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Há diferença entre 'abuso de liberdade de expressão' e 'direito de liberdade de expressão'?

Há diferença entre 'abuso de liberdade de expressão' e 'direito de liberdade de expressão'?

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Pelas vigentes normas do ordenamento jurídico pátrio, bem como do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), é possível se afirmar que há sim limites para a liberdade de expressão.

Existe, ou não, limite na liberdade de expressão?

O artigo possuirá subtítulos: I - Direito Nacional ou Interno; II - Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH). Nos respectivos subtítulos, exposições.


I - DIREITO NACIONAL OU INTERNO

CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

II - a dignidade da pessoa humana;

Sérgio: a dignidade humana é um valor preenchido. Pelo pós-positivismo, não é possível qualquer objetificação do ser humano pelo próprio ser humano. O "fim em si mesmo", pela filosofia kantiana, garante a individualidade sobre o poder da coletividade (utilitarismo). Disso advêm que nenhum ser humano, por sua condição étnica, sexual, etc, sofra ações, por agentes públicos ou não, por ação do Estado, capazes de relativizar, coisificar, instrumentalizar a integridade física, emocional, espiritual e psíquica do indivíduo em benefício da maioria. Com isso, ainda que se fale em salvar vidas, nenhum ser humano, sem o seu consentimento, pode ser coagido a ceder seu material genético.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

Sérgio: O que é ser "justa"? Para isso, o diálogo entre Sócrates e Polemarco em A República de Platão:

Sócrates - A quem chama de amigos: aos que parecem honestos a uma pessoa, ou aos que o são de fato, ainda que não o pareçam? E outro tanto direi dos inimigos?

Polemarco - É natural amar a quem nos parece honesto e odiar a quem nos parece mal.

Sócrates - Mas os homens não se enganam a esse respeito, de maneira que lhes parecem honestos muitos que não o são e vice-versa?

Polemarco - Enganam-se.

Sócrates - Logo, para esses, os bons são inimigos, e os maus, amigos?

Polemarco - Precisamente.

IX. Sócrates - Não obstante, para essas pessoas, a justiça é ajudar os maus e prejudicar os bons?

Polemarco - Assim perece.

Sócrates - E, contudo, os bons são justos e incapazes de cometer injustiças?

Polemarco - É verdade.

Sócrates - Então, é justo fazer mal a quem não cometeu qualquer injustiça?

Polemarco - De modo algum, Sócrates. Isso parece um raciocínio perverso.

Sócrates - Então – disse eu – é justo prejudicar os injustos e ajudar os justos?

Polemarco - Esse raciocínio já me parece mais coerente do que o anterior.

Sócrates - Logo, ó, Polemarco, acontecerá que, para muitos que errarem em seu juízo sobre os homens, será justo prejudicar os amigos, pois não são maus aos seus olhos, e ajudar aos inimigos, pois o tomam por bons. E assim afirmaremos exatamente o contrário que concluímos ser o pensamento de Simônides.

Polemarco - É assim que acontecerá. Mas vamos corrigir-nos, pois é provável que não tenhamos definido corretamente o que é amigo e o que é inimigo.

Sócrates - Como o definimos, Polemarco?

Polemarco - O que parece honesto, esse é o amigo.

Sócrates - E agora – disse eu – como conseguimos corrigir a definição?

Polemarco - Amigo, é o que parece e é na realidade honesto. O que parece, mas não o é, apenas aparenta ser amigo sem o ser. E, sobre o inimigo, a definição é a mesma.

Sócrates - Logo, segundo esse raciocínio, parece que amigo é o homem de bem, e inimigo é o malvado.

Polemarco - Sim.

Sócrates - Acrescentamos à definição da justiça, tal como a formulávamos primeiro – de que é justo fazer bem ao amigo e mal ao inimigo – a ideia de que é justo fazer bem a um amigo bom e mal a um inimigo mal?

Polemarco - Exatamente. Parece-me que isso seria falar com propriedade.

Sócrates - Então, é próprio de um homem justo fazer mal a qualquer espécie de homem?

Polemarco - Precisamente. Deve-se fazer mal aos malvados e inimigos.

Sócrates - Quando se faz mal aos cavalos, eles se tornam melhores ou piores?

Polemarco - Piores.

Sócrates - Em relação à perfeição dos cães ou à dos cavalos?

Polemarco - À dos cavalos.

Sócrates - Mas, caso se fizer mal a cães, eles se tornam piores relativamente à perfeição de cães, e não à de cavalos?

Polemarco - Forçosamente.

Sócrates - E quanto aos homens, ó, companheiro, não teremos de dizer o mesmo: que, se lhes faz o mal, tornam-se piores em relação à perfeição humana?

Polemarco - Exato.

Sócrates - Mas a justiça não é a perfeição dos homens?

Polemarco - Isso também é forçoso.

Sócrates - E, se se fizer mal aos homens, são forçosos que eles se tornem mais injustos?

Polemarco - Assim parece.

Sócrates - Acaso os músicos podem tornar outrem ignorante na música através de sua arte?

Polemarco - Impossível.

Sócrates - E os tratadores de cavalos podem tornar outrem incapaz de montar através de sua arte?

Polemarco - Não pode ser.

Sócrates - Mas os justos podem tornar outrem injusto através da justiça? Ou, de um modo geral, os bons podem tornar outrem mal através de sua perfeição?

Polemarco - É impossível.

Sócrates - Efetivamente, a ação do calor não é parece-me refrescar, mas o contrário.

Polemarco - Sim.

Sócrates - Nem a da secura umedecer, mas o contrário.

Polemarco - Exatamente.

Sócrates - Nem tampouco a do homem bom fazer o mal, mas o contrário?

Polemarco - Assim parece.

Sócrates - Então, o homem justo é bom?

Polemarco - Absolutamente.

Sócrates - Logo, ó, Polemarco, fazer mal não é a ação do homem justo, quer seja a um amigo, quer seja a qualquer outra pessoa, mas, ao contrário, é a ação de um homem injusto.

Polemarco - Parece-me inteiramente verdade, ó, Sócrates.

Sócrates - Portanto, se alguém afirmar que a justiça consiste em restituir a cada um, o que lhe é devido, e que isso significa que o homem justo deve fazer mal aos inimigos e bem aos amigos, quem assim afirmar não é sábio, porquanto não disse a verdade. Fazer mal não é justo de nenhuma maneira.

Polemarco - Concordo.

Sócrates - Logo, lutaremos, pois, tu e eu, se alguém pretender afirmar que disse semelhante coisa Simônides, Biante, Pítaco ou qualquer outro dos bem-aventurados sábios.

Polemarco - Eu estou disposto a acompanhar-te na luta.

Sócrates - Mas, sabes tu, por acaso, a quem pertence esta afirmação: “é justo fazer bem aos amigos e mal aos inimigos”?

Polemarco - De quem?

Sócrates - Penso que é de Periandro, de Perdicas, de Jerjes, de Isménias de Tebas ou de qualquer outro homem rico muito convencido de seu grande poder.

Polemarco - Verdade.

No diálogo entre Sócrates e Polemarco, não há "justiça" quando ela for considerar todos os seres humanos da mesma espécie. Fazer o mal para alguns, enquanto outros não, é mais uma condição de especificar quem é realmente mal e quem é realmente bom. Tal premissa é vazia de sentido, pois os valores sociais mudam sobre ser mal e ser bom.

É encontrado também em Agostinho o sentido sobre justiça, quando pirata questiona Alexandre, O Grande:

“(...) a mim, porque o faço com um pequeno navio, chamam-me ladrão; e a ti porque o fazes com uma grande armada, chamam-te imperador”.

Por que o reconhecimento na CRFB de 1988 pelas desigualdades sociais? A CRFB de 1988 é um documento solene, o documento máximo do ordenamento pátrio. Quanto à classificação constitucional, a CRFB de 1988 é promulgada, isto é, a sua origem foi a vontade do povo brasileiro. O Poder Constituinte Originário transcreveu a vontade do povo na CRFB de 1988. Quis o povo brasileiro que, na República Federativa do Brasil, isto é, as futuras gerações, com as participações das gerações responsáveis pela criação de uma nova Constituição, construíssem e desenvolvessem o Brasil para ser solidário, compatriota, harmônico, fraterno etc.

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

II - prevalência dos direitos humanos;

III - autodeterminação dos povos;

IV - não-intervenção;

VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;

IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;

Sérgio: é a dignidade humana "um valor preenchido". Soma-se esse valor como quis o povo brasileiro: que, na República Federativa do Brasil, isto é, as futuras gerações, com as participações das gerações responsáveis pela criação de uma nova Constituição, construíssem e desenvolvessem o Brasil para ser solidário, compatriota, harmônico, fraterno etc. e com o reconhecimento da valorização do ser humano, independente de nacionalidade, por pertencer à espécie humana.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

IV - e livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

V - e assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

VI - e inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de cult o e a suas liturgias;

IX - e livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

XIV - e assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo: DLG nº 186, de 2008 , DEC 6.949, de 2009 , DLG 261, de 2015 , DEC 9.522, de 2018 )

§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

§ 3º Compete à lei federal:

I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§ 4º A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso IIdo paragrafoo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

§ 5º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

§ 6º A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.

§ 2º A não renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal.

Sérgio: nas normas constitucionais acima, todo cidadão pode externalizar suas opiniões pessoais, ainda que por motivos de crença, sem que seja por meio do anonimato. CRFB de 1988 garante a todos os cidadãos, sejam agentes públicos ou não, cumprindo penas ou não, a manifestação por natureza política, ideológica e artística. Do comportamento, a responsabilização pelos danos advindos de seu comportamento por dano material, moral ou à imagem. A "produção e a programação das emissoras de rádio e televisão" deve alcançar, por preferência, a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas. de forma que também alcance respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. Pode-se dizer que a não renovação da concessão ou permissão para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens somente se fará para se evitar qualquer divulgação contrária às regras e, principalmente, aos princípios constitucionais.

LEI Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989

Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de um a três anos e multa.(Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo;(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por qualquer meio; (Redação dada pela Lei nº 12.735, de 2012) (Vigência)

III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores. (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

Sérgio: a norma infraconstitucional não pode ser incompatível com as regras e os princípios constitucionais.

LEI Nº 12.965, DE 23 DE ABRIL DE 2014

Art. 1º Esta Lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria.

Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados os seguintes direitos:

I - inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.

§ 2º A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal.

§ 3º As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.

§ 4º O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3º , poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Sérgio: A liberdade de expressão é mais do que gesticular, falar, escrever. O ato de se comunicar é um símbolo linguístico e, como tal, possui dimensões diversas. Diversas, pois a liberdade de expressão é um desenvolvimento contínuo da maneira por meio da qual o ser humano se comunica. Da arte rupestre, as escritas cuneiformes até a atualidade da comunicação — como faço por intermédio da Internet —, a espécie humana se expressa. É a liberdade de expressão a exteriorização íntima de cada ser humano. Ainda que a liberdade de expressão seja pessoal, como numa agenda pessoal, há comunicação, neste caso, da própria pessoa que escreve. Do que escreve, ou digita, posteriormente, nalgum momento, a reflexão sobre os escritos. Disso, a importância da liberdade de expressão para o desenvolvimento humano.

LEI Nº 12.737, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2012

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos e dá outras providências.

Art. 154-A. Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita:

§ 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:

Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.

§ 4º Na hipótese do § 3º , aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos.

§ 5º Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra:

I - Presidente da República, governadores e prefeitos;

II - Presidente do Supremo Tribunal Federal;

III - Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou

IV - dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.”

Sérgio: outra vez, a norma infraconstitucional jamais pode estar divorciada das normas constitucionais. Do que escreve, ou digita, posteriormente, nalgum momento, a reflexão sobre os escritos ocorrerá. A curiosidade humana não é ruim. É a curiosidade benéfica, pois ela garantiu que a espécie humana fosse além de seu mundo interior e pudesse cogitar, aventurar-se no além-mar. Todavia, salvo nalguns casos, por vontade pessoal, a vida privada e a intimidade também fazem parte do desenvolvimento da espécie humana. É o segredo pessoal a maneira de pensar e repensar auscultando a própria consciência. Em estados de completo esvaziamento de pensamentos, como fazem os iogues, por exemplo, há o afastamento dos pensamentos próprios, mas não desentranhados de outros pensamentos. Esses últimos pensamentos são os valores culturais. A intimidade e a privacidade também garantem proteção contra ideologias dominantes, muitas vezes discriminatórias. Como seriam as revoluções se as informações não pudessem ser íntimas e privadas? Não haveria nenhuma revolução. Isso me faz pensar nas tecnologias atuais de monitoramentos nas vias públicas, em instituições de ensino etc. capazes de leituras faciais, expressões corporais. As autoridades prontamente saberão se os cidadãos estão felizes ou não com as políticas dos governantes.

DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940

Art. 216-B. Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes: (Incluído pela Lei nº 13.772, de 2018)

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo. (Incluído pela Lei nº 13.772, de 2018)

Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Aumento de pena (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Exclusão de ilicitude (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

§ 2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Sérgio: outra vez, a norma infraconstitucional jamais pode estar divorciada das normas constitucionais. Todavia, "cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado". A cultura brasileira foi construída por valores e crenças da Igreja Católica Apostólica Cristã. Atualmente, há parceria entre católicos, protestantes e evangélicos para impedir a "ameaça comunista". Tal ameaça representa, nas palavras deles, completa perversão moral. Logicamente, caso o Brasil fosse desenvolvido pelos nativos povos indígenas, não haveria crime por divulgação de "cena de nudez ou ato sexual, ou libidinoso, de caráter íntimo e privado". O corpo humano não é pecado, não é impuro. A fixação, a curiosidade pela vida alheia, quanto à sexualidade, o comportamento sexual, os relacionamentos sexuais, resultam de séculos de repressões sexuais. Tem-se, assim, o resultado, as invasões. Outro resultado é a compulsão sexual, a exploração capitalista por causa dos tabus quanto ao sexo e a sexualidade humana. Aliás, o Brasil é um dos países que mais consomem produções cinematográficas pornôs.

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.

Sérgio: na esteira dos princípios constitucionais, todo e qualquer comportamento humano produz consequências. Viver e conviver em sociedade demanda autocontrole pessoal. Se todos os cidadãos resolverem fazer o que dá vontade, a vida seria insuportável, muito mais do que presente. As regras sociais, as normas em geral, elas têm como finalidade a harmonia nas relações interpessoais. Diversas ideologias, diversos defensores e opositores. Se cada grupo ideológico quisesse agir sem se preocupar com a dignidade de outros grupos, os crimes aumentariam. Claro, conceituar crime e admitir quem comete, depende do utilitarismo. Não há nada demais para um neonazista decapitar ciganos, negros, prostitutas etc.

LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.

Art. 78. As revistas e publicações contendo material impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas em embalagem lacrada, com a advertência de seu conteúdo.

Parágrafo único. As editoras cuidarão para que as capas que contenham mensagens pornográficas ou obscenas sejam protegidas com embalagem opaca.

Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao público infanto-juvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Sérgio: para os evangélicos, as crianças são consideradas como tábua rasa, isto é, não possuem conhecimento nenhum. Resulta disso a responsabilidade de os adultos repassarem valores considerados "justos", "sociais", "benéficos" para a coletividade. John Locke também julgava as crianças como "tábua rasa". Jean Jacques Rousseau acreditava que a sociedade corrompia as crianças. Thomas Hobbies, Sigmund Freud, por sua vez, acreditavam que a espécie humana é má e si mesma.

LEI Nº 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003

Art. 1º É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

Art. 2º O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

Art. 4º Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei.

Sérgio: Idosos possuem suas limitações em decorrência da idade. Nada é eterno. Ainda que algumas pessoas mantenham "aspecto de jovem", não se comparam aos jovens. Se assim não fosse, não existiria especialidade médica em gerontologia. Tanto o Estado, quanto a sociedade, devem proteger os idosos contra todas as formas de negligência, de maus-tratos.

LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010

Art. 1º Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

Parágrafo único. Para efeito deste Estatuto, considera-se:

I - discriminação racial ou étnico-racial: toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada;

Art. 23. É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

Infelizmente, negacionistas e relativistas quanto aos séculos de explorações aos negros agem e criam conceitos de racismo reverso. Trata-se de esforços de minimizar gravíssimas violações de Direitos Humanos no passado. Não me estenderei, recomendo ler Dia da Consciência Negra. Como relativizar este dia invocando 'igualdade' (jusbrasil.com.br).


II- DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS (DIDH)

Sem muito comentários, as causas na Segunda Guerra Mundial geraram efeitos positivos, a internacionalização dos Direitos Humanos (DHs). Quando me refiro "geraram efeitos positivos", não que a Segunda Guerra Mundial foi necessária, todavia, pela trajetória da espécie humana quanto aos DHs, infelizmente, a dor tem servido de modificar comportamentos considerados "bons" para a humanidade. Pelo utilitarismo, diversos filósofos questionaram o próprio utilitarismo. Não é possível conceber "justiça" quando a "maioria" considera ela mesma detentora de direitos, enquanto mitiga direitos de outros grupos humanos considerados "inferiores".

O Brasil é signatário da CONVENÇÃO PARA A PREVENÇÃO E A REPRESSÃO DO CRIME DE GENOCÍDIO (1948). O Brasil repudia o crime de genocídio pela LEI Nº 2.889, DE 1º DE OUTUBRO DE 1956.

Alguns manifestantes contrários ao governo de Jair Messias Bolsonaro intitularam o presidente da República como "genocida". Juridicamente, o presidente da República não cometeu nenhum crime tipificado como "genocídio". A Lei é solar ao se referir "grupo" ou "membros do grupo":

Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal: (Vide Lei nº 7.960, de 1989)

a) matar membros do grupo;

b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo;

c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial;

d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;

e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo;

Para o enquadramento na Lei, o presidente da República agiria, no caso da pandemia atual, para dificultar a distribuição das vacinas para determinados grupos, ou mesmo priorizando determinadas regiões, para punir os seus opositores. Para isso, a comprovação da ilicitude de Bolsonaro deve ser clara. Entretanto, pode Bolsonaro ter o seu comportamento apreciado, pelo comportamento de negligência genérica, pela Comissão Interamericana de Direitos Humano e, se condenado, pela Corte Interamericana de Direitos Humano, à responsabilização. No caso, a responsabilização do Estado brasileiro.

Pela liberdade de expressão, "Os funcionários públicos estão sujeitos a maior escrutínio da sociedade. As leis que punem a expressão ofensiva contra funcionários públicos, geralmente conhecidas como 'leis de desacato', atentam contra a liberdade de expressão e o direito à informação"[Convenção Liberdade de Expressão (oas.org)].

A LEI Nº 7.170, DE 14 DE DEZEMBRO DE 1983 tem servido de escudo para Bolsonaro contra os seus opositores. A mesma Lei também foi usada pelo ministro Alexandre de Morais.

No ordenamento jurídico pátrio, o DECRETO No 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992:

ARTIGO 13

Liberdade de Pensamento e de Expressão

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.

2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei a ser necessária para assegurar:

a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral pública.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos à censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2º.

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

Como exposto, "a lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência". Há diferença entre crítica de apologia.

DISCURSO DE ÓDIO E A CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS

Transcreverei partes do Capítulo VII (OAS :: Special Rapporteurship for Freedom of Expression):

Introdução: Finalidade e contexto do relatório

1. Discurso de ódio, ou discurso destinado a intimidar, oprimir ou incitar o ódio ou a violência contra uma pessoa ou grupo com base em sua raça, religião, nacionalidade, gênero, orientação sexual, deficiência ou outra característica de grupo, não conhece limites de tempo ou lugar. Da Alemanha nazista à Ku Klux Klan nos Estados Unidos à Bósnia nos anos 1990 até o genocídio de 1994 no Ruanda, o discurso de ódio foi implantado para assediar, perseguir e justificar a privação dos direitos humanos, e no seu mais extremo, para racionalizar o assassinato. Na esteira do Holocausto alemão, e com a ascensão da Internet e de outros meios de comunicação modernos ajudando a facilitar a disseminação do discurso de ódio, muitos governos e organismos intergovernamentais tentaram limitar os efeitos nocivos desse tipo de expressão. Esses esforços, no entanto, colidem naturalmente com o direito à liberdade de expressão garantido por inúmeros tratados, constituições nacionais e leis internas.

2. Nas Américas, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos prevê uma ampla medida de liberdade de expressão nos termos do artigo 13º, garantindo o direito de "buscar, receber e transmitir informações e ideias de todos os tipos" através de qualquer meio. O artigo 13º protege essa liberdade, proibindo a censura prévia e as restrições indiretas e permitindo a posterior imposição de responsabilidade em apenas um pequeno conjunto finito de exceções, como as destinadas a proteger a segurança nacional, a ordem pública e os direitos e reputações de terceiros. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos refinaram ainda mais essa liberdade através de sua jurisprudência das últimas décadas.

3. Este amplo manto de liberdade de expressão, no entanto, não é absoluto. A Convenção Americana – como muitos pactos internacionais e regionais – declara que o discurso de ódio está fora das proteções do artigo 13º e exige que as partes dos Estados proíbam essa forma de expressão. O parágrafo 5º do artigo 13º prevê:

Qualquer propaganda para a guerra e qualquer defesa do ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitações à violência sem lei ou a qualquer outra ação semelhante contra qualquer pessoa ou grupo de pessoas por qualquer motivo, incluindo os de raça, cor, religião, língua ou origem nacional, serão considerados crimes puníveis por lei.

(...)

Representante sobre a Liberdade de Imprensa, o Relator Especial reconheceu que a expressão que incita ou promove "ódio racial, discriminação, violência e intolerância" é prejudicial, e que os crimes contra a humanidade são frequentemente acompanhados ou precedidos por essas formas de expressão. A Declaração Conjunta observou que as leis que regem o discurso de ódio, dada a sua interferência na liberdade de expressão, devem ser "previstas em lei, servir a um objetivo legítimo como estabelecido o direito internacional e ser necessário para alcançar esse objetivo". Observou ainda que o discurso de ódio, de acordo com o direito internacional e regional, deve, no mínimo, estar em conformidade com as seguintes diretrizes

  • ninguém deve ser penalizado por declarações que são verdadeiras;

  • ninguém deve ser penalizado pela disseminação do discurso de ódio, a menos que tenha sido demonstrado que o fizeram com a intenção de incitar a discriminação, hostilidade ou violência;

  • o direito dos jornalistas de decidir a melhor forma de comunicar informações e ideias ao público deve ser respeitado, especialmente quando eles estão relatando racismo e intolerância.

  • ninguém deve estar sujeito a censura prévia; e

  • qualquer imposição de sanções pelos tribunais deve estar em estrita conformidade com o princípio da proporcionalidade.

(...)

19. Finalmente, em J.R.T. e no W.G. Party v. Canada, o Comitê considerou o caso de um canadense que usou mensagens gravadas em fita para alertar os chamadores dos perigos das "finanças internacionais e judeus internacionais que levam o mundo a guerras, desemprego e inflação e o colapso dos valores e princípios mundiais". A petição de J.R.T. contestou o término de seu serviço telefônico sob a Lei Canadense de Direitos Humanos de 1978, o que tornou uma "prática discriminatória" usar o telefone de uma maneira que pudesse expor outros ao ódio ou desprezo com base, entre outros, raça, origem nacional ou étnica e religião. O Comitê declarou a petição inadmissível porque as opiniões que J.R.T. queria disseminar por telefone "constituem claramente a defesa do ódio racial ou religioso que o Canadá tem a obrigação prevista no nº 2 do artigo 2º do [ICCPR] de proibir.

C. O Tribunal Penal Internacional para Ruanda (ICTR) e o Tribunal Militar Internacional em Nuremberg

20. No seu discurso de ódio mais extremo pode ser usado como arma para incitar, promover ou promover o extermínio de um grupo de pessoas, como foi visto tanto na Alemanha nazista quanto no genocídio de 1994 no Ruanda. Ambas as atrocidades levaram as criações de tribunais internacionais a processar os responsáveis, e essas acusações incluíram decisões diretas sobre o crime de "incitação ao genocídio". Embora este crime hediondo seja uma forma notória e pouco frequente do discurso de ódio mais comumente alvo de convenções internacionais e direito doméstico, as decisões dos dois tribunais sobre a incitação ao genocídio podem ser valiosas para orientar decisões sobre os tipos mais padrão de discurso de ódio.

21. O Tribunal Militar Internacional de Nuremberg foi o resultado de um acordo de 1945 entre o Reino Unido, os Estados Unidos, a França e a União Soviética que visava processar criminosos de guerra por crimes contra a paz, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Um caso ouvido pelo Tribunal foi o de Julius Streicher, um apoiador estridente dos nazistas que pediu a aniquilação da raça judaica e incitou os alemães a perseguir judeus através de discursos e artigos. Streicher, por exemplo, chamou alguém de origem judaica de" parasita, inimigo, malfeitor, disseminador de doenças que devem ser destruídas no interesse da humanidade ". Embora Streicher negasse ter conhecimento de execuções em massa de judeus, o Tribunal decidiu que as incitações de Streicher ao assassinato e extermínio constituíram claramente" perseguição por motivos políticos e raciais em conexão com crimes de guerra " como definido pela Carta do Tribunal, e foram, portanto, crimes contra a humanidade. Streicher foi condenado à morte.

Minhas ponderações. No caso em tela, o discurso de ódio estava direcionado para ser humano de origem judaica, por ser" parasita, inimigo, malfeitor, disseminador de doenças que devem ser destruídas no interesse da humanidade ". Este é um discurso de ódio explícito. Outros exemplos de discursos de ódios explícitos:

  • Católicos, evangélicos e protestantes —" Comunistas são pedófilos, destruidores dos valores morais cristãos e devem ser exterminados ";
  • Católicos contra evangélicos —"Evangélicos são contra a Igreja Católica, pois ironizam nossas imagens sagradas. São inimigos e devem ser expulsos do Brasil";
  • Evangélico para católico —"O Papa é nada mais do que uma figura simbólico, o mesmo para as imagens de seus santos. Por adorarem imagens, são adoradores de falsos deuses. Todo evangélico deve agir contra este grande mal de adorações aos falsos deuses, pois somente Ele é o Verdadeiro e Único".

Existe o discurso de ódio velado/implícito. Pode conter defesa sobre" moralidade "," ética "," soberania "(nacionalismo)," boa educação ", segurança pública etc.

Do site governo federal (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) a nota pública (Publicado em 31/07/2013 14h32. Atualizado em 14/05/2018 23h30) :

"O governo brasileiro congratula-se com a Organização dos Estados Americanos (OEA) pela aprovação em 6/06, em Antígua (Guatemala), da Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância e a Convenção Interamericana Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância.

(...)

A participação ativa do Brasil na aprovação das Convenções é coerente com as políticas desenvolvidas no país de combate à discriminação e promoção da igualdade racial no plano interno, como, por exemplo, a adoção da política de cotas para as populações historicamente marginalizadas. O governo brasileiro reconhece igualmente como um importante avanço para a afirmação dos Direitos Humanos a garantia da população vítima de violações devida a sua orientação sexual, religiosa, cultural ou política, assim como assegura a proteção de pessoas vulnerabilizadas em razão de sua condição social, deficiência ou estado de saúde física ou mental, inclusive infectológico e condição psíquica incapacitante".

Do site do Senado Federal (10/02/2021, 21h58)"Senadores aprovam por unanimidade Convenção Interamericana contra o Racismo":

O Plenário do Senado aprovou por unanimidade, em dois turnos, nesta quarta-feira (10), o Projeto de Decreto Legislativo 562/2020, que confirma a adesão do Brasil à Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância. No primeiro turno, votaram a favor do texto 71 senadores; no segundo turno, 66. O documento com a convenção, apresentado em 2013 pela Organização dos Estados Americanos (OEA), traz diretrizes para a luta contra o racismo. O projeto de decreto legislativo foi relatado pelo senador Paulo Paim (PT-RS). Por se tratar de um acordo internacional na área de direitos humanos, tem força de emenda constitucional. O texto agora vai a promulgação.

(...)

Parecer do relator

Ao destacar a importância dessa convenção, o senador Paulo Paim afirma que a luta contra o racismo e a intolerância deve ser a luta de todos os brasileiros. Ele agradeceu o apoio que a matéria recebeu de lideranças do país, do Senado e da Câmara dos Deputados.

— Ratificar a convenção interamericana contra o racismo é declarar, é validar, é confirmar o compromisso do Brasil com o respeito e o amor ao próximo, independentemente de raça, origem, cor, orientação sexual. Aprovar a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância é fortalecer o grande pacto de proteção para todos os seres humanos. Oxalá, senhor presidente, consigamos implantar ao longo do tempo todos os artigos da Constituição. Disse Nelson Mandela: democracia com fome, sem educação, sem saúde para maioria, é uma concha vazia — disse o relator.

Trechos da CONVENÇÃO INTERAMERICANA CONTRA TODA FORMA DE DISCRIMINAÇÃO E INTOLERÂNCIA:

CAPÍTULO I

Definições

Artigo 1

Para os efeitos desta Convenção:

1. Discriminação é qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes.

A discriminação pode basear-se em nacionalidade, idade, sexo, orientação sexual, identidade e expressão de gênero, idioma, religião, identidade cultural, opinião política ou de outra natureza, origem social, posição socioeconômica, nível educacional, condição de migrante, refugiado, repatriado, apátrida ou deslocado interno, deficiência, característica genética, estado de saúde física ou mental, inclusive infectocontagioso, e condição psíquica incapacitante, ou qualquer outra condição.

2. Discriminação indireta é aquela que ocorre, em qualquer esfera da vida pública ou privada, quando um dispositivo, prática ou critério aparentemente neutro tem a capacidade de acarretar uma desvantagem particular para pessoas pertencentes a um grupo específico, ou as coloca em desvantagem, a menos que esse dispositivo, prática ou critério tenha algum objetivo ou justificativa razoável e legítima, à luz do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

(...)

4. As medidas especiais ou de ação afirmativa adotadas com a finalidade de assegurar o gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais de grupos que requeiram essa proteção não constituirão discriminação, desde que essas medidas não levem à manutenção de direitos separados para grupos diferentes e não se perpetuem uma vez alcançados seus objetivos.

5. Intolerância é um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou contrárias. Pode manifestar-se como a marginalização e a exclusão de grupos em condições de vulnerabilidade da participação em qualquer esfera da vida pública ou privada, ou como violência contra esses grupos.

O discurso de ódio velado/implícito se caracteriza pelo" propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade "com a intenção de" marginalização e a exclusão de grupos em condições de vulnerabilidade ". Ou seja, o discurso de ódio velado/implícito não usa armas de fogo ou arma branca, contudo, de meios persuasivos, geralmente com produções de" fake news ", para se atingir o status quo da" maioria ", como se esta" maioria "representasse valores supremos, inquestionáveis, imutáveis. É o backlast — recomendo ler Justiça o lado moral na internet — Parte XV." Status quo "e" backlash "(jusbrasil.com.br) e Justiça, o lado moral da internet — Parte VII. A 'Contracontracultura' (jusbrasil.com.br).

Faço uso do Dicionário Aurélio século XXI sobre o significado da palavra ditadura:

[Do lat. dictatura.]

S. f.

1. Forma de governo em que todos os poderes se enfeixam nas mãos dum indivíduo, dum grupo, duma assembleia, dum partido, ou duma classe.

[Cf. democracia (2).]

2. Qualquer regime de governo que cerceia ou suprime as liberdades individuais.

3. Fig. Excesso de autoridade; despotismo, tirania.

Quando há invocação em defesa da" maioria ", a intenção é estabelecer, ou restabelecer, valores morais e éticos da comunidade que se acha" pura "," perfeita "," fraternal "," conciliadora ", única capaz de" desenvolver a economia ", criar e manter uma sociedade" harmoniosa ". Não obstante, a única intenção é a hegemonia dessa comunidade, principalmente pelo uso do Estado, para cercear ou suprimir as liberdades individuais de outras comunidades cujas ideologias sejam incompatíveis.

Existem formas de racismos: exclusão; segregação; e integração. Exemplos:

  1. Exclusão — No nazismo houve exclusão, os campos de concentração foram medidas de" profilaxia étnica "para os próprios nazistas. Nos EUA, pela ação da Klu Klus Kan, a defesa da supremacia branca;
  2. Segregação — Nos EUA, a segregação. Até os anos de 1980, o negros tinham lugares determinados para sentarem, quando podiam, nos assentos de ônibus. Na África, a segregação pelo Apartheid;
  3. Integração — No Brasil, a integração dos ex-escravos. Não existiram exclusão e segregação, no entanto, os ex-escravos foram rejeitados pelas políticas de desenvolvimentos do Estado. A vida dos ex-escravos eram em guetos, a ascensão socioeconômica fora dificultada. Somente com ações afirmativas, pelo ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal, os afrodescendentes puderam, pela equidade, ter os mesmos direitos dos não negros, a meritocracia, sem políticas racistas, tonou-se possível. Recomendo ler Faculdade de Direito da USP aprova reserva de vagas para alunos pretos, pardos e indígenas (PPIs). Luiz Gonzaga Pinto da Gama rejubila (jusbrasil.com.br) e Arquitetura da Discriminação: Jogos olímpicos de 2016, Morro da Favela e Vila Autódromo - Sérgio Henrique Da Silva Pereira - JurisWay.

O discurso de ódio velado/implícito contém exclusão, segregação ou integração. No caso do gênero feminino, da vigência do Código Civil de 1916 ao trabalhar fora do"lar doce lar" somente com autorização expressa do marido. E a exclusão, a segregação ou a integração? E no caso de backlash, para a mulher ser subjugada pelo homem, a exclusão, a segregação ou a integração?

Outro exemplo de segregação:

Art. 5º. A Religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a Religião do Império. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto doméstico, ou particular em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior do Templo. [CONSTITUIÇÃO POLÍTICA DO IMPÉRIO DO BRAZIL (DE 25 DE MARÇO DE 1824)]

No exemplo exposto, a segregação —" culto doméstico, ou particular em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior do Templo "e a integração —" Todas as outras Religiões serão permitidas ". No caso de exclusão," A Religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a Religião do Império ", todavia," Todas as outras Religiões serão "proibidas no Brasil, assim como" culto doméstico, ou particular ".

Há três anos publiquei Posso desobedecer ordem de policial por ele ser LGBT? , em qual modalidade (exclusão, segregação ou integração) se encaixaria a permissão de LGBTQI+ viver na sociedade brasileira sem "revelar", já que não é escolha ser ou não LGBTQI+, e sim, sua natureza? Lembre-se, discurso de ódio velado/implícito contém exclusão, segregação ou integração. Quando se fala "não tenho nada contra os LGBTQI+, desde que não demonstrem afetos nas vias públicas, principalmente na presença de crianças e adolescentes ", permite-se o convívio com os heteronormativos por integração.

CRÍTICA E APOLOGIA

Criticar, todos podem. Apologia, não. De que modo se diferenciam?

Exemplo. Direito de o marido estuprar sua "mulher de família"— anterior às novas redações da Lei nº. 12.015, de 2009 -, pelo débito conjugal:

"Exercício regular de direto. Marido que fere levemente a esposa, para constrangê-Ia à prática de conjunção carnal normal. Recusa injusta da mesma, alegando cansaço. Absolvição mantida. Declaração de Voto. (...) A cópula intra matrimonium é dever recíproco dos cônjuges e aquele que usa de força física contra o outro, a quem não socorre escusa razoável (verbi gratia, moléstia, inclusive venérea, ou cópula contra a natureza) tem por si a excludente da criminalidade prevista no art. 19, n. III (art. 23, III, vigente), de Código Penal, exercício regular de direito.” (TIGB RT, 461/444).

Liberdade de expressão e exemplos:

1) O direito de estupro — Numa via há carro de som. A voz que soa diz: "É direito dos homens, pelo débito conjugal, forçar suas esposas à realização da "conjunção carnal normal"(pênis na vagina), e não"cópula contra a natureza (sexo anal)";

2) O direito de salvar — Numa via há carro de som. A voz que soa alerta: "Vocês não sabem que os perversos não herdarão o Reino de Deus? Não se deixem enganar: nem imorais, nem idólatras, nem adúlteros, nem homossexuais passivos ou ativos, nem ladrões, nem avarentos, nem alcoólatras, nem caluniadores, nem trapaceiros herdarão o Reino de Deus. Assim foram alguns de vocês. Mas vocês foram lavados, foram santificados, foram justificados em nome do Senhor Jesus Cristo e do Espírito de nosso Deus” (Homossexualidade | Bibleinfo.com)

Em qual exemplo há crítica? No número"2". No"1", a apologia ao crime. Claro, como depreende-se da Lei nº. 12.015, de 2009. Antes da Lei, não existia crime de estupro pelo "Exercício regular de direto". Notem. A Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 possui como um de seus fundamentos a dignidade humana. Por que era possível, antes da Lei nº. 12.015, de 2009, o estupro marital? Porque a tradição estava tão radiante quanto o texto constitucional. A força da tradição, assim como a ideologia por trás dela, exercia forte postulado. Ora, não se pode conceber dignidade humana mitigada quando outro ser humano possui um valor a mais. Pela mesma ideologia, a mulher, em caso de demonstrar a sua satisfação sexual, ou exigir do marido o seu "crédito conjugal", a imputação de "vulgívaga". Dois pesos e duas medidas.

O vídeo acima ilustra o poder da tradição e a dificuldade de se adaptar aos novos valores sociais, estes criados pelo Estado. No entanto, o Estado também cria condutas, o Direito, por sua vez, permite que o Estado consolide sua ideologia, como no caso dos estados sulistas, nos EUA. No Brasil, em referência ao estupro marital, o Estado tinha fortíssima influência ideológica machista. Para mudar, o Estado também mudou. Não o Estado em si, pois é um mito; a mudança aconteceu na cultura brasileira, ainda que não em sua totalidade.

Alcanço aqui o título deste artigo: Há diferença entre 'abuso na liberdade de expressão' e 'direito de liberdade de expressão'? A resposta é depende. Pelo Direito Nacional e pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos existe diferença entre 'abuso na liberdade de expressão' e 'direito de liberdade de expressão'.

Há certos valores éticos morais universais: proibição de invasão de propriedade; desconhecido estuprar mulher casada, solteira; concidadão da mesma religião divergir e agir contrariamente aos dogmas da própria religião; furto; roubo; trapacear etc. Espera-se, então, abster-se de atos contrários. Não obstante, os valores éticos morais variam, e é histórico, para com outras culturas, ou mesmo comunidades do mesmo país. A escravidão é exemplo de considerar outros seres humanos como objetos.

Apesar dos códigos éticos morais nas diversas culturas, há certos valores éticos morais universais, como (redundância) proibição de invasão de propriedade; desconhecido estuprar mulher casada, solteira; concidadão da mesma religião divergir e agir contrariamente aos dogmas da própria religião; furto; roubo; trapacear etc.

No vídeo acima. Aquele que acredita, veementemente, em sua ideologia, pode ser acusado de "negacionista", de fatos e leis consideradas "absurdas" pelo próprio negacionista?


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há diferença entre 'abuso na liberdade de expressão' e 'direito de liberdade de expressão'? Depende. Depende daquele que acredita, veementemente, em sua ideologia. Fatos e leis consideradas "absurdas", por serem incompatíveis com o tipo de ideologia, jamais serão aceitas.

O exemplo do vídeo acima. Debates sobre crenças, ainda assim são ideologias. Interessante observar que ambas possuem algumas particularidades, e, ainda assim, há a "maioria" para ditar e cercear as liberdades individuais de "párias da sociedade".

No trecho do filme no alto, quem deve ser salvo? A mesma questão pode ser transportada para a liberdade de expressão. Quando se pode categorizar que há abuso na liberdade de expressão ou direito de liberdade de expressão?

A dinâmica da política

Sociedade e comunidade. Mesmo nas divergências entre as diversas comunidades que compõem a sociedade, existem momentos, de associações, negociações, coalizões.

Católico, protestante, ateu e candomblecista. Católicos e protestantes são contra os sacrifícios de animais durante os rituais do candomblé. O ateu é ambientalista, defende a dignidade dos animais não humanos, sendo a morte de qualquer desses animais, até para consumo humano, violação da dignidade do animal não humano. O ateu, vegano ou vegetariano, promove campanha contra o sacrifício de animais não humanos para os rituais do candomblé. Católicos e protestantes aproveitam a iniciativa do ateu para propor Projeto de Lei contra sacrifícios de animais não humanos em rituais candomblecistas. Projeto aprovado, proibição de sacrifício. O mesmo ateu, após o projeto, propõe, por iniciativa popular, proibição de qualquer símbolo católico nas repartições públicas. Os protestantes, então, aproveitam para fortalecerem suas campanhas contra os símbolos católicos. Iniciativa popular aprovada, os protestantes conseguiram materializar um dos seus propósitos. Outra iniciativa popular, também criada pelo mesmo ateu, contra o uso do Estado, pelos religiosos, para proibição de aborto.

Católicos e protestantes, apesar de algumas diferenças, unem-se contra o ateu. Algum cidadão vê oportunidade de se candidatar para deputado federal. Abraçará e defenderá o ateu e sua iniciativa. Eleições, votações e o cidadão candidato consegue vitória nas urnas. Alguns meses depois, o mesmo ateu propõe que os agentes públicos, principalmente os políticos, tenham as mesmas vantagens dos agentes na Suécia, ou seja, todas as mordomias presentes aos agentes brasileiros serão extintas — Um País Sem excelências e Mordomias. Outro deputado, não satisfeito, irá articular com outros deputados, para a manutenção do (super) subsídio e auxílios. Esse deputado negocia com católicos e protestantes. Acordo: os deputados, católico e protestante, apoiam o nobre deputado em sua causa, enquanto este apoiar os religiosos para criação de Emenda Constitucional, proibindo qualquer tipo de aborto.

Poderia criar outras situações, com libertários, liberais, anarquistas, comunistas, ateus, agnósticos. Por isso, a liberdade de expressão é pilar da democracia. Então, tudo pode? E os danos morais? A normas dos arts. 138, 138 e 140 do CP? Do jeito que se coloca no Brasil, em defesa da liberdade de expressão, tais artigos são"inconstitucionais". A antítese está entre defender fato(s) e condenar outro(s) fato(s). Se a liberdade de expressão não deve ter limites, não há nada demais chamar católico de"papa hóstia", de católico chamar evangélicos e protestantes de "hereges", de católicos, protestantes e evangélicos chancelarem os comunistas e os libertários, estes em defesa da autonomia da vontade de a mulher decidir, por ela mesma, fazer aborto ou não, de "demônios". Por sua vez, os comunistas e os libertários poderão autodenominar os católicos, protestantes e evangélicos de "permissionários do estupro marital", pois somente com a vigência da Lei nº. 12.015, de 2009, o direito de o marido estuprar sua "mulher de família" não é mais moral e ético.

Libertários e comunistas poderiam contra-argumentarem, "anterior às novas redações da Lei nº. 12.015, de 2009, por que não houve, muito antes da CRFB de 1988, de forma ampla e explícita, manifestações contrárias ao direito marital"? Comunistas e os libertários poderiam justificar a antinomia comparando a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em defesa da democracia e dos "bons costumes", com a falta da Marcha da Família com Deus pela Liberdade da Mulher de Não ser Estuprada Pelo Direito Marital, em defesa da dignidade do gênero feminino.

Encerro. Pela vigentes normas do Direito Nacional ou Interno, e do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), sim, há limites para a liberdade de expressão. Ou seja, nenhum direito é absoluto. Direito Nacional ou Interno e Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) foram construídos sobre os escombros, os cadáveres, as agonias, infelizmente, do Estado nazista. O nazismo foi a expressão máxima de todas as ideologias anteriores, o darwinismo social, a eugenia, a intolerância e o uso do positivismo jurídico para instrumentalizar, coisificar seres humanos "sem importâncias". Como o nazismo, o uso de notícias falsas, do medo generalizado, de não criar nenhuma verdade, as armas perfeitas para se impor qualquer tipo de ideologia, racista.

É a criação de uma realidade sem se basear na realidade. A espécie humana é única, todos os seres humanos querem respeito, consideração, valorização pelo trabalho, condições iguais para poder estudar, não discriminação etc. A arma perfeita para se impor qualquer tipo de ideologia, racista, é não criar nenhuma verdade para, posteriormente, declarar a única verdade, a dos próprios racistas. Estabelecida, não há mais Estado social, dignidade humana e os Direitos Humanos.


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