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O crescimento e a redução do Estado brasileiro.

A permanência da crise fiscal

O crescimento e a redução do Estado brasileiro. A permanência da crise fiscal

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Este artigo apresenta reflexões sobre o crescimento e a redução do Estado brasileiro e a permanência da crise fiscal, com sucessivos aumentos de arrecadação.

Sumário:1. O crescimento do Estado. 2. O crescimento e a redução do Estado brasileiro. 3. A permanência da crise fiscal e o crescente aumento da carga tributária no Brasil. 4. A crise da legitimidade da tributação. 5. Conclusões. 6. Referências bibliográficas.

RESUMO: Este artigo apresenta reflexões sobre o crescimento e a redução do Estado brasileiro e a permanência da crise fiscal, com sucessivos aumentos de arrecadação. Também analisa a crise de legitimidade da tributação e a necessidade de ajustes no processo de redução da estrutura do Estado, com uma melhor gestão e transparência na administração de recursos públicos, mediante a instituição (ou reforço) de mecanismos de participação popular (controle social).

Palavras-chave: Estado – privatização – crise fiscal – legitimidade - tributação – recursos públicos.

ABSTRACT: This article presents reflections about the increase and the reduction of the Brazilian State and the permanence of the fiscal crisis, with successive increases of collection tax. Also it analyzes the crisis of legitimacy of the taxation and the necessity of adjustments in the process of reduction of the structure of the State, with one better management and transparency in the administration of public resources, by means of the institution (or reinforcement) of mechanisms of popular participation (social control).

Word-key: State - privatization - fiscal crisis - legitimacy - taxation - public resources.


1. O crescimento do Estado:

        Quando se estuda a evolução do Estado até os dias de hoje, percebe-se com relativa facilidade que as principais causas do atual desequilíbrio financeiro do Estado, de um modo geral, foram a atribuição de um maior número de tarefas ao Estado e o seu conseqüente crescimento.

        Após a derrocada dos Estados Absolutistas, houve o surgimento do Estado Liberal, fundado nas idéias da proteção da liberdade e da igualdade.

        Inspirado pela obra de Adam SMITH, o modelo liberal de absenteísmo na atividade econômica mostrou-se insuficiente para debelar as distorções econômicas e sociais que ele mesmo provocou, afetando mecanismos de mercado que levaram à Grande Depressão, na década de 30.

        "(...) em termos históricos, podemos afirmar que o modelo liberal, consolidado ao longo do século XIX e embasado no binômio Estado/indivíduo (com a exclusão do social), entrou em crise em fins do mesmo século e primórdios do século XX, ao desencadear-se o processo de politização da sociedade, antes excluída da normatização constitucional, resultante da agudização das contradições de classe do modelo capitalista." [01].

        Após a II Guerra Mundial consolidou-se um novo modelo de Estado: o Estado Social (também denominado "welfare state", Estado do Bem-Estar, Estado Providência, Estado do Desenvolvimento, Estado Social de Direito), cuja ascensão, fortemente intervencionista, considerava "ser sua função assumir directamente a responsabilidade pela execução de um amplo programa de tarefas prestacionais teleologicamente vinculadas pelos textos constitucionais à prossecução do bem-estar" [02].

        Neste novo modelo superam-se as idéias liberais de cunho individualista e da igualdade meramente formal (as quais, frise-se, ensejaram profundas desigualdades sociais) para a busca de uma igualdade em sentido material.

        Observa-se, no período (final do século XIX e primeiras duas décadas do século XX) uma "abundante produção legislativa que atribuiu ao Estado as competências de intervenção na economia" [03], firmando-se, como grandes marcos históricos da ascensão do Estado Social as Constituições do México (1917) e Weimar (1919).

        Assim, atribui-se ao Estado o dever de intervir na ordem econômica, para o fim de corrigir as distorções provocadas pelo liberalismo até então vigente.

        Maria Sylvia Zanella DI PIETRO comenta este fenômeno explicando que:

        "(...) com o crescimento dos chamados direitos sociais e econômicos (...) o Estado (...) ampliou desmesuradamente o rol de suas atribuições, adotando diferentes atitudes: a. algumas atribuições foram assumidas pelo Estado como serviços públicos, entrando na categoria de serviços públicos comerciais, industriais e sociais; para desempenhar esses serviços, o Estado passou a criar maior número de empresas estatais e fundações; b. outras iniciativas, também de natureza econômica, o Estado deixou na iniciativa privada, mas passou a exercê-las a título de intervenção no domínio econômico, por meio de sociedades de economia mista, empresas públicas e outras empresas sob controle acionário do Estado; c. finalmente, outras atividades, o Estado nem definiu como serviço público nem passou a exercer a título de intervenção no domínio econômico; ele as deixou na iniciativa privada e limitou-se a fomentá-las, por considerá-las de interesse para a coletividade. Desenvolve-se, então, o fomento como uma atividade administrativa de incentivo à iniciativa privada de interesse público. O Estado fomenta a iniciativa privada por diferentes meios, como os honoríficos (prêmios, recompensas, títulos e menções honrosas), os jurídicos (outorga de privilégios próprios do Poder Público que outras entidades não têm) e os econômicos (auxílios, subvenções, financiamentos, isenções fiscais, desapropriações por interesse social, etc.) [04].

        Em conseqüência, com o abandono do reconhecimento do papel até então meramente complementar do Estado, assistiu-se a um crescimento excessivo do mesmo, com reflexos negativos que, nas lições de Maria Sylvia Zanella DI PIETRO podem ser sintetizados:

        a)O Estado, que até então era prestador de serviços passa a ser também um Estado empresário, investidor (ocasionando o fortalecimento do Poder Executivo e a atribuição de poderes normativos ao mesmo, com inevitáveis reflexos negativos nos princípios da separação dos poderes e da legalidade).

        b)Com o crescimento da máquina administrativa foram adotados métodos burocráticos de especialização (organização em carreiras), hierarquização (atuação homogênea) e subordinação à lei (e, assim, a impessoalidade) que, ao serem aplicados indistintamente a todas as atividades do Estado, conduziram à ineficiência do mesmo, na prestação dos serviços (deficiência esta agravada pelo volume de atividades por ele assumidas e pelas crises financeiras havidas, em especial, na América Latina).

        c)O princípio da legalidade sofre nova configuração: abandonaram-se as normas de Direito Natural (então defendidas no ideário liberal) pelo positivismo jurídico, que passou a analisar a lei despida de qualquer conteúdo de justiça (tendência esta perfilhada também pelo Poder Judiciário, que não acompanhou o crescimento e não absorveu a complexidade dos inúmeros conflitos surgidos com o novo perfil do Estado).

        d)Por fim, diferentemente do Estado liberal (que não desejava a ação do Estado senão em termos bem restritos e definidos), no Estado social o indivíduo passou a exigir a ação estatal: "a sociedade quer subvenção, financiamento, escola, saúde, moradia, transporte; quer proteção ao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio histórico e artístico nacional e aos mais variados tipos de interesses difusos e coletivos", multiplicando e se tornando mais complexas as relações entre a Administração e o administrado [05].

        A estes aspectos negativos, adicionamos um fator de suma importância em termos de estruturas de mercado: a abundante criação de novas normas tributárias, abrangendo novas hipóteses de incidência, para atender à crescente demanda de da arrecadação.

        Em termos de controle, as estruturas idealizadas no período liberal, embora modificadas no decorrer do tempo, não conseguiram atender adequadamente o processo de evolução e crescimento do Estado.

        Assim, ao mesmo tempo em que o Estado foi convocado a atuar nos campos econômico e social (para assegurar justiça social), passou a colocar em risco a liberdade individual (com restrições que vão desde a simples limitações ao exercício de direitos até atuação direta no setor da atividade privada, com o agravante de não alcançar o objetivo inerente ao Estado Social – assegurar o bem comum).

        As conseqüências negativas do Estado Social demandaram novas transformações no papel do Estado: acrescentou-se o elemento "democrático" ao Estado Social, que passou a ser concebido como Estado de Direito Social e Democrático (é de Direito – protetor das liberdades individuais, sem deixar de ser Social – protetor do bem comum). Insere-se o elemento democrático (que já se encontrava presente, na formulação anterior, frise-se) com uma nova roupagem, a saber: "participação popular no processo político, nas decisões do Governo, no controle da Administração Pública" [06].

        No Estado Democrático de Direito, o princípio do interesse público assume nova feição, passando da concepção utilitarista (inspirado nas doutrinas contratualistas liberais, no qual o Direito assumia o papel de proteger as liberdades individuais, como tutela do bem-estar geral, em sentido puramente material) para se humanizar: preocupa-se não só com bens materiais, mas também como valores considerados essenciais à uma existência digna, o que exige do Estado uma atuação com vistas a diminuir as desigualdades sociais e levar à toda comunidade o bem-estar social.

        O princípio da legalidade, por seu turno, também assume novos contornos: não basta ao Estado submeter-se à lei, mas sim a todos os princípios que se encontram na base do ordenamento jurídico, estejam positivados ou não.

        Ao Estado Democrático de Direito acresce-se a idéia de Estado subsidiário (sua formulação é anterior, remontando aos fins do século XIX e começo deste século, com a Doutrina Social da Igreja), cujas idéias que lhes são inerentes são:

        a) respeito aos direitos individuais (o Estado deve manter neutralidade e abster-se de intervir em atividades as quais a iniciativa privada pode atuar autonomamente e com seus próprios recursos);

        b) o Estado deve exercer atividades de incentivo, coordenação e fiscalização da iniciativa privada, deixando a esta o risco de seus empreendimentos;

        c) parceria entre o público e privado, dentro do objetivo de subsidiar a iniciativa privada, quando esta é deficiente. O bem comum, na definição do Papa João XXIII, na Mater et Magistra é "o conjunto de condições sociais por onde os homens tornam-se capazes de alcançar mais facilmente a plenitude de seu desenvolvimento".

        João Paulo II, na Centesimus Annus afirma que o Estado, na busca do bem comum, deve respeitar a autonomia dos indivíduos, das famílias, das associações de classe, grupos econômicos, partidos políticos, assentando-se, assim, a idéia da subsidiariedade do Estado.

        Ensina Maria Sylvia Zanella DI PIETRO que o princípio da subsidiariedade, ao se estabelecer na própria base da nova concepção do Estado de Direito Social, implica a idéia de que os direitos fundamentais não constituem apenas uma barreira à atuação do Estado (como no período liberal), mas significam a própria razão de ser do Estado, a quem compete promover, estimular e criar condições para que o indivíduo se desenvolva livremente e igualmente dentro da sociedade (em especial condições de participação do cidadão no processo político e controle das atividades governamentais).

        Em outras palavras, desloca-se o foco para a centralidade da pessoa humana, no âmbito do ordenamento social, donde decorre que a idéia que o princípio da subsidiariedade apresenta duas vertentes: a) sentido vertical (relações entre entes territoriais e o governo, ou seja, governos centrais e locais); b) sentido horizontal (relações entre grupos sociais e nas relações entre público e privado).

        Isto significa afirmar que decisões de interesses comuns da coletividade devem ser tomadas preferencialmente por instituições mais próximas ao cidadão, competindo ao governo central atuar apenas quando os entes locais não possam fazê-lo sozinhos.

        Contudo, mesmo este modelo demonstrou sinais de desgaste.

        "Curiosamente, no entanto, a hipertrofia do Estado de bem-estar, por alguns mesmo qualificado do ‘Estado de mal-estar’, levou a que se reflectisse sobre a dimensão do papel social e econômico do Estado, incluindo a amplitude da intervenção de uma Administração Pública verdadeiramente tentacular sobre a esfera da sociedade civil e do indivíduo: o final dos anos setenta e o início dos anos oitenta, primeiro pelos partidos políticos de orientação conservadora, mas, a partir de meados dos anos oitenta, também pelos partidos de matriz-socialista, transformou a redução do peso do Estado num objectivo programático de todos os governos" [07].

        Dentro deste panorama, em respostas à crise institucional do Estado, ganharam corpo diversas correntes políticas e ideológicas: a) a esquerda tradicional; b) a centro-esquerda pragmática; c) a direita neoliberal; d) centro-esquerda pragmática, social-democrática ou social-liberal [08].

        Da coalizão entre as correntes de centro-esquerda e a centro-direita surgiram iniciativas mundiais no sentido de proceder a uma reforma do Estado, para torná-lo menor e mais voltado para as atividades que lhes são específicas. Assim, os componentes ou processos básicos de reforma do Estado seriam:

        "a) delimitação das funções do Estado, reduzindo seu tamanho em termos principalmente de pessoal através de programas de privatização, terceirização e ‘publicização’ (este último processo implicando na transferência para o setor público não-estatal das (sic) serviços sociais e científicos que hoje o Estado presta);

        b) redução do grau de interferência do Estado ao efetivamente necessário através de programas de desregulação que aumente o recurso aos mecanismos de controle via mercado, transformando o Estado em um promotor da capacidade de competição do país a nível internacional ao invés de protetor da economia nacional contra a competição internacional.

        c) o aumento da governança do Estado, ou seja, da sua capacidade de tornar efetivas as decisões do governo, através do ajuste fiscal, que devolve autonomia financeira ao Estado, da reforma administrativa rumo a uma administração pública gerencial (ao invés de burocrática) e a separação, dentro do Estado, entre a formulação de políticas públicas e a sua execução; e finalmente,

        d) o aumento da governabilidade, ou seja, do poder de governo, graças à existência de instituições políticas que garantam uma melhor intermediação de interesses e tornem mais legítimos e democráticos os governos, aperfeiçoando a democracia representativa e abrindo espaço para o controle social ou democracia direta" [09].

        Assim, a exigência da redução do tamanho do Estado ganhou maior expressão, especialmente, após a queda dos regimes comunistas europeus (no final dos anos oitenta) e o subsequente desmantelamento das máquinas estaduais [10].

        Em resumo: "Fatores como inflação, recessão, desemprego, déficit público, instabilidade monetária, forte endividamento, entre outros, formaram um ambiente propício para a discussão acerca da crise do Estado e do seu papel" [11] e consequentemente, abriram espaço para que, no final dos anos 70, o governo Thatcher desencadeasse o "fenônemo privatizador", o qual, inicialmente se alastrou por toda a Europa, alicerçado principalmente em argumentos de natureza econômica e financeira, gerando reflexos até a década de 90, onde se assistiu a uma verdadeira onda de privatizações.


2. O crescimento e a redução do Estado brasileiro:

        Nos anos 20 e após a Revolução de 1930, na era Vargas, intensifica-se um processo de descentralização do Estado e o fortalecimento da presença do Estado no domínio econômico, com a criação de autarquias, as quais exerciam não apenas funções administrativas, mas também de natureza industrial ou comercial. Após a II Guerra Mundial, tais atividades passaram a ser exercidas por pessoas jurídicas de direito privado (sociedades de economia mista e empresas públicas).

        Durante o governo militar realizaram-se grandes obras de infra-estrutura necessárias ao desenvolvimento do país, ampliando-se, neste esforço, a órbita da atuação do Estado na economia (com a criação de grande número de entidades de administração indireta destinadas a desempenhar papéis de agentes econômicos quanto pela edição de diversas regras jurídicas disciplinadoras da atividade econômica) [12].

        Paralelamente a este movimento ocorre uma outra tendência de intervenção econômica, mediante o fomento público ou crédito concedido por entidades bancárias oficiais (Banco do Brasil e BNDES) à entidades privadas, o que teve uma consequência interessante: as empresas devedoras dessas instituições, quando impossibilitadas de pagarem os débitos, tomavam-nas como sócias (muitas vezes majoritárias). Por conta disto, no decorrer de alguns anos, a União, além de possuir no quadro da Administração indireta sociedades de economia mista e empresas públicas, tornara-se proprietária de uma variada gama de empresas privadas, que possuíam diversos fins, frequentemente desvinculados ao interesse público.

        Note-se que o modelo de crescimento adotado no país, nas décadas de 60 e 70, associava o setor produtivo à presença do Estado: havia forte dependência da iniciativa privada em relação ao Estado (na medida em que estaria sob sua responsabilidade todo investimento necessário para a ampliação e manutenção da infra-estrutura necessária ao crescimento). Este quadro resultou em um agigantamento do Estado, que tinha por característica ser excessivamente controlador e burocrático.

        A partir dos anos 70, por diversas razões, que vão desde razões pragmáticas (altos custos e déficits insuportáveis [13]), políticas e ideológicas, ganhou força a idéia da redução do tamanho do Estado, não ao retrocesso ao Estado mínimo, mas que se liberasse a sociedade da forte presença do Estado como agente econômico e dos excessos da regulamentação exagerada.

        Privatização e desregulamentação portanto, eram as palavras de ordem e que, em diferentes níveis, passou a ser adotada pelas principais nações ocidentais. Na América Latina a ênfase se deu nas privatizações (sendo marcante a influência do FMI), nos Estados Unidos, o meio escolhido, para reduzir o tamanho do Estado, foi a desregulamentação [14].

        Assim, partindo de iniciativas tímidas já no Governo de Figueiredo (1981-1984), passando pelos Governos de José Sarney (1985-1989), Fernando Collor de Mello (1990-1992), Itamar Franco (1992-1994) e Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) o Estado brasileiro passou por significativa redução, com a venda de diversas empresas públicas e sociedades de economia mista, tanto lucrativas como deficitárias. Contudo, foi na gestão de Fernando Henrique Cardoso que houve o auge do processo de privatização, mediante a quebra de monopólios tradicionais (para tornar competitivas atividades antes exercidas com exclusividade pelo setor público), a delegação de serviços públicos ao particular – mediante autorização, permissão e concessão e parcerias com entidades públicas e privadas para gestão associada de serviços públicos ou serviços de utilidade pública, por meio de convênios, consórcios e contratos de gestão, bem assim a intensificação da terceirização.

        Na década de 90, o Estado brasileiro reduziu o seu tamanho, mas a crise fiscal (que seria uma das justificativas para a redução do Estado) permaneceu.


3. A permanência da crise fiscal e o crescente aumento da carga tributária no Brasil:

        Apesar de o Estado brasileiro ter passado por um significativo processo de redução de suas dimensões, na década de 90, possibilitando uma reordenação de sua posição na economia, mediante a transferência à iniciativa privada atividades antes exploradas pelo setor público, pouco se avançou para a diminuição da sua estrutura em termos de Administração direta.

        Em outras palavras, muito se evoluiu para reduzir-se o tamanho da Administração indireta, com a venda de ativos de empresas públicas e sociedades de economia mista, mas pouco se avançou para a redução da estrutura da Administração direta (que, ao revés, aumentou de tamanho e ganhou novas ramificações, com a criação de novas autarquias: as agências reguladoras).

        Ou seja, o esforço de reduzir o tamanho do Estado brasileiro, apesar de trazer benéficos efeitos (eliminando da estrutura estatal empresas deficitárias e cujos riscos financeiros oneravam os cofres públicos) e para o mercado (mediante o incremento da concorrência), não debelou a crise fiscal, pelo simples e elementar fato de que não houve uma redução da estrutura da Administração direta, que permaneceu, em alguns casos, com os mesmos vícios históricos de ineficiência e baixos padrões de qualidade, não obstante o crescente aumento de recursos para o custeio desta estrutura [15].

        É certo que no estágio de evolução de nossa sociedade algumas tarefas devem permanecer aos cuidados do Estado – atividades próprias e indelegáveis ao particular (segurança, defesa, justiça, relações exteriores, legislação, polícia), sobre as quais deve prevalecer o financiamento através da tributação. Tais tarefas são constitucionalmente cometidas ao Estado e, portanto, continuam sob sua tutela.

        Contudo, ainda não houve uma necessária mudança de mentalidade na gestão de tais tarefas: os recursos humanos, materiais e financeiros do Estado não se voltam preferencialmente em benefício do cidadão, não há, ainda, qualidade e eficiência na consecução destes objetivos estatais.

        O Estado brasileiro continua a adotar uma forma burocrática da organização da Administração Pública (baseada em idéias de hierarquia, especialização, impessoalidade, controle formal – que deveria ser reservada apenas para o núcleo estratégico constituído pelos três Poderes, como órgãos de Governo, Ministério Público e órgãos de assessoramento direto do chefe do Poder Executivo).

        Por tais motivos, a estrutura estatal continua congestionada e provoca o aumento de déficits orçamentários (saliente-se: não se sustenta a idéia de que a razão de tais déficits sejam exclusivamente oriundos da estrutura da Administração direta, todavia, é inegável que a estrutura ainda é ineficiente, gera gastos desnecessários e contribuiu para o agravamento da crise fiscal, demandando aumento da tributação para o custeio de atividades essenciais do Estado [16], contribuindo, como um todo, para o desequilíbrio financeiro do Estado).

        Luis Roberto BARROSO, abrindo um panorama mais amplo no exame do desequilíbrio financeiro do Estado, arrola, entre outras causas: a) na partilha de competências político-administrativas, há sobreposição de superposições de atribuições; b) alguns tributos municipais só possuem expressão econômica em áreas desenvolvidas; c) no âmbito do ICMS, há prejuízos com a guerra fiscal e distorções pelo regime diferenciado de alíquotas internas e interestaduais; d) Estados e Municípios desenvolveram crônica dependência por recursos alternativos à partilha constitucional (os quais entraram em colapso com o esgotamento de oferta de empréstimos externos e escassez e controle de crédito interno, gerando inadimplência); e) insuficiência da arrecadação; f) descontrole de gastos, em especial, com o pessoal e particularmente com inativos [17].

        A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 04 de maio de 2000), representa um avanço para a superação de tais dificuldades, porquanto definiu responsabilidades ao administrador público, tais como limites de gastos com pessoal, proibição de criação de despesas de duração contínua sem contrapartida segura de receitas, abrindo um novo cenário no que se refere à transparência e controle da gestão pública. Contudo, ainda há um grande caminho a ser trilhado.


4. A crise de legitimidade da tributação:

        Os objetivos que ensejaram as propostas de redução do Estado brasileiro (torná-lo mais moderno, ágil e eficiente, capacitando-o a atender grande parte das demandas sociais com eficácia e qualidade) ainda não foram atingidos e, pior, não se assistiu uma redução da pressão fiscal sobre a economia privada.

        É evidente que a diminuição do papel do Estado e, consequentemente, a redução do seu tamanho não é a fórmula mágica para redução do déficit fiscal. Mas a permanência de um Estado que, mesmo reduzido, não atende as demandas sociais que ainda remanescem sob sua custódia, não gerindo adequadamente os recursos que arrecada, abre um campo propício para uma outra crise: a crise da legitimidade da tributação [18].

        E esta crise gera a adoção de condutas evasivas à tributação [19], corrosão nas contas públicas e maior pressão sobre setores produtivos onde a arrecadação e fiscalização são mais eficazes, gerando efeitos nas estruturas de mercado, que reagem negativamente, mediante a fuga de investimentos no país. O reflexo é a perda de recursos necessários ao financiamento das demandas sociais as quais o Estado se obriga a suprir.

        Por outro lado, esta crise de legitimidade provoca um massivo descumprimento dos preceitos tributários, esvaziando o próprio conteúdo da produção normativa [20], que, ao perder efetividade, provoca indiscutíveis prejuízos à promoção social dos indivíduos e dos grupos sociais.

        Esta mesma crise também esvazia o princípio da solidariedade na tributação, com o possível o risco de se perder "o conceito de responsabilidade pública, que os cidadãos deixem de ter consciência que uma parte de suas vidas deve ser gerida em comum com os outros" esvaziando o "significado real da solidariedade, como ensina a etimologia do termo (do latim "in sólido")" [21].

        Assim, a "questão que se põe é que nem sempre a teoria é de fácil aplicação prática. Como toda transformação social, a adoção de uma Administração Pública moderna - absolutamente comprometida com o cidadão, amplamente eficiente e submetida ao controle social - demanda tempo. A sociedade e o próprio Estado precisam de um tempo de adaptação para se acostumarem com novas idéias, novos conceitos e novas formas de se viver. É o que ocorre com a concepção de controle social" [22].

        Ou seja, no amplo e complexo processo de redução da estrutura do Estado, o esperado aumento de eficiência e qualidade na consecução das tarefas públicas e, se possível, diminuição da carga fiscal (ou, no mínimo, transparência e melhor gestão dos recursos advindos da tributação), demanda a criação (ou reforço) de mecanismos de participação popular [23], ao lado, do estrito acompanhamento dos Poderes Legislativo e Judiciário.


5. Conclusões:

        O tamanho do Estado foi, no decorrer do tempo, moldado por períodos históricos cíclicos: ora apregoou-se um Estado mínimo (Estado liberal), ora advogou-se por um Estado máximo (Estado Social) [24].

        As crises verificadas em tais modelos ensejaram alterações estruturais de grande importância e de significativas conquistas econômicas e sociais.

        Contudo, no estágio atual de evolução do Estado, em particular, o Estado brasileiro, em que pesem os esforços para a sua redução, ainda demanda alguns ajustes. A estrutura administrativa nacional ainda é ineficiente e onera os cofres públicos, a gestão inadequada de recursos gera insatisfação, abrindo espaço para uma crise de legitimidade da sua própria base de financiamento (tributação).

        O almejado aumento de eficiência e qualidade nas atividades ainda cometidas ao Estado (segurança, defesa, justiça, relações exteriores, legislação, polícia) e que são financiadas através da tributação, ainda não se verificou em termos amplos e concretos, sensíveis à grande parte da população.

        A "nova" dimensão da atuação do Estado no domínio econômico, com a redução de sua participação direta na prestação de serviços ainda não é plena, pois ainda remanescem estruturas arcaicas e burocráticas alojadas no seio do Estado brasileiro, impondo a necessidade de se redimensionar tal estrutura. Ainda, se faz necessária a criação (ou reforço) de mecanismos de participação popular, a fim de possibilitar um controle social, tanto na arrecadação quanto na gestão dos recursos obtidos.


6. Referências Bibliográficas:

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Notas

  1. CORRÊA, Darcísio. A construção da cidadania: reflexões histórico-políticas. Ijui: UNIJUÍ, 1999, p. 175. Apud BRENDLER, Karina Meneghetti. A Panacéia do Estado Social e a Crise Fiscal. Publicada no Juris Síntese nº 53 - Mai/Jun de 2005.
  2. OTERO, Paulo. Coordenadas Jurídicas da Privatização da Administração Pública, in "Os Caminhos da Privatização da Administração Pública", Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra: Coimbra Editora, 2001. p. 35.
  3. HAVA, Ben-Hur. A Reforma do Estado Brasileiro e as Perspectivas de sua Implementação: das Mudanças Efetivadas ao Controle Necessário. Publicada no Juris Síntese nº 44 - Nov/Dez de 2003.
  4. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2003, p. 22.
  5. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 24.
  6. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit. p. 25.
  7. OTERO, Paulo. op. cit. p. 35.
  8. Sinteticamente: a) esquerda tradicional: entrou em crise e ficou paralisada, porquanto diagnosticou erroneamente a crise; b) centro-direita pragmática: defendiam o ajuste fiscal e liberação dos preços e a liberalização comercial, privatização e desregulação; c) direita neoliberal,ganhou adeptos com a temática do Estado mínimo e a necessidade de privatizar, liberalizar, desregular e flexibilizar os mercados,de forma radical, devendo o Estado assumir uma política macroeconômica neutra (ou seja, o Estado deveria objetivar apenas o déficit público zero e a emissão de moeda, abstendo-se de realizar políticas industriais e sociais); d) centro-esquerda pragmática, diagnosticou com clareza a grande crise dos anos 80, propôs a reconstrução do Estado, para que este possa, em um novo ciclo,voltar a complementar e corrigir, efetivamente, as falhas de mercado, mantendo um perfil mais modesto de intervenção (sem chegar, entretanto, ao radicalismo do Estado mínimo). PEREIRA, Bresser. A Reforma do estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997, Caderno 1, p. 10. pp. 16/17.
  9. PEREIRA, Bresser. op. cit. pp. 18/19.
  10. Almiro do Couto e Silva comenta a tendência mundial de reexaminar algumas concepções jurídicas bem arraigadas, nos termos seguintes: "Não será necessário dizer que tal tendência está intimamente relacionada com a circunstância de haver os Estados Unidos, após a segunda grande guerra mundial e, mais fortemente ainda depois da queda do muro de Berlim, assumido posição hegemônica numa economia que hoje é globalizada. Mas não só. Existem outras causas que são, pelo menos, igualmente importantes. Ela resulta também da crise do Estado Social, do Estado Providência ou do Welfare State, o qual, com seu gigantismo, suas imensas despesas e seus déficits públicos, sua ampla intervenção no campo econômico e no campo social, deu origem e alimentou uma forte reação no plano teórico, representada pela corrente de pensamento chamada de neo-liberal.Ao longo das últimas décadas do século passado o neo-liberalismo, que ganhara consistência e expressão com a difusão das obras de Friederich von Hayeck e o crescente prestígio dos economistas da escola de Chicago, liderados por Milton Friedmann, acabou por influenciar poderosamente as políticas econômicas e sociais dos Estados Unidos e da Inglaterra, respectivamente nos governos Reagan e Thatcher. É claramente perceptível, por igual, a influência do liberalismo, pelo favorecimento da concorrência e do mercado,em normas fundamentais, que, desde o Tratado de Roma, presidem as relações entre os países membros da União Européia. 3. Foi dentro desta moldura que se iniciou a discussão mundial sobre o tamanho do Estado e as medidas que deveriam ser utilizadas para reduzi-lo. Estão ligadas a esse contexto as privatizações, a liberalização, a desregulamentação, a quebra de monopólios estatais de serviços públicos e a abertura à concorrência das atividades por eles exercidas, bem como a atribuição de novos papéis aos particulares na realização de fins públicos. COUTO E SILVA, Almiro. Privatização no Brasil e o Novo Exercício de Funções Públicas por Particulares. Serviço Público "à brasileira"? in Revista de Direito Administrativo, 230: 45-74, Outubro/Dezembro de 2002, Rio de Janeiro, p. 48.
  11. HAVA, Ben Hur. op. cit.
  12. Note-se que a era Vargas "introduziu no País na siderurgia e na produção petrolífera e os militares, embora tenha vindo ao poder para renegar o nacionalismo do grupo varguista (João Goulart à frente), mantiveram a estratégia de desenvolvimento industrial conduzida pela ação estatal. Criou-se, dentro desse espírito, a Telebrás, a Eletrobrás e a Siderbrás, para impulsionarem o processo industrial, para que o País conseguisse, no terceiro milênio, ingressar no fechado clube dos países desenvolvidos (Brasil grande). Quando, no entanto, o fluxo de capitais em direção ao País foi interrompido nos anos 80, o Brasil mergulhou numa crise sem precedentes e começaram a surgir as primeiras iniciativas em direção a um capital emancipado do Estado). AMARAL FILHO, Marcos Jordão Teixeira. Privatização no Estado Contemporâneo, 1ª edição, São Paulo: Ícone, 1996, p. 64.
  13. Segundo José Coelho Matos Filho e Carlos Wagner A. Oliveira: "alguns fatos explicam essa deterioração das finanças públicas: o crescimento do setor produtivo estatal, a partir de 1973, financiado por empréstimos externos; a concessão de subsídios creditícios ao setor privado, principalmente ao setor rural, na segunda metade da década de 70 e nos anos 80; o financiamento de déficits na balança comercial por meio de endividamento de estatais, a partir de 1979. Os reempréstimos de recursos depositados no Banco Central, na década de 80, para pagamento da dívida no exterior; a absorção, pelo Tesouro, das dívidas dos estados e municípios, por ele avalizadas; a desvalorização cambial, como forma de gerar excedentes na balança comercial, em virtude das dificuldades posteriores da entrada de recursos externos, na década de 80, entre outros [Velloso (1993)]". Para referidos autores, a privatização foi um meio alternativo de financiamento não inflacionário do déficit público (tradicionalmente financiado pela emissão de moeda, aumento de impostos, endividamento externo ou interno, ou, a combinação de um ou mais instrumentos listas). Configura modo alternativo porque estariam esgotadas as possibilidades da financiamento tradicional: a) emissão de moeda aumenta o processo inflacionário; b) o aumento de impostos seria um instrumento politicamente difícil de ser implementado; c) o financiamento externo, embora com taxas viáveis, estaria prejudicado com problemas envolvendo a dívida externa; d) o financiamento interno equivale a substituição de impostos – que, reduzidos, induziriam a um aumento da demanda e um aumento de preços, ocasionando processo inflacionário. Assim, a privatização de ativos, além de complementar as receitas correntes, reduzem as necessidades de financiamento do setor público. MATOS FILHO, José Coelho. OLIVEIRA, Wagner A., in O Processo de Privatização das Empresas Estatais Brasileiras, extraído do site: http://www.ipea.gov.br/pub/td/1996/td_0422.pdf. Acessado em 20/05/2007, p. 11.
  14. Note-se que historicamente nos EUA a posição do Estado é de limitar-se a ser mero regulador no jogo econômico, interferindo somente quando as regras elaboradas pelo próprio mercado fossem falhas ou deficientes. A solução americana para reduzir o tamanho do Estado, através das agências reguladoras (regularoty agencies) é elogiável, pois há excelente qualidade técnica das normas regulatórias, não só pela proximidade entre os órgãos da entidade e os fatos a serem disciplinados ou controlados, como também o caráter setorial ou específico da regulação e do controle. Todavia, além das agências reguladoras, convivem, nos EUA, as agências não reguladoras, encarregadas dos benefícios sociais. O gigantismo do Estado que foi combatido na era Reagan, portanto, centrava-se pois, em dois aspectos: a) a desregulamentação e diminuição da área da administração prestadora de serviços (com a supressão de um número considerável de programas sociais; b) desregulamentação de certos setores (v.g. o aeronáutico).
  15. Dados divulgados pelo Ministério do Planejamento, tendo como fonte a Secretaria da Receita Federal dão conta de que de 1991 a 2003 a carga tributária total variou de 24,61% do PIB (em 1991) para 34,88% (em 2003). Em 2005 o percentual foi de 37,37% do PIB (Fonte SRF). Fonte: http://www.planejamento.gov.br/arquivos_down/assec/indicador_fiscal/I_CargaTributaria.pdf. Acesso em 31/07/2007 às 14:59.
  16. Vide, por exemplo, a criação e prorrogação da CPMF mediante sucessivas emendas constitucionais.
  17. Comenta Luis Roberto BARROSO: "(...) a causa deste desequilíbrio são muitas e de origem variada. Dentre elas, com indisfarçável destaque, encontra-se a não superação, na atual partilha de competências político-administrativas, das crônicas indefinições e superposições de atribuições, inclusive em domínios vitais, como educação e saúde. No tocante aos Municípios, seus tributos de competência própria somente têm expressão econômica em áreas desenvolvidas e urbanas. No âmbito dos Estados, o ICMS, sua principal fonte de recursos, tem ficado comprometido por fatores como a guerra fiscal e as distorções causadas pela existência de alíquotas internas e interestaduais. Enfim, são causas que se multiplicam e que não cabe inventariar amplamente nesta instância". BARROSO, Luiz Roberto. "A derrota da federação: o colapso financeiros dos estados e municípios" in Temas de Direito Constitucional, 2ª edição, Renovar: Rio de Janeiro, São Paulo, 2002, pp. 145/146.
  18. Klaus Tipke afirma que o Estado só pode esperar retidão do contribuinte se der o bom exemplo moral quanto à tributação e respectivos gastos. TIPKE, Klaus. Moral Tributaria del Estado y de los Contribuyentes. (Besteuerungsmoral und Steuermoral). Tradução de Pedro M. Herrera Molina, Madrid: Marcial Pons, 2002, Barcelona.
  19. Sem embargo da tendência de se apontar o contribuinte como vilão, que, ao praticar tentativas de economia fiscal é injustamente acusado de realizar atos atentatórios à sobrevivência da coletividade. Sérgio Andre R. G da Silva comenta este aspecto, que ocorre notadamente no campo judicial, em que se justifica a exigência inconstitucional ou ilegal de tributos sob o argumento de que "os cofres públicos não suportariam a sangria necessária a recomposição do estado de legalidade",. o que, na opinião do Autor, pode conduzir que o desamparo ao contribuinte leve ao risco de "acabar com a própria fonte dos recursos". SILVA, Sérgio Andre R. G da. A tributação na sociedade de risco. Princípios de Direito Financeiro e Tributário. Estudos em homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres.
  20. Merece registro que a crise de legitimidade da tributação (lei tributária) também se associa a outros fatores não discutidos neste trabalho, entre eles a debilitação do princípio da legalidade e a superação da visão histórica da lei como manifestação da vontade geral e infalível. Sobre este tópico, vide ALTAMIRANO, Alejandro C. Jaque a la Ley: Referencia a Algumas Anomalias de la Ley Tributaria. In: Revista Brasileira de Direito Tributário e Finanças Públicas. Caderno de Direito Comparado. Doutrina. nº 1. Porto Alegre: Editora Magister, 2007.
  21. SACCHETO, Claudio. O Dever de Solidariedade no Direito Tributário: o Ordenamento Italiano. In Solidariedade Social e Tributação, Coordenadores Marco Aurélio Greco e Marciano Seabra de Godoy, São Paulo: Dialética, 2005.
  22. HAVA, Ben Hur. op.cit.
  23. A idéia de participação popular é lançada por Ben Hur HAVA, que expressa seu entendimento nos termos seguintes: "A idéia de controle social já foi lançada. No entanto, não se espera que seja assimilada imediatamente. Só o tempo e o grau de esforço conjunto de administradores e administrados, irá dizer se esse tipo de controle tem chances de vingar no Brasil. O certo é que é estamos diante de nova forma organizativa da esfera pública que precisa ser aperfeiçoada para que os bons resultados se façam sentir a curto e médio prazos". op. cit.
  24. Reflexões sobre os limites da dimensão do Estado, ver NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina, 1998.

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PINTO, Cláudia Maria Borges Costa. O crescimento e a redução do Estado brasileiro. A permanência da crise fiscal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2026, 17 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12226. Acesso em: 26 abr. 2024.