Buenos Aires : Depalma, 1984, p. 7.

9. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Coimbra : Armênio Amado, 1984.

10. JESCHECK, Hans. Tratado de derecho penal. Barcelona : Bosch, 1981.

11. NUVOLONE, Pietro. O sistema do direito penal. Tradução por ADA PELLEGRINI CRINOVER. Notas por RENÉ ARIEL DOTTI. São Paulo : RT, 1981. Assim, como ROSSI, Pelegrino. Lineamenti di diritto penale e costituzionale, Palermo, 1953.

12. AFTALIÓN, Enrique. Tratado de derecho penal especial. Buenos Aires : Ediar, 1963.

13. SANTORO, Arturo. Manuale di diritto penale. Torino : UTET, 1938.

14. MANTOVANI, Ferrando. Diritto penale – Parte generale. Padova : Cedam, 1980.

15. FLORA, Giovanni. Il rilievo dei principi costituzionali nei manuali di diritto penale. In: Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale. Padova : Cedam, 1994, p. 1187.

16. Cf. Em busca das penas perdidas – a perda de legitimidade do sistema penal. Tradução por VÂNIA ROMANO PEDROSA e AMIR LOPES DA CONCEIÇÃO. Rio de Janeiro : Revan, 1991.

17. ZAFFARONI, Op. cit., p. 16

18. ZAFFARONI, Op. cit., p. 17. "A consagração positiva de uma ontologia regional do homem – que bem pode chamar-se antropologia jurídica jus-humanista – impõe a consideração do homem como pessoa."

19. Ibidem.

20. Idem, p. 18

21. Idem, p. 21

22. Ibidem.

23. Idem, p. 22

24. Idem, p. 26

25. Ibidem.

26. Idem, p. 27

27. Idem, p. 28

28. MUSSE, Ricardo. Manifesto Comunista – esboço de história universal. São Paulo : Folha de São Paulo, 5º Caderno – mais, 1º.02.1998, p. 7.

29. Cf. Manifesto Comunista – Um apelo à libertação. São Paulo : Folha de São Paulo, 5º Caderno – mais, 1º.02.1998, p. 6.

30. Idem. Ibidem.

31. ZAFFARONI, Op. cit., p. 51

32. Idem. Ibidem.

33. Idem, p. 53

34. Idem, p. 54

35. Ibidem.

36. Idem, p. 58.

37. A análise feita por ZAFFARONI é da obra Introduzione a la criminologia. Florença, 1980. Vide também il sistema della giustizia penale tra riduzionismo e abolizionismo. In: Rivista di studi sociali, storici e giuridici sulla questione criminale, anno III, nº 3, set./dic., 1985, p. 525-553

38. Idem, p. 59

39. Ibidem.

40. A análise feita por ZAFFARONI é da obra Desarrolos recientes de la criminologia critica y el marxismo. Barcelona : PPU, 1982. Vide também Principi del diritto penale mínimo. Per una teoria dei diritto come oggetti della legge penale.. In: Rivista di studi sociali, storici e giuridici sulla questione criminale, anno III, nº 3, set./dic., 1985, p. 443-473.

41. Op. cit., p. 58-9

42. Ibidem.

43. Idem, p. 97

44. Idem, p. 98

45. Penas Perdidas – o sistema penal em questão. 2ª edição. Tradução por MARIA LÚCIA KARAM. Rio de Janeiro : LUAM, 1997.

46. Perché il carcere? Torino : Edizioni Gruppo Abele, 1996 (Italian translation of Prison on Trial, with a new postscript).

47. Abolire le pene? Il paradosso del sistema penale. Tradução Italiana. Con introduzione di MASSIMO PAVARINI. Torino : Edizioni Grupo Abele, 1985.

48. La división del trabajo social. Barcelona : PPU, 1985.

49. Vigiar e Punir – história da violência nas prisões. 23ª edição. Tradução por RAQUEL RAMALHETE. Petrópolis : Editora Vozes, 2000.

50. ZAFFARONI, Op. cit., p. 102

51. Microfisica del poder. Madrid, 1979.

52. ZAFFARONI, Op. Cit., p. 102

53. Idem, p. 109

54. A história do pensador argentino no Direito Penal, é uma história de luta pela defesa e proteção dos direitos humanos na América Latina. É um dos mais árduos defensores da civilização latino-americana.

55. Op. cit., p 147

56. Idem, p. 149

57. Idem, p. 154

58. Para sustentar sua teoria de resposta marginal, ZAFFARONI utiliza o termo marginal como forma de exemplificar os diversos significados da palavra no contexto de sua teoria.


Autor

  • Luciano Nascimento Silva

    Luciano Nascimento Silva

    professor universitário, mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), doutorando em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Coimbra (Portugal), bolsista de Graduação e Mestrado da FAPESP e de Doutorado da CAPES, pesquisador em Criminologia e Direito Criminal no Max Planck Institut für ausländisches und internationales Strafrecht – Freiburg in Breisgau (Alemanha)

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SILVA, Luciano Nascimento. Manifesto abolicionista penal. Ensaio acerca da perda de legitimidade do sistema de Justiça Criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3556. Acesso em: 3 maio 2024.