Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/68313
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A utilização da linguagem não-verbal como fundamentação pelo juiz na coleta de prova oral do processo penal

A utilização da linguagem não-verbal como fundamentação pelo juiz na coleta de prova oral do processo penal

Publicado em . Elaborado em .

A adoção do livre convencimento motivado do juiz pelo sistema probatório penal possibilita ao magistrado interpretar a linguagem não-verbal e usá-la como fundamentação de suas decisões?

INTRODUÇÃO

A comunicação possui papel fundamental nas relações humanas, estando aquela constantemente presente nessas, seja através da linguagem verbalizada, como pela linguagem não-verbal. O Direito, em especial o processual, atua, ao mesmo tempo, como criador e fruto dessas interações interpessoais. Assim, temos que, durante o processo, como todo e qualquer diálogo comunicacional, a linguagem verbal e não-verbal encontram-se presentes.

A linguagem não-verbal no âmbito jurídico é a que acarreta mais controvérsia, porém, antagonicamente, é a que menos possui estudos e debates acerca do tema. O direito sempre foi tido como uma ciência isolada, ligado a normatividade estrita, não concedendo oportunidade para a inclusão de outros saberes em sua aplicação.

Acontece que a multidisciplinariedade se tornou uma exigência a todas as ciências atuais, não podendo o direito eximir-se dessa correlação. Desse modo, devemos nos recordar da condição humana do juiz e do principal bem jurídico em questão: a liberdade individual. Assim, no processo penal, o magistrado tem diante de si um homem e não um simples fato, o que acarreta na corroboração de muitos aspectos subjetivos no desfecho processual.

Com a adoção da persuasão racional no sistema probatório brasileiro, temos que as provas podem ser valoradas de acordo com o livre convencimento do juiz e, consequentemente, as provas orais podem, como normalmente acontece, adquirir um crédito superior ao das outras espécies probatórias. As provas tidas como orais acabam manifestando-se através de uma junção de informações verbais e não-verbais, realizando o juiz a análise e julgamento de ambas, averiguando também se há harmonia entre elas.

À vista disso, esse trabalho tem por objetivo geral discutir a viabilidade de fundamentação das decisões, pelo juiz, com base na linguagem não-verbal, delimitando o estudo, a coleta de prova oral no processo penal. Isso exige uma abordagem conjunta entre o mundo jurídico e o campo da psicologia, ciência essa que trata do comportamento humano e suas interações com o ambiente físico e social.

Portanto, essa conciliação de saberes instiga diversos questionamentos acerca da validade dos métodos aplicados e, principalmente, se afeta a segurança jurídica processual. No primeiro capítulo, apresentou-se, então, a linguagem não-verbal e iniciou-se o debate acerca da confiabilidade de sua interpretação. Já no capítulo seguinte, a parte processual penal foi explorada, tratando dos sistemas de avaliação das provas e as espécies probatórias orais.

No terceiro e último capítulo, versou-se sobre efeitos e o impacto na discricionariedade do magistrado quando aplicada essa análise de leitura corporal como fundamentação de decisões. Para a construção desse trabalho, utilizou-se a pesquisa exploratória, com analise de documentação indireta, tanto por pesquisa documental, como também pela bibliográfica.

Aplicou-se o método qualitativo e o dedutivo de investigação, desenvolvendo uma instigação para discussão no âmbito criminal de aplicação desse tipo de linguagem.


COMUNICAÇÃO INTERSUBJETIVA E LINGUAGEM NÃO VERBAL

A comunicação é indispensável para o convívio em sociedade, uma vez que, na década de 70, descobriu-se a existência do “homem social”. Nessa teoria, surgida na escola de Relações Humanas, o homem é visto como um ser que necessita de interação com outros indivíduos, precisando compartilhar valores e sentimentos, criando-se então um “meio ambiente social” (BONDENAVE, 1985, p. 8).

O homem é um animal essencialmente comunicativo, não que os outros animais não tenham tal possibilidade, mas sim que nossa capacidade de pensar, ou seja, de ser racional, diferencia nossa comunicação quando comparada com outras espécies. Desta maneira Paul Watzlawick (1993, p. 45) postula um axioma metacomunicacional da pragmática da comunicação: não se pode não comunicar.

Temos que o homem é, ao mesmo tempo, produto e criador de sua sociedade e cultura, e a sua comunicação, essa responsável pela ligação entre os indivíduos e o meio físico e social, tem papel crucial nessa cadeia de relações. A comunicação ela é indispensável e fundamental para o convívio coletivo. Segundo Juan Diaz (1985, p. 16):

Então, a comunicação não existe por si mesma, como algo separado da vida da sociedade. Sociedade e comunicação são uma coisa só. Não poderia existir comunicação sem sociedade, nem sociedade sem comunicação. A comunicação não pode ser melhor que sua sociedade nem esta melhor que sua comunicação. Cada sociedade tem a comunicação que merece. “Dize-me como é a tua comunicação e te direi como é a tua sociedade”.

Nesse mesmo sentido, Pierre Weil e Roland Tompakow (2005, p. 71) apontam que “quem está em grupo sempre influencia o comportamento deste e, por sua vez, também é por ele influenciado”, reiterando a existência de concomitância entre comunicação e sociedade.

Essa percepção também pode ser aplicada aos diferentes grupos sociais, isto é, as subdivisões presentes dentro da sociedade. Cada grupo social possui uma maneira de se comunicar, criando vocábulos e expressões, verbais e não-verbais, que apenas o indivíduo pertencente ou conhecedor daquele grupamento consegue decifra-la. Assim, temos que a comunicação diz muito acerca do seu convívio social, como também sobre o indivíduo em si.

Mesmo Juan Diaz Bordenave (1985, p. 80) indicando diferenças apenas entre “a linguagem empregada pelas classes sociais mais elevadas e a utilizada pelas classes subalternas”, nota-se, que essas distinções também se encontram presentes em outras divisões sociais, como os grupos religiosos e a comunidade Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros – LGBT.

 Comunicação Intersubjetiva

A comunicação intersubjetiva relaciona-se com a troca de mensagens. A própria expressão comunicar vem do latim communicare, que tem por significado partilhar, colocar em comum, isto é, entrar em relação com. Assim, temos que a comunicação tem ligação direta com o relacionamento, esse que ocorre quando os indivíduos se encontram em comunhão, em sociedade.

Aqui importa responder a indagação do que é a comunicação. Existe duas maneiras de definir o que é uma determinada coisa: enumerando os elementos que compõe essa, ou indicar sua serventia. Assim exemplifica Juan Diaz (1985, p. 36):

Pode-se definir o automóvel, por exemplo, dizendo que é um conjunto formado por motor, carroçaria e rodas. Mas seria ainda melhor defini-lo como um veículo autopropulsado que serve para transportar pessoas e coisas de um lugar a outro.

Com isso, podemos definir a comunicação a partir da ideia de sua finalidade, portanto, para que serve o ato de se comunicar. Temos então que a comunicação “serve para que as pessoas se relacionem entre si, transformando-se mutuamente e a realidade que as rodeia” (BORDENAVE, 1985, pg. 36), restando então demonstrado a presença de reciprocidade de consequências nesse processo comunicacional. 

A comunicação não existe quando o indivíduo se encontra só.  Ela é, em sua essência, plural. Quando falamos na comunicabilidade, muitos pensam apenas em seus meios, conectando-a a ideia de mídias sociais.  Porém aquela é consideravelmente mais ampla, abrangendo a substancialidade do ser humano e assim, como afirma Juan Diaz (1985, p. 19), “a comunicação é uma necessidade básica da pessoa humana, do homem social”.

Desta maneira, destaca Bordenave (1985, p. 22) a importância e abrangência da comunicação:

Assim como cresce e se desenvolve uma grande árvore, a comunicação evolui de uma pequena semente – a associação inicial entre um signo e um objeto – para formar linguagens e inventar meios que vencessem o tempo e a distância, ramificando-se em sistemas e instituições até cobrir o mundo com seus ramos. E não contente em cobrir o mundo, a grande árvore já começou a lançar brotos à procura de estrelas.

Visto que o ato de comunicar exige mais de um indivíduo, isto é, dependente da convivência social, temos a constatação de elementos para a existência dessa comunicação, esses que são os componentes que a estruturam.

Elementos da Comunicação

Apresentou-se que a comunicação, além de indispensável para a existência humana, desempenha também diversas funções necessárias ao convívio coletivo. Assim, afirma Anna Luiza Ramsthaler (2004, p. 2): “Comunicamos para informar e estarmos informados, para formar e influenciar atitudes e crenças, por simples prazer, para realizar tarefas em grupo, para criar e manter organizações, ou para inovar”.

Ainda na abordagem de Anna Luiza (2004, p. 2), mesmo havendo comunicação em situações e maneiras diversas, existem elementos característicos que sempre se apresentam: emissor, receptor, mensagem, código, canal, contexto, ruído e feedback.

O emissor e o receptor são os participantes diretos da comunicação intersubjetiva, ou seja, os que falam entre si e que, na conceituação de Bordenave (1985, p. 39), seriam os interlocutores.

A mensagem representa o conteúdo daquilo que se deseja compartilhar, que para Ramsthaler (2004, p. 3) é o “conjunto de sinais com significado: idéias, sentimentos, conjunto de símbolos emitidos pelo emissor”.

Já o código seria o conjunto de sinais e regras que possibilita a transformação do pensamento em informação possível de interpretação pelo receptor, e o canal o meio físico no qual essa informação é entregue (RAMSTHALER, 2004, p. 3). Na designação de Juan Diaz (1985, p. 39), esses dois elementos seriam, respectivamente, a forma como a mensagem se apresenta, e o meio empregado para transmiti-la.

Importante ressaltar que as formas que representam as ideias e as emoções, para Bordenave (1985, p. 39), chamam-se signos e, o seu conjunto organizado denomina-se código. Nota-se que o autor realiza uma cadeia de classificação dentro da forma, diferente de Ramsthaler que apenas coloca o elemento código, esse que pode se diferir entre outros, mas não se aborda mais subdivisões.

O elemento contexto apresentado por Anna Luiza possui igual caracterização da realidade para Juan Diaz, esse que considera a situação onde a comunicação se realiza e sobre a qual tem um efeito transformador (BORDENAVE, 1985, p. 40).

Por fim, Ramsthaler adiciona dois elementos a classificação de Bordenave, o ruído e o feedback. O ruído inclui tudo que distorce ou perturba o processo de comunicação, podendo ser um barulho (fisicamente perceptível), ou até uma ideia ou sentimento que atrapalhe a eficácia da comunicação (RAMSTHALER, 2004, p. 3). Já o feedback relaciona-se com a impressão dada ao emissor de como a mensagem foi recebida pelo receptor, o que ajuda a aferir a eficácia do processo comunicacional. 

 Tipos de Comunicação

Discutidos os aspectos elementares do processo de comunicação, cabe agora apresentar os tipos de comunicação: comunicação verbal e não-verbal.

A linguagem verbal consiste na emissão da mensagem, que, na classificação de Bordenave, se dá pela forma e na de Ramsthaler pelo código, das palavras. Elas podem ser transmitidas tanto oralmente como pela escrita. Define então Anna Luiza (2004, p. 7): “Quando emitimos uma mensagem, podemos utilizar vários códigos, entre esses existem as palavras. Quando a comunicação é realizada por meio das palavras, estamos utilizando a linguagem verbal”.

Diferentemente, na linguagem não-verbal, enfoque desse trabalho, temos diversos elementos em ação: gestos, posturas, olhares, expressões faciais, tom de voz, e até o silêncio tem significado. Tudo comunica. Nesse sentido, Juan Diaz (1985, p. 50):

É necessário compreender que a comunicação não inclui apenas as mensagens que as pessoas trocam deliberadamente entre si. Além das mensagens trocadas conscientemente, com efeito, muitas outras são trocadas sem querer, numa espécie de paracomunicação ou paralinguagem.

O tom das palavras faladas, os movimentos do corpo, a roupa que se veste, os olhares e a maneira de estreitar a mão do interlocutor, tudo tem algum significado, tudo comunica. Quer dizer, praticamente, é impossível não comunicar.

Desta forma, temos que a linguagem não-verbal além de estar constantemente presente nas interações humanas, também influi consideravelmente na forma como a mensagem é recebida pelo receptor. Exatamente por isso que a mesma mensagem pode ser transmitida, porém interpretada de maneira diversa a depender do meio/ canal empregado para tal finalidade.

Com isso, nítida fica a necessidade e a importância da linguagem não-verbal no discurso, uma vez que essa pode tanto se harmonizar com as informações declamadas verbalmente como contradize-las, causando ao receptor a impressão de antagonismo e, consequentemente, auferir uma possível mentira.

Visto o valor dessa linguagem dentro da eficiência da comunicação, resta evidente a indispensabilidade de aprofundamento no estudo acerca dela para melhor compreender as relações humanas. Relações essas que, tanto originaram o Direito como influem invariavelmente em sua existência e atuação, afetando todos os seus ramos e desdobramentos.

Assim, de acordo com Julius Fast (1970), conforme citado por Jo-Ellan Dimitrius e Mark Mazzarella (2000, p. 62):

Um estudo da linguagem corporal é um estudo do conjunto de todos os movimentos do corpo, desde os muito voluntários até os completamente inconscientes, dos que se aplicam apenas a uma cultura ou àqueles que atravessam todas as barreiras culturais.

Constatamos que esse estudo exige uma grande complexidade de analise, porém será aqui tratado, em síntese, os pontos elementares correlacionados ao processo penal, em especial a coleta de prova oral.

 Comunicação Não-verbal

Já em 1872, Charles Darwin em seu livro The Expression of the Emotions in Man and Animals destacava a importância da linguagem corporal e a sua influência nas relações entre as espécies, assim como suas semelhanças:

Aquele que observar um cão preparando-se para atacar outro cão ou um homem, e o mesmo animal acariciando seu dono, ou a expressão de um macaco quando provocado e quando afagado pelo seu tratador, será forçado a admitir que os movimentos de seus traços e gestos são quase tão expressivos quanto os dos humanos. (DARWIN, 2009, p.127)

Foi apresentado, em sua obra, a influência da evolução advinda da seleção natural na linguagem corporal das espécies, demonstrando através de suas análises cientificas a existência de expressões inatas e hereditárias em todas elas:

Esse fato, ainda ignorado por muitos psicólogos, consiste simplesmente em que padrões comportamentais são características tão confiáveis e conservadas nas espécies quanto as formas dos ossos, dos dentes, ou de qualquer outra estrutura corporal. Semelhanças entre comportamentos hereditários unem membros de uma espécie, de um gênero, e mesmo de unidades taxonômicas maiores, exatamente da mesma maneira como o fazem as características corporais. (2009, p. 09)

Nessa lógica, continua o naturalista:

Admitir que padrões comportamentais têm evolução exatamente igual à dos órgãos leva ao reconhecimento de outro fato: eles também têm o mesmo tipo de transmissão hereditária. Em outras palavras, a adaptação dos padrões comportamentais de um organismo ao seu meio se dá exatamente da mesma maneira que a de seus órgãos, isto é, mediante as informações que a espécie acumulou, ao longo de sua evolução, pelo antiquíssimo método da seleção e mutação. (2009, p. 10)

A linguagem não-verbal originou-se antes mesmo da linguagem verbalizada, acompanhando o surgimento do ser humano sobre a face da Terra (CAES, 2012, p. 02) e, como apresentando por Darwin, possui desenvolvimento semelhante a evolução biológica, incluindo em suas características a hereditariedade e a inerência.

Assim, ainda em mesmo sentido, Jo-Ellan Dimitrius e Mark Mazzarella (2000, p. 165) asseguram:

Existem muitos paralelos entre o modo como as pessoas interagem e as dinâmicas que acontecem no mundo animal. Nós humanos avançamos e nos retraímos, distraímos e atraímos, como fazem todas as criaturas. Afastamos os outros dos assuntos que pretendemos evitar, ou os conduzimos para a direção que queremos. Fazemos isso usando um arsenal de técnicas de comunicação desenvolvidas por causa da sobrevivência social: palavras e tom, ações e até silêncio. Algumas são instintivas; outras são manobras conscientes.

Temos, então, que as expressões corporais, em grande parte, foram de início utilizadas voluntariamente e com finalidade específica pelos indivíduos, tanto para interação entre uns e outros, como principalmente no auxílio à sobrevivência da espécie e, assim, influenciando diretamente na seleção natural.

Contudo, mesmo o tempo retirando sua necessidade de existência, a transmissão dessas expressões entre as gerações persistira até o presente momento, tornando-as em maioria desnecessárias, mas inatas e universais a todos os seres humanos. Assim, nas palavras de Darwin (2009, p. 41):

(...) parece provável que algumas ações, de início executadas conscientemente, converteram-se pela força do hábito e da associação em ações reflexas, e foram tão firmemente fixadas e herdadas que são executadas mesmo quando não têm a menor utilidade, toda vez que as mesmas causas, que originalmente as provocaram em nós por meio da vontade, reaparecem.

Como exemplo desses movimentos expressivos inatos, Darwin alude as pessoas que nascem cegas, não podendo essas adquirir expressões através da imitação, mas que as exibem tão bem quantos os que tem visão (2009, p. 298).

Outro caso intrigante apontado pelo referido autor para comprovar a hereditariedade das expressões, foi o de duas meninas que realizavam o mesmo gesto inusitado do avô, esse que elas jamais conheceram:

Quando deseja alguma coisa impacientemente, estende sua pequena mão e esfrega com rapidez o polegar sobre o indicador e o dedo médio: esse mesmo gesto era frequentemente realizado por seu avô em circunstâncias idênticas. (2009, p. 228)

Dando prosseguimento a análise, completa o autor (2009, p. 229):

Neste último caso, temos um bom exemplo, como os já apresentados num capítulo anterior, da hereditariedade de tiques e gestos. Presumo que ninguém atribuiria a uma simples coincidência um hábito tão peculiar quanto esse, comum ao avô e a suas duas netas que jamais o haviam visto.

Com isso, temos que a hereditariedade das expressões pode tanto se dar de maneira geral, sendo essas apresentadas em resposta a situações comuns a toda espécie humana, quanto também específicos a uma determinada estirpe. Sintetiza então Darwin (2009, p. 229):

Entretanto, quando pensamos em gestos menos comuns, que estamos acostumados a considerar como artificiais ou convencionais (...), parece-nos por demais surpreendente descobrir que eles são inatos. Podemos inferir que esses e alguns outros gestos são hereditários por serem realizados por crianças muito pequenas, pelos nascidos cegos e pelas mais variadas raças humanas. Precisamos também considerar o fato notório de que tiques novos e muito peculiares, associados a certos estados de espírito, surgidos em certos indivíduos, foram depois transmitidos aos seus descendentes, em alguns casos por mais de uma geração.

Assim, temos que necessariamente concluir que certas características são comuns a todos os indivíduos, de maneira geral, mas que outras afetam grupamentos em específico, restringindo-se tanto a uma linguagem familiar como a um conjunto cultural isolado.

Dentre essas expressões corporais comuns, importa destacar aquelas tidas como invisíveis, que quando explicadas na perspectiva darwinista, são vistas mais nitidamente como herança genética da espécie, portanto inatas e universais. Também importa salientar que essas possuem origem mais remota e maior importância em nossa sobrevivência e que, sobre elas, não possuímos qualquer tipo de controle:

O coração, como já disse, será ainda mais facilmente afetado, mediante associações habituais, por não estar sob o controle da vontade. Um homem, quando moderadamente zangado, ou quando furioso, pode comandar os movimentos de seu corpo, mas não impedir seu coração de bater rápido. Sua respiração pode ficar arqueada e suas narinas tremerem, pois os movimentos da respiração são apenas parcialmente voluntários. Da mesma maneira, aqueles músculos da face que são menos obedientes à vontade por vezes serão os únicos a trair uma emoção leve e passageira. As glândulas, mais uma vez, são totalmente independentes da vontade, e um homem sofrendo de tristeza pode controlar sua expressão, mas nem sempre consegue impedir as lágrimas de lhe encherem os olhos. Se uma comida apetitosa é colocada na frente de um homem com fome, ele pode ocultar qualquer sinal externo de fome, mas não consegue impedir a secreção de saliva. (2009, p. 71)

A exemplo também dessas expressões corporais involuntárias, temos a do sangue que flui para os músculos das pernas quando sentimos medo de um iminente perigo, o que nos prepara para realizar o que a evolução nos adaptou a fazer: correr.

Foi com base nessas mudanças corporais involuntárias e de caráter universal que o polígrafo, vulgo “detector de mentiras”, ganhou popularidade. Assim, utilizando-se da medida de variáveis fisiológicas para descobrir incoerências entre a linguagem verbal e a não-verbal, foi implementado em diversos países como meio de prova em processos penais, mas hoje possui sua confiabilidade constantemente indagada.

Não cabe agora o aprofundamento do tema, uma vez que o assunto será retomado em tópico próprio, mas interessa ressaltar aqui o quanto afeta os processos judicias, em especial o penal, a tentativa de interpretação dessa linguagem não-verbal. Essa intervém com clara certeza na motivação judicial, pois não se pode desvincular as informações coletadas verbalmente das emitidas pelo corpo, mas cabe examinar a viabilidade de explicação dessa apreciação e os impactos dela decorrentes.

Dando continuidade ao estudo da linguagem corporal, Darwin traz também a comprovação da existência da universalidade das expressões através da análise científica, demostrando que culturas completamente distintas possuem as mesmas expressões, ou bastante semelhantes, quando sujeitas as mesmas situações, em síntese (2009, p. 23):

(...) Conclui-se, a partir das informações assim adquiridas, que um mesmo estado de espírito exprime-se ao redor do mundo com impressionante uniformidade; e este fato é ele mesmo interessante como evidência da grande similaridade da estrutura corporal e da conformação mental de todas as raças humanas.

Apresenta-se, então, que a linguagem corporal, presente em todas as espécies, é essencial ao Homo sapiens, não apenas do ponto de vista social, como também em seu aspecto biológico. Em vista disso, analisar a universalidade e hereditariedade dessa linguagem corporal interessa por demasiado o estudo em ciências diversas, devendo ser incluído no direito processual, uma vez que esse se materializa por intermédio de atos humanos e, por conseguinte, tal linguagem acaba por influenciar em sua dinâmica.

Buscando comprovar que as expressões eram aprendidas socialmente e culturalmente variáveis, contrariando a investigação darwinista, Paul Ekman iniciou uma pesquisa que o fez, na verdade, confirmar exatamente oposto do que pretendia, como demonstra em seu livro Emotions Revealed (EKMAN, 2011).

 Emoções

Paul Ekman realizou estudo abrangente sobre a linguagem corporal, em especial a relação entre as expressões faciais e as emoções. Desta maneira, define:

A emoção é um processo, um tipo específico de avaliação automática, influenciado por nosso passado evolucionista e pessoal, em que sentimos que algo importante para nosso bem-estar está acontecendo e um conjunto de mudanças fisiológicas e comportamentos emocionais influenciam a situação. (2011, p. 31)

Segundo o autor, as emoções podem ainda “anular o que a maioria dos psicólogos considera os motivos essenciais que impulsionam nossas vidas: fome, sexo e o instinto de sobrevivência”, exemplificando:

As pessoas não comerão se acharem que o único alimento disponível é repugnante. Elas podem até morrer, ainda que outras pessoas possam considerar o mesmo alimento saboroso. A emoção triunfa sobre o impulso da fome. O impulso sexual é notoriamente vulnerável à interferência das emoções. Uma pessoa pode nunca tentar o contato sexual por medo ou aversão, ou pode nunca ser capaz de consumar um ato sexual. A emoção triunfa sobre o impulso sexual. E o desespero pode subjugar até a vontade de viver, induzi ao suicídio. As emoções triunfam sobre a vontade de viver. (2011, p. 17)

A emoção é vista, pelo senso comum, como um sentimento íntimo que afeta nosso psicológico, mas essa não se restringe em sensibilizar apenas os aspectos mentais, como também atinge consideravelmente nosso modo de comportamento, havendo uma exteriorização dessa emoção. Assim, ao surgir uma emoção, nosso corpo altera-se, seja no gesticular, no tom de voz, ou até nas expressões faciais.

A existência dessa influência da emoção sobre a linguagem corporal já era abordada, mesmo que voltada para a utilidade evolucionista, por Charles Darwin (2009, p. 48):

(...) isto é, sempre que qualquer sensação de desejo, aversão etc. tenha ocasionado algum movimento voluntário durante uma longa série de gerações, uma tendência à execução de movimento similar será quase certamente desencadeada toda vez que a mesma – ou semelhante e associada – sensação etc., ainda que fraca, for experimentada; não importando que o movimento seja nesse caso absolutamente inútil. Tais movimentos habituais são frequentemente, ou no geral, herdados; e eles assim pouco diferem das ações reflexas.

Essa associação é bastante antiga e reconhecida pelos estudiosos, porém ainda consiste em uma ciência recente, conhecida como cinética (CAES, 2012, p. 8). Desse modo, não há discordância acerca de sua existência, mas apenas em como se dá sua propagação e processo, assim como a intensidade de sua interferência.

Pierre Weil e Roland Tompakow (2005, p. 169), dentro dessa abordagem, referem-se ao chamado Princípio Psicofisiológico:

Cada modificação no estado fisiológico é acompanhada por uma mudança apropriada no estado mental-emocional; e reciprocamente cada modificação no estado mental-emocional é acompanhada por uma mudança apropriada no estado fisiológico.

Esse princípio, que evidencia a existência de alterações corporais advindas dos estados de espirito, é incontroverso, uma vez que é completamente perceptível a existência dessa relação, recíproca e constante, de causa e efeito. Entretanto, sua utilização como fonte confiável e sua possível aplicação como meio de interpretação de informações não verbalizadas é evidentemente polêmica.

Darwin afirma que “os movimentos expressivos conferem vivacidade e energia às nossas palavras. Eles revelam os pensamentos e as intenções alheios melhor do que as palavras, que podem ser falsas” (2009, p. 310).  A transmissão de informações enganosas através da linguagem verbal é, frequentemente, notória e constatada pela simples verificação com a veracidade dos fatos.

Porém, cabe examinar se também há essa possibilidade de manipulação da linguagem não-verbal, assim como se existem outros aspectos que possam influir em sua expressão que não necessariamente seja de adulteração consciente.

Regras de Exibição

Paul Ekman, como já abordado, confirmou, em suas pesquisas, a existência de emoções inatas e universais, que, como consequência, se expressam de maneira comum nas diferentes culturas. Ademais, também constatou a existência de peculiaridades acerca do controle das expressões, nomeando-as de “Regras de Exibição” (2011, p. 22):

Essas, propus, são socialmente aprendidas, muitas vezes culturalmente diferentes, a respeito do controle da expressão, de quem pode demonstra que emoção e para quem e de quando pode fazer isso. Eis por que, na maioria das competições esportivas públicas, o perdedor não demonstra a tristeza e o desapontamento que sente. As regras de exibição estão incorporadas na advertência dos pais: “pare de parecer contente”. Essas regras podem ditar a diminuição, o exagero, a dissimulação ou o fingimento da expressão do que sentimos.

Esses mecanismos aprendidos também eram evidenciados por Darwin, uma vez que afirmava haver a possibilidade de repressão das expressões das emoções como maneira de controla-las, pois, “a livre expressão de uma emoção por sinais exteriores a intensifica”, mas, “por outro lado, a repressão de todos os sinais exteriores, até onde isso é possível, atenua a emoção” (DARWIN, 2009, p. 310).

Logo, vemos que as emoções, ao serem controladas, acabam por conter também sua exteriorização, isto é, não podemos interromper nossas emoções e nem desliga-las, mas podemos controlá-las através de alguns artifícios, o que acarreta em deliberada ocultação. Assim, temos em pauta a confiabilidade da linguagem não-verbal, uma vez que aquela manifestada pelo individuo pode estar sujeita ao controle do mesmo.

Contudo, mesmo havendo a possibilidade desses controles aprendidos e diferentes entre as culturas, Paul Ekman afirma que as expressões emocionais podem sim variar sua intensidade e o momento oportuno de demonstração, porém não a expressão em si (2011, p. 30). O autor defende que, mesmo havendo a contenção da emoção, essa sempre será revelada por algumas incongruências dentro da própria linguagem corporal.

Assim, teríamos as expressões consideradas inatas somente quando o indivíduo está em particular, momento no qual não se exige a contenção da emoção em si e nem de sua expressão corporal. Porém, em público, ela pode ser exteriorizada de maneira contida, mas sempre se fará presente, tanto por ser involuntária, como por também sua completa exclusão ser, segundo Ekman, impossível.

Microexpressões

Visto que as emoções podem ser controladas, assim como suas expressões, Paul Ekman desenvolveu o conceito de microexpressões, essas definidas nas palavras do autor:

O que denominei microexpressões – movimentos faciais muito rápidos, que duram menos de um quinto de segundo – são fonte importante de escapamento, revelando uma emoção que a pessoa está tentando ocultar. Uma expressão falsa pode ser denunciada de diversas maneiras: em geral, é levemente assimétrica e carece de uniformidade da forma que flui de vez em quando da face.

Desse modo, as expressões emocionais quando manipuladas ou controladas, não conseguem omitir por completo as genuínas e involuntárias emoções, deixando escapar resquícios. Esses podem apresentar-se de diversas maneiras, como por exemplo a variação na tonalidade e volume da voz, porém Ekman concentrou seus estudos nas imprecisões propagadas na face.

Darwin já enxergava a possibilidade dessa identificação, mas relatava sua dificuldade pela efemeridade das expressões, ainda mais com os meios tecnológicos disponíveis à época (2009, p. 19):

O estudo da Expressão é difícil devido ao fato de que os movimentos muitas vezes são extremamente sutis, e de natureza efêmera. Uma diferença pode ser claramente percebida e mesmo assim às vezes é impossível, pelo menos em minha experiência, estabelecer em que ela consiste.

Já Paul Ekman, averiguando a existência desses mecanismos de escape das verdadeiras emoções, desenvolveu um Sistema de Codificação da Ação Facial (Facial Action Coding System – FACS), esse utilizado para medir a face, entregando as emoções reprimidas a partir dessas microexpressões.

Assim, o programa seria como um atlas da face, capaz de apontar incongruências nas expressões faciais das emoções que acabam por evidenciar uma contradição, isto é, entregar a mentira. Desse modo, essa técnica não mede diretamente a emoção, e sim pontua objetivamente os movimentos musculares faciais (EKMAN, 2011, p. 140), esses que acabam por evidenciar quando uma expressão alegada não é a verdadeira.

Segundo Ekman (2011, p. 38), as emoções começam tão rápidas que não temos consciência dos processos mentais que as deflagram, existindo então mecanismos automáticos de avaliação responsáveis por desencadeá-las.

Esses tais mecanismos automáticos de avaliação, os autoavaliadores, através dos estímulos fornecidos por cada órgão sensorial, rastreiam e detectam tudo ao nosso redor, efetuando de maneira rápida e inconsciente, a decisão de produção de uma emoção quando necessária para nosso bem-estar e sobrevivência.

Seria como se tivéssemos um banco de dados de alerta emocional, no qual os nossos autoavaliadores estão em constante busca de situações contidas nesse registro, metáfora utilizada por Ekman para melhor esclarecer a atuação desses mecanismos:

Nossos autoavaliadores são poderosos e examinam continuamente, fora de nosso conhecimento consciente, os temas e as variações dos eventos relevantes para nossa sobrevivência. Utilizando uma metáfora informática, os mecanismos automáticos de avaliação estão buscando em nosso ambiente algo que se assemelhe ao que está armazenado em nosso banco de dados de alerta emocional, escrito, de um lado por nossa biologia, mediante a seleção natural, e de outro, por nossa experiência individual. (2011, p. 46)

A importância da velocidade desse processo de avaliação é demonstrada quando, por exemplo, estamos em iminência de sofrer uma colisão de carro. Ou seja, assim que seus sensores o alertaram do perigo, inconscientemente, o medo surge, apoderando-se de nós em milésimos de segundo, e sem nenhuma consideração da questão, viramos o volante para evitar a batida, assim como pressionamos o freio.

Temos demonstrada então, que as emoções nos preparam para lidar com eventos importantes sem precisarmos pensar no que fazer (EKMAN, 2011, p. 37) e que, graças a esses mecanismos, conseguimos agir rapidamente, sendo essa situação usualmente chamada de instinto.

Gatilhos Emocionais

Visto que as emoções são desencadeadas de maneira involuntária através dos autoavaliadores, importa compreender o que são os estímulos recebidos por eles, advindos de nossos órgãos sensoriais, assim como sua reprodução cerebral, por exemplo, através da memória.

Segundo o psicólogo Richard Lazarus (1991 apud Paul Ekman, 2011, p. 41), existem os chamados temas relacionais centrais, sendo esses considerados como cenas universais para as emoções.

Os temas relacionais centrais são universais e relacionados com uma certa emoção, como se esses fossem um gênero, podendo dele surgir espécies, essas que seriam variações adquiridas pelas experiências individuais, mas correlacionadas aos temas centrais. Assim, exemplifica Ekman (2011, p. 41):

 Quando identificamos um tema, como a sensação quando uma cadeira inesperadamente desaba conosco, isso ativa uma emoção com pouca avaliação. Pode levar mais tempo para os autoavaliadores identificarem algumas variações de cada tema, aquelas que aprendemos ao longo do processo de crescimento. Quanto mais a variação estiver afastada do tema, mais tempo pode levar até que alcancemos o momento em que ocorre a avaliação reflexiva. Nesse processo, temos consciência dos percursos avaliatórios: estamos pensando e considerando o que está acontecendo. Suponhamos que alguém escute que vai haver um corte de mão de obra na empresa. A pessoa reflete se pode ser afetada, e, à medida que crê nessa possível ameaça, começa a sentir medo. Ela pode perder o emprego, pois precisa do salário para se manter. O evento se associa ao tema da perda de apoio – um dos temas associados ao medo -, mas está tão afastado desse tema que a avaliação não seria automática, mas reflexiva. A mente consciente da pessoa está envolvida.

As variações desenvolvidas pela vivência individual são as chamadas variações idiossincráticas ou gatilhos emocionais. Em vista disso, temos certas situações que são diretamente relacionados aos temas universais, sendo ambos advindos da herança evolutiva humana e, portanto, comum a toda espécie. Porém, há também os gatilhos emocionais, que se relacionam aos temas, mas que se diferenciam entre os indivíduos, sendo esses específicos. Paul Ekman (2011, p. 60) elucida:

(...) os temas, produtos de nossa evolução, são indeléveis, tais como as constatações a respeito de ratos nascidos em laboratório, que nunca tiveram qualquer experiência com gatos, mas, mesmo assim demonstram medo no primeiro contato. É um tema inato, um gatilho de medo que já não requer aprendizagem.

Desse modo, diversos podem ser os episódios que acarretam o surgimento de emoções entre os indivíduos. Por exemplo, pode uma pessoa possuir medo ao encontrar uma cobra e, assim, essa situação faze-la manifestar todas as alterações corporais advindas dessa emoção. Entretanto, pode outro indivíduo não experimentar tal emoção com a situação anteriormente apresentada, mas senti-la com a presença de outro animal venenoso, o escorpião.

Assim, os indivíduos, como um todo, possuem um tema central que acarreta a emoção do medo, como anteriormente apresentado, v.g., a presença de animais venenosos. Cada um pode possuir situações especificas para o desencadear de emoções, mas todos irão demonstrar a emoção ligada aquelas.

Em resumo desse conjunto de alterações corporais inevitáveis, advindas do surgimento de emoções e desencadeadas por gatilhos individuais e/ou universais, Paul Ekman (2011, p. 81):

Quando estamos sob o domínio de uma emoção, uma sucessão de mudanças ocorre em uma fração de segundo – sem que escolhamos ou tenhamos consciência imediata -, nos sinais emocionais faciais e vocais; nas ações predefinidas; nas ações aprendidas; na atividade do sistema nervoso autônomo que regula nosso corpo; nos padrões reguladores que modificam continuamente nosso comportamento; na recuperação das memórias e expectativas relevantes e na interpretação do que está acontecendo dentro de nós e no mundo. Essas mudanças são involuntárias: nós não escolhemos.

Para o autor, as emoções e suas expressões, tanto as universais quanto as advindas das experiências individuais, podem ser controladas e, consequentemente, reprimidas. Porém, sempre haverá um escapamento daquela que se tenta esconder, o que origina uma microexpressão, essa plausível de identificação pela ciência e seus programas tecnológicos.

 Associação entre a Linguagem Corporal e o Âmbito Jurídico

Como apresentado nos tópicos iniciais desse capítulo, a comunicação é indispensável as relações humanas e, tanto é produto delas, como também instrumento para sua concretização. Temos o Direito alocado dentro da área de ciências humanas, sendo um claro exemplo de sistema oriundo das relações individuais e que, ao mesmo tempo, possui a finalidade de resolver os seus próprios conflitos.

Encontramos então a linguagem corporal, como parte de toda comunicação humana, presença intrínseca no Direito, não podendo sua análise ser por ele afastada. Desta maneira, muitos institutos jurídicos fazem uso dessa linguagem, mesmo que indiretamente, possuindo influência em momentos diversos da construção judicial.

A linguagem não-verbal é por nós analisada de maneira automática, não havendo a percepção de sua utilização como fator determinante de julgamento, em especial no âmbito penal. Quando estamos diante de um Tribunal do Júri, essa aplicação é mais evidente, pois temos civis que não possuem um preparo para afastar de seu juízo o estereótipo dos participantes no processo e nem a necessidade de fundamentação de sua decisão.

 Acontece que, ao juiz, cabe a fundamentação de suas decisões, o que acaba por mitigar a influência dessa linguagem ao veredito concedido. Porém, ao lembrarmos da condição humana do julgador, parece-nos improvável que essa leitura corporal não esteja presente, ainda mais com o sistema de livre apreciação das provas utilizado pelo processo penal brasileiro.

O mesmo pode ser visualizado no inquérito policial, uma vez que a linguagem corporal encontra espaço mais amplo nos atos pré-processuais, no qual não ocorre o contraditório e assim, a parcialidade é notoriamente em grau mais elevado.

Nessa linha temos também, por exemplo, a embriaguez ao conduzir veículo automotor, esse que admite para sua constatação os “sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora”, como o apresentado pelo Código de Trânsito Brasileiro em seu art. 306, § 1º, inciso II.

Com isso, negando o individuo a produção de teste de alcoolemia, mas apresentando sinais de embriaguez, “o agente de trânsito está apto a analisar se determinado condutor incorreu em infração administrativa de dirigir embriagado e/ou incidiu no crime previsto no art. 306 do CTB” (SILVA, 2014, p. 75). Aqui, resta clara a presença dessa comunicação não-verbal e sua leitura com influência direta no direito, tanto material quanto processual, uma vez que esse agente de trânsito também irá configurar como testemunha no processo.

No caso acima citado, temos que a prova testemunhal será admitida com valor quase absoluto, pois a não realização do exame para constatação do crime de trânsito, esse que é de mera conduta, a torna quase que única possível. Esse trabalho não tem por função discorrer sobre essa tipificação criminal e suas consequências, mas sua existência já nos introduz a discussão primordial desse: a coleta de prova oral no processo penal.

Com isso, dentro do processo penal, a instrução probatória é de inigualável importância, sendo ela talvez a que configure o próprio processo, uma vez que esse tem por objetivo exatamente comprovar fatos alegados pela acusação com a produção de provas, garantindo-se o contraditório e ampla defesa do acusado acerca delas.


AS PROVAS NO PROCESSO PENAL

O vocábulo prova recebe definições distintas dentro do direito penal, que de forma ampla, Renato Brasileiro de Lima (2018, p. 591) conceituou que “provar significa demonstrar a veracidade de um enunciado sobre um fato tido por ocorrido no mundo real”. Já no sentido estrito, Antônio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 41) diferencia:

Na terminologia processual, o termo prova é empregado com variadas significações: indica, de forma mais ampla, o conjunto de atividades realizadas pelo juiz e pelas partes na reconstrução dos fatos que constituem o suporte das pretensões deduzidas e da própria decisão; também pode aludir aos instrumentos pelos quais as informações sobre os fatos são introduzidas no processo (meios de prova); e, ainda, dá o nome ao resultado dessas atividades.

Desse modo, o emprego da palavra irá variar de acordo com o contexto e a significação dada a ela, importando compreender melhor suas definições. Porém, antes de iniciarmos essa exposição, interessa distinguir prova de indício, esses que são confundidos constantemente no linguajar corrente.

Assim, Ferrajoli (2002, p. 106) propõe chamarmos de “prova o fato probatório experimentado no presente, do qual se infere o delito ou outro fato do passado” e de indício “o fato provado do passado, do qual se infere o delito ou outro fato do passado que, por sua vez, tenha o valor de um indício”. Por exemplo, na coleta direta das declarações de uma testemunha ocular, temos uma prova de um fato. Porém quando esse é utilizado em momento posterior, isto é, uma transcrição do mesmo testemunho, temos um indício ou prova indiciária, uma vez que o fato foi provado no passado.

Retomando as significações de prova, temos que a primeira acepção dada por Antônio Magalhães é relativa à atividade, que nas palavras de Sérgio Rebouças (2017, p. 506):

No primeiro caso, a prova é compreendida como a (i) atividade desenvolvida pelas partes no sentido de fornecer elementos destinados a formar a convicção do órgão judiciário acerca da hipótese de acusação e das demais questões empíricas relevantes para a apreciação do mérito da causa (a hipotética relação de direito penal material discutida).

Com base nessa conceituação, temos que “a atividade probatória desenvolve-se no contexto do direito à prova titularizado pela parte” (REBOUÇAS, 2017, p. 507), e  que, “o direito à prova é um direito das partes, cabendo a cada uma delas exercer esse direito, demonstrando os fundamentos dos fatos admitidos quando da inicial acusatória e da defesa preliminar”, como assevera Ronaldo Tanus Madeira (2003, p. XVI).

Nesse sentido, a prova é um exercício, ou melhor, um direito das partes.  Dentro do processo, tanto a acusação quanto a defesa devem procurar comprovar as situações por elas alegadas, caracterizando, então, a essencialidade do processo.

Já em relação à prova como instrumento, ela “abrange os meios de que se valem as partes para demonstração de suas alegações” (REBOUÇAS, P. 507) e, em nosso Código de Processo Penal - CPP, em seu título VIII, encontramos um rol meramente exemplificativo dos meios de prova admitidos, a saber: a) exame de corpo de delito e perícias em geral (capítulo II, art. 158  a 184); b) interrogatório do acusado (capítulo III, art. 185 a 196); c) confissão (capítulo VI, art. 197 a 200); d) declarações do ofendido (capítulo V, art. 201); e) testemunhas (capítulo VI, art. 202 a 225); f) reconhecimento de pessoas e coisas (capítulo VII, art. 226 a 228); f) acareação (capítulo VIII, art. 229 e 230); g) documentos (capítulo IX, art. 231 a 238); h) indícios (capítulo X, art. 239); e por fim, i) busca e apreensão (capítulo XI, art. 240 a 250).

A acepção da prova como resultado “caracteriza-se pela formação da convicção do órgão julgador no curso do processo quanto à existência (ou não) de determinada situação fática. É a convicção sobre os fatos alegados em juízo pelas partes” (LIMA, 2018, p. 592).

Em síntese, Ronaldo Tanus Madeira (2003, p. 01)

Definir algo é dizer em que consiste esse algo que se define, é apontar suas características essenciais. E, não raro, a essência de um objeto não vem divorciada de sua finalidade. Daí que a prova penal pode ser conceituada como o conjunto de fatos produzidos pelas partes, acusação e defesa, e, de ofício, pelo juiz, em um procedimento processual, cuja finalidade é a de estabelecer uma verdade jurisdição, através da descoberta da verdade real, e que possa, com segurança, levar o magistrado a propagar uma decisão final da causa.

Temos então a prova como aquilo que se assemelha a veracidade dos fatos, como aquilo que é real. O processo relaciona-se, então, com todas as significações dada a prova, sendo um exercício das partes, buscando meios de confirmar suas alegações para que, por fim, tenha o juiz constatado a veracidade dos fatos narrados.

Assim, aqui importa adentrar a discussão dos sistemas de avaliação das provas, em que a acepção da prova como resultado fica em evidência, uma vez que se relaciona a gestão da prova e sua valoração com o julgamento realizado pelo juiz.

 Sistema de Avaliação da Prova

Antes de apresentar os sistemas de avaliação de prova, interessa destacar, de forma sintética, os sistemas do processo penal: inquisitório e acusatório.

O sistema inquisitorial, permeado pelo princípio inquisitivo, caracteriza-se, em suma, na concentração das funções de acusar e julgar na pessoa do juiz, tendo então sua imparcialidade completamente prejudicada. Nas palavras de Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2016, p. 56):

O princípio inquisitivo é caracterizado pela inexistência de contraditório e de ampla defesa, com concentração das funções de acusar, defender e julgar em uma figura única (juiz). O procedimento é escrito e sigiloso, com o início da persecução, produção da prova e prolação de decisão pelo magistrado.

Nesse modelo, a busca pela realidade dos fatos configurava-se em verdadeira obsessão, devendo descobri-la a qualquer custo, o que importava a aceitação da tortura como meio de obtenção da confissão do acusado, esse que seria o único a conhecer por completo a verdade dos fatos:

Corolários dessas exigências eram o segredo, face ao perigo de propagação das condutas heréticas ou contestadoras do poder real, bem como o caráter praticamente ilimitado da pesquisa da verdade, que consistia em verdadeira obsessão do inquisidor; daí ser natural, nessa perspectiva, a utilização do saber do próprio acusado como fonte de informação; se culpado, o acusado tem certamente um conhecimento preciso da realidade e a confissão, se obtida, constitui a melhor forma de alcançar a verdade real: "in criminali causa certum est confessum esse damnandum secundum omnes"; assim, acabava por transformar-se toda a atividade probatória em uma desenfreada busca da confissão, inclusive com a admissão do recurso à tortura. (GOMES FILHO, 1997, p. 21)

No sistema processual inquisitório, o acusado é tido como um mero expectador do processo, no qual o “juiz procede de ofício à procura, à colheita e à avaliação das provas, produzindo um julgamento após uma instrução escrita e secreta, na qual são excluídos ou limitados o contraditório e os direitos da defesa” (FERRAJOLI, 2002, p. 452).

Em oposição, no modelo acusatório, temos como principal característica a separação entre juiz e as partes, além da existência de diversos princípios garantidores de direitos, como os do contraditório, da ampla defesa e da publicidade. Nesse sistema, temos no juiz um sujeito passivo, que mantém sua imparcialidade durante todo o debate paritário entre acusação e defesa e que, por fim, decide conforme a sua livre convicção. Nesse sentido, Sérgio Rebouças (2017, p. 54):

No processo penal de tipo acusatório, com a separação das funções processuais em sujeitos distintos, sobreleva a nota de imparcialidade do julgador, o que impõe que o órgão jurisdicional se encontre institucionalmente em posição de equidistância em relação às partes em conflito.

Além do mais, ainda podemos citar a existência de um sistema misto ou acusatório formal, composto “por uma instrução preliminar, secreta e escrita, a cargo do juiz, com poderes inquisitivos, no intuito da colheita de provas, e por uma fase contraditória (judicial) em que se dá o julgamento, admitindo-se o exercício da ampla defesa e de todos os direitos dela decorrentes” (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 58).

Como visto, o modelo acusatório tem relação direta com a livre convicção judicial, essa que pode se dá de maneira completamente desatarefada ou com necessária motivação. Ainda existe também um sistema de provas com valor pré-estabelecido. Assim, importa apresentar essas classificações possíveis para melhor compreender qual o aplicado no ordenamento brasileiro e o porquê.

Sistema da Íntima Convicção

Nesse sistema, temos que o juiz é liberto na valoração da prova, podendo decidir livremente e sem a necessidade de motivar, ou seja, apresentar a causa de sua decisão. Explana Renato Brasileiro (2018, p. 625):

De acordo com o sistema da íntima convicção, também conhecido como sistema da certeza moral do juiz ou da livre convicção, o juiz é livre para valorar provas, inclusive aquelas que não se encontram nos autos, não sendo obrigado a fundamentar seu convencimento. Esse sistema permite que o magistrado avalie a prova com ampla liberdade, decidindo ao final do processo de modo a aplicar o direito objetivo de acordo com sua livre convicção (secunda conscientia), não estando obrigado a fundamentar sua conclusão.

A liberdade do juiz é incondicional. Dessa forma, o julgador pode utilizar elementos que não se encontram dentro do processo para construir seu convencimento, como por exemplo, aqueles não submetidos ao contraditório. O juiz possui independência absoluta para estabelecer sua decisão, o que acaba acarretando na arbitrariedade do mesmo.

Sistema da Prova Legal

Diferentemente do que se pensa, esse sistema é comum nas culturas que adotam o modelo inquisitório, pois “apenas na tradição inquisitória é que se firmou a figura do juiz técnico, obrigando a motivar suas decisões” (REBOUÇAS, 2017, p. 513). Ele surgiu exatamente para contrapor e mitigar o excesso de poderes conferidos ao juiz no sistema da intima convicção.

Nesse sistema, a própria lei atribui um valor a cada prova, estruturando sua hierarquia e assim “aniquilando praticamente a margem de liberdade apreciativa do magistrado” (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p.649). O legislador tarifa o valor das provas, cabendo ao juiz apenas a realização do cômputo delas. 

Exatamente por isso que a confissão era tão almejada pelos sistemas inquisitoriais, uma vez que, ao possuir um valor inestimável em comparação ao resto das provas, seria dado como prova essencial e de evidente destaque na busca da verdade. Assim, deriva desse sistema “o conceito da confissão como rainha das provas, sendo que nenhuma outra prova seria capaz de infirmá-la” (LIMA, 2018, p. 626).

Assim, contextualiza e introduz o próximo sistema, Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 32):

O reconhecimento do valor garantístico do sistema das provas legais, sem que se ignorassem os absurdos a que poderia conduzir, levou então a doutrina à elaboração do que se denominou teoria das provas legais negativas, que em última análise, postulava limitações ao livre convencimento, quando se tratasse de condenar. Desse modo, ao contrário do que sucedia em relação às provas legais tradicionais, ou positivas, em que determinados elementos autorizavam o reconhecimento da culpabilidade, mesmo contra o convencimento moral do juiz, segundo essa nova concepção, o juiz só estaria autorizado a condenar se, além de convencido, estivesse amparado por um mínimo de prova, de acordo com as estipulações do legislador.

A partir dos extremismos dos sistemas apresentados, tanto no da íntima convicção com o excesso da liberdade conferido ao juiz, como no bloqueio completo de apreciação das provas pelo magistrado no da verdade legal, surgiu um terceiro sistema visando conciliar os anteriores, buscando realizar uma harmonização de suas qualidades. Assim, nesse sistema intermediário, o juiz possuí autonomia na formação de seu julgamento, porém não de forma desenfreada.

Sistema do Livre Convencimento Motivado

Também chamado de persuasão racional, nesse modelo existe a liberdade do juiz na valoração das provas, podendo deliberar com base no que melhor lhe convencer e, por fim, decidir motivadamente, isto é, de maneira justificada. Nesse sentido, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2016, p. 650):

A liberdade do julgador lhe permite avaliar o conjunto probatório em sua magnitude e extrair da prova a sua essência, transcendendo ao formalismo castrador do sistema da certeza legal. Não existe hierarquia entre as provas, cabendo ao juiz imprimir na decisão o grau de importância das provas produzidas.

Assim, esse sistema veio para livrar a instrução probatório de radicalismos, possibilitando que não aja arbitrariedades por parte do magistrado, como também não impossibilite ao mesmo a análise de cada caso concreto. Desse modo, Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 161) diferencia e elucida:

Nas provas legais, a função do julgador diante das provas era de mera constatação de sua existência e, em seguida, de dedução de seu valor para a decisão, segundo os parâmetros anteriormente fixados pelo legislador; ao contrário, na íntima convicção e no livre convencimento, a tarefa de apreciar as provas investe o agente de amplos poderes de crítica e seleção do material probatório, para dele extrair o seu julgamento sobre os fatos.

Certamente, temos que o sistema adotado em nosso ordenamento acolhe a liberdade de convencimento do juiz, porém com a necessidade de motivação, como consagrado na Constituição Federal de 1988, em seu art. 93, inciso IX, in verbis:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

(...)

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; (grifo nosso)

Em coaduno, o Código de Processo Penal, em seu art. 155:

Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Importa aqui diferenciar, de maneira simplificada, prova de elementos informativos. A prova é, em regra, produzida durante o curso do processo, com a realização do contraditório. Diferentemente, os elementos de informação são colhidos durante o inquérito policial e “auxiliam na formação da opinio delicti do órgão de acusação” (LIMA, 2018, p.592).

Manifesta então a necessidade do contraditório na produção da prova, ou pelo menos a posterior contestação dessa pela parte contrária, temos então que “a motivação nasce, juntamente, do direito à prova, ao contraditório, sem o que fica impossível ao juiz valorá-la” (MADEIRA, 2003, p. XVII). Assim, delimita-se a liberdade do magistrado e, concomitantemente, possibilita as partes o protagonismo no processo.

Em mesmo sentido, Ronaldo Tanus complementa (2003, p. 21):

A exigência constitucional inserida no art. 93, IX, de que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão fundamentados sob pena de nulidade, impede que uma sentença possa nascer de um subjetivismo puro, sem referenciais que poderiam ser interpretadas como capricho pessoal e arbitrário.

Inequívoco que a escolha pelo sistema processual penal acusatório e a implementação do sistema de livre convencimento motivado encontra-se compatível com o Estado democrático de direito. Não poderia ser de maneira diversa, uma vez que o Estado que preza pelos direitos humanos e pelas garantias fundamentais não poderia ter seu judiciário engessado pelo legislador e nem agindo em completo despotismo.

No Estado democrático de direito, em que a liberdade individual é reconhecida como premissa fundamental para a justa organização da sociedade, é evidente que as decisões penais, que incidem exatamente sobre o status libertatis do cidadão, só podem ser legitimadas por um saber resultante de procedimentos que permitam esclarecer os fatos sob a dupla ótica da sociedade e do indivíduo: é preciso que as hipóteses acusatórias sejam verificadas, pois sem a existência de provas concludentes não se poderá superar a presunção de inocência do acusado; mas é igualmente necessário que essas mesmas provas sejam produzidas com a participação e o controle da defesa e, ainda, que possa haver contraprova. (GOMES FILHO, 1997, p. 55)

Assim, posto que a República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, como o disposto no art. 1º da Constituição Federal, compatibiliza-se com a escolha pelo sistema do livre convencimento motivado do juiz pelo ordenamento em questão, pois assim atende aos direitos fundamentais elencados em sua estrutura.

Em exceção à regra, temos o Tribunal do Júri, no qual o sistema adotado é o da íntima convicção, não necessitando os jurados motivarem suas decisões. Acontece que, essa escolha se faz justificável, uma vez que o plenário do Júri é composto por civis, sem exigência de formação acadêmica especifica e com a característica de transitoriedade.

A consciência do juiz togado, diferente do juiz de fato, no Tribunal Popular do Júri, não pode fazer uma valoração diante de si mesma, de sua concepção social e humana de justiça, mas a sua decisão deve decorrer da correlação entre consciência e prova, livre convencimento e inserção no âmago ou conteúdo das provas produzidas. (MADEIRA, 2003, p. 21)

Além do mais, também importa destacar que possuímos alguns resquícios do sistema de prova tarifada, nos artigos 158 e 155, parágrafo único, do CPP, que estabelece algumas restrições à liberdade judicial.

Com vista do exposto, os mecanismos probatórios “visam à formação e à justificação do convencimento judicial” e “somente a concreta apreciação da prova, verificável pela motivação da sentença, assegura a efetividade do direito à prova” (GOMES FILHO, 1997, p. 89), assim condicionando a liberdade do juiz ao aparato probatório legal.

Desse modo, conclui-se que a fundamentação é indispensável, pois “com a progressiva tendência de constitucionalização das garantias processuais”, cumpre “tanto funções processuais – como, v.g., a referente às impugnações –, como extraprocessuais ou políticas, relacionadas ao controle popular sobre a atuação dos órgãos estatais” (GOMES FILHO, 1997, p. 163).

Isto posto, temos então que o “livre convencimento é sobretudo convicção fundamentada”, devendo ser um “convencimento transparente, justificado perante as partes e a sociedade”, como sustentado por Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 163), esse que preleciona também acerca da motivação:

É por meio dela que será possível distinguir a decisão arbitrária, fruto exclusivo do poder, daquela amparadas pela prova capaz de superar a presunção de inocência do acusado, ou seja, resultante de um saber; só através da indicação da decisão será viável constatar a existência de um nexo entre o convencimento e as provas produzidas. (1997, p. 164)

Aqui, importa realizar breve questionamento invólucro a discussão precípua desse trabalho, uma vez que essa motivação, indispensável a validade das decisões, encontra guarita na linguagem escrita, isto é, linguagem verbal possível de escrituração.

Desse modo, como poderia o juiz, limitado a essa prática, utilizar-se da leitura de aspectos não verbais para motivação de suas decisões? Isso tornaria a sentença nula? Será possível o amparo de técnicas confiáveis que possam embasar tal prática sem se dar margem a discricionariedade desmedida da autoridade judicial? Esses são apenas alguns dos questionamentos que permeiam a discussão, porém serão melhores abordados em capítulo ulterior.

Dando continuidade à temática das “provas” no processo penal, abordaremos então as provas orais em espécie, essas que são as diretamente relacionadas com o tema proposto nesta elaboração acadêmica.

 As Espécies de Provas Orais

A prova, como já ponderado em momento anterior, possuí como uma de suas acepções a de instrumento para a comprovação das alegações formuladas pelas partes processuais. Assim, seriam os meios disponíveis, tanto a defesa como a acusação, durante o processo, para validar suas afirmações.

No Código de Processo Penal, diversos são os artifícios possíveis para comprovação dos fatos alegados, porém, apresenta o texto legal apenas um rol exemplificativo, havendo a viabilidade de outras serem utilizadas, desde que respeitada a vedação às provas ilícitas e ilegítimas. Nessa perspectiva, temos que, “ao lado de um verdadeiro direito à incorporação de provas” pôde-se também falar “em um direito à exclusão das provas que não atendam aos requisitos da legalidade” (GOMES FILHO, 1997, p. 40).

Desse modo, dentre as espécies probatórias elencadas, destacaremos as de cunho oral, uma vez que essas possuem ligação direta com a linguagem não-verbal, pois se referem a relação entre seres humanos (juiz e ofendido; juiz e acusado; juiz e testemunha) e, consequentemente, com evidente participação da subjetividade, o que se difere, por exemplo, de provas documentais e exame periciais, que tem como principal característica a objetividade.

Portanto, iremos abordar as seguintes provas em espécie: a) declarações do ofendido; b) prova testemunhal; e, c) interrogatório do acusado. Também iremos transpassar a confissão e a acareação, porém em caráter supletivo. A sequência de análise seguirá a estabelecida na instrução probatória, com exceção as duas últimas, uma vez que a primeira pode se dar em qualquer momento e a segunda, em regra, dar-se antes do interrogatório, porém realocado para melhor discorrer, pois não é foco desse trabalho.

Importa também informar a abordagem principiológica examinada em cada uma das espécies, em separado, nas quais alguns princípios possuem maior preponderância. Apresentada essa metodologia, prosseguimos com o estudo das provas em espécie.

Declarações do Ofendido

O ofendido é a vítima da infração, isto é, aquele que tem o bem jurídico lesado. Assim, temos um envolvimento direto e inerente desse com a situação apurada no processo, o que o difere de uma testemunha e, consequentemente, desencadeia prerrogativas próprias.

Visto que o ofendido é um espectador do fato em averiguação, mas suas declarações não são enquadradas como prova testemunhal, evidencia-se que sua versão dos fatos possui natureza probatória, porém não se sujeitando ao compromisso com a verdade e, muito mesmo, podendo responder como autor do crime de falso testemunho.

As declarações prestadas são de valor probante relativo frente ao sistema do livre convencimento motivado do juiz adotado em nosso ordenamento, porém em circunstâncias específicas, elas ganham um maior destaque. Em exposição, Renato Brasileiro (2018, p. 702):

Em virtude do sistema da livre persuasão racional do juiz, tem-se que o valor probatório das declarações do ofendido é relativo. Logicamente, nos crimes cometidos às ocultas, a palavra da vítima ganha um pouco mais de importância, mas daí não se pode concluir que seu valor seria absoluto. É o que acontece, por exemplo, em crimes contra a dignidade sexual, geralmente cometidos em locais ermos, sem testemunhas presenciais, etc., hipótese em que as declarações da vítima se revestem de especial relevância.

A parte que trata desse meio de prova no Código de Processo Penal é breve e recebeu nova abordagem com a lei nº 11.690 de 9 de junho de 2008, essa que elencou prerrogativas ao ofendido que antes não se faziam presentes. Assim, com essa nova roupagem legal, a vítima passou a receber maior atenção por parte do Estado, adquirindo também maior protagonismo na relação processual. Desse modo, nos dizeres de Nestor Távora e Rosmar Alencar (2016, p. 707):

A Lei nº 11.690/08 deu novo tratamento à figura do ofendido, tentando resgatar décadas de esquecimento para com a vítima, que deve ser tratada não apenas como mais um meio de prova, e sim como pessoa que merece proteção e amparo do Estado, não só quanto às pretensões materiais e resguardo individual, mas também para que não seja atingida pelos efeitos diretos e indiretos do processo, como a exposição à mídia, traumas psicológicos, risco a integridade física, dentre outros.

Por fim, ressalta-se a necessidade de que suas declarações devam ser dar “sob o crivo do contraditório, sob pena de violação ao preceito do art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal” (LIMA, 2018, p. 701), uma vez que todas as provas devem cumprir com tal exigência.

Prova Testemunhal

Diferentemente do ofendido, a testemunha é considerada “pessoa desinteressada que declara em juízo o que sabe sobre os fatos, em face das percepções colhidas sensorialmente” (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 708). Aquele que presta testemunho é, presumidamente, imparcial e alheio ao conflito apurado no processo, o que acarreta na necessidade de comprometimento com a verdade.

Além do mais, importa destacar que o CPP elenca exceções à necessidade de compromisso com a imparcialidade e a verdade em seu art. 208, tendo então que esse “é uma obrigação imposta, em regra, às testemunhas, e não elemento inerente ao próprio conceito” (REBOUÇAS, 2017, p. 600). Nesse sentido, interessante diferenciação realiza o autor Sérgio Rebouças (2017, p. 600):

Distinguimos, assim, as testemunhas compromissadas das testemunhas não compromissadas. A entender-se, porém, como parte da doutrina, que o compromisso integra a essência do conceito em foco, deve ser particularizada a figura do informante, como categoria diversa da testemunha. Informante, assim, é a testemunha que não presta compromisso.

Conforme a doutrina, a prova testemunhal é composta por algumas características: judicialidade, oralidade, objetividade, retrospectividade e individualidade.

A judicialidade configura-se com a imprescindibilidade de produção em juízo, isto é, o depoimento deve ser prestado perante o magistrado. Nessa perspectiva, Renato Brasileiro (2018, p. 702) complementa:

Logo, ainda que determinada pessoa tenha sido ouvida em fase investigatória, seja n o curso de um inquérito policial, seja durante um procedimento investigatório criminal presidido pelo Ministério Público, seu depoimento deverá ser reproduzido em juízo, a fim de se fazer observar os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Claro que tal característica é de evidente necessidade, uma vez que já apresentamos anteriormente a diferenciação entre provas e elementos informativos, sendo aquelas indispensavelmente produzidas com o exercício do contraditório para que sejam válidas e possíveis de utilização pelo magistrado como motivação de suas decisões.

 Já em relação à oralidade, temos a prevalência da palavra verbalmente professada. Assim, o “depoimento deve ser prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito” (LIMA, 2018, p. 703), entretanto, pode a testemunha realizar breve consulta em apontamentos como elucida o art. 204 do CPP, como também o código apresenta exceções, por exemplo, no caso de mudos e surdos-mudos (art. 223, parágrafo único, combinado com o art. 192, ambos do CPP).

A objetividade refere-se à necessidade de a testemunha relatar os fatos que teve ciência por suas percepções sensoriais, sem emitir juízo de valor, ou seja, sem exprimir opinião pessoal. Dessarte, Renato Brasileiro de Lima (2018, p. 703) excetua:

Logicamente, em determinadas situações, sua opinião será indissociável de sua narrativa. É o que acontece, por exemplo, em um crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, quando a testemunha relata a suposta velocidade em que se encontrava o veículo dirigido pelo acusado. Nesse caso, não há como afastar sua apreciação subjetiva.

Outro aspecto da prova testemunhal é a retrospectividade, uma vez que a testemunha irá narrar sobre fatos pretéritos de que tenha conhecimento. E, por fim, temos a individualidade, essa que se caracteriza pela inquisição das testemunhas em separado, evitando-se que umas tenham contato com as informações prestadas pelas outras, garantindo a incomunicabilidade entre elas.

Renato Brasileiro de Lima (2018) descreve como deveres das testemunhas o de depor, de comparecimento, de prestar compromisso de dizer a verdade e o de comunicar mudança de residência.

No que se refere ao dever de depor, temos que “toda pessoa poderá ser testemunha” e, em regra, “não poderá eximir-se da obrigação de depor” conforme disposto nos arts. 202 e 206 do CPP, respectivamente. Algumas exceções são apresentadas no próprio art. 206, nos qual elenca pessoas que não são obrigadas a prestar depoimento, assim podendo realizar a recusa, ipsis litteris:

Art. 206.  A testemunha não poderá eximir-se da obrigação de depor. Poderão, entretanto, recusar-se a fazê-lo o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias.

O dispositivo anteriormente citado “tem como objetivo precípuo preservar a harmonia familiar, evitando que pessoas ligadas por laços de parentesco ou conjugais sejam obrigadas a depor em detrimento de seus entes próximos” (LIMA, 2018, p.704). Outra exceção indicada na legislação seria a das pessoas proibidas de depor, conforme o art. 207 do CPP:

Art. 207.  São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.

Acerca do dever de comparecimento, “se a testemunha foi regularmente intimada, tem o dever de comparecer em juízo para prestar seu depoimento no local, dia e hora designados” (LIMA, 2018, p. 705). Além do mais, caso não compareça e nem justifique sua ausência, poderá ser conduzida coercitivamente (art. 218, CPP), multada, responsabilizada pelo crime de desobediência e, ainda, pode ser condenada ao pagamento das custas da diligência para trazê-la (art. 219 c/c art. 458, ambos do CPP).

Sobre o dever de comunicar mudança de residência, esse possui amparo no art. 224 do CPP e estabelece que “as testemunhas comunicarão ao juiz, dentro de um ano, qualquer mudança de residência, sujeitando-se, pela simples omissão, às penas do não-comparecimento”.

Por fim, a testemunha também tem como dever o de dizer o que sabe, como evidenciado no art. 203 do CPP, nestas palavras:

 Art. 203.  A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado, devendo declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade.

Acontece que o compromisso legal a que se submente a testemunha não decorre desse dispositivo e sim em decorrência do art. 342 do Código Penal que tipifica o crime de falso testemunho. Nesse sentido, Renato Brasileiro (2018, p. 708):

De todo modo, é bom que se diga que o compromisso legal de dizer a verdade não decorre do ato de a testemunha prestar compromisso legal, previsto no art. 203 do CPP, cuja natureza é meramente processual e o valor jurídico é o de mera exortação, mas decorre do tipo penal do falso testemunho (art. 342 CP).

Sobre tal tipificação, indaga-se a possibilidade de uma testemunha ter sua conduta enquadrada a partir de uma contradição entre linguagem verbal e não-verbal. Assim, em capítulo posterior, o assunto será retomado, mas vale ao leitor iniciar a reflexão a respeito do assunto com a apresentação de algumas informações gerais acerca do delito.

Falso Testemunho

O crime de falso testemunho ou falsa perícia é tipificado no art. 342 do Código Penal – CP e pretende através desse “resguardar o prestígio da Justiça” (CUNHA, 2018, p. 942). Assim, temos a seguinte redação:

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1º As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta.

§ 2° O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.

Tal proteção ao processo, em particular o judicial, tem por finalidade evitar que o magistrado seja induzido ao erro por informações incorretas ou, ainda, pela omissão de fatos relevantes para a solução dos conflitos perante a justiça. Nessa perspectiva, Rogério Sanches Cunha (2018, p. 942):

Nessa conjuntura, exatamente porque nas provas pericial e testemunhal encontra a sentença, em regra, o histórico dos fatos (base à decisão), necessário se fazia que o Direito cercasse a perícia e o testemunho com todas as garantias possíveis, impedindo pareceres e depoimentos levianos e mendazes, campo fértil para provocar o erro judicial.

Segundo a doutrina, esse delito é tido como de mão própria, isto é, “só podendo ser praticado por quem, reunindo qualidades especiais, esteja em condições de realizar imediata e corporalmente a conduta típica dentro de um processo judicial ou administrativo, inquérito policial ou em juízo arbitral” (CUNHA, 2018, p. 943).

Temos que o legislador elencou 3 (três) ações admissíveis para que o crime possa ser consumado: fazer afirmação falsa, ou negar ou calar com a verdade. O crime de falso testemunho é, então, um crime de ação múltipla em que não apenas a conduta comissiva é punível, mas também a omissiva.

Aqui importa entender o que seria a verdade exigida no tipo penal. Segundo Rogério Sanches (2018, p. 945) “nada mais é do que a perfeita correspondência entre a realidade e sua expressão”. Desse modo, temos a exigência de os relatos prestados em juízo estarem em conformidade com a realidade, ou seja, que os fatos narrados pelas testemunhas correspondam, em sua integridade, com os que tiveram ciência por seus sentidos.

Acontece que a simples existência de discrepância não pode tipificar a conduta da testemunha, exigindo a presença do dolo, ou melhor, da consciência de que as informações prestadas não correspondem às que teve conhecimento. Explicita Rogério Sanches (2018, p. 945):

Nesse diapasão, a falta com a verdade pode decorrer, de um lado, de um defeito de percepção; de outro, da própria intenção de enganar. No primeiro caso, demonstrado que a afirmação falsa decorreu de erro ou ignorância, estará afastada a voluntariedade da ação. No segundo, porém – e aqui já se passa ao exame do elemento psíquico –, evidenciado que o agente era conhecedor da existência de um fato que posteriormente omitiu ou deturpou, ou da inexistência daquilo que forjou, o dolo aparece configurado com nitidez (RT 440/371, 498/293, 581/311).

Continua o autor com a exposição (2018, p. 945):

A falsidade, portanto, não se extrai da comparação do depoimento da testemunha e a realidade dos fatos (teoria objetiva), mas sim do contraste do depoimento e a ciência da testemunha (teoria subjetiva). Assim sendo, perfeitamente possível o falso testemunho sobre fato verdadeiro, como no caso do agente que detalha minuciosamente episódios verdadeiros (ocorridos) que jamais presenciou.

Vemos então que as informações prestadas pela testemunha podem discrepar, porém isso não significa, necessariamente, que aquela se encontra de má-fé. Questões como o tempo e, consequentemente, a memória, podem afetar diretamente os relatos.

Nítida que essa exigência de veracidade visa a obtenção da verdade real, princípio consagrado no processo penal desde outrora, porém recebendo nova significação nos dias atuais.

O Princípio da Verdade Real

No início da exposição acerca dos sistemas de avaliação da prova, ao diferenciar o sistema inquisitório do acusatório, descreveu-se brevemente que, no primeiro, existia uma busca da verdade real a todo custo, justificando e legitimando violações de direitos por parte do Estado, como por exemplo, a prática de tortura para obtenção da confissão.

A crença de que a verdade podia ser alcançada pelo Estado tornou a sua perseguição o fim precípuo do processo criminal. Diante disso, em nome da verdade, tudo era válido, restando justificados abusos e arbitrariedades por parte das autoridades responsáveis pela persecução penal, bem como a ampla iniciativa probatória concedida ao juiz, o que acabava por comprometer sua imparcialidade. (LIMA, 2018, p. 68)

Certamente tal princípio foi reformulado, recebendo uma nomenclatura diferente, a de busca da verdade, retirando-se o adjetivo “real” ou “material”. A expressão verdade ainda nos traz uma ideia de valor absoluto, contudo, encontra-se pacificado o entendimento pela impossibilidade de reconstrução completa dos fatos, que nos dizeres de Renato Brasileiro (2018, p. 68):

No âmbito processual penal, hodiernamente, admite-se que é impossível que se atinja uma verdade absoluta. A prova produzida em juízo, por mais robusta e contundente que seja, é incapaz de dar ao magistrado um juízo de certeza absoluta. O que vai haver é uma aproximação, maior ou menor, da certeza dos fatos. Há de se buscar, por conseguinte, a maior exatidão possível na reconstrução do fato controverso, mas jamais com a pretensão de que se possa atingir uma verdade real, mas sim uma aproximação da realidade, que tenda a refletir ao máximo a verdade.

Dessa forma, temos que “a verdade absoluta, coincidente com os fatos ocorridos, é um ideal, porém inatingível” (LIMA, 2018, p. 68) e que, mesmo sendo uma utopia processual, essa verdade deve continuar norteado o processo, pois é apenas através dela que se promove outro ideal do direito: o de concretização da justiça.

Tendo a atividade processual esse objetivo de reconstrução de fatos, encontra-se nessa um considerável desafio ao magistrado, como apresenta Antonio Magalhães Gomes filho (1997, p. 44):

Uma primeira e essencial dificuldade que se coloca ao juiz, na busca de um conhecimento verdadeiro a respeito dos fatos que serão levados em conta na decisão, é representada pela impossibilidade de observação direta dos mesmos; ao contrário do que ocorre nas ciências experimentais, em que o pesquisar pode ter um contato direto com fenômenos que se repetem na natureza, ou conta com o recurso de reproduzi-los em laboratórios, a atividade de investigação judicial se dirige a acontecimentos passados, cuja reconstituição somente pode ser alcançada a partir de meios indiretos; aliás, mesmo na hipótese pouco provável de ter assistido a algum desses eventos, estaria o juiz impedido de valer-se de seus conhecimentos pessoais, pois seria testemunha e não juiz.

Assim, o juiz jamais irá possuir a certeza dos fatos, porém, para que determine a condenação do acusado, aquele deve ter a convicção de que esse configurou como autor desses mesmos fatos. Diante disso, vemos uma diferenciação da busca da verdade real, princípio do processo e de alcance fictício, daquela certeza necessária ao julgador para que intitule o acusado como culpado.

Explica então Cândido Rangel Dinamarco (1993, p. 318):

A verdade e a certeza são dois conceitos absolutos e, por isso, jamais se tem a segurança de atingir a primeira e jamais se consegue a segunda, em qualquer processo (a ‘segurança jurídica’, como resultado do processo, não se confunde com a suposta certeza, ou ‘segurança’, com base na qual o juiz proferiria os seus julgamentos). O máximo que se pode obter é um grau muito elevado de probabilidade, seja quanto ao conteúdo das normas, seja quanto aos fatos, seja quanto à subsunção destes nas categorias adequadas.

Isto posto, evidente que, durante o processo, diversas narrativas são tidas como possíveis, e assim, consequentemente, diversas podem ser as conclusões findadas pelo juiz. Dessa maneira, a sentença proferida pelo magistrado acolhe uma dessas narrativas, elegendo a que lhe convence da veracidade ou, em caso de dúvida, deverá absolver o réu (princípio in dubio pro reo).

Dessa forma, fica evidente que todas as provas orais possuem o atributo de remodelar o rumo das narrativas processuais, uma vez que uma mesma história pode ser relatada e interpretada de diferentes perspectivas.

No jogo processual, para além da regulamentação da partida, a atuação dos sujeitos na construção da prova e da sentença consubstancia aspectos fundamentais como o tempo, a memória, o movimento, a fixidez, a criatividade, a subjetividade, os quais o Direito, isoladamente, sequer consegue identificar. A dissonância entre as idéias que norteiam a teoria e prática jurídica ante os estudos realizados em outros campos do saber evidência a insustentabilidade da verdade como meta da atividade instrutória, o que possibilitaria pensar a sentença penal não como "o" relato, mas como "um" relato. (PLETSCH, 2007, p. 15).

Por fim, temos que a prova testemunhal “consubstancia a instrução oral por excelência”, porém sendo também “dos mais frágeis e falíveis, por estar sujeito a manipulações, interesses e equívocos, o que reclama particular cuidado na apreciação (valoração) judicial” (REBOUÇAS, 2017, p. 601).

Nessa lógica, fica perceptível que não se pode acatar os testemunhos como narrativas verossímeis por completo, uma vez que esses podem ser persuadidos por diversos fatores, como em todas as provas orais.

Interrogatório do Acusado

Da mesma forma que o ofendido não presta o compromisso com a verdade, por estar envolvido diretamente com situação apurada em juízo, o acusado também não precisa cumprir tal exigência. Com isso, temos que as informações prestadas pelo acusado não precisam estar em congruência com a veracidade dos fatos.

Não poderia o ordenamento dispor de maneira diversa, uma vez que o réu pode eximir-se da produção de prova, pois não pode ser obrigado a produzir prova contra si mesmo, não havendo então motivo para a vedação às declarações que melhor lhe convier.

Logo, o interrogatório, além de ser tido como um meio de prova processual, também se caracteriza como meio de defesa, assim explicitado nas palavras de Ronaldo Tanus Madeira (2003, p. 73):

O interrogatório é o momento processual em que o juiz ouve a versão do acusado sobre os fatos a ele imputados e narrados na denúncia. Estando situado em nosso Código de Processo Penal no Capítulo sobre a prova, é considerado sob dois aspectos, meio de prova e meio de defesa, pois é a oportunidade que o réu tem de contestar ou negar os fatos a ele atribuídos e configuradores da tipicidade penal.

Assim, quando o acusado decide manifestar-se no interrogatório, oferece ao magistrado outro ponto de vista da narrativa construída no processo, podendo coincidir com os demais panoramas apresentados ou lançar um completamente diverso.  Nos dizeres do autor Sérgio Rebouças (2017, p. 636):

Nesse contexto, o interrogatório traduz a oportunidade processual de exercício, pelo acusado, de sua autodefesa perante o órgão judiciário, o que inclui, portanto, o direito de presença e o de audiência perante o juiz. Interrogatório, assim, é o ato judicial pelo qual se ouve o acusado a respeito de uma hipótese acusatória e, portanto, de uma imputação de crime contra ele formulada.

Apresenta-se então o acusado rodeado de diversas garantias, essas que refletem diretamente no momento do seu interrogatório pois, uma vez violadas, acarretam a nulidade absoluta do processo.

Princípio da Ampla Defesa

A ampla defesa é um princípio-garantia do acusado. Ela é composta pela defesa técnica e a autodefesa, sendo a primeira indisponível e representada por seu defensor (público ou privado), e a segunda relaciona-se com o direito de audiência e o de direito a presença, que nas palavras de Ada Grinover, Antônio Scarance Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho (2006, p. 88):

Com relação à autodefesa, cumpre salientar que se compõe ela de dois aspectos, a serem escrupulosamente observados: o direito de audiência e o direito de presença. O primeiro traduz-se na possibilidade de o acusado influir sobre a formação do convencimento do juiz mediante o interrogatório. O segundo manifesta-se pela oportunidade de tomar ele posição, a todo momento, perante as alegações e as provas produzidas, pela imediação com o juiz, a razão e as provas.

Esse princípio possui amparo no ordenamento brasileiro no art. 5º, inciso LV, da Carta Magna. Por conseguinte, acaba por acarretar diversos outros direitos ao réu, como, v.g., o de possível ajuizamento de revisão criminal quando nova prova comprove sua inocência, essa revelada após o trânsito em julgado da decisão condenatória.

Como outro desdobramento dessa garantia constitucional, temos o de verificação, pelo magistrado, da eficiência da defesa. Assim, constatado a inaptidão do defensor, deve o juiz desconstituir o advogado nomeado pelo acusado, fazendo-o eleger um outro ou nomeando um dativo caso não o faça.

A ampla defesa também possibilita a admissão de provas ilícitas em juízo, de forma excepcional, caso essas sejam obtidas em favor do acusado e que promovam sua inocência. Assim, tanto o desentranhamento das provas tidas como ilegais como também a aceitação dessas em favor do acusado, demonstram a existência do necessário sopesamento de valores pelo juiz, que segundo Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 106):

Mas, por outro lado, são semelhantes considerações a respeito da ponderação de interesses que autorizam a admissão da prova ilícita pro reo: no confronto entre uma proibição de prova, ainda que ditada pelo interesse de proteção a um direito fundamental, e o direito à prova da inocência parece claro que deva este último prevalecer, não só porque a liberdade e a dignidade da pessoa humana constituem valores insuperáveis, na ótica da sociedade democrática, mas também porque ao próprio Estado não pode interessar a punição do inocente, o que poderia significar a impunidade do verdadeiro culpado; (...)

Resta evidente que o princípio em tela tem por fundamento a necessidade de um devido processo legal, viabilizando o acesso à justiça e a concretização dessa no desfecho judicial. Desse modo, não pode o processo permitir que recaia sobre o acusado o ônus da comprovação, pelo contrário, a esse possibilita-se o direito de não produção de provas incriminadoras contra si.     


Princípio da Inexigibilidade de Autoincriminação

Esse princípio relaciona-se diretamente ao princípio da presunção de inocência e o com o direito ao silêncio, ambos elencados no rol de garantias do art. 5º da Constituição Federal, nos incisos LVII e LXIII, respectivamente.

A inexigibilidade de autoincriminação ou nemo tenetur se detegere “assegura que ninguém pode ser compelido a produzir prova contra si mesmo” (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 95) e assim, “não ser compelida a declarar contra si mesma nem a participar ativamente, mediante ato que equivalha a um testemunho, da produção de prova que a possa incriminar” (REBOUÇAS, 2017, p. 116).

 Implica destacar explanação do doutrinador Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 113):

Embora aludido ao preso, a interpretação da regra constitucional deve ser no sentido de que a garantia abrange toda e qualquer pessoa, pois diante da presunção de inocência, que também constitui garantia fundamental do cidadão (art. 5.º, inc. LVII, CF e, ainda, Convenção Americana sobre Direitos Humanos, art. 8.º, § 2.º), a prova de culpabilidade incumbe exclusivamente à acusação. Em decorrência disso, são incompatíveis com os referidos textos quaisquer disposições legais que possam, direta ou indiretamente, forçar o suspeito, indiciado, acusado, ou mesmo qualquer pessoa (inclusive a testemunha) a uma auto-incriminação.

À vista disso, a discussão acerca da possibilidade de incriminação, da testemunha, no crime de falso testemunho advinda de contradição de linguagem verbal e não verbal ganha razão, uma vez que a inexigibilidade de autoincriminação abrange a todos, inclusive a testemunha.

Em remate, o aludido princípio acoberta, pelo sentido e alcance, três dimensões protetivas, segundo Sérgio Rebouças (2017, p. 119):

(i) direito de não declarar, previsto na Constituição e nas normas internacionais como direito ao silêncio, que se integra, em última análise, no próprio marco da ampla defesa – aqui se resguarda o indivíduo de qualquer declaração sobre a hipótese acusatória, evitando-se o mais remoto risco de que diga algo que lhe possa incriminar; (ii) direito de não declarar contra si mesmo, que expressa uma dimensão mais aproximada e diretamente referida à não autoincriminação; (iii) direito de não se confessar culpado, em que se identifica, de forma direta, a proibição de que o silêncio do imputado seja interpretado como confissão tácita ou tenha qualquer interferência sobre o convencimento do julgador – aqui se inclui a vedação de que o acusador faça referência, sobretudo perante jurados (leigos), ao silêncio do imputado como se fosse uma assunção de culpa.

Importa destacar que o direito ao silêncio também apresenta liame com o princípio da ampla defesa anteriormente indicado, pois o seu exercício não pode configurar em prejuízo ao réu, podendo esse até interessar para a tutela do mesmo.

Confissão e Acareação

A confissão “é a admissão por parte do suposto autor da infração, de fatos que lhe são atribuídos e que lhe são desfavoráveis” (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 683), devendo ainda ser “ato pessoal, voluntário, expresso e formal” (REBOUÇAS, 2017, p. 652).

Como qualquer outra prova, a confissão possui valor probatório relativo, devendo estar em conformidade as outras produzidas no processo, uma vez que a confissão não tem “aptidão para desconstituir o ônus, a recair exclusividade sobre o órgão acusador, da prova da existência material e autoria do fato” (REBOUÇAS, 2017, p. 655) e, por conseguinte, completa o autor:

Caso subsistente ao final do processo apenas a confissão, sem qualquer outro elemento de prova que a respalde, o acusado deverá ser absolvido, uma vez que, nessa hipótese, o acusador não se desincumbiu do ônus de demonstrar a autoria ou a participação do imputado no fato. (2017, p. 656)

A confissão também não pode suprir o exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, como disposto no art. 158 do CPP, exatamente pelo anteriormente apresentado, pois o ônus de comprovação do fato deve recair exclusivamente sobre a acusação.

Já no que se refere a acareação, temos, nos dizeres de Julio Fabbrini Mirabete (2006, p. 311):

Acarear (ou acoroar) é pôr em presença uma da outra, face a face, pessoas cujas declarações são divergentes. A acareação é, portanto o ato processual consistente na confrontação das declarações de dois ou mais acusados, testemunhas ou ofendidos, já ouvidos, e destinado a obter o convencimento do juiz sobre a verdade de algum fato em que as declarações dessas pessoas forem divergentes.

Disposta no art. 229, caput, do CPP, o meio de prova em questão apresenta-se com a seguinte redação:

Art. 229.  A acareação será admitida entre acusados, entre acusado e testemunha, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, e entre as pessoas ofendidas, sempre que divergirem, em suas declarações, sobre fatos ou circunstâncias relevantes.

Tanto a confissão como a acareação apresentam relação com a matéria de estudo desse trabalho, uma vez que sendo ambos meios de prova oral, são indissociáveis da linguagem corporal. Na primeira, temos que a oralidade é um requisito de validade, só podendo ser realizada diante do juiz para evitar possíveis violações a garantias. Já na acareação, pode haver sua produção por meio de precatória, como elencando no art. 230 do CPP, porém, resta prejudicada, pois a linguagem não-verbal possui tanto valor, ou até mais, do que a linguagem verbal, mesmo que sua utilização como fundamentação pelo juiz ainda esteja em pauta de discussão.

            Importância da Linguagem Corporal nas Provas Orais

As provas orais são de extremada importância para o processo, mesmo não havendo tarifação de valor probatório, pois, em situações excepcionais, vemos que a prova oral ganha maior destaque, como na impossibilidade de exame de corpo de delito por motivo de desaparecimento de vestígios, em que a prova testemunhal passa a supri-lo (art. 167, CPP).

É claro que o mérito das referidas provas não se encontra apenas nessas situações atípicas, mas em todos os processos, uma vez que essa prova sempre se faz presente em alguma de suas espécies, não existindo processo que não tenha ofendido, testemunha e, principalmente, acusado.

Assim, as declarações do ofendido podem não acontecer, por exemplo, no crime de homicídio. Com também pode o processo desenrolar-se apenas com provas de cunho concreto, como com a prova documental. Mas sempre, em todos os processos, teremos o acusado. Pode ser que esse não exerça sua autodefesa, renunciando aos direitos de audiência e presença, mas sempre será possível seu exercício.

Dessa forma, temos que a prova oral é inerente ao processo, o que não poderia configurar de maneira diversa, pois o direito, como já visto, é fruto das relações humanas, sendo o processo composto de atos e procedimentos realizados pelas próprias pessoas.

Com isso, vemos que a linguagem não-verbal é incessante na coleta de prova oral, apresentando influência na narrativa escolhida na sentença e devendo, portanto, pautar mais debates acerca de sua relevância e utilização no processo.


APLICAÇÃO DA LINGUAGEM NÃO-VERBAL NA COLETA DE PROVA ORAL

A linguagem não-verbal, como inseparável das provas orais coletadas no processo, deve receber devida atenção, não apenas em relação aos meios de provas, como também a existência de um juiz humano, esse que precisa motivar sua decisão, porém, antes, necessita formar sua convicção pessoal. Assim, vemos que “entre a prova e a decisão, interferem inúmeros fatores de natureza objetiva e subjetiva. Principalmente subjetiva.” (MADEIRA, 2003, p. XI).

Desta forma, diversos questionamentos passam a circundar o direito positivado, acarretando o rompimento do ideal de conceitos há muito consagrados no Direito, como, por exemplo, a imparcialidade do juiz e a própria busca da verdade, essa já destacada anteriormente.

Impossível ao juiz, como ser humano, desenvolver uma livre convicção sem que fatores subjetivos interfiram, esses advindos tanto de sua vivência pessoal, como as externadas pelas partes em juízo e pelos colaboradores da justiça, isto é, as testemunhas.

Acontece que a subjetividade ainda atormenta aos juristas, evitando esses, ao máximo, instigar discussões acerca do assunto para não desacreditar, ainda mais, a atividade jurisdicional. Nesse sentido Natalie Ribeiro Pletsch (2007, p.12):

Os papéis dos sujeitos - o conjunto probatório e a decisão judicial - raramente têm sido confrontados com o ideal de verdade. Na prática, perdura o ideal da ciência moderna que despreza a subjetividade e confia no potencial da racionalidade humana para o conhecimento imaculado. Assim a atividade jurisdicional é considerada apta para captar "o" passado e, reunindo os esforços dos atores processuais, reconstruir o "real", ainda que imperfeitamente.

O questionamento, porém, que esse trabalho tenta iniciar, ou pelo menos faiscar, envolve a possibilidade de utilização dessa linguagem não-verbal, que influencia na convicção do magistrado, mas que se encontra intrinsecamente ligado a subjetividade, na fundamentação das decisões judiciais.

Instaura-se então indagações: como o juiz irá transferir informações visuais, característica da linguagem não-verbal, para a verbal? As técnicas atuais de leitura de linguagem corporal são confiáveis? E a segurança jurídica do processo? Como fica a discricionariedade do juiz nessas situações?

 A Busca da Verdade onde impera a Subjetividade

A verdade já foi apontada como finalidade precípua do processo penal, justificando excessos absurdos por parte do Estado, que atuando como acusador e juiz, reduzia o acusado a mero expectador de uma peça com final já conhecido pelo público.

Com isso, temos que “a verdade serviu tanto para justificar os piores excessos do poder penal (a tortura sistemática) como para construir os limites que buscam preveni-los” (BINDER, 2003, p. 46, apud PLETSCH, 2007, p. 57). Diferente da inquisição, temos que:

No modelo garantista, ao contrário, a preocupação está em assegurar a paridade de armas para que a acusação e defesa estejam em equivalentes condições de debater, ou seja, comprovar suas teses e refutar as alegações contrárias. A verdade é apenas uma meta, e, na tentativa de aproximação, devem ser respeitados os direitos e garantias individuais. (PLETSCH, 2007, p. 118)

  • outrora apresentado, temos que “com a valoração de todos os fatos produzidos no processo, o juiz, através do seu livre convencimento, obtém a verdade jurídica que se traduz na descoberta da vida real”, sendo a sentença penal “a aplicação do direito ao fato produzido no processo, que denominamos de verdade real” (MADEIRA, 2003, p. 02).

Assim, importa recordar que a verdade real (absoluta) não encontra mais amparo frente às diversas modificações garantistas ocorridas em nosso ordenamento, sendo de maneira preferível substituída pela verdade processual (relativa), essa que se desenvolve com o decorrer do processo e que sim, tenta se aproximar da veracidade dos fatos, mas que não a utiliza como finalidade primordial.

A reflexão sobre a verdade, ou a impossibilidade de verdade, na atividade processual contribui para fortalecer os limites do Estado na persecução penal, estabelecendo o procedimento probatório, as exigências para comprovação do fato narrado na denúncia, os critérios para a solução do caso penal. (PLETSCH, 2007, p. 58)

Essa impossibilidade de alcance da verdade absoluta é intrínseca à própria atividade processual, uma vez que os fatos trazidos para discussão em juízo datam de um passado e, assim, sendo revivido pelo “tempo presente”, já se encontram vinculados a esse, alterando substancialmente suas características, isto é, a própria técnica do reescrever está pautada na subjetividade.

Dessa forma, temos que “a reconstrução mnemônica do passado, com frequência, diz mais sobre o presente “, esse em que se dá a reconstrução, do que sobre o passado em si, “o qual, a rigor, não pode ser verificado fácticamente, senão sob a ótica e o filtro da reconstrução, isto é, do presente” (SOARES e GUINDANI, 2005, p. 49, apud PLETSCH, 2007, p. 25).

A verdade, mesmo não sendo mais considerada o objetivo crucial do processo, ainda deve elencar o rol de finalidades almejadas, pois tem função essencial para a legitimação desse perante a sociedade e, sem a qual, o Estado atuaria em completa arbitrariedade, desconstruindo o lema originário do direito de “proteção aos bens jurídicos”, conforme bem elucida Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 172):

Embora a obtenção de uma verdade absolutamente correspondente à realidade dos fatos seja incompatível com a própria natureza da atividade processual, a sua procura constitui, inegavelmente, um valor a ser perseguido. No Estado democrático de direito, somente as decisões fundadas no conhecimento dos fatos podem legitimar as restrições à liberdade pessoal; mas, para ser efetivamente imparcial, na qual as preposições acusatórias não somente sejam plenamente comprovadas, mas também que os procedimentos respectivos sejam realizados com a participação e o controle da defesa e, ainda, que possa haver contraprova.

Visto que a verdade, não mais absoluta e sim relativa, decorre de uma reconstrução de fatos, esses necessários a legitimidade da atividade processual, e que são afetados por características subjetivas dos envolvidos, temos que “a apreciação da prova no processo penal está permeada pela subjetividade do julgador" (PLETSCH, 2007, p. 16). Assim, não se tem como desassociar do processo as características íntimas e próprias dos envolvidos, em especial as do magistrado.

Nesse sentido, completa Natalie Ribeiro Pletsch (2007, p. 114):

Desde a formação acadêmica do magistrado, seu contexto sociocultural, suas relações familiares, sua situação econômica, sua história pessoal repercute na atividade jurisdicional, mesmo as mais singelas e aparentemente insignificantes preferências ou preconceitos "afetam a memória ou a atenção do julgador e influem sobre a credibilidade das testemunhas ou das partes". Tais percepções ecoam no relato final do julgador ou mesmo no direcionamento que este confere à formação da prova.

O processo não pode e nem deve abster-se dessa discussão, pois “para além das tentativas de exclusão, a subjetividade estará sempre presente nos atos decisórios" (PLETSCH, 2007, p. 112), devendo o jurista, ao invés de vedar seus olhos para esse fato, reconhece-lo e buscar integra-lo da maneira mais benéfica possível a atividade jurisdicional. Adepto desse entendimento, Alexandre Morais da Rosa (2004, p. 288):

[...] ir ao encontro do um-juiz humano, portador de uma subjetividade que opera dentro da 'Instituição', para encontrar emoções, desejos, complexos, é um caminho rumo à democratização do ato decisório. Não se trata, evidentemente, de eclipsar seu lugar, nem de aceitar a decisão consensual entre as partes envolvidas sobre o 'caso penal', muito menos de adotar uma 'psicologia do eu'. Cuida-se de reconhecer a influência do inconsciente do um-julgador no momento do ato decisório, uma vez que 'não tem sentido manter uma venda nos olhos para fazer de conta que o problema não existe'.

A subjetividade não deve ser rechaçada, uma vez que, “para julgar um ser humano, o juiz precisa ser cada vez mais humano” e, talvez, “o excesso de técnica” exigido dele acaba por “distanciá-lo desse ideal” (Prado, 2013. p. 20).

Reconhecendo a falibilidade da reconstrução dos fatos e, principalmente, a interferência inerente da subjetividade do juiz na prolação das decisões, confirmamos a ideia de que a sentença seleciona apenas uma narrativa dentre várias possíveis.

Assim, vemos o magistrado como um participante da produção de provas, mesmo que indiretamente, uma vez que ao estabelecer sua convicção, acabar por buscar os pontos convergentes e possíveis de fundamentação da sentença. Desse modo, o juiz movimenta-se através das possíveis narrativas e, certamente, “não há movimentação neutra: sempre há de se escolher em que caminho seguir” (PLETSCH, 2007, p. 67).

Essa movimentação tendenciosa do magistrado é mais evidente quando esse realiza, de oficio, diligencias para dirimir dúvida sobre ponto relevante, conforme possibilidade disposta no inciso II, do art. 156 do CPP. Nesse caso, essa quebra da isenção judicial é mais patente, pois, em regra, essa ruptura aconteceria de forma velada.

Temos, então, que “o juiz vai à audiência sem um conhecimento prévio dos fatos e essa desinformação é propositadamente disposta como instrumento de garantia da imparcialidade” (GOMES FILHO, 1997, p. 70). Porém, em regra, a partir de um certo momento, o juiz já se encontra convencido de algum posicionamento, buscando apenas uma forma de explicar, através da linguagem verbal escrita, as suas motivações.

Sabemos que a linguagem não-verbal influi diretamente nessa tomada de posição do magistrado, afetando a subjetividade desse. Acontece que a comunicação corporal é essencialmente visual, tornando sua reprodução escrita, talvez, uma incompatibilidade inata.

 Subjetivismo Necessário

Com o advento da Lei nº 11.719/08 incluiu-se ao direito processual penal o princípio da identidade física do juiz, esse já aplicável na sessão de julgamento do Tribunal do Júri e no âmbito dos Juizados Especiais Criminais.

Porém, com sua normatização no parágrafo 2º, do art. 399 do CPP, proporcionou o “indispensável contato entre o acusado e o juiz, assim como a colheita imediata da prova por aquele que, efetivamente, irá proferir a decisão” em todos os procedimentos penais comuns, ipsis litteris:

Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente.

§ 1º O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação.

§ 2º O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. (grifo nosso)

Certamente, tal inclusão apresentou-se benéfica ao processo, sendo então enaltecida por Renato Brasileiro de Lima (2018, p. 656):

Louvável a introdução desse princípio no processo penal, já que, antes da reforma processual de 2008, era exatamente comum que um juiz interrogasse o acusado, outro ouvisse as testemunhas de acusação, outro as de defesa, com um quarto magistrado proferindo a sentença. Esse distanciamento entre prova e o magistrado prejudicava a formação de um quadro probatório coeso e harmônico, prejudicando um dos escopos do processo penal, que é a busca da verdade.

A introdução desse princípio ao processo penal não apenas contribui para a busca da verdade processual, como também contempla a ideia de que, o contato direto com as provas, em especial as orais, afeta a subjetividade do juiz, uma vez que se contrário fosse, não teria o porquê de se ter vinculada a figura do magistrado. Claro que essa vinculação não se dá de maneira absoluta, havendo exceções advindas de excepcionalidades, como no caso de promoção do juiz.

Dessa forma, a regra é a vinculação, essa que destaca os aspectos subjetivos da motivação e desencadeia pertinentes reflexões, por exemplo, se a discrepância entre julgamentos na 1ª instância e o grau recursal deriva da ausência de contato direto com as provas. Porém, em vista da complexidade necessária para esse estudo, tal analise não encontra espaço nesse trabalho, tentando esse apenas propor importantes discussões basilares da temática.

Dando prosseguimento, temos então que a necessária identidade física do juiz traz à tona a atinente subjetividade do magistrado na valoração das provas, reconhecendo que essa característica intima do magistrado possui relevância e atinge diretamente a motivação judicial.

 A Inserção de outros Saberes no Direito

A partir de tudo que foi discorrido, entendemos com maior nitidez a interferência causada no processo pela linguagem não-verbal, não apenas se encontrando presente, como também sendo indispensável na formação da sentença.

Seguindo esse entendimento, temos um caso em especial, no qual o Juiz Max Carrion Brueckner, da 6ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, dispensou uma testemunha alegando incompatibilidades entre sua comunicação verbalizada e a corporal. Temos então, em resumo, o disposto na Revista Eletrônica nº 186/2015 do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, em sua página 46:

Prova testemunhal. Imprestabilidade. Relevância da análise do juiz que colheu os depoimentos. Importância da linguagem não-verbal, cujo registro em ata não é possível. Atitude corporal que muitas vezes não corresponde à informação verbalizada. Emprego de técnicas atuais na coleta de prova oral. Jurisprudência quanto à consideração das observações do juiz de primeiro grau. Testemunha que revela ausência de comprometimento com a verdade. Intenção demonstrada de defender os interesses da autora. Cometimento de exageros e menção a aspectos sequer citados pela reclamante. Retificação de depoimento após questionamentos do advogado, em visível indução.

O fato de essa decisão originar-se no âmbito trabalhista não afasta a reflexão necessária no âmbito penal, uma vez que a atitude do magistrado na seara do trabalho possui reflexo em outras áreas do direito e, com destaque no referido caso, no direito penal.

A prova testemunhal, ao ser afastada por se encontrar contraditória, pode acarretar na incriminação por falso testemunho, disposto no art. 342 do CP e já abordado anteriormente. Cabe, entretanto, analisar se essa tipificação é possível com o amparo da linguagem não-verbal, devendo ser discutida de maneira mais complexa, mas que em simples verificação formal do tipo penal, pode sim se encaixar, opinião explanada com mais apreço em momento ulterior.

O que importa aqui destacar em relação a decisão do juiz é a sua justificação, na qual o magistrado relata que recebeu treinamento acerca de “técnicas atuais de coleta de prova oral” (Revista Eletrônica nº 186 do TRT da 4ª Região, 2015, p. 46), o que demonstra a inserção, no direito, de outros ramos das ciências sociais, em especial o da psicologia.

Assim, o reconhecimento da necessidade dessa interpretação e da influência que essa acarreta sobre o julgador, demonstra que “a formação da prova e a sentença judicial são atividades criativas”, como explicando por Natalie Pletsch (2007, p. 28):

Assumir que a formação da prova e a sentença judicial são atividades criativas não é negar a instrumentalidade garantista do processo penal, transformando-o na construção de uma narrativa qualquer, mas, ao contrário, é assumir o ato decisório como o sentire do julgador e reafirmar o papel de garantidor daquele que soluciona o caso penal, função abandonada quando o juiz se torna gestor da prova, protegido pelo argumento da busca da verdade.

Coadunando e reforçando essa característica do sentire do julgador, temos a citação da seguinte ementa na sentença proferida no caso anteriormente mencionado:

Prova testemunhal. Valoração. Ninguém melhor que o Juiz que colheu a prova testemunhal para aferir seu valor. Afinal, ele é que manteve o contato vivo, direto e pessoal com o depoente, mediu-lhe as reações, a (in)segurança, a (in)sinceridade, a postura. Aspectos, aliás, que não se exprimem, que a comunicação escrita, dados os seus acanhados limites, nem sempre permite traduzir. O Juiz que colhe o depoimento é, por assim dizer, a testemunha da prova. Por isso, o convencimento extraído pelo Juiz que colheu a prova deve sempre ser prestigiado, salvo quando houver elementos muito contundentes a revelar desvio de valoração. (TRT 2ª Região, Processo 00379-2006-492-02-00-1, Relator Desembargador Eduardo de Azevedo Silva, Data: 24/04/2007)

Vemos aqui a obtenção de credibilidade do juiz de primeiro grau perante a instância superior por possuir contato direto com as provas. Assim, mesmo não havendo o acolhimento do princípio da identidade física do juiz pelo direito do trabalho, resta nítida a influência da linguagem não-verbal no convencimento judicial e que esse deve ser considerado.

Acerca da ausência do referido princípio no direito processual do trabalho, segue trecho retirado de ementa no julgado da 3ª turma do TST, tendo como relator renomado ministro e doutrinador na esfera trabalhista:

Ainda que se possa, por absoluta exceção, considerar válido o princípio no processo penal, ele é dispensável e inadequado no processo do trabalho, em vista da pletora de desvantagens e prejuízos que acarreta, em contraponto com a isolada e suposta vantagem que, em tese, propicia. (TST – Ag – AIRR: 3228120115060021, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data do Julgamento: 18/12/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/01/2014)

Desta maneira, com a adoção do princípio da identidade física do juiz pelo processo penal, torna evidente o resguardo a subjetividade do juiz na elaboração de sua decisão e, consequentemente, também abre espaço para interpretações acerca da linguagem não-verbal na esfera criminal, como a que foi realizada pelo juiz trabalhista.

Assim, retornamos o desenvolvimento proposto por Natalie Pletsch (2007, p. 32) de formação da prova e da sentença judicial como atividades criativas, completando a autora:

A rejeição a qualquer de subjetividade, neste caso específico, da criatividade denota o transparente descompasso da área jurídica diante dos demais ramos do saber e fechamento para seu entorno. Por insistir em não dialogar com os demais saberes acabou por perder os sentidos: não ouve, não vê, não sentes sequer as investigações das outras disciplinas.

Nesse mesmo sentido, tece Salo de Carvalho crítica ao afastamento do direito, em especial o penal, da interdisciplinaridade, retratando que o encantamento:

dos cientistas (do direito penal) com sua imagem refletida nos espelhos teóricos encena o triste quadro de serem eles os únicos satisfeitos com a técnica desenvolvida. A vontade de verdade (vontade de sistema), eleita como fim último da própria atividade, revela a incapacidade de diálogo; e a incapacidade de escuta das angústias das partes envolvidas nos conflitos. (CARVALHO, 2006, p. 85)

O processo penal, então, deve buscar integra-se com outras ciências, não apenas para se manter atualizado, mas sim para atender da melhor forma possível sua finalidade principal: a justiça das decisões.

A Prova Oral analisada por outra Perspectiva

A linguagem não-verbal, por estar presente em todas as ciências sociais e humanas e, consequentemente, no Direito, guarda conexão intrínseca com os processos judiciais, como já exaustivamente apresentado. Acontece que esse liame não é explorado com afinco, uma vez que o assunto ainda é considerado um tabu no meio jurídico.

Essa multidisciplinariedade, que relaciona direito processual com a psicologia, não deve ser afastada pelos juristas, e sim, que seu impacto sobre a formação das decisões judiciais seja estudado para melhorar sua aplicação.

Assim, vimos no primeiro capítulo como funciona a linguagem não-verbal, essa caracterizada por um conjunto de movimentos corporais e que, em regra, se coaduna ao discurso verbal. Apontamos também que essa forma de comunicação revela a personalidade e as emoções individuais, apresentando-se de maneira involuntária e de possível percepção pelo receptor da mensagem. Nesse sentido, Jo-EllanDimitrius e Mark Mazzarella (2000, p. 49):

Por outro lado, a linguagem corporal nos dá uma informação mais básica. Poucas pessoas têm consciência de suas reações físicas ao mundo que as rodeia, e ainda menos pessoas podem controlar sempre essas ações, mesmo que desejem. Boas maneiras podem ser aprendidas conscientemente, mas expressões faciais, piscar de olhos, cruzar de pernas e tamborilar nervoso de dedos são difíceis de reprimir. Já observei um número suficiente de pessoas no banco das testemunhas para saber que é quase impossível controlar a linguagem corporal, mesmo quando o seu destino depende disso.

Constatamos que, às vezes, as expressões corporais acabam por divergir do discurso verbalmente proferido pelo indivíduo. Essa falta de harmonização entre as linguagens acaba por resultar em uma contradição, importando para esse trabalho aquela realizada, em juízo, pelo ofendido, pela testemunha ou pelo acusado na coleta de provas orais.

Porém, a detecção dessas contrariedades ou distorções são possíveis de analise a todo momento, uma vez que, como afirma Dimitrius e Mazzarella (2000, p. XIV), “pessoas são pessoas, onde quer que estejam” e “um jurado ou testemunha tentará evitar uma pergunta delicada no tribunal, do mesmo modo que faria em casa ou no trabalho”.

Analisamos também que os gatilhos, tanto os universais como os individuais, originam emoções e essas, por consequência, resultam em movimentos corporais involuntários.

Acontece que essas expressões podem ser controladas, mesmo que com grande dificuldade, o que caracteriza uma forma de manipulação dessa forma de comunicação. Porém, de acordo com Paul Ekman, mesmo quando uma emoção está sendo contida, as microexpressões – movimentos faciais extremamente ligeiros e que são fontes de escapamento - acabam por entrega-la.

Ele então desenvolveu o sistema FACS, esse que consegue capturar essas microexpressões e, consequentemente, detectar quando uma emoção é suprimida ou reprimida. O programa utiliza algumas táticas para identificação, como por exemplo, a de desigualdade das expressões faciais, pois, segundo Ekman, expressões tidas como falsas são mais assimétricas que expressões espontâneas.

Outra forma de verificação de ocultação seria a ausência de certos movimentos musculares involuntários, sugerindo então que a expressão externada seja falsificada. Nas palavras de Pierre Weil e Roland Tompakow (1986, p. 258):

Esta linguagem silenciosa do corpo que muitas vezes contradiz a palavra falada mais diz a verdade nua e crua é, como você já deve ter percebido, completamente inconsciente.

Sucede-se que, mesmo sendo detectada com maestria essa ocultação de emoções, essa não necessariamente contraria o que está sendo discursado verbalmente, podendo apenas caracterizar pensamentos privados e longínquos do indivíduo.

Contextualizando as Emoções

Temos então que a linguagem não-verbal quando contraria a verbal, pode sim ser detectada, tanto pelo FACS, como também por um observador experiente. Porém, essa discrepância pode resultar de fatores internos alheios a situação em que acontece, isto é, “as expressões não dizem sua causa” (EKMAN, 2011, p. 180). Assim, temos que:

A linguagem corporal de uma pessoa pode mudar de um momento para outro, de um ambiente para outro, e, assim, se você só encontrou uma pessoa uma vez, é arriscado julgar sua personalidade com base na linguagem corporal. (DIMITRIUS e MAZZARELLA, 2000, p. 63)

Aqui surge um desafio ao processo judicial, uma vez que o contato com as partes envolvidas e os colaboradores da justiça se dá de maneira breve e, em maioria, uma única vez. Com isso, o juiz não consegue e nem deve estabelecer um prejulgamento acerca da personalidade e, consequentemente, da índole de seus discursos, pois pode cometer sério equívoco. Exemplifica Jo-Ellan Dimitrius e Mark Mazzarella (2000, p. 69):

Há vários anos, eu trabalhava num caso no qual o proprietário de uma empresa de incorporação imobiliária estava sendo processado por fraude por seu sócio. Uma das testemunhas-chave era uma empregada que tinha trabalhado com os dois homens. Ele era uma mulher muito nervosa mesmo na melhor das circunstâncias, e tremia como uma vara verde desde o momento em que foi chamada até o momento em que saiu do banco das testemunhas. Ela demonstrava todos os sinais clássicos de desonestidade: ausência de contato ocular, tremor, inquietação, e mexia com os copinhos de papel no banco das testemunhas. Mas eu não podia concluir que ela estava mentindo, porque se estivesse sendo desonesta, provavelmente teria se sentido mais confortável durante alguma parte de seu depoimento – quando descrevia sua história profissional, por exemplo. O fato de o desconforto dessa mulher ter sido constante revelava que ela era nervosa, não necessariamente desonesta.

Em vista disso, toda expressão corporal deve ser interpretada dentro do seu contexto, pois diversos fatores influem em sua manifestação, desde do tipo de vínculo estabelecido entre os interlocutores, emissor e receptor, até o ambiente em que se dá a mensagem.

Se eu notar que alguém parece nervoso no banco de testemunhas, levarei em consideração que o tribunal é um ambiente muito estressante. É claro, qualquer ambiente tem algum impacto sobre o modo como uma pessoa se expressa. (DIMITRIUS e MAZZARELLA, 2000, p. 121)

Desse modo, o próprio Ekman afirma que, “a mesma microexpressão pode ter significados muito diferentes em diversos contextos” e que “esse contexto é entendido pela natureza da interação conversacional, história do relacionamento, turno do falante e congruência” (EKMAN, 2011, p. 225).

Consequentemente, mesmo sendo descoberta a supressão de emoções por parte do indivíduo, não significa imperativamente que esse pretende ludibriar a justiça. Nesse sentido, Paul Ekman (2011, p. 225) destaca:

É importante ressaltar que a microexpressão parece a mesma quer seja o resultado de emoção suprimida ou reprimida. A microexpressão em si não diz o que é; isso deve ser determinado pelo contexto, e, muitas vezes, exige questionamento adicional.

Importa apresentar a diferenciação entre emoção suprimida e reprimida para melhor compreender o trecho citado. A primeira é fruto de um ocultamento deliberado, enquanto a segunda deriva de uma confusão íntima, na qual o indivíduo não sabe como se sente.

Assim, temos que o contexto é importante para qualquer tipo de interpretação. Exatamente por isso, que as leis devem sempre ser interpretadas conforme o seu contexto, a chamada interpretação histórica, para que os juristas possam compreender o que o legislador visava atingir à época de criação da lei, assim como adequá-la as mudanças sociais.

Interessante ilustração nos oferece Pierre Weil e Roland Tompakow (1986, p. 107), no qual alguém, por “despir-se em público”, pode ver sua conduta condenada e repelida pela socialidade, como pode a mesma situação, em contexto distinto, ser passível de demasiados elogios, quando a pessoa o faz, por exemplo, atirando-se de um cais, para salvar alguém de um afogamento.

Apresentada essa necessidade de compreensão do contexto em que se dá a comunicação, conclui-se que devemos nos atentar a essa característica com especial atenção para não cometermos o conhecido “erro de Otelo”.

O Erro de Otelo

Na obra Otelo, o mouro de Veneza de William Shakespeare, datada de 1603, temos que Otelo acusa sua mulher, Desdêmona, de estar apaixonada por Cássio e exige dela a confissão, esclarecendo que essa, consequentemente, irá acarretar em sua morte. Em seguida, Desdêmona pede para que Cássio seja chamado para que ateste sua inocência. Porém, Otelo assume que já matou Cássio e Desdêmona, ao perceber que não poderia provar a injusta acusação contra ela imputada, seria condenada à morte, colocando-se então em prantos.

DESDÊMONA — Então, é que ele o achou. Nunca lho dei. Mandai chama-lo, para vir confessar o que há.

OTELO — Já confessou.

DESDÊMONA — Confessou quê, senhor?

OTELO — Que te possuiu.

DESDÊMONA — Como? Ilicitamente?

OTELO — Sim.

DESDÊMONA — Absurdo! Não dirá isso.

OTELO — Não, porque tapada já tem a boca, pois o honesto Iago tomou suas providências.

DESDÊMONA — Oh! Meu medo tinha razão de ser! Então, morreu?

OTELO — Se seus cabelos todos vivos fossem, minha grande vingança os devorara.

DESDÊMONA — Ai de mim! Foi traído e estou perdida!

OTELO — Sai, prostituta infame! Vais chorá-lo na minha frente?

DESDÊMONA — Ó meu senhor! Bani-me de vossa vista, mas deixai-me viva.

OTELO — Para trás, prostituta!

(ATO V, CENA II, 168 – 169)

Explica Paul Ekman (2011, p. 74) o erro cometido por Otelo, nessas palavras:

O erro de Otelo não foi a incapacidade de reconhecer os sentimentos de Desdêmona. Ele sabia que ela estava angustiada e amedrontada. Seu erro foi acreditar que as emoções possuem uma única fonte, foi interpretar a angústia dela como resultado da notícia da morte de seu suposto amante, e o medo como o de uma mulher infiel, pega em sua traição. Otelo mata Desdêmona sem considerar que sua angústia e medo podiam ter fontes diferentes. Que eram as reações de uma mulher inocente, que sabia que seu marido extremamente ciumento estava prestes a matá-la, e que não havia maneira de provar sua inocência.

Concluímos então que apenas detectar a existência de uma emoção suprimida ou reprimida não nos oferece parâmetro suficiente para afirmar que o indivíduo age com má-fé, pois aquela pode possuir diversas origens. Desse modo, não devemos saltar para conclusões e sim considerar motivos alternativos. Ilustra Jo-Ellan Dimitrius e Mark Mazzarella (2000, p. 108) tal erro ante a coleta de prova testemunhal:

Existem poucos ambientes em que as pessoas se sintam menos à vontade que num tribunal. Vi centenas de pessoas testemunhando, desde especialistas profissionais até aqueles que estão no banco de testemunhas pela primeira vez. Muitas vezes, alguém que eu sei que está falando apenas a verdade, mostra sinais de nervosismo e desonestidade. A voz treme; seus olhos podem estar baixos ou ir de um lado para o outro; ele pode passar a língua sobre os lábios, brincar com os objetos a sua frente, gaguejar e até não se lembrar de acontecimentos recentes. Seria um grave erro concluir que deve estar mentindo. Pela mesma razão, muitos especialistas testemunharam literalmente centenas de vezes no tribunal e estão totalmente à vontade. Sabem o que estão fazendo e se comportam de modo confiante e sem esforço. Muitos são essencialmente ótimos atores e conseguiriam parecer completamente inocentes mesmo se estivessem esticando a verdade até o limite.

Essa necessidade de contextualização já nos restava apresentada, de maneira tímida, quando explicado os gatilhos das emoções. Assim, para compreender a expressão de uma emoção no indivíduo, deve-se cogitar a existência de gatilhos específicos para tal e não constatar, prematurante, a existência de um gatilho universal.

Em elucidação, deve-se relembrar o medo de animais venenosos, exemplo utilizado na explicação dos temas centrais universais. Assim, v.g., temos um empregado de comportamento sempre exemplar. Acontece que, por um mal-entendido, acaba ele sendo convocado ao escritório de seu chefe para prestar esclarecimentos acerca de uma conduta vista como inadequada pelos seus colegas.

Porém, ao se encontrar perante seu superior hierárquico, demonstra grande medo. Não da acusação injustamente imputada a ele e que, evidentemente, não cometeu. Mas sim de um inofensivo escorpião presente dentro de um aquário sobre a mesa. Assim, o funcionário começa a transpirar excessivamente, a gaguejar e, até mesmo, declarar informações desconexas.

Na situação narrada, caso o patrão não tenha conhecimento desse gatilho emocional especifico do empregado ou pior, nem cogite, ao menos, a existência de outras possibilidades justificantes dessa conduta, poderá a autoridade inferir, equivocadamente, que o operário está mentindo. Esse erro, também cometido por Otelo, pode ocorrer exatamente pela existência de gatilhos diversos para uma mesma emoção. Nesse mesmo sentido, Paul Ekman aborda (2011, p. 74):

O medo possui diversas fontes. O medo de uma pessoa culpada ser capturada parece exatamente o medo de um inocente não ser levado em consideração. Os sinais emocionais fornecem informações importantes a respeito do que uma pessoa está sentindo e o que ela pode fazer depois, mas quase sempre há mais de uma possibilidade. Uma pessoa cheia de medo pode lutar em vez de fugir ou se esconder.

Essa é a principal, e a mais comum, falha do “detector de mentiras”, esse que não consegue distinguir entre a discrepância deliberada pelo indivíduo e aquela oriunda de outras razões. Assim, tantos os efeitos corporais de uma emoção podem variar, como também os motivos que a originam.

O Detector de Mentiras

O polígrafo, popularmente conhecido como detector de mentiras, é um aparelho que se dispõe a medir e gravar as variáveis fisiológicas visando identificar incoerência em um relato verbal. Esse trabalho não se dispõe a abordar sua parte técnica, mas apenas apontar sua falibilidade vista a necessidade de contextualização das emoções e suas expressões. Nesse sentindo, Paul Ekman (2011, p. 74):

Há um problema sério quando nos submetemos a um detector de mentiras. O responsável pelo detector tentar diminuir o medo de uma pessoa inocente de ser julgada injustamente garantindo a exatidão do aparelho, mas como não é muito exata e as pessoas sabem disso cada vez mais, tanto a pessoa inocente como a culpada podem manifestar o mesmo medo.

Vemos então que o medo do inocente em muito se assemelha ao do culpado e, infelizmente, essa tecnologia não consegue fazer essa diferenciação. Na verdade, nenhum meio ou aparelho existente pode constatar, com exatidão, uma mentira. As discrepâncias entre linguagem verbal e não-verbal podem decorrer desde pensamentos dissonantes ao momento da comunicação, por falhas de memória e até por condições físicas preexistentes do indivíduo.

Outra relevante objeção ao uso dessa tecnologia é a invasão da esfera individual, uma vez que seu uso acaba por “detectar” algo que se pretendia omitir, isto é, afeta a intimidade do individuo e a liberdade de suas escolhas. Observa, então, Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 116):

Não menos repugnantes são os meios de caráter técnico, químico ou psiquiátrico - o detector de mentiras, o soro da verdade, a hipnose, a narcoanálise, etc. -, que afetam a liberdade de declaração, a intimidade e a dignidade pessoal do interrogado, caracterizando violação até mais séria que a própria tortura, pois nesta, como lembrou José Frederico Marques, ainda existe uma possibilidade de resistência, ao passo que tais métodos levam a uma subjugação total da vontade, com uma despersonalização da criatura humana.

Essa “intromissão” na individualidade afeta garantias constitucionais, como por exemplo a disposta no inciso X do art. 5º da Constituição Federal, que garante a inviolabilidade “a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Assim, complementa:

Mas, o que se deve contestar em relação a essas intervenções, ainda que mínimas, é a violação do direito à não auto-incriminação e à liberdade pessoal, pois se ninguém pode ser obrigado a declarar-se culpado, também deve ser assegurado o seu direito a não fornecer provas incriminadores contra si mesmo. O direito à prova não vai ao ponto de conferir a uma das partes no processo prerrogativas sobre o próprio corpo e a liberdade de escolha da outra. (GOMES FILHO, 1997, p. 119)

Importa aqui destacar que a garantia constitucional em relação a intimidade e a privacidade não abarca apenas o acusado, como todas as pessoas que se encontram em território nacional e, por óbvio, resguarda também as testemunhas.

Violação da Esfera Individual

Como anteriormente apresentado em relação ao detector de mentiras, um dos principais obstáculos em sua utilização é o da violação à intimidade. Essa que também é desrespeitada quando o juiz decide basear seu julgamento em movimentos involuntários corporais, trazendo à tona questões que o indivíduo não escolheu externar.

Assim, as emoções nos causam reações públicas, dizendo aos outros como nos sentimos. Porém seus gatilhos, isto é, suas causas, são privados e desconhecidos pelo receptor. Temos então que “a maioria de nossas emoções possui sinal inconfundível, que diz aos outros como nos sentimos”, mas já “os pensamentos, por outro lado, são totalmente privados” (EKMAN, 2011, p. 71).

Temos então duas situações distintas e possíveis ao juiz ao constatar discrepância entre os tipos de comunicação: a) concluir a má-fé por parte do individuo e, consequentemente, sua mentira; ou b) buscar descobrir o porquê dessa incompatibilidade de linguagens.

Na primeira situação, como já explorado, concluiria inadequadamente o juiz, uma vez que a incongruência pode derivar de estímulos diversos. Já na segunda hipótese, exige do juiz uma percepção bastante perspicaz, pois a intervenção direta, isto é, atestar a divergência e exigir explicações, acarretaria em uma violação ao direito a intimidade individual.

Assim, precisa o juiz vislumbrar outros motivos alternativos capazes de interferir na prova oral, porém procurar constata-los sem se valer de atitudes ríspidas ou abruptas, como também tentar evitar que as partes assim ajam. Desse modo, acrescenta Gomes Filho (1997, p. 99):

Cuida-se, em síntese, de preservar a esfera individual contra intromissões que, embora ditadas pelo interesse de eficiência do processo, poderiam ter um custo desproporcional, na ótica de uma organização social secularmente assentada na primazia do indivíduo.

Destaca-se que violações constitucionais acarretam a nulidade do processo, porém essas se restringem em relação as partes processuais, não havendo resguardo quanto a testemunha, uma vez que essa não integra o processo, sendo vista com “imparcialidade”.

Assim, caso “técnicas” de análise de linguagem não-verbal sejam utilizadas de forma a desfavorecer o réu, por exemplo, configura a nulidade da sentença, assunto que será melhor abordado adiante. Porém, quanto a testemunha, por ora, tal intromissão é tida como possível.

Vulnerabilidade Jurídica

O devido processo legal é um dos princípios constitucionais com maior destaque, sendo considerado, como observou Ferrajoli, “de uma garantia das garantias, cuja observância é a nota diferenciadora entre as culturas jurídicas democráticas e autoritárias” (1990, p. 632-4, apud GOMES FILHO, 1997, p. 57).

A Constituição Federal estabelece em seu art. 5º, inciso LIV, que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, proporcionando aos indivíduos a segurança jurídica necessária e exigida em um Estado Democrático de Direito, pois esse tem sua atividade punitiva condicionada e limita aos ditames legais.

Com José Herval Sampaio Junior, “vê-se que esse princípio assume dentro do processo penal uma importância transcendental e que delineia todo o seu agir, limitando inclusive a atividade do legislador”, porquanto “deve a lei se conformar com os direitos e garantias fundamentais do cidadão”, não havendo lugar para a interferência no núcleo protetivo da liberdade do agente, sem que sejam observados os condicionamentos e limites que decorrem da cláusula due process of law. (2008, p. 137, apud TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 87)

Eis então outro obstáculo a utilização das técnicas de análise da linguagem não-verbal. A interpretação da linguagem não-verbal, como já vimos, exige que o receptor tenha compreensão de uma diversidade de elementos e considerações possíveis dentro do contexto da comunicação e até externo a esse.

A relação entre os interlocutores, o ambiente, questões intimas de caráter psicológico e/ou biológico, a influência do lapso temporal dos acontecimentos. Essas e outras tantas razões devem ser consideradas quando se tenta interpretar a linguagem corporal de um indivíduo. Assim, como pode o juiz, em um contato sucinto, examinar e considerar todas essas possibilidades? Realmente é um desafio e tanto ao magistrado.

Além do mais, essa enormidade de situações admissíveis acarreta, inevitavelmente, uma insegurança jurídica. A partir do momento no qual o juiz possui, em seu favor, artifícios completamente discricionários, compromete-se a necessária imparcialidade. Dessa forma, poderia o juiz formar sua convicção inicial e buscar, posteriormente, pontos que justifiquem sua decisão, examinando a prova oral com uma visão previamente condicionada.

Assim, condensa o raciocínio exposto, Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 92):

Daí resulta a indeclinável exigência lógica de submissão dos procedimentos probatórios a certas regras - lógicas, psicológicas, éticas, jurídicas, etc. -, cuja inobservância acarretaria uma inevitável fratura ente o julgamento e a sociedade no seio da qual o mesmo é realizado. Assim como o saber científico, que só adquire esse status na comunidade acadêmica após uma rigorosa verificação sobre a validade dos métodos de pesquisa utilizados, também a verdade judicial requer obediência a parâmetros bem delimitados no seu processo de construção, sem os quais confundir-se-ia com um intolerável arbítrio do juiz.

A segurança jurídica exige, então, que toda decisão judicial seja explicada de maneira pormenorizada, possibilitando que os indivíduos compreendam os motivos que conduziram o magistrado a conclusão e que possam, assim, contestar sua imprecisão caso essa subsista.

Grafando a Linguagem Não-verbal

A linguagem não-verbal é, não apenas, mas em grande parte, visual, refletindo uma característica essencial de sua existência. Diferentemente, a sentença judicial deve ser escrita, pormenorizada, expressa de maneira minuciosa.

Nitidamente observa-se o embate entre os atributos de ambas e nos sugere mais um questionamento: como transformar um tipo de linguagem marcadamente sensorial para palavras, transformando um código em outro? Essa possibilidade, por óbvio, é possível e encontramos, constantemente, nas obras literárias.

Acontece que essa é uma prática que exige tempo e um cuidado descomunal para com os detalhes, na qual adjetiva, e com razão, seus produtores como artistas. Assim, o juiz para desenvolver tal habilidade, prejudicaria a eficiência processual, dificuldade apresentada pelo próprio Juiz Max Carrion Brueckner, do caso de dispensa testemunhal já citado, em sua decisão:

É importante deixar claro, na sentença, aspectos relevantes na tomada dos depoimentos, cujo registro seria impossível na ata de audiência. Com efeito, para consignar todas as impressões do magistrado durante a audiência, seria necessário estender a solenidade por tempo indefinido, o que prejudicaria demasiadamente a produção da prova, em face das diversas interrupções que seriam necessárias. (Revista Eletrônica nº 186 do TRT da 4ª Região, 2015, p. 46)

Aqui retomamos a discussão acerca da segurança jurídica, em especial quando se encontra ameaçada a liberdade individual, pois essa impossibilidade de pormenorização do juiz dos aspectos visuais da audiência causa incerteza e dificulta a oposição e, consequentemente, viola a ampla defesa e o contraditório.

Caso um juiz, na esfera penal, vier a dispensar a validade de uma testemunha por entender que seus discursos, verbal e não-verbal, são contrários, como irá contestar a parte que arrolou aquela prova oral? Resta patente que esse tipo de juízo coloca o processo penal em total antagonismo com seus princípios. Nesse sentido, interessa destacar os dizeres de Antonio Magalhães Gomes Filho (1997, p. 166):

Assim, ao direito que tem as partes à introdução de provas corresponde não somente um direito à valoração das mesmas, mas sobretudo um direito à motivação que exprima e justifique, de maneira expressa e completa, a avaliação realizada; nessa matéria, não será possível admitir-se uma motivação implícita, decorrente, v.g., da aceitação de outra prova em sentido contrário, pois nesse caso não será possível deduzir-se, facilmente e com certeza, as verdadeiras razões da não consideração da prova rejeitada.

Importa também destacar que a imposição de estrita legalidade relacionada diretamente com a necessária documentação, em especial na área jurídica, afasta aspectos importantes do momento fático, isto é, prejudica a complexidade dos elementos que compõe a realidade.

Assim, a capacidade do homem de discernir resta prejudicada quando “o hábito de atentar para as ferramentas-símbolos, chamadas palavras” afasta-o da percepção do “aqui e agora” (WEIL e TOMPAKOW, 1986, p. 79), o que pode afastar o juiz da eficiência processual em prol da legalidade estrita.

 Impraticabilidade no Interrogatório

Em vista de todas as garantias constitucionais e processuais, resta indubitável a impossibilidade de análise da comunicação não-verbal do acusado. Não que esse tipo de linguagem não possa ser interpretado pelo magistrado, mas sim sua inviabilidade na motivação da sentença.

Sendo o silêncio direito do indiciado, tendo em vista que ele não pode e a lei não autoriza que o mesmo faça prova contra si mesmo, sofrer qualquer represália ou prejuízo em função do exercício de seu direito constitucional. (MADEIRA, 2003, p. 38)

O silêncio do réu não pode ser utilizando em seu desfavor, posto que é um direito constitucional do acusado. Mas não apenas o “não dizer” encontra-se resguardado, como pode também apresentar sua versão dos fatos, essa sem o compromisso com a verdade e, consequentemente, a que melhor lhe convier.

Assim, a linguagem não-verbal se constitui como um “dizer”, mas um dizer, em regra, involuntário; ou se voluntário, de causa íntima e privada. Em ambas as situações, o acusado tem seu direito resguardado, uma vez que sua omissão ou sua “versão dos fatos” não lhe pode prejudicar, encontrando-se no exercício de sua autodefesa.

Conclui-se que o juiz, ao fundamentar sua decisão, não poderá valer-se da linguagem corporal do acusado para motivar sua decisão, pois caso contrário, incorrerá em expressivas violações constitucionais.

 A Utilização Tática do Ofendido

As provas, como já apresentado, são todas tidas com valor relativo, tendo o juiz a atribuição de livremente valora-las, desde que a faça de maneira motivada. Desse modo, as declarações do ofendido estão, de início, em equivalência com todas as outras provas, podendo o juiz concedê-las o valor que melhor entender.

Assim, vemos que a vítima possui em sua alçada um artifício de inigualável relevância, uma vez que pode se valer da linguagem não-verbal para convencer o magistrado de que suas alegações são legítimas.

Enquanto o acusado não pode ser prejudicado quanto a sua linguagem corporal, o ofendido pode utiliza-la em seu favor, tentando convencer o juiz a lhe dar uma credibilidade superior por harmonizar os dois tipos de comunicação. Ao ofendido importa, então, “conhecer as possibilidades que acompanha as expressões, e assim saber lidar melhor com as situações” (EKMAN, 2011, p. 181).

 A Polêmica Prova Testemunhal

A testemunha é a prova oral que dispensa mais controvérsia. Ela é tida como imparcial, uma vez que não está envolvida diretamente com o “caso penal” em análise, como, por exemplo, estão a vítima e o acusado. Desta maneira, ela não possui interesse no conflito, prestando o dever apenas de colaborar com a justiça relatando as informações de que teve conhecimento e que possam auxiliar na resolução da contenda.

Por esse motivo, presta compromisso com a verdade, essa que, caso seja infringida, responderá pelo crime de falso testemunho tipificado no art. 342 do CP. Nesse sentido, Ronaldo Tanus Madeira (2003, p. 95):

Tanto o acusado como a vítima podem mentir, pois estão psicologicamente envolvidos no interesse que está implícito no desenrolar da causa. Ambos não podem ser processados por falso testemunho. Já a testemunha, ao depor perante o juiz, compromete-se a dizer a verdade, razão porque, se omitir ou falsear verdade, poderia ser processada.

Acontece que, como já abordado, muitos são os elementos que recaem sobre as provas orais, podendo essas restarem prejudicadas tanto em seu discurso verbal, por exemplo pelo transcorrer do tempo, como também suas declarações não-verbais. A memória é diretamente afetada pelo lapso temporal, esse que atravanca o relato verossímil. Nesse ponto de vista, Ronaldo Tanus Madeira (2003, p. 97):

Embora Mittermayer considere a testemunhal “a prostituta das provas”, a tendência de qualquer testemunha, ao comparecer diante do juiz, é a de dizer a verdade. Diante de um juiz experiente, qualquer esforço da testemunha em omitir ou faltar com a verdade é de imediato percebido. Entretanto, a falibilidade do testemunho humano deve ser uma condição considerada pelo julgador, pois alguns fatos relacionados com a percepção, memória, influem na capacidade da testemunha no momento da retrospectividade.

Não apenas contradições no discurso verbal são captadas pelo juiz. A testemunha pode apresentar sinais não-verbais de inquietação e nervosismo, induzindo o juiz a conclusão de falsidade de suas declarações verbais. Segundo Magalhães Gomes Filho (1997, p. 151), todos esses fatores devem ser considerados na coleta da prova oral:

A observâncias ao contraditório na introdução da prova no processo assume seus contornos mais característicos em relação à inquirição das testemunhas, pois se trata de prova de estrutura complexa, em que se ressaltam dois componentes essenciais: a narração do fato e o comportamento do depoente; disso decore a constatação de que a aquisição da prova não se limita à documentação de uma informação, mas exige uma participação ativa de quem realiza a inquirição, com o objetivo de se proceder, concomitantemente, a uma valoração sobre a idoneidade do testemunho.

Desse modo, o juiz analisa a compatibilidade entre os discursos para auferir sua credibilidade, devendo atentar-se para as incongruências, mas verificado cautelosamente o porquê delas.

O Juiz há de possuir a psicologia suficiente para perceber que a testemunha, com o passar do tempo, não se recorda mais de algumas circunstâncias em relação ao fato, objeto da prova e do processo. E, assim sendo, deve o Magistrado munir-se de todo um instrumental inquisitivo, no sentido de não forçar a testemunha a suprir certas lacunas na sua memória, com afirmações de fatos e circunstâncias não verdadeiras. (MADEIRA, 2003, p. 110)

Em complemento, Natalie Ribeiro Pletsch (2007, p. 25):

Tem-se, então, no processo penal a construção de uma narrativa, que é redigida a partir de variadas lembranças, em que pesem as contribuições da vítima e do réu, a prova testemunhal é de fundamental importância, ainda que não haja "neutralidade possível no resgate mnemônico, nem objetividade, por mais sincera que seja a testemunha".

Retornemos então a discussão acerca do crime de falso testemunho e a sua possibilidade de aplicação baseada na linguagem corporal. No caso em que o juiz valorou a prova testemunhal com base na linguagem não-verbal, pode a testemunha responder pela tipificação do art. 342 do CPP?

Segundo o Exmo. Juiz Max Carrion Brueckner, “a impressão do Juiz a respeito do comportamento das testemunhas e a análise da linguagem não-verbal dizem respeito à valoração da prova e devem ser consideradas no julgamento”, assim como também compara a dissonância das mensagens transmitidas pela testemunha com à situação de verbalização da palavra "sim", concomitantemente, ao gesticular do "não" (Revista Eletrônica nº 186 do TRT da 4ª Região, 2015, p. 46).

Ora, se o juiz declara a imprestabilidade da prova testemunhal afirmando que ela está se contradizendo entre os tipos de linguagem, resta claro a figura de linguagem do litote.

Essa figura de linguagem configura-se presente quando, como uma maneira de abrandar uma expressão, realiza-se a negação do contrário, permitindo a afirmação de algo por meio de uma negação. Em exemplo, temos o seguinte: “Eu não estou feliz com a notícia dada pela minha mãe”, utilizando-se a expressão “não estou feliz” para atenuar a ideia de “ficar triste”.

Dessa forma, o magistrado, ao concluir que a testemunha estava se contradizendo, afirmou, por consequência, que ela estava faltando com a verdade e, assim, incorrendo no crime de falso testemunho. Vista a tipificação formal, encontra-se o agente em perfeita conformidade. Porém, também importa analisar, com atenção, outro elemento relacionado a tipicidade da conduta: o dolo.

Uma vez que a tipificação penal em analise não dispõe de modalidade culposa, estabelece que apenas a conduta dolosa praticada pelo agente pode ser punida. Acontece que, como vimos, a linguagem corporal pode se contrapor a linguagem verbal por diversos motivos e que, para sua interpretação correta, incumbiria desgaste excessivo por parte do magistrado e de todo o aparato judicial.

Além disso, caso fosse exigido do agente a confirmação da intenção no cometimento da contradição, estaria o julgador violando o princípio da inexigibilidade da autoincriminação, como também invadindo por demasiado a esfera individual, não tendo o Estado poder punitivo superior ao da garantia a intimidade particular.

Com isso, constatar que a testemunha não está cumprindo com o seu dever com a verdade, porém se alicerçando em uma contradição entre tipos de linguagem sem a averiguação necessária, estaria o magistrado cometendo o erro de Otelo e, assim, responsabilizando, talvez, um inocente.


CONCLUSÃO

Por fim, conclui-se que as provas orais, assim como as outras integrantes do conjunto probatório, precisam estar em conformidade com os limites estabelecidos pelas garantias constitucionais e as formalidades exigidas no processo. Essas não apenas cumprem com os imperativos do devido processo legal e da segurança jurídica, como também buscam a verdade processual, a qual deve ser o mais verossímil possível da real.

Temos, então, que a prática processual, segundo os dizeres de Natalie Ribeiro Pletsch, “nada mais é do que a representação cênica de inúmeras interpretações possíveis do 'caso penal'” (2007, p. 26), isto é, dentre diversas possibilidades de narrativas, o juiz acata aquela que o persuadiu. Contudo, para findar tal decisão, o juiz é influenciado tanto pelo discurso verbal, como também pelo não-verbal, ambos proferidos na coleta da prova oral.

Depreende-se ser “fundamental para que o processo funcione como mecanismo de redução de danos”, que exista “a percepção de que a subjetividade está intrincada com a racionalidade” e que, ambas, “funcionam conjunta e indistintamente no momento das decisões” (PLETSCH, 2007, p. 113).

Assumindo-se, então, a existência da perspectiva subjetiva do juiz como fator de relevância na valoração da prova e no consequente remate do conflito, a linguagem não-verbal encontra espaço para o debate acerca de sua influência na formação da sentença. Presente com ênfase nas provas orais, a comunicação corporal, por óbvio, transmite informações ao magistrado, tanto coincidindo com as declarações verbais, ou as contradizendo.

Indagou-se, a partir daí, acerca da possibilidade dessa interpretação ser utilizada como motivação, pelo juiz, na hora de proferir seu veredito.

O acusado não pode ser prejudicado pelo seu silêncio, assim como também pode apresentar sua própria versão dos fatos, adotando aquela que melhor lhe atende. Com isso, temos que a análise de aspectos não-verbais do acusado, para fundamentação pelo juiz, não se faz possível.

No que se refere ao ofendido, a comunicação não-verbal é tida com um artificio de convencimento, podendo aquele coadunar os tipos de linguagem para tentar convencer o juiz de sua narrativa. Assim, com o sistema de livre apreciação motivada das provas, pode o magistrado valorar com preponderância as declarações do ofendido frente a essa articulação corporal.

Já a prova testemunhal, por prestar compromisso com a verdade, deve ter seu relato analisado com maior cautela, atentado o magistrado para as divergências admissíveis entre linguagem verbal e não-verbal. Desse modo, deve o juiz realizar um exame minucioso do porquê da divergência, não podendo se antecipar aos motivos e concluir pela má-fé da testemunha. Existem muitas razões possíveis acerca das incongruências, sendo preferivel uma acareação para melhor compreensão do que uma aplicação de determinada interpretação equivocada e, consequentemente, indevida.

Dessa forma, Paul Ekman adverte que “não há um único indício infalível relacionado à dissimulação”, desse modo, temos que, “em todas as situações, as emoções não nos revelam a fonte” e a contradição entre as informações verbalizadas e as transmitidas pelo corpo, apenas nos “indica que precisamos de outras explicações; isso é tudo” (EKMAN, 2011, p. 232).

Por fim, restou clara sua impossibilidade de incriminação por falso testemunho (art. 342 CP) com base em divergência do discurso verbal e não-verbal, uma vez que não pode ser constatado, com firmeza, a existência do dolo por parte do agente.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORDENAVE, Juan Diaz. O Que É Comunicação. 7ª. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1985.

BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Brasília, 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 05.abr. 2018.

_______. DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940. Código Penal. Rio de Janeiro, 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 05.abr. 2018.

_______. DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, em 3 de outubro de 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 05.abr. 2018.

_______. LEI Nº 9.503, DE 23 DE SETEMBRO DE 1997. Código de Trânsito Brasileiro. Brasília, 23 de setembro de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503Compilado.htm>. Acesso em: 05.abr. 2018.

_______. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. 11ª Turma. Recurso Ordinário:  RO 379200649202001 SP 00379-2006-492-02-00-1. Acórdão Nº: 20070322079. Relator: Desembargador Eduardo de Azevedo Silva. Data de Julgamento: 24/04/2007. JusBrasil, 2007. Disponível em: <https://trt-2.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/9030027/recurso-ordinario-record-379200649202001-sp-00379-2006-492-02-00-1/inteiro-teor-14205673>. Acesso em: 25.mar.2018.

_______. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Decisões de 1º Grau: Exmo. Juiz Max Carrion Brueckner. 6ª Vara do Trabalho de Porto Alegre. Processo n. 0021322- 37.2014.5.04.0006. Publicação em 10-11-2015. Escola Judicial do TRT da 4ª Região. Revista Eletrônica Ano XI, Número 168, Novembro de 2015. Rio Grande do Sul, 2015. 46 p.

_______. Tribunal Superior do Trabalho. 3ª Turma. Agravo de Instrumento em Recurso de Revista: Ag-AIRR-3228120115060021. Relator: Ministro Mauricio Godinho Delgado. Data de Julgamento: 18/12/2013. JusBrasil, 2013. Disponível em: <https://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/121176610/agravo-de-instrumento-em-recurso-de-revista-ag-airr-3228120115060021/inteiro-teor-121176629?ref=juris-tabs>. Acesso em: 30.mar.2018.

CAES, Valdinei. A Importância da Gestualidade na Comunicação Não-Verbal. Revista eletrônica dos Cursos de Administração e Ciências Contábeis da Faculdade Opet. Curitiba, nº 7, 2012. 11 p.

CARVALHO, Salo de. Memória e esquecimento nas práticas punitivas. Revista de Estudos Ibero-Americanos: Revista do Programa de Pós-Graduação em História da PUC – RS, Edição especial, Porto Alegre, 2006.

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte especial (arts. 121 ao 361). Salvador: JusPodivm, 2018.

DARWIN, Charles. A expressão das emoções no homem e nos animais. Tradução de Leon de Souza Lobo Garcia. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

DIMITRIUS, Jo-ellan; MAZZARELLA, Wendy Patrick. Decifrar Pessoas: como entender e prever o comportamento humano. Tradução de Sonia Augusto. São Paulo: Alegro, 2000.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1993.

EKMAN, Paul. A linguagem das emoções: Revolucione sua comunicação e seus relacionamentos reconhecendo todas as expressões das pessoas ao redor. Tradução Carlos Szlak. São Paulo: Lua de Papel, 2011.

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997.

GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 6ª Edição. Salvador: Ed. JusPodivm, 2018.

MADEIRA, Ronaldo Tanus. Da prova e do processo penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2003.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

PLETSCH, Natalie Ribeiro. Formação da prova no jogo processual penal: o atuar dos sujeitos e a construção da sentença. São Paulo: IBCCRIM, 2007.

PRADO, Lídia Reis de Almeida. O juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial. 6. Ed. São Paulo: LTr, 2013.

RAMSTHALER, Anna Luiza. Comunicação e Relação interpessoal. Programa Permanente de Capacitação de Pessoal - PPCAP. Brasília: CESPE, 2004. Disponível em: < http://www.cespe.unb.br/colaboradores/Chefes_Fiscais_04_1/arquivos/APOSTILA_COMUN_E_RELAC_INTERPESS.PDF>. Acesso em: 15.mar.2018.

REBOUÇAS, Sérgio. Curso de direito processual penal. 1ª Edição. Salvador: JusPodivm, 2017.

ROSA, Alexandre Morais da. Decisão no Processo Penal como Bricolage de Significantes. 430 p. Tese. (Doutorado em Direito). Setor de Ciências Jurídicas e Sociais, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2004.

SHAKESPEARE, William. Otelo, o mouro de Veneza. Edição Ridendo Castigat Mores. Versão para eBook: eBooksBrasil.org, 2000. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/otelo.pdf>. Acesso em: 10.mai.2018.

SILVA, Thiago Luiz de Faria. Linguagem corporal como meio de prova e sua aplicabilidade como agente provocador do inquérito policial. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade Estadual da Paraíba., Centro de Ciências Jurídicas, 2014.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 11ª. Ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.

WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Janet Helmick; JACKSON, Don D. Pragmática da Comunicação Humana: um estudo dos padrões, patologias e paradoxos da interação. São Paulo: Cultrix, 1993.

WEIL, Pierre; TOMPAKOW, Roland. O corpo fala: a linguagem silenciosa da comunicação não-verbal. Petrópolis: VOZES, 1986.



Informações sobre o texto

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, em cumprimento à exigência para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Data de apresentação: 06/06/2018.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DELFINO, Ana Luisa Rocha. A utilização da linguagem não-verbal como fundamentação pelo juiz na coleta de prova oral do processo penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5588, 19 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68313. Acesso em: 5 maio 2024.