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Argüição de inconstitucionalidade

Argüição de inconstitucionalidade

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1 INTRODUÇÃO

O controle de constitucionalidade é exercido no Brasil por diversas formas. Primeiramente através do processo legislativo impedindo que um projeto de lei em desacordo com os preceitos fundamentais da Constituição entre em vigência. E mesmo após uma norma inconstitucional entrar em vigor, há diversas maneiras de tirá-la do ordenamento jurídico e a declarar nula.

O princípio de supremacia da constituição é o conceito mais importante para se entender o poder hierárquico que existe entre a Lei Maior – a Constituição da República – em relação a todos os demais atos normativos existentes no ordenamento Jurídico.

Esse Princípio norteador do direito constitucional possui suas raízes nos tribunais norte-americanos que após o celebre caso Marbury versus Madison em 1803 resultou na primeira manifestação do Poder Judiciário acerca da constitucionalidade de uma lei, que será apresentado nas linhas abaixo

Analisaremos que a constituição escrita demonstra sua hierarquia em relação às demais normas, não apenas por ser uma norma jurídica com poder vinculante até mesmo para os poderes constituídos, mas também por todo o seu complexo processo de elaboração e aprovação exercido pelo poder constituinte originário.

Fica demonstrado nesta obra que o Brasil adotou, para controlar a constitucionalidade das normas infraconstitucionais, um sistema de controle de constitucionalidade eclético ou híbrido, na medida em que reúne o controle Político-Preventivo, adotado na França, e o controle Judicial-Repressivo, vigente no EUA.

A forma de controle abstrato tem como objetivo a declaração de inconstitucionalidade da própria norma, sem nenhum interesse subjetivo nesta declaração, somente de retirar do ordenamento jurídico esta norma incompatível com a Lei Fundamental, que poderá sofrer algumas peculiaridades em relação ao caso em concreto.

Analisaremos a possibilidade do controle de constitucionalidade ser exercido por qualquer juiz ou tribunal que é invocado por uma parte com o objetivo principal de satisfação de sua pretensão e não da própria declaração de inconstitucionalidade. Portanto neste caso essa declaração torna-se apenas uma causa de pedir para a parte atingir o seu objetivo, com efeitos, em regra, meramente inter partes.

Desvendaremos a questão sobre a aplicação dos efeitos no controle de constitucionalidade, em que no caso em concreto poderá ser ex nunc conforme o entendimento do órgão julgador, e assim admitindo a constitucionalidade de uma norma declarada inconstitucional por uma determinada lapso temporal.

Todavia, ao analisar o controle difuso de constitucionalidade realizado no Supremo Tribunal Federal, será também demonstrada a possibilidade de alteração legislativa que contribuirá para uma maior instrumentalidade do processo e uma maior efetividade das normas constitucionais que asseguram direitos aos cidadãos e que são constantemente ignoradas pelo Poder Legislativo.


2 SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO

A constituição consiste na fixação dos princípios, seus fundamentos em uma lei Maior, de uma comunidade. Estas normas escritas estão acima de qualquer outra norma escrita, que não poderão contrariá-las, bem como se encontra acima de todos os poderes do Estado, onde foi determinada. Consiste, portanto, em uma entidade viva, que se adapta ao desenvolvimento da sociedade, a fim de cumprir sua função reguladora, devendo ser respeitada por todos os membros do Estado, visando o progresso, o bem-estar e a convivência sadia e fraterna que deve prevalecer no seio da sociedade.

Para que ocorresse o objetivo pretendido com o movimento político-constitucional dos tempos modernos, surgiu a necessidade de que a constituição fosse escrita, ou seja, não apenas a presença de Constituições reais e efetivas, mas que encontrasse "escritas nas folhas de papel", conforme afirmou Lassalle (2004, p. 47).

Além de estar escrita, há a necessidade, para que a norma jurídica tenha sua eficácia perante as demais, de ser rígida. Essa rigidez se dá pelo seu processo para alteração, ou seja, uma norma constitucional somente pode ser modificada através de um procedimento complexo, não podendo ser modificada por uma lei ordinária.

A supremacia da Constituição consiste, primeiramente, em um aspecto material, no qual os atos normativos não podem contrariar as normas contidas nela, e também há um aspecto formal, que a Constituição prevê a organização, a estrutura, a composição, as atribuições e o procedimento dos Poderes.

As normas infraconstitucionais somente terão eficácia caso estejam de acordo com a Lei Maior, de forma que todas estas serão subordinadas a Constituição através de um critério hierárquico.

As normas contidas nas Constituições rígidas possuem a natureza de norma jurídica, isto é, são vinculantes, imperativas, geram uma obrigatoriedade a toda a coletividade, como é o caso da Constituição da República Federativa do Brasil, assim como a maioria das constituições modernas. Portanto, por terem este caráter imperativo ostentam uma posição de proeminência em relação às demais normas, que deveram respeitá-la, seja quanto a sua formação, ou seja, quanto à matéria de que tratam.

O que faz a Constituição como tão especial, e a colocando em um patamar de superioridade é justamente a sua fonte de sua elaboração, que foi realizada pelo Poder Constituinte Originário, que pertence ao povo exercido por meio dos seus representantes. Já as demais normas, que devem se conformar a esta supremacia, foram elaboradas pelo poder constituído, que por sua vez surgiu do próprio Poder Constituinte, o que demonstra, mais uma vez, a sua supremacia.

As características que, atualmente, garantem a suprema aplicação das normas constitucionais em relação às demais normas consiste na sua rigidez e por ser escrita. A partir da Constituição dos Estados Unidos, promulgada em 1787, todas as demais passaram a ter essas peculiaridades, a fim de obter sua plena eficácia, e assim não permitir o abuso do Poder do Estado perante a sociedade e garantir a todos uma maior segurança jurídica e social, conforme afirma Gustavo Binenbojm (2001, p 25)

O direito pátrio possui vários mecanismos legislativos e jurídicos para garantir que uma lei esteja de acordo com a Lei Maior. Primeiramente, há o controle preventivo exercido pelo poder Legislativo e Executivo para impedir que um projeto de ato legislativo considerado inconstitucional, pela sua forma ou pela própria matéria, venha a ser aprovado. Ocorre através da própria elaboração do processo legislativo [01] ou do veto pelo chefe do executivo.

Mesmo que não seja declarado inconstitucional, um ato legislativo, durante o processo legislativo, existe ainda o controle repressivo exercido pelo Poder Judiciário que será melhor analisado abaixo.


3 ORIGENS DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE

O controle Jurisdicional de Constitucionalidade teve origem no inicio do Século XIX nos Estados Unidos, por meio de um entendimento jurisprudencial acerca da necessidade da aplicação do Princípio da Supremacia da Constituição em relação às leis Ordinárias, principalmente no caso de Willian Marbury versus James Madison com a celebre decisão proferida por John Marshall (BINENBOJM, 2001, p. 29)

Antes deste caso, nunca houve nada especificamente parecido no mundo como o sistema norte-americano do judicial review, nada jamais havia sido criado para o controle e validade das leis. Em razão disto à própria criação da Constituição do Estados Unidos iniciou à época do "constitucionalismo", com a concepção da supremacy of the Constitution em relação às leis ordinárias(CAPPELLETTI, 1992 p. 42)

É oportuno, abrir um parêntese e analisar a origem do controle "americano" de constitucionalidade, quais foram as suas influências. Segundo Mauro Capeletti, tem origem no direito ateniense. Sobre a influencia do judicial review, no direito norte-americano sublinhou Capeletti:

Distinguia-se, no Direito ateniense, entre o nomos , isto é, a lei em sentido estrito, e o pséfisma, ou seja para usar o termo moderno, o decreto. Na realidade, o nómos, ou seja, as leis tinham um caráter que, sob certos aspectos, poderia se aproximar das modernas leis constitucionais, e isto não somente porque diziam respeito à organização do Estado, mas ainda porque modificações das leis (nómoi) vigentes não podiam ser feitas a não ser através de um procedimento especial, com características que, sem dúvida podem trazer à mente do jurista contemporâneo o procedimento de revisão constitucional.(CAPPELLETTI, 1992 p. 49)

Entretanto, ainda no direito ateniense, havia a elaboração de decretos (pséfisma) por uma Assembléia Popular, denominada Ecclesía. A Pséfisma podia tratar sobre matérias abstratas e gerais. O entendimento que havia na época é de que esta não podia estar em contraste com a nómos, pois era considerada norma Fundamental.

John Marshall, nativo do Estado de Virgínia, era o quarto Chief Justice [02] dos Estados Unidos e um Congressista do Estado da Virgínia. Na Guerra Revolucionária [03], Marshall assumiu o posto de Capitão, e ao termino do conflito advogou em Richmond e tornou-se delegado do Estado da Virgínia, eleito em uma Assembléia Geral. Em 1799, foi ao Congresso, e posteriormente nomeado Secretário de Estado por John Adams então Presidente dos Estados Unidos pelo Partido Federalista. Em seguida foi indicado para ser Presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos em 1801 onde permaneceu no cargo até a sua morte em 1835 com oitenta anos de idade.

Adams, o Presidente dos Estados Unidos e seu Secretário de Estado, John Marshall pertenciam ao Partido Federalista, que foi derrotado por Thomas Jefferson e seus partidários. O novo Presidente e o Congresso deveriam ser empossados meses depois, tempo suficiente para que Adams efetivasse o seu testamento político. A forma encontrada pelos federalistas foi nomear os correligionários para os cargos do Judiciário, onde usufruiriam das conhecidas garantias de vitaliciedade e de irredutibilidade de vencimentos. Um dos beneficiados deste ato foi Marshall, nomeado, depois de aprovação pelo Senado, para Presidente da Suprema Corte, cargo que acumulou com o de Secretário de Estado até a véspera da posse do novo Governo. No Período entre a derrota eleitoral e a posse do novo Governo, Marshall não conseguiu entregar todos os títulos de nomeação.

Portanto o famoso caso supracitado, Marbury versus Madison, iniciou no período da eleição americana para a Presidência do ano de 1800, Thomas Jefferson, representante dos Federalistas, consagrou-se vitorioso contra os Republicanos liderados por Alexandre Hamilton.

O então, presidente John Adams, que era do partido Federalista, no tempo que restava de seu mandato, com o intuito de conservar sua influência política no Poder Judiciário, aliou-se ao Congresso para, em fevereiro de 1801 aprovar uma lei de reestruturação do poder judiciário federal.

Suas principais mudanças foram, ter diminuído o número de Ministros da Suprema Corte, impedindo assim a nomeação de novos pelo futuro presidente e ter criado dezesseis cargos de juiz federal, que foram ocupados por seus aliados.

Ainda durante o seu mandato como presidente, John Adams, aprovou um projeto legislativo para a nomeação de quarenta e dois juízes de paz, sendo que quase todos os nomes indicados pelo Presidente foram aprovados e confirmados pelo Senado na véspera da posse do novo presidente, Thomas Jefferson.

Entretanto, não foram investidos todos nos cargos de juizes de paz, apesar de terem sidos nomeados pelo já ex-presidente, pois, ao assumir o poder, Thomas Jefferson, do partido Republicano, determinou com que seu secretário de Estado, James Madison, não entregasse os Atos de Investiduras as juizes que ainda não tinham sido empossados. Entre os juízes que não tomaram posse estava Willian Marbury, que havia sido nomeado juiz de paz do Distrito de Colúmbia, por John Adams, do partido Federalista.

Em dezembro de 1801 para ter seu direito ao cargo reconhecido, Marbury recorreu até a Suprema Corte requerendo um mandamus, para que o Secretário de Estado Madison fosse obrigado a dar-lhe posse. O writ baseava-se na Lei Judiciária de 1789 que autorizada a Suprema Corte a expedir mandados para remediar erros ilegais do Executivo.

O Presidente Thomas Jefferson, com maioria no congresso, alterou a lei que reorganizava o Judiciário Federal, extinguindo os cargos que haviam sido criados e destituindo seus ocupantes. Com a intenção de evitar questionamentos acerca dessa decisão, a Suprema Corte por supressão do Congresso deixou de se reunir de dezembro de 1801 até fevereiro de 1803.

Após esse intervalo de tempo surgiria o célebre aresto de John Marshall no caso de Marbury v. Madison, em 1803, consagrando o marco inicial do controle judicial a constitucionalidade das leis incorporando definitivamente ao sistema jurídico dos Estados Unidos.

John Marshall, Chief Justice, tratou o caso pelo prisma da competência constitucional da Suprema Corte para julgar o caso, analisando a incompatibilidade da Lei Judiciária de 1789 e a Constituição (CAPPELETTI, 1992 p. 48), que em seu artigo III, seção 2, disciplinava a competência originária da Corte.

A Constituição dos Estados Unidos disciplinava, expressamente, no artigo VI, clausula 2ª, que "this Constituition (...) shall be the supreme Law of the Land; and the judges in every State shall be bound thereby (...)" (CAPELLETTI 1992 p. 47). A interpretação de Marshall teve um caráter inovador fixando assim o princípio da Supremacia da Constituição, e por outro lado o poder, e dever dos juizes de negar aplicação das leis que contrariam à Constituição.

Nessa época, a Suprema Corte ainda não sustentava o grande prestígio que desfruta atualmente. Portanto, John Marshall enfrentou um enorme dilema em face das condições políticas no momento. No mandamus impetrado por William Marbury, particularmente, ele entendia que as nomeações feitas pelo antigo presidente deveriam ser mantidas, mas também temia que o Secretário de Estado, James Madison, sob ordens do então presidente, Thomas Jefferson, não cumprisse o mandado em favor de impetrante, com isso desmoralizaria a Suprema Corte, e ainda a sua própria pessoa, colocando em risco, até, a recente Constituição dos Estados Unidos, em decorrência ao choque entre o Poder Judiciário e o Executivo.

Em decisão exclusiva, Marshall, uma aula de direito constitucional, recusou-se a expedir o writ, sob a alegação da incompetência originária da Suprema Corte, pois a constituição previa taxativamente suas competências, e entre elas não cabia esta medida. E ainda, que a lei Judiciária de 1789 que dera a Suprema Corte o poder de expedir aquele tipo de mandado contra agentes de outros Poderes era inconstitucional, pois agindo assim, aumentava a competência fixada pela Constituição da Suprema Corte.

Embora não tenha emitido o writ, Marshall entendera que a conduta do Secretário do Estado, Madison, foi ilegal por não ter empossado o juiz de Paz, Marbury, ao cargo, uma vez que o mesmo já havia sido nomeado em conformidade com a legislação.

Marshall fundamentou sua decisão da seguinte maneira:

a questão de que uma lei em choque com a Constituição possa transformar-se em Direito do País é profundamente interessante para os Estados Unidos e, felizmente, não tão confusa quanto a proposição de seu interesse. Parece apenas necessário reconhecer certos princípios considerados há muito como bem estabelecidos, para decidir. Que o povo tem um Direito originário de estabelecer, para seu futuro governo, tais princípios, que, em sua opinião provavelmente melhor conduzirão à sua felicidade, é a base sobre a qual toda a estrutura americana tem sido erigida. O exercício desse Direito original demanda um enorme esforço; não pode nem deve ele ser freqüentemente repetido. Os princípios, portanto, assim estabelecidos, são considerados fundamentais; e como autoridade da qual promanam é suprema e raramente pode agir, são designados para ser permanentes. Essa vontade original e suprema organiza o governo e determina aos diversos departamentos seus respectivos poderes. Pode parar aqui ou estabelecer certos limites que não devem ser transcendidos por aqueles departamentos. O Governo dos Estados Unidos segue a última idéia. Os poderes do Legislativo são definidos e limitados e seus limites não podem ser controvertidos ou enfraquecidos; a Constituição é escrita. Qual o propósito de serem os poderes limitados e aqueles limites consignados por escrito, se puderem, a qualquer tempo, ser ultrapassados por limites considerados como restritos? A distinção entre um governo com poderes limitados ou ilimitados é abolida, se aqueles limites não contiverem as pessoas sobre as quais são impostos, e se leis proibidas e leis permitidas forem de igual obrigação. É uma proposição demasiadamente clara para ser contestada, a de que a Constituição controla a qualquer ato legislativo em choque consigo, ou que o Legislativo possa alterar a Constituição por lei ordinária. Entre estas alternativas, não há meio termo.(BINENBOJM, 2001 p. 32)

A citação supracitada demonstra o entendimento de Marshall em relação à supremacia da Constituição. Para ele os atos do Legislativo que confrontem com a Constituição devem ser revogados, fortificando a idéia de que possíveis antinomias além de serem resolvidas pelo critério cronológico (Lex posterior derogat legi priori) e pelo critério da especialidade (Lex specialis derogat legi generali) serão também resolvidas pelo critério hierárquico (Lex superior derogat legi inferiori).

John Marshall criticou a possibilidade do legislativo alterar, ou no caso, ampliar, uma norma jurídica de uma constituição. Ou a Constituição é rígida, e somente poderá ser altera por um procedimento específico, ou poderá o poder legislativo em seu bel-prazer deliberar e modificar as normas constitucionais por meio das leis ordinárias. Assim não poderia haver meio termo: ou a Constituição é uma lei superior, inacessível à legislação ordinária, ou está no mesmo patamar que as demais, podendo ser modificadas por lei ordinárias.

Em sua explanação, Marshall argumentou que caso a primeira alternativa – supremacia da constituição – for verdadeira, então qualquer ato legislativo contrário à Constituição não seria lei, ou seja, seria nulo, caso a ultima parte for verdadeira – a lei ordinária modificando a Constituição – então as constituições escritas são tentativas, em vão, emanadas pelo próprio povo, de limitar o poder do Estado que por natureza é ilimitado. Então, ou a constituição escrita limita o poder do Estado, ou este é ilimitado.

Neste sentido afirma Gustavo Binebojojm que uma lei considerada contraria lei superior, é considerada nula, isto é, invalidaa desde o seu nascedouro, cabendo ao judiciário, apenas, declarar tal nilidade.(2001, p. 34)

Por fim concluiu que um ato legislativo que confronta a norma Constitucional é void, ou seja, juridicamente vazio, haja vista que aqueles que a estruturaram, a contemplaram como the fundamental and Paramount law of the nation (CAPPELLETTI, 1992 p.63)

Além desse forte argumento baseado no objetivo de limitar o poder do Estado, defendendo a liberdade da sociedade, Marshall também utilizou de outros argumentos a fim de demonstrar a desrespeito da lei a Constituição, como o texto do próprio juramento que o juiz faz, obrigando-se a decidir conforme a Constituição e leis do Estados Unidos. Afirmou que a constituição é mencionada em primeiro lugar, induzindo que as leis dos Estados Unidos, não são qualquer leis, mas somente aquelas que estiverem de acordo com a Lei Maior.

Surgiu o sistema de controle de constitucionalidade das leis de extrema simplicidade conhecido como controle difuso, ou controle "americano" de constitucionalidade, judicial review, no constitucionalismo moderno, com a já mencionada decisão de 1803, de John Marshall, assegurando, pela suprema corte norte-americana a subordinação de todas as leis ordinárias a Lei Fundamental.

Porém, o caso de Marbury versus Madison não foi o primeiro da história norte-americana a colocar em xeque uma norma ordinária que não se encontrava compatível com a Lei Fundamental. Anteriormente, ainda no século XVIII, a Suprema Corte reviu um ato legislativo, na Hayburn’s Case em 1792. Em 1796, no caso Hylton versus United States, declarou a constitucionalidade de um ato do legislativo, que caso, estivessem convencidos da sua incompatibilidade com a constituição o teria declarado inconstitucional, mas não o fez. (BORGES, 2001 p. 15)

Ressalta-se ainda que no número LXXVIII de The Federalist papers, coleção de artigos publicados a favor da aceitação constituição, que unificava as leis, pois, não era bem aceita pela coletividade, sublinhou Alexandre Hamilton:

Procedendo a um exame da repartição judiciária do governo proposto e analisando a utilidade e a necessidade de uma judicatura federal – já havia afirmado que a interpretação das leis é uma província própria e peculiar das cortes e que uma constituição é, de fato, e deve ser considerada pelos juízes uma lei fundamental e que, portanto, cabe a estes verificar o significado dela, assim como o significado de qualquer ato particular procedente da corporação legislativa, de tal modo que, se suceder que exista uma discordância irreconciliável entre ambos, aquele que tiver validade e obrigatoriedade superiores deve, certamente, ser preferido; ou, em outras palavras, a Constituição deve ser preferida à lei: a intenção do povo, à intenção dos seus agentes.(1993, p.478)

É de suma importância a influência da sentença do juiz Marshall para o constitucionalismo moderno, bem como, sobre o controle judicial de constitucionalidade das leis, embora houvesse grande interesse político envolvido, pois Marshall acreditava que mesmo se a decisão fosse favorável para Marbury, dificilmente seria cumprida pelo Presidente, resultando, portanto em um desprestígio para a Suprema Corte.

Através de apurada técnica processual, Marshall estabeleceu que o requerente tinha o direito de ser empossado, mas que a lei que o conferia esta competência era inconstitucional. Portanto, incidentalmente, atribuiu à Suprema Corte o poder de declarar nulos atos controversos com a Constituição, denegando o mandado e concluindo que a norma deveria ser descartada.

Marshall em seus trinta e quatro anos como Chief Justice estabeleceu a Suprema Corte como a última instância a interpretar a Constituição, consagrando a via de exceção do controle de constitucionalidade das leis [04].

O modelo norte-americano serviu de modelo para os diversos paises para implantar em seu ordenamento jurídico o controle difuso de constitucionalidade, inclusive o Brasil, onde surgiu esta possibilidade desde a primeira Constituição da Republica, que o previa em seu artigo 59.

Essa decisão do Chief Justice Marshall, com a proclamação da supremacia da Constituição sobre as outras leis e por conseqüência a não aplicação das normas inconstitucionais pelos juizes, representou em uma grande inovação no mundo jurídico atual, onde a maioria das constituições modernas possui um caráter de rígida, e não mais flexível, não podendo ser modificadas ou derrogadas por leis ordinárias.

Após uma resistência inicial, a doutrina do judicial review se concretizou nos Estados Unidos da América e se espalhou, gradativamente, em seguida por diversos países como Canadá, Brasil, Argentina, Japão, Portugal, Noruega, Dinamarca, Suécia, Alemanha e Itália (BINENBOJM, 2001 p. 35).

Entretanto, essa influência em países de tradição jurídica romano-germânica criou uma problemática, que acabou cedendo espaço, ao decorrer do século XX, para o sistema de controle concentrado, em que a fiscalização é exercida por um único órgão jurisdicional competente.


4 CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL.

4.1 ORIGEM

Desde o surgimento da constituição da República que atribuiu ao Brasil a característica de um estado Democrático de Direito, sendo que uma das bases que sustenta esse modelo de estado é o princípio da legalidade, neste sentido José Afonso da Silva ensina sobre a importância da lei:

Deve, pois, ser destacada a relevância da lei no Estado Democrático de Direito, não apenas quanto ao seu conteúdo formal de ato jurídico abstrato, geral, obrigatório e modificativo da ordem jurídica existente, mas também à sua função de regulamentação fundamental, produzida segundo um procedimento constitucional qualificado (2006, p. 121).

Portanto, conforme já foi mostrado anteriormente, a supremacia da constituição impõe que todas as situações jurídicas estejam em acordo com os princípios elencados, ou seja, deve afastar toda norma que esteja em desacordo com o estabelecido pelo legislador constituinte, de modo que haja um compatibilidade entre as normas.

Zeno Veloso, ao tecer comentários sobre a hierarquia constitucional, de maneira lapidar, constata:

As normas constitucionais são dotadas de preeminência, supremacia em relação às demais leis e atos normativos que integram o ordenamento jurídico estatal. Para manter a harmonia do sistema, e até por uma questão de lógica, coerência, todas as normas devem se adequar, têm de ser pertinentes, precisam se conformar com a Constituição, que é o parâmetro, o valor supremo, o nível mais elevado do direito positivo, a lex legum (Leis das leis) (2007, p.135).

Não diferente da maioria dos países de cultura commow law [05], o Brasil, embora possua sua principal influência do civil law [06], também encontra raízes históricas no direito norte-americano, especialmente no caso anteriormente mencionado de Marbury versus Madison, quando o Juiz Marshall da Suprema Corte entendeu que havendo conflito entre a aplicação de uma lei e a Constituição em um caso concreto, deve prevalecer sempre a norma hierarquicamente superior.

Dirley da Cunha Junior demonstra essa importante influência norte-americana no direito constitucional pátrio:

A decisão de Marshall representou a consagração não só da supremacia da constituição em face de todas as demais normas jurídicas, como também do poder e dever dos juízes de negar aplicação às leis contrárias à Constituição. Considerou-se que a interpretação das leis era uma atividade específica dos juízes, e que entre essas figurava a lei constitucional, como a lei suprema, de tal modo que, em caso de conflito entre duas leis a aplicar a um caso concreto, o juiz deve aplicar a lei constitucional e rejeitar, não a aplicando, a lei inferior (2007, p. 75).

Passou a ser adotado no Brasil, inicialmente com a constituição de 1891, baseado no modelo do judicial review norte americano, e não previa qualquer outra espécie de controle, sendo recepcionada pelas demais Constituições até 1988. Durante o período de 1891 a 1988 surgiram várias inovações no cenário nacional neste âmbito de controle de constitucionalidade.

Foi perdendo espaço, ao longo deste século, o sistema baseado no commow law para o novo modelo de controle que surgiu na Europa baseado no civil law, conhecido como controle concentrado de constitucionalidade, sendo também adotado no ordenamento jurídico brasileiro. Com isso, portanto, o Brasil adotou o sistema misto de controle de constitucionalidade, baseado nos dois modelos supramencionados.

4.2 CONTROLE DIFUSO NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA.

Conforme tradição no direito brasileiro, o controle difuso de constitucionalidade é cabível nos casos que seja imprescindível para o deslinde do caso concreto. Ocorrendo diante uma relação jurídica controvertida levada ao judiciário sendo possível questionar a constitucionalidade do ato normativo aplicado ao caso. Necessitando, o magistrado, aferir a constitucionalidade para decidir o mérito.

Sobre essa explanação defende Marcelo Alexandrino:

Então, sendo argüida a inconstitucionalidade da norma, o juiz, para reconhecer ou negar o direito do autor, vê-se obrigado a examinar a questão de constitucionalidade suscitada. Por isso se diz que no controle difuso o objeto da ação não é a constitucionalidade em si, mas sim uma relação jurídica concreta qualquer (2007, p. 39).

Por esse motivo que o controle difuso é denominado de incidental ou incidenter tantum, já que a declaração de inconstitucionalidade da norma é meramente acessória, porquanto a questão principal a ser decidida é o reconhecimento ou proteção de um direito alegado.

Pelo fato de a controvérsia surgir no caso concreto, esse controle poderá ser realizado por qualquer órgão do Poder Judiciário, seja pelos juízes de primeiro grau, pelos Tribunais locais ou superiores, podendo a controvérsia, inclusive, ser levada ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal através do recurso extraordinário ou ordinário.

Vejamos o que dispõe a constituição da república neste sentido, em seu artigo 102 inciso II e III:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

II - julgar, em recurso ordinário:

a) o "habeas-corpus", o mandado de segurança, o "habeas-data" e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão;

b) o crime político;

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal

Nesta forma de controle, a inconstitucionalidade dos atos ou omissões do Estado possuem uma natureza de questão prejudicial, devendo ser decidida pelo juiz ou tribunal anteriormente de julgar a própria controvérsia. Assim afirma Dirley da Cunha Júnior, uma conditio sine qua non da resolução do conflito (2006, p 99).

O controle difuso de constitucionalidade pode operar-se no âmbito de qualquer processo judicial, desde que seja exercida concretamente em um processo inter partes, na defesa de um direito subjetivo das partes interessadas. A questão é argüida incidentalmente, como um causa de pedir remota, com a finalidade de satisfação de um direito da parte e não de propriamente declarar a inconstitucionalidade do ato normativo.

Esta garantia constitucional tem esta natureza prejudicial, ou seja, antes de julgar o mérito, e com isso, quando é trazida a matéria da constitucionalidade para ser deduzida em juízo, deve o magistrado conhecer da questão e se manifestar sobre a matéria que terá efeito, em princípio, inter partes. Entretanto haverá casos que seus efeitos poderão atingir a terceiros, que será explanado posteriormente.

Conforme ocorre no direito norte-americano, esta forma de controle se manifesta por via de exceção, podendo o interessado atacar o ato diretamente ou se defender da imposição deste, não importando em que pólo do processo esteja, seja autor ou réu de uma demanda judicial.

Neste sentido Lúcio Bittencourt entende que "desde que exista, ou possa existir, um litígio e para a sua decisão seja mister o exame da eficácia da lei, pouco importa a forma processual adotada."(2006 p 102). A ação não pode ter como pedido unicamente a declaração da constitucionalidade como causa de pedir, mas deve existir uma lide principal.

Portanto poderá o autor provocá-la em qualquer inicial de qualquer ação, seja de natureza civil, penal, trabalhista, eleitoral e nas de natureza constitucional como o mandado de segurança, o habeas corpus, habeas data, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública, inclusive em qualquer tipo de procedimento, seja conhecimento, execução e cautelar.

Nesta mesma linha de raciocínio pode provocar o réu, em seus atos de resposta, como contestação, reconvenção, exceção, intervenção de terceiros e ações incidentais de contra-ataque como o embargos à execução, para se defender de uma norma que considere inconstitucional.

Na maioria das vezes esta forma de controle ocorre com as ações constitucionais de garantias, ou seja, pelos remédios constitucionais, em razão de sua celeridade e seus procedimentos que são especiais.

Assim pode exercer o controle de constitucionalidade qualquer parte do processo, seja o autor ou réu, os terceiros envolvidos, o Ministério Público quando atue no feito e ainda o juiz de ofício. Entretanto neste último caso o Supremo Tribunal Federal não adota essa doutrina. O entendimento do Egrégio tribunal é de que deve haver um pré-questionamento das partes para se manifestar, com base no princípio da demanda.

4.3 DA COMPETÊNCIA PARA REALIZAR O CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE.

Esta forma de controle pode ser exercida por qualquer juiz, originalmente, ou tribunal, originalmente ou em grau de recuso, competente para processar e julgar a causa, inclusive o Supremo Tribunal Federal.

Vale esclarecer que o Superior Tribunal de Justiça, somente pode exercer esta forma de controle concreto no âmbito de sua competência originária, na forma do art. 105, I, ou em grau de recurso ordinário, conforme art. 105, II, não podendo, portanto, exercer em Recurso Especial, pois nesta forma só pode julgar matéria infraconstitucional, uma vez que a matéria constitucional é de competência do Supremo Tribunal Federal em Recurso Extraordinário [07].

Nesta matéria deve ser respeitada a regra que indica o artigo 97 da Constituição da República, senão vejamos o texto deste dispositivo.

Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

Esta norma constitucional exige para que seja declarada a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo pelos tribunais deve haver o quorum de maioria absoluta de seus membros e a reserva de plenário.

Acerca de dessas condições de eficácia da declaração de inconstitucionalidade, ensina Dirley da Cunha Junior:

Cuida a aludida regra de uma condição de eficácia da decisão declaratória de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo do poder público. Assim, como condição de eficácia de decisão, exige a Constituição que a declaração de inconstitucionalidade proclamada pelo tribunal seja pronunciada pela maioria absoluta(primeiro número inteiro subseqüente à metade) de seus membros ou daqueles que compõem o órgão especial (onde houver, na forma do inciso XI do artigo 93) (2006, p. 139).

4.4 DOS PROCEDIMENTOS PARA O CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE.

Em se tratando de controle incidental argüido perante qualquer juiz, não há procedimento específico para ser observado, tão-somente será suscitada como todas as demais questões prejudiciais de mérito que ocorre no decorre do processo, como fundamento de uma pretensão ou resistência à pretensão de outrem.

Entretanto se for provocada perante tribunal, deve-se observa os artigos 480 e 482 do CPC [08] e o seu regimento interno. Sendo assim, explica Dirley da Cunha Júnior como ocorre este procedimento quando argüido:

Efetivamente, suscitada a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, em qualquer processo concreto de competência originária ou recursal, o relator do processo, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara a que tocar o conhecimento da causa. Se a argüição for rejeitada, o julgamento prosseguirá. Por outro lado, se acolhido, o que poderá ser por maioria simples, será lavrado o acórdão, a fim de ser a questão submetida ao plenário do tribunal ou, onde houver, ao órgão especial.(2006, p.142)

Com a inclusão dos parágrafos 1°, 2° e 3° do artigo 482 do CPC pela lei 9.868, de 10 de novembro de 1999 [09], alguns entes públicos poderão manifestar-se no incidente de inconstitucionalidade em curso perante os tribunais, criando assim um caráter de concentração e objetivação no controle difuso exercido nos Tribunais, denominado Reserva de Plenário.

Assim, decidida a inconstitucionalidade do ato normativo de forma incidental, o processo volta para à apreciação da turma ou câmara pra julgamento da pretensão deduzida. Isto trata da divisão funcional de competência entre plenário e órgão fracionário. Ocorre que a decisão do plenário, isto é, aquela que trata apenas da inconstitucionalidade do ato não é passível de recurso. Assim trata a súmula 513 do STF.

Súmula 513 do STF: A decisão que enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é a do plenário, que resolve o incidente de inconstitucionalidade, mas a do órgão (câmaras, grupos ou turmas) que completa o julgamento do feito.

Neste sentido ainda há as sumulas 293 e 455 do STF sobre essa impossibilidade.

Sumula 293 do STF: São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão de matéria constitucional submetida ao plenário dos tribunais

Sumula 455 do STF: Da decisão que se seguir ao julgamento de constitucionalidade pelo Tribunal Pleno são inadmissíveis embargos infringentes quanto à matéria constitucional.

Ressalta-se que para haver julgamento de questão de inconstitucionalidade de algum ato normativo, seja ele concreto ou abstrato, é necessário o quorum mínimo de 8 ministros presentes, e da votação de 6 deles para a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade do ato.

É importante destacar que muito é debatido na doutrina acerca da possibilidade de controle concreto em ação civil pública, mas o entendimento dos Tribunais Superiores reconhece a possibilidade, pois o que faz coisa julgada é o dispositivo que terá efeitos erga omnes, mas a fundamentação na qual constará a argüição de constitucionalidade não fará coisa julgada erga omnes.

4.5 DOS EFEITOS DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE.

Com base na doutrina norte-americana, e, especialmente, no já mencionado caso Marbury versus Madison é considerado nulo todo o ato em contraste com a norma constitucional.

Portanto, uma decisão que declara a inconstitucionalidade de um ato normativo do poder público em um caso concreto tem efeitos declaratórios, retroagindo à origem do ato impugnado para declará-lo nulo, ou seja, este ato não chegou a viver. É uma lei que nasceu morta. Conforme afirmou Alfredo Buzaid que não teve, pois, nenhum único momento de validade. (2004. apud JUNIOR, 2006, p 143).

Com isso o efeito dessa declaração de inconstitucionalidade terá efeitos ex tunc [10], retroagindo sua nulidade até o momento de sua origem, declarando nulo todas as relações jurídicas atingidas por esse ato normativo desde seu surgimento.

Entretanto poderá o Tribunal em uma determinada situação concreta, entendendo ser necessário, limitar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade atribuindo a sua decisão efeitos ex nunc [11]. Tal possibilidade é também uma herança do direito norte-americano, especialmente do caso Likletter versus Walker, e considerado o leading case, julgado pela Suprema Corte em 1965.(JÚNIOR, 2006, p. 143).

No Brasil esta possibilidade ganhou força com a vigência das Leis 9.868 e 9.882 de 1999, que dispõem sobre os processos de Ação direta de Constitucionalidade e outras formas de controle concentrado de constitucionalidade, especialmente nos artigo 27 e 11, que em razão do princípio da segurança jurídica e o interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal restringir ou decidir que os efeitos da sentença só tenham eficácia a partir do seu transito em julgado.

Em princípio a decisão que declara a inconstitucionalidade de uma norma até mesmo através do Supremo Tribunal Federal, no controle difuso de constitucionalidade produzirá seus efeitos somente com parte integrantes da demanda judicial que a deu origem. Tendo assim, seus efeitos inter partes.

Contudo, a decisão em controle difuso-incidental, eventualmente, pode ter seus efeitos estendidos a terceiros, passando, pois, a ter efeitos erga omnes, como no sistema objetivo de controle abstrato de constitucionalidade.

Para isso, é preciso atentar-se ao art. 52, inc. X da Constituição, que dispõe que caberá privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, da lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Essa suspensão pode se dar em relação às leis federais, estaduais, distritais e municipais, desde que, é claro, sua inconstitucionalidade tenha sido reconhecida em controle difuso.

Vejamos o que dispõe o artigo 52 inciso X da Constituição:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

Entretanto deve-se diferenciar o conceito de retirar da eficácia para a suspensão da eficácia. Este se entende como revogar a lei, à espera da retirada de sua eficácia, deixando ela de produzir efeitos a partir de certo momento. Retirada sua eficácia ela se torna nula, como se nunca tivesse existido, o que a faz produzir efeitos ex tunc.

É ato discricionário do Senado, e facultativo, em que analisando os critérios de oportunidade e conveniência suspenderá ou não a eficácia da lei, com isso não há qualquer prazo para sua manifestação, e tampouco um sanção a uma eventual não suspensão do prazo. Sobre essa faculdade do legislador ensina Pedro Lenza que

o Senado Federal não está obrigado a suspender a execução de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Trata-se de discricionariedade política, tendo o Senado Federal total liberdade para cumprir o art. 52, X da CF/88. Caso contrário, estaríamos diante de afronta ao princípio da separação de poderes. (2007, p. 114).

Entretanto, acerca da nova leitura do artigo 52, inciso X da CRFB, o Ministro do STF, Gilmar Mendes, sustenta que teria ocorrido uma "Mutação Constitucional" (2007, p. 206) que consiste numa espécie de reforma da Constituição sem a modificação no texto.

Por essa razão sublinha o eminente Ministro.

Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão do Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. [...] Assim, o Senado não terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que não se cuida de uma decisão substantiva, mas de simples dever de publicação [...]. (MENDES, 2007, p. 208).

Com isso há uma grande aproximação do controle difuso de constitucionalidade com o judicial review do modelo americano, típico dos países com cultura do commow law, implicando na vinculação das decisões da Suprema Corte aos demais órgãos judiciário e administrativos.

Entretanto esse entendimento do Ministro não é aceito por grande parte da doutrina que entende que não ser possível a mutação atribuindo efeitos erga omnes para as decisões de controle difuso, pois não há previsão legislativa para sua implementação, e ainda, apenas tornar público um entendimento do Supremo Tribunal Federal significa reduzir as atribuições constitucionais do Senado.

Há autores que afirmam que o controle de constitucionalidade do Brasil é misto, envolvendo controle político com judicial. Entretanto Dirley da Cunha Júnior explica esse equívoco.

Cumpre esclarece que o artigo 52, inciso X, da Constituição Federal, sub examine, não autoriza o Senado a declarar nenhuma inconstitucionalidade [...] Aquela disposição (art. 52 X CF) tão-somente confere ao Senado a competência para deliberar sobre a suspensão da execução do ato, declarado inconstitucional, aqui sim, por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, para o fim específico de emprestar eficácia genérica, ou seja, erga omnes, a essa decisão judicial, até então de efeitos inter partes, porquanto pronunciada num processo judicial concreto, em sede de controle incidental.(2006, p 145 e 146)

Assim o sistema de controle difuso de constitucionalidade do Brasil deve ser exercido pelo próprio poder jurisdicional, não devendo vincular o Senado nesta questão. Por isso, salienta Dirley da Cunha Junior:

Deva eliminar o sistema de intervenção do Senado nas questões constitucionais discutidas incidentalmente, para transformar o Supremo Tribunal Federal em verdadeira Corte com competência para decidir, ainda que nos casos concretos, com eficácia geral e vinculante, à Semelhança do stare decisis da Supreme Court dos Estado Unidos da América (2006 p.150).

Por fim, podemos afirmar que novo paradigma do controle difuso de constitucionalidade é possível a transcendência dos motivos determinantes, no qual a fundamentação terá efeitos erga omnes, mas não fará coisa julgada. E neste passo, o dispositivo fará coisa julgada, entretanto os efeitos serão inter partes.


5 CONCLUSÃO

Desde a evolução histórica da supremacia da constituição sobre as demais normas existentes, de modo que todas as demais normas devem estar de acordo com a lei superior, e em razão da rigidez da Constituição, foi necessária a criação de mecanismos para que as normas não contrariassem a lei maior.

Surgiu então o controle de constitucionalidade dos atos normativos, iniciando com o caso norte-americano através do caso Marbury versus Madison no âmbito de controle incidental – difuso e o com o modelo Austríaco de controle concentrado de constitucionalidade, de modo que o ordenamento jurídico brasileiro adotou o sistema misto de controle.

Diferentemente do controle abstrato, em que a constitucionalidade da norma é verificada em tese, o controle difuso ocorre diante de casos concretos, em que as partes litigantes, de maneira incidental, pedem que se declare determinado ato ou norma inconstitucional naquele caso.

A princípio terão seus efeitos inter parte e ex tunc, entretanto com a evolução e a nova modulação dos efeitos temporais do controle difuso, poderá atribuir, em determinados casos especiais, os seus efeitos erga omnes e ex nunc.

Essa possibilidade de abstração do controle concreto de constitucionalidade resulta em uma maior instrumentalidade do processo para atingir o maior numero possível de pessoas e garantir a aplicação correta de um preceito fundamental.

É certo o conceito acerca da função do Supremo Tribunal Federal, de maneira que este não é apenas decidir as interesses pessoais das partes, mas sim de proteger a constituição e dizer qual é o sentido da norma escrita, pois embora a norma seja escrita pelo poder Legislativo, no caso pelo Poder Constituinte, este apenas faz a redação o sentido da norma é feito pelo Poder Judiciário.

Dessa forma, em atenção ao princípio da economia e celeridade processuais, da efetividade da jurisdição e da segurança jurídica, entende-se que se o órgão jurisdicional competente para declarar, em última instância, a inconstitucionalidade de uma lei já o fez por maioria absoluta de seus membros, tal decisão, ainda que em sede de controle difuso de constitucionalidade, deveria ter efeitos ex tunc e erga omnes, impedindo, portanto, que as instâncias inferiores concedessem falsas expectativas aos jurisdicionados, que são tão penalizados pela delonga na decisão de seus processos.

Por fim, essa forma de controle difuso de constitucionalidade é um enorme enriquecimento democrático ao país, que permite ao cidadão comum questionar em juízo a inconstitucionalidade de uma determinada norma a fim de satisfazer a sua pretensão.


6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 4ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009.

BINENBOJM, Gustavo. A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

BITTENCOURT, Carlos Alberto Lúcio. O Controle Jurisdicional da Constitucionalidade das Leis. 1968. Rio de Janeiro: Forense

BUZAID, Alfredo. Da declaração de inconstitucionalidade no direito brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1958

CAPPELLETTI, Mauro. O Controle Judicial de Constitucionalidade das Leis no Direito Comparado. 2ª ed. Porto Alegre: Fabris, 1992.

DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23 ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2008

DA SILVA, Jose Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

JÚNIOR, Dirley da Cunha. Controle de Constitucionalidade: Teoria e Prática. Salvador: Edições Podivm, 2006.

LASSALE, Ferdinand. O que é uma constituição. São Paulo: Global Editora, 1987.

MADISON, James; HAMILTON, Alexander; JAY, John. Os Artigos Federalistas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3ªed. São Paulo: Saraiva, 2004.

VELOSO, Zeno. Reforma do Judiciário. São Paulo: Saraiva, 2007.


ANEXO I

RE 197917 / SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA

Julgamento: 06/06/2002 Órgão Julgador: Tribunal Pleno

Parte(s)

RECTE. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

RECDOS. : CÂMARA MUNICIPAL DE MIRA ESTRELA E OUTROS

ADV. : JAIR CESAR NATTES

EMENTA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIOS. CÂMARA DE VEREADORES. COMPOSIÇÃO. AUTONOMIA MUNICIPAL. LIMITES CONSTITUCIONAIS. NÚMERO DE VEREADORES PROPORCIONAL À POPULAÇÃO. CF, ARTIGO 29, IV. APLICAÇÃO DE CRITÉRIO ARITMÉTICO RÍGIDO. INVOCAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA RAZOABILIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A POPULAÇÃO E O NÚMERO DE VEREADORES. INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. 1. O artigo 29, inciso IV da Constituição Federal, exige que o número de Vereadores seja proporcional à população dos Municípios, observados os limites mínimos e máximos fixados pelas alíneas a, b e c. 2. Deixar a critério do legislador municipal o estabelecimento da composição das Câmaras Municipais, com observância apenas dos limites máximos e mínimos do preceito (CF, artigo 29) é tornar sem sentido a previsão constitucional expressa da proporcionalidade. 3. Situação real e contemporânea em que Municípios menos populosos têm mais Vereadores do que outros com um número de habitantes várias vezes maior. Casos em que a falta de um parâmetro matemático rígido que delimite a ação dos legislativos Municipais implica evidente afronta ao postulado da isonomia. 4. Princípio da razoabilidade. Restrição legislativa. A aprovação de norma municipal que estabelece a composição da Câmara de Vereadores sem observância da relação cogente de proporção com a respectiva população configura excesso do poder de legislar, não encontrando eco no sistema constitucional vigente. 5. Parâmetro aritmético que atende ao comando expresso na Constituição Federal, sem que a proporcionalidade reclamada traduza qualquer afronta aos demais princípios constitucionais e nem resulte formas estranhas e distantes da realidade dos Municípios brasileiros. Atendimento aos postulados da moralidade, impessoalidade e economicidade dos atos administrativos (CF, artigo 37). 6. Fronteiras da autonomia municipal impostas pela própria Carta da República, que admite a proporcionalidade da representação política em face do número de habitantes. Orientação que se confirma e se reitera segundo o modelo de composição da Câmara dos Deputados e das Assembléias Legislativas (CF, artigos 27 e 45, § 1º). 7. Inconstitucionalidade, incidenter tantun, da lei local que fixou em 11 (onze) o número de Vereadores, dado que sua população de pouco mais de 2600 habitantes somente comporta 09 representantes. 8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário conhecido e em parte provido.

DECISÃO

Por unanimidade, a Turma deliberou afetar ao Plenário o julgamento do feito. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Celso de Mello. 2a. Turma, 31.08.99. Após o voto do Senhor Ministro Maurício Corrêa, Relator, conhecendo e provendo parcialmente o recurso, no sentido de julgar procedente, em parte, o pedido formulado na inicial, declarando a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 6º da Lei nº 226, de 31 de março de 1990, do Município de Mira Estrela, Estado de São Paulo, a Presidência indicou adiamento. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Ilmar Galvão. Plenário, 06.06.2002. Após o voto do Senhor Ministro Maurício Corrêa, Relator, conhecendo e provendo parcialmente o recurso, para acolher, em parte, o pedido formulado na inicial, declarando a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 6º da Lei nº 226, de 31 de março de 1990, do Município de Mira Estrela, Estado de São Paulo, pediu vista o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Presidência do Senhor Ministro Marco Aurélio. Plenário, 27.06.2002. Colhido o voto do Senhor Ministro Gilmar Mendes, acompanhando, parcialmente, o voto do Senhor Ministro Maurício Corrêa, Relator, para fixar a eficácia da declaração de inconstitucionalidade considerada a próxima legislatura, pediu vista o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence. Presidência do Senhor Ministro Marco Aurélio. Plenário, 10.04.2003. Após os votos dos Senhores Ministros Relator, Gilmar Mendes, Nelson Jobim, Joaquim Barbosa e Carlos Britto, que conheciam do recurso extraordinário e lhe davam parcial provimento para, restabelecendo em parte a decisão de primeiro grau, declarar inconstitucional, incidenter tantum, o parágrafo único do artigo 6º da Lei Orgânica nº 226, de 31 de março de 1990, do Município de Mira Estrela/SP, e determinar à Câmara de Vereadores que, após o trânsito em julgado, adote as medidas cabíveis para adequar sua composição aos parâmetros ora fixados, e dos votos dos Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio, que conheciam do recurso mas lhe negavam provimento, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Cezar Peluso. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 11.12.2003. O Tribunal, por maioria, deu parcial provimento ao recurso para, restabelecendo, em parte, a decisão de primeiro grau, declarar inconstitucional, incidenter tantum, o parágrafo único do artigo 6º da Lei Orgânica nº 226, de 31 de março de 1990, do Município de Mira Estrela/SP, e determinar à Câmara de Vereadores que, após o trânsito em julgado, adote as medidas cabíveis para adequar sua composição aos parâmetros ora fixados, respeitados os mandatos dos atuais vereadores, vencidos os Senhores Ministros Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Celso de Mello. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 24.03.2004.

ANEXO II

AI 582280 AgR / RJ - RIO DE JANEIRO

AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO

Relator(a): Min. CELSO DE MELLO

Julgamento: 12/09/2006 Órgão Julgador: Segunda Turma

Parte (s)

AGTE.(S) : MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

ADV.(A/S) : HERALDO MOTA PACCA

AGDO.(A/S) : OLIVIER CHARLES MATHIEUX

ADV.(A/S) : LAURO LUIZ STUDART LEÃO E OUTRO(A/S)

E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO/RJ - PLEITO RECURSAL QUE BUSCA A APLICAÇÃO, NO CASO, DA TÉCNICA DA MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - IMPOSSIBILIDADE, PELO FATO DE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NÃO HAVER PROFERIDO DECISÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PERTINENTE AO ATO ESTATAL QUESTIONADO - JULGAMENTO DA SUPREMA CORTE QUE SE LIMITOU A FORMULAR, NA ESPÉCIE, MERO JUÍZO NEGATIVO DE RECEPÇÃO - NÃO-RECEPÇÃO E INCONSTITUCIONALIDADE: NOÇÕES CONCEITUAIS QUE NÃO SE CONFUNDEM - RECURSO IMPROVIDO. 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O VALOR DO ATO INCONSTITUCIONAL - OS DIVERSOS GRAUS DE INVALIDADE DO ATO EM CONFLITO COM A CONSTITUIÇÃO: ATO INEXISTENTE? ATO NULO? ATO ANULÁVEL (COM EFICÁCIA "EX TUNC" OU COM EFICÁCIA "EX NUNC")? - FORMULAÇÕES TEÓRICAS - O "STATUS QUAESTIONIS" NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 2. MODULAÇÃO TEMPORAL DOS EFEITOS DA DECISÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE: TÉCNICA INAPLICÁVEL QUANDO SE TRATAR DE JUÍZO NEGATIVO DE RECEPÇÃO DE ATOS PRÉ-CONSTITUCIONAIS. - A declaração de inconstitucionalidade reveste-se, ordinariamente, de eficácia "ex tunc" (RTJ 146/461-462 - RTJ 164/506-509), retroagindo ao momento em que editado o ato estatal reconhecido inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. - O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, excepcionalmente, a possibilidade de proceder à modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mesmo quando proferida, por esta Corte, em sede de controle difuso. Precedente: RE 197.917/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA (Pleno). - Revela-se inaplicável, no entanto, a teoria da limitação temporal dos efeitos, se e quando o Supremo Tribunal Federal, ao julgar determinada causa, nesta formular juízo negativo de recepção, por entend er que certa lei pré-constitucional mostra-se materialmente incompatível com normas constitucionais a ela supervenientes. - A não-recepção de ato estatal pré-constitucional, por não implicar a declaração de sua inconstitucionalidade - mas o reconhecimento de sua pura e simples revogação (RTJ 143/355 - RTJ 145/339) -, descaracteriza um dos pressupostos indispensáveis à utilização da técnica da modulação temporal, que supõe, para incidir, dentre outros elementos, a necessária existência de um juízo de inconstitucionalidade. - Inaplicabilidade, ao caso em exame, da técnica da modulação dos efeitos, por tratar-se de diploma legislativo, que, editado em 1984, não foi recepcionado, no ponto concernente à norma questionada, pelo vigente ordenamento constitucional.

DECISÃO:

A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. 2ª Turma, 12.09.2006.


Notas

  1. Essa forma de controle será exercida pela Comissão de Constituição e Justiça que possui competência para apreciar todos os processos que tramitam na Assembléia Legislativa, antes de serem votados pelo Plenário.
  2. Chief Justice pode ser comparado aos Ministros do Supremo no direito Pátrio.
  3. Guerra da Independência dos Estados Unidos de 1775 a 1783, entre Inglaterra e França, onde delimitou grandes áreas do território norte americano.
  4. Após o caso Marbury versus Madison, a Suprema Corte somente voltou a declarar a inconstitucionalidade de uma lei federal em 1857, no caso Dread Scott, quando entendeu incompatível com a Constituição a seção 8ª do Missouri Compromise Act, de 1850, que proibia a escravidão nos territórios. Essa decisão entendeu que escravos não eram cidadãos, mas sim propriedades, o que gerou durante algum tempo a perda a prestigio da Suprema Corte.
  5. Common Law é uma estrutura mais utilizada por países de origem anglo-saxônica como Estados Unidos e Inglaterra, que o Direito, basicamente, se baseia mais na Jurisprudência que no texto da lei.
  6. Civil Law é a estrutura jurídica oficialmente adotada no Brasil. O que basicamente significa que as principais fontes do Direito adotadas aqui são as Leis.
  7. Conforme dispõe artigo 102 da Constituição da República Federativa do Brasil.
  8. CPC Art. 480. Argüida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público, o relator, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara, a que tocar o conhecimento do processo.
  9. CPC Art. 482. Remetida a cópia do acórdão a todos os juízes, o presidente do tribunal designará a sessão de julgamento

  10. CPC Art 482. § 1º O Ministério Público e as pessoas jurídicas de direito público responsáveis pela edição do ato questionado, se assim o requererem, poderão manifestar-se no incidente de inconstitucionalidade, observados os prazos e condições fixados no Regimento Interno do Tribunal.§ 2º Os titulares do direito de propositura referidos no art. 103 da Constituição poderão manifestar-se, por escrito, sobre a questão constitucional objeto de apreciação pelo órgão especial ou pelo Pleno do Tribunal, no prazo fixado em Regimento, sendo-lhes assegurado o direito de apresentar memoriais ou de pedir a juntada de documentos. § 3º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá admitir, por despacho irrecorrível, a manifestação de outros órgãos ou entidades.
  11. Como regra geral no ordenamento brasileiro. Neste sentido vide o Anexo II.
  12. Iniciou com a decisão do RE 197.917/SP, que modificou os efeitos para garantir maior segurança jurídica. (Vide decisão – Anexo I)

Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRAL, Raul Campos. Argüição de inconstitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2883, 24 maio 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19173. Acesso em: 26 abr. 2024.