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Do poder investigatório do Ministério Público.

Contradições do RHC 81.326-DF

Do poder investigatório do Ministério Público. Contradições do RHC 81.326-DF

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O trabalho busca combater a atual visão do Supremo Tribunal Federal e demonstrar que o Ministério Público possui atribuição para investigar, na esfera criminal, fatos tipificados como delituosos.

"Ainda pior que a convicção do não é a incerteza do talvez é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi...

O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si. Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance; para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência, porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer..."

Autor Desconhecido


RESUMO

O presente trabalho visa combater a atual visão do Supremo Tribunal Federal e demonstrar que o Ministério Público é dotado de atribuição constitucional e infraconstitucional para investigar, na esfera criminal, fatos tipificados como delituosos. Neste sentido, analisa-se vasta literatura jurídica (livros, artigos, periódicos, jurisprudências e legislações), que comprova a legitimidade do Parquet para realizar diligências investigatórias no âmbito penal. A defesa desta idéia é de alta relevância, pois, atualmente, há no meio jurídico grande polêmica acerca deste tema. Diariamente, Juizes, Advogados, Procuradores e Promotores de Justiça têm travado discussões em relação a constitucionalidade da atuação ministerial nesta seara criminal. O que se almeja neste trabalho é tentar incutir na consciência jurídica nacional a idéia de que o Ministério Público é um órgão constitucionalmente dotado de poder para investigar criminalmente infrações penais e não apenas e exclusivamente a polícia judiciária. Para isso, destacar-se-á a importância da atuação ministerial na conjuntura sócio-jurídica existente no Brasil, além da crítica que será desenvolvida ao contemporâneo posicionamento do Supremo Tribunal Federal.

Palavras-Chave:1. Processo Penal 2. Legitimidade do Ministério Público 3. Investigação Criminal


ABSTRACT

This work aims at criticizing the Supreme Court’s point of view and proving that the Prosecution Service can, according to the Constitution and to ordinary laws, investigate crimes. It is based on a great number of Law books, articles, decisions and laws, which corroborate that the Prosecution Service is permitted to investigate criminal facts. The subject turns out to be extremely important nowadays, since it is been thoroughly discussed in Brazil. Every day, judges, lawyers and prosecutors discuss the constitutionality of the Prosecution Service criminal investigations. Finally, this work aims at highlighting how important the Prosecution Service’s work is to help us achieve what the Constitution calls "social justice", making people aware of the fact that the Prosecution Service, as well as the police, is constitutionally allowed to investigate crimes.

Key Word:

1. Process Penal.2. Prosecution Service’s Legitimation 3. Investigation Criminal


SUMÁRIO:INTRODUÇÃO. CAPÍTULO I – DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1.1.Origem e Aspectos Gerais. 1.2 A atuação do Ministério Público. CAPÍTULO II – DO PODER MINISTERIAL PARA INVESTIGAR INFRAÇÕES PENAIS. 2.1 Da Conjuntura Jurídico-Social. 2.2. Da inserção do Ministério Público na atual conjuntura jurídico-social. 2.3. Do respaldo legal para a investigação criminal pelo Ministério Público. CAPÍTULO III – DO POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RHC 81.326-DF): PONTOS CONTROVERTIDOS. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


INTRODUÇÃO

Atualmente, existe grande celeuma acerca da existência, ou não, de legitimidade no Ministério Público para realizar, diretamente, investigações criminais na fase pré-processual.

Os operadores do direito brasileiro divergem, em muito, nas opiniões sobre o tema em cotejo, instalando-se verdadeira guerra de argumentos a favor e contra a investigação em referência.

Apoiando-se no que preceitua a Constituição da República Federativa do Brasil, bem como em normas infraconstitucionais existentes no direito brasileiro, o presente trabalho tem como objetivo minimizar a dúvida sob cogitação, no sentido de comprovar a possibilidade de o Parquet investigar na seara criminal, além de combater de frente com o recente pronunciamento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que se posicionou contra a atuação ministerial na fase investigatória pré-processual.

Entende-se por investigação criminal o procedimento através do qual uma autoridade pública, normalmente os integrantes da polícia, diligencia no tocante a fatos tipificados como criminosos, averiguando a autoria e a materialidade do delito, a fim de proporcionar ao Estado, por meio do Ministério Público ou ao ofendido, nas ações privadas, a possibilidade de ingressar com a ação penal pública, através da denúncia, ou com a queixa-crime.

A Carta Magna conceitua o Ministério Público como uma Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, além de conferir-lhe privatividade na ação penal pública.

Assim, entendendo a investigação criminal como procedimento preparatório para a instauração da ação penal pública e o Órgão Ministerial como uma Instituição do Estado, responsável pela ordem jurídica, pelo regime democrático e pelos interesses sociais e individuais indisponíveis, além de agente titular exclusivo da ação penal pública, não há como não compreender que a ele cabe investigar criminalmente, desde que estejam em jogo alguns desses bens juridicamente tutelados.

A atual conjuntura jurídico-social clama por um Ministério Público mais atuante junto aos verdadeiros interesses da sociedade, e é nesse sentido que o presente trabalho se desenvolverá, procurando provar que a investigação criminal realizada diretamente pelo Parquet só servirá para beneficiar a sociedade.

No primeiro capítulo, será feita uma análise histórica da evolução do Ministério Público, visando demonstrar que seu desenvolvimento no tempo serviu para consolidar a força que ele possui na atualidade, além de uma breve explanação sobre a atuação desse Órgão.

Já no segundo capítulo, após contextualização temporal do momento em que se vive, bem como da inserção do Órgão Ministerial dentro desta conjuntura, serão trazidos à baila todos os argumentos que embasam a idéia do presente trabalho, no sentido de comprovar que o Mistério Público pode investigar criminalmente.

Finalmente, no último capítulo, será feita uma crítica à atual posição do Supremo Tribunal Federal.

A metodologia adotada baseia-se em pesquisas de textos legais, doutrina, jurisprudência e artigos de maneira que, após uma abordagem teórica no decorrer dos capítulos, concluiremos que a atuação efetiva do Ministério Público, na área investigatória, é, entre outras coisas, corolário de sua privatividade constitucional na promoção da ação penal pública.

Serão utilizados os preceitos normativos da Constituição Federal de 1988, das Leis nº 75/93 e 8.625/93, bem como do Código de Processo Penal, além de inúmeros argumentos extraídos da vasta doutrina sobre o tema.

A escolha do tema foi motivada pela polêmica que se instalou no meio jurídico a partir de decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal no R.H.C. nº 81.326-DF, no sentido de afastar a possibilidade de investigação criminal direta pelos órgãos do Ministério Público, fazendo tábula rasa da função persecutória institucional a ele inerente, conferida pela Constituição da República de 1988.

Considerando meramente exemplificativo o rol de atribuições inerentes ao Ministério Público constante no art. 129 da Constituição da República, o tema nos convida a uma reflexão acerca da importância do reconhecimento de que os atos de investigação criminal não são exclusivos da polícia judiciária, e sendo assim, não podemos negar a vigência, eficácia e validade das normas infraconstitucionais que legitimam uma atuação direta do Ministério Público, desde que compatíveis com sua finalidade constitucional.

Nosso trabalho, enfim, convida a uma ponderação objetiva em torno dos principais elementos que nos dão sustentação na defesa do poder conferido ao Ministério Público - legítimo representante de parcela da soberania estatal – de proceder investigação também na seara criminal.

Sem a pretensão de esgotar o debate em torno do assunto, em face de nossas naturais limitações, a par de uma pesquisa seletiva e estabelecendo prioridades, pretendemos contribuir com o presente trabalho para o debate acadêmico, que servirá de base para a obtenção de melhores resultados no dia-a-dia daqueles responsáveis pela práxis da investigação criminal.


CAPÍTULO I – DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Como explanado por Hugo Nigro Mazzili [01] e Marcos Kac [02], não há consenso na doutrina quanto à origem do Mistério Público (M.P.). Segundo eles, uma corrente alega ter sido o seu nascimento no antigo Egito, aproximadamente há 4.000 a.C., caracterizado no funcionário real do Egito, Magiai, que estava incumbido, entre outras coisas, de denunciar as práticas criminosas aos Magistrados legalmente constituídos para tal desiderato, além de castigar os rebeldes, reprimir os violentos e proteger os cidadãos pacíficos.

De acordo com os autores supra, outra corrente acredita que o M.P. teve sua origem nos Éforos da Espanha, que, embora Juízes, equilibravam os poderes real e senatorial, exercendo o ius accusationiis, ou, ainda, nos Thesmotetis ou Tesmãtetas gregos, forma embrionária de acusador público.

Segundo Mazzilli e Kac, há, também, quem lembre [03] dos Advocatus Fisci e dos Procuratores Caeseris de Roma, cuja função era vigiar a administração de bens do Imperador, como possibilidade para o surgimento do M.P., além da corrente que fala do surgimento do Parquet na Idade Média, nos Saions germânicos, nos Bailios e Senescais, defensores dos senhores feudais em juízo, ou, ainda, nos Missi Dominici ou Gastaldi do direito lombardo ou, também, no Gemeiner Auklager (acusador comum) da Alemanha, responsável pela acusação quando o particular permanecia passivo.

Os autores em referência lembram também que em 1289, em Portugal, sob o reinado de Afonso III, já existia o Procurador da Coroa e, em 1387, o Rei Don Juan I criou El Ministerio Fiscal, Órgão dotado de certa semelhança com o M.P. atual.

Ainda em conformidade com o exposto por Mazzilli e Kac, outros doutrinadores, como Marcio Incarato, Manzini e Pertile, entendem ter o M.P. sua origem na Itália medieval, caracterizado no avvogadori di communi, da Veneza medieval; no avvocato della corte, do reino de Nápoles; e nos conservatori delle leggi, da Florença dos Gonfalonieri do início do século XIII.

Apesar dessas inúmeras correntes de pensamento enumeradas, os autores sob cogitação afirmam que a majoritária inclina-se pela procedência francesa. A expressão Ministério Público, como hoje se conhece, nasceu na França do século XVIII, onde os Procuradores eram defensores da coroa, do Rei e de toda a sociedade.

Em 1302, a França criou o M.P., referindo-se aos Procuradores do Rei, que, inicialmente, zelavam apenas pelos interesses privados do soberano e, com o passar do tempo, passaram a exercer funções de interesse próprio do Estado.

Em 1790, através de decreto, seus agentes passaram a ter vitaliciedade, ou seja, seriam nomeados pelo Rei e só poderiam ser demitidos por comprovada corrupção.

A Revolução Francesa estruturou melhor o Órgão Ministerial enquanto Instituição, pois conferiu garantias a seus integrantes; já os textos napoleônicos instituíram o M.P. que a França conhece na atualidade.

Tendo em vista essas várias teorias, conclui-se que o M.P. não nasceu repentinamente, devido a algum ato legislativo, mas que se formou lenta e progressivamente, em resposta às exigências históricas da sociedade.

No Brasil, o M.P. percorreu longa caminhada jurídico-social até adquirir a força que a atual Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988 (C.F./88), conferiu-lhe.

O desenvolvimento do Parquet brasileiro, até após a independência, esteve ligado ao velho direito português.

Em 1609, o Procurador da Coroa e da Fazenda era o Promotor de Justiça.

No Brasil-Colônia e no Brasil-Império, o Procurador-Geral ainda centralizava o ofício, mas não passava de um agente do Poder Executivo, sem haver propriamente uma Instituição, nem garantia ou independência dos Promotores Públicos.

Na vigência da Constituição de 1824, o Procurador da Coroa e Soberania Nacional passou a ser competente para acusação no juízo de crimes comuns e o Código de Processo Criminal do Império, de 1832, continha uma seção reservada aos Promotores, com os primeiros requisitos de nomeação e principais atribuições.

Em 1841, os Promotores passaram a ser nomeados por tempo indefinido, pelo Imperador, no município da Corte, e pelos Presidentes, nas províncias. Eles serviriam enquanto conviesse a sua conservação ao serviço público, sendo, caso contrário, indistintamente demitidos.

A primeira Constituição da República, de 1891, não fez alusão ao M.P. enquanto Instituição, só se referindo à escolha do Procurador-Geral e a sua iniciativa na revisão criminal pro reo.

O Parquet do Brasil se desenvolveu no período republicano. O Código de Processo Penal (C.P.P.) de 1941 garantiu-lhe o poder de requisição de Inquérito Policial e diligências. Tornou-se regra sua titularidade na promoção da ação penal pública, foi-lhe cometida a tarefa de promover e fiscalizar a execução da lei e, no direito civil, o M.P. conquistou importante papel, tanto como Órgão agente, quanto interveniente.

Em 1981, a primeira Lei Orgânica Nacional do M.P. definiu um estatuto básico e uniforme para o M.P. nacional, com suas principais atribuições, garantias e vedações. Já em 1985, a Lei da Ação Civil Pública conferiu ao Órgão Ministerial a iniciativa na promoção de ações para a proteção de interesses difusos e coletivos. A C.F./88, por sua vez, conferiu ao M.P. seu maior crescimento. Nesse sentido, Alexandre de Moraes entende que

(...) a Constituição Federal de 1988 ampliou sobremaneira as funções do Ministério Público, transformando em um verdadeiro defensor da sociedade, tanto no campo penal com a titularidade exclusiva da ação penal pública (cf. comentário sobre art. 5º, LIX) quanto no campo cível como fiscal dos demais Poderes Públicos e defensor da legalidade e moralidade administrativa, inclusive com a titularidade do inquérito civil e da ação civil pública. [04]

Leis ulteriores à C.F./88 desenvolveram a atuação do M.P. ainda mais, tornando-o presente nos procedimentos que envolvem a pessoa portadora de deficiência, os investidores do mercado de valores mobiliários, as crianças e os adolescentes, o consumidor e outros interesses difusos e coletivos, além da proteção ao patrimônio público, à ordem econômica e à livre concorrência.

A Lei Maior, em seu art. 127, conceitua o M.P. como Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, ou seja, trata do interesse público social.

A Carta Magna situa o Órgão Ministerial em capítulo especial, fora da estrutura dos demais poderes da República, consagrando sua total autonomia e independência e ampliando-lhe as funções, sempre em defesa dos direitos, garantias e prerrogativas da sociedade.

Para o constitucionalista Alexandre de Moraes,

(...) o legislador constituinte criou, dentro do respeito à teoria dos ‘freios e contrapesos’ (cheks and balances), um órgão autônomo e independente deslocado da estrutura de qualquer dos Poderes do Estado, um verdadeiro fiscal da perpetuidade da federação, da Separação de Poderes, da legalidade e moralidade pública, do regime democrático e dos direitos e garantias individuais: o Ministério Público. [05]

O M.P. é um Órgão do Estado, e não do Governo, que zela por interesses indisponíveis ou de larga abrangência social. Sua presença será essencial à prestação jurisdicional sempre que estiverem em jogo interesses sociais e individuais indisponíveis e quando, ainda que não haja indisponibilidade do interesse, a lei considere conveniente sua atuação em defesa do bem geral.

No que tange à defesa dos interesses indisponíveis, em geral, mas não necessariamente, o zelo pela indisponibilidade do interesse está presente na atuação do M.P. Nesse sentido, Hugo Nigro Mazzilli argumenta que o M.P.:

(...) a) ou zela para que não haja disposição de interesse que a lei considera indisponível; b) ou, nos casos de indisponibilidade relativa, zela para que a disposição do interesse seja conforme às exigências da lei; c) ou zela pela prevalência do bem comum, nos casos em que não haja indisponibilidade do interesse, nem absoluta nem relativa, mas esteja presente o interesse da coletividade como um todo (...) [06] o correto seria dizer que todo interesse indisponível deve ser fiscalizado pelo Ministério Público, o que não significa que a instituição só oficie em defesa de interesses indisponíveis. Em outras palavras, se num processo judicial estiver em jogo interesse indisponível, deverá haver a intervenção ministerial – quer se trate de interesse individual ou social indisponível; por isso se diz que indisponibilidade é nota marcante da atuação do Ministério Público. (...) Em suma, desde que haja alguma característica de indisponibilidade parcial ou absoluta de um interesse, ou desde que a defesa de qualquer interesse, disponível ou não, convenha à coletividade como um todo, aí será exigível a iniciativa ou a intervenção do Ministério Público junto ao Poder Judiciário. [07]

Constitucionalmente, o M.P. abrange o Ministério Público da União (M.P.U.), que compreende o Ministério Público Federal (M.P.F.), o Ministério Público Militar (M.P.M.), o Ministério Público da Trabalho (M.P.T.) e o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (M.P.D.F./T.), e os Ministérios Públicos dos Estados (art. 127, §3º, C.F./88).

O art. 73, §2º, I, da C.F./88 prevê a existência de um M.P. junto ao Tribunal de Contas da União (T.C.U.), sendo que em seu art. 130, a Carta Magna determina que aos membros desse M.P. devem ser aplicados os direitos, vedações e forma de investidura previstas aos demais membros do M.P.

Apesar da polêmica existente acerca da configuração jurídico-institucional, o Supremo Tribunal Federal (S.T.F.) já se pronunciou no sentido de que o M.P. junto ao T.C.U. é Instituição que não integra o M.P.U., cujos ramos são taxativamente inscritos no rol do art. 128 da C.F./88, entendendo ser possível a vinculação administrativa desse M.P. ao próprio T.C.U.

Em relação aos Tribunais de Contas estaduais, cada Estado-membro deve disciplinar em sua Constituição Estadual qual o M.P. que atuará perante o Tribunal de Contas do Estado.

Já no que concerne à atuação do Parquet na seara eleitoral, pode-se dizer que não existe um M.P. eleitoral propriamente dito, mas funções eleitorais afetas a ele. Ao M.P. eleitoral cabe atuar perante a Justiça Eleitoral e o Procurador-Geral Eleitoral é o Procurador-Geral da República.

Compete ao Procurador-Geral Eleitoral exercer as funções de M.P. perante o Tribunal Superior Eleitoral. Os Procuradores Regionais Eleitorais e seus substitutos funcionam perante os Tribunais Regionais Eleitorais. Já o Promotor Eleitoral tem assento perante os Juízes e Juntas Eleitorais, sendo que esta atribuição é afeta aos membros do M.P. local. Assim, os Promotores de Justiça dos Estados exercem função federal.

A Lei nº 8.625/93 dispõe sobre as normas gerais para a organização do M.P. dos Estados; a Lei Complementar nº 75/93 (L.C. 75/93), por sua vez, trata da organização, das atribuições e do estatuto do M.P.U.

A unidade, a indivisibilidade, a independência funcional e o princípio do promotor natural são princípios institucionais do M.P. previstos na C.F./88.

Por Princípio da Unidade, entende-se que os membros do M.P. integram um só órgão sob a direção única de um só Procurador-Geral.

Já de acordo com o Princípio da Indivisibilidade, o M.P. é uno porque seus membros não se vinculam aos processos nos quais atuam, podendo ser substituídos uns pelos outros, de acordo com as normas legais.

O Princípio da Independência ou Autonomia Funcional, por sua vez, preceitua que o M.P. é independente no exercício de suas funções, não ficando sujeito às ordens de quem quer que seja, mas somente devendo prestar contas de seus atos à C.F./88, às leis e a sua consciência.

De acordo com o Princípio do Promotor Natural, é inadmissível que o Procurador-Geral faça designações arbitrárias de Promotores de Justiça para uma Promotoria ou para as funções de outro Promotor, que seria afastado compulsoriamente de suas atribuições e prerrogativas legais, até porque isso seria ferir a garantia da inamovibilidade, prevista no texto constitucional, inamovibilidade essa ampla, protegendo o cargo e a função, pois seria um contra-senso subtrair as respectivas funções aos próprios cargos.

A C.F./88 enumera algumas funções ministeriais em seu art. 129. Todavia, cabe destacar ser um rol meramente enumerativo, pois pode o M.P. exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade constitucional, sendo-lhe vedada, expressamente, a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas [08].

Tanto a Instituição do M.P., como seus membros, são dotados de garantia constitucionais conferidas pelo legislador constituinte objetivando o pleno e independente exercício de suas funções.

Assim, os membros do M.P. gozam de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos (art. 128, §5º, I, C.F./88), devendo ingressar na carreira apenas mediante concurso público de provas e títulos.

Já a Instituição tem estruturação em carreira e é dotada de autonomia funcional, administrativa e financeira (art. 127, §2º), havendo limitação à liberdade do chefe do Executivo para nomeação e destituição do Procurador-Geral.

Também há vedações aos membros do M.P., pois, conforme a C.F./88:

Art. 128. (omissis)

(...)

§5º Leis Complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:

(...)

II – as seguintes vedações:

a)receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais;

b)exercer a advocacia;

C)participar de sociedade comercial, na forma da lei;

d)exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério;

e)exercer atividade político-partidária, salvo exceções previstas na lei.

1.2. A atuação do Ministério Público

Atualmente, é assaz diversificado o ofício do M.P.

Na esfera penal, o M.P. ora é autor, ora é interveniente. Atuando como autor, é considerado uma Instituição de caráter público que representa o Estado-Administração, expondo ao Estado-Juiz a pretensão punitiva, pois, conforme preceitua a C.F./88, cabe ao M.P., com exclusividade, propor a ação penal pública.

É interveniente quando atua junto à Ação Penal Privada, intervindo em todos os atos do processo, na qualidade de fiscal da lei, tenha ou não aditado a queixa.

Ainda na seara criminal, cabe também ao M.P. exercer o controle externo da atividade policial, requisitar diligências investigatórias e determinar a instauração de Inquérito Policial, praticando todos os atos necessários ao desempenho dessas funções que a lei lhe atribui.

O M.P. tem plena liberdade de convicção e de atuação, não estando o Promotor obrigado a acusar, desde que não se verifique hipótese que torne exigível a iniciativa. Além de que, ele não só pode, como deve, pedir a absolvição ou recorrer em favor do acusado, quando se convença de sua inocência, podendo, ainda, o M.P., impetrar habeas corpus em benefício do acusado, se entender que ele sofre constrangimento ilegal.

No direito civil, a posição do M.P. assume as mais variadas formas. Pode ele ser autor, representante da parte, substituto processual, interveniente em razão da natureza da lide, desvinculado, a princípio, dos interesses de quaisquer das partes ou, ainda, interveniente em razão da qualidade da parte.

Assim como na ação penal pública, também na ação civil pública o M.P., verificada a ocorrência de hipótese que justifique a iniciativa, deve propor a ação, porém vale ressaltar que a legitimidade do Parquet para agir na área cível nunca é exclusiva.

Todas as vezes em que numa ação civil pública se discutam interesses afetos à Instituição, seja porque as tenha proposto, ou porque, nas ações propostas por terceiros, atua como interveniente, oficiará o Órgão Ministerial, além de que esse Órgão assumirá a promoção da ação, sempre que nela, proposta por qualquer co-legitimado, sobrevier desistência ou abandono infundados.

Para que o M.P. conteste ou recorra se faz necessária a presença de interesse na reforma do ato atacado.

O Parquet exercita, também, a administração pública de interesses privados, quando atua, por exemplo, nas habilitações matrimonias, na fiscalização de fundações e, também, quando atende ao público, cuidando do efetivo respeito aos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na C.F./88. Nesses atendimentos, o M.P. orienta os necessitados, faz conciliações, homologa transações extrajudiciais, atende questões de família, de menores, de acidentados do trabalho, de pessoas portadoras de deficiência e dos necessitados em geral.

Por tudo até aqui esplanado, e antes de tecer mais considerações acerca da atuação ministerial, não há como não concordar as seguintes opiniões: "o Ministério Público está consagrado, com liberdade, autonomia e independência funcional, à defesa dos interesses indisponíveis do indivíduo e da sociedade, à da ordem jurídica e do regime democrático." [09]; e

(...) o Ministério Público é a instituição a serviço, permanente, da sociedade com o escopo de exigir, em juízo ou fora dele, a reparação de toda e qualquer lesão a direitos constitucionalmente protegidos a fim de resguardar a ordem jurídica vigente. Tendo sua atuação pautada pelos princípios da legalidade e impessoalidade seu objetivo é sempre a fiel fiscalização da aplicação da lei justa, a cada caso concreto. [10]


CAPÍTULO II – DO PODER MINISTERIAL PARA INVESTIGAR INFRAÇÕES PENAIS

Atualmente, há grande discussão entre os operadores do direito brasileiro quanto à existência, ou não, de legitimidade no M.P. do Brasil para investigar ilícitos penais.

Analisando detidamente a questão, não há outra saída a não ser concordar com a idéia de que o Parquet é um órgão dotado de poder para realizar tal atribuição.

Para comprovar a afirmação acima descrita, utilizar-se-á o que preconiza a C.F./88, tanto o que consta expressamente em seus artigos, como o que preceituam seus princípios, bem como normas infraconstitucionais, que só vêm a confirmar o que determina a Lei Maior.

Antes de ir diretamente ao texto de lei, é de grande importância fazer uma abordagem da conjuntura jurídico-social que envolveu a promulgação da C.F./88, por ser fundamental para o embasamento da idéia do presente trabalho.

Como bem analisam Lenio Streck e Luciano Feldens [11], o conceito de Estado e de direito no Brasil, assim como em o todo o mundo, passou por uma evolução no decorrer dos tempos. Primeiramente, existia um Estado Liberal, que ostentava uma função reduzida, cabendo ao direito a subsidiária função ordenadora. Já no Estado Social, nascido como resposta ao Liberal e marcado pelo perfil intervencionista, o direito passa a ter uma função promovedora. Novamente em resposta a essas duas formas de se posicionar diante dos reclames da sociedade, surge o Estado Democrático de Direito, cujos pilares de sustentação são o respeito à democracia e aos direitos fundamentais-sociais. Nessa nova fase, as funções ordenadora e promovedora do direito unem-se numa só, a função transformadora.

Nas referidas fases atravessadas pelo Estado, verifica-se a predominância de seus diferentes Poderes em cada uma delas. Dessa forma, no Estado Liberal observa-se uma maior atuação do Poder Legislativo, pois as leis tinham grande valor. No Estado Social, por sua vez, notadamente intervencionista, é o Poder Executivo quem ganha campo, em face da necessidade de se implementar políticas públicas, marcando essa fase com alta dose de autoritarismo. Finalmente, no Estado Democrático de Direito, nota-se uma maior força do Poder Judiciário, que deu espaço para busca do que hoje se entende por justiça social [12].

Como bem explanado por Marcos Kac, Estado Democrático de Direito pode ser entendido da seguinte forma:

(...) por Estado Democrático deve ser entendido aquele em que seus cidadãos tomam as decisões políticas e traçam as linhas mestras de atuação de seus governantes. Este se funda no princípio da soberania popular, impondo participação efetiva do povo na coisa pública, visando, assim, realizar o princípio democrático como garantia geral dos direitos fundamentais da pessoa humana. A democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser um processo de convivência social em uma sociedade livre, justa e solidária, em que o poder emana do povo e em seu nome é exercido, diretamente ou por representantes eleitos, envolvendo a participação popular no processo decisório, respeitando a pluralidade de idéias, culturas e etnias. O Estado Democrático tem por fundamentos a soberania, a cidadania e dignidade da pessoa humana, os valores éticos e sociais, vigorando o trabalho e a livre-iniciativa, e, ainda, o pluralismo político. [13]

2.2. Da Inserção do Ministério Público na atual conjuntura jurídico-social

Como cediço, o legislador constituinte nada mais é que um representante do povo e, em sendo assim, está ele inserido na mesma conjuntura que envolve a coletividade, sentindo as mudanças da mesma forma que ela e desejando as mesmas transformações.

É também de conhecimento geral que cabe aos aplicadores do direito corresponder às expectativas da sociedade, representadas nas leis criadas pelos legisladores.

Neste diapasão, Paulo Rangel entende que:

(...) o povo tem a titularidade do Poder Constituinte, porém quem o exerce são seus representantes políticos, agindo em uma verdadeira representação constitucional. Ou seja, agem em nome alheio defendendo direito alheio: direito à criação de um Estado legítimo, editando uma nova Constituição. O Poder Constituinte, assim, é o legítimo direito natural que tem o povo de apoderar-se de um instrumento normativo ordenador do Estado (...) [14] O Estado Constitucional, portanto, pressupõe o poder constituinte do povo, ou seja, o direito do povo fazer uma lei superior (Constituição) da qual constem as razões públicas demonstrativas do consentimento popular de ser governado, sob determinadas condições. Trata-se de um mandato popular exercido pelo governo com o propósito nítido e exclusivo de submeter suas decisões ao império da lei, criando-se assim o Estado Democrático de Direito, onde as decisões emanam, diretamente, do Estado, mas tomadas, indiretamente, pelo povo. [15]

Assim, como no Estado Democrático de Direito, como já dito acima, novos princípios surgem, e uma mesma coisa, um mesmo fato, ou um mesmo direito, passam a ser valorados de forma diferente, pois a sociedade assim almeja, cabe a quem executa o direito trabalhar no sentido de proporcionar as alterações esperadas pela comunidade e, neste sentido, levando em conta o papel conferido ao M.P. pela C.F./88, não podem os responsáveis pela aplicação das leis dar entendimento diverso e, conseqüentemente, aplicação equivocada ao que a sociedade, através de seus representantes, almeja. Os constituintes pensaram em um M.P. forte, atuante junto à coletividade e defensor de seus interesses, não podendo os operadores do direito de hoje burlarem o invocado na Constituinte.

No contexto jurídico-social em que o mundo se encontra na atualidade, compreende-se com muita clareza o papel que o M.P. assume, pois, como bem dispõe a C.F./88, incumbe a ele o dever de zelar pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Ao Órgão Ministerial cabe a defesa do Estado Democrático de Direito, e não há como entender de outro modo, pois o que seria defesa da ordem jurídica e do regime democrático senão as bases do sistema que funciona neste Estado?

Neste sentido, Mazzilli argumenta que

(...) o constituinte de 1988 reconheceu que a abertura democrática não dispensa um Ministério Público forte e independente, que efetivamente possa defender as liberdades públicas, os interesses difusos e coletivos, o meio ambiente, o patrimônio público, as vítimas não só da violência como as da chamada criminalidade do colarinho branco – ainda que o agressor seja muito poderoso ou até mesmo quando seja agressor o governo ou governante. Atribuiu ao Ministério Público o zelo do próprio regime democrático. Enfim, a Constituição de 1988 assegurou à instituição novas atribuições e um relevo que jamais texto constitucional algum nem de longe conferiu ao Ministério Público, nem mesmo no direito comparado. [16]

Posicionando-se no mesmo sentido, Streck e Feldens [17] afirmam que na medida em que a Constituição de 1988 estabelece um novo paradigma no campo jurídico-político, exsurgindo o Estado Democrático de Direito como um plus normativo em relação às fases/dimensões estatais anteriores (Estado Liberal e Estado Social), torna-se absolutamente relevante que haja uma nova discussão sobre o perfil a ser assumido pelas instituições encarregadas da defesa da ordem jurídica a partir do que dispõe o núcleo político da Carta.

Assim, acreditam que novos paradigmas engendram novos olhares, clamam por novas interpretações. Como consectário lógico da transformação paradigmática havida na teoria do Estado e do direito, o Ministério Público, que tem sua raiz histórica predominantemente conectada ao combate dos crimes que colocam em risco os interesses das camadas dominantes da Sociedade (via de regra, a propriedade privada), recebe, inegavelmente, um novo delineamento jurídico-constitucional a partir de 1988. E não poderia ser diferente, na medida em que o próprio Poder Judiciário passa a ostentar um relevo nunca dantes alcançado, o que pode ser constatado pelos perfis intervencionistas assumidos pelos Tribunais Constitucionais surgidos nas democracias contemporâneas a partir do segundo pós-guerra.

Finalizam afirmando que, para esse desiderato – representado pelo compromisso das instituições de construir um Estado Social (que no Brasil foi um simulacro até então) – o poder constituinte brasileiro, na senda das preciosas lições dessa tradição inaugurada pelo (neo)constitucionalismo europeu, arquitetou, no plano institucional, um Ministério Público com garantias similares às do Poder Judiciário, alçando-o, demais disso, a guardião dos interesses transindividuais da Sociedade e do próprio regime democrático.

Por sua vez, Marcos Kac sintetiza a atuação ministerial após a C.F./88 da seguinte forma:

(...) ao estabelecer que o Ministério Público é Instituição essencial à função jurisdicional do Estado, o constituinte de 1988 atestou sua indispensabilidade para a manutenção do regime democrático... foi o Ministério Público o grande beneficiado quando da outorga da nova Carta Política. Corrija-se, a sociedade restou fortalecida à medida que seu maior guardião teve suprimentos normativos nunca dantes verificados, e mais, a Instituição a partir daí só fez crescer suas responsabilidades e vem dando resposta concreta, firme, segura e adequada àqueles que a têm buscado para a preservação de seus direitos e garantias fundamentais. [18]

2.3 Do respaldo legal para a investigação criminal pelo Ministério Público

Após esse breve panorama do caminho percorrido pelas sociedades atuais para alcançar o momento em que vivem atualmente, bem como da função que o M.P. assume diante dessa realidade, cabe adentrar nos meandros constitucionais e infraconstitucionais que legitimam o M.P. a investigar na seara penal.

A C.F./88, dentro do Capítulo IV, reservado às funções essenciais à justiça, traz dispositivos relativos ao M.P. e, em seu art. 129, enumera algumas das funções institucionais que por ele devem ser desempenhadas.

Sem maiores esforços de interpretação, compreende-se que o rol trazido pela Carta Magna não é taxativo, pois, em seu último inciso [19], a C.F./88 abre caminho para que o M.P. desempenhe outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, restringindo-lhe, apenas, a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas [20].

Por sua vez, a L.C. 75/93 [21], obedecendo a C.F./88 [22] que, em seu art. 128, §5º, determinou que leis complementares da União e dos Estados estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada M.P., claramente institui, em seu art. 8º, inciso V, que para o exercício de suas atribuições, o M.P. poderá realizar inspeções e diligências investigatórias.

Assim, resumidamente, a C.F./88 determina que leis complementares estabeleçam as atribuições do M.P., ademais, posteriormente, permite que esse Órgão exerça outras funções que lhes sejam conferidas, além das expressamente enumeradas, desde que compatíveis com sua finalidade; e, de sua vez, a L.C. 75/93, em complemento, concede ao Parquet a atribuição de realizar inspeções e diligências investigatórias, ou seja, afigura-se a previsão legal conferindo ao M.P. o poder de investigar criminalmente.

Analisando detidamente os diplomas legais que tratam do M.P. (C.F./88, L.C. 75/93 e Lei nº 8.625/93), verificam-se em seus artigos outras possibilidades de interpretações condizentes com o tema em tela, porém, para não confundir o leitor com excesso de informações – e também porque alguns desses outros dispositivos legais serão mencionados mais adiante – opta-se por frisar apenas o preceituado nos arts. 128, §5º e 129, IX da C.F./88 e os arts. 5º, §2º e 8º, V, da L.C. 75/93, por entender que eles já bastam para comprovar a existência de legitimidade no M.P. para investigar criminalmente.

No intuito de impedir que o M.P. desempenhe a função de investigar ilícitos penais, inúmeros argumentos são criados pelos que não entendem dessa forma ou pelos que se sentem incomodados com essa atuação ministerial no âmbito criminal. Apesar de parecer bastante clara a real intenção do legislador ao criar as leis supra mencionadas, cabe agora contra-argumentar, um a um, os argumentos trazidos à baila pelos que acreditam não caber ao M.P. a função investigatória na seara penal.

Basicamente, existem dois argumentos que embasam a tese de que o Parquet não teria legitimidade para investigar criminalmente, são eles:

a)ausência de fundamento legal a respaldar tal atividade; e exclusividade da polícia na tarefa de investigar a prática de qualquer infração penal e sua autoria.

b)No tocante ao primeiro argumento, já fora acima demonstrada a existência de fundamento legal a amparar o desempenho da função investigadora pelo M.P., pois tanto a C.F./88 como a legislação infraconstitucional lhe dotam de tal capacidade.

A Lei Maior dispõe que pode o M.P. exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, e estatui que são as leis complementares que estabelecerão as atribuições de cada M.P. Por sua vez, a lei que trata do Órgão Ministerial no âmbito federal (L.C. 75/93), estabelece que cabe ao M.P. realizar inspeções e diligências investigatórias, donde se conclui que a função investigatória lhe foi conferida.

Diante do contra-argumento de que a lei confere poder ao M.P. para investigar, alguns tentam desvirtuar o que se entende por "investigar", utilizando-se de interpretações ilógicas para minimizar a atuação ministerial.

Razão não há para entender o sentido da palavra investigar diferente do que ela realmente significa, pois se utilizar de meios interpretativos para desvirtuar o verdadeiro conceito dessa palavra é, no mínimo, ilógico. Investigar é "indagar com minúcia; pesquisar; inquirir" [23], e não há como se entender de forma contrária!

Ainda nesse sentido, e apenas para deixar mais nítida a intenção do legislador constituinte, a Constituição e o C.P.P. deixam claro que tem o M.P. poder requisitório (art. 129, incisos VI e VIII, da C.F./88 e art. 47 do C.P.P.), o que lhe garante o cumprimento de tudo que requisitar, de forma compulsória. Neste diapasão, Paulo Rangel afirma que "requisição é uma ordem que deve ser aceita, é exigência legal a qual a autoridade policial não pode se furtar de cumprir." [24]

No que tange à compatibilidade com a finalidade, não restam dúvidas de que o M.P. é uma instituição pública constitucionalmente comprometida com a defesa do Estado Democrático de Direito, o que, já daí, dá-lhe respaldo suficiente para desempenhar a função investigatória.

O Órgão Ministerial, apesar de ser o titular da ação penal, é uma Instituição que preza pelo fiel cumprimento da lei, lutando, a todo custo, pela aplicação da justiça. Assim, praticar atos para real elucidação dos casos concretos em nada se afasta da sua finalidade, até porque o M.P. não tem interesse pessoal na condenação de criminosos.

A obrigatoriedade da ação penal pública é o exercício de um poder-dever, conferido ao Parquet, de exigir do Estado-juiz a devida prestação jurisdicional a fim de satisfazer a pretensão acusatória estatal, restabelecendo a ordem jurídica violada. Trata-se de um munus público constitucional conferido ao Ministério Público pela sociedade, através do exercício do poder constituinte originário. Neste sentido, Mazzilli entende que:

(...) o Ministério Público é apenas parte processual, formal ou instrumental no processo... quando inicia a ação, produz prova, debate a causa ou recorre, é parte, no sentido técnico e processual. Sua imparcialidade somente poderia ser compreendida no sentido atécnico, no sentido moral, portanto (de objetividade, serenidade e fiscalização da lei, pois não tem um interesse material fora do processo contraposto ao interesse do réu) [25]

Como titular da ação penal pública, tem o M.P. direito de melhor informar-se quanto à ação que pretende intentar. Como já dito, é ele, acima de tudo, um fiscal da lei e, analisado como parte, o é apenas formalmente, sendo óbvio que, apesar de "autor" da ação penal, utiliza de suas atribuições para benefício da sociedade. O Parquet é uma Instituição que atua em nome da sociedade e serve a um Estado Democrático de Direito e, nesse diapasão, entendeu o Ministro do S.T.F., Sepúlveda Pertence, no voto proferido no M.S. 21.239-DF, quando asseverou que "o Ministério Público da Constituição de 1988 lança-se ao exercício de uma magistratura ativa na defesa da ordem jurídico-democrática."

Nesse sentido, Mazzilli afirma que:

(...) inexiste impedimento para que o promotor que investigou os fatos ou oficiou no inquérito policial possa ajuizar a conseqüente ação penal ou nela oficiar: ’é pacífico o entendimento segundo o qual a atuação do Ministério Público, na fase do inquérito policial, tem justificativa na sua própria missão de titular da ação penal, sem que se configure usurpação da função policial ou venha a ser impedimento a que ofereça a denúncia. [26]

Corroborando com a idéia de que o M.P. é imparcial, porque atua movido pelo princípio da legalidade, não exercitando direito subjetivo próprio algum, Paulo Rangel afirma que:

(...) a imparcialidade material do membro do Ministério Público não pode ser confundida com a parcialidade instrumental, ou seja, com a capacidade de ser parte, a legitimatio ad causam... se ser parte instrumental fosse ser parcial quanto ao direito material deduzido em juízo, não estaria o Ministério Público autorizado a opinar pela absolvição. A imparcialidade ministerial assim, ganha um novo contorno diante da análise do devido processo penal... a persecução penal exercida pelo órgão ministerial é feita muito mais em nome dos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana do que em prol da obtenção, simples, do resultado favorável da pretensão acusatória. Não se visa única e exclusivamente à punição do indivíduo como bel prazer do Promotor de Justiça, mas sim sua proteção jurídica, a tutela de sua liberdade que, excepcionalmente, poderá ser cerceada... a atuação do Ministério Público, se for exercida através do devido processo legal em seu duplo enfoque (instrumental e substantivo), é garantia do acusado de que todos os direitos previstos na ordem jurídica constitucional lhe foram assegurados, com a certeza da imparcialidade não só do órgão julgador, mas também do órgão fiscalizador da lei. Assim, afasta-se da idéia de que o Ministério Público é órgão acusador e compreende-se seu verdadeiro papel constitucional de instituição guardiã da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. [27]

Quanto à exclusividade da polícia para investigar qualquer tipo de infração penal, os que defendem essa idéia se baseiam no §1º, inciso IV, do art. 144 da C.F./88, que estatui que a polícia federal destina-se a exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

Novamente sem maiores esforços de raciocínio, pode-se compreender que o que quis o legislador constituinte foi diferenciar as atividades desempenhadas pelas diferentes polícias enumeradas no art. 144, estabelecendo que, dentre a polícia federal, a rodoviária federal, a ferroviária federal, as civis e as militares e corpos de bombeiros, cabe à polícia federal praticar as funções de polícia judiciária da União.

Neste diapasão, Marcos Kac [28] entende que não há como se falar em privatividade da atuação investigatória como sendo exclusiva da polícia judiciária, pois o inquérito policial demonstra que, ao contrário dos já aclamados princípios do Promotor Natural e do Juiz Natural, não há no procedimento administrativo o princípio da Autoridade Policial Natural, podendo a investigação ser procedida, inclusive, pelos membros do M.P.

Se assim não fosse, como compreender as investigações realizadas pelos mais variados setores do Estado? Alguns exemplos podem ser citados para demonstrar que tanto na prática, como expressamente disposto em diversas legislações, há investigações realizadas por órgãos que não a polícia federal.

No âmbito do Poder Executivo, pode-se citar a Receita Federal, que realiza com freqüência não só diligências investigatórias, como também operações para constituição de auto de infração e repressão a determinados delitos, sem falar na própria representação fiscal para fins penais, dirigida ao M.P. com informações que o levam a impetrar a ação penal pública, e, ainda, na existência de um órgão voltado para investigar, o E.S.P.E.I. (Escritório de Pesquisa e Inteligência).

Ainda na seara do Executivo, encontra-se o Banco Central, onde são efetuadas diligências que, para além de instruir o procedimento administrativo, terão como destinatário o M.P., para que proceda criminalmente contra os investigados. Sem contar com a existência de um Departamento de Combate a Ilícitos Cambiais e Financeiros (D.E.C.I.F.) e de um Conselho de Coordenação de Atividades Financeiras que realiza, a seu modo, atividade investigatória, atuando como órgão do Governo, responsável pela coordenação de ações voltadas ao combate à lavagem de dinheiro [29].

Já na esfera do Poder Legislativo, encontram-se as Comissões Parlamentares de Inquérito, que, de acordo com o art. 58, §3º, da C.F./88, "tem poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas".

Ainda analisando o Legislativo, o art. 269 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados dispõe que se instaurará inquérito a ser presidido pelo diretor de serviços de segurança ou, se o indiciado ou o preso for membro da Casa, pelo Corregedor ou Corregedor substituto, quando nos edifícios da Câmara for cometido algum delito.

Além desses poderes conferidos no âmbito do Legislativo, aplicar-se-ão, nos dois casos acima descritos, os dispositivos contidos no C.P.P.

Finalmente, quanto ao Poder Judiciário, cabe rememorar que, de acordo com o art. 33 da Lei Complementar nº 35/79 – Lei Orgânica da Magistratura –, compete a ele próprio (Poder Judiciário), e jamais à polícia, a investigação de Magistrados envolvidos em práticas criminosas e, tratando-se do M.P. não é diferente, pois de acordo com a L.C. 75/93:

(...) quando, no curso de investigação, houver indício da prática de infração penal por membro do Ministério Público da União, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá imediatamente os autos ao Procurador-Geral da República, que designará membro do Ministério Público para prosseguimento da apuração do fato.

Ainda no tocante ao Poder Judiciário, cumpre destacar o art. 43 do Regimento Interno do S.T.F., que prescreve que "ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro."

O M.P. não pretende afrontar e nem tomar a posição dos Delegados de Polícia, porém conceber a apuração de ilícitos penais exclusivamente pela polícia judiciária é um retrocesso inadmissível e deve ser repudiado para que se possa ver garantido o pleno exercício da titularidade da ação penal pública.

Além de toda a explanação e exemplos supra acerca da ausência de exclusividade da polícia para investigar, cabe destacar o que preceitua o C.P.P., em seu art. 4º, quando faz expressa ressalva à possibilidade da existência de inquéritos extrapolicias que visem, inclusive, dar suporte na apuração de infrações penais por outros órgãos que não sejam exclusivamente a polícia, desde que efetivados por autoridades administrativas a quem por lei seja cometida a mesma função investigatória:

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas a quem por lei seja cometida a mesma função. (grifo nosso)

Além dos contra-argumentos aqui trazidos, no intuito de ver sanada por definitivo a polêmica quanto à existência, ou não, de legitimidade no M.P. para investigar criminalmente, outros pontos merecem ser destacados.

Como notadamente cediço, e como dito acima, o M.P. é dotado de garantias constitucionais, dentre elas, a inamovibilidade, que lhe assegura o direito de, uma vez titular do respectivo cargo, somente ser removido ou promovido por iniciativa própria, nunca ex officio por qualquer outra autoridade. [30]

Assim, o membro do M.P. não sofrerá retaliação desse tipo em virtude de investigação realizada em nenhuma esfera ou contra qualquer agente do poder, diferentemente da polícia, que não detém essa garantia.

Através de noticiários, a imprensa veicula, periodicamente, casos de policiais que são, repentinamente, transferidos de suas comarcas, porque estão envolvidos com investigações por demais "políticas" e, em seus lugares, assumem profissionais completamente vinculados aos "grandões" do poder, normalmente os investigados, o que faz com que os autos sejam arquivados ou se "encontrem" culpados para os crimes.

Como exemplo do afirmado, pode-se trazer à baila o caso recentemente divulgado do vereador Jorge Babu, investigado em virtude de participação em briga de galo, onde policiais foram afastados do caso. [31]

Dentro desse contexto, resta evidente que a garantia da inamovibilidade conferida aos membros do M.P. pela C.F./88 lhes assegura ainda mais autonomia nas investigações, pois, se um membro do M.P., juntamente com a polícia local, investiga ilícito penal e, de repente, o Delegado for transferido, o Promotor/Procurador, em virtude da garantia constitucional da inamovibilidade, continuará na localidade, investigando e podendo vir a denunciar os verdadeiros culpados, mesmo com a presença de outro Delegado.

Neste sentido, Paulo Rangel assevera que:

(...) o mundo do crime, a cada dia que passa, conta com a presença cada vez maior de pessoas ilustres, detentoras de parcela do poder estatal, que, sob as vestes do cargo que ocupam, associam-se a delinqüentes (ou já estavam associados e assumiram o cargo) para garantir-lhes a impunidade e gerar riquezas indevidas e escusas. Nesse caso, a persecução penal por parte do Estado torna-se difícil, porque as diligências que deveriam e poderiam ser feitas acabam sendo intencionalmente frustadas, com o único escopo de prejudicar a ação da justiça, inclusive com a participação (criminosa) direta de determinadas autoridades policiais, peritos criminais e/ou comandantes da Polícia Militar (...) [32] a atuação do Ministério Público, na condução das investigações diretas, não pode se voltar única e exclusivamente para os crimes cometidos pelos administrados, mas sim, também, pelos administradores, integrantes do governo, que, por exercerem poder hierárquico sobre as atividades das autoridades policiais, muitas vezes, impedem que haja uma apuração isenta de qualquer conotação político-partidária. [33]

Outro ponto que merece ser destacado é a impunidade que atualmente vige no Brasil. É amplamente cediço que diversos crimes quedam-se sem punição devido à falta de provas, ou em virtude de Inquéritos Policiais recheados de provas mal produzidas. Assim, a atuação ministerial nas investigações mais uma vez beneficiará a sociedade, que poderá ter no Parquet uma "carta na manga" para melhor elucidação dos casos concretos, o que ocasionará um menor índice de impunidade no Brasil. Neste sentido, Kac assevera que

(...) a impunidade é um dos maiores males de nossa sociedade moderna. É em razão desta que a criminalidade vem se acentuando, cada vez mais, e se instalando em todo o corpo social... A investigação penal nos moldes atuais, demonstra, à saciedade, a iniqüidade destes procedimentos e atesta, sem sombra de dúvida, a falência dos órgãos investigativos. É anseio mais do que merecido de parcela significativa da sociedade que o Ministério Público tome as rédeas da investigação penal (mediante seleção de casos) para que os procedimentos possam, de alguma maneira, ser notabilizados por sensível melhora e que a ação penal a ser posteriormente proposta não esteja quase sempre fadada ao insucesso. [34]

Se já não bastasse o acima exposto, a Lei Orgânica do M.P., nº 8.625/93 (estabelece as normas gerais para a organização desse Órgão nos Estados), em seu art. 26, dispõe sobre os atos que o Parquet poderá praticar no exercício de suas funções. Dentre eles, encontra-se, respectivamente, nos incisos II, V, que poderá o M.P. requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou processos em que oficie; e praticar atos administrativos executórios, de caráter preparativo.

A lei acima não diz em qual o procedimento que o M.P. pode requisitar informações e documentos para instruí-lo... Por que entender que procedimentos de caráter criminal estariam excluídos? O M.P. só pode agir nas investigações cíveis? Baseando-se em que essa idéia poderá prevalecer? Parece um tanto ilógico deduzir tal pretensão, pois espremer a lei para extrair-lhe o que for de interesse próprio não parece ser o mais correto.

Já no tocante ao disposto no inciso V, suscita-se outra questão: o que são atos administrativos executórios de caráter preparativo? Por que não compreender isso como um ato de investigação preparatório da ação penal pública? Realmente, a única coisa que se enxerga no discurso dos que são contrários à investigação ministerial criminal é que há temor nessa atuação, pois tenta-se, a todo custo, desvirtuar a real intenção do legislador.

Cabe destacar também que, se munido de informações consistentes capazes de suprir a ausência do Inquérito Policial, poderá o Parquet ingressar com a ação penal, fator que só confirma a legitimidade do M.P. para investigar. É o que estabelece o C.P.P., em seu art. 27 [35], pois o Inquérito Policial é uma peça de informação, legalmente dispensável, que pode vir a formar o convencimento do membro ministerial.

As peças de informação formam o gênero do qual o Inquérito Policial é espécie. São elas toda e qualquer informação que possui o M.P. acerca de um fato delituoso, obtidas através de uma notitia criminis, da representação feita pelo ofendido, nos crimes de ação penal pública condicionada à representação, ou pela providência do art. 40 do C.P.P.

Se o Órgão Ministerial pode oferecer denúncia sem Inquérito Policial, é porque a investigação policial pode ser substituída por outra investigação preliminar levada a cabo pelo M.P.

E, novamente, o Pergaminho Processual Penal só reforça a comprovação da tese sob comento quando, no §5º, do art. 39, dispõe que "o órgão do Ministério Público dispensará o inquérito se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal...", confirmando que o Órgão Ministerial é livre para propor a ação penal pública quando se convencer da materialidade e verificar a existência de indícios da autoria do delito.

Tendo por base a idéia de que o M.P. atua como parte formal, entende-se claramente que não há óbice legal de que o Parquet possa desenvolver as investigações criminais diretas que viabilizarão o curso regular do processo a que irá se submeter o réu. Inclusive, e como já dito, o M.P. pode dispensar o Inquérito Policial se tiver outros elementos que viabilizem o exercício da ação penal. Ou seja, pode dispensar o Inquérito para, de imediato, iniciar a ação penal, porque não poderia fazer a investigação que dará suporte à ação que irá propor? Quem pode o mais pode o menos.

Se a C.F./88 reconhece o M.P. como Instituição essencial à função jurisdicional, incumbindo-o de defender a ordem jurídica e conferindo-lhe a promoção privativa da ação penal pública, lógico que as investigações necessárias para formar sua opinio delicti são inerentes à obrigatoriedade da ação penal. Estão implícitas!

Paulo Rangel corrobora com essa idéia quando afirma que:

(...) na medida em que a Constituição legitima o Ministério Público a requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquéritos policias, claro está que, se tem o poder de determinar esta ou aquela diligência, possui também legitimidade para realizar, pessoalmente, as diligências que pode determinar. Seria um contra sensu, pelo menos assim nos parece, dar-lhe a legitimação para exigir que se faça, mas negar-lhe o direito de fazê-lo, pessoalmente. Em outras palavras, é como se disséssemos: "pode o Ministério Público fazer o mais, porém lhe é negado fazer o menos". Violaríamos as regaras comezinhas de hermenêutica jurídica se assim pensássemos. [36]

Kac também comunga desta idéia, asseverando que:

(...) quando o constituinte concede a determinado órgão ou instituição uma função (atividade-fim), implicitamente estará concedendo-lhe os meios necessários ao atingimento do seu objetivo (atividade-meio), sob pena de se ver frustrado o exercício do munus constitucional que lhe foi cometido. Nestes termos, se incumbe ao Ministério Público, privativamente, o exercício da ação penal pública, é tranqüilo concluir que estarão compreendidos entre seus poderes e prerrogativas institucionais o de produzir provas e investigar a ocorrência de indícios que justifiquem sua atuação na persecução penal preliminar, instaurando o procedimento administrativo pertinente, devendo assim proceder por dever de ofício e sempre que a atuação da Polícia Judiciária possa revelar-se insuficiente à satisfação do interesse público consubstanciado na apuração da verdade real. [37]

É um retrocesso desnecessário o fato de o Estado autorizar o M.P. a iniciar a persecução penal quando as informações que servirão de suporte à denúncia forem levadas ao seu conhecimento pelo particular, porém tal imputação penal carecer de legitimidade se forem as informações colhidas por ele mesmo.

Se, ao fim de investigações na seara civil, o membro do M.P. dispuser de provas que indiquem a prática de crime, devem esses elementos ser considerados imprestáveis para fins penais? Se a resposta for positiva, estar-se-á diante de um absurdo jurídico e prático, com afronta, inclusive, ao princípio constitucional da eficiência, que deve pautar a atuação de todas as esferas estatais.

Cabe, também, destacar dentro deste Capítulo, a diferença entre condução de Inquérito Policial e realização de diligências investigatórias. O que se quer é comprovar definitivamente que o M.P. pode realizar diligências investigatórias, direito conferido pela C.F./88, juntamente com as normas infraconstitucionais, utilizando-se, para isso, de suas atribuições, como, por exemplo, o poder requisitório, e não conduzir o Inquérito Policial, muito menos presidi-lo, pois aí, realmente, não há nenhuma legitimidade, até porque, se assim fosse, ele nem teria essa nomenclatura.

Fortalecendo esse entendimento, Alfredo Martins afirma que "a verdade é que o modelo processual penal brasileiro, desde há muito, vem confundindo a investigação criminal com o inquérito policial, quando, na verdade, este é apenas um aspecto daquela." [38]

Outra questão que merece destaque é em relação ao direito comparado. Com bem analisado por Marcos Kac [39], o mundo contemporâneo já recepciona o M.P. como Instituição com atuação na seara da investigação criminal, pois em muitos países – Estados Unidos da América, México, França, Itália, Espanha, Bélgica, Portugal, Alemanha, Colômbia, Peru e Paraguai, por exemplo - é assim que o Parquet se comporta.

Com isso, só fica mais latente que ao Órgão Ministerial Brasileiro deve ser, por definitivo, atribuída a função investigatória criminal, pois é assim que se procede no mundo moderno, ao qual o Brasil se enquadra.

Neste sentido, Kac conclui que:

(...) nos países com legislação investigativa mais avançada, a investigação penal preliminar é conduzida pelo Ministério Público. É inaceitável que nos dias de hoje no Brasil a investigação fique a cargo exclusivo da Autoridade Policial, seja ela estadual ou federal, sem que haja qualquer ingerência do destinatário final do lastro probatório mínimo na fase pré-processual a permitir a correta formação do opinio delicti e consequentemente a deflagração da persecutio criminis juditio. [40]

Importante, ainda, destacar que o M.P. não pretende usurpar as funções da polícia. Almeja-se dar por encerrada a polêmica quanto ao tema sob cogitação e ver-se conferida, definitivamente, a legitimidade ao Órgão Ministerial para investigar, podendo, inclusive, haver duplicidade de investigações, pela polícia e pelo M.P., o que, em nada, prejudicará a sociedade, ao contrário. Paulo Rangel comunga dessa idéia, pois, segundo ele:

(...) não estamos negando o exercício da polícia de atividade judiciária pelas autoridades policiais, através do inquérito policial, mas, sim, mostrando que há outro legitimado para tal investigação que, inclusive, pode ser feita em perfeita harmonia com a polícia de atividade judiciária com ganho exclusivo da sociedade. Não se trata, nem poderia assim o ser, de uma usurpação de função por parte do Ministério Público, mas sim, de uma união de forças institucionais em nome da segurança pública e da manutenção da ordem jurídica tão fragilizada pela conduta abusiva de determinados criminosos, em especial aqueles que integram a elite econômica de nosso País. A sociedade é a única que, efetivamente, irá ganhar com a investigação direta pelo Ministério Público e, conseqüentemente, a única que sairá perdendo se pensarmos diferente. [41]

Essa união apenas virá a beneficiar a sociedade como um todo, que passará a ter mais um ente legitimado investigando os delitos contra ela praticados. O M.P., muitas vezes, não tem condições de levar adiante uma investigação criminal sozinho, tanto por carência de material humano, quanto físico - investigadores, viaturas, espaço físico apropriado etc. – e nada impede, ao contrário, tudo indica, a união de forças com a polícia.

Além de que, muitas vezes, os procedimentos se eternizam nas idas e vindas entre a Delegacia Policial e o M.P., quando esse requisita diligências. Com a condução direta das investigações penais, o Órgão Ministerial verificaria, de plano, quais os casos possíveis de efetiva solução, e em quais as chances de solução seriam mínimas ou nenhuma, destinando sua força policial para a elucidação dos casos possíveis.

Não existe qualquer ofensa ou perigo no fato de o agente do M.P., promotor privativo da ação penal, requisitar documentos, perícias, ou ouvir testemunhas para colher os elementos de convicção necessários, não mais, de qualquer modo, do que acontece quando essas diligências são realizadas pela autoridade policial.

Neste sentido, Marcos Kac entende que:

(...) desburocratizando os serviços de investigação penal, o procedimento investigatório começará a andar mais rápido, e conseqüentemente, o deslinde se dará de forma mais célere. Quebrando a rotina de entregas de procedimentos de um lado para o outro, evitar-se-á o desperdício de gastos, inúteis para o fecho de determinados casos. E mais, evitará que os procedimentos vão e voltem sem a realização do que neles se requisitou. Os aparatos do Estado não são estanques, e por isso mesmo, não podem ficar isolados, como ilhas. Necessária se faz uma maior aproximação entre o aparato investigador e o aparato acusador, para que a investigação e a ação possam melhor frutificar. [42]

O Parquet, entendido como parte meramente formal, busca, apenas, a verdade real dos fatos, sua correta elucidação. Não há como compreender a resistência tão empreendida por muitos para que o Órgão Ministerial não investigue ilícitos penais, pois nessa atuação não se encontra nenhum malefício à sociedade.

A investigação criminal exercida pelo M.P. não se consubstancia como uma regra geral. No mais das vezes, seu desencadeamento decorrerá ou da inconveniência casuística da instauração de um procedimento amplo como o Inquérito Policial ou mesmo da omissão da polícia na investigação de determinados delitos, notadamente quando envolvidos agentes policiais.

Em entrevista à revista IstoÉ, o Procurador do Estado de São Paulo, Luiz Antônio Guimarães Marrey, disse que: ".. . entendemos que o fato de o Ministério Público promover investigações criminais diretamente só favorece o interesse público. Ninguém quer substituir o trabalho das polícias nem temos estrutura para isso. Mas queremos, em casos selecionados, poder apurar fatos que a polícia não tenha apurado ou não tenha interesse em apurar. Ações assim têm impedido a impunidade, têm evitado a tortura e até mesmo a proliferação de grupos de extermínio." [43]

Nesse diapasão, Streck e Feldens afirmam que:

(...) o que aqui se preconiza, enfim, não é um "Ministério Público-policial", a dar ensejo à figura de um procurador/promotor "investigador por excelência"; quanto menos um Estado "big brother", panóptico ante os meios social e individual. Sustenta-se, isto sim, com substrato na Constituição e na legislação vigente (e válida), a destruição de dogmas que apenas servem para alimentar feudos corporativos há muito inexistentes no Direito comparado. [44]

Faz-se, ainda, imperioso trazer à baila o entendimento sobre o tema em tela de alguns autores de renome nacional, como Frederico Marques e Mazzilli:

Frederico Marques entende que:

(...) se é o Estado-administração quem investiga e acusa, é irrelevante o órgão a quem ele atribui uma ou outra função. No juízo ou no inquérito quem está presente é esse Estado-administração. Que importa, pois, que ele se faça representar, na fase investigatória, também pelo Ministério Público. [45]

Mazzilli, por seu turno, afirma que:

(...) o mais usual é iniciar-se a ação penal pública à vista da opinio delictis formada pelo órgão ministerial por meio dos elementos colhidos no inquérito policial. Contudo, nem só no inquérito policial pode ela fundar-se. Em documentos extraídos de processos ou procedimentos judiciais e administrativos, pode encontrar o órgão do Ministério Público elementos para a propositura direta da ação penal, dispensando o inquérito policial. Até mesmo em inquérito civil ou em decorrência de requisições ou diligências diretas realizadas pela instituição, podem surgir elementos suficientes para embasar a acusação penal. Pode, ainda, o órgão ministerial, exercitar a ação penal pública a partir de elementos de convicção colhidos a partir do atendimento pessoal aos necessitados. [46]


CAPÍTULO III - DO POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RHC 81.326-DF [47]): PONTOS CONTROVERTIDOS.

Recentemente, o S.T.F. posicionou-se diretamente em relação ao tema sob cogitação (R.H.C. 81.326-DF) e, este Tribunal – guardião da Constituição, formado por membros de notável saber jurídico e que, em tese, pugna pela real e justa aplicação da lei no Brasil –, entendeu que o M.P. não tem legitimidade para investigar criminalmente. Data venia, parece que o S.T.F., por meio da sua 2ª Turma, não conferiu o melhor sentido à Constituição.

Vejamos alguns trechos do voto relator, elaborado pelo Ministro Nelson Jobim, ao fundamentar sua decisão:

(...) em 1936, o Ministro da Justiça VICENTE RÁO, tentou introduzir, no sistema processual brasileiro, os juizados de instrução. A Comissão da Segunda Secção do Congresso nacional do Direito Judiciário, composta pelos Ministros BENTO DE FARIA, PLÍNIO CASADO e pelo GAMA CERQUEIRA, acolheu a tese no anteprojeto de reforma do Código de Processo Penal. Ela, entretanto, não vingou. Na exposição de motivos do Código de Processo penal o Ministro FRANCISCO CAMPOS ponderou acerca da manutenção do inquérito policial...

(...) o Constituinte rejeitou as Emendas 945, 424, 1.025, 2.905, 20.524, 24.266 e 30.513, que, de um modo geral, davam ao MINISTÉRIO PÚBLICO a supervisão, avocaçao e o acompanhamento da investigação criminal...

(...) a legitimidade histórica para condução do inquérito policial e realização das diligências investigatórias, é de atribuição exclusiva da polícia... [48]

Analisando-se detidamente a decisão sob comento, encontram-se argumentos desprovidos de fundamentos plausíveis que justifiquem tal posicionamento.

Da leitura do voto-condutor é possível extrair que sua fundamentação está assentada nos seguintes aspectos:

a)análise histórica das tentativas de legitimar o M.P. a investigar criminalmente;

b)a C.F./88 não confere ao M.P. o poder investigatório; e

c)a exclusividade da Polícia, em face à legitimidade histórica, para realização de investigação no âmbito criminal.

Em relação à análise histórica feita pelo Ministro Nelson Jobim, tanto quanto as relativas às diversas iniciativas já tomadas de se conferir ao M.P. poder investigatório, como quanto à exclusividade da polícia para a prática de tal função, de importante só teve a pesquisa realizada. Não se pode olhar o novo com os olhos do velho. Muito admira-se que um Ministro do S.T.F. se baseie em uma análise histórica para embasar seu voto, pois claramente se compreende, por mais imaturo e inexperiente que se seja, que tudo evolui, que a sociedade anda para frente e que não se pode negar a prática de algo que a C.F./88 confere, em conjunto com demais normas do ordenamento jurídico, porque antigamente não era assim.

Nesse diapasão, Streck e Feldens [49], analisando a decisão sob cotejo, entendem que, de início, deve-se deixar claro que qualquer método de interpretação (no caso, o histórico) pode tornar-se frágil se confrontado a outros métodos. Mais do que isto, todavia, é a própria metodologia que não se sustenta em face daquilo que hoje denomina-se de nova hermenêutica... Do mesmo modo, entendem que não é possível concluir que, pelo fato de que, desde o Projeto RÁO (1936) até o período posterior ao processo constituinte (1999), os projetos que apontavam para a possibilidade de o Ministério Público dirigir investigações criminais haverem sido rejeitados (juizados de instrução), tenha sido afastada a legitimidade da Instituição para realizar diligências investigatórias.

Para os autores, os argumentos históricos, conformadores de uma eventual voluntas legislatoris negativa, não podem impedir, hermeneuticamente, a possibilidade de que se atribua sentido diferente aos dispositivos constitucionais e à legislação complementar, que assinala, de forma clara, a possibilidade de o Ministério Público realizar tais atos investigatórios. Há, outrossim, vários precedentes contemporâneos do próprio S.T.F. que autorizam distinta conclusão acerca da atuação pré-processual do M.P. Considerado o aspecto histórico metodologicamente utilizado na decisão, tais precedentes merecem referência... Daí porque não se pode aplicar ao M.P. do Estado Democrático de Direito interpretações recolhidas de um modelo institucional hoje inexistente, impensável e constitucionalmente inconcebível. Olhando para trás, corre-se o risco de seqüestrar o tempo.

E concluem asseverando que é razoável dizer que até 1988 era "possível" defender a existência de uma legitimidade histórica da polícia para investigar. Estava-se, afinal, sob o égide de outro paradigma jurídico-constitucional. Entretanto, nesta quadra da história, não é mais possível buscar esse fundamento. Vingasse o argumento da "legitimidade histórica" da polícia para investigar, mesmo com o advento da Constituição de 1988, o "direito histórico" à propriedade rural, mesmo com a Constituição estabelecendo limites a esse direito, através da exigência do cumprimento da função social, ou, ainda, poder-se-ia defender, mesmo após a Constituição, a "legitimidade" de a polícia continuar a "baixar" portarias com base na Lei nº 4.611/65, instrumento edificado pelo regime autoritário com nítidos propósitos de controle sobre determinados delitos e proteção de setores específicos da Sociedade. Isto para ficar apenas em dois singelos exemplos.

Paulo Rangel, também em análise do R.H.C. nº 81.326-DF, entende que "o STF, nesta decisão, deu um passo atrás, estabelecendo um retrocesso social e atando as mãos do Ministério Público." [50]

Não há como deixar de citar a perfeita conclusão a que chegaram Lenio Streck e Luciano Feldens quando da análise da decisão em comento:

(...) lembra ORTEGA Y GASSET que "a tradição afoga-nos com uma avalancha de questões acumuladas, onde vêm confundidas as substancias com as fictícias". Estarmos inseridos na tradição significa dizer que estamos no mundo a partir de nossos pré-juízos, e nos expressamos a partir de nossa condição de ser-no-mundo. Daí a necessidade de que suspendamos nossos pré-juízos, deixando o novo vir à presença, isto porque toda experiência é confronto, alerta GADAMER, já que " ela opõe o novo ao antigo, e, em princípio, nunca se sabe se o novo prevalecerá, quer dizer, tornar-se-á verdadeiramente uma experiência, ou se o antigo, costumeiro e previsível, reconquistará finalmente a sua consistência. Sabemos que, mesmo nas ciências empíricas, como KUHN em particular o demonstrou, os conhecimentos novamente estabelecidos encontram resistências e na verdade permanecem por muito tempo ocultos pelo ‘paradigma’ dominante. O mesmo ocorre fundamentalmente com toda experiência. Ela precisa triunfar sobre a tradição sob pena de fracassar por causa dela. O novo deixaria de sê-lo se não tivesse que se afirmar contra alguma coisa." É neste contexto que se inserem as presentes reflexões: procurar indagar acerca das condições de possibilidade de o novo (paradigma do Estado Democrático de Direito e seus reflexos especialmente no papel a ser desenvolvido pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público) triunfar sobre a tradição, calcada em um Direito de nítido cariz liberal-individualista... Assim, de nada adianta todo o arcabouço jurídico-constitucional, forjado a partir do processo constituinte de 1986-1988, apontar para um Estado Democrático de Direito, que traz ínsito um plus normativo, superador das concepções anteriores de Direito e de Estado (Liberal e Social), se, no conjunto das práticas dos juristas, não se constituir um substrato político, material e cultural, apto a concretizar essa normatividade. Trata-se, pois, de uma questão recorrente, representada pela discussão da crise de paradigmas: é preciso triunfar sobre a tradição sob pena de fracassarmos por causa dela! [51]

O também Ministro do S.T.F. Joaquim Barbosa, colega do Ministro Nelson Jobim, teceu críticas quanto ao método histórico utilizado:

(...) o ministro Nelson Jobim, S. Exa. funda essencialmente a sua nova visão sobre o tema não na inteligência específica da Constituição de 1988, vista numa perspectiva global e sistemática, mas, sim, em interpretações de textos legais que datam de 1936 (Projeto Rao), 1941 (Código de Processo Penal) e 1957 (decisão do Supremo Tribunal Federal da lavra de Hungria). Tais interpretações, ainda que válidas para um determinado período, não o são necessariamente para outro, especialmente tendo-se em conta a radical transformação do quadro constitucional e especialmente o saliente papel que se procurou atribuir ao Ministério Público no Estado brasileiro. Em suma, o método hermenêutico de cunho historicista, além de suas deficiências intrínsecas. [52]

No tocante ao argumento de que a Lei Maior não confere ao M.P. legitimidade para investigar criminalmente, já se discorreu sobre o tema no Capítulo II deste trabalho, sendo redundante e dispensável repetir as mesmas considerações feitas acima.

Como visto, o posicionamento do S.T.F., representado no voto do Ministro Nelson Jobim, está fundamentado em bases permeáveis, pois repleto de lacunas interpretativas. Para torná-lo ainda mais conflituoso, cabe destacar a existência de posicionamentos diferentes da decisão sob cogitação, ou seja, casos em que a Suprema Corte foi a favor da investigação criminal pelo M.P.

Veja-se, por exemplo, a ADIN nº 1.571, onde o Tribunal Guardião da Constituição manifestou-se no sentido de que o M.P.F. não fica impedido de agir, desde logo, utilizando-se, para isso, dos meios de prova a que tiver acesso; o H.C. nº 75.769-MG, mais explícito ao afirmar que não se evidencia irregularidade na participação do Ministério Público em fase investigatória; e, para surpresa do leitor, o H.C. nº 77.371, que teve como relator o próprio Ministro Nelson Jobim, reconhecendo como legal (baseando-se no art. 26 da Lei nº 8.625/93) a prova colhida pelo M.P., argumentando que sua Lei Orgânica faculta a seus membros a prática de atos administrativos de caráter preparatório tendentes embasar a denúncia.

Após a publicação da decisão contida no R.H.C. 81.326-DF, o S.T.F. novamente contradisse-se, afirmando, em decisão que negou H.C. a juíza federal investigada por suposta adulteração de placa de veículo e cassou a liminar que anteriormente havia suspendido o inquérito judicial que investigava a suposta prática pela Magistrada do crime de adulteração de sinal identificador de placa de veículo automotor. [53]

Como saber o real posicionamento do S.T.F.? Não há como fugir da idéia de que esse Tribunal é de cunho eminentemente político!!!

Apenas para fundamentar o entendimento de que o S.T.F. vem atuando de forma política, vale salientar que essa decisão se torna tanto mais importante quanto se sabe que ela foi proferida exatamente no momento em que a instituição Ministério Público vem ganhando espaço, sobretudo como conseqüência das investigações que tem procedido especialmente em relação à macrocriminalidade, normalmente com inegável êxito, o que pode ser observado nas constantes notícias que são veiculadas pela grande mídia nacional.

Assim compreendida, a decisão da 2ª Turma do S.T.F. seria, não há negar-se, um verdadeiro obstáculo ao desempenho do M.P. que, sem poder de investigar e instruir, ver-se-ia tolhido em suas ações, voltando a depender das investigações que a polícia judiciária realizasse, nos moldes avoengos, como sempre ocorreu na tradição do direito brasileiro, daí a intensa repercussão nacional e os compreensíveis protestos que os integrantes dessa conceituada Instituição têm manifestado.

A polêmica foi novamente levantada em virtude da existência do Inquérito nº 1.968-2-DF, em trâmite no S.T.F., cuja denúncia foi oferecida com base em procedimento administrativo instaurado a partir de notitia criminis do Ministério da Saúde. O relator, Ministro Marco Aurélio, votou pela rejeição da denúncia, sob o argumento de que inexiste justa causa, por falta de atribuição do M.P. para instaurar e presidir Inquéritos Policiais.

Atualmente, o processo encontra-se suspenso, pois o Ministro Cezar Peluso pediu vista, porém, apesar da extensão, merece ser aqui destacado o posicionamento do Ministro Joaquim Barbosa, favorável à atuação ministerial na investigação criminal. Eis alguns trechos de seu voto:

(...) o que autoriza o Ministério Público a investigar não é a natureza do ato punitivo que pode resultar da investigação (sanção administrativa, cível ou penal), mas, sim, o fato a ser apurado, incidente sobre bens jurídicos cuja proteção a Constituição explicitamente confiou ao Parquet. A rigor, nesta como em diversas outras hipóteses, é quase impossível afirmar, a priori, se se trata de crime, de ilícito cível ou de mera infração administrativa. Não raro, a devida valoração do fato somente ocorrerá na sentença! Note-se que não existe uma diferença ontológica entre o ilícito administrativo, o civil e o penal. Essa diferença, quem a faz é o legislador, ao atribuir diferentes sanções para cada ato jurídico (sendo a penal, subsidiária e a mais gravosa). Assim, parece-me lícito afirmar que a investigação se legitima pelo fato investigado, e não pela ponderação subjetiva acerca de qual será a responsabilidade do agente e qual a natureza da ação a ser eventualmente proposta. Em síntese, se o fato diz respeito a interesse difuso ou coletivo, o Ministério Público pode instaurar procedimento administrativo, com base no art. 129, III, da Constituição Federal. Na prática, penso que é possível propor tanto ação civil pública com base em inquérito policial quanto ação penal subsidiada em inquérito civil. Essa divisão entre civil e penal é mera técnica de racionalização da atividade estatal. O que é de fato relevante é a obrigação constitucional e legal a todos imposta de se conformar às regras jurídicas, indispensáveis a uma convivência social harmônica. Não quero com isso dizer que o Ministério Público possa presidir o inquérito policial. Não. A própria denominação do procedimento (inquérito policial) afasta essa possibilidade, indicando o monopólio da polícia para sua condução. Ocorre que a elucidação da autoria e da materialidade das condutas criminosas não se esgota no âmbito do inquérito policial, como todos sabemos. Em inúmeros domínios em que a ação fiscalizadora do Estado se faz presente, o ilícito penal vem à tona exatamente no bojo de apurações efetivadas com propósitos cíveis. Nesses casos, como em muitos outros, o desencadeamento da ação punitiva do Estado prescinde da atuação da polícia. Daí a irrazoabilidade da tese que postula o condicionamento, o aprisionamento da atuação do Ministério Público à atuação da polícia, o que, sabidamente, não condiz com a orientação da Constituição de 1988...

(...) o que a Constituição e a teoria constitucional moderna asseguram é que, sempre que o texto constitucional atribui uma determinada missão a um órgão constitucional, há de se entender que a esse órgão ou instituição são igualmente outorgados os meios e instrumentos necessários ao desempenho dessa missão. Esse é, em síntese, o significado da teoria dos poderes implícitos... De fato, se a Lei Maior concedeu ao Ministério Público a função de dar início à ação penal, sendo esta sua atividade-fim, implicitamente, por óbvio, concedeu-lhe também os meios necessários para o alcance de seu objetivo, caso contrário seu encargo constitucional nem sempre poderia ser cumprido.

Se houvesse a imperativa inércia do promotor de Justiça criminal e sua impossibilidade de investigar os fatos, porquanto sempre na dependência do trabalho da polícia judiciária, como poderia o Ministério Público cumprir sua função constitucional de "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia" como prescreve o art. 129, II, da Carta Magna? Como poderia defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, previstos no art. 127, caput, da mesma Constituição?

Ora, esses meios de ação foram expressamente conferidos ao Ministério Público, tanto no plano constitucional, por força da própria natureza da função cuja titularidade lhe foi outorgada, quanto no plano legal. Com efeito, o art. 129, IX, da Constituição diz que são funções institucionais do Ministério Público "EXERCER OUTRAS FUNÇÕES QUE LHE FOREM CONFERIDAS, DESDE QUE COMPATÍVEIS COM SUA FINALIDADE". Não me parece haver dúvidas de que a investigação da veracidade de uma notitia criminis que lhe chegue ao conhecimento tem total pertinência com uma das mais importantes dentre as atribuições do Ministério Público, que é o exercício da titularidade da ação penal. Não é por outra razão que a Lei Complementar 75/1993, Lei Orgânica do Ministério Público da União, em seu art. 8º, V, estipula que "para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência, REALIZAR INSPEÇÕES E DILIGÊNCIAS INVESTIGATÓRIAS". Esse dispositivo, de clareza insuplantável, estabelece sem sombra de dúvida a relação meio-fim a que faz alusão o art. 129, IX, da Constituição. Dispositivo com dizeres similares é encontrado no art. 26 da Lei 8.625/1993, que disciplina a atuação dos ministérios públicos estaduais...

(...) Sr. Presidente, uma das facetas mais marcantes da jurisdição constitucional - e que a singulariza em face das outras formas de jurisdição - é o componente político que lhe é ínsito. Político, mas não no sentido vulgar, partidário, mas numa compreensão que simbolize a atividade de velar pelo bem-estar na polis, pela segurança dos cidadãos, pela paz social, em suma, pelos destinos da nação. Noutras palavras, esse componente político da jurisdição constitucional se materializa quando as cortes, deixando temporariamente de lado a dogmática chã, que não raro empobrece o debate verdadeiro das questões, toma decisões à luz da realidade político-social concreta de cada país. Anoto, de passagem, que as grandes cortes constitucionais assim procedem não sem levar em conta o papel e a imagem que os respectivos países gozam ou almejam gozar no cenário internacional. Tenho dito em algumas oportunidades que a função básica de uma corte constitucional é velar pela preservação de certos equilíbrios. Pois bem. Creio que essa visão se aplica ao presente caso. Nitidamente estamos diante de uma situação em que cabe a esta Suprema Corte estabelecer o ponto justo, o equilíbrio ideal entre, de um lado, os direitos processuais das pessoas suspeitas da prática de crime e, de outro, os interesses maiores da sociedade, a segurança da população, o interesse em preservar o patrimônio público contra a corrupção e em extirpar da cena pública os indícios de penetração do crime organizado. A Constituição de 1988, símbolo da inserção do nosso país no concerto das nações democráticas, oferece aos suspeitos da prática de crimes um rol de direitos, privilégios e prerrogativas que nos coloca em pé de igualdade com as mais sólidas democracias do planeta. Citem-se como exemplo o princípio da não-incriminação, o da reserva legal e da irretroatividade da lei penal, o da individualização da pena, o da amplitude da defesa etc. É importante assinalar que todo esse arcabouço constitucional-penal tem como primeiro objetivo a proteção do inocente. Aliás, essa proteção reforçada do inocente faz com que o sistema feche até mesmo os canais de acesso à mais segura e autêntica fonte de apuração da verdade, isto é, o acusado, que tem para protegê-lo o princípio da não-incriminação...

(...) Em suma, compelir o Ministério Público a uma postura meramente contemplativa seria, além de contrário à Constituição e ao status constitucional que essa instituição passou a ter a partir de 1988, desservir aos interesses mais elevados do país, instituir um sistema de persecução penal de fachada, incompatível com o visível amadurecimento cívico de nosso país e com a solidez das nossas instituições democráticas.

Analisando os trechos acima, elaborados pelo Ministro Joaquim Barbosa, pode-se, agora sim, perceber que, enfim, um membro da Corte Suprema deu real sentido à Constituição.

Não podem os Ministros continuar presos a valores conservadores, para não dizer políticos, no sentido vulgar, de proteção de interesses subalternos, de manutenção de status quo de setores privilegiados. O verdadeiro sentido das normas constitucionais tem que prevalecer no meio jurídico-social, sob pena de vivermos na mais plena demagogia, simulacro de democracia.

Se não forem os Ministros do S.T.F., quem vai garantir a vigência do preceituado na Lei Maior? Cabe a eles, guardiões da Carta Magna, defender a ordem constitucional.


CONCLUSÃO

Da análise do que preceitua a C.F./88, verifica-se que vige no Brasil um Estado Democrático de Direto, responsável, entre outras coisas, por proporcionar o bem comum para a sociedade, através da garantia dos direitos do cidadão comum.

Após percorrer longa caminhada, o Ministério Público adquiriu bastante força com a promulgação do C.F./88, pois, dotado de grande dose de autonomia, viu-se livre para defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis. O Parquet desligou-se do Poder Executivo, ao qual sempre foi fortemente vinculado, sendo disciplinado em um momento próprio dentro da Lei Maior, exatamente no capítulo intitulado por " Das Funções Essenciais à Justiça".

Assim, resumidamente, entendendo que vige no Brasil um Estado Democrático de Direito e que o M.P. é um Órgão amplamente comprometido na defesa desse Estado, compreende-se de uma forma muito nítida que sua atuação é voltada para garantir essa defesa.

Desde o início da vigência da Carta Magna, o Órgão Ministerial exerceu suas funções, porém, a partir do momento em que passou a incomodar determinados setores da sociedade, representantes desses começaram a tentar tolher sua atuação, buscando, para isso, os mais variados argumentos. Convocado a tutelar direitos, a sociedade reclamou o agir de Procuradores e Promotores de Justiça em todo o território nacional e, aos poucos, mesmo a despeito de precários mecanismos processuais, foi sendo aprimorada a atuação do Ministério Público. Nunca se experimentou, no país, tanto trabalho nas áreas de defesa da moralidade administrativa, na tutela da ordem tributária, no combate às mais diversas formas de exploração contra usuários de serviços públicos e privados e espoliação do erário, enfim, nunca tantos foram incomodados em tão pouco tempo.

O que se extrai das alegações contrárias à atuação do M.P. nas investigações criminais são: falta de permissão legal e exclusividade da polícia judiciária para tal desiderato. Porém, conforme explanado no presente trabalho, tanto a C.F./88 quanto às normas infraconstitucionais (L.C. 75-93, Lei nº 8.625 e C.P.P.) autorizam o M.P. para prática de investigação criminal. Além de que, restou sobejamente comprovada a ausência de exclusividade da polícia no tocante ao tema.

Além da permissão constitucional e legal, vários outros argumentos vêm apenas para comprovar com maior evidência a importância da atuação ministerial quando das investigações de delitos. A garantia da inamovibilidade pode ser suscitada como crucial para a investigação ministerial, além da dispensabilidade do Inquérito Policial, do entendimento do Parquet como parte meramente formal e da análise do direito comparado, pois se verifica que em muitos países que adotam o mesmo sistema penal do Brasil, o M.P. tem poder para investigar ilícitos penais.

O S.T.F. é considerado o tribunal responsável, notadamente, pela defesa da Constituição Brasileira. Composto por bacharéis de notável saber jurídico, cabe a ele a responsabilidade de zelar para que nenhuma lei afronte a Lei Maior, posicionando-se sempre de acordo com o que preceitua a Carta Magna. Porém, após detida análise do R.H.C. 81.326-DF, compreende-se, data venia, que o S.T.F., representado por sua 2ª Turma, não conferiu o verdadeiro sentido ao preceituado pela C.F./88. Baseando-se em método histórico, o Ministro Nelson Jobim pronunciou-se contra a atuação do Ministério Público em investigações criminais.

Além da fragilidade do método adotado – histórico –, encontram-se nos julgados da Corta Suprema, tanto anteriores, quanto posteriores ao R.H.C. 81.326-DF, posicionamentos favoráveis ao exercício investigativo por parte do M.P., o que se leva a crer ser esse Tribunal de cunho eminentemente político, na acepção vulgar, frise-se, não raro descomprometido com a segurança dos cidadãos e o futuro da sociedade brasileira.

Após conclusão do presente trabalho, outra coisa não me vem a mente: Por que tolher a atuação do Ministério Público? Que mal sua atuação poderá gerar para sociedade? E, ao mesmo tempo, a única resposta que encontro é: o M.P. tem incomodado demais!

Limitar o poder de ação do Ministério Público constitui garantia aos corruptos espoliadores da nação – espécie de criminoso ainda pouco selecionado pelo sistema penal em todo o mundo – de não serem molestados. Mitigar as prerrogativas funcionais dispostas na Carta Política implica reduzir suas possibilidades de atuação, configurando-se um retrocesso, com o retorno ao modelo do Ministério Público como instância absolutamente conseqüente dependente da atividade policial.

Não há qualquer regra, óbice, ou, sobretudo, princípio jurídico no direito brasileiro que impeça os membros do Ministério Público de promover diretamente diligências investigatórias. Não existe risco para os direitos fundamentais. Esse é, inclusive, o dever da Instituição que dele tem se desincumbido com louvor, sendo em grande parte responsável por apurações exitosas que vão aos poucos diminuindo a impunidade no país.

Não é o homem comum, o pobre cidadão brasileiro, que, em regra, é objeto das investigações criminais diretas do Ministério Público por todo o país. Nesses apuratórios, quase sempre são homens poderosos que ocupam o posto de suspeitos e depois o banco dos réus, como antes não se via. Esses, sim, é que se ressentem da intransigência do Ministério Público na defesa da ordem jurídica e da punição severa para os que violam a lei penal, sem distinção de classes. Para o cidadão comum, o que importa é que a lei valha para todos, e não quem investiga, se a polícia ou o Ministério Público.

O movimento supostamente democrático das entidades incomodadas não pode prosperar, no sentido de minimizar a atuação do M.P., seu ‘‘inimigo público número 1".

Óbvio que não pode prevalecer no meio jurídico o entendimento de que o Parquet não possui legitimidade para investigar, pois são objetivos ocultos, por detrás da inacreditável alegação de que o Ministério Público é o responsável por violações aos direitos fundamentais dos investigados e acusados, que dão força a esta idéia.

Não querem os autoproclamados arautos da democracia proteger o interesse público, a segurança e o bem-estar dos cidadãos, mas sim seus interesses pessoais. Não querem a punição de corruptos, mas a impunidade para seus crimes. Querem apenas, como defensores de criminosos de ‘‘colarinho branco’’, advogar o interesse de seus próprios clientes!


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LIVROS:

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2004.

KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1997.

MORAES, Alexandre de Moraes. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2001.

RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pela Ministério Público: visão crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.

STRECK, Lenio. Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 1ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

VIEIRA, Luiz Guilherme. O Ministério Público e a Investigação Criminal. Rio de Janeiro: Rabaço, 2004.

MONOGRAFIAS:

MARTINS NETO, Alfredo. Pinheiro. O papel do Ministério Público na Investigação Criminal. Monografia (Pós-Graduação em Ciências Criminais) – Faculdade de Direito. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2004.


Notas

01 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 1-7.

02 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 91-105.

03 Gabriel de Rezende Filho, Amaral Santos, Sérgio de Andréa, Cappelletti e Jolowicz e Vellani.

04 MORAES, Alexandre de. Direto Constitucional. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 490.

05 MORAES, Alexandre de. Direto Constitucional, Op. cit. p. 503.

6 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 23.

07 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 53-55.

08 Cumpre destacar o art. 29, §3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que estabelece que o membro do M.P. admitido antes da promulgação da C.F./88 pode optar pelo regime anterior, no tocante às garantias e vantagens, observando-se, quanto às vedações, a situação jurídica na data da promulgação da Lei Maior.

09 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público.Op. cit. p. 12.

10 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 255.

11 STRECK, Lenio Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 1ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 16-17.

12 Pode-se entender por justiça social, o ideal preconizado nas Constituições contemporâneas do mundo que prima pela defesa dos direitos fundamentais-sociais do homem.

13 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit. p. 119.

14 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p. 10.

15 Idem, p. 14.

16 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 12.

17 STRECK, Lenio Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Op. cit. p. 4-6.

18 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op.cit. p. 115-116.

19 Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

(...)

IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

20 Sobre isso, conferir o explanado no nota 8.

21 L.C. 75/93

Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:

(...)

V – realizar inspeções e diligências investigatórias;

(...)

22 C.F./88

Art. 128. (omissis)

(...)

§5º Leis Complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:

(...)

23 LUFT, C. P. Minidicionário Luft. 10 ed. São Paulo: Ática 1995.

24 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. Cit. p. 190.

25 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 154.

26 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 152.

27 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p. 65-68.

28 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit. p. 147.

29 Lê-se na própria página-web do órgão que: "O COAF é o órgão do Governo responsável pela coordenação de ações voltadas ao combate à ‘lavagem’ de dinheiro e pelo recebimento das Comunicações de Operações Suspeitas, obrigatórias às pessoas citadas no art. 9º da Lei nº 9.613" (www.fazenda.gov.br/coaf).

30 Dispõe a CF/88 que, por motivo de interesse público e mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de seus membros, além de assegurada a ampla defesa, a garantia da inamovibilidade poderá sofrer exceção.

31 Extrai-se o seguinte de reportagem jornalística: "... a prisão do publicitário Duda Mendonça em uma rinha de galo no mês de outubro, no Rio de Janeiro, reacende as discussões sobre crueldades contra animais. No dia 21 de outubro deste ano, o publicitário e coordenador de campanha do PT, Duda Mendonça, e o vereador Jorge Babu (PT), foram presos em flagrante com quase 200 outros envolvidos em brigas de galo, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro... Desde a prisão de Duda Mendonça, dois agentes da Polícia Federal, que prenderam os envolvidos, foram transferidos de suas funções de maneira duvidosa e saíram da delegacia em que trabalhavam. A Delegacia Executiva (DEREX) se afinou e não transferiu os policiais para Campos e Macaé, no interior de RJ. Aliás, um deles está afastado para cuidar da saúde até hoje. A única punição até agora foi a expulsão de Babu do PT, no começo deste mês.

Em meados do mês, a promotora do caso ofereceu denúncia contra Duda e outros rinheiros envolvidos, nos crimes de formação de quadrilha, apologia ao crime e crime ambiental de maus-tratos contra animais.

O Juiz Joel Pereira dos Santos aceitou a denúncia contra Duda Mendonça, Jorge Babu (sem partido) e outros 4 empresários envolvidos...

O último desdobramento do caso surpreendeu a todos. No dia 20/12, o delegado titular da Policia Federal do Meio Ambiente no Rio de Janeiro, Dr. Antônio Rayol, que comandou a prisão de Duda Mendonça, foi dispensado do cargo pelo diretor da Polícia Federal.

Este fato reforça a suspeita do movimento de proteção animal de que haja pressões internas na Polícia Federal para abafar o caso. Justamente quando se imaginava que a justiça seria feita, acontece um descaso desse tipo." (ARCA BRASIL. Galogate. Caso Duda Mendonça. Disponível em: http://www.arcabrasil.org.br/galogate.htm. Acesso em: 12 fev 2005.)

32 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p. 53.

33 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p. 213.

34 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit. p. 165-166.

35 Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

36 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p.190.

37 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit. p. 189.

38 MARTINS NETO, Alfredo. Pinheiro. O papel do Ministério Público na Investigação Criminal. Monografia (Pós-Graduação em Ciências Criminais) – Faculdade de Direito. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2004.

39 KAC, Marcos, O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar.Op. cit. p. 166.

40 KAC, Marcos, O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar.Op. cit. p. 166.

41 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit p. 183.

42 KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit. p. 213-214.

43 SIMAS FILHO, Mário. O PT mudou. IstoÉ, nº 1797, p. 7-11, 17 março/2004.

44 STRECK, Lenio Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Op. cit. p. 112.

45 MARQUES, José. Frederico., apud Kac, Marcos, O Ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Op. cit, p. 160.

46 MAZZILLI, Hugo. Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. p. 159.

47 RHC 81.326-DF: EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE. 1. PORTARIA. PUBLICIDADE A Portaria que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial no âmbito do Ministério Público do Distrito Federal, no que tange a publicidade, não foi examinada no STJ. Enfrentar a matéria neste Tribunal ensejaria supressão de instância. Precedentes. 2. INQUIRIÇÃO DE AUTORIDADE ADMINSITRATIVA. ILEGITIMIDADE. A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar a presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido.

48 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 81.326-DF. Recorrente: Marco Aurélio Vergílio de Souza. Recorrido: Ministério Público Federal. Relator: Ministro Nelson Jobim. Brasília, 6 de maio de 2003. Disponível em: http://www.stf.gov.br/Jurisprudencia/. Acesso em: 13 de abril de 2005.

49 STRECK, Lenio Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Op. cit. p. 63-78.

50 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público: visão crítica. Op. cit. p. 237.

51 STRECK, Lenio Luiz.; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Op. cit. p. 105-107.

52 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito nº 1968. Autor: Ministério Público Federal. Indiciados: Remy Abreu Trinta, Maria José Abreu Trinta e Diomar Bezerra Lima. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasilía, DF, 13 de abril de 2004. Disponível em: http:// www. stf. gov. br/Jurisprudencia/. Acesso em: 13 de abril de 2005.

53 Todos esses exemplos foram extraídos da obra de Lenio Luiz Streck e Luciano Feldens (Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 1ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003), às páginas 102-103


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREIRE, Paula Roberta Pereira. Do poder investigatório do Ministério Público. Contradições do RHC 81.326-DF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1762, 28 abr. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11207. Acesso em: 5 maio 2024.