Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/14718
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Do prazo prescricional das ações de dano moral na Justiça do Trabalho

Do prazo prescricional das ações de dano moral na Justiça do Trabalho

Publicado em . Elaborado em .

O TST adotou a tese de observância dos prazos prescricionais previstos no Código Civil de 2002. Contudo, o lapso trienal desprestigia princípios basilares da justiça trabalhista.

RESUMO

Esse trabalho visa tratar do prazo prescricional da ação de dano moral proveniente da relação de trabalho, não pretendendo exaurir todas as teses sustentadas, mas somente apresentá-las com intuito de demonstrar o quanto a matéria é controvertida. Para tanto, além das interpretações doutrinárias, colacionam-se julgados, inclusive o posicionamento atual do Tribunal Superior do Trabalho. Em linhas gerais, o TST adotou a tese de observância dos prazos prescricionais previstos no Código Civil de 2002. Contudo, o lapso trienal desprestigia princípios basilares da justiça trabalhista e, em razão disso, esse trabalho defende a revisão imediata desse posicionamento do TST, tendo em vista que, ao servir de paradigma aos tribunais de instâncias inferiores, corre-se o risco de se formarem decisões, in totum, dissonantes à política da justiça laboral.

Palavras-chave: Prescrição. Divergências de Prazos. Ação de Dano Moral. Justiça do Trabalho.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 DA PRESCRIÇÃO. 1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO INSTITUTO. 1.2 DA PRESCRIÇÃO DA JUSTIÇA LABORAL. 2 DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. 2.1 DO ATO ILÍCITO E DO DANO. 2.2 DO CONCEITO DE DANO MORAL. 2.3 DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. 3 DA PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. 3.1 DAS DIVERSAS TESES ACERCA DO PRAZO PRESCRICIONAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. 3.1.1 Da Imprescritibilidade. 3.1.2 Da Prescrição Constitucional Trabalhista. 3.1.3 Das Prescrições Civilistas. 3.1.4 Da Prescrição Civil/Trabalhista. 3.2 POSICIONAMENTO ATUAL DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 5 REFERÊNCIAS


INTRODUÇÃO

Para a maioria dos filósofos, o conceito de trabalho decorre da ideia de sofrimento, dor e até em determinados momentos da história, de pena e castigo. A partir do século XVIII, essa noção de trabalho desvalorizado começa perder força devido aos novos ideais defendidos na Revolução Francesa e na 1ª Revolução Industrial, uma vez que a ordem econômica da época vinculava o capital à produção, transformando o trabalho em uma necessidade social.

As transformações de ordem sócio-econômica, tecnológica e cultural ocorrida no final do século XIX e início do século XX, através da política neoliberal e da globalização, repercutiram de forma considerável nas relações de trabalho.

A substituição do homem pela máquina, as terceirizações, bem como a flexibilização das normas trabalhistas foram alguns exemplos da transformação que atingiu a vida do empregado, gerando piora das suas condições de trabalho, favorecendo o surgimento de doenças ocupacionais, conflitos entre empregado e empregador, distúrbios físicos e mentais.

Impende frisar que o ambiente sadio de trabalho é direito do empregado e responsabilidade do empregador. Logo, condutas consideradas como impertinentes às relações de trabalho devem ser coibidas, sob pena de lesar direito subjetivo do obreiro.

O local de trabalho que infringe as normas legais sobre a qualidade do ambiente laboral constitui-se objeto deste estudo, uma vez que esta situação desfavorável estimula a prática de condutas que lesionam o patrimônio subjetivamente protegido do empregado, gerando um dano, passível de reparação na Justiça do Trabalho, por força do artigo 114 da Constituição Federal.

Para fazer uso da tutela jurisdicional, há de ser observado o prazo da prescrição, ou seja, o lapso estabelecido pelo legislador para que o ofendido possa acionar o Poder Judiciário em busca da reparação da dor suportada, surgindo daí divergências, para os operadores do direito, quanto ao lapso temporal a ser observado, tendo em vista que a matéria – prescrição – é tratada pelo atual Código Civil e pela Constituição Federal.

Nesse cenário, nosso trabalho visa demonstrar, através de interpretações doutrinárias e jurisprudenciais, a posição atual, bem como defender a revisão imediata da tese sedimentada pelo Tribunal Superior do Trabalho, haja vista que, a nosso ver, o posicionamento hodierno diverge, consideravelmente, dos princípios basilares norteadores da justiça trabalhista.


1 DA PRESCRIÇÃO

1.1. BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO PRESCRIÇÃO

Historicamente, a doutrina aponta a origem do termo prescrição na palavra latina praescriptio, derivada do verbo praescribere, que significa "escrever antes", remontando às ações temporárias do direito romano.

Segundo Pontes de Miranda (1955, p. 100), a prescrição seria "(...) a exceção, que alguém tem contra o que não exerceu, durante certo tempo, que alguma regra jurídica fixa a sua pretensão ou ação."

Nesse pisar, Clóvis Beviláqua assevera que a prescrição seria a perda da ação atribuída a um direito e de toda sua capacidade defensiva, devido ao não-uso delas em um determinado espaço de tempo.

Desse modo, a prescrição pressupõe a existência de um direito anterior, e a lei exige que o interessado promova o seu exercício, sob pena da inércia caracterizar-se em negligência que, em virtude da decorrência dos prazos estabelecidos, faz desaparecer o exercício deste direito.

Com efeito, falar-se-á em prescrição, quando aquele detentor do direito subjetivo deixar transcorrer, in albis, o prazo fixado em lei para propositura de uma demanda, extinguindo, tão somente, a pretensão condenatória contra o responsável pela reparação do direito.

Vale ressaltar que, desde os primórdios do Código Civil de 1916, a doutrina apresentava-se divergente quanto ao conceito de prescrição, confundindo-se inclusive com o conceito de decadência, uma vez que ambos tratavam do mesmo assunto, a perda do direito.

Com o advento do Código Civil 2002, os conceitos foram devidamente definidos, extirpando do ordenamento jurídico pátrio quaisquer dúvidas quanto às suas aplicabilidades no caso concreto.

Além da distinção necessária, o legislador do vigente Código Civil manteve os prazos prescricionais diferenciados, merecendo destaque, para análise do presente trabalho, aquele fixado como a regra geral, que no revogado Código Civil de 1916 - lapso de 20 anos para propositura de ações pessoais - cujo objetivo visava tutelar direito pessoal, ou, mais precisamente, o cumprimento de uma obrigação.

Com o novel Codex, houve redução, pela metade, da regra mencionada, passando a viger, de acordo com o artigo 205, in verbis: "a prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor."

1.2 DA PRESCRIÇÃO NA JUSTIÇA LABORAL

No que toca à prescrição trabalhista, urge mencionar que o legislador, no texto original da Consolidação das Leis trabalhistas, editado em 1943, previu no artigo 11 o fenômeno da prescrição, estabelecendo o prazo de dois anos para o exercício do "direito de pleitear a reparação de qualquer ato infringente de dispositivo nela contido."

Com a promulgação da Constituição Cidadã, em 1988, a prescrição trabalhista foi arrolada no artigo 7º, no capítulo dos direitos sociais, estabelecendo-se novos paradigmas para a prescrição, sendo criadas, inclusive, situações diferenciadas – trabalhador urbano e trabalhador rural -, com prazos prescricionais também distintos.

Em 1998, com a edição da Lei nº 9.658, houve modificação da redação inicial do aludido artigo 11, passando a dispor em consonância com o texto original da Constituição Federal, a saber:

Art. 11 - O direito de ação quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve:

I - em cinco anos para o trabalhador urbano, até o limite de dois anos após a extinção do contrato;

Il - em dois anos, após a extinção do contrato de trabalho, para o trabalhador rural.

Oportuno registrar, ainda, a alteração dada pela Emenda Constitucional nº 28/2000, que igualou os prazos prescricionais para os trabalhadores rurais e urbanos, passando o inciso XXIX do artigo 7º da Constituição Federal, a dispor que a "ação quanto aos créditos resultantes da relação de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho", revogando, assim, o artigo 11 da Consolidação das Leis trabalhistas.

Com efeito, os prazos prescricionais para as demandas trabalhistas passaram a ser aqueles fixados pelo inciso XXIX do artigo 7º da Carta Magna, sendo observado o mesmo prazo para os trabalhadores rurais e urbanos.

Nota-se, que a norma constitucional não diferencia os casos para aplicabilidade dos prazos prescricionais, apontando, assim, um lapso que seria genérico às demandas trabalhistas, surgindo daí as divergências doutrinárias, vez que há no ordenamento jurídico previsões específicas de normas prescricionais para reparação do dano moral, sendo este o cenário de estudo do presente trabalho.


2

Inicialmente, cumpre registrar que, quando reiteradas práticas ofensivas desenvolvidas no ambiente de trabalho visam a atingir a dignidade do trabalhador, constitui-se o quê a doutrina jurídica denomina ato ilícito, capaz de gerar um dano, que é, em suma, qualquer ato ou fato humano lesivo a interesses alheios protegidos.

2.1 DO ATO ILÍCITO E DO DANO

A doutrina classifica como ato ilícito aquele praticado em dissonância com a norma positivada, sendo este o elemento primordial para caracterização da teoria da responsabilidade civil. Neste sentido, o artigo 186 do Código Civil Brasileiro prevê o dever de reparar quando da ocorrência do ato ilícito, senão vejamos: "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano."

Numa relação jurídica, o ato ilícito manifesta-se através de uma das condutas previstas no artigo supra, imputando, assim, na responsabilidade de reparação do dano.

Segundo o doutrinador Sílvio Rodrigues (1998, p. 324), ato ilícito "é aquele praticado com infração a um dever e do qual resulta dano para outrem. Dever legal, ou contratual".

Nessa linha, a vedação ao comportamento ilícito advém tanto da norma jurídica, quanto da norma contratual, como é o caso do contrato de trabalho, provenientes das relações privadas.

O doutrinador Caio Mário da Silva Pereira (2004) esclarece que para se caracterizar o ato ilícito devem ocorrer certos elementos, tais como a violação do direito ou dano causado a outrem, a ação ou omissão do agente e a culpa, caracterizando a ilicitude da conduta num procedimento contrário a um dever preexistente.

Dito isto, tem-se que o dano se classifica em material, quando recai sobre os bens constitutivos do patrimônio da vítima; ou em moral, infringindo, basicamente, os direitos assegurados na Constituição Federal, senão vejamos o artigo 5º, incisos V e X:

Art. 5º

V – É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem;

(...)

X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Com efeito, verificamos que a conduta que macula a imagem do empregado constitui um ato ilícito, já que afronta direitos constitucionais, ocasionando um dano passível de reparação por aquele que agiu ilicitamente.

2.2 DO CONCEITO DE DANO MORAL

Preliminarmente, mister se faz diferenciar dano e moral, sendo que esta última tem como base uma visão filosófica, que tem relação com os costumes de uma determinada sociedade, situada num determinado local, em um certo momento histórico.

Na visão marxista, seria "um conjunto de regras, normas de convivência e de conduta humana que determina as obrigações dos homens, as suas relações entre si e com a sociedade." (BASTOS, 2003, p. 17)

Por sua vez, a conduta que contraria alguma norma configura-se como ilícita e gera um "dano", que remete a ideia de ato de deterioração ou danificação praticado contra algo ou alguém, trazendo um prejuízo.

Acerca do dano moral, Cláudio Antonio Soares Levada (2000, p. 345) assevera que:

Dano moral é uma ofensa injusta a todo e qualquer atributo da pessoa física como individuo integrado à sociedade ou que cerceie sua liberdade, fira sua imagem ou sua intimidade, bem como a ofensa à imagem e à reputação da pessoa jurídica, em ambos os casos, desde que a ofensa não apresente quaisquer reflexos de ordem patrimonial ao ofendido.

Nesse mesmo pensar, Carlos Alberto Bittar (1992, p. 47):

Qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade e da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social).

Assim, vislumbramos que a doutrina é unânime em admitir que o dano moral atinge, basicamente, o direito subjetivo de cada pessoa, infringindo o princípio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana.

Outrossim, Luiz Antonio Rizzato Nunes e Mirella D’Angelo Caldeira (1999, p. 1) asseveram que o dano moral afeta a paz interior, atingindo tudo que não tem valor econômico, mas causa dor e sofrimento.

Corroborando essa posição, o respeitado doutrinador Silvio Venosa (2004, p. 41),

O dano psicológico pressupõe modificação de personalidade, com sintomas palpáveis, inibições, depressões, bloqueios, etc. evidente que esses danos podem decorrer de conduta praticada por terceiro, por dolo ou culpa. O dano moral, em sentido lato, abrange não somente os danos psicológicos; não se traduz unicamente por uma variação psíquica, mas também pela dor ou padecimento moral, que não aflora perceptivelmente em outro sintoma. A dor moral insere-se no amplo campo da teoria dos valores.

Em sendo assim, independente da forma de manifestação, o fato é que o dano moral atinge o íntimo da pessoa, uma vez que esta tem os seus valores e os seus princípios atacados pelo agressor.

Pode-se dizer que o dano moral surgiu no Brasil com o Código Civil de 1916, nos artigos 76, 79 e 159. Entretanto, a princípio, este instituto não fora absorvido pela doutrina e jurisprudência da época, que passaram a negar a reparabilidade dos danos morais, sob argumento de que o artigo 159 não tratava expressamente das lesões de natureza extrapatrimoniais, assim como a norma contida no artigo 76 se referia à ordem processual invocada pelo direito de ação do indivíduo.

A indenização do dano moral só teve relevância a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, com a consagração deste dever, tendo que a doutrina reavaliar seu posicionamento ante a nova ordem normativa.

Com efeito, a Carta Magna estabeleceu o dano moral e, segundo o doutrinador Caio Mário da Silva Pereira (2001, p. 58) a "Constituição de 1988 veio pôr pá de cal na resistência à reparação do dano moral".

O Código Civil de 2002, adequando-se à norma constitucional, reconheceu de forma expressa em seu artigo 186 o instituto e impõe, via conseqüência, o dever de indenizar.

2.3 DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

Conforme mencionado, o dever de indenizar é a conseqüência direta do ato ilícito praticado contra o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima operária.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a doutrina e a jurisprudência posicionavam entendimento no sentido de que competia à Justiça do Trabalho dirimir conflitos inerentes à relação de emprego, que tinha por cerne o contrato de trabalho, com alicerce no artigo 114 da Carta Magna.

Dessa forma, o dispositivo constitucional pôs fim à discussão no que se referia à atuação da Justiça do Trabalho, fixando a competência não em razão da matéria, mas em razão da pessoa, vez que se levaram em conta os sujeitos atuantes da relação laborativa, quais sejam, empregado e empregador, pois se abstraído a situação de empregado e empregador não haveria que se falar em relação de emprego, tampouco em competência da Justiça do Trabalho. Era neste sentido o seguinte julgado:

COMPETÊNCIA – CONFLITO NEGATIVO – JUSTIÇA ESTADUAL E JUSTIÇA DO TRABALHO – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL DECORENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO – PRECEDENTES – COMPETÊNCIA DA JUSRIÇA COMUM – (...) II – O Supremo Tribunal Federal decidiu ser da Justiça do Trabalho a competência, quando se trata de indenização de dano moral ou material derivado da relação de emprego, como, por exemplo, a despedida por justa causa. (STJ. AGRCC 31607-MG. 2ª S. Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. DJU 03.02.2003)

Desse modo, a competência para tratar dos dissídios oriundos da relação de emprego seria da Justiça do trabalho, por força do artigo 114 da CF/1988.

Com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, houve ampliação da competência da Justiça do Trabalho, haja vista que a redação do artigo 114 foi alterada, passando a viger da seguinte maneira:

Art. 114 - Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II - as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III - as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV - os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V - os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, "o";

VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII - as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII - a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, "a", e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX - outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei. (grifo nosso)

Com a nova redação, a Justiça do Trabalho passou a ter competência para julgar quaisquer litígios provenientes de uma relação jurídica na qual um sujeito presta serviço, e o outro toma o serviço prestado, sendo autônomo ou subordinado, gratuito ou oneroso.

Em sendo assim, o termo "relação de emprego" passou a ser espécie, do gênero "relação de trabalho", tendo, em ambos os casos, a Justiça Laboral competência para dirimir quaisquer conflitos.

Cumpre ressaltar, que a legislação trabalhista não traz nenhuma norma específica quanto à obrigatoriedade de reparar os danos morais provenientes da relação de trabalho. Contudo, o parágrafo único do artigo 8º da Consolidação das Leis Trabalhistas prevê que, nos casos de omissão, se poderá utilizar as normas do direito comum.

Partindo dessa ideia, impende esclarecer que a reparação não se confunde com a possibilidade da rescisão do contrato de trabalho, sendo possível o empregado pleitear a reparação dos danos morais e a rescisão do contrato de trabalho.

Isso porque a legislação trabalhista outorga poderes de direção aos empregadores para que os mesmos organizem, controlem e disciplinem as atividades laborais, não podendo que tais poderes ofendam os direitos à personalidade do empregado.

A conduta que compromete a qualidade da relação de trabalho, infringindo princípios, tais como o da proteção, da realidade, da razoabilidade e da boa-fé, enquadra-se na possibilidade de se aplicar o artigo 483, alínea ‘e’, da CLT, a saber:

Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

(...)

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

Assim, todo "ato lesivo à honra" do empregado gera a possibilidade de rescisão do contrato, que seria dada de forma indireta, ou seja, provocada pelo empregador. Segundo Süssekind (2004, p. 331):

A despedida indireta decorre de uma situação fática que torna impossível, prejudicial ou desrespeitosa a execução do contrato de trabalho pelo empregado. O art. 483 da CLT é expresso a respeito, elencando as faltas patronais que justificam a resolução do contrato por iniciativa do empregado.

É este o entendimento jurisprudencial predominante:

ASSÉDIO MORAL - RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR JUSTA CAUSA DO EMPREGADOR - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - CABIMENTO. O assédio moral, como forma de degradação deliberada das condições de trabalho por parte do empregador em relação ao obreiro, consubstanciado em atos e atitudes negativas ocasionando prejuízos emocionais para o trabalhador, face à exposição ao ridículo, humilhação e descrédito em relação aos demais trabalhadores, constitui ofensa à dignidade da pessoa humana e quebra do caráter sinalagmático do Contrato de Trabalho. Autorizando, por conseguinte, a resolução da relação empregatícia por justa causa do empregador, ensejando inclusive, indenização por dano moral". (TRT 15ª, 01711-2001-111-15-00-0 RO (20534/2002-RO-2); Rel. Juiza Mariane Khayat F. do Nascimento, 2ª T, DJU 21/03/2003)

Impende dizer, que compete ao autor determinar, com clareza, na sua peça exordial, a natureza do seu pedido de reparação, haja vista que a trabalhista sugere fato gerador de valor devido por empregador ao empregado, tendo cada um a sua cota, sob a rubrica do imposto de renda e das contribuições previdenciárias. Tratando-se de verba reparatória civil, não há que se falar em fato gerador, não culminando em descontos e obrigações fiscais dos sujeitos da relação.


3 DA PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE REPARAÇÃO DO DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Conforme mencionado anteriormente, a violação do direito faz surgir para o titular a pretensão, e para o agressor a responsabilidade ínsita ao dever de reparação. O não-exercício dessa pretensão, num certo tempo legalmente estatuído, por inércia do titular, gera o seu perecimento por incidência da prescrição.

Impende esclarecer, que as regras atinentes ao instituto da prescrição se constituem objeto do direito material e não do processual, havendo, no ordenamento normativo, distintivos prazos, a serem observados, a depender da natureza jurídica do direito violado.

Inobstante a especificidade apontada, no que toca ao prazo prescricional das ações de indenização do dano moral na Justiça do Trabalho, a doutrina é bastante divergente, conforme se verificará ao longo da exposição desse capítulo, advertindo, desde já, que a nossa tese coaduna com aquela favorável à aplicação da regra geral da prescrição prevista no atual Código Civil.

3.1 DAS DIVERSIDADES DE TESES ACERCA DO PRAZO PRESCRICIONAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Antes de adentrar ao assunto proposto, ressalta-se que este trabalho não tem a intenção de esgotar todos os argumentos utilizados na defesa das diversas teses citadas, mas, e somente, alertar para a existência das mesmas, assim como demonstrar as razões pelas quais não merecem serem acolhidas.

3.1.1 Da Imprescritibilidade

Há corrente no sentido de que a pretensão relativa ao dano moral decorrente da relação de trabalho seria imprescritível, vez que o bem jurídico protegido é um direito da personalidade, o qual decorre da relação jurídica básica que cada cidadão possui um com o outro, independente da existência de uma relação jurídica específica, no caso, civil ou trabalhista.

Nessa tese, pode-se perceber contida a ideia da imprescritibilidade dos direitos fundamentais, que, por serem os que asseguram uma existência digna a todos os cidadãos, são essenciais e a possuem como uma de suas características. Ensina José Afonso da Silva (2007, p. 185) que a:

Prescrição é um instituto jurídico que somente atinge, coarctando, a exigibilidade dos direitos de caráter patrimonial, não a exigibilidade dos direitos personalíssimos, ainda que não individualista, como é o caso. Se são sempre exercíveis e exercidos, não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição.

Os defensores dessa corrente alegam que não se trata de um crédito trabalhista, e que a reparação do bem não é civil, visto que seu fundamento é constitucional. O doutrinador Francisco das Chagas Lima Filho sintetiza sua visão, a saber:

(...) a ação seria imprescritível dado ao fato de tratar-se de ação de reparação de danos a direitos da personalidade que, por irrenunciáveis, o seu exercício não está sujeito a prescrição, face aos termos do que disposto no art. 11 do Código Civil e pela natureza do bem envolvido, ou seja, a personalidade, a dignidade do ser humano. A ação de reparação de danos morais decorrentes de acidente do trabalho ou de doença profissional – equiparada a acidente de trabalho por força de expressa disposição legal – tem por objetivo indenizar o trabalhador pelos danos à saúde, à vida, à integridade física ou mental, enfim direitos ligados à personalidade e à dignidade do ser humano. Essa categoria de direitos fundamentais constitucionalmente é garantida ao ser humano enquanto pessoa e não porque ostenta a condição de cidadão trabalhador ou empregado. Por conseguinte de natureza indisponível, não podendo o seu titular a eles renunciar e sendo irrenunciáveis o são por conseqüência, imprescritíveis. (...) não se trata, pois, de direito de natureza trabalhista, nem tampouco civil, mas de direito de índole fundamental que diz respeito à dignidade humana. Portanto, imprescritível, pois a dignidade humana sendo "aquela qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, não é subtraída da tutela constitucional apenas porque aquele que sofreu a violação não reclamou, muitas vezes por circunstâncias alheias à sua vontade, dentro de um certo espaço de tempo. Não se perde a dignidade em razão do decurso de tempo, evidentemente.

Resta claro, portanto, que a tese da imprescritibilidade nas ações de indenização por dano moral decorrente da relação de trabalho é no sentido de que não se trata de meros créditos resultantes da jurídica pré-existente, mas da satisfação de um direito fundamental, que é a preservação da saúde e da vida, o mais essencial dos direitos humanos.

Refutando a tese exposta, o doutrinador Júlio Bernardo do Carmo (2006, p. 96), leciona que:

A teoria da imprescritibilidade dos direitos da personalidade, em todos os sentidos, em que pese sedutora, serve como fator de intranqüilidade e de quebra da harmonia da paz social, colocando o ser humano ou quem quer que esteja obrigado a respeitar direito dessa natureza a um jugo eterno e inexorável, pois a qualquer tempo poderá ser acionado por uma responsabilidade civil que se esvaneceu nas brumas do tempo. Se o próprio ser humano é finito e transitório, mostra-se incongruente a criação de uma potestade jurídica atemporal que não guarde correspondência com a ordem divina imprimida à própria natureza humana. Em um mundo onde tudo é fluido e transitório não é concebível a criação de direitos subjetivos eternos, porque imprescritíveis. A primeira teoria jurídica da imprescritibilidade do direito do trabalhador acionar o seu empregador ou tomador de serviços para demandar reparação civil por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho, porque conectado a direito de personalidade, não sobrevive ao rigorismo da crítica científica e sucumbe diante do próprio arcabouço de direito positivo que tutela os direitos subjetivos, todos sujeitos inexoravelmente aos efeitos do tempo. (grifamos)

Desse modo, a corrente contrária, sabiamente, argumenta no sentido de que o exercício dos direitos da personalidade jamais prescreve, mas a pretensão à reparação dos danos causados ao obreiro é prescritível, tendo em vista que a noção de imprescritibilidade absoluta criaria situação de discriminação em nosso direito positivo.

3.1.2 Da Prescrição Constitucional Trabalhista

Vencida essa questão, parte da doutrina defende aplicação apenas da prescrição genérica trabalhista, aquela prevista no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal. Isto porque a natureza jurídica de crédito trabalhista atribuída à indenização deriva de outra relação, sendo esta orginária, não adimplida ou inobservada pelo empregador, porém ambas possuindo a mesma natureza trabalhista. Deste modo, José Affonso Dallegrave Neto (2007, p. 302) explica que:

(...) todos os direitos exigíveis em juízo, que se manifestam na execução do contrato de trabalho subordinado e que são decorrentes da inadimplência de deveres principais, secundários ou acessórios, sejam eles previstos em lei, no contrato ou nos instrumentos normativos da categoria, constituem-se crédito trabalhista, atraindo-se à competência da Justiça do Trabalho e a responsabilidade civil contratual. Por serem pretensão de natureza trabalhista o prazo prescricional aplicável será o qüinqüenal do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal.

Outro argumento favorável à aplicação do prazo constitucional advém do fato de que apenas caberia a prescrição prevista no Direito Comum se não houvesse norma específica no Direito do Trabalho a regular a matéria de pertinência temporal incidente sobre o direito de ação.

Conforme estabelece o parágrafo único do artigo 8º da Consolidação das Leis Trabalhistas, o Direito Comum será fonte subsidiária do Direito do Trabalho, desde que compatível com os princípios que o informam, e apenas na ausência de regra própria trabalhista, uma vez que, possuindo o Direito Laboral regramento específico para os prazos prescricionais dos créditos trabalhistas (CF/88, art. 7º, XXIX; CLT, art. 11), não se há de falar em incidência da prescrição civil.

Por esta razão, é que o doutrinador Nehemias Domingos de Melo, que adotava posicionamento defendendo a aplicação da prescrição prevista no Código Civil para as ações de dano moral, reviu entendimento com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, por considerar que:

(...) se a postulação da indenização por danos morais é feita perante a Justiça do Trabalho, e sob o fundamento de que a lesão decorreu da relação de trabalho, não há como se pretender a aplicação do prazo prescricional previsto no Direito Civil, principalmente porque o ordenamento jurídico-trabalhista possui prazo prescricional específico, regulado tanto na Constituição Federal quanto na legislação consolidada do trabalho. (CF, art. 7º, XXIX; CLT, art. 11) - (grifamos)

Ademais, os seguidores dessa corrente advertem que o simples fato de grande parte do detalhamento da indenização estar disciplinado no Código Civil não atrai a aplicação da prescrição do direito comum, porque no campo especial do Direito do Trabalho há regra específica prevendo o cabimento da indenização (art. 7º, XXVIII da CF), bem como estabelecendo o prazo prescricional (art. 7º, XXIX da CF).

A crítica que, a nosso ver merece ser acolhida, recai sob o fato de que o prazo prescricional constitucionalmente estatuído (artigo 7º, XXIX da Constituição Federal) apenas remete aos créditos trabalhistas típicos, como aviso prévio, férias, horas extras, etc., não alcançando créditos trabalhistas, como as indenizações por danos morais e materiais que, por serem específicos, se regem por normas específicas do direito comum.

Ademais, não é pelo fato de a competência, para julgar dano moral decorrente da relação de trabalho, seja a Justiça Especializada que a prescrição deva ser a prevista para os demais créditos trabalhistas, haja vista que a reparação pelo referido dano "pode ser tudo, menos um ‘crédito trabalhista’".

3.1.3 Das Prescrições Civilistas

É cediço que a reparação do dano moral decorre da responsabilidade civil, sendo verba indenizatória com esteio em norma civil, porquanto resultante de ato ilícito praticado pelo empregador, ainda que no curso da relação de trabalho.

Esse entendimento considera que o dano não é uma decorrência natural da execução do contrato de trabalho, mas um fato extraordinário, alheio à expectativa do empregado, sendo tipicamente pessoal não compensável como crédito trabalhista.

Desse modo, constitui direito de natureza eminentemente civil, não sendo possível, por isso, aplicar-se o prazo constitucional mencionado.

Nota-se, que ao se estabelecer que a prescrição trabalhista observa normas de direito civil, outra problemática surge, vez que o Código de 2002 reduziu sobremaneira o prazo ordinário da prescrição anteriormente definido pelo Código Civil de 1916, passando a regra geral de vinte para dez anos, e, ainda, reduziu o prazo de prescrição referente à pretensão de reparação civil por dano material ou moral, que passou a ter norma específica, nos termos do artigo 206, § 3º, V do referido diploma legal.

Entendem alguns doutrinadores que, se a ação versar sobre indenização proveniente das relações de trabalho, aplica-se a prescrição prevista no artigo 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002, observada a regra de transição estabelecida no artigo 2.028, qual seja, "serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada." 

Um dos fatores que implicaram resistência de alguns operadores do direito à aplicação da prescrição civil de três anos foi a influência do princípio protecionista, haja vista que quando o prazo prescricional civil era mais longo (Código Civil de 1916), a resistência era menor. Rodrigo Dias da Fonseca (2006, p. 448) entende que:

(...) não parece convincente a restrição, eis que não se pode acolher certa norma, para declará-la aplicável a uma relação jurídica, para a seguir, buscar outra, antes desprezada, apenas porque, desde certo instante no tempo, esta revelou-se mais favorável ao empregado.

Considerando a regra de transição relativa à alteração dos prazos, conforme o art. 2.028 do Código Civil de 2002 finaliza o autor:

(...) a conclusão é bastante simples: se já decorreram-se mais de dez anos da violação do direito, prevalecerá a prescrição vintenária, prevista no código revogado. Caso contrário, se ainda não se atingiu a metade do prazo previsto no Código de 1916, isto é, dez anos, contados da violação do direito, então o prazo prescricional será o do novo Código, ou seja, três anos, tendo por ‘dies a quo’ a data de entrada em vigência do Código Civil de 2002, dia 10.1.2003, conforme art. 2.044 do mesmo diploma legal.

Nesse sentido, avaliando-se as hipóteses mencionadas no art. 206, § 3º, do Código Civil, verifica-se que não é possível vincular os danos ali expressos ao dano decorrente da relação de trabalho, cuja reparação está na própria origem do Estado Social e dos direitos humanos.

Negando a aplicabilidade da prescrição triênio, há argumento no sentido de que a reparação não é matéria de direito civil, ainda se fosse, e o legislador quisesse incluir como exceções do artigo 206 do Código Civil o teria feito expressamente, pois que, naturalmente, se reparação civil fosse, não seria uma reparação civil como outra qualquer, como não o são, por exemplo, a reparação civil por dano ao meio ambiente (Lei n. 9.605/98) e por dano civil decorrente de ato administrativo (Lei n. 8.429/92 – este com prazo prescricional de cinco anos).

Já a vertente que defende a utilização exclusiva da prescrição genérica de dez anos prevista no art. 205 do Código Civil 2002, que nos parece a mais benéfica ao empregado, considera que a indenização por dano moral decorrente da relação de trabalho constitui direito de natureza pessoal, pois não se trata de crédito trabalhista e nem de reparação civil stricto sensu.

Entende que a reparação buscada decorre da violação de um direito fundamental inerente à pessoa humana e aos direitos da personalidade, restando assegurados pela Constituição Federal o direito à indenização pelo dano material ou moral pertinente, não sendo possível, por isso, aplicarem-se os prazos prescricionais anteriormente mencionados.

Dessa forma, pela inexistência de previsão legal sobre a prescrição aplicável a tais casos específicos, impõe-se a utilização do prazo genérico decenal previsto no artigo 205 do atual Código Civil.

Acerca de tal pensamento, cita-se a conclusão de Raimundo Simão de Melo (2006, p. 170), nos seguintes termos:

A norma civil deve ser utilizada, repita-se, não porque se trate de uma pretensão de reparação civil no sentido estrito, mas porque é a lei civil que socorre nos casos de omissão regulatória sobre a prescrição no Direito brasileiro, ou seja, quando não há prazo expresso de prescrição sobre determinada pretensão, aplica-se o geral, de dez anos.

No Direito do Trabalho, embora existam razões pertinentes, o legislador brasileiro não adotou expressamente causas suspensivas ou interruptivas da prescrição, como ocorre no Direito Civil, motivo pelo qual se entende plausível, com alicerce nos princípios incidentes na relação trabalhista, que o intérprete deva amenizar os critérios legais para favorecer o trabalhador, tendo sempre como norte a adoção da norma mais benéfica ao reclamante, não merecendo prosperar a ideia de que a houve "inércia do trabalhador", quando na vigência do contrato de trabalho, deixou de reclamar seus direitos violados.

Oportuno citar, que na Primeira Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho foi aprovado o Enunciado nº 45, contendo entendimento favorável a essa última corrente mencionada, o que pode vir a colaborar com a aplicação do prazo prescricional mais benéfico ao trabalhador. Assim, orienta o citado Enunciado, in verbis:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO. A prescrição da indenização por danos materiais ou morais resultantes de acidente do trabalho é de 10 anos, nos termos do artigo 205, ou de 20 anos, observado o artigo 2.028 do Código Civil de 2002.

Diante do exposto, verificamos que a observância da regra geral do prazo prescricional previsto na legislação civilista representa a norma mais benéfica ao empregado, rogando pela sua aplicabilidade nos casos concretos, estando em harmonia com a legislação trabalhista.

3.1.4 Da Prescrição Civil/Trabalhista

Por fim, há corrente que defenda a prescrição civil/trabalhista, sob argumento de que  a prescrição aplicável nas ações indenizatórias decorrentes da relação de trabalho deve ser a do Código Civil para as ações ajuizadas até 2004 e a trabalhista para aquelas iniciadas posteriormente.

Em uma segunda hipótese de aplicação das duas prescrições, considera-se, que se o trabalhador não for empregado, aplica-se a prescrição civil (relação jurídica de trabalho é gênero de natureza civil) e se for, emprega-se a prescrição trabalhista (relação de emprego é espécie de natureza trabalhista). Neste pisar, Alexandre Agra Belmonte e Leonardo Dias Borges (2006, p.161) também entendem que "(...) em matéria de danos morais aplicável será a trabalhista ou a civil, dependendo da relação a ser apreciada pela Justiça do Trabalho: sendo de emprego, a prescrição será a trabalhista e sendo de trabalho, a prescrição aplicável será a civil".

Rechaçando de plano essa tese, Rodrigo Dias, na obra já citada, reclama que:

(...) não seria razoável distinguir a definição da regra prescricional conforme o trabalhador fosse classificado ou não como empregado, ou seja, aplicar certa norma, sendo ele empregado, e outra, sendo ele um profissional autônomo, por exemplo. Afinal, num e noutro caso, o trabalhador teria sido submetido ao exato mesmo constrangimento, logo deve ser-lhe aplicada a mesma regra prescricional.

Ademais, a modificação constitucional foi de competência, matéria processual, a qual não interfere no direito material e, sendo a matéria danos morais de natureza pessoal, deve-se observar sempre a prescrição do Código Civil, que nos parece ser a mais benéfica ao empregado, sob pena de admitir que a Justiça Comum, em toda a longa história anterior ao reconhecimento da competência da Justiça do Trabalho sobre o tema, aplicou, equivocadamente, a regra prescricional aos casos que lhe foram submetidos – e seria inviável cogitar que a norma prescricional variasse ao sabor da competência do órgão jurisdicional encarregado do julgamento da demanda.

3.2 DO POSICIONAMENTO ATUAL DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Conforme demonstrado no decorrer desse trabalho, a matéria sempre foi divergente, tendo, até mesmo, dubiedade de entendimentos entre as turmas do TST, como pode ser visto em 2008, quando a quinta turma considerou que as ações ajuizadas antes da Emenda Constitucional nº 45/2004 prescreviam no prazo de 20 (vinte) anos, e a oitava turma, no entanto, considerou prescrito o direito de uma ex-empregada que sofreu um acidente de trabalho em 1992 e ajuizou a ação trabalhista em 2005. (E-RR-99517/2006-659-09-00.5)

Recentemente, com intuito de por fim a dissonância jurisprudencial, a Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho determinou o retorno do citado processo analisado pela oitava turma, já que, após a Emenda Constitucional nº 45/2004, houve ampliação da atuação da competência da Justiça do Trabalho, não permitindo a aplicação imediata da prescrição trabalhista (de dois anos) para ajuizamento de ação, sendo certo que a data do ajuizamento da ação é que rege a aplicação da prescrição, de modo que, ajuizada a ação na Justiça do Trabalho, aplica-se a regra do direito do trabalho.

Por esta razão, fixou-se entendimento no sentido de que, ao reduzir os prazos prescricionais para dez e três anos, nas ações ordinárias e indenizatórias, respectivamente, o Código Civil estabeleceu que os prazos fossem os da lei anterior, se na data de sua entrada em vigor, já houvesse transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada, senão vejamos:

RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL E MATERIAL. AÇÃO AJUIZADA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. Tratando-se de pedido de indenização decorrente da relação de emprego, a prescrição aplicável é aquela prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, de cinco anos, contados da ocorrência da lesão, observado o prazo de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (Recurso de Revista 247/2006-751-04-00.8, Data de Julgamento: 27/05/2009, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 14/08/2009)

RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. DANO MORAL. Pacificou-se o entendimento nesta Corte de que a data do ajuizamento da ação é que rege a aplicação da prescrição, tendo como marco referencial a vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004. A presente ação foi ajuizada um ano após a vigência da mencionada emenda constitucional. Embora consolidada a lesão em 1994 e observadas a contagem do prazo prescricional vintenário do Direito Civil (Código de 1916) e a regra de transição do Código de 2002 (art. 2.028), até a vigência do Código Civil de 2002 (em 2003), ter-se-iam passados apenas 9 anos, não se alcançando a metade do antigo prazo prescricional. Logo, a pretensão passa a ser regida pelo prazo do novo Código Civil (três anos, a teor do art. 206, § 3º, V), a contar de sua vigência. Dessa forma, o termo final do prazo prescricional seria o ano de 2006. Destarte, ajuizada a ação em 2005, quer pelo prisma do direito trabalhista ou do civil, não há prescrição a ser declarada. Recurso de revista não conhecido." (RR-971/2005-036-01-00.7, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 25/03/2009, 6ª Turma, Data de Publicação: 07/04/2009)

Com efeito, a orientação do TST é no sentido de que, após a Emenda Constitucional nº 45/2004, passou-se a aplicar as normas de direito do trabalho, devendo ser observada, para tanto, a data da lesão ao direito, levando-se em conta o início da vigência do Código Civil de 2002 e suas normas de transição.


4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse trabalho tratou de analisar o dano moral na relação de trabalho, demonstrando que determinadas condutas do empregador pode macular a moral do empregado, tendo em vista que se configura em ato ilícito, gerando um dano, pois lesa patrimônio constitucionalmente tutelados pelo nosso ordenamento.

Constatamos que, com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, o julgamento do dano moral proveniente da relação de trabalho passou a ser de competência da Justiça Laboral, devendo, para tanto, ser observado o prazo prescricional para a propositura da ação cabível.

Acerca do lapso temporal, malgrado o tema seja bastante divergente, hodiernamente, o Tribunal Superior do Trabalho já pacificou entendimento no sentido de que se privilegia o prazo estabelecido pelo inciso do artigo 7º da Constituição Federal, nos casos de lesão sofrida após a Emenda Constitucional nº 45/2004, sendo observada a regra de transição, prevista no artigo 2028 do atual Código Civil, para os casos cuja ocorrência tenha sido anterior à vigência do diploma civilista, podendo inclusive ser aplicada a prescrição trienal, codificada no inciso V do artigo 206 do mencionado Código.

Nota-se, que dessa maneira o Tribunal acolheu a tese de que a prescrição, nestes casos, é matéria constitucional e civilista, variando a aplicabilidade de acordo com o caso concreto.

Apesar de a questão ter sido, aparentemente, pacificada pelo Colendo Tribunal Superior, urge mencionar que há, ainda, os defensores da ideia de que a indenização por dano moral decorrente da relação do trabalho é um direito de natureza pessoal, uma vez que não se trata de crédito trabalhista e nem de reparação civil stricto sensu.

Coadunando com esse pisar, a reparação buscada decorre da violação de um direito fundamental inerente à pessoa humana e aos direitos da personalidade, restando assegurados pela Constituição o direito à indenização pelo dano material ou moral pertinente, não sendo possível, por isso, aplicar-se a prescrição civil de três anos e nem a trabalhista de dois/cinco anos.

Considerando o exposto, verificamos que o acolhimento dessa tese desprestigia normas atinentes à relação trabalhista, como os princípios do protecionismo, da norma mais favorável, vez que ao definir prazos prescricionais de dois, três, cinco anos se estabeleceria limites menores que aqueles previstos na regra geral civilista, qual seja, 20/10 anos, não sendo esta posição benéfica aos trabalhadores.

Ademais, em razão da inexistência de norma legal específica sobre a prescrição aplicável a tais casos, se impõe mais uma vez, a utilização do prazo genérico previsto no artigo 205 do atual Código Civil.

Ainda assim, se levarmos em conta a inexistência de regras de interrupção/suspensão do prazo prescricional - como deveria ocorrer ao menos durante a vigência do contrato de trabalho, já que existe um poder implícito do empregador sob o empregado, inibindo o efetivo acesso à justiça – necessário se faz que, após o término do contrato de trabalho, prestigiemos a interpretação jurídica que traga mais benesse ao trabalhador.

De tudo quanto foi exposto, é possível concluir que, em razão das ausências apontadas, há necessidade do Tribunal Superior do Trabalho rever seu entendimento, posicionando favorável a tese de que, independentemente da vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004, adota-se a regra geral para todos os casos, sob pena de comprometer a equidade da justiça, vez que o fundamento lógico da prescrição é no sentido de atuar no decurso do tempo sobre a regulamentação dos direitos, visando à maior segurança jurídica e estabilidade das relações sociais.


5 REFERÊNCIAS

ANGHER, A. J. (org.) Vade mecum acadêmico de direito. 1. Ed. São Paulo: Rideel, 2004.

BASTOS, Guilherme Augusto Caputo. O dano moral no direito do trabalho. 1º ed. São Paulo: LTR, 2003.

BELMONTE, Alexandre Agra; BORGES, Leonardo Dias. Danos morais decorrentes da relação de trabalho. Revista LTr, São Paulo, ano 70, n. 02, p. 161, fev.2006.

BEVILÁQUA, Clóvis. Theoria geral do Direito Civil. 2 ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1929.

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 1º ed. São Paulo: RT, 1992, p. 47.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 8ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 268.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Competência. Conflito Negativo. Justiça Estadual e Justiça do Trabalho. Indenização por dano moral e dano material decorrente de acidente de trabalho. Precedentes. Competência da Justiça Comum. Irene Francisca Barbosa Santana versus Companhia Têxtil Santa Elisabeth. Agravo Regimental 31.607/MG. Acórdão publicado em 03 de fevereiro de 2002. Disponível em <http:www.stj.gov.br>. Acesso em: 06 ago. 2009.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL E MATERIAL. AÇÃO AJUIZADA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. Ribas Francisco de Oliveira versus Comercial Destro Ltda. Recurso Ordinário 01220-2004-071-09-00-0. Acórdão publicado em 11 de novembro de 2005. Disponível em <http:www.trt9.gov.br> Acesso em: 06 ago. de 2009.

BRASIL. Tribunal Regional Trabalho da 15ª Região. Dano Moral. Prejuízo. Necessidade de demonstração do nexo de causalidade. Flávio Elier Santiago Assagra versus ACP Comércio de Alimentos Ltda. Recurso Ordinário 00828-2002-042-15-00-8. Acórdão publicado em 14 de novembro de 2003. Disponível em <http://www.trt15.gov.br>. Acesso em 06 ago. 2009.

CARMO, Julio Bernardo. A prescrição em face da reparação de danos morais e materiais decorrentes de acidentes de trabalho ou doença profissional ao mesmo equiparada. Revista LTr, São Paulo, ano 70, n. 06, p. 679, jun.2006.

DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Vol. 2, 10ª Edição, Editora Forense, 1995, p. 730.

DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. pp. 302-304.

FONSECA, Rodrigo Dias da. Danos morais e materiais na justiça do trabalho – prazo prescricional. Revista LTr, São Paulo, ano 70, n. 04, p. 448, abr.2006.

MELO, Raimundo Simão. Prescrição nas ações acidentárias. Revista LTr, São Paulo, ano 70, n. 10, p. 170, out.2006.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

LEVADA, Cláudio Antônio Soares. Liquidação de danos morais. 2. ed. São Paulo: Copola Livros, 1997.

MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista. São Paulo: Atlas, 2007.

MIRANDA, F. C. Pontes de. Tratado de direito privado. 1ª ed., São Paulo: Bookseller, t. VI, 2000.

NUNES, Luis Antônio Rizzato; CALDEIRA. Mirella D’Angelo. O dano moral e sua interpretação jurisprudencial. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 100

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de.  Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 319.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 20 ª edição. Vol 1. atualizadora Maria Celina Bodin de Moraes.Rio de Janeiro. Ed Forense, 2004.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Vol 1. São Paulo: Saraiva, 1998.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.p.185.

SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A prescrição do direito de ação para pleitear indenização por dano moral e material decorrente de acidente do trabalho. Revista LTr, São Paulo, ano 70, n. 05, pp. 546-547, mai.2006.

SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2ª Edição: RENOVAR, 2004.

VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol. 4. Ed. Atlas, 2004.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCUASSANTE, Priscyla Mathias. Do prazo prescricional das ações de dano moral na Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2484, 20 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14718. Acesso em: 26 abr. 2024.