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Fragmentos de justiça nicomaqueia: como permanece vivo o pensamento aristotélico em decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Fragmentos de justiça nicomaqueia: como permanece vivo o pensamento aristotélico em decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

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A doutrina nicomaqueia de justiça, particular e corretiva, faz-se presente no discurso de fundamentação dos acórdãos prolatados pelo tribunal gaúcho.

Resumo: Realizou-se, nesta investigação, um levantamento de informações sobre a presença ou não nos acórdãos disponíveis, de argumentos referentes aos conceitos de justiça em Aristóteles no repositório eletrônico de jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, até dezembro de 2017. Constatou-se que a doutrina nicomaqueia de justiça, particular e corretiva, faz-se presente no discurso de fundamentação dos acórdãos prolatados pelo tribunal gaúcho. Nos casos analisados, destaca-se que foram visualizados problemas em termos de argumentação jurídica, na medida que muitas vezes são utilizados como argumentos de autoridade ou apenas de opinião, sem a exposição sobre o seu conteúdo e a devida contextualização na decisão. Também foi possível verificar, até mesmo em maior medida, que há a utilização de outros conceitos aristotélicos, como a sua doutrina política, merecedores de uma investigação mais aprofundada.

Palavras-chaves: Aristóteles - Justiça - Ética a Nicômaco - fundamentação das decisões


Introdução

Os ensinamentos de Aristóteles, um filósofo grego do século V a.C., fazem-se presentes no discurso de fundamentação das decisões judiciais, como se pode constatar inclusive em algumas dezenas de julgados do Supremo Tribunal Federal[1]. No mesmo sentido, a menção à tradição aristotélica de justiça[2].

Vive-se um dilema na pós-modernidade, da ausência de validade da crença de que é possível chegar a plena autoconsciência no que diz respeito à realidade social (MORRISON, 2006, p. 15-16). Por isso, numa sociedade complexa, de desencantamento de mundo, de um ceticismo onde não existem padrões morais mínimos que possam ser compartilhados[3], é salutar o reviver de narrativas que buscam dar uma explicação transcendental de justiça, o que acaba servindo como um alento diante de posturas metaéticas não cognitivistas.

Nesse contexto, é possível avistar uma retomada do pensamento aristotélico, especialmente quanto à sua concepção de justiça perfilada na obra “Ética à Nicômaco”. Embora a constatação do uso de tais argumentos revele que em tais há alguma importância, não implica, necessariamente, naquilo que é preconizado por VILLEY (2003, p. 53), de um “retorno às fontes” (e, nem se advoga por uma solução simplista neste sentido, embora a ampliação de horizontes e a preocupação ética[4] sempre seja muito bem-vinda).

Em nossa pesquisa, constata-se que a doutrina de justiça em Aristóteles é trazida como elemento a apoiar a conclusão do raciocínio decisório. Mas, sente-se a ausência de um maior desenvolvimento.

Colocadas essas bases, o presente estudo pretende descrever o conceito de justiça em Aristóteles, com o foco na justiça particular e suas espécies: justiça distributiva e corretiva, e, como é feito o manejo desses conceitos em acórdãos nos quais houve a sua citação.

O recorte da pesquisa se deu no repositório eletrônico de jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) até dezembro de 2017. Para ter-se uma breve ideia, utilizando-se como indexador as seguintes palavras-chaves “Aristóteles” chegou-se a 1490 resultados, “justiça comutativa” a 3230 resultados, “justiça corretiva” a 377 resultados, “justiça distributiva” a 4890 resultados e “Ética a Nicômaco”, 11 resultados.

No escopo limitado da presente investigação, tentar-se-á uma análise que se leve em conta a pertinência dos argumentos, a qualidade e a correspondência com o que Aristóteles pensava. Trata-se de examinar a imbricação de argumentos de índole filosófica com o direito aplicado ao caso concreto.

Pode-se adiantar que, na grande maioria dos casos, a invocação das lições de Aristóteles serviu muito mais como um mero argumento de autoridade ou de caráter opinativo, do que contribuíram necessariamente para o raciocínio realizado como fundamentação da decisão judicial.

Ao final, será agregada uma breve conclusão.


1 A justiça em Aristóteles

Aristóteles é considerado o fundador da filosofia do direito. Nascido em Estagira, a sua concepção de justiça é fruto do amadurecimento das contribuições que lhe foram antecedentes, como a de Sócrates e de Platão e dos debates acadêmicos de sua época.

Os textos aristotélicos têm por base uma narrativa teleológica ou intencional da natureza humana (MORRISON, 2006, p. 49), onde todas as coisas tendem para um bem (ARISTÓTELES, 1984, p. 49) e, esse fim, que é almejado por si próprio, pois autossuficiente e absoluto é o sumo bem: a felicidade (eudaimonia).

O bem é uma potencialidade e a pessoa tem a capacidade de escolher.

Por sua vez, a boa conduta é aquela adequada entre fins e meios, resultado do exercício da prudência (phronesis), ou seja, de uma escolha racional. A ação ética é aquela governada pela vontade racional.

Assim, um bom homem é aquele que age retamente, segundo a virtude, a qual é desenvolvida pelo hábito.

Relembrem-se as palavras do próprio Aristóteles:

“A virtude é, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria prática. E é um meio-termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta; pois que, enquanto os vícios ou vão muito longe ou ficam aquém do que é conveniente no tocante às ações e paixões, a virtude encontra e escolhe o meio-termo. E assim, no que toca à sua substância e à definição que lhe estabelece a essência, a virtude é uma mediania; com referência ao sumo bem e ao mais justo, é, porém, um extremo.” (ARISTÓTELES, 1984, p. 73)

A conduta virtuosa é aquela que consiste numa deliberação fundada na mediania entre dois extremos: o excesso e a falta, como por exemplo, entre os sentimentos de medo e de confiança, o meio-termo é a coragem; entre a prodigalidade e a avareza, é a liberalidade. Embora nem todas as condutas admitam um meio-termo, pois por si próprias já implicam numa maldade, como o despeito, a inveja etc.

O homem, dispondo de suas potencialidades, deve colocar a razão para guia-lo, num agir virtuoso, tanto a nível teórico, como prático.

O viver feliz, que é o fim último, é aquele que se desenvolve na pólis, tendo a legislação como “instrumento de que se utiliza a cidade racionalmente organizada para a habituação de seus membros na realização da justiça, virtude social por excelência.” (BITTAR, 2001, p. 74).

No livro V, da obra “Ética a Nicômaco”, após ter discorrido sobre outras virtudes morais, como a coragem, a moderação e a sabedoria, Aristóteles lança olhares sobre a virtude da justiça, a qual pode ser entendida em dois sentidos: geral e particular, sendo esta espécie daquela.

A justiça geral ou legal corresponde a um sentido amplo de justiça; é a virtude do homem justo (dikaios), que pratica atos, numa sociedade política, com fim de produzir e preservar a felicidade e os elementos que a compõem.

A justiça é considerada uma virtude completa e muitas vezes considerada a maior das virtudes (ARISTÓTELES, 1984, p. 122), uma virtude completa ou inteira, onde o justo se confunde com a noção de ser moral (ZINGANO, 2017, p. 19).

“Segundo a análise de Aristóteles, justiça exprime em geral a moralidade, a conformidade da conduta de um indivíduo com a lei moral. Assim, Aristóteles chama esta justiça de ‘justiça legal’. Em outras palavras, se a lei moral comanda todas as virtudes, a justiça é a ‘soma de todas elas’, ou a virtude universal’.” (VILLEY, 2003, p. 59)

Nessa forma de justiça há um caractere relacional, pois visa o “bem de um outro”.

Existe, portanto, uma noção de bilateralidade ou de alteridade (REALE, 2002, p. 345). Por isso, que em AQUINO encontramos de que consiste numa virtude perfeita, “direcionada para o outro em conformidade com o prescrito em lei.” (2012, p. 26).

Enquanto que a justiça geral “diz respeito a todos os objetos com que se relaciona o homem bom”, a justiça particular também consiste numa relação para com o próximo, mas que “diz respeito à honra, ao dinheiro ou à segurança — ou àquilo que inclui todas essas coisas, se houvesse um nome para designá-lo — e seu motivo é o prazer proporcionado pelo lucro” (ARISTÓTELES, 1984, p. 123).

Aclara essa proposição AQUINO (2012, p. 32), conforme segue: “Ora, a Justiça legal ordena-se para um elemento que é o bem comum, enquanto a Justiça particular ordena-se para um bem pertencente a uma pessoa particular.”

A justiça particular é “aquela relação que promove a igualdade entre pelo menos dois agentes quanto aos bens exteriores.”, enquanto que a justiça geral “relata todo tipo de atividade em relação a outrem.” (ZINGANO, 2017, p. 35). Por isso, dizer que o problema da justiça particular reside numa questão de igualdade (REALE, 2002, p. 642) e da justiça geral (ou integral) no bem comum.

A justiça particular divide-se em duas espécies, distributiva e corretiva.

Quanto em uma, como em outra, pretende-se por meio de uma análise matemática, definir o que é justo, embora não se esgote nesse tratamento. ZINGANO afirma que ela continua sendo uma virtude moral e está em última instância enraizada na natureza cambiante das ações humanas, dependendo de uma análise particularista, como ocorre com a aplicação da equidade, em que depõe a lei ao seu domínio circunstancial (2017, p. 22-23).

A justiça distributiva é a que se manifesta na distribuição de bens externos, como honras, bens, dinheiro ou outras coisas. Pressupõe-se uma relação de subordinação entre as partes, entre aquele que distribui e aquele que recebe, numa relação público – privada.

 “Se não são iguais, não receberão coisas iguais; mas isso é origem de disputas e queixas: ou quando iguais tem e recebem partes desiguais, ou quando desiguais recebem partes iguais. Isso, aliás, é evidente pelo fato de que as distribuições devem ser feitas ‘de acordo com o mérito’; pois todos admitem que a distribuição justa deve recordar com o mérito num sentido qualquer, se bem que nem todos especifiquem a mesma espécie de mérito, mas os democratas o identificam com a condição de homem livre, os partidários da oligarquia com a riqueza (ou com a nobreza de nascimento), e os partidários da aristocracia com a excelência.” (ARISTÓTELES, 1984, p. 125).

Aqui há noção de desigualdade no receber algo, na distribuição, que se deve- ao mérito de cada um: “O meio-termo da Justiça distributiva deve ser proporcionalmente concebido: dar a cada um a correta medida do que lhe convém!” (AQUINO, 2012, p. 43). O justo é uma proporcional geométrica, onde “ocorre bem que o todo precisamente como a parte está para a parte [...] não é contínua, pois não há um número único que representa para quem e o quê.” (ZINGANO, 2017, p. 101).

As pessoas, na distribuição desses bens, geralmente não recebem partes iguais, mas recebem tendo por base uma razão de mérito. Sugere-se que o mérito está relacionado à concepção geral do objetivo da sociedade ou da cidade-Estado grega (MORRISON, 2006, p. 57).

Quanto à justiça corretiva (díkaion diorthótikon) ou comutativa, como foi chamada posteriormente, é aquela que surge das transações voluntárias, como involuntárias, entre indivíduos. Constitui-se na retidão nas transações comuns (AQUINO, 2012, p. 38).

Aplica-se a justiça corretiva na hipótese em que há uma situação de coordenação, isto é, entre iguais e, não de subordinação, como ocorre com o justo distributivo (BITTAR, 2001, p. 98).

Com efeito, a justiça que distribui posses comuns está sempre de acordo com a proporção mencionada acima (e mesmo quando se trata de distribuir os fundos comuns de uma sociedade, ela se fará segundo a mesma razão que guardam entre si os fundos empregados no negócio pelos diferentes sócios); e a injustiça contrária a esta espécie de injustiça é a que viola a proporção. Mas a justiça nas transações entre um homem e outro é efetivamente uma espécie de igualdade, e a injustiça uma espécie de desigualdade; não de acordo com essa espécie de proporção, todavia, mas de acordo com uma proporção aritmética. (ARISTÓTELES, 1984, p. 126).

Essa proporção aritmética é a que permite “a ponderação entre a perda e o ganho, garantindo objetivamente o restabelecimento das partes à posição inicial em que se encontravam; o justo corretivo se exerce por meio do retorno das partes ao status quo ante.” (BITTAR, 2001, p. 99). Logo, a extensão da reparação deve corresponder ao dano sofrido, sem levar em conta a posição social das pessoas envolvidas (ZINGANO, 2017, p. 37).

Assim, quando há, numa relação humana, uma situação em que para uma das partes cometa-se uma injustiça, conferindo uma maior vantagem do que a devida, compete ao juiz (dikastés) restabelecer a igualdade.

Ao estabelecer critérios de justiça a serem aplicados ao regime de trocas entre privados ou nas distribuições estatais, esses conceitos atravessaram o tempo, permanecendo presentes no discurso jurídico, político e econômico (pós) moderno.

Aristóteles ainda menciona outras formas de justiça, como o justo político e o doméstico, aquele que se refere a aplicação da justiça na pólis e, esta, dentro do matrimônio.

Cabe, ainda, uma última palavra sobre a equidade, que não se confunde com o justo, pois muitas vezes aquela exclui o justo legal (AQUINO, 2012, p. 130). A “equidade consiste na justiça enquanto ela é tomada não segundo as leis dadas, mas como uma correção ao justo expresso nas leis” (ZINGANO, 2017, p. 61).

O próprio Aristóteles a explica:

“O que faz surgir o problema é que o equitativo é justo, porém não o legalmente justo, e sim uma correção da justiça legal. A razão disto é que toda lei é universal, mas a respeito de certas coisas não é possível fazer uma afirmação universal que seja correta. Nos casos, pois, em que é necessário falar de modo universal, mas não é possível fazê-lo corretamente, a lei considera o caso mais usual, se bem que não ignore a possibilidade de erro. E nem por isso tal modo de proceder deixa de ser correto, pois o erro não está na lei, nem no legislador, mas na natureza da própria coisa, já que os assuntos práticos são dessa espécie por natureza.

[...]

Portanto, quando a lei se expressa universalmente e surge um caso que não é abrangido pela declaração universal, é justo, uma vez que o legislador falhou e errou por excesso de simplicidade, corrigir a omissão — era outras palavras, dizer o que o próprio legislador teria dito se estivesse presente, e que teria incluído na lei se tivesse conhecimento do caso.” (ARISTÓTELES, 1984, p. 136).

Em razão da abstração e da universalidade do preceito legal, surgem dificuldades na tutela da multiplicidade e singularidade dos casos que surgem na vida concreta. Aplicar a equidade “significa agir de modo a complementar o caso [...] está-se a agir como o faria o próprio legislador se estivesse presente.” (BITTAR, 2001, p. 140).

Conforme expressa OLIVEIRA (2016, p. 50-52), a “ideia de correção da lei” não significa a ruptura com a tradição política de que a justiça emerge da lei, mas de que a normatividade da lei se realiza na concretude do caso.

Tais conceitos da filosofia aristotélica, aqui muito suscintamente comentados, continuam a influenciar as decisões judiciais nos dias de hoje. Agora, num segundo momento, vamos verificar como esses conceitos têm aparecido nas decisões do TJRS, tecendo algumas reflexões sobre esta recepção.


2 Análise de decisões judiciais do TJRS

Realizada a pesquisa no repertório eletrônico de jurisprudência do Tribunal de Justiça gaúcho, verificou-se a existência de milhares de decisões que mencionavam algo relacionado a Aristóteles. A exiguidade do calendário para a realização da pesquisa não permitiu a análise de todas as decisões, mas mediante um recorte, foi possível extrair uma singela amostra.

Constata-se que na grande maioria dos acórdãos, a menção aos conceitos Aristotélicos é feita de passagem, sem maiores explicações ou contextualizações. É comum verificar a presença da repetição da mesma fundamentação, com a utilização de conceitos específicos, como a “justiça distributiva”, sem necessariamente incorrer na aplicação - em maior extensão - da própria filosofia aristotélica ou mesmo de sua refutação.

Isso gerou algumas situações incômodas, sobretudo porque ao utilizar o conceito aristotélico, esquecendo-se do pano de fundo filosófico, esbarra-se com a própria concepção de direito brasileiro, que tem em suas raízes o positivismo legalista (que remonta ao sistema jurídico de Pontes de Miranda) e hoje bebe num extremado subjetivismo, naquilo que é chamado de panprincipialismo (uma versão do realismo, que confere uma preponderância aos princípios jurídicos, num forte ativismo judicial).

Retomaremos essas questões. Passamos a analisar alguns casos, conforme seguem.

a) Em demanda que se discutiu a reparação por violação de direito autorais, por plágio em uma versão de uma música, a Quinta Câmara Cível[5] deu provimento a pedido de arbitramento de danos morais aviado em recurso de apelação, citando obra de Paulo de Tarso Vieira Sanseverino[6], a qual estabelece que o princípio da reparação integral e o modo de reparação constituem exigência da justiça comutativa:

PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL.

A reparação do dano injustamente sofrido causado constitui uma exigência de justiça comutativa, como já fora vislumbrado por Aristóteles na Ética a Nicômaco, devendo ser a mais completa possível, o que se chama modernamente, de princípio da reparação integral do dano. O seu exame será efetuado em duas grandes perspectivas, analisando-se, primeiramente, os modos de reparação do dano e seguindo-se com a sua configuração como princípio jurídico.

[...]

MODOS DE REPARAÇÃO

[...]

Com efeito constitui uma exigência natural de justiça comutativa restituir a vítima, o mais exatamente possível, ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito (status quo ante), conforme já observara Aristóteles na Ética a Nicômaco.

Portanto, a doutrina aristotélica do justo particular corretivo foi apresentada como elemento da responsabilidade civil, na especificação da extensão da reparação, de modo a recompor a perda sofrida. A transposição do conceito apresenta-se sem qualquer prejuízo para a sua compreensão e coerência com o retratado pelo estagirita.

***

b) Em recurso interposto de decisão que indeferiu antecipação de tutela[7], em ação anulatória de multa, a Vigésima Primeira Câmara não deu provimento ao Agravo de Instrumento. Num dos votos, reconheceu-se a proporcionalidade da medida de penalização derivada do artigo 87, IV, da Lei nº 8.666/93, a qual teve apoio argumentativo na ideia de justo como proporcional:

Na síntese perfeita do Estagirita, no Livro V da “Ética a Nicômaco”, “o justo é o proporcional, e o injusto é o que viola a proporção.”

Por isso, quando “um dos termos se torna grande demais e o outro muito pequeno, como efetivamente acontece na prática, pois o homem que age injustamente fica com uma parte muito grande daquilo que é bom, e o que é injustamente tratado fica com uma parte muito pequena.”

Já no “caso do mal, ocorre o inverso, pois o menor mal é considerado um bem em comparação com o mal maior, uma vez que o mal menor deve ser escolhido de preferência ao mal maior” (valho-me da tradução de Pietro Nassetti).

Este o princípio e sua aplicação na penalização. Havendo escolha, o bem, em suma, está no mal menor.

A doutrina do meio-termo aristotélico aparece, como argumento a justificar o que é o justo, porém ressente-se que a tese não tenha um maior desdobramento, sobretudo porque se trata de uma citação referente à justiça distributiva (referente a mediania na distribuição de distribuição de benefícios ou encargos) e de como este conceito enquadra-se no raciocínio da decisão.

***

c) Uma decisão interessante da Nova Câmara Cível[8], envolveu o direito à indenização pretendido por produtores de fumo pela interrupção do fornecimento de energia elétrica. A fumicultura possui peculiaridades, pois quando o processo de secagem é forçado, o desabastecimento de energia elétrica acarreta grande perdas. Mas, como a instalação de um gerador pelos fumicultores não teria um custo elevador, a Câmara decidiu pela repartição dos riscos entre o fornecedor e o consumidor (produtor rural). Para tanto, uma das análises se deu pelas óticas da justiça corretiva e da justiça distributiva, como segue:

6.    A questão em tela não pode ser analisada exclusivamente do ponto de vista individual (justiça corretiva), já que ela necessariamente tem implicações sociais (justiça distributiva), pois o repasse dos custos dos danos do fumicultor individual para a concessionária de energia elétrica, num primeiro momento, acaba repercutindo sobre toda a sociedade, já que no regime capitalista todo e qualquer custo ou prejuízo transforma-se em preço ou tarifa. Consequentemente, cedo ou tarde, o valor das indenizações redundará em aumento da tarifa a ser paga por toda a sociedade.

Quando se qualificou como “interessante” a decisão, porque ela conjuga as duas espécies de justiça particular, num construto que certamente não fora pensado por Aristóteles.

***

d) A concessão da gratuidade da justiça deve ser deferida a quem realmente dela necessitar, sendo uma maneira de realização da justiça distributiva, tendo o Centro de Estudos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, firmado Enunciado de nº 49, quanto ao critério da demonstração dessa necessidade.[9]

Como afirmado acima, na relação Estado – cidadão, o acesso à justiça gratuito é conferido aos necessitados, distribuindo-se esta benesse segundo uma determinada renda, no qual se presume a necessidade.

***

e) O pré-tarifamento da pensão alimentícia - em caso de desemprego - seria uma forma de promover maior “justiça distributiva”.[10] Tal argumento constou na justificativa do parecer do Ministério Público, incorporado ao corpo do acórdão.

Houve um equívoco, pois se trata de um caso de aplicação da justiça corretiva, na medida em que a relação se dá entre particulares. Além disso, novamente, o conceito de “justiça distributiva” é invocado, sem que se decline as razões para a sua compreensão.

***

f) Em decisão proferida pela Décima Segunda Câmara Cível[11], a regra processual referente a abandono de processo pela parte autoral foi interpretada segundo uma exigência de justiça, anulando a sentença de extinção do processo. Segue excerto do acórdão:

Juarez Freitas, em sua obra Grandes Linhas da Filosofia do Direito, 2ª edição, refere sobre justiça comutativa: “o direito de dar a cada um o seu direito”, enunciado por Ulpiano nas institutas (p. 24). Aristóteles introduziu “a noção de epieikeia ou eqüidade, que teria a função de corrigir a generalidade das leis quando excepcionalmente não contemplarem o caso individual nas suas minúcias” (p. 26)

Ao ver de Santo Agostinho “o que não é justo não é lei” (p. 30). “O Direito, por conseguinte, só pode ser admitido enquanto embricado na idéia de Justiça” (p. 30).

Santo Tomás de Aquino: justiça é “dar a cada um o que é seu, na conformidade com o bem-comum” e possui três aspectos: distributiva, comutativa e legal (p. 33)

Pois bem, as correntes instrumentalistas do processo atribuem ao processo a finalidade de realização do direito material (não apenas este, mas outros, como o político e o social), em que o mero formalismo recebe uma superação, por meio de uma interpretação criativa, onde a equidade, isto é, a correção da lei com vistas ao caso concreto, acaba tendo um amplo espaço para aplicação.

Indagar sobre a equidade, sobretudo a aristotélica, no sistema jurídico é realizar indagações mais complexas, que envolvem superabilidade de regras, fontes do direito etc. A doutrina Aristotélicas ou de outros filósofos não pode ser utilizada tão somente como argumento de autoridade.

***

g) No mais, a citação de Aristóteles nas decisões analisadas não se resume à justiça, mas abrange uma variedade de temas, como separação de poderes[12], vontade e tempo[13], interesse público[14] etc.

***

Depreende-se que a concepção de justiça aristotélica atua como um bom argumento moral, demonstrando-se que o positivismo adotado pelas cortes brasileiras muito longe está de ser meramente um exemplar da tradição metaética do construtivismo.

Veja-se que Aristóteles remonta a uma tradição metaética do realismo (FERREIRA NETO, 2015, p. 189) ou realismo tradicional (REALE, 2002, p. 117), no qual há a preeminência do objeto, isto é, se conhecem coisas. Os fatos são o ponto de partida, sobre os quais haverá um raciocínio ético.

“O projeto ético desenvolvido por ARISTÓTELES é, sabidamente, o melhor exemplo de um esquema teórico que visa a esclarecer os elementos essenciais da ação humana partindo de considerações que estariam fundadas em uma dimensão ontológica da realidade. Assim, para ARISTÓTELES, são centrais para a compreensão do que determina e direciona a ação humana os conceitos de fim (telos) e de bem (agathon) [...]” (FERREIRA NETO, 2015, p. 189)

Nas tradições metaéticas, há um pano de fundo acerca da separação entre direito e moral, em que há um problema de demarcação, seja de separação (positivismo), com uma independência radical; uma conexão forte, com uma submissão do direito à moral; e, uma conexão fraca, em que há uma espécie de direito natural mínimo.[15]

Por um lado, temos tradições não cognitivistas e cognitivistas, aquelas em que não há sentido de se falar em fatos morais ou verdades relevantes ao campo da ação humana e nestas, é possível reconhecer, pela racionalidade, de maneira objetiva, juízos de verdade referentes à ação humana. Aristóteles é um cognitivista e, como um defensor do direito natural isso acarreta implicações quando a sua doutrina é invocada na ordem prática, isto é, na dimensão da realidade humana em que são emitidas as decisões judiciais.

Por isso, quando afirmamos que se gera uma situação de constrangimento, é de que Aristóteles está numa tradição filosófica diversa da supostamente adotada no positivismo, isso sem contar algumas implicações filosóficas outras, como adotar (de Aristóteles) uma teoria da verdade como correspondência. Aqui paramos. Seguir adiante foge da proposta aqui delineada, por isso, passamos a analisar outro ponto, que envolve a teoria da decisão judicial.

Aristóteles é importante, mas a sua invocação deve ser sempre contextualizada. Isto não quer dizer que se advogada contra a filosofia aristotélica, pelo contrário, mostra que é necessário de que os operadores do Direito, sobretudo o Judiciário, atentem-se para isso, pois deixar de contextualizar, se levado ao extremo, correr-se-ia o risco de se legitimar inclusive a escravidão (!)[16].

Outra questão importante, deveras, é contextualizar os conceitos aristotélicos e, por conseguinte, a sua compreensão de mundo, que nem sempre sobreviveriam a um constrangimento epistêmico proporcionado pelo ordenamento jurídico levado a sério.

A doutrina aristotélica não deve apenas servir como “justificativa” de uma decisão, pois a sua “autoridade” não basta. Temos um sistema jurídico que tem por base o princípio da legalidade (artigo 5, inciso II, da Constituição Federal) e no respeito ao dever de fundamentação das decisões judiciais, que está expressamente previsto no inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal, em que a argumentação deve ser realizada neste horizonte.

Sobre a decisão judicial, STRECK (2013, p. 322- 348) formula cinco princípios fundamentais para a adoção de uma hermenêutica adequada: preservação da autonomia do direito, controle hermenêutico da interpretação constitucional, efetivo respeito à integridade e à coerência do direito, dever fundamental de justificar as decisões ou de como motivação não é igual a justificação, e, direito fundamental a uma resposta constitucionalmente adequada.

Nessa imbricação entre filosofia e direito, os argumentos com base em Aristóteles têm de ser articulados sistematicamente, revelando, sempre que possível, o pensamento conceitual que está por trás da enunciação, permitindo a controlabilidade das decisões.

Na argumentação jurídica levada a efeito para a obtenção de uma decisão judicial, que atenda aos reclamos de ser racionalmente articulada, coerente com o sistema jurídico (válida, portanto). Justificar não é o mesmo que fundamentar.

“No Estado Democrático de Direito, a pretensão jurídica moderna de garantir certeza nas relações, através de padrões normativos, a um só tempo, dotados de caráter coercitivo e intersubjetivamente estabelecidos, manifesta-se no exercício da jurisdição como a pretensão de que a um só tempo as decisões judiciais sejam coerentes com o Direito vigente, e adequadas aos casos submetidos à apreciação judicial.” (OLIVEIRA, 2016, p. 116)

Nas decisões mencionadas acima, nalgumas houve o bom uso do argumento, mas noutras restou um déficit argumentativo, especialmente pela perspectiva do usuário da prestação jurisdicional. Quando, por exemplo, o conceito de justiça distributiva é utilizado numa decisão sem qualquer pertinência com aquilo que Aristóteles propugnava, de justiça que se observava na distribuição de bens, honrarias, impostos etc pelo Estado, em razão do mérito do cidadão, acarreta-se um empobrecimento na qualidade da fundamentação, pois se invoca uma preciosa lição sem que os argumentos tenham qualquer correspondência com o caso.

Observa-se aquilo que RODRIGUEZ (2013) denunciou em sua obra sobre “Como decidem as cortes”, de que a invocação de autoridades e uma justiça opinativa, com um manancial de argumentos, não vinculados de maneira racional e unificada, caracterizam a argumentação jurídica praticada nos dias atuais. Não deixa de permear nisso um elemento ideológico (WARAT, 1994, p. 101) que deve ser levado em conta.


Conclusão

Efetuada a introdução, com a exposição dos motivos para a presente pesquisa, passou-se pela revisão dos principais conceitos sobre a justiça contida na obra Ética a Nicômaco.

Da análise de acórdãos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, constatou-se que há argumento empírico que demonstra que o pensamento de Aristóteles, ou pelo menos “fragmentos”, continua vivo no discurso de fundamentação, embora existam deficiências e equívocos, como apontado no decorrer do texto.

Veja-se que o uso dos conceitos de justiça nicomaqueia não podem ser apropriados de forma arbitrária pelo operador do direito, devendo respeitar algumas condições, tanto a nível de filosofia aristotélica (por uma questão de coerência e contextualização), como de fundamentação da decisão, evitando-se o mero argumento de autoridade ou de caráter opinativo.

Impõe-se superar aquilo que WARAT (1994, p. 13) chamou de senso comum teórico dos juristas, onde a citação de Aristóteles não deve ser apenas um costume intelectual, que carrega dentro de si um espaço para decisionismos.

Por isso, é um tema instigante, que merece um maior aprofundamento, pois revelar que o pensamento de um grego, de mais de dois milênios, ainda é constantemente invocado, mas para superar as falhas acima mencionadas, impõe-se aclarar a sua filosofia e seus conceitos, numa adequada teoria da decisão judicial.


Referências

AQUINO, Tomás de. Da justiça. Trad. Tiago Tondinelli. Campinas: Vide Editorial, 2012.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W.D. Ross. São Paulo: Nova Cultural, 1984. P. p. 44 - 236. v. 2.

BITTAR, Eduardo C. B. A justiça em Aristóteles. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.

FERREIRA NETO, Arthur Maria. Metaética e a fundamentação do direito. Porto Alegre: Elegantia Juris, 2015.

MORRISON, Wayne. Filosofia do direito: dos gregos ao pós-modernismo. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

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Notas

[1] Embora não seja o objeto do presente, é interessante demonstrar, de passagem, como a “felicidade” ingressa no discurso jurídico em decisões do STF. Para o Ministro Celso de Mello, seria um mandamento comum, ao lado da dignidade humana e do devido processo legal, o direito à felicidade, que é derivado daquela. “Não constitui demasia assinalar, neste ponto, que a busca da felicidade representa o fim natural da vida humana. O eudemonismo, nesse contexto, desempenha um papel de significativa importância, pois encerra a noção, já formulada no Século IV a.C., por ARISTÓTELES (“Ética a Nicômaco”, 1.12.8), para quem “A felicidade é um princípio; é para alcançá-la que realizamos todos os outros atos; ela é exatamente o gênio de nossas motivações”.  (STF, ADC 41, Relator:  Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 16-08-2017 PUBLIC 17-08-2017).

[2] “A igualdade, desde Platão e Aristóteles, consiste em tratar-se de modo desigual os desiguais.” (STF, MS 26690, Relator:  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2008, DJe-241 DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-12-2008). No mesmo sentido: STJ, HC 92.875/RS, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em 30/10/2008, DJe 17/11/2008. Sobre a aplicação da equidade em Aristóteles: STJ, REsp 1029434/CE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/05/2008, DJe 18/06/2008.

[3] No âmbito da sociologia, fala-se em uma modernidade (pós-modernidade) líquida, em que os padrões, códigos e regras, que serviam de conformação ou guias, estão cada vez mais estão em falta. Essa fluidez é marcada pela insegurança e mudanças. (Veja-se: BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Trad Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2001).

[4] Por exemplo, no âmbito da economia: SEN, Amartya. Sobre ética e economia. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

[5] Apelação Cível Nº 70069719722, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Julgado em 31/08/2016.

[6] SANSEVERINO, PAULO DE TARSO VIEIRA. Princípio da reparação integral. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 34

[7] Agravo de Instrumento Nº 70047482443, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 30/05/2012.

[8] Apelação Cível Nº 70070811021, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 14/12/2016.

[9] Agravo de Instrumento Nº 70076205335, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em 19/12/2017.

[10] Apelação Cível Nº 70072652845, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 14/12/2017.

[11] Apelação Cível Nº 70010806743, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Cezar Muller, Julgado em 05/05/2005.

[12] Apelação Cível Nº 70075911057, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Giovanni Conti, Julgado em 14/12/2017.

[13] Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 70075120428, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Victor Luiz Barcellos Lima, Julgado em 01/12/2017.

[14] Agravo de Instrumento Nº 70074558537, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Julgado em 31/10/2017.

[15] Por isso, é bom rememorar que, quanto à origem do conhecimento, REALE enquadra ARISTÓTELES entre os pensadores do racionalismo em que, além do fato como fonte do conhecer (como no empirismo), existem verdades de razão, obtidas essas por análise. O estagirita pertenceria a um ramo chamado de intelectualismo, onde o intelecto possui um papel de agente ou positivo, que atua sobre os elementos empíricos, captando a sua essência.

“Denominamos propriamente ‘intelectualismo’ àquela corrente, originada de Aristóteles, que reconhece a existência de ‘verdades de razão’ e, além disso, atribui à inteligência função positiva no ato de conhecer: — a razão não contém, porém, em si mesma, verdades universais como idéias inatas, mas as atinge à vista dos fatos particulares que o intelecto coordena: o intelecto extrai os conceitos ínsitos no real, operando sobre as imagens que o real oferece.” (REALE, p. 96)

Para o racionalista, ao lado do direito, como fato empírico (direito positivo), existe um direito ideal, racional ou natural (REALE, 2002, p. 99).

[16] Em Aristóteles há a figura do escravo por natureza, num contexto da estrutura familiar grega da época. O mesmo raciocínio poder ser verificado em questões de gênero.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATTE, Fabiano Tacachi. Fragmentos de justiça nicomaqueia: como permanece vivo o pensamento aristotélico em decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5494, 17 jul. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67646. Acesso em: 6 maio 2024.