Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/10423
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Agências executivas e contratos de gestão.

A possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira deve ficar restrita apenas às autarquias e fundações?

Agências executivas e contratos de gestão. A possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira deve ficar restrita apenas às autarquias e fundações?

Publicado em . Elaborado em .

Órgãos da administração direta, empresas públicas e sociedades de economia mista que desempenhem serviços/atividades exclusivas do Estado podem ser qualificados como agência executiva.

"Ninguém respeita a Constituição

Mas todos acreditam no futuro da nação

Que país é este?" (Renato Russo)


Introdução.

A Crise do Estado ocupou a pauta central das decisões políticas na década de 90, conduzindo a uma ampla Reforma do Aparelho do Estado, com o objetivo de disponibilizar para a sociedade brasileira uma administração pública mais equilibrada e eficiente, aumentando a capacidade governamental de definir e implementar políticas públicas sem comprometimento de suas finanças.

O presente artigo tem por objeto a análise crítica da necessidade de revisão do instituto das Agências Executivas no âmbito da administração pública, mediante a adoção deste moderno arranjo institucional para órgãos ou entidades administrativas de qualquer natureza, de modo consentâneo com a previsão constitucional dos contratos de gestão (§8º, art. 37).


A Reforma do Aparelho do Estado.

Para uma compreensão do tema – Agências Executivas – é necessária uma contextualização prévia do processo de Reforma do Aparelho do Estado, a fim de verificar em que medida este instituto pode vir a ser aperfeiçoado, em continuidade ao processo de modernização do Estado iniciado na década de 90.

Conquanto tenha sido desencadeada no início dos anos 70, com os choques do petróleo (1973 e 1979), o explosivo endividamento externo, a desaceleração econômica e a hipérbole inflacionária, a Crise do Estado somente passa a mostrar os seus efeitos negativos na década de 80 (BRESSER-PEREIRA, 2003), quando a máquina estatal perde a sua capacidade de atuar como locomotiva do desenvolvimento econômico em razão dos aspectos fiscais da crise, do esgotamento da estratégia de substituição de importações, de distorções do modelo desenvolvimentista, criadas por setores interessados em auferir vantagens com o sistema intervencionista (rent-seekers), além da dificuldade estatal em acompanhar as crescentes inovações tecnológicas e do recrudescimento da competição entre mercados em nível global (globalização).

Todo momento de crise pode ser também um momento prenhe de oportunidades [01] e profícuo para mudanças de paradigmas. Deste momento de crise na década de 90, a sociedade brasileira alcançou duas das suas maiores conquistas no campo da gestão pública: a valorização da Gestão Fiscal Responsável e a Reforma do Aparelho do Estado.

No processo dialético do embate de posicionamentos travados naquela época parece ter restado um consenso [02] no sentido de que a resposta ideal para a crise do Estado Intervencionista do Bem-Estar não era o Estado Mínimo Neoliberal, mas sim um modelo de Estado em que o seu papel e tamanho fossem adequados para o atendimento das crescentes demandas sociais sem comprometimento do equilíbrio fiscal, de modo a assegurar a continuidade das políticas públicas e da capacidade de investimento estatal.

A solução para Crise do Estado não era ignorar a crise ou promover uma radical redução do tamanho do Estado, mas sim a maximização do aparato estatal (ajuste de tamanho e fortalecimento de sua capacidade gerencial). A resposta ideal para um Estado Intervencionista não é o "absentismo estatal", mas sim a adequação do seu tamanho e do seu papel para o aumento de sua capacidade de governar, implementar leis e políticas públicas (governança).

Em reação à crise, o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado – MARE elaborou o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, tendo como principal ideólogo o Ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, como resposta à proposição neoliberal do Estado Mínimo, por entender que os motivos da crise residiam em três pontos básicos (BRASIL, 1995a): a crise fiscal, os evidentes sinais de fadiga do modelo intervencionista de desenvolvimento e a inadequação do modelo burocrático de administração pública para atender às crescentes demandas da sociedade (BRASIL, 1995b, p. 10-11).

O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado preconizava a necessidade de superação do modelo burocrático de administração pública, com a implementação de instrumentos gerenciais na condução da atividade administrativa estatal, considerando a necessidade de reformulação do controle da atuação governamental, pugnando no sentido de que, paralelamente aos mecanismos tradicionais de controle prévio dos meios de atuação da máquina administrativa, deveriam ser implementados mecanismos de controle a posteriori da atividade pública, ou seja, avaliação de resultados das políticas públicas.


Administração Gerencial.

Como reação direta ao patrimonialismo na condução da coisa pública (res publica) e às suas mazelas históricas (autoritarismo, clientelismo, nepotismo, corrupção e demais formas de apropriação privada da coisa pública), o Estado Liberal Moderno adotou um sistema mais racional e democrático de administração, sintetizada no pensamento do sociólogo alemão Max Weber (administração pública burocrática), que propugnava pela estrita legalidade, formalização dos atos, minuciosa divisão de competências, impessoalidade, hierarquização e meritocracia.

A administração pública burocrática teve como mérito principal a racionalização e profissionalização da atividade administrativa, introduzindo instrumentos de controle da legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade dos atos públicos, instituindo, por exemplo, a obrigatoriedade do concurso público para ingresso no serviço público, a licitação para as compras/alienações estatais e o devido processo administrativo.

Não obstante os seus inequívocos aspectos positivos, o caráter de auto-referência da administração burocrática conduziu ao desvirtuamento do modelo weberiano, com a verificação de disfunções (excessivo engessamento da máquina burocrática, na desmesurada exigência de formulários, selos, carimbos, no acúmulo irracional de papel e dificuldades em "customizar" soluções às múltiplas e diversificadas demandas dos cidadãos, em razão da rígida padronização do atendimento) [03]. Conforme arguta análise formulada em meio à Crise do Estado (RIBEIRO, p. 81) "As chamadas máquinas estatais adquiriram dimensões descomunais, são hoje verdadeiros mamutes burocráticos que muitas vezes a própria administração pública não conhece direito, como no caso do Brasil".

A administração pública burocrática, conquanto tenha tido o incontestável mérito de tentar combater as mazelas do sistema patrimonialista (nepotismo, clientelismo, corrupção, etc.), não se mostrou capaz de, por si só, dar conta do aumento da pressão da sociedade por uma maior oferta de serviços públicos de qualidade, pois o excesso de controles formais não permitia a avaliação dos resultados alcançados, mas sim o mero controle dos meios, conduzindo à constatação de que este excesso de controle não significa, de forma necessária, uma melhoria dos serviços públicos e dos resultados das políticas públicas.

O crescimento da demanda da sociedade por serviços públicos mais eficientes e de maior qualidade, bem como o aperfeiçoamento das instituições democráticas e o aumento dos canais legítimos de participação popular impõem uma administração pública que atue impulsionada pela necessidade de obtenção de resultados, mediante a superação de alguns dos paradigmas da administração pública burocrática [04].

Na medida em que o cidadão passa a ser identificado como destinatário final dos serviços estatais (invertendo-se uma suposta relação de vassalagem entre o cidadão e o Estado, sendo aquele considerado a ultima ratio deste), a administração pública necessita se utilizar de instrumentos e práticas de nítida inspiração na gestão empresarial (descentralização decisória, flexibilidade, inovação, etc.), contrapondo-se aos rigores típicos da administração burocrática, sem, contudo, abandonar os avanços históricos oriundos do racionalimo weberiano (legalidade, impessoalidade, moralidade, etc.).

Para um salto de qualidade na oferta de serviços públicos à sociedade, que, em última análise, custeia o funcionamento do aparato estatal, há a necessidade de deslocar a ênfase do controle dos procedimentos (meios) para os resultados (fins), ou seja, a prestação de serviços de qualidade aos cidadãos, com níveis crescentes de eficiência (redução de custos com ampliação da oferta e da qualidade dos serviços públicos).

Neste cenário, emerge a Administração Pública Gerencial visando reformular o controle na atividade administrativa, deslocado o seu enfoque dos meios (processos) para os fins (resultados), visando o aumento da satisfação dos usuários e dos níveis de eficiência, com base nas experiências anglo-americana do managerialism, consumerism e public service orientation, bem como no receituário contido na obra Reinventando o Governo (Osborne & Gaebler, 1994), um best-seller no campo da Nova Gestão Pública.

Não se ignora a importância dos mecanismos de controle prévio da atividade estatal, porém não se olvida que o excesso de controle não conduz, por si só e necessariamente, a um aumento da eficiência da atuação estatal, podendo, na maioria das vezes, redundar em simples "ineficiência controlada" e não em um efetivo "controle de eficiência".

A reformulação do enfoque do controle na atividade estatal, o aumento da autonomia dos gestores públicos sobre os meios e recursos postos à sua disposição para movimentar a máquina administrativa e a existência mecanismos efetivos de controle de resultados das políticas públicas, são os pontos cruciais para a implementação de uma administração pública verdadeiramente gerencial, ágil e eficiente.


A Lógica da Reforma do Aparelho do Estado.

A Reforma do Aparelho do Estado criou institutos jurídicos novos para dotar a administração pública de instituições mais adequadas a dar conta aos desafios que se impõem ao setor estatal, sendo necessária uma análise das premissas básicas do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado para entender a finalidade e o campo de atuação de cada um destes modernos arranjos institucionais.

Para este efeito, o Plano Diretor da Reforma (BRASIL, 1995a, p. 42-43) concebeu a existência de quatro setores no Aparelho do Estado, a fim de responder a questionamentos sobre que atividades devem ser desempenhadas pelo setor estatal, quais devem ser transferidas para o setor público não-estatal e quais devem ser transferidas para o setor privado, bem como que instituições devem ser criadas para que o alcance de cada um dos objetivos da reforma, quais sejam: (1) núcleo estratégico (corresponde diretamente ao exercício dos Três Poderes e o Ministério Público, situando-se na esfera das decisões políticas fundamentais), (2) serviços/atividades exclusivas (somente podem ser prestadas pelo Estado, sendo, por essência, atividade estatais, nas quais o Estado exerce o seu poder extroverso - ex. tributação, policiamento, regulação, fiscalização, fomento, etc.); (3) serviços não exclusivos (atividades em que existe um interesse público subjacente que legitima a atuação estatal, porém sem eliminar a possibilidade de que estes serviços sejam desempenhados por prestadores privados - saúde, educação, cultura, pesquisa, preservação ambiental, desporto, etc.); e, (4) produção de bens e serviços para o mercado (hipóteses excepcionais em que é legítima a exploração direta de atividade econômica pelo Estado – imperativo da segurança nacional ou relevante interesse coletivo – por se tratar de atividades que, em princípio, devem ser realizadas pelo mercado, segundo os princípios da iniciativa privada e da livre concorrência).

O Plano Diretor da Reforma (BRASIL, 1995a, p. 40-44) concebeu estes setores estatais para evidenciar a forma de propriedade necessária para o desempenho de suas funções e a forma de gestão que deve ser empregada, a fim de atender às peculiaridades de cada uma destas esferas de atuação.

Em relação ao setor de atividades e serviços exclusivos do Estado, o Plano Diretor da Reforma idealizou um modelo de gestão que fosse mais consentâneo com as exigências de eficiência que marcam este setor (qualidade dos serviços e dos gastos públicos), propugnado pela necessidade da implementação de uma administração gerencial. Para pôr em prática esta estratégia, o MARE concebeu a criação de agências autônomas, ou seja, de corpos estatais com maior autonomia gerencial, administradas segundo um contrato de gestão (compromisso de resultados), com substituição da rigidez burocrática dos controles a priori pela concepção gerencialista de controles a posteriori de resultados pelo núcleo estratégico. Esta modalidade de controle, segundo Meirelles (1996, p. 576), tem a característica de controle finalístico de entidades autônomas.

O principal marco legal da Reforma do Aparelho do Estado é a Emenda Constitucional nº 19/98, que alçou o princípio da eficiência a princípio explícito da administração pública, passando a atuação estatal a ser analisada sob os prismas dos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e da eficiência (MODESTO, 2005b) [05]. Além disso, a aludida Emenda Constitucional possibilitou a ampliação da autonomia de órgãos e entidades mediante contrato de gestão, conferindo aplicabilidade às agências autônomas concebidas pelo MARE.

A implantação de instrumentos e institutos preconizados pela administração pública gerencial é um dos vetores que direcionaram a Reforma do Aparelho do Estado, trazendo importantes inovações para o campo da gestão pública: o contrato de gestão, as organizações sociais, as agências reguladoras, as agências executivas, o uso intensivo de tecnologia da informação, a criação de carreiras próprias de Estado na área de formulação de políticas públicas e gestão governamental, além de uma completa revisão de competências e estruturas dos órgãos e entidades da administração pública.


Modelos Institucionais Criados pela Reforma do Aparelho do Estado.

Dentre as principais instituições jurídicas criadas pela Reforma do Aparelho do Estado se destacam as Organizações Sociais (OS), as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), as Agências Reguladoras e as Agências Executivas.

Cada um desses arranjos institucionais tem um campo de atuação próprio, que varia de acordo com a sua finalidade e o setor de atuação estatal em que se encontra inserido, de acordo com as diretrizes traçadas pelo Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Visando racionalizar a máquina estatal, o Plano Diretor da Reforma delimitou o campo de atuação de cada um dos setores do Estado, dos Poderes Públicos, dos órgãos administrativos, das entidades administrativas, das organizações e das empresas estatais (BRASIL, 1995a):

Setores do Estado

Núcleo Estratégico

Atividades Exclusivas

Serviços não exclusivos

Produção para o mercado

Três poderes

Ministério Público

Administração Direta

Administração Indireta

Organizações Estatais Organizações Privadas Empresas Públicas Sociedade economia mista
Agências reguladoras Agências Executivas Agências reguladoras Agências Executivas Organizações sociais OSCIP´s

Figura 01 – Campo de Atuação das OS, OSCIP e Agências

Seguindo as premissas do Plano Diretor da Reforma já existem implementadas em todo País, tanto na esfera da administração federal quanto estadual, organizações sociais (OS), organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) e agências reguladoras, sendo que em relação às agências executivas as iniciativas ainda são um tanto quanto tímidas, frente às potencialidades deste arranjo institucional nitidamente gerencial para o aumento da governança.

Ao contrário das agências reguladoras, que proliferaram em virtude das privatizações de setores de grande importância econômica, as administrações públicas brasileiras parecem não ter se apercebido da importância das Agências Executivas como instrumento de modernização da gestão pública, criando uma espécie de "autismo" entre o aparato institucional existente, que ainda segue os rígidos princípios burocráticos (excesso de controles e pouca, ou nenhuma, avaliação de desempenho) e o discurso gerencialista em voga.

A despeito da implementação dos dois arranjos institucionais mais conhecidos do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (Organizações Sociais e Agências Reguladoras) no âmbito da administração pública ainda não foi consolidado o modelo Agências Executivas [06], embora sejam expressamente contempladas no Plano Estratégico do Estado (PPA 2004/2007) [07].

A implantação de agências executivas na administração pública, antes de ser uma demanda dos ideólogos da Nova Administração Pública, é uma efetiva visão de futuro no sentido da obtenção de um modelo de gestão pública mais moderno, adequado e eficiente, com a implementação de programas e ações voltados para o atendimento das demandas do cidadão, gestão de resultados, estabelecimento de objetivos/metas e avaliação permanente, fundada em indicadores apropriados e confiáveis.

Além disso, há que ser levado em consideração que a implementação de Agências Executivas pressupõe a assinatura de um contrato de gestão, a fim de que o órgão ou entidade venha a ter a sua autonomia ampliada, passando a ser regido pelo regime jurídico-administrativo próprio deste arranjo institucional.


Contratos de Gestão.

A falta de disciplina genérica, no direito positivo, dos contratos de gestão dificulta uma conceituação uniforme desta multifacetada realidade, conforme reconhece a doutrina especializada (DI PIETRO, 2002, p. 199), uma vez que os contratos de gestão se aplicam a situações diversas: (a) às empresas estatais integrantes do Programa de Gestão das Empresas Estatais [08]; (b) ao Serviço Social Autônomo das Pioneiras Sociais [09], (c) às Organizações Sociais - OS [10], (d) Agências Reguladoras [11]; e, (e) às Agências Executivas. Gasparini (2002, p. 602-6032) define os contratos de gestão do seguinte modo:

ajuste celebrado pelo Poder Público com órgãos e entidades da Administração direta, indireta e entidades privadas qualificadas como organizações sociais, para lhes ampliar a autonomia gerencial, orçamentária e financeira ou para lhes prestar variados auxílios e lhes fixar metas de desempenho na consecução de seus objetivos.

Portanto, é possível verificar a existência de contratos de gestão de caráter endógeno à administração (disciplina da tutela administrativa de órgão e entidades da própria administração, como ocorrem com as agências reguladoras) e contratos de gestão de natureza exógenos (disciplina da parceria com a iniciativa privada, sendo os contratos referentes às Organizações Sociais o principal exemplo).

Desta forma, tendo em vista o "recorte metodológico" do presente trabalho, o tema será enfrentado apenas no que se circunscreve os contratos de gestão de caráter endógeno, mais especificamente àqueles que dizem respeito às Agências Executivas, tendo em vista que abordar todas as dimensões dos contratos de gestão exigiria um trabalho monográfico específico.

O contrato de gestão se constitui num instrumento/garantia de que as políticas públicas formuladas pelo núcleo estratégico sejam implementadas pelos órgãos e entidades do setor de atividades exclusivas do Estado, por implicar no estabelecimento de objetivos e metas a serem atendidos durante a vigência do contrato, com o estabelecimento dos indicadores adequados para a avaliação objetiva dos resultados, permitindo, deste modo, um monitoramento efetivo destas políticas, verificando se as mesmas atenderam às demandas e expectativas da sociedade (BRASIL, 1995b).

No âmbito federal, com a edição do Decreto n° 2.487, de 02 de fevereiro de 1998, passou a ser disciplinada a possibilidade das autarquias e fundações federais que tenham assinado um contrato de gestão serem qualificadas como agências executivas. Em 27 de maio de 1998, com a promulgação da Lei Federal n° 9.649, a matéria passou a ser disciplinada por lei, suprindo-se o hiato legal, haja vista que a ordem natural de que o regulamento deve suceder a lei a ser regulada foi invertido, suscitando questionamentos acerca da constitucionalidade destes contratos.

A Emenda Constitucional n°19, de 04 de junho de 1998, seguindo as diretrizes delineadas pelo Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, elevou ao status constitucional a possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração mediante "contrato" a ser firmado entre a instituição e o poder central, no qual se estabelecerão as metas de desempenho a serem cumpridas para a manutenção da sua autonomia (contratualização do controle):

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

§ 8º A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre:

I - o prazo de duração do contrato;

II - os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes;

III - a remuneração do pessoal.

Este dispositivo constitucional autoriza a celebração de contratos de gestão com órgãos e entidades da administração pública, conferindo-lhes maior agilidade e flexibilidade para o desempenho de suas atividades, contratualizando a tutela da administração direta sobre os órgãos e entidades que lhe são vinculados.

O contrato de gestão relativo às Agências Executivas é um mecanismo de incremento da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração, visando o deslocamento da ênfase do controle dos meios para o controle dos resultados, de acordo com o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. A ampliação da capacidade gerencial dos órgãos e entidades estatais demanda a existência de um "pacto de resultados" e que as instituições tenham efetivamente maior poder de decisão sobre os meios que lhes são disponibilizados para o atingimento dos resultados esperados e metas pactuadas.

Embora conteste com veemência a juridicidade dos contratos de gestão (com base na precisão dogmática que lhe é peculiar, por não admitir a possibilidade jurídica de contrato entre uma pessoa jurídica de direito público e um órgão interno), Bandeira de Mello (2004, p. 215) reconhece a necessidade de curvar-se perante a constitucionalização do tema, em face da Emenda nº 19/98, que pôs uma "pá de cal" nos debates jurídicos acerca destes contratos [12]. Em sua celebre obra, Hesse (1991) sustenta que a Constituição não é apenas um documento de caráter histórico e sujeito aos fatores reais de poder, possuindo uma força normativa que lhe confere o caráter de força ativa, na medida em que tem o poder de transformar realidade, na medida em que protege o Estado Democrático de Direito das conveniências de ocasião (HESSE, 1991, p. 19).

Os contratos de gestão são um importante instrumento de ação do poder público, na medida em que exige dos órgãos e entidades que "pensem" e "ajam" estrategicamente, cumpram um programa de desenvolvimento institucional a ser cumprido, concedendo-lhes, em troca, a oportunidade de aumentar do grau de autonomia (DI PIETRO, 2002, p. 225). O propósito deste aumento do grau de autonomia é dotar os órgãos e entidades da administração – Agências Executivas – de maior flexibilidade administrativa para possibilitá-las a atingir níveis de performance institucional de excelência, não se tratando de concessão graciosa de autonomia ou com base em critérios subjetivos, mas sim um benefício decorrente de um "pacto de resultados", com fundamento em critérios técnicos e democráticos, na medida em que possibilita a todos os órgãos e entidades que se enquadrem no campo de atuação das agências executivas o acesso aos benefícios previstos em lei.


Agências Executivas.

Para a existência de uma administração pública verdadeiramente gerencial é imprescindível que haja uma definição clara dos objetivos a serem alcançados pelo órgão ou entidade, os quais devem ter uma perfeita "aderência" em relação ao planejamento estatal (Plano Plurianual e Lei de Diretrizes Orçamentárias), acompanhada de uma sistemática permanente de avaliação do desempenho institucional para verificar se os resultados esperados foram alcançados e, em caso negativo, que medidas devem ser tomadas para corrigir a disfunção.

Por outro lado, há que se considerar que somente é possível exigir resultados do administrador público se lhe for concedida um maior grau de autonomia sobre os meios postos à sua disposição para o desempenho da atividade (recursos humanos, materiais e financeiros), flexibilizando a gestão, na medida em que o enfoque do controle seja destinado aos resultados e não apenas em relação aos meios.

Como estratégia para implementação de uma administração gerencial no setor que exerce atividades exclusivas de Estado, o Plano Diretor da Reforma concebeu o Projeto das Agências Autônomas, inspiradas nas executives agencies anglo-saxãs [13], como o modelo a ser aplicado para a modernização da gestão, na medida em que, paralelamente à concessão de maior autonomia sobre os meios, há o controle finalístico da atividade estatal, com a avaliação de desempenho institucional (resultados alinhados à macro-estratégia estatal, disposta no seu Plano Plurianual)

A primeira vista os conceitos de agência executiva e agência reguladora podem levar à precipitada conclusão de que se tratam de institutos jurídicos equivalentes, embora retratem situações bem diversas, não sendo possível estabelecer uma relação necessária entre estes dois tipos de agências.

O Ministério da Administração e Reforma do Estado (BRASIL, 1998) identificou a existência de um ciclo vicioso e perverso para a sociedade, sendo o aumento da autonomia decisória do administrador sobre os meios para pôr em prática os seus projetos e atividades uma das medidas a serem adotadas para o rompimento desta triste ciranda:

É mais importante cobrar "o quê", deixando a cargo das instituições a decisão sobre o "como", obviamente exigindo de seus dirigentes a observância das leis. Com isso, a Administração Pública foge de um ciclo vicioso – e perverso para a sociedade – no qual as instituições argumentam que não podem apresentar melhores resultados porque não detêm o controle dos "meios" e os controladores dos "meios" argumentam que não podem passar para as instituições o seu controle porque elas não apresentam resultados.

A quebra desse ciclo vicioso se impõe para que a administração pública dê um salto de qualidade no sentido do gerencialismo, com a implementação de controles de resultados e a concessão de um maior grau de autonomia aos órgãos e entidades, a qual fica condicionada ao cumprimento de metas discutidas e pactuadas com a alta administração (avaliação objetiva de resultados, com a utilização de indicadores adequados).

A estratégia do MARE para a implementação da administração gerencial no setor de atividades exclusivas do Estado era a transformação das autarquias e fundações públicas em agências autônomas, as quais passaram a ser denominadas de agências executivas.

Assim, dentro da sistemática concebida pelo MARE, torna-se possível a modificação do regime de autonomia das instituições por intermédio de um mecanismo flexível de enquadramento da entidade, por simples ato administrativo do Poder Executivo (decreto de qualificação), conforme identificado por MODESTO (2001a, p. 3-4), sendo que a manutenção desta autonomia gerencial fica vinculada ao cumprimento de metas e a obtenção de resultados.

A Lei Federal n° 9.649, de 27 de maio de 1998, estabelece que o Poder Executivo Federal poderá qualificar autarquias e fundações públicas de agências executivas, dotando-as de maior autonomia sobre os meios, desde que atendam aos requisitos legais básicos: (a) existência de plano estratégico de reestruturação de desenvolvimento institucional em andamento; e (b) ter celebrado contrato de gestão como o ministério supervisor.

Portanto, é possível concluir que nenhuma instituição nasce agência executiva, torna-se agência executiva, alcançando este status jurídico após a edição do respectivo decreto de qualificação, devendo a mesma manter um nível de desempenho institucional para manter esta condição, posto que a sua diferenciação de regime em relação aos demais órgãos e entidades da administração se dá por ato administrativo de caráter instável (decreto), que pode ser utilizado como mecanismo de estímulo de eficiência (MODESTO, 2001a, p. 8).

Agência Executiva é um qualificativo a ser concedido, por decisão do chefe do Poder Executivo, a órgãos e entidades da administração que desempenhem atividades e serviços exclusivos do Estado, sendo que a sua instituição não demanda a criação de novas estruturas do aparelhamento administrativo, extinção das estruturas já existentes ou, ainda, a alteração da natureza jurídica dos órgãos e entidades existentes. Em suma, nenhum órgão ou entidade nasce agência executiva, ele alça ao "status" jurídico-institucional de agência executiva e passa a usufruir de um maior grau de autonomia gerencial, de modo que lhe assegure maior capacidade de implementação das políticas públicas e o desempenho das atividades típicas de Estado.


Efeitos e Benefícios do Enquadramento.

A qualificação de um órgão ou entidade da administração como agência executiva surte efeitos imediatos e implica na possibilidade do órgão/entidade vir a usufruir dos benefícios previstos em lei ou em atos normativos infralegais para ampliação do seu grau de autonomia de gestão. Assim, diversamente do que ocorre com as agências reguladoras (onde vige uma pletora de atos normativos), nas agências executivas deve haver uma uniformidade de tratamento, diversamente do que ocorre com as agências reguladoras e seu "cipoal" de regramentos (MODESTO, 2001), uma vez que os benefícios são previstos abstratamente para todos os órgãos/entidades que alcancem o qualificativo de agência executiva, não ficando a administração pública ao sabor de casuísmos legislativos ou de outras vicissitudes.

Os benefícios aptos à ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos/entidades (agências executivas) podem envolver aspectos atinentes à sua gestão, sendo possível a previsão de maior autonomia no que tange à política de recursos humanos, serviços gerais, contratações de serviços/aquisição de bens, orçamento, finanças públicas e modificação das estruturas organizacionais. Por exemplo, na esfera federal já existe a previsão de elevação em vinte por cento do valor dos limites máximos para cada uma das modalidades de licitação e para as dispensas de licitação fundadas nos incisos I e II do art. 24 da Lei Federal n° 8.666/93, flexibilizando as regras para os procedimentos licitatórios e para as dispensas de licitação.

Não existe um "pacote" pré-definido de benefícios previstos na legislação federal para as agências executivas estaduais, pois tal medida violaria o pacto federativo, já que a auto-organização é um dos pressupostos da autonomia estadual. A título de ilustração, este trabalho contempla sugestões que poderiam vir a ampliar a autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos/entidades qualificados como agências executivas:

-Remuneração Variável: implantação de sistema de "prêmio por resultados" (Lei Estadual nº 8.889/03, art. 119 e seguintes), como instrumento de remuneração variável vinculada ao alcance de resultados e de metas estabelecidas pelo planejamento estratégico institucional, objetivando ampliar os níveis de motivação dos servidores do órgão/entidade;

-Contratações de serviços e aquisições de bens: aumento dos limites máximos para cada modalidade de licitação e de dispensa, flexibilizando os limites legais para as licitações e dispensas de licitação (nos moldes da Lei Federal nº 9.648/98, que alterou a redação do art. 24 da Lei Federal 8.666/93);

-Modificação em estruturas organizacionais internas: possibilitando os órgãos e entidades da administração adequarem as suas estruturas internas, ajustando o organograma da instituição às reais necessidades e demandas existentes, desde que não implique na criação de novos cargos em comissão (flexibilização da rigidez organizacional) e respeite as finalidades institucionais do órgão/entidade (matéria atinente a competência legal);

-Programa de Estágio: adoção de regras diferenciadas para que as agências executivas possam dispor de maior autonomia para aceitar alunos universitários e de cursos profissionalizantes como estagiários, desde que haja disponibilidade orçamentária, propiciando-lhes prática profissional em complementaridade da formação acadêmica, os quais atuaram como importantes colaboradores da administração;

-Flexibilização de Jornada: criação de "banco de horas", respeitando a jornada de trabalho prevista em lei, de modo a flexibilizar a gestão dos recursos humanos, criando uma relação de maior comprometimento dos servidores, pois as dificuldades em remunerar horas extraordinárias poderiam ser suplantadas com a sistemática;

- Dispensa de celebração de termos aditivos para a prorrogação de contratos e convênios de vigência plurianual: desde que se tratem de ajustes que visem apenas identificar o crédito orçamentário à conta dos quais devem correr as despesas no exercício não é necessária a edição de aditivos, desde que não haja mudança de qualquer outra condição ou cláusula do contrato/convênio (medida de desburocratização do controle orçamentário e da gestão de contratos);

-Orçamento disposto de forma mais agregada: alocação dos recursos nos projetos/atividade capitais para o órgão ou entidade, respeitada a distinção entre os grupos de despesa, facilitando a gestão orçamentária ao permitir ao gestor alocar os recursos de forma a propiciar melhores resultados, não ficando a sua atuação "engessada" pelo excessivo detalhamento orçamentário;

-Contingenciamentos ou cortes: em vista da pactuação de um compromisso de resultados é conveniente que os recursos orçamentários destinados às agências executivas não sofram o mesmo tratamento que os recursos de entidade/órgãos que não têm um compromisso de resultados (somente poderiam ser contigenciados ou cortados em situações extremamente excepcionais e de forma diferenciada).

Os exemplos acima propostos, até mesmo pelo propósito deste artigo, servem apenas para ilustrar as possibilidades que o modelo institucional das agências executivas permite, na medida em que torna factível a flexibilização de aspectos específicos da gestão dos órgãos/entidades sem comprometer a unificação de tratamento, num pacto onde o Estado concede autonomia aos gestores e cobra resultados efetivos para a sociedade.


Procedimento de Qualificação de Agências Executivas.

Para que um órgão/entidade alcance a qualificação de agência executiva e possa usufruir da ampliação de sua autonomia gerencial é preciso cumprir determinados requisitos, quais sejam: (1) decisão inicial, (2) assinatura de Protocolo de Intenções, (3) assinatura de Contrato de Gestão; e, (4) decreto de qualificação.

A instituição de uma Agência Executiva se inicia com a manifestação por parte do órgão/entidade ao órgão central (conselho gestor) sobre o seu interesse em obter a qualificação e ter a sua autonomia de gestão ampliada (etapa 1). Após esta fase, o órgão/entidade assinará um Protocolo de Intenções com o órgão central, aderindo ao programa de qualificação institucional (etapa 2), no qual constará um plano de ação, onde são definidas a etapas do plano de reestruturação estratégica (definição de ações, prazos e responsáveis).

Após estas duas primeiras etapas, o órgão/entidade estará apto a firmar o contrato de gestão (etapa 3), no qual serão estabelecidos, no mínimo, conforme as diretrizes defendidas pelo MARE (BRASIL, 1997): a) disposições estratégicas (alinhamento com o planejamento estratégico do Estado); b) objetivos, metas e plano de ação; c) indicadores de desempenho institucional; d) meios (nível de autonomia delegada à instituição); e) sistemática de avaliação; f) revisão, suspensão e rescisão do contrato; g) definição de responsáveis e conseqüências do descumprimento do pacto; h) obrigações dos contratantes; i) condições de vigência e controle social; e, j) mecanismos de publicidade e controle social.

Assim, tendo a instituição um plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional em curso e firmado um contrato de gestão com o órgão supervisor, o mesmo encontra-se apto à qualificação final, que se dará mediante decreto específico do dirigente máximo – decreto de qualificação de agência executiva (etapa 4).

Cumprido este procedimento, o órgão ou entidade poderá usufruir da ampliação de sua autonomia gerencial, cuja manutenção ficará adstrita ao desempenho institucional, com cumprimento de metas.


Necessidade de revisão da legislação federal.

Embora haja expressa previsão na Constituição Federal (§8º, art. 37), não é possível ampliar a autonomia gerencial de órgãos e entidades sem que sejam editadas leis específicas disciplinando os contratos de gestão, em razão da ressalva contida na parte final do §8º do art. 37 da Constituição Federal (MORAES, 1999, p. 58) e em razão da incidência do princípio interpretativo da unidade da Constituição, que submete os citados contratos ao império do princípio da legalidade.

A Lei Federal n° 9.649/98 disciplina, no âmbito da administração pública federal, as agências executivas, sendo regulamentado pelo Decreto Federal nº 2.487/98. Estas normas não são auto-aplicáveis aos Estados, que poderão disciplinar a matéria de forma diversa (DI PIETRO, 2003, p. 402), desde que respeitados os mandamentos constitucionais [14], em consonância com o §8º do artigo 37, posto que os Decretos n°s 2.487/98 [15] e 2.488/98 [16] têm aplicabilidade apenas na esfera federal, buscando-se, na medida do possível, observar as diretrizes do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado.

Deste modo, limitar a qualificação de agências executivas a apenas autarquias e fundações públicas restringiria em demasia as potencialidades deste arranjo institucional, por mero apego dogmático ao Plano Diretor da Reforma, desprezando as peculiaridades de cada ente da federação, ignorando que a Decisão Política Fundamental (Constituição) não faz qualquer restrição ou ressalva quanto a possibilidade de utilização do contrato de gestão em outros órgãos e entidades da administração pública, facultando aos Entes da Federação adotar o critério mais consentâneo com as suas necessidades.

Deste modo, para implementação de um programa de qualificação de agências executivas no âmbito da administração pública é possível, após a edição de legislação própria, é possível aperfeiçoar o modelo existente, que se mostra assaz restritivo, na medida em que contempla apenas as autarquias e fundações pública, quando, em última instância, deveria contemplar quaisquer órgãos ou entidades que desempenhem serviços e/ou atividades exclusivas do Estado.

As possibilidades de um projeto de implementação de agências executivas vão além dos limites postos no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, uma vez que a Constituição Federal estende a possibilidade de aumento do grau de autonomia aos órgãos e entidades da administração pública por meio de contrato de gestão, sem restringir a sua aplicabilidade apenas às autarquias e fundações públicas, em decorrência do fato de que o campo de atuação das agências autônomas é a "operacionalidade", definida como a implementação e execução de atividades e prestação de serviços públicos à sociedade (CARVALHO FILHO, p. 384), o que não se circunscreve apenas à administração indireta.

Neste ponto, o que a princípio poderia se revelar uma ameaça para a implementação deste moderno arranjo gerencial, torna-se uma verdadeira oportunidade, na medida em que possibilita que o modelo seja aperfeiçoado e aprofundado, pois o modelo federal de agências executivas restringe-se apenas as autarquias e fundações, apesar da Constituição permitir que a concessão de autonomia gerencial via contrato de gestão (agência executiva) seja para órgãos e entidades, sem qualquer restrição.


Considerações finais.

Há viabilidade de ampliação do espectro de atuação do Programa GestãoBahia para que o mesmo seja utilizado como Conselho Gestor de um futuro Programa Estadual de Agências Executivas, cumprindo, assim, com o seu propósito de disseminar a gestão estratégica na Administração Pública Estadual, possibilitando que os seus órgãos e entidades tenham a sua autonomia ampliada, mediante instrumento de controle a posteriori dos resultados da atuação estatal, elevando, deste modo, a performance institucional da máquina estatal.

Por fim, há que se considerar que os contratos de gestão previstos no §8° do art. 37 da Constituição Federal não são exclusivos das autarquias e fundações públicas, podendo ser aperfeiçoado o modelo existente, possibilitando também que órgãos da administração direta, empresas públicas e sociedades de economia mista que desempenhem serviços/atividades exclusivas do aparato estatal sejam qualificados como Agência Executiva, demonstrando a sua capacidade de inovação no campo da gestão pública ao superar a limitação imposta pela legislação federal para a utilização deste arranjo institucional às autarquias e fundações públicas.

A eficiência da administração pública depende diretamente da capacidade de seus gestores compatibilizarem os princípios da legalidade e da eficiência administrativa, uma vez que a legalidade não pode ser concebida como óbice à eficiência estatal, mas sim um padrão necessário de atuação dos agentes e instituições públicas.


Bibliografia Consultada.

BRASIL. Plano Diretor da Reforma do Aparelho Estado. Brasília, 1995.

__________. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Agências executivas (Cadernos MARE da Reforma do Estado, v. 11). Brasília, 1995.

BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil: história, economia e política de Getúlio Vargas a Lula. São Paulo: Editora 34, 2003.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual do direito administrativo. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2003.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública : concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. São Paulo: Atlas, 2002.

__________. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2003.

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2002.

HESSE, Konrad. A força normativa da constituição (Die normative Kraft der Verfasssung). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.

MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida. Das agências executivas. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 556, 14 jan. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6172>. Acesso em: 12 ago. 2005.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores , 1996.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

MODESTO, Paulo. Agências executivas: a organização administrativa entre o casuísmo e a padronização. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº 6, setembro, 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em 09 de maio de 2005.

__________. Notas para um debate sobre o princípio constitucional da eficiência. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº 2, maio, 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em 10 de maio de 2005.

MORAES, Alexandre de. Reforma administrativa: emenda constitucional nº 19/98. São Paulo: Atlas, 1999. (Série fundamentos jurídicos)

RIBEIRO, João Ubaldo. Política; quem manda, por que manda, como manda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.


Notas

01 Há aqueles que afirmam que em momento de crise há aqueles que choram e aqueles que riem de tanto vender lenços.

02 A expressão "consenso" é utilizada de forma deliberada para enfatizar a existência de interpretações críticas à Crise do Estado, contrapondo-se ao denominado "Consenso de Washington". Por exemplo, Bresser-Pereira (2003, p. 246-255) pôs em xeque várias das conclusões do "Consenso" e da ideologia que lhe é subjacente (liberalismo econômico em oposição ao desenvolvimentismo keynesiano). A crise brasileira não pode ser debitada ou explicada apenas pelo populismo econômico, pela inexistência de estabilização e pela intervenção do Estado na seara econômica (não fosse esta intervenção, o Brasil não teria experimentado o desenvolvimento havida entre 1930 e 1980). Reduzir drasticamente o investimento público para equilibrar as finanças públicas é uma solução prática e cômoda, porém equivocada, em certa medida, por conduzir, a médio prazo, na perda da capacidade de investimento estatal, cuja retomada atuará como obstáculo ao crescimento econômico.

03 Este caráter é tão nítido que o termo burocracia tem, no seu uso corrente e coloquial, um sentido mais pejorativo e negativo (exigências desmesuradas de documentos, procedimentos e formulários) que o sentido weberiano.

04 A respeito de um destes paradigmas, se posiciona Modesto (1997, p. 27 – Bahia - 365): "é indispensável para a efetiva implementação da reforma pretendida, que os agentes administrativos superem o tradicional vezo burocrático que vem convertendo a Administração numa cara ‘máquina de impedir’, fiel ao que o mesmo autor batizou como ‘código do fracasso’, que dispõe: artigo primeiro: não pode; artigo segundo: em caso de dúvida, abstenha-se; artigo terceiro: se é urgente, espere; artigo quarto: sempre é mais prudente não fazer nada".

05 É importante registrar que, mesmo antes da Emenda Constitucional n° 19/98, a eficiência já era um princípio constitucional - embora implícito - decorrente da análise sistêmica do Texto Constitucional, conforme redação do inciso II do artigo 74 ("os Poderes (...) manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de: (...) comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão..."), do artigo 70 ("...quanto à legalidade, legitimidade, economicidade..."), §7º do artigo 144 ("...A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades..."). Portanto, a Reforma do Estado não "inventou" a eficácia, apenas a evidenciou como princípio explícito da administração pública.

06 Embora existam três entidades denominadas de agência na estrutura administrativa estadual (Agência de Fomento do Estado da Bahia – DESENBAHIA, Agência Estadual de Defesa Agropecuária – ADAB e a Agência Estadual de Regulação de Serviços de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia – AGERBA), nenhuma delas possui a natureza jurídica de agência executiva, pois a DESENBAHIA é uma sociedade de economia mista sujeita ao regime administrativo geral destas entidades, a ADAB é uma entidade autárquica sujeita ao regime administrativo geral e a AGERBA é uma agência reguladora, ou seja, autarquia em regime especial, não se sujeitando ao regime jurídico-administrativo próprio das agências executivas, mas a um regime específico.

07 Lei Estadual nº 8.885/03.

08 O Decreto Federal n° 137, de 27 de maio de 1991, autorizou a celebração de contrato de gestão com empresas estatais: Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobrás (Dec. n° 1.040/94) e Companhia Vale do Rio Doce – CVRD (Dec. s/n°, de 10/06/1992).

09 Lei Federal n° 8.246/91, que criou o Programa Nacional de Publicização (art. 3º).

10 Lei Federal n° 9.637/98, que instituiu o Serviço Social Autônomo Associação das Pioneiras Sociais (arts. 5°, 6° e 7°)

11 No âmbito federal, existe a previsão de contrato de gestão na Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL (Lei n° 9.427/96, art. 7°), Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA (Lei n° 9.782/99, art. 19), Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS (Lei n° 9.961/00, art. 14) e Agência Desenvolvimento da Amazônia – ADA (Medida Provisória n° 2.157-2/01, art. 19), não havendo previsão legal de contrato de gestão para a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL (Lei n° 9.427/97), Agência Nacional de Petróleo – ANP (Lei n° 9.478/97), Agência Nacional de Águas – ANA (Lei n° 9.984/00), Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ (Lei n° 10.233/01), Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT (Lei n° 10.233/01). No âmbito estadual, há previsão de contrato de gestão para a Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia – AGERBA (Lei Estadual n° 7.314/90 – art. 4° e Decreto Estadual n° 7.426/98 – art. 46).

12 "Como em outros temas, o fundamental é identificar o que há de bom e ruim no modelo das agências executivas, sem adoção de posturas unilaterais. Dos juristas se espera um discurso que favoreça a decidibilidade dos conflitos jurídicos; não se espera o impasse e a desesperança.", pois, segundo MODESTO (2001a, p. 10) "As decisões legislativas nunca são cartesianas, nem seguem a modelos teóricos rigorosos", por brotarem até mesmo de uma forma caótica no complexo processo político decisório de negociação.

13 Segundo Modesto (2001a, p. 9-10) para a criação das agências executivas brasileiras não "houve cópia ou assimilação de experiência internacionais, portanto, mas sim uma solução criativa para a rigidez do sistema brasileiro de definição do grau a de autonomia a ser concedido a entidades da administração indireta de natureza autárquica em relação à administração direta".

14 Conforme a opinião da doutrina (MODESTO, 2001a) não poderá haver a redução da autonomia, pois a CF apenas prevê o contrato de gestão como elemento de aumento da autonomia gerencial.

15 Dispõe sobre a qualificação de autarquias e fundações como Agências Executivas, estabelece critérios e procedimentos para a elaboração, acompanhamento e avaliação dos contratos de gestão e dos planos estratégicos de reestruturação e de desenvolvimento institucional das entidades qualificadas.

16 Define medidas de organização administrativa específicas para as autarquias e fundações qualificadas como Agências Executivas.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MÔNACO, Gabriel Santana. Agências executivas e contratos de gestão. A possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira deve ficar restrita apenas às autarquias e fundações?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1539, 18 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10423. Acesso em: 26 abr. 2024.