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Controle jurisdicional do processo disciplinar

Controle jurisdicional do processo disciplinar

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O processo disciplinar instaurado em face dos servidores públicos e dos parlamentares não está, assim como tantos outros atos estatais, imune à revisão jurisdicional.

RESUMO

A importância da pesquisa acerca do tema - Controle Jurisdicional do Processo Disciplinar - reside em apreciar a revisão judicial sobre os procedimentos e atos da administração pública que visem a aplicar sanções de natureza estatutária e política aos servidores públicos e aos parlamentares, respectivamente, considerando, para tanto, as novas vertentes do princípio da legalidade, a adoção do Estado de Direito e a garantia de acesso à justiça. O que se pretende com este trabalho é demonstrar a viabilidade do amplo controle jurisdicional dos processos de natureza disciplinar que são instaurados em desfavor dos servidores públicos civis da União e dos parlamentares do Congresso Nacional (deputados e senadores), tendo em vista a necessidade de se valorizar os preceitos de ordem constitucional, sobretudo, os de hierarquia principiológica, além do que o referido controle não acarreta prejuízos ao princípio da separação dos poderes, que permanece incólume, pois apenas promove a efetividade do ordenamento jurídico.

Palavras-chave: Processo Disciplinar. Controle Jurisdicional. Cabimento.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 LINHAS GERAIS ACERCA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DO CONTROLE JURISDICIONAL. 1.1 A Administração Pública no Estado de Direito. 1.2 O regime jurídico da Administração Pública. 1.2.1 Fundamentos. 1.2.2 A proeminência da Constituição Federal. 1.2.3 Dos atos administrativos. 1.3 O controle jurisdicional dos atos administrativos. 1.3.1 Hipóteses. 1.3.2 Os atos administrativos discricionários. 2 O PROCESSO DISCIPLINAR. 2.1 O processo disciplinar por falta funcional. 2.1.1 Conceito. 2.1.2 Fundamentos. 2.1.3 Princípios e modalidades. 2.1.4 Etapas. 2.2 O processo disciplinar por conduta ofensiva ao decoro parlamentar . .2.1 Conceito .2.2.2 As modalidades de condutas ofensivas ao decoro parlamentar. 2.2.3 Das conseqüências da conduta indecorosa . 3 O CABIMENTO DO CONTROLE JURISDICIONAL DO PROCESSO DISCIPLINAR. 3.1 Dos argumentos contrários ao controle jurisdicional do processo disciplinar. 3.1.1 Da ofensa à separação dos poderes. 3.1.2 Da intangibilidade do mérito do ato discricionário. 3.1.3 Da natureza política do ato. 3.2 Dos argumentos favoráveis ao controle jurisdicional do processo disciplinar. 3.2.1 Da autonomia entre as instâncias e do acesso à Justiça. 3.2.2 Da existência de uma razoável tipificação das condutas. 3.2.3 Da proteção aos direitos subjetivos. CONCLUSÃO . REFERÊNCIAS. APÊNDICE.


INTRODUÇÃO

A partir da decadência dos regimes monárquico-absolutistas, notadamente da Revolução Francesa, em 1789, que constitui o marco histórico delimitador do fim da Idade Moderna e início da Era Contemporânea, o Estado Democrático de Direito deixou de ser uma utópica aspiração das nações para tornar-se realidade, sendo essa ruptura política fundamentada basicamente nos ideais humanitários e liberais, em alta na época, pregada pelos filósofos iluministas.

Desde então, seja nas monarquias parlamentaristas, seja nas repúblicas presidencialistas, a idéia de submeter todos os membros da coletividade ao ordenamento jurídico nacional, fundado numa Constituição, passou a aplicar-se também ao Estado. Assim, foram estabelecidos direitos e garantias individuais e coletivas em prol dos cidadãos oponíveis ao próprio Estado – isso sem prejuízo da sua aplicação nas relações privadas – tais como o direito à vida, à propriedade, à segurança, ao julgamento justo perante o juízo natural, ao devido processo legal e à ampla defesa, à inviolabilidade do lar, da vida privada e da intimidade das pessoas, dentre outros.

Como a característica principal dos Estados de Direito é sua submissão à Constituição e às Leis, o princípio da legalidade e o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional se mostram os pilares de sustentação desse regime democrático, pois deles dependem a maioria dos demais. Nesse aspecto, representam simultaneamente uma garantia dos cidadãos contra abusos eventualmente praticados pelo Estado e pelas entidades que o compõem e um direito à reparação pelos possíveis danos que este venha a causar-lhes ao exercer sua atividade.

Sabido que o Estado, sendo uma ficção jurídica, não atua senão por intermédio da conduta de seus agentes (servidores públicos e agentes políticos), esses sujeitos podem vir a praticar atos incompatíveis com as normas vigentes, podendo e devendo, por isso, serem-lhes aplicadas as sanções previamente cominadas pelo ordenamento estatal.

Porém, ao exercer o poder disciplinar sobre seus funcionários, o Estado estará irremediavelmente jungido ao princípio da legalidade, isto é, deverá limitar-se a aplicar a sanção cabível, que seja compatível e proporcional ao desvio cometido, observando as regras e os princípios do direito, notadamente a ampla defesa e o devido processo legal, sob pena de ter sua decisão punitiva revista e reformada pela intervenção do Poder Judiciário, caso seja provocado a se manifestar por impulso do sujeito lesado.

Assim, embora o Estado detenha a prerrogativa de disciplinar internamente os seus servidores e as demais pessoas sujeitas ao regime jurídico de direito público, aplicando aos faltosos a sanção que entender conveniente e bastante dentre aquelas existentes, a verdade é que essa punição deve ser pautada pela legalidade, conceito atualmente entendido não mais como a estrita observância ao direito positivo, mas também aos princípios constitucionais e administrativos explícitos e implícitos.

Sob esse prisma, o estudo do controle jurisdicional dos atos administrativos, embora ainda seja um tema nebuloso e intrincado, é apaixonante e extremamente recompensador, sobretudo quando descemos à minúcia de analisar especificamente a possibilidade de revisão dos processos disciplinares.

À guisa de exemplo, são freqüentes os casos de servidores públicos sancionados a revelia da legalidade, às vezes, de forma imotivada, noutras sem a observância mínima dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, o que enseja a propositura das mais diversas ações judiciais pelos agentes prejudicados, em que pleiteiam a cessação da arbitrariedade.

É comum vermos notícias veiculadas pela mídia informando a atuação do Poder Judiciário no âmbito do processo disciplinar, notadamente, nos casos em que servidores são acusados de crimes e expulsos da Administração, após sumário e superficial procedimento disciplinar, sendo, contudo, posteriormente, readmitidos por decisão judicial em virtude da absolvição na instância criminal. Assim, Juízes e Tribunais ora têm concedido ordem suspensiva do feito administrativo ainda em curso, ora decisão declaratória de nulidade do ato disciplinar e, às vezes, até mesmo mandado judicial de reintegração, assegurando ao servidor demitido o retorno ao cargo que ocupava.

Isso é possível graças à adoção do Estado de Direito e ao expresso acolhimento do princípio da legalidade, sem prejuízo dos demais, pela Constituição Federal, o que possibilita o controle jurisdicional dos atos administrativos. A própria Carta Magna assegura a possibilidade de revisão do processo disciplinar pelo Poder Judiciário, estabelecendo que o servidor público estável só perderá o cargo ou em virtude de sentença judicial transitada em julgado, ou mediante processo administrativo em que lhe seja facultado defender-se amplamente, ou ainda mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma da lei complementar.

No que tange ao controle jurisdicional da decisão que proscreve o mandato eletivo dos membros do Congresso Nacional, embora o Pretório Excelso já tenha se manifestado negativamente quanto a sua admissibilidade, fê-lo utilizando-se do argumento de que tal ato seria de natureza política e discricionária, insuscetível, portanto, de apreciação judicial.

Contudo, é fundamental não generalizarmos esse entendimento. A Suprema Corte, na verdade, deveria fazer uma análise pontual de cada caso submetido a sua apreciação, pois, do contrário, estaria consagrando o autoritarismo e sufragando cassações de mandato totalmente descabidas que, no fundo, têm como justificativa meras desavenças políticas ou ideológicas. Se continuar a prevalecer esse entendimento genérico do STF, toda decisão daquele jaez seria de natureza política e discricionária, inabalável, portanto, em face de apreciação judicial, o que seria, aí sim, ofensa ao princípio da separação e autonomia dos poderes.

Como se vê, a análise dos atos administrativos de natureza disciplinar aplicáveis pela Administração aos seus servidores e agentes, bem como sua sujeição a revisão pelo Poder Judiciário, é tema atual e pululante na doutrina e jurisprudência.

Fincadas essas premissas, buscar-se-á desenvolver pesquisa monográfica que responda os seguintes questionamentos: se o controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar instaurado contra servidores públicos importa em ofensa ao princípio da separação dos poderes; se a autoridade incumbida de sancionar o servidor faltoso está vinculada à conclusão e aos fatos apurados no processo disciplinar, sendo-lhe aplicável a Teoria dos Motivos Determinantes; e finalmente se a perda do mandato eletivo dos membros do Congresso Nacional, sob o fundamento de conduta incompatível com o decoro parlamentar, é passível de controle judicial perante o Supremo Tribunal Federal.

Quanto aos aspectos metodológicos, as hipóteses levantadas foram investigadas através de pesquisa bibliográfica. No tocante à tipologia da pesquisa, esta, segundo o emprego dos resultados, é pura, uma vez que é realizada unicamente com o intuito de aumentar o conhecimento, sem transformar a realidade. No que se refere à abordagem, é quantitativa, através da pesquisa de fatos e de dados objetivos, e qualitativa, com a observação das ações, relações, e situações sociais pertinentes. Quanto aos objetivos, a pesquisa é exploratória, uma vez que procurará aprimorar idéias, buscando maiores informações sobre o tema em foco, e descritiva, posto que buscou descrever, explicar, classificar, esclarecer e interpretar o fenômeno observado.

Tendo por base os objetivos apontados e, de acordo com o método utilizado, o desenvolvimento deste estudo foi executado em três capítulos para que, ao final, apresentássemos a opinião que se entendeu mais adequada para o caso em testilha.

No primeiro será abordado o regime jurídico ao qual a Administração Pública se encontra submetida, fazendo-se uma análise das normas constitucionais e legais, bem como dos atos administrativos e seus elementos, requisitos e atributos, que o ente estatal emite visando à persecução do interesse público. Destacar-se-á os aspectos gerais do controle jurisdicional e seu manejo como instrumento de garantia dos direitos fundamentais em face da Administração Pública, seu desenho em nosso atual Estado de Direito e a atuação do Poder Judiciário como ente garantidor do ordenamento jurídico.

Será mencionada também a questão do controle jurisdicional dos atos administrativos, feito genericamente com fulcro nos princípios constitucionais e administrativos, notadamente a legalidade, a inafastabilidade da jurisdição e a segurança jurídica, destacando-se seu dever de observância, não só da literalidade da lei, mas também da compatibilidade do ato com o sistema jurídico, o que vale inclusive para os atos discricionários.

Apontados esses lineamentos gerais sobre a atividade administrativa e o controle jurisdicional do Estado, com destaque para a ampliação da esfera de conhecimento do Poder Judiciário sobre os atos administrativos, passa-se a averiguar os aspectos concernentes ao processo disciplinar, dentre os quais seu conceito, natureza, fundamento, princípios, modalidades, forma de desenvolvimento e aplicabilidade da decisão sancionatória, além das nuanças do procedimento disciplinar em face dos servidores públicos civis federais e dos congressistas, estes quando acusados de praticarem conduta incompatível com o decoro parlamentar.

Estabelecidas essas considerações, que serão apresentadas, respectivamente, nos dois primeiros capítulos, foi então discutido o cabimento ou não, e se amplo ou restrito, do controle jurisdicional do processo disciplinar, o que foi feito no terceiro capítulo e em duas partes.

Na primeira foi enfocado o processo disciplinar propriamente dito, que é aquele instaurado contra os servidores públicos federais, e na segunda abordou-se o controle jurisdicional do procedimento, de natureza disciplinar, que visa a apurar a prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar por parte dos congressistas federais (deputados e senadores). Em ambos foram levantados posicionamentos a favor e contra o cabimento do controle jurisdicional.

Por fim, ante os argumentos que foram desenvolvidos no transcurso desse estudo, apresentou-se o entendimento que pensamos ser o mais condigno e eficaz para tutelar os direitos individuais dos sujeitos processados e da sociedade, conforme num ou noutro sentido reste comprovado a prática do desvio funcional, com ênfase no apontado pela doutrina e pela jurisprudência mais recente, segundo os princípios da dignidade da pessoa humana, da legalidade, da garantia da jurisdição, da segurança jurídica, da razoabilidade e da proporcionalidade.


1 LINHAS GERAIS ACERCA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DO CONTROLE JURISDICIONAL

O Estado, como atualmente o conhecemos, foi concebido limitado em seu início, uma vez que fora constituído somente para proporcionar segurança e proteção à propriedade privada e à integridade física daquelas pessoas que o compunham, restringindo-se a manter a paz e o status quo através do combate às invasões estrangeiras. Assim evoluiu, a titularidade do poder mudou de mãos – do monarca para o povo – e o Estado foi do feudalismo ao absolutismo monárquico, daí ao liberalismo e ao socialismo, chegando ao modelo social-democrata hodierno.

Veio o constitucionalismo e o reconhecimento de direitos fundamentais aos cidadãos, assim como a tripartição das funções ou "poderes" estatais, isto é, as prerrogativas de administrar, legislar e julgar, antes concentradas em uma única pessoa ou instituição, passaram a ser conferidas a entidades distintas, que são os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, incumbindo ao primeiro a administração pública, ao segundo a elaboração das leis e ao terceiro assegurar o cumprimento delas. A partir de então surgiram os Estados Democráticos de Direito, que conforme o caput do art. 1º da Constituição Federal é o modelo de poder sobre o qual o Brasil se encontra atualmente estruturado.

Contudo, embora as funções estatais devam ser exercidas de forma independente e harmônica por cada Poder, com estrita obediência à Constituição e às leis, isso nem sempre ocorre. Muitas vezes a arbitrariedade e a violação a direitos individuais cometida por um Poder deságua e reflete noutro. Nesse ponto se destaca o Poder Judiciário e a função jurisdicional como o último refúgio do cidadão injustiçado. Assim, a jurisdição estatal consiste em aplicar aos conflitos intersubjetivos que afloram na sociedade as normas do ordenamento jurídico, visando com isso solucioná-los através da proclamação de uma determinada decisão, que será, de regra, definitiva.

Sob esse aspecto, ao nos constituirmos sob a forma de Estado Democrático de Direito, devemos ter em mente sua principal característica, que é a submissão do próprio Estado ao ordenamento jurídico pátrio, ao qual estão igualmente sujeitos os demais membros da coletividade, cuja base é a Constituição Federal. Nesse modelo, não há privilégios nem exceções de qualquer sorte, a não ser as prerrogativas funcionais e institucionais asseguradas constitucionalmente. Dessa forma, tanto os cidadãos, quanto o próprio Estado estão sujeitos ao império da lei.

1.1 A Administração Pública no Estado de Direito

O atual estágio de evolução sócio-político fez com que adotássemos o Estado Democrático de Direito quanto à forma de constituição, consoante se depreende do caput do art. 1º da CF, cujo modo de governo escolhido é o presidencialismo republicano. Aqui a Administração Pública, ao invés do que se dava nas monarquias absolutistas – onde sua atividade era "legitimamente desregrada" – tem sua atuação "legalmente definida", conforme parâmetros normativos pré-estabelecidos.

Nesse sentido, distingue-se o vetusto Estado de Polícia do atual Estado de Direito, conforme ensina Merkl (1980, p. 92-93) apud Maria Sylvia Zanella di Pietro (2001, p.17-18):

A primeira etapa do Estado moderno é conhecida como Estado de Polícia, em que a forma de Governo adotada é a monarquia absoluta. A segunda etapa corresponde ao surgimento do Estado de Direito. [...] A oposição, mais corrente, entre Estado de Polícia e Estado de Direito representa, igualmente, dois tipos de administração, cuja diferença reside na relação que guarda a administração com o campo funcional que dela se destaca. [...] O Estado de Polícia se apresenta como aquele Estado cuja administração se acha legalmente incondicionada, enquanto o Estado de Direito oferece uma administração condicionada legalmente. (grifo nosso)

Segundo José Afonso da Silva (2006, p.114) a submissão do Estado ao Poder Judiciário é elemento fundamental num Estado de Direito, asseverando o renomado constitucionalista que "Estado submetido ao juiz é Estado cujos atos legislativos, executivos, administrativos e também judiciais ficam sujeitos ao controle jurisdicional no que tange à legitimidade constitucional e legal".

Desse modo, serão sindicáveis perante o Poder Judiciário, não só a atuação abusiva dos particulares e os conflitos entre estes, mas também todas as desavenças surgidas entre aqueles e o próprio Estado, corporificado pela Administração Pública.

Esse entendimento é confirmado pelo disposto nos arts. 5°, incs. II e XXXV, e 37, caput, da CF, que trazem, respectivamente, os postulados da inafastabilidade da garantia jurisdicional e o princípio da legalidade, aplicáveis tanto aos jurisdicionados, quanto à Administração Pública.

Ressalta-se que, quando nos referimos à Administração Pública, consideramos aqui a sua forma subjetiva, a qual, segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro (2001, p. 19), consiste naquele "conjunto de pessoas e órgãos que exercem a função administrativa do Estado", pois embora o Poder Executivo seja por excelência aquele que se ocupa precipuamente da atividade administrativa, esta não lhe é exclusiva, mas típica, pois tanto o Poder Legislativo quanto o Judiciário a exercem de forma atípica, ao lado das suas funções institucionais de normatizar e julgar, respectivamente. Estes o fazem sempre que praticam atos de natureza administrativa, isto é, quando, por exemplo, contratam um serviço através de licitação, quando nomeiam seus funcionários ou os demitem, etc.

Da Administração Pública, interessa-nos, particularmente, a sua atuação concreta, pois quando o administrador público age e exerce suas funções, não o faz desgarrado de qualquer parâmetro, mas de acordo com o princípio da legalidade, ou seja, atua com estrita observância à Constituição e às Leis. Isso significa que não lhe foi conferido vontade ou margem de escolha entre esta ou aquela conduta, pois sua atividade já é previamente pautada em lei. Hely Lopes Meirelles (2003, p. 86) tece os seguintes comentários a respeito desse princípio:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. [...] A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimento da Lei e do Direito. [...] Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa "poder fazer assim"; para o administrador público significa "dever fazer assim". (grifo nosso)

Sob esse aspecto, embora a Administração Pública sempre busque a perfeição e a eficiência na satisfação do interesse coletivo, especializando-se cada vez mais nas diversas áreas de sua incumbência, não poderá olvidar que sua atividade deverá ser exercida com estrita observância à legalidade, que no Estado de Direito é mais que o simples cumprimento da lei.

1.2 O regime jurídico da administração pública

A atividade administrativa do Estado está embasada no princípio da legalidade, conforme mencionado anteriormente, pois é ele que a legitima, sendo ambos objeto de estudo, tanto do direito administrativo, como do direito constitucional, em face da interação das matérias. Em conseqüência, nesse ponto, far-se-á menção aos fundamentos da atividade administrativa e às principais normas e dispositivos que tratam da Administração Pública, conforme se passa a detalhar.

1.2.1 Fundamentos

Os principais fundamentos que legitimam a atividade administrativa do Estado são a supremacia do interesse público sobre privado e a sua indisponibilidade por parte da Administração. Disso resulta que toda a atividade estatal há de ser executada com base nesses postulados.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2006) atribui especial importância a esses dois princípios, afirmando que não devem ser analisados em si mesmos, de forma isolada, mas sim de acordo com suas repercussões no ordenamento jurídico, pois seriam o fundamento da construção de todo o sistema de Direito Administrativo.

Explica-se o destaque da doutrina administrativista a esses princípios, pelo fato da Administração Pública sempre buscar satisfazer o bem coletivo, entendido como a prática de condutas por parte do administrador para conseguir aquilo que mais proveito traga à comunidade, além de ter o dever de zelar e bem gerir o patrimônio público, já que pertencente a toda sociedade. Aliás, o próprio termo "administrar" pressupõe alguém incumbido de bem e fielmente conduzir as "coisas" ou os negócios de terceiros, no caso a sociedade.

1.2.2 A proeminência da Constituição Federal

É sabido que a Constituição Federal é a norma suprema e incontestável num Estado Democrático de Direito, tal qual o nosso. Sua supremacia e sua rigidez são pressupostos da legitimidade estatal e que possibilitam ao Poder Judiciário, na qualidade de instituição encarregada de preservar a ordem jurídica, exercer o controle dos atos administrativos, legislativos e jurisdicionais praticados no exercício da atividade pública.

Considerando esses aspectos da Constituição, a Administração Pública, uma vez submetida ao princípio da legalidade, deve, sem dúvida, observar o mandamento legal das normas infraconstitucionais, mas deve, também, e, principalmente, fazê-lo com relação à CF, dada sua superioridade hierárquica e sua rigidez normativa.

Isso posto, o jurista Paulo Bonavides tece os seguintes comentários (2000, p. 267):

O sistema das Constituições rígidas assenta numa distinção primacial entre poder constituinte e poderes constituídos. Disso resulta a superioridade da lei constitucional, obra do poder constituinte, sobre a lei ordinária, simples ato do poder constituído, um poder inferior, de competência limitada pela Constituição mesma. As constituições rígidas, sendo constituições em sentido formal, demandam um processo especial de revisão. Esse processo lhes confere estabilidade ou rigidez bem superior àquela que as leis ordinárias desfrutam. Daqui procede pois a supremacia incontrastável da lei constitucional sobre as demais regras de direito vigente num determinado ordenamento. Compõe-se assim uma hierarquia jurídica, que se estende da norma constitucional às normas inferiores (leis, decretos-leis, regulamentos etc.), e a que corresponde por igual uma hierarquia de órgãos.A conseqüência dessa hierarquia é o reconhecimento da superlegalidade constitucional, que faz da Constituição a lei das leis, a lex legum, ou seja, a mais alta expressão jurídica da soberania.

Tais considerações demonstram que a Administração Pública não poderá desvencilhar-se de cumprir, quer os postulados legais, quer as normas traçadas constitucionalmente, sobretudo aqueles que se lhe aplicam de forma imediata, e que constam nos arts. 37 e seguintes da Carta Magna, pois, conforme afirma a já citada administrativista Maria Sylvia Zanella di Pietro (2001, p. 62), se é sabido que o direito administrativo é essencialmente legislado, é assente também que grande parte de seus institutos encontram embasamento na CF, arrematando a autora nos seguintes termos:

[...] É o que ocorre com a matéria de princípios, de intervenção na propriedade, de licitação e contratos, concessão e permissão de serviços públicos, de empresas estatais, de servidor público, de serviço público, de controle. Poucas são as matérias do direito administrativo que não encontram seu fundamento e seus limites na própria Constituição. (grifo nosso)

Essas considerações nos levam a concluir que a observância da CF e de seus princípios, além das regras legais positivadas, deve ser feita de forma inquestionável por parte da Administração Pública, pois se é possível suscitar eventual alegação de inconstitucionalidade da lei, o mesmo não será possível em face das normas constitucionais. Caso contrário, poderá o Poder Judiciário ser chamado à tona para dirimir a controvérsia instalada, restaurando a ordem jurídica violada pela atividade ilegítima do Estado.

Nesse contexto, apresentam peculiar importância os dispositivos da CF que se referem diretamente à atividade administrativa do Estado, que se encontram arranjados no Título III, Capítulo VII da Carta Magna. Contudo, como o tema aqui em estudo restringiu-se a analisar o controle jurisdicional da atividade administrativa do Estado na aplicação de sanções aos servidores públicos federais e aos parlamentares do Congresso nacional, é razoável a menção, entre aqueles comandos, somente aos que mais intimamente lhes dizem respeito, considerando o trinômio Estado Administração - Servidor Público - Parlamentar, já que os demais, além de aplicáveis só reflexamente, são elucidáveis e compreensíveis a partir de uma singela leitura.

Feita essa premissa, destacam-se as disposições do art. 37 da CF, com a redação dada pela Emenda Constitucional (EC) nº 19/98, os arts. 39 a 41, que se referem aos servidores públicos, bem como os arts. 53 a 56, onde se encontra o "estatuto dos congressistas". No âmbito infraconstitucional, destaca-se a lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União.

1.2.3 Dos atos administrativos

O Poder Legislativo, ao exercer sua função típica, emite atos legiferantes; o Poder Judiciário, por sua vez, faz uso dos atos jurisdicionais, tais como despachos, sentenças, acórdãos, etc.; o Poder Executivo, que exerce a atividade administrativa por excelência, por fim, lança atos administrativos para cumprir seu desiderato. Esses últimos se caracterizam por serem emanações concretas do Poder Público que, agindo nessa qualidade, produz efeitos imediatos, estando sujeito ao regime jurídico de direito público e ao posterior controle jurisdicional.

Os atos administrativos, conforme o clássico ensinamento de M. Seabra Fagundes (1979, p. 26), ainda são "aqueles através dos quais o Estado determina situações jurídicas individuais ou concorre para a sua formação". Para que a sua constituição se dê de forma válida, esses atos devem ostentar determinados requisitos, sem os quais estarão fadados à ilegalidade. São eles: I – a competência, que é a parcela de poder outorgada por lei ao agente da administração para que pratique e exerça regularmente suas funções; II – a finalidade, ou seja, o alvo do ato deve ser a satisfação do interesse público, que, na maioria dos casos, já vem indicado pela norma; III – a forma, que consiste no revestimento externo do próprio ato, no modo como ele se manifestará; IV – o motivo, isto é, a causa, a razão, o intuito, as circunstâncias fáticas ou jurídicas que levaram a autoridade a praticar o ato; e, por fim, V – o objeto, pois como os atos administrativos visam adquirir, resguardar, transferir ou modificar direitos para satisfazer o interesse público, seu objeto ou conteúdo é, segundo ensina Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 216), "o efeito jurídico imediato que o ato produz".

Caso o ato administrativo preencha esses requisitos, gozará das prerrogativas que o fazem peculiar e os distinguem dos demais atos jurídicos em geral. Tais predicados são os atributos do ato administrativo, e são de três ordens: a) presunção de legitimidade e veracidade; b) imperatividade (ou coercibilidade); e c) auto-executoriedade. O primeiro se refere aos fatos alegados pela administração que servirão de fundamento para a prática dos atos administrativos, é a "fé pública". Uma das suas principais conseqüências é transferir o ônus da prova de ilegalidade do ato administrativo para quem o alega. O segundo confere obrigatoriedade a certos atos emanados da Administração Pública, independentemente de declaração de validade ou legitimidade ulterior. O terceiro atributo consiste na faculdade que a Administração tem de proceder à imediata e à direta execução de alguns atos, independentemente de ordem judicial.

É interessante fazermos aqui uma rápida alusão à classificação doutrinária dos atos administrativos para destacarmos, contudo, somente dois dos critérios utilizados, que nos interessarão mais adiante nesse estudo, quando abordarmos o controle jurisdicional dos atos administrativos. São eles os que consideram a formação do ato e o que atenta para a liberdade de ação do administrador. Aquele subdivide os atos administrativos em simples, complexos e compostos, conforme num ou noutro caso haja se manifestado um ou vários órgãos estatais.

Aqui invocamos mais uma vez a lição de M. Seabra Fagundes (1979, p. 38-40):

Ainda os atos administrativos podem ser simples, complexos ou contratuais, se vistos sob o aspecto da formação da vontade neles expressa. No ato simples, há uma vontade única. O ato somente dela depende. No ato complexo, várias vontades individuais se somam e se manifestam numa declaração única. Num, a vontade é individual. Noutro, várias vontades se conjugam para integrar o ato, que, à falta duma delas, ou por vício de qualquer uma, poderá, em certos casos, ser anulável ou nulo. Mas são sempre atos unilaterais, no perfeito sentido da palavra, porque decorrem de manifestação unilateral da vontade, obrigando a uma parte que neles não aquiesceu nem colaborou. Ainda quando haja multiplicidade de vontades (ato complexo), elas se somam no sentido de produzir determinados efeitos sobre terceiro alheio à sua manifestação. (grifo nosso)

Hely Lopes Meirelles (2003, p. 167-168) também aborda o tema de forma bastante didática, senão vejamos:

Ato simples é o que resulta da manifestação de vontade de um único órgão, unipessoal ou colegiado. Não importa o número de pessoas que participam da formação do ato; o que importa é a vontade unitária que expressam para dar origem, a final, ao ato colimado pela Administração. [...] Ato complexo é o que se forma conjugação de vontades de mais de um órgão administrativo. O essencial, nesta categoria de atos, é o concurso de vontades de órgãos diferentes para a formação de um único ato. [...] Ato composto é o que resulta da vontade única de um órgão, mas depende da verificação por parte de outro, para se tornar exeqüível. [...] O ato composto distingue-se do ato complexo porque este só se forma com a conjugação de vontades de órgãos diversos, ao passo que aquele é formado pela vontade única de um órgão, sendo apenas ratificado por outra autoridade. Essa distinção é essencial para se fixar o momento da formação do ato e saber-se quando se torna operante e impugnável. (grifo original)

O segundo critério de classificação, que considera a liberdade de ação do administrador, divide os atos administrativos em vinculados e discricionários, conforme a lei lhe tenha deixado ou não certa margem de atuação. Quanto a esse critério é pertinente trazermos à baila os ensinamentos de José dos Santos Carvalho Filho (2006, p. 114):

Atos vinculados, como o próprio adjetivo demonstra, são aqueles que o agente pratica reproduzindo os elementos que a lei previamente estabelece. Ao agente, nesses casos, não é dada liberdade de apreciação da conduta, porque se limita, na verdade, a repassar para o ato o comando estatuído na lei. Isso indica que nesse tipo de atos (sic) não há qualquer subjetivismo ou valoração, mas apenas a averiguação de conformidade entre o ato e a lei. [...] Diversamente sucede nos atos discricionários. Nestes é própria a lei (sic) que autoriza o agente a proceder a uma avaliação de conduta, obviamente tomando em consideração a inafastável finalidade do ato. A valoração incidirá sobre o motivo e o objeto do ato, de modo que este, na atividade discricionária, resulta essencialmente da liberdade de escolha entre alternativas igualmente justas, traduzindo, portanto, um certo grau de subjetivismo. (grifo original)

Expostas as colocações sobre os atos administrativos que mais nos interessam, analisaremos agora os aspectos do seu controle perante o Poder Judiciário.

1.3 O controle jurisdicional dos atos administrativos

A submissão dos atos da Administração Pública à análise do Poder Judiciário é pressuposto lógico de nossa constituição sob a forma de Estado de Direito, como fora exposto no início desse capítulo. Nesse tópico destacaremos brevemente as principais hipóteses que autorizam o exercício do controle jurisdicional sobre os atos administrativos, bem como a questão da possibilidade de revisão judicial dos atos administrativos discricionários.

1.3.1 Hipóteses

O exercício do controle jurisdicional dos atos administrativos será possível, quando ocorrerem irregularidades na sua formação, nos seus efeitos, na sua motivação, em síntese, quando houver afronta ao regime jurídico administrativo, ao qual se encontre submetida a Administração Pública. Nesses casos, poderá ser pleiteada a anulação do ato por vício de legalidade, independentemente do exercício da autotutela administrativa, conforme preconiza a súmula nº 473 [01] do Supremo Tribunal Federal (STF).

Assim, os atos administrativos podem ser anulados, quando exista alguma irregularidade, ou quando não esteja presente algum de seus requisitos (competência, finalidade, forma, motivo e objeto). Sem esses componentes, ou tendo-os viciado, o ato não se aperfeiçoará, não terá aptidão para gerar efeitos válidos perante o Direito.

Também será revisto judicialmente o ato que não se compactue com as regras normativas positivadas e com os princípios constitucionais e administrativos, explícitos e implícitos, que informam a atividade estatal. Essas regras, de natureza principiológica, são de fundamental observância por parte da Administração, são a "infra-estrutura" normativa e sobre elas repousa todo o direito positivo.

A Constituição Federal, em seu art. 37, caput, impõe à atividade administrativa o respeito a esses princípios. Reza o dispositivo:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] (grifo nosso)

Sem prejuízo dos princípios expressos, mencionados pela CF, existem ainda os princípios reconhecidos ou implícitos, que também vinculam a atividade administrativa e são aceitos pela doutrina e pela jurisprudência como parâmetros para o exercício do controle jurisdicional. São eles: a supremacia do interesse público, a autotutela, a indisponibilidade dos bens públicos, a continuidade dos serviços públicos, a segurança jurídica, a razoabilidade e a proporcionalidade.

1.3.2 Os atos administrativos discricionários

Não obstante a Administração Pública esteja submetida ao império da legalidade, só podendo agir de acordo com o que a lei, previamente, vier a estabelecer, a verdade é que, nem sempre, o legislador consegue antever tudo aquilo que ocorrerá no seio social. Ele, no exercício da função legiferante, emite normas necessariamente gerais, impessoais, dirigidas a todas as pessoas ou entidades, sem particularidades ou discriminações, isto é, sem levar em conta os casos específicos que surgem e que requerem, por conseqüência, uma normatização peculiar, considerando o princípio da isonomia.

Como conseqüência desponta a discricionariedade administrativa, entendida como a margem de liberdade atribuída à Administração pela lei para que esta analise os casos concretos e escolha, dentre as alternativas legais possíveis, aquela mais adequada, a que mais lhe convenha, a mais oportuna para satisfazer o interesse público. Hely Lopes Meirelles (2003, p. 164) define o ato discricionário como o que "a Administração pode praticar com liberdade de escolha de seu conteúdo, de seu destinatário, de sua conveniência, de sua oportunidade e do modo de sua realização".

Essa margem de liberdade de que dispõe o administrador para atuar, contudo, não é ilimitada. A ele foi apenas delegado, em face das circunstâncias – pois ninguém melhor que a própria Administração conhece as situações concretas enfrentadas rotineiramente – a oportunidade e a conveniência de escolher a melhor solução para o caso, a mais justa, segundo sua valoração. Nisso consiste o mérito do ato administrativo, quando praticado no exercício do poder discricionário.

M. Seabra Fagundes (1979, p. 74-76), ao comparar os atos administrativos vinculados aos atos discricionários afirma o seguinte:

Para a prática de alguns atos, a competência da Administração é estritamente determinada na lei, quanto aos motivos e modo de agir. A lei lhe determina que, existentes determinadas circunstâncias, proceda dentro de certo prazo e certo modo. A competência diz-se então vinculada. A Administração Pública não é livre em resolver sobre a conveniência do ato, nem sobre o seu conteúdo. Só lhe cabe constatar a ocorrência dos motivos, e, com base neles, praticar o ato. Escusando-se a praticá-lo, no tempo e com o objetivo determinado, viola a lei. Noutros casos, a lei deixa a autoridade administrativa livre na apreciação do motivo ou do objeto do ato, ou de ambos ao mesmo tempo. No que respeita ao motivo, essa discrição se refere à ocasião de praticá-lo (oportunidade) e à sua utilidade (conveniência). No que respeita ao conteúdo, a discrição está em poder praticar o ato com objetivo variável, ao seu entender. Nestes casos, a competência é livre ou discricionária. A propósito de tais atos, não é possível cogitar de nulidade relacionada com o motivo, com o objeto, ou com ambos, conforme a respeito de qualquer um desses requisitos, ou dos dois, possa deliberar livremente a Administração. No mais, entretanto, ou seja, quanto à manifestação da vontade (falta de competência para agir e defeito pessoal na vontade do agente), finalidade e forma, o ato discricionário incide nos mesmos casos de invalidez dos atos vinculados. (grifo nosso)

Desse seu ensinamento, extrai-se que o mérito do ato administrativo discricionário, ou seja, a oportunidade e a conveniência acerca da sua prática, seria intangível jurisdicionalmente, subsistindo sobredito controle somente em relação aos elementos vinculados do ato (competência, finalidade, forma, etc.).

Contudo, sem embargo do acerto dessa lição do notável mestre, a doutrina e a jurisprudência, até então uníssonas em compartilhar semelhante pensamento, começam a se inclinar para o sentido de, considerando a nova feição do princípio da legalidade, que atualmente não mais se restringe a perquirir da compatibilidade mecânica entre o ato discricionário e a lei positivada, admitirem o controle jurisdicional também do mérito dos atos discricionários, desde que tomado por parâmetro o dever da Administração de fundamentar seu comportamento, indicando o porquê de portar-se de determinada forma, bem como os motivos pelo qual o faz, sem olvidar igualmente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Acerca do princípio da proporcionalidade, Pierre Müller (1978, p.218) apud Paulo Bonavides (2006, p.393) tece as seguintes considerações:

[...] há violação do princípio da proporcionalidade, com ocorrência de arbítrio, toda vez que os meios destinados a realizar um fim não são por si mesmos apropriados ou quando a desproporção entre meios e fim é particularmente evidente, ou seja, manifesta. (grifo nosso)

Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade vêm gradativamente ganhando importância no cenário jurídico, de modo que hoje já não é mais possível à Administração renegá-los, quando da execução dos seus deveres. Nota-se que houve um aumento da esfera de atuação do Poder Judiciário, já não se admitindo a restrita atuação de perquirir da compatibilidade do ato concretamente praticado com a norma positivada, o que era feito desprovido de qualquer ponderação de conteúdo axiológico.

Nesse sentido convém registramos a preciosa lição de Germana de Oliveira Moraes (2004, p.111-112), que assim se manifesta:

A compreensão do controle jurisdicional da discricionariedade e da valoração administrativa dos conceitos indeterminados, como controle de juridicidade, e não apenas de legalidade, revela a superação do positivismo legalista, que pretendia reduzir o Direito à exegese apenas das leis escritas. Atualmente, conforme já se afirmou anteriormente, ultrapassada a dicotomia entre princípios e normas, não se questiona a idéia de que as normas jurídicas compreendem tanto as regras, normas em sentido estrito, quanto os princípios. Os princípios, cuja superioridade e hegemonia na pirâmide normativa se reconhece a partir de sua positivação nos textos constitucionais, rotulados de "normas-chaves de todo o ordenamento jurídico" e considerados "o oxigênio das Constituições na época do pós-positivismo", são, na expressão de Paulo Bonavides, "compreendidos, equiparados e até mesmo confundidos com os valores" e "enquanto valores fundamentais, governam a Constituição, o regímen, a ordem jurídica. Não são apenas a lei, mas a sua extensão, substancialidade, plenitude e abrangência." De acordo com essa perspectiva doutrinária, ocorreu, no Brasil, a partir da Carta Política de 1988, a constitucionalização dos princípios da Administração Pública. [...] A constitucionalização desses princípios da Administração Pública e dos princípios gerais do Direito gerou para o Poder Judiciário a possibilidade de verificar além da conformidade dos atos administrativos com a lei, ao exercer o controle de seus aspectos vinculados, à luz do princípio da legalidade, também aspectos não vinculados desses atos, em decorrência dos demais princípios constitucionais da Administração Pública, da publicidade, da impessoalidade e da moralidade, do princípio constitucional da igualdade e dos princípios gerais da razoabilidade e da proporcionalidade. (grifo nosso)

Como se vê, o controle judicial dos atos administrativos, sobretudo dos atos discricionários, teve seu âmbito dilatado, e isso graças ao acolhimento constitucional dos princípios gerais e específicos que regem a atividade administrativa do Estado.

Porém, tal não significa tolher da Administração o exercício de sua competência discricionária, uma vez que esta, assim como a atividade vinculada, é de fundamental importância para o seu êxito e a sua eficiência.

O que se busca é a possibilidade de apreciação jurisdicional dos atos discricionários para que, a partir da análise de seus requisitos e elementos, em cotejo com os princípios jurídicos acima mencionados, possa se anular aqueles que, a despeito de serem discricionários, findarem por pender para a arbitrariedade.

Assinaladas as principais características da Administração Pública e do controle jurisdicional, especialmente, o aplicável aos atos administrativos, cumpre-nos a seguir apresentar alguns aspectos referentes ao processo administrativo disciplinar, para que, fixadas tais premissas, seja-nos possível apreciar, ao final, o cabimento do seu controle jurisdicional.


2 O PROCESSO DISCIPLINAR

É sabido que o processo é o principal e um dos mais legítimos instrumentos dentre aqueles que o Estado se vale para resolver os conflitos intersubjetivos que afloram na sociedade, constituindo-se, assim, num dos meios de pacificação e controle social existentes. Contudo, nem sempre foi o que ocorreu.

Em épocas remotas, quando o Estado ainda se encontrava em estágio embrionário, os litigantes faziam uso da autotutela para resolverem suas questões. Nesses casos, sempre prevalecia à justiça o poder e a imposição da vontade do sujeito mais forte sobre o mais fraco. Somente num momento posterior, quando o Estado ganhou força e legitimidade suficiente, pôde suplantar esse estágio e monopolizar a atividade jurisdicional, decidindo os casos concretos de acordo com as leis.

A partir desse período, os conflitos não eram mais resolvidos pelos próprios cidadãos, mas por funcionários do Estado, terceiros imparciais que, aplicando o direito ao caso debatido, proferiam decisões obrigatórias e de regra definitivas. Eram os pretores, que atualmente corresponde aos nossos juízes e tribunais que integram o Poder Judiciário. Assim, quando hoje surge um conflito, este é resolvido através do processo e da jurisdição estatal, entendendo-se como tal a aplicação prática do direito objetivo ao caso a ser solucionado.

Ocorre que não obstante tenha sido atribuído precipuamente ao Poder Judiciário o encargo jurisdicional, essa função também é exercida legitimamente, embora de forma atípica, pelos Poderes Executivo e Legislativo, considerando a atividade jurisdicional como a prerrogativa de aplicar o direito na solução das situações que surgem, o que é feito através do processo. A diferença reside no seguinte ponto: as decisões proferidas pelo Poder Judiciário são, em regra, definitivas, em face do dogma da coisa julgada, enquanto que as decisões exaradas nos processos administrativos podem ser revistas pelo Judiciário.

No que respeita às faltas funcionais praticadas pelos servidores públicos, a Administração se vale do processo disciplinar como meio legítimo de apuração dos desvios de conduta e de aplicação da sanção respectiva.

Já a prática de conduta pelos parlamentares que se afigure como procedimento que atente contra o decoro institucional será apurada no âmbito do Poder Legislativo, através de procedimento próprio, que pode redundar inclusive na perda do mandato político.

Assentadas essas ponderações, será feita, no presente capítulo, uma breve análise acerca do processo administrativo disciplinar em face dos servidores públicos, enfocando seu conceito, fundamentos, princípios, modalidades e principais etapas. Em seguida serão tecidas algumas colocações no que concerne às condutas praticadas pelos parlamentares que se afigurem como incompatíveis ao decoro parlamentar, em que se examinará também suas conseqüências e o respectivo processo de apuração, que possui inquestionavelmente natureza disciplinar.

2.1 O processo disciplinar por falta funcional

Preliminarmente, devemos atentar para corrente distinção que é feita entre processo e procedimento, pois enquanto o primeiro corresponde àquele conjunto de atos e providências praticadas com o intuito de obter-se determinada solução sobre uma controvérsia qualquer, seja no âmbito judicial ou administrativo, o segundo caracteriza-se pelo modo de exteriorização do processo, pelas fases de seu andamento, ou seja, pelo seu rito.

2.1.1 Conceito

O processo administrativo disciplinar para apurar as faltas funcionais pode ser conceituado, segundo as lições de Hely Lopes Meirelles (2003), como o meio de que se vale a Administração Pública para apurar e punir os desvios de conduta praticados por seus servidores e pelas demais pessoas sujeitas ao regime jurídico administrativo. Ensina ainda o mestre que essa espécie de processo se baseia na supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam aos seus serviços ou às suas atividades, quer de forma definitiva ou transitória, razão pela qual se submetem à sua disciplina.

José dos Santos Carvalho Filho (2006, p. 812) define o processo administrativo disciplinar como sendo "o instrumento formal através do qual a Administração apura a existência de infrações praticadas por seus servidores e, se for o caso, aplica as sanções adequadas". Vemos então que o processo disciplinar é espécie do gênero processo administrativo e busca apurar, particularmente, os desvios funcionais que venham a ser praticados pelos agentes públicos ou pelos particulares que estejam submetidos ao regime jurídico administrativo.

Contudo, devemos ressaltar que a garantia do processo disciplinar foi conferida aos servidores públicos efetivos, e não aos empregados públicos, que são aqueles contratados pelo Estado, selecionados através de concurso público, cuja relação de trabalho é regida pela legislação celetista. Estes, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal (AI-AgR nº 323346/CE), podem ser sancionados sem as formalidades de prévio processo disciplinar, porém desde que haja motivo e que seja comprovada e justificada pela autoridade a falta funcional.

2.1.2 Fundamentos

A Administração Pública, ao tomar conhecimento da prática de desvios funcionais por parte de seus agentes, deve necessariamente apurar a falta cometida para aplicar a sanção mais adequada e consentânea ao caso. Para isso é que dispõe do poder disciplinar, de natureza administrativa, que é o fundamento e o sustentáculo da sua atividade disciplinadora.

Esse poder, assim como os demais, é de caráter instrumental, pois serve para que bem desenvolva a atividade administrativa. De acordo com Hely Lopes Meirelles (2003, p. 120) ele pode ser definido da seguinte forma:

Poder disciplinar é a faculdade de punir internamente as infrações funcionais dos servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços da Administração. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente.

Esse poder, no entanto, não se confunde com o poder punitivo do Estado, uma vez que ele se baseia e analisa as condutas incompatíveis com o estatuto funcional, e não com o ordenamento penal, embora, em alguns casos, a mesma conduta possa dar ensejo à aplicação de ambas as penas, a disciplinar e a criminal.

Destacamos ainda que a aplicação da sanção disciplinar, nos casos em que realmente exista a prática de falta funcional por parte do servidor, é de caráter obrigatório, sob pena de o superior hierárquico incorrer no crime de condescendência criminosa, previsto no art. 320 do Código Penal.

2.1.3 Princípios e modalidades

Regem o processo administrativo disciplinar, assim como o processo civil ou penal, algumas normas de caráter principiológico que lhe dão fundamento e o norteiam, indicando qual o melhor caminho a ser seguido, quando da apuração do desvio funcional. Grande parte desses princípios do processo administrativo é comum, também, ao processo civil e ao processo penal, mas podemos apontar alguns que são peculiares àqueles processos conduzidos no âmbito interno da Administração.

Dentre os princípios comuns, que integram a teoria geral do processo, podemos destacar os seguintes: I – princípio da legalidade; II – princípio da publicidade; III – princípio da oficialidade; IV – princípio do contraditório e da ampla defesa; V – princípio da economia processual. Esses princípios, embora sejam comuns aos vários ramos processuais, aplicam-se ao processo administrativo com certa dose de intensidade ou mitigação, conforme num ou noutro caso o interesse público seja mais eficazmente tutelado.

Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 604), o princípio da publicidade, por exemplo, no processo administrativo, é de aplicabilidade mais ampla que ao processo judicial. Eis suas palavras:

Esse direito de acesso ao processo administrativo é mais amplo do que o de acesso ao processo judicial; neste, em regra, apenas as partes e seus defensores podem exercer o direito; naquele, qualquer pessoa é titular desse direito, desde que tenha algum interesse atingido por ato constante do processo ou que atue na defesa do interesse coletivo ou geral, no exercício do direito à informação assegurado pelo art. 5º, inciso XXXIII, da Constituição.

Também o princípio da oficialidade, no processo administrativo, é mais abrangente que no tradicional processo judicial, pois enquanto neste ele só se aperfeiçoa após instaurada a relação processual, naquele existe a possibilidade da própria Administração dar início ao processo sem necessidade de provocação de qualquer pessoa. É o que se depreende ainda da lição de Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 605), que averba o seguinte:

No âmbito administrativo, esse princípio assegura a possibilidade de instauração do processo por iniciativa da Administração, independentemente de provocação do Administrado e ainda a possibilidade de impulsionar o processo, adotando todas as medidas necessárias a sua adequada instrução. Essa executoriedade, sendo inerente à atuação administrativa, existe mesmo que não haja previsão legal; como a Administração Pública está obrigada a satisfazer ao interesse público, cumprindo a vontade da lei, ela não pode ficar dependente da iniciativa particular para atingir os seus fins. (grifo nosso)

Além desses princípios, comuns aos processos administrativos e judiciais, existem outros, que se aplicam mais peculiarmente aos primeiros. Esses princípios estão descritos no art. 2º da lei nº 9.784/99, diploma que trata do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. O dispositivo preceitua o dever de obediência da Administração aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Feitas essas ponderações, atentemos agora para as principais modalidades de apuração disciplinar que a Administração Pública lança para averiguar os desvios funcionais praticados.

De acordo com o art. 143 da lei nº 8.112/90, norma que trata do regime jurídico dos servidores públicos civis da União, de suas autarquias e fundações públicas federais, existem duas espécies de procedimentos: a sindicância e o processo administrativo disciplinar.

Na sindicância, que consiste em meio sumário de investigação funcional, a Administração Pública realiza levantamentos preliminares para, posteriormente, instaurar processo administrativo disciplinar, caso existam indícios suficientes da prática da falta; do contrário arquiva a investigação. Trata-se de procedimento similar ao inquérito policial, que poderá resultar ou não no início da ação penal, caso haja indícios da autoria e materialidade delituosa.

Ainda segundo o art. 145, inc. II da referida lei, da sindicância não poderá resultar punição ao investigado, salvo a aplicação da pena de advertência ou de suspensão por até 30 dias, desde que assegurada oportunidade de defesa.

A segunda espécie, e a principal delas, é o processo administrativo disciplinar propriamente, que também é chamado erroneamente de "inquérito administrativo". Segundo Hely Lopes Meirelles (2003, p. 666), "é o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da Administração".

É o meio de que se vale a Administração para aplicar as penas de maior gravidade ao servidor faltoso, e que, por isso, demandam a necessidade de assegurar-lhe ampla possibilidade de defesa. De acordo com a definição do art. 148 da lei nº 8.112/90, o processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo no qual se encontre investido.

Existe ainda "verdade sabida", que é o meio sumário de averiguação e punição da conduta irregular mediante a iniciativa da própria autoridade incumbida de aplicar a sanção. A respeito nos ensina ainda o notável Hely Lopes Meirelles o seguinte (2003, p. 669):

[...] verdade sabida é o conhecimento pessoal da infração pela própria autoridade competente para punir o infrator. [...] Em tais casos, a autoridade competente, que presenciou a infração, aplica a pena pela verdade sabida, consignando no ato punitivo as circunstâncias em que foi cometida e presenciada a falta. Esse meio sumário só é admissível para as penalidades cuja imposição não exija processo administrativo disciplinar. Tem-se considerado, também, como verdade sabida a infração pública e notória, estampada na imprensa ou divulgada por outros meios de comunicação de massa. O essencial para se enquadrar a falta na verdade sabida é seu conhecimento direto pela autoridade competente para puni-la, ou sua notoriedade irretorquível. Não obstante, embora sem rigor formal, deve-se assegurar a possibilidade de defesa.

Feitas essas colocações, passaremos agora a analisar as principais etapas do processo administrativo disciplinar instaurado contra os servidores públicos. Após, discorreremos sobre o procedimento para cassação de mandato dos congressistas acusados de praticarem conduta incompatível com o decoro parlamentar.

2.1.4 Etapas

As etapas do processo administrativo disciplinar instaurado contra os servidores públicos civis federais encontram-se dispostas nos artigos 148 a 182 da lei nº 8.112/90. A primeira fase do processo administrativo disciplinar é a instauração e se dá mediante ato da autoridade legalmente competente, que expede uma portaria descrevendo o que deve ser apurado e indicando a infração na qual o investigado possivelmente incorreu. Nesse momento é designada também uma comissão processante, que será incumbida de realizar toda a instrução processual.

Essa comissão deverá ser composta necessariamente por três servidores estáveis, cujo presidente será indicado pela autoridade e deverá ter cargo ou nível de escolaridade igual ou superior ao do funcionário processado. Ato contínuo, o presidente escolhe então um dos servidores para exercer as funções de secretário da comissão [02].

Em seguida, inicia-se a fase de instrução. Nela, a comissão processante goza de plena liberdade no que tange à colheita das provas produzidas pelas partes – Administração e servidor processado, podendo se valer de assessores técnicos, peritos, documentos, provas testemunhais, vistorias, etc. Nessa etapa deve ser assegurado efetivamente ao demandado seu direito ao contraditório e à ampla defesa, como reza o art. 5º, inc. LV da CF e o art. 156 da lei nº 8.112/90.

Uma vez terminada a instrução, a comissão disciplinar irá relatar tudo o que ocorreu durante o processo. Em seu relatório, deverá dizer se houve infração funcional, e, nesse caso, qual ou quais os dispositivos infringidos, recomendar a instauração de outros processos ou a adoção de outras providências que entenda necessária e, ao final, manifestar-se a favor ou contra a aplicação da sanção, indicando-a [03].

Por fim, vem a fase de julgamento e decisão, em que a autoridade que determinou a apuração do desvio e deflagrou o processo disciplinar irá se manifestar sobre o relatório conclusivo. Ela poderá imputar ao sujeito demandado a pena sugerida pela comissão ou outra que entenda mais razoável para o caso, ou ainda nenhuma, concordando ou discordando da conclusão exarada no parecer.

Nesse sentido, assinala Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 614-615): "O relatório é peça apenas opinativa, não obrigando a autoridade julgadora, que poderá, analisando os autos, apresentar conclusão diversa", porém, a autora aduz ainda que, quando da decisão da autoridade, e nos casos em que ela divirja da conclusão exarada no parecer da comissão processante, há necessidade de fundamentar e motivar a aplicação, ou não, da penalidade, indicando quais as causas que a levam decidir num ou noutro sentido. Eis sua lição (DI PIETRO, 2006, p. 615):

A fase final é a de decisão, em que a autoridade poderá acolher a sugestão da comissão, hipótese em que o relatório corresponderá à motivação; se não aceitar a sugestão, terá que motivar adequadamente a sua decisão, apontando os elementos do processo em que se baseia. (grifo nosso)

Destacadas as principais fases do processo disciplinar em face dos servidores públicos, analisaremos agora o procedimento, de natureza disciplinar, instalado em desfavor dos membros que integram o Poder Legislativo (deputados e senadores), manejável quando se portam em desacordo com o "decoro parlamentar", conforme reza a CF. Serão destacadas também as espécies de conduta incompatíveis com o decoro parlamentar, as etapas de apuração, além das conseqüências da sua prática.

2.2 O processo disciplinar por conduta ofensiva ao decoro parlamentar

Decoro significa decência, compostura, dignidade, pundonor. A preocupação com a ética na disputa política e no decorrer do exercício do mandato eletivo fez com que o constituinte originário estabelecesse limitações ao comportamento dos parlamentares, o que fora feito com o intuito de inibir que a prática de suas prerrogativas não transbordasse para o abuso de direito.

Aos congressistas, como aos demais agentes do poder público, é vedado se valerem da legislatura para pleitearem vantagens pessoais. No sistema da democracia representativa, tal qual o nosso, eles recebem do povo delegação para agirem em seu nome, são mandatários, devem aprovar as leis que interessem à sociedade, fiscalizar o Poder Executivo, exercer o controle orçamentário e financeiro dos gastos públicos, além de outras atribuições institucionais.

Ocorre que nem sempre os parlamentares se portam como deveriam. Às vezes se desviam de sua missão constitucional e agem de forma ilegítima, e quando isso ocorre aflora a prática de condutas incompatíveis com o decoro parlamentar. Quando praticam desvios no exercício do mandato que configurem, em tese, conduta indecorosa, será aberto procedimento investigatório para, ao final, decidir-se por sua absolvição ou condenação, e à conseqüente perda ou não do mandato (cassação). Esse procedimento e seu respectivo julgamento são feitos por seus pares, os demais deputados ou senadores, cuja decisão, prima facie, é de natureza política. Nesse rumo, cabe-nos agora defini-lo.

2.2.1 Conceito

O procedimento disciplinar instaurado em face dos congressistas, o qual apurará a prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar, pode ser conceituado como o meio de que se vale o próprio Poder Legislativo para investigar e descobrir as eventuais faltas cometidas pelos seus membros, aplicando, através de procedimento formal próprio, e desde que assegurada ampla defesa, decisão pela cassação ou manutenção do mandato, conforme votação da maioria de seus componentes.

A Constituição Federal4 diz que a perda do mandato político, nos casos de conduta incompatível com o decoro parlamentar, será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, através do voto secreto da maioria de seus membros, mediante provocação da Mesa respectiva ou de agremiação política com representação no Congresso Nacional, assegurando-se ao processado a ampla defesa.

Segundo Alexandre de Moraes (2002, p. 416), a expressão decoro parlamentar pode ser compreendida como "o conjunto de regras legais e morais que devem reger a conduta dos parlamentares, no sentido de dignificação da nobre atividade legislativa". Por conseguinte, o procedimento disciplinar que visa à sua apuração buscará averiguar da ocorrência ou não de ofensa a tais regras de conduta.

2.2.2 As modalidades de condutas ofensivas ao decoro parlamentar

A definição de decoro parlamentar está contida, tanto na Constituição Federal, quanto no regimento interno e nos códigos de ética das casas legislativas (Câmara dos Deputados e Senado Federal). A primeira cuida do tema em seu art. 55, § 1º e, nesse mesmo dispositivo, confere ao Congresso Nacional, sem prejuízo das definições que traz, a possibilidade dele dispor sobre outras condutas que se afigurem como incompatíveis ao decoro parlamentar.

A aludida norma constitucional fora vazada nos seguintes termos:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

I – [...]

II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

[...]

§ 1°. É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas. (grifo nosso)

Depreende-se do dispositivo que a Carta Magna elegeu como conduta parlamentar indecorosa, passível de ensejar a cassação do mandato, "o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional" e a "percepção de vantagens indevidas". O referido abuso de prerrogativas consiste no comportamento arbitrário praticado no exercício do mandato, na atuação com abuso de autoridade, ou seja, quando o congressista se vale das suas inviolabilidades civis e penais5 para praticar atos incompatíveis com o decoro parlamentar. Já a percepção de vantagens indevidas diz respeito a todo tipo de benesse que os congressistas auferem ilegitimamente.

Além dessas, o constituinte deu margem a que o próprio Poder Legislativo, no exercício de seu múnus constitucional, estabelecesse outros atos que também seriam considerados incompatíveis com o dever de decoro, o que haveria de ser feito por intermédio do seu regimento interno. Como o Poder Legislativo brasileiro é bicameral, tanto a Câmara dos Deputados, quanto o Senado Federal possuem seus respectivos regimentos, e neles podem traçar quais as normas de conduta as quais seus membros devem observar, sob pena de quebra do decoro.

No âmbito da Câmara dos Deputados, seu regimento interno está consubstanciado na resolução nº 17/1989, que, em seus artigos 231 e 244, tratam do dever de observância dos deputados às normas constitucionais e regimentais de natureza ética, fixando o que se entende por decoro parlamentar. Tais preceitos têm a seguinte redação:

Art. 231. No exercício do mandato, o Deputado atenderá às prescrições constitucionais e regimentais e às contidas no Código de Ética e Decoro Parlamentar, sujeitando-se às medidas disciplinares nelas previstas.

[...]

Art. 244. O deputado que praticar ato contrário ao decoro parlamentar ou que afete a dignidade do mandato estará sujeito às penalidades e ao processo disciplinar previstos no Código de Ética e Decoro Parlamentar, que definirá também as condutas puníveis. (grifo nosso)

Conforme se infere desses preceitos, eles fazem alusão à resolução nº 25/2001, que trata do código de ética e decoro parlamentar da Câmara dos Deputados, norma que também traz conceitos e definições acerca do instituto em exame e integra, por conseguinte, nosso objeto de estudo.

O referido código de ética traz disposições complementares às contidas na CF e no regimento interno da Câmara, estabelecendo em seus artigos 4º e 5º, detalhadamente, (tipificando) quais as condutas consideradas incompatíveis com o decoro parlamentar. Ei-los:

Art. 4° Constituem procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato:

I – abusar das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 55, § 1°);

II – perceber, a qualquer título, em proveito próprio ou de outrem, no exercício da atividade parlamentar, vantagens indevidas (Constituição Federal, art. 55, §1°);

III – celebrar acordo que tenha por objeto a posse do suplente, condicionando-a a contraprestação financeira ou à prática de atos contrários aos deveres éticos ou regimentais dos Deputados;

IV – fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos legislativos para alterar o resultado de deliberação;

V – omitir intencionalmente informação relevante, ou, nas mesmas condições, prestar informação falsa nas declarações de que trata o art. 18.

Art. 5º Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis na forma deste Código:

I – perturbar a ordem das sessões da Câmara ou das reuniões de comissão;

II – praticar atos que infrinjam as regras de boa conduta nas dependências da Casa;

III – praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou comissão, ou os respectivos Presidentes;

IV – usar os poderes e prerrogativas do cargo para constranger ou aliciar servidor, colega ou qualquer pessoa sobre a qual exerça ascendência hierárquica, com o fim de obter qualquer espécie de favorecimento;

V – revelar conteúdo de debates ou deliberações que a Câmara ou comissão hajam resolvido devam ficar secretos;

VI – revelar informações e documentos oficiais de caráter reservado, de que tenha tido conhecimento na forma regimental;

VII – usar verbas de gabinete em desacordo com os princípios fixados no caput do art. 37 da Constituição Federal;

VIII – relatar matéria submetida à apreciação da Câmara, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral;

IX – fraudar, por qualquer meio ou forma, o registro de presença às sessões, ou às reuniões de comissão.

Parágrafo único. As condutas puníveis neste artigo só serão objeto de apreciação mediante provas. (grifo nosso)

O Senado Federal, por sua vez, trata das condutas incompatíveis com o decoro parlamentar no art. 32 da resolução nº 93/1970, que dispõe sobre o seu regimento interno. Essa norma tem basicamente a mesma redação do art. 55, § 1º da CF, não apresentando maiores dificuldades quanto ao seu entendimento, senão vejamos:

Art. 32. Perde o mandato o Senador (Const., art. 55):

I – [...]

II – cujo procedimento for declara do incompatível com o decoro parlamentar;

[...]

§ 1º. É incompatível com o decoro parlamentar o abuso das prerrogativas asseguradas ao Senador e a percepção de vantagens indevidas (Const., art. 55, § 1º). (grifo nosso)

Percebe-se que o regimento interno do Senado não traz, de forma esmiuçada, as condutas que configurem ato atentatório ao decoro parlamentar, como o faz o regimento interno da Câmara dos Deputados, acima citado. Ao contrário, ele se restringe a praticamente repetir o que já prevê a CF, como dito.

Assim, e pelo exposto, vemos que, tanto normas de hierarquia e natureza constitucional, quanto normas inferiores, de natureza regimental, tratam do decoro parlamentar, aquelas definindo-o de forma simples, aparentemente genérica, mas por si suficiente, e algumas destas escalonando as condutas faltosas detalhadamente, pontuando os comportamentos imorais e anti-ético dos parlamentares, os quais ensejarão punição bastante severa: a cassação do respectivo mandato eletivo.

2.2.3 Das conseqüências da conduta indecorosa

O dever de integridade e honradez deve acompanhar o congressista durante toda a sua jornada, pois o comportamento que se mostre incompatível com dever de manter o decoro acarreta necessariamente, por mandamento constitucional, a perda do mandato eletivo do parlamentar, dada a gravidade da falta cometida.

Sob esse aspecto não há meio termo: ou se cassa o mandato do parlamentar, caso reste comprovado a prática de conduta indecorosa, ou parlamento o absolve, caso se apure sua inocorrência. Assim, vê-se que a única punição cominável pela CF (art. 55), nesse caso, é a cassação do mandato.

José Afonso da Silva (2006, p. 539), apoiado nas lições de Hely Lopes Meirelles, ensina que a cassação "é a decretação da perda do mandato, por ter o seu titular incorrido em falta funcional, definida em lei e punida com esta sanção".

Nessa passagem, podemos compreender que a expressão "definida em lei" alude às várias condutas descritas nos regimentos das casas legislativas e no código de ética da Câmara dos Deputados, como mencionamos no presente capítulo.

Em seguida, e caso que haja indícios suficientes e plausíveis da prática de conduta incompatível com o exercício do mandato, o procedimento de cassação poderá ser iniciado mediante provocação da Mesa respectiva ou de partido político com representação no Congresso Nacional, desde que assegurado no processo o direito a ampla defesa.

Ao final, a decisão será tomada por seus pares, pelo voto secreto da maioria absoluta dos membros da Casa respectiva, tudo nos termos do art. 55 da CF e das normais regimentais, que traçam o rito do procedimento.

Enfim, após essas considerações acerca do processo disciplinar em face dos servidores públicos, por falta funcional, e dos congressistas, por quebra do decoro parlamentar, somada aos comentários sobre o controle jurisdicional e a Administração Pública, feitos inicialmente, passamos então a verificar a possibilidade do exercício do controle jurisdicional sobre referido processo, analisando seu cabimento num e noutro caso, conforme será detalhado no capítulo seguinte.


3 O CABIMENTO DO CONTROLE JURISDICIONAL DO PROCESSO DISCIPLINAR

Assentados os argumentos expostos nos dois capítulos anteriores, os quais serão fundamentais para a análise e formação do convencimento no que diz respeito à possibilidade do exercício do controle jurisdicional sobre o processo disciplinar, tanto em face dos servidores públicos, quando praticam falta funcional, quanto em face dos parlamentares, desta feita por quebra de decoro, passamos, no presente capítulo, a adentrar no âmago da discussão a que se presta este trabalho.

Aqui, considerando aspectos didáticos e o intento de conferir-se mais racionalidade ao estudo, serão de logo apresentados os principais argumentos sustentados por aqueles que não admitem a sindicabilidade do processo disciplinar para, em seguida, discorrermos a respeito das razões que norteiam a corrente que o admite. Por fim, apresentaremos o entendimento ao qual chegamos após o presente estudo.

3.1 Dos argumentos contrários ao controle jurisdicional do processo disciplinar

A função jurisdicional, exercida de forma típica pelo Poder Judiciário, é a prerrogativa do Estado de resolver as controvérsias surgidas na sociedade, aplicando, para isso, o direito ao caso concreto e proferindo uma decisão que será dotada de imutabilidade, em face do princípio da coisa julgada, conforme já o fora mencionado alhures.

Ocorre que, para muitos, essa função ainda deve se restringir à singela tarefa de cotejar o caso à lei, devendo o juiz, sobretudo, primar pelo integral e mecânico cumprimento das normas, ainda que isso importe em injustiça. Escorados basicamente nesse pensamento é que seus adeptos dele se valem para propagar a impossibilidade de submissão do processo disciplinar ao crivo do Poder Judiciário.

Eles se embasam nos seguintes argumentos: ofensa à separação dos poderes; incognoscibilidade do mérito do ato discricionário e na natureza do ato sancionatório, que consideram de cunho político. Dessa forma, nos itens que seguem iniciaremos a abordagem desses fundamentos para, após, contrapô-los com as opiniões que sustentam o cabimento do controle jurisdicional, senão vejamos.

3.1.1 Da ofensa à separação dos poderes

A Constituição Federal consagrou a divisão dos "poderes" do Estado como forma de garantir o funcionamento do sistema de freios e contrapesos e a observância dos direitos fundamentais dos cidadãos. Assim, em seu art. 2º está dito que "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário".

Esse sistema foi teorizado inicialmente por Aristóteles, em sua obra intitulada "Política", que posteriormente foi detalhado por Jonh Locke no "Segundo Tratado do Governo Civil", sendo finalmente exposto na célebre obra de Montesquieu – "O Espírito das Leis", de em que se espraiou pelas demais nações democráticas.

Ao dissertar sobre a divisão dos poderes Montesquieu (1999) dizia que o equilíbrio entre eles era pressuposto para se atingir um Estado com governo moderado e, para isso, as atribuições de legislar, administrar e julgar não deveriam ser concentradas em uma única pessoa, mas conferidas a entes distintos.

Tal postulado consiste, como se sabe, em distinguir três funções estatais – legislação, administração e jurisdição, que devem ser conferidas, por conseqüência, a três órgãos distintos, que serão autônomos e a exercerão com exclusividade.

Ocorre que não é raro um poder desrespeitar suas limitações, o que se dá quando exerce atribuição que não é sua e se arroga de competência que não possui, e que deveria ser exercida por outro poder. Assim, invade a esfera de atuação alheia, inobservando o dever de convivência harmônica que devia pairar.

No que tange ao nosso objeto de estudo, isso ocorre, segundo a corrente que professa a impossibilidade do controle jurisdicional do processo disciplinar, quando o Poder Judiciário é chamado para rever a punição aplicada ao agente público, seja ele servidor público da Administração estatal ou membro do parlamento investido por mandato eletivo.

Como o ato administrativo disciplinar que aplica a respectiva sanção ao agente público é oriundo ora do Poder Executivo, ora do Poder Legislativo, conforme, num ou noutro caso, o agente que se puna pertença a este ou àquele Poder, o Judiciário não pode rever ou substituir a vontade daqueles poderes pela sua própria vontade, isto é, os critérios utilizados pela Administração para aplicar a reprimenda seriam insuscetíveis de controle judicial.

É o que se depreende da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos autos do MS nº 3.071-0/DF, DJU 14/03/1994, cujo relator foi o ministro Milton Luiz Pereira. Eis sua ementa:

O controle jurisdicional do ato administrativo, para não violar a separação dos poderes, distancia-se do critério político (mérito), cingindo-se à verificação das prescrições legais determinadas (competência e manifestação da vontade do agente, objeto, conteúdo, finalidade e forma). O critério político e razões técnicas, desde que lícitos, são estranhos à prestação jurisdicional. (grifo nosso)

Dessa forma, ao Poder Judiciário seria vedado rever as sanções funcionais aplicadas aos agentes públicos, pois no fundo o Judiciário estaria revertendo as razões de ordem discricionária e política que condicionaram o administrador a tomar referida decisão.

Assim, vê-se que o apontado óbice está em estreita relação com o que será visto nos tópicos seguintes, que é a alegação de insuscetibilidade de submissão dos atos administrativos discricionários e políticos à apreciação judicial.

3.1.2 Da intangibilidade do mérito do ato discricionário

O primeiro óbice, acima apontado, guarda estreita relação com este e com o seguinte, pois seria justamente pela apreciação judicial dos atos discricionários e políticos, emanados da Administração, que restaria configurada a referida ofensa ao princípio constitucional da separação dos poderes.

O mérito do ato disciplinar são as razões que levaram a Administração a agir de determinada forma diante da situação concreta, o que se dará quando investida da competência discricionária. Assim, ela será livre para ponderar acerca da conveniência e da oportunidade de praticar o ato desta ou daquela maneira, e o Judiciário não poderia interferir alegando a prática de injustiça.

Assim, o quantum e o an da punição a ser aplicada aos agentes públicos não seriam suscetíveis de revisão judicial, pois, quando assim age, a Administração o faz de acordo com sua competência discricionária.

Sob esse aspecto, ao Poder Judiciário só seria legítimo apreciar se o ato punitivo é ou não legal, isto é, se estaria de acordo com a legislação ou não. Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 711), a respeito dos atos discricionários, diz que eles se sujeitam à apreciação judicial, "desde que não se invadam os aspectos reservados à apreciação subjetiva da Administração Pública, conhecidos sob a denominação de mérito (oportunidade e conveniência)". Nesse mesmo sentido, já decidiu o STJ, conforme se depreende do julgamento do RMS n° 1.288-0/SP, DJU 02/05/1994, abaixo transcrito:

É defeso ao Poder Judiciário apreciar o mérito do ato administrativo, cabendo-lhe unicamente examiná-lo sob o aspecto de sua legalidade, isto é, se foi praticado conforme ou contrariamente à lei. Esta solução se funda no princípio da separação dos poderes, de sorte que a verificação das razões de conveniência ou de oportunidade dos atos administrativos escapa ao controle jurisdicional do Estado. (grifo nosso)

Hely Lopes Meirelles (2003, p. 668) também trata do tema da mesma forma, asseverando o autor o seguinte:

Permitido é ao Poder Judiciário examinar o processo administrativo disciplinar para verificar se a sanção imposta é legítima e se a apuração da infração atendeu ao devido procedimento legal. Essa verificação importa conhecer os motivos da punição e saber se foram atendidas as formalidades procedimentais essenciais, notadamente a oportunidade de defesa ao acusado e a contenção da comissão processante e da autoridade julgadora nos limites de sua competência funcional, isto sem tolher o discricionarismo da Administração quanto à escolha da pena aplicável dentre as consignadas na lei ou regulamento do serviço, à graduação quantitativa da sanção e à conveniência ou oportunidade de sua imposição. O que se nega ao Judiciário é o poder de substituir ou modificar penalidade disciplinar a pretexto de fazer justiça, pois, ou a punição é legal, e deve ser confirmada, ou é ilegal, e há que ser anulada; inadmissível é a substituição da discricionariedade legítima do administrador por arbítrio ilegítimo do juiz. (grifo nosso)

Assim, embora haja a possibilidade de revisão judicial do processo disciplinar, esta seria restrita aos seus aspectos legais, à análise da compatibilidade do ato sancionatório com a lei, sem adentrar nas considerações quanto à justiça, oportunidade, eficiência, razoabilidade, etc.

3.1.3 Da natureza política do ato

Por fim, as sanções disciplinares aplicadas aos servidores públicos e aos parlamentares, estes, quando incidirem em quebra de decoro, seriam de natureza política e insuscetíveis, por conseguinte, de apreciação judicial.

Embora guarde certa similitude com o ato discricionário, o ato acoimado de político é mais abrangente, pois seria dotado de uma maior carga de discricionariedade do ente administrativo encarregado da apreciação do caso. Nessas espécies de ato, o Poder Judiciário não poderia sequer conhecer de seu conteúdo, haja vista tratar-se de matéria interna corporis.

M. Seabra Fagundes (2006, p. 180) diz que o próprio sentido de mérito do ato administrativo denota seu cunho político, o que impediria a apreciação jurisdicional, asseverando o autor nos seguintes termos:

O mérito está no sentido político do ato administrativo. É o sentido dele em função das normas da boa administração, ou, noutras palavras, é o seu sentido como procedimento que atende ao interesse público, e, ao mesmo tempo, o ajusta aos interesses privados, que toda medida administrativa tem de levar em conta. Por isso, exprime um juízo comparativo. Compreende os aspectos, nem sempre de fácil percepção, atinentes ao acerto, à justiça, utilidade, equidade, razoabilidade, moralidade etc. de cada procedimento administrativo.

Para os adeptos desse pensamento, a simples classificação do ato administrativo como interna corporis seria suficiente para apregoá-los como atos políticos e excluí-los da apreciação jurisdicional. Nota-se isso particularmente nas decisões do Poder Legislativo sobre a cassação de mandato de seus membros por quebra de decoro parlamentar, em que seriam de forma mais destacada. Nesse sentido já decidiu o STJ, ao julgar o RMS nº 18.959/SE, DJU 10/10/2005, lavrado nos seguintes termos:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO DE CASSAÇÃO DE MANDATO PARLAMENTAR. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO DE ATOS DE NATUREZA POLÍTICA. ATO INTERNA CORPORIS. REQUERIMENTO. VALIDADE. 1. [...] 2. Além de ato político, a cassação de mandato parlamentar é interna corporis, cuja apreciação é reservada exclusivamente ao Plenário da Câmara, não podendo o judiciário substituir a deliberação da Casa por um pronunciamento judicial sobre assunto que seja da exclusiva competência discricionária do Poder Legislativo. 3. Recurso não-provido.

Talvez isso se dê em virtude do ranço deixado pelas Constituições de 1934 e 1937, que diziam serem os atos políticos insuscetíveis de apreciação judicial. Nesse período, a motivação política do ato e a alegada supremacia do interesse público sobre o particular frustravam qualquer tentativa do Judiciário de imiscuir-se nessa seara.

Maria Sylvia Zanella di Pietro (2006, p. 712) faz as seguintes colocações acerca desse nebuloso momento:

Houve um período no direito brasileiro, na vigência da Constituição de 1937, em que os atos políticos eram insuscetíveis de apreciação judicial, por força de seu art. 94. Essa norma ligava-se à concepção do ato político como sendo aquele que diz respeito a interesses superiores da nação, não afetando direitos individuais; como o exercício do direito de ação estava condicionado à existência de um direito individual lesado, não ocorrendo lesão, faltava o interesse de agir para o recurso às vias judiciais. (grifo nosso)

Assim, vê-se que o entendimento acerca dos atos políticos é que estes não seriam sindicáveis porque não causariam prejuízos aos particulares, já que, em tese, seriam praticados visando ao bem comum, à promoção da satisfação coletiva e na persecução do interesse público.

3.2 Dos argumentos favoráveis ao controle jurisdicional do processo disciplinar

Superada a exposição das razões que fundamentam a impossibilidade do exercício do controle jurisdicional do processo disciplinar, iniciaremos aqui o delineamento dos motivos que embasam a tese a seu favor, e que entendemos seja a corrente mais acertada.

Para isso, apresentaremos o entendimento de que as instâncias administrativa e jurisdicional não se confundem, sendo autônomas, o postulado que garante ao administrado o direito de ter acesso à justiça, a necessidade de uma razoável tipificação das condutas, que se configurem como faltosas em face do servidor público e indecorosa em face do parlamentar, além de defender-se a necessidade de proteção judicial aos direitos subjetivos dos sujeitos processados.

3.2.1 Da autonomia entre as instâncias e do acesso à Justiça

Embora a Administração Pública possa apurar e punir internamente seus servidores e agentes políticos, essa faculdade é exercida sem prejuízo da garantia do cidadão de invocar a proteção jurisdicional, existente em face da autonomia entre as instâncias administrativa e judicial.

O processo disciplinar, como expusemos, é deflagrado no âmbito interno da Administração; nele vige o princípio da oficialidade em sua plenitude. Após o seu desate, caso se comprove a prática de falta funcional pelo servidor ou pelo parlamentar, a este será aplicada a respectiva sanção diretamente pela própria Administração, pois o ato administrativo disciplinar goza do atributo da auto-executoriedade.

Ocorre que, caso o ato disciplinar lese ou ameace lesar direitos subjetivos do agente público, este poderá recorrer ao Judiciário para que repare a punição arbitrária. Essa arbitrariedade ocorrerá sempre que a Administração não balizar o processo disciplinar de acordo com os parâmetros legais e principiológicos que norteiam sua atividade.

A Constituição Federal assegura expressamente em seu art. 5°, inc. XXXV, a previsão de amplo acesso ao judiciário para aqueles sujeitos que vierem a ter seus direitos ameaçados. Do mesmo modo, para viabilizar esse sagrado direito, acrescenta a garantia do devido processo legal e do contraditório a todos os litigantes, quer em processo judicial ou administrativo.

Em seu art. 41, § 2º, na redação dada pela emenda constitucional nº 19/98, a Carta Magna diz que a demissão do servidor público estável poderá ser invalidada por sentença judicial, sendo ele, nesses casos, reintegrado ao seu cargo de origem. Daí se depreende a possibilidade do servidor socorrer-se ao Judiciário para ver resguardado seu direito ao regular trâmite do seu processo disciplinar.

Ao analisá-lo, o Judiciário ponderará se os aspectos vinculados do ato disciplinar – que é, prima facie, discricionário – foram observados, como a competência do agente, a finalidade, a forma, e outros. Porém, deverá analisar também se a punição está em consonância com os princípios constitucionais e administrativos que regem a Administração, notadamente os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por conduto de sua Quinta Turma, proferiu recentemente acórdão bastante elucidativo nesse sentido, deixando assentado no RMS n° 19.774/SC, DJU 12/12/2005, cujo Relator foi o Ministro José Arnaldo da Fonseca, a possibilidade de revisão judicial do processo disciplinar tendo por supedâneo os princípios constitucionais e administrativos que norteiam a atividade da Administração Pública, especificamente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Eis sua ementa:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PROCESSO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. CAPITULAÇÃO DA INFRINGÊNCIA. DIFERENÇA ENTRE O RELATÓRIO DA COMISSÃO E O ATO INDIGITADO. AGRAVAMENTO DA PENA: DEMISSÃO. SUGESTÃO DA PENA DE SUSPENSÃO. DESPROPORCIONALIDADE. Ao Poder Judiciário não cabe discutir o mérito do julgamento administrativo em processo disciplinar, mas, por outro lado, compete-lhe a análise acerca da proporcionalidade da penalidade imposta, nos termos de farto entendimento jurisprudencial. Mesmo sendo clara em relação à ausência de comprovação de lesão ao erário e de dolo por parte do recorrente, a autoridade coatora entendeu pela presença da desídia, e assim alterou a capitulação da infringência, aplicando, com evidente falta de proporção, a pena demissória. Recurso provido, com a concessão parcial da ordem para determinar a anulação da demissão e a conseqüente reintegração do recorrente, resguardando à autoridade coatora a aplicação da penalidade sugerida pela Comissão. (grifo nosso)

Germana de Oliveira Moraes (2004, p. 110-111), ao dissertar acerca do princípio do acesso à justiça em face do princípio da separação dos poderes, afirma a necessidade de uma interpretação que leve à coexistência de ambos. Diz a autora o seguinte:

Para saber se há compatibilidade entre o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional e o princípio da separação de poderes, é preciso, de um lado, verificar se há hipóteses nas quais a conduta da Administração Pública ocasiona lesão ou ameaça a direito insuscetíveis de apreciação judicial, e, de outro, se há intromissão indevida do Poder Judiciário na atuação administrativa. A limitação do controle jurisdicional da atividade administrativa, a denominada "área de livre decisão", seja de atuação discricionária da Administração Pública, seja de preenchimento do sentido dos conceitos indeterminados, reside nas conseqüências decorrentes desse controle (e não na exclusão de determinados atos), as quais se restringem, na grande maioria das vezes, apenas a invalidar o ato impugnado, sem determinar sua substituição por outro. Assim, no Direito Brasileiro, os princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da separação dos poderes são perfeitamente compatíveis entre si, pois, quando da atividade não vinculada da Administração Pública, desdobrável em discricionariedade e valoração administrativa dos conceitos verdadeiramente indeterminados, na denominada "área de livre decisão" que lhe é reconhecida, resultar lesão ou ameaça a direito, é sempre cabível o controle jurisdicional, seja à luz do princípio da legalidade, seja em decorrência dos demais princípios constitucionais da Administração Pública, de publicidade, de impessoalidade e da moralidade, seja por força do princípio constitucional da igualdade, ou dos princípios gerais de Direito da razoabilidade e da proporcionalidade, para o fim de invalidar o ato lesivo ou ameaçador de direito.

Assim, vemos que o controle jurisdicional, fundado no direito de acesso à justiça, não encontra óbice no postulado da separação dos poderes. Ademais, é dever da Administração Pública observar, ao emitir um ato disciplinar em detrimento de seus agentes, os mesmos requisitos do ato administrativo em geral, devendo, sobretudo, motivá-lo e fundamentá-lo.

No que tange ao processo disciplinar em face dos servidores públicos, se a autoridade incumbida de aplicar a sanção funcional discordar da opinião emitida pela comissão processante em seu parecer, deverá expor os motivos pelos quais assim age. Se não o fizer, tal ato punitivo será anulável por ausência de motivo. Sob esse aspecto, ela estará vinculada aos fatos apurados no processo disciplinar, sendo-lhe aplicável, nesse aspecto, a teoria dos motivos determinantes, só não se vinculando à penalidade recomendada no parecer conclusivo.

3.2.2 Da existência de uma razoável tipificação das condutas

Embora a noção de tipicidade seja mais afeta ao direito penal, em que estão em jogo interesses de suma importância, tanto da sociedade, como do indivíduo, isso não obsta que, em relação às faltas funcionais praticadas pelos servidores públicos da União e pelos parlamentares, quando configurem quebra de decoro, sejam-lhes aplicados as premissas básicas do instituto com o fim de resguardar seus direitos subjetivos.

É verdade que no âmbito penal os interesses em conflito são de maior magnitude (honra, integridade física, liberdade, etc.), o que demandará do Estado e dos entes envolvidos mais cautela no procedimento apuratório. Porém, isso não quer dizer que ali seja a única seara na qual direitos subjetivos individuais estejam em questão, podendo sofrer restrições.

Quando é instaurado processo disciplinar em face de determinado servidor público, a ele poderá ser aplicado, desde que comprovada a falta, sanções de diversos níveis, que vão desde uma reprimenda simples, como a advertência, até a demissão e a cassação de aposentadoria ou disponibilidade [06], assim o agente público será privado da única fonte de subsistência que possui para manter-se e à sua família.

Essa questão ganha maior evidência nos procedimentos disciplinares instaurados em face dos congressistas federais (deputados e senadores), quando acusados de prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar, pois aqui, caso reste comprovada a falta e, nesse sentido, seja a votação de seus pares, haverá a cassação do mandato do parlamentar ímprobo, já que esta é a sanção cominada.

Assim, vê-se que uma tipicidade prévia e mínima das condutas faltosas (servidores) e indecorosas (parlamentares) é fundamental, tanto para resguardar os sujeitos processados de eventuais processos disciplinares, que às vezes são impulsionados mais pela perseguição e pelo arbítrio que pelo zelo da postura dos agentes públicos, como até para legitimar as eventuais sanções que vierem a serem-lhes aplicada.

Nesse sentido, a já referida lei nº 8.112/90 traz os deveres7e as proibições8 aos quais estão vinculados os servidores públicos, de modo que devem ser tomadas por parâmetro para aplicação das penas de ordem estatutária.

Em seu art. 128 está assentado que para aplicação de qualquer penalidade deve-se levar em consideração a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como os antecedentes funcionais do servidor.

Além disso, deve-se destacar que a referida norma correlaciona à sanção cominada as condutas previamente descritas nos arts. 116 e 117, que tratam dos deveres e das proibições dos servidores, como fora mencionado. Assim, aplicar-se-á a pena de advertência nos casos apontados pelo art. 129; a de suspensão nos casos do art. 130; a de demissão para as faltas descritas pelo art. 132; e a de cassação de aposentadoria ou disponibilidade nos casos do art. 134.

José dos Santos Carvalho Filho (2006, p. 614), ao tratar da responsabilidade administrativa dos servidores, ensina que há necessidade da Administração motivar a penalidade aplicada ao agente público, não só como requisito do ato administrativo, mas também porque é daí que será possível averiguar se o administrador atentou para a correlação que deve existir entre a infração funcional e a punição imposta. Eis suas palavras:

[...] Outro é o princípio da motivação da penalidade, necessário para apontar os elementos que comprovam a observância, pelo administrador, da correlação entre a infração funcional e a punição imposta. Por essa razão, em tais atos punitivos devem estar integrados os fatores apurados no processo administrativo disciplinar, bem como os fundamentos jurídicos da punição, rendendo ensejo, por conseguinte, a que possam tais elementos ser aferidos no Poder Judiciário. (grifo nosso)

Idêntico pensamento deve ser seguido em relação aos congressistas acusados de procederem de forma incompatível com o decoro parlamentar.

A Constituição Federal, por muitos taxada de extremamente analítica, pois regula de forma minudente todas as questões que entende relevantes para a formação e desenvolvimento do Estado, contendo assim normais constitucionais formais e matérias, aqui merece elogios.

O constituinte originário, pois, prevendo que as disputas eleitorais sazonalmente travadas pelos grupos políticos em busca do poder poderiam vir a prejudicar o regime democrático e a estabilidade das instituições, restringiu a discricionariedade das casas legislativas (Câmara dos Deputados e Senado Federal) em dizer o que seria ato incompatível com o decoro parlamentar.

Dessa forma, ao preceituar quais as duas principais situações que ofendem a dignidade parlamentar e ensejam a cassação do mandato9, deixou assentado desde logo a possibilidade do Poder Judiciário apreciar o procedimento de cassação e perquirir se houve, ou não, a prática de ato indecoroso, não havendo de se invocar aqui o óbice de que se trataria de ato interna corporis ou de natureza política.

Assim, no caso de processo disciplinar de cassação de mandato de congressista acusado de conduta incompatível com o decoro parlamentar, também deverá haver a motivação e a comprovação da conduta indecorosa, consistente no abuso das prerrogativas individuais ou na percepção de vantagens indevidas.

Nesses dois casos poderá o Judiciário, se provocado pelo agente político, analisar o procedimento disciplinar; se a decisão estiver em consonância com a prova carreada aos autos, o julgamento final no sentido da cassação do mandato ou da absolvição será mantido incólume; caso contrário, se dele divergir, a decisão final poderá ser anulada pelo Judiciário por afronta à Constituição Federal.

Destaque-se que o STF, por ser o juízo competente para julgar as ações mandamentais impetradas em face das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e tendo em vista ainda que o mandado de segurança, além de cabível, será o instrumento processual mais adequado para tutelar os interesses em conflito, será a Excelsa Corte que apreciará as ações deste jaez, que terão por objeto a revisão das decisões do parlamento pendendo ora pela cassação ora pela manutenção do mandato do congressista10.

3.2.3 Da proteção aos direitos subjetivos

Não raro servidores públicos e congressistas, submetidos a procedimento disciplinar por suposta prática de conduta faltosa, batem às portas do Poder Judiciário na tentativa de salvaguardar seus direitos, invocando razões de ordem jurídica para rever ou obstar aquele julgamento que a princípio seria, segundo alguns, de natureza política, e cuja apenação ficaria ao sabor da apreciação discricionária da Administração.

Contudo, é sabido que os conceitos de falta funcional e decoro parlamentar, nos quais incidem os servidores públicos e congressistas, respectivamente, que são submetidos a processo disciplinar, como outros do mundo jurídico, podem ser ponderados pelo Judiciário nos casos submetidos à sua apreciação, pois é esta a instituição que, em último caso, os agentes injustiçados buscarão tutela resguardo aos seus direitos.

Assim, ao servidor público deve ser assegurado a ampla possibilidade de levar seu processo disciplinar a análise do Poder Judiciário, caso se sinta lesado ou na iminência de o sê-lo, pois existe a possibilidade de mácula a direitos subjetivos seus, como o direito à estabilidade no cargo, à impenhorabilidade dos seus vencimentos, dada sua natureza alimentar, ao direito de defesa nos processos judiciais ou administrativos, etc.

Ademais, os termos "falta funcional" e "decoro parlamentar", sendo conceitos jurídicos, ainda que parcialmente indeterminados, não outorgam um "cheque em branco" à Administração para apontar quando um ou outro restará configurado.

Eles podem e devem ser interpretados pelo Judiciário nos casos em que sejam chamados a analisar, em que perquirirá da prática, ou não, de conduta faltosa do servidor ou do agente público à luz dos princípios constitucionais e administrativos. Nesse sentido já decidiu o STF, ao julgar o RMS n° 24.699/DF, DJU 01/07/2005, cuja ementa é a seguinte:

EMENTA: RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMISSÃO. PODER DISCIPLINAR. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. ATO DE IMPROBIDADE. 1. Servidor do DNER demitido por ato de improbidade administrativa e por se valer do cargo para obter proveito pessoal de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, com base no art. 11, caput, e inciso I, da Lei n. 8.429/92 e art. 117, IX, da Lei n. 8.112/90. 2. A autoridade administrativa está autorizada a praticar atos discricionários apenas quando norma jurídica válida expressamente a ela atribuir essa livre atuação. Os atos administrativos que envolvem a aplicação de "conceitos indeterminados" estão sujeitos ao exame e controle do Poder Judiciário. O controle jurisdicional pode e deve incidir sobre os elementos do ato, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração. 3. Processo disciplinar, no qual se discutiu a ocorrência de desídia – art. 117, inciso XV da Lei n. 8.112/90. Aplicação da penalidade, com fundamento em preceito diverso do indicado pela comissão de inquérito. A capitulação do ilícito administrativo não pode ser aberta a ponto de impossibilitar o direito de defesa. De outra parte, o motivo apresentado afigurou-se inválido em face das provas coligidas aos autos. 4. Ato de improbidade: a aplicação das penalidades previstas na Lei n. 8.429/92 não incumbe à Administração, eis que privativa do Poder Judiciário. Verificada a prática de atos de improbidade no âmbito administrativo, caberia representação ao Ministério Público para ajuizamento da competente ação, não a aplicação da pena de demissão. Recurso ordinário provido. (grifo nosso)

No que tange aos congressistas, também lhes deve ser assegurada a possibilidade de revisão judicial de seus processos de cassação por suposta quebra de decoro, pois aqui também está em jogo direitos individuais seus, além da expectativas de seus eleitores, que o investiram no mandato.

O STF já se pronunciou sobre essa questão, e o Min. Carlos Velloso, em seu voto, no julgamento do MS nº 21.564/DF, enfatizou a possibilidade de revisão judicial de "atos políticos" quando em jogo direitos subjetivos. Eis o trecho do seu voto:

Onde houver a alegação no sentido de que um direito subjetivo, público ou privado, está sendo violado, lá estará o juiz para curar a lesão. É certo que há atos de natureza puramente política, tanto do Congresso quanto do Executivo, que estão imunes ao controle jurisdicional. Todavia – a lição é velha, mas é atual, é a do maior constitucionalista brasileiro, é de Ruy – "a violação de garantias individuais, perpetradas à sombra de funções políticas, não é imune à ação dos tribunais." [...]

É sabido que decoro parlamentar significa o dever, comum aos legisladores, de procederem com ética, probidade e zelo na sua vida pública. Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1972) diz que já na CF/69 houve uma delimitação do que se entedia por decoro parlamentar, pois aquela Carta Política restringiu o âmbito do termo, não havendo infração ao dever de decoro, apta a ensejar a perda do mandato eletivo, senão quando a conduta do congressista configurasse ação ou omissão descrita como tal, na Constituição ou no regimento interno da Casa Legislativa.

Em face dessa evolução conceitual, e tendo em vista que o procedimento disciplinar que apura a prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar pode extirpar direitos subjetivos do indivíduo e da sociedade, o Poder Judiciário, nos casos já previstos constitucionalmente, pode valorar seu conteúdo e dizer se, em determinada situação, submetida à sua apreciação (CF, art. 5º, XXXV) houve ou não a prática de conduta indecorosa.

Esses casos são: i) o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional; e ii) a percepção de vantagens indevidas. Frisamos ainda que o uso das imunidades parlamentares, no entanto, não foi conferida ao congressista por suas qualidades pessoais, mas sim em virtude das atribuições do seu cargo.

Por outro lado, a fiscalização do Congresso Nacional não pode redundar numa "cassa às bruxas", feita de forma arbitrária e desproporcional. A esse respeito, Eduardo Fortunato Bim (2006, p. 77) diz que "o exercício das imunidades não pertence tão subjetivamente ao próprio parlamento", e pode vir a ser controlado se o parlamentar não extrapolou do "regular exercício das imunidades".

Nesse sentido adverte Miguel Reale (1969, p. 88):

Grave risco cercearia o regime democrático se "faltar ao decoro parlamentar" viesse a significar, também, pretensos excessos praticados pelo parlamentar no exercício do seu dever de crítica e de fiscalização dos negócios públicos, a começar pelos da própria Casa a que pertence. (grifo nosso)

Assim, não há que se falar que a punição das faltas funcionais dos servidores públicos ou dos parlamentares sejam atos políticos, discricionários ou interna corporis, cuja apreciação e ponderação ficaria ao exclusivo alvedrio da autoridade administrativa.

Na verdade, será plenamente cabível o controle judicial do processo disciplinar em ambos os casos, visto que há a possibilidade, ainda que potencial, de ofensa a direitos fundamentais dos sujeitos processados.

Desse modo, apresentadas as premissas acima no sentido do cabimento do controle jurisdicional do processo disciplinar instaurado, tanto em face dos servidores públicos, quando cometem falta funcionais, quanto em face dos parlamentares, quando infringem o dever de decoro, encerra-se aqui o presente capítulo. Passamos agora fazer as derradeiras ponderações quanto ao assunto ora estudado.


CONCLUSÃO

Pelo exposto, vemos que o processo disciplinar instaurado em face dos servidores públicos e dos parlamentares não está, assim como tantos outros atos estatais, imune à defendida sindicabilidade jurisdicional, uma vez que lhes é assegurado constitucionalmente o direito de acesso à justiça, podendo o Judiciário corrigir os eventuais abusos praticados pela Administração, cometidos sob o pretexto de aplicar-lhes as sanções estatutárias.

Além disso, a Administração deve estrita obediência ao princípio da legalidade, em face da Constituição Federal consagrar sua formação sob a forma de Estado Democrático de Direito. Assim, essas sanções, aplicadas com o intuito de sancionar os servidores públicos que cometem faltas funcionais, poderão ser revistas judicialmente nos casos em que a Administração Pública não se atenha aos princípios constitucionais e administrativos que norteiam sua atividade, sobretudo os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Nesse sentido, a alegação de que a escolha e a quantificação da sanção estatutária estariam contidas no mérito do ato disciplinar, sendo este de natureza discricionária ou política, não é suficiente para afastar a possibilidade de controle jurisdicional, já que é reconhecida, doutrinária e jurisprudencialmente, a força normativa dos princípios jurídicos mencionados, aos quais deve haver observância.

Sob esse aspecto, os processos de cassação de mandato dos parlamentares acusados de prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar poderão igualmente ser revistos pelo Supremo Tribunal Federal, já que a concepção que se tem do termo não é de exclusiva valoração das Casas Legislativas, além de estar em jogo direitos subjetivos do congressista e de seus eleitores, que não poderão ser extirpados abruptamente, sem causa ou comprovação, ainda que indiciária, da prática de conduta indecorosa.

Não obstante sejam suscitados óbices ao cabimento do controle jurisdicional do processo disciplinar, estes restaram suplantados frente à garantia fundamental da sindicabilidade judicial (CF, art. 5º, XXXV), que há de prevalecer.

Desta feita, restou demonstrado que a existência de autonomia entre as instâncias administrativa e judicial, a previsão de uma razoável tipificação das condutas tanto na lei nº 8.112/90, em relação aos servidores públicos, quanto na própria Constituição Federal (art. 55, § 2º), em relação aos parlamentares, do que vem a ser falta funcional ou falta de decoro parlamentar, num e noutro caso, aliado ainda ao fato do princípio da motivação dos atos administrativos, além de estarem em jogo interesses individuais, que merecem proteção do Estado, levam-nos a concluir que é cabível o controle jurisdicional do processo disciplinar, pois há potencial lesividade a direitos fundamentais.

Dessa forma, constata-se que o cabimento do aludido controle em favor dos sujeitos processados em nada subjuga a Administração Pública, já que só promove a efetividade do ordenamento jurídico e do princípio da legalidade, objetivos colimados, tanto pelo Judiciário, quanto pela Administração, não havendo ofensa ao princípio da separação dos poderes.

Assim, e sem pretensão de esgotar a análise do tema ora em estudo, conclui-se pelo cabimento do controle do processo administrativo disciplinar nos dois aspectos aqui levantados, isto é, tanto aquele que visa a apurar a prática de faltas funcionais praticadas pelos servidores públicos, quanto o manejado para investigar a prática de conduta incompatível com o decoro parlamentar por parte dos membros do Congresso Nacional.


REFERÊNCIAS

Livros e artigos:

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Notas

01 A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

02 Cf. lei nº 8.112/90, art.149.

03 Cf. lei nº 8.112/90, art. 165.

04 Cf. CF/88, art. 55.

05Cf. CF/88, art. 53, caput

06 Cf. lei nº 8.112/90, art. 127.

07 Cf. lei nº 8.112/90, art. 116.

08 Cf. lei nº 8.112/90, art. 117.

09 Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

[...]

II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

[...]

§ 1°. É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.

10 Cf. CF/88, art. 102, I, d.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINHEIRO, Paulo César Morais. Controle jurisdicional do processo disciplinar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1878, 22 ago. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11622. Acesso em: 26 abr. 2024.