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Representação dos trabalhadores nas empresas

Representação dos trabalhadores nas empresas

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Ao representante dos trabalhadores atribui-se o status de garantia constitucional em razão de seu nítido caráter assecuratório de direitos constitucionais e legais dos trabalhadores, tais como direito à intimidade, vida privada, integridade física, limitação da jornada de trabalho, intervalos para descanso e piso remuneratório.

1. INTRODUÇÃO

A Convenção n. 135 da OIT, promulgada pelo Decreto n. 131/91, estabelece que os representantes dos trabalhadores na empresa devam ser beneficiados com uma proteção eficiente contra quaisquer medidas que possam prejudicá-los (Convenção n. 135 da OIT, artigo 1º).

Mais quem são os representantes dos trabalhadores nas empresas? Segundo a Convenção 135 da OIT, podem ser tanto os representantes nomeados ou eleitos pelo sindicato que representa os trabalhadores, quanto os representantes livremente eleitos pelos trabalhadores da empresa, conforme as disposições da legislação nacional ou de convenções coletivas, cujas funções não se estendam a atividades que sejam reconhecidas como prerrogativas exclusivas dos sindicatos (Convenção n. 135 da OIT, artigo 3º).

No sistema jurídico brasileiro, estabeleceu o Legislador Constitucional de 1988 que nas empresas com mais de duzentos empregados é assegurado aos trabalhadores a escolha de um representante para promover o entendimento direto com o empregador:

Art. 11. Nas empresas de mais de duzentos empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores.

Ainda carente de regulamentação, há entendimento no sentido de que referida norma constitucional não poderia produz efeitos no mundo jurídico até que seja editada legislação específica. Respeitado entendimento em contrário, deve-se ter conta a plena efetivadade dos direitos fundamentais, dentre os quais o direito dos trabalhadores escolherem um representante para tratar de questões pertinentes ao contrato de trabalho.

O presente trabalho objetiva analisar a figura da representação dos trabalhadores nas empresas. Especificamente, após breve introdução ao tema, serão delimitados os parâmetros jurídicos para a tutela desse direito fundamental de titularidade dos trabalhadores.


2. REPRESENTAÇÃO DOS TRABALHADORES NA EMPRESA

Da consciência dos trabalhadores quanto à necessidade de melhoria nas suas condições de trabalho resultou a constatação da necessidade de relações coletivas de trabalho que requerem, além da atuação do sindicato profissional, o reconhecimento do direito dos trabalhadores de se organizarem no âmbito da empresa (BARROS, 1998:179). Especificamente, a transformação da organização do trabalho no modelo pós-fordista requer a participação dos trabalhadores na gestão da empresa, devendo-se considerar, ainda, a dificuldade da atuação sindical decorrente da lógica conflitual que privilegia a contratação como método regulativo das relações de trabalho (SILVA, 1998:154).

Enquanto os sindicatos unem os trabalhadores no plano da profissão e do local do estabelecimento (categoria e base territorial), a representação dos trabalhadores oferece um quadro mais restrito e um vínculo mais estreito. De fato, os trabalhadores de determinada empresa estão presos por liames de maior poder vinculante em relação aos se colegas de ofício contratados por empresas vizinhas. Quer dizer, ligados estreitamente em vista de pertencerem a uma mesma unidade de produção (GOTTSCHALK, 1996:53).

A representação dos trabalhadores nas empresas é matéria da Convenção n. 135 da OIT, promulgada pelo Decreto n. 131, de 22 de maio de 1991. Do texto da referida convenção merece destaque a menção a uma proteção eficiente contra quaisquer medidas que prejudiquem a atuação do representante, bem como a garantia de facilidades que possibilitem o cumprimento rápido e eficiente de suas funções, desde que não resulte em prejuízo ao funcionamento eficiente da empresa (Convenção n. 135, artigos 1º e 2º).

Em regra, a representação dos trabalhadores é desprovida de personalidade jurídica. [01] A legislação nacional, as convenções coletivas, as sentenças arbitrais e as decisões judiciárias poderão determinar o tipo ou os tipos de representantes dos trabalhadores que devam ter direito à proteção ou às facilidades objetivadas pela Convenção n. 135 (Convenção n. 135 da OIT, artigos 4º e 6º). Portanto, pode decorrer da lei, da negociação coletiva via entidade sindical ou ainda por iniciativa dos próprios trabalhadores. A participação do sindicato profissional em sua formação não é regra, até porque, não é raro, a entidade sindical ser contrária à sua instituição, receosa da perda de espaço no papel de defesa dos interesses dos trabalhadores.

Seus fundamentos jurídicos são o direito de associação que a se assegura a todos os indivíduos, o direito de participação dos empregados na gestão da empresa, bem como o conceito social de empresa (Nascimento, 2006:282).

A representação dos trabalhadores se apresenta nas modalidades de co-gestão, conselhos ou comitês, seções sindicais, representação mista (sindicato e trabalhadores) e representação unitária (apenas trabalhadadores) (Nascimento, 2006:282). A representação dos trabalhadores pode ser colegiada ou singular. Na primeira modalidade, mais de um representante, na forma de comitês ou conselhos, trata dos interesses dos trabalhadores. Na segunda, apenas um trabalhador, delegado sindical ou delegado de pessoal, encarrega-se da representação (SILVA, 1998:33). O colega José Claudio Monteiro Brito Filho, com muita propriedade, diferencia a figura do representante sindical (CF, artigo 8, III), do representante dos trabalhadores (CF, artigo 11) e da comissão de trabalhadores constituída na empresa mediante regulamento interno (2007:296).

A Convenção n. 135 da OIT classifica os representantes dos trabalhadores em representante sindical, nomeado ou eleito pelo sindicato profissional, e representante eleito livremente pelos próprios trabalhadores, ressalvando, apenas, que, nesse caso, as funções do representante não abrangerão aquelas tidas como prerrogativas exclusivas dos sindicatos, devendo-se destacar, ainda, a preocupação inserida no texto em relação à possibilidade de enfraquecimento do sindicato profissional em decorrência da atuação do representante eleito pelos trabalhadores:

ARTIGO 3º

Para os fins da presente Convenção, os termos "representantes dos trabalhadores" designam pessoas reconhecidas como tais pela legislação ou a prática nacionais, quer sejam:

a) representantes sindicais, a saber representantes nomeados ou eleitos por sindicatos;

b) ou representantes eleitos, a saber representantes livremente eleitos pelos trabalhadores da empresa, conforme as disposições da legislação nacional ou de convenções coletivas, e cujas funções não se estendam a atividades que sejam reconhecidas, nos países interessados, como dependendo das prerrogativas exclusivas dos sindicatos.

(...)

ARTIGO 5º

Quando uma empresa contar ao mesmo tempo com representes sindicais e representantes eleitos, medidas adequadas deverão ser tomadas, cada vez que for necessário, para garantir que a presença de representantes eleitos não venha a ser utilizada para o enfraquecimento da situação dos sindicatos interessados ou de seus representantes e para incentivar a cooperação, relativa a todas as questões pertinentes, entre os representants eleitos, por uma Parte, e os sindicatos interessados e seus representantes, por outra Parte.

Os representantes sindicais são vinculados à entidade sindical, podendo, inclusive, ter sido escolhidos sem a participação dos trabalhadores. Isso não ocorre com os representantes dos trabalhadores, cuja escolha por seus pares atua como requisito essencial, enquanto que a vinculação ao sindicato, por conta do princípio da liberdade sindical, será meramente facultativa.

Destaca-se, ainda, a Recomendação n. 143 da OIT, cujo texto se ocupa em delimitar a figura do representante, suas atribuições, sua atuação em conjunto com o sindicato profissional e sua efetiva proteção em relação a todo e qualquer ato que possa prejudicá-lo:

5. Los representantes de los trabajadores en la empresa deberían gozar de protección eficaz contra todo acto que pueda perjudicarlos, incluido el despido por razón de su condición de representantes de los trabajadores, de sus actividades como tales representantes, de su afiliación al sindicato, o de su participación en la actividad sindical, siempre que dichos representantes actúen conforme a las leyes, contratos colectivos u otros acuerdos comunes en vigor (OIT, Recomendação n. 143, artigo 5º).

Na Itália, a complexidade das relações de trabalho somada à estrutura burocratizada dos sindicatos garantiu o espaço para surgimento da figura do representante dos trabalhadores no âmbito da empresa. Trata-se, pois, em sua origem de um canal de representação dos trabalhadores estruturalmente separado dos sindicatos (GIUGNI, 1991:39). O artigo 46 da Constituição Italiana de 1948 assegura aos trabalhadores o direito de participar da gestão da empresa:

Ai fini della elevazione economica e sociale del lavoro e in armonia con le esigenze della produzione, la Repubblica riconosce il diritto dei lavoratori a collaborare, nei modi e nei limiti stabiliti dalle leggi, alla gestione delle aziende.

O sistema jurídico italiano vigente apresenta um sistema de representação dos trabalhadores fortemente ligado aos sindicatos, tanto que os artigos do Estatudo dos Trabalhadores que tratam da representação sindical integram o capítulo que regula a atividade sindical. O artigo 19 trata da figura do representante sindical na empresa, espécie de delegado sindical a ser escolhido mediante critérios estabelecidos em negociação coletiva com o sindicato respectivo:

Art. 19 - Costituzione delle rappresentanze sindacali aziendali

Rappresentanze sindacali aziendali possono essere costituite ad iniziativa dei lavoratori in ogni unità produttiva, nell'ambito:

a. […];

b. delle associazioni sindacali che siano firmatarie di contratti collettivi di lavoro applicati nell'unità produttiva.

Nell'ambito di aziende con più unità produttive le rappresentanze sindacali possono istituire organi di coordinamento.

Ao estar vinculada aos sindicatos, a representação dos trabalhadores na Itália sempre ocilou de acordo com o momento histórico. Desde o incentivo à formação de comissão, até a supressão de suas prerrogativas, a representação e os sindicatos passaram por fases de enfrentamento representativo e convivência democática. (SIQUEIRA NETO, 2000:220).

Na Espanha, superado o regime ditatorial do General Francisco Franco, a Constituição de 1978 incumbiu aos poderes públicos a promoção eficaz das diversas formas de participação nas empresas:

2. Los poderes públicos promoverán eficazmente las diversas formas de participación en la empresa y fomentarán, mediante uma legislación adecuada, las sociedades cooperativas. También establecerán los medios que faciliten el acceso de los trabajadores a la propiedad de los medios de producción. (Artículo 129, 2).

O Estatuto dos Trabalhadores, de 1980, substituindo legislação anterior, regulou a matéria. Para as empresas com mais de seis e menos de cinquenta trabalhadores contratados será escolhido um delegado de pessoal, mediante votação secreta, pelos próprios trabalhadores. Para as empresas com mais de cinquenta trabalhadores, será formado um comitê de empresa, órgão colegiado destinado à defesa dos interesses dos trabalhadores perante a empresa (ET, artigos 62 e 63) [02].

Na França o sistema jurídico se divide entre a representação unitária, composta pelas figuras do delegado de pessoal e do comitê de empresa, e a representação sindical que remete às figuras da seção sindical na empresa e do delegado sindical.

Ao delegado de pessoal compete apresentar aos empregadores todas as reclamações individuais ou coletivas sobre salários, a aplicação do Código do Trabalho e outras disposições legais relativas à proteção social, saúde e segurança, bem como convenções e acordos aplicáveis. Incumbido, ainda, levar à inspeção do trabalho todas as queixas e observações que lhes são confiadas, bem como ser consultado nas hipóteses de dispensa coletiva por razões econômicas, além de cumprir as funções do Comitê de Empresa nas empresas com número de trabalhadores inferior a cinquenta (Código do Trabalho, artigos L2313-1 e L2313-7/L2313-8) [03].

Ao comitê de empresa, sem prejuízo das funções do delegado de pessoal e do delegado sindical, compete participar da gestão e evolução econômica e financeira da empresa, organização do trabalho, formação profissional e técnicas de produção [04].

A representação dos trabalhadores na Alemanha, regulada pela Lei Constitucional de Empresa ("Betriebsverfassungsgesetz" – BetrVG, de 11/10/52), é incumbêrncia do conselho de empresapara os estabelecimentos com pelos menos cinco trabalhadores contratados, devendo ser observadas as prerrogativas dos sindicatos. Todos os trabalhadores têm direito a voto, podendo se candidatar aqueles contratados a pelo menos seis meses (BetrVG, §§ 1º, 2º, 7º e 8º) [05]

Deve-se destacar que o no modelo alemão, a partir dos princípios da confiança e do dever de paz, as atribuições do conselho de empresa não se confundem com as atribuições do sindicato. Ao primeiro recai um papel de cooperação perante a empresa, enquanto ao sindicato resta uma atuação mais incisiva, que pode resultar, inclusive, na deflagração de greve com o objetivo de tutelar os interesses dos trabalhadores. Quanto à negociação coletiva, o conselho de empresa pode firmar acordos intraempresariais, desde que a matéria não tenha sido objeto de cláusula inserida em convenção coletiva firmada pelo sindicato (SILVA, 1998:64/67).

Ainda, na Austria o conselho de empresa, segundo a Lei Federal de 28 de março de 1947 acrescida de modificações posteriores, representará os trabalhadores nas empresas com pelo menos cinco contratados, cujas atribuições, consultivas e de assessoria, abarcam todos os aspectos da gestão da empresa, tais como problemas econômicos, de pessoal e de ordem social. Já na Bélgica os conselhos são regulados pela Lei de 20 de setembro de 1948, acrescida de posteriores alterações, sendo destinados às empresas com no mínimo cem trabalhadores contratados. Tais conselhos têm a incumbência de apresentar proposições referentes à organização e às condições de trabalho (OIT, 1981:13/140).


3. ARTIGO 11 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

No Brasil, a representação dos trabalhadores já se apresentava no modelo das comissões internas, inspiradas nos ideais anarquistas, que tiveram papel determinante nas greves dos anos de 1917 e 1919. Entretanto, o primeiro instrumento normativo a prever figura assemelhada foi o Decreto lei n. 7.036/44 que institui a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes - CIPA, cuja regulação, posteriormente, ficou a encargo dos artigos 163 a 165 da CLT (SILVA, 1998:158/162).

Definitivamente, a CIPA representa um primeiro esboço da idéia de representantes eleitos pelos trabalhadores para tratar de questões pertinentes às relações de trabalho no interior da empresa. Sua estrutura é composta por representantes da empresa e dos empregados, sendo que os representantes dos empregadores, titulares e suplentes, serão por eles designados, enquanto que os representantes dos empregados, titulares e suplentes, serão eleitos em escrutínio secreto, do qual participem, independentemente de filiação sindical, exclusivamente os empregados interessados. Ainda, o mandato é fixado no prazo de um ano, sendo permitida uma recondução, tendo os representantes dos empregados proteção contra a despedida arbitrária, qual seja aquela que não se fundar em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro (CLT, artigos 164 e 165).

Citam-se também as comissões de fábrica criadas em São Bernardo do Campo, cujo exemplo mais marcante foi a comissão da Cobrasma, criada em 1965. Nas greves de 1978, algumas montadoras incentivaram os trabalhadores a instituíram comissões de fábrica, com objetivo de proceder a negociação direta e afastar a interferência do sindicato. A reação do sindicato profissional, entretanto, foi num primeiro momento de rejeição do modelo e, posteriormente, de interação com os representantes dos trabalhadores, criando, para tanto, um canal de comunicação dentro das empresas. O grande exemplo desse processo evolutivo foi a greve dos trabalhadores da Ford no primeiro semestre de 1990, cuja organização foi fruto do trabalho em conjunto da comissão de fábria e do sindicato respectivo (SILVA, 1998:165/168).

A Constituição de 1967 inovou ao tratar da participação dos trabalhadores nos lucros e na gestão da empresa:

Art 158 - A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:

(...)

V - integração do trabalhador na vida e no desenvolvimento da empresa, com participação nos lucros e, excepcionalmente, na gestão, nos casos e condições que forem estabelecidos;

Além de disciplinar o direito de associação e a participação dos trabalhadores na gestão e nos lucros da empresa, a Constituição de 1988 expressamente assegurou a escolha de um representante para promover o entendimento direto com o empregador:

Art. 5º

(...)

XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;

(...)

Art. 7º

(...)

XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;

(...)

Art. 11. Nas empresas de mais de duzentos empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores.

O artigo 11 da Constituição Federal assegura tão somente a escolha de um representante por empresa, não obstante ser mais adequado a escolha do representante por estabelecimento, considerando a possibilidade de empresas com mais de uma unidade produtiva. Da mais mesma forma, a possibilidade de um único representante mostra que o legislador Constitucional deixou a desejar. Como visto, em modelos como o espanhol e o francês, a representação dos trabalhadores recai sobre um único representante apenas nas empresas com poucos trabalhadores contratados.

Ao represente dos trabalhadores atribui-se o status de garantia constitucional em razão de seu nítido caráter assecuratório de direitos constitucionais e legais dos trabalhadores, tais como direito à intimidade, vida privada, integridade física, vida, limitação da jornada de trabalho, intervalos para descanso e piso remuneratório.

Ainda carente de regulamentação, há entendimento no sentido de que referida norma constitucional não poderá produz efeitos no mundo jurídico até que seja editada legislação regulamentadora específica. A esse respeito, seguindo a lição de José Afonso da Silva, as normas constitucionais se dividem em normas de eficácia plena, contida e limitada. Na primeira modalidade, a norma constitucional produz efeitos desde a entrada em vigor da Constituição. São, portanto, autoaplicáveis. As normas de eficácia contida produzem efeitos desde então, mas podem ter sua amplitude restringida pela atuação do legislador infraconstitucional. Finalmente, as normas de eficácia limitada apresentam aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, pois somente incidem totalmente após uma normativa ulterior que lhes desenvolva a aplicabililidade (MORAES, 1999:39).

Estabelece o artigo 5º, § 1º, da Constituição, que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. O artigo 11 da Constituição, respeitado entendimento em contrário, trata de direito fundamental dos trabalhadores, o que já garante, por si só, a autoaplicabilidade do dispositivo. Outrossim, verifica-se que o legislador constitucional não impôs qualquer condição para o exercício do direito. Trata-se de norma constitucional de eficácia plena. Não há que se falar, pois, na necessidade de legislação para regulamentar o direito, mesmo porque o próprio texto constitucional assegura aos trabalhadores a escolha de seu representante sem qualquer restrição [06].


5. ELEIÇÃO, GARANTIAS E ATRIBUIÇÕES DO REPRESENTANTE

Reconhecimento a efetiva plena no artigo 11 da Constituição Federal, resta ao presente trabalho delimitar os parâmetros referentes ao processo de escolha, às garantias e às atribuições do representante dos trabalhadores.

Ainda que não vinculado ao sindicato profissional, o processo de escola do representante dos trabalhadores poderá originar-se tanto da lei quanto da negociação coletiva [07]. Nesse sentido, é importante destacar a importância da atuação do sindicato dos trabalhadores no encaminhamento desse processo, tendo em vista sua função principal, qual seja a tutela dos interesses dos trabalhadores que, na sistemática sindical brasileira, integram a categoria (CF, artigo 8º, III) [08]. Por certo, a figura do representante dos trabalhadores não poderá resultar no enfraquecimento da atuação do sindicato profissional. Tratam-se, portanto, de entidades complementares que devem atuar em conjunto para a tutela efetiva dos interesses dos trabalhadores.

Igualmente, não deve o empregador criar obstáculos à escolha do representante dos trabalhadores. Não custa lembrar que a definição de um intelocutor é necessária à efetiva proteção dos direitos dos trabalhadores contratados pela empresa, cujos interesses econômicos também são atendidos quando presente um diálogo rápido e efetivo entre empregador e trabalhadores. Mas o aspecto mais importante diz respeito à necessária participação do empregador na plena efetivação do direito fundamental em questão. Não se justifica a adoação de postura omissiva e descompromissada por parte da empresa em se tratando da escolha do representante dos trabalhadores.

É, portanto, dever do empregador, juntamente com o sindicato profissional e com os próprios trabalhadores contratados, tomar providências necessárias à execução do processo de escolha, destre as quais, exemplificativamente, citam-se a disponibilização de espaço físico para a realização de assembléia, a liberação de trabalhadores para organizar o processo de escolha do representante, bem como o fornecimento de toda a estrutura necessária para a realição do processo eleitoral.

Reitera-se a importância da escolha por estabelecimento e não por empresa enquanto medida destinada a dar maior efetividade ao instituto, a fim de que seja garantida certa proporcionalidade para cada estabelecimento da empresa.

Quanto às garantias, o dirigente sindical tem tutela expressa no ordenamento jurídico pátrio. Para tanto, não poderá ser impedido do exercício de suas funções, nem transferido para lugar ou mister que lhe dificulte ou torne impossível o desempenho das suas atribuições sindicais. Também, fica vedada a sua dispensa, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção, até um ano após o final do seu mandato, salvo se cometer falta grave (CF, artigo 8º, VIII, e CLT, artigo 543, caput e § 3º), devendo-se destacar que o entendimento atualizado do Tribunal Superior do Trabalho, Súmula n. 369, seria de que referida garantia abrange aos dirigentes sindicais titulares e suplementes.

Igualmente, o membro da CIPA escolhido pelos trabalhadores tem proteção com a dispensa arbitária ou sem justa causa desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandado. Por despedida arbitrária entende-se aquela que não se função em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro (ADCT, artigo 10, II, a, e CLT, artigo 165).

Oportuno citar, ainda, que os membros das comissões de concição prévia representantes dos trabalhadores, modalidade de representação destinada a conciliar conflitos individuais de trabalho, também contam com efetiva proteção contra a dispensa abusiva nos termos do artigo 625-B, § 1º, da CLT:

§ 1º É vedada a dispensa dos representantes dos empregados membros da Comissão de Conciliação Prévia, titulares e suplentes, até um ano após o final do mandato, salvo se cometerem falta, nos termos da lei. 

Para o representante eleito pelos trabalhadores, da leitura do artigo 11 da Constituição não se extrai a previsão expressa de estabildidade no emprego, ao contrário do que ocorre em outros sistemas jurídicos. Em todo caso, sem prejuízo da iniciativa do Legislativo ou da previsão em acordo ou convenção coletiva de trabalho, a Convenção n. 135 da OIT, artigo 1º, estabelece a obrigação dos Estados membros em tutelar o contrato de trabalho do representante dos trabalhadores contra quaisquer medidas que possam vir a prejudicá-los:

ARTIGO 1º 

Os representantes dos trabalhadores na empresa devem ser beneficiados com uma proteção eficiente contra quaisquer medidas que poderiam vir a prejudicá-los, inclusive o licenciamento, e que seriam motivadas por sua qualidade ou suas atividades como representantes dos trabalhadores, sua filiação sindical, ou participação em atividades sindicais, conquanto ajam de acordo com as leis, convenções coletivas ou outros arranjos convencionais vigorando. (destacou-se)

Ainda, a dispensa abusiva do representante dos trabalhadores deve ser tipificada como ato antissindical, nos termos do artigo 1º, § 1º, da Convenção n. 98 da OIT (Decreto n. 42.288/57):

Artigo 1

1. Os trabalhadores gozarão de adequada proteção contra atos de discriminação com relação a seu emprego.

A propósito, sobre atos antissindicais, é pertinente a citação dos parâmetros apresentados pelo saudoso Oscar Ermida Uriarte (1989:17):

(...) qualquer ato que prejudique indevidamente o trabalhador ou as organizações sindicais no exercício da atividade sindical ou a causa desta ou que lhes negue injustificadamente as facilidades ou prerrogativas necessárias para o normal desenvolvimento da ação coletiva.

Ainda, o Tribunal Superior do Trabalho editou precedente que estende ao representante dos trabalhdores a estabilidade dos dirigentes sindicais:

PRECEDENTE NORMATIVO n. 86 - Representantes dos trabalhadores. Estabilidade no emprego (positivo)

Nas empresas com mais de 200 empregados é assegurada a eleição direta de um representante, com as garantias do art. 543, e seus parágrafos, da CLT. (Ex-PN 138) (DJ 08-09-1992)

Quanto às atribuições, a figura do representante não se confunde com a figura do sindicato. Para tanto, não se deve acreditar que ao representante incumbe a tarefa de entrar em choque o empregador na defesa dos interesses dos trabalhadores representados. Segundo o artigo 11 da Constituição Federal, ao representante dos trabalhadores compete exclusivamente promover o entendimento direto entre trabalhadores e empregadores. Reitera-se, não cabe ao representante executar atribuições próprias do sindicato profissional. A negociação coletiva, por exemplo, requer obrigatoriamente a participação sindical, segundo o estabelecido pelo artigo 8º, VI, da CF:

VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

Portanto, o sindicato profissional não pode ser afastado do processo de negociação coletiva pelo representante dos trabalhadores. De outro lado, não há obstáculo à participação do representante em tal processo. A expressão entendimento direito com os empregadores inserida no artigo 11 da Constituição Federal atribui ao representante um papel significativo no processo de negociação coletiva, pois, em sua função, deve repercurtir perante o empregador e ao sindicato profissional os anseios dos trabalhadores representados. Em outras palavras, o resultado da negociação - acordo ou convenção coletiva de trabalho – deve observar os interesses dos trabalhadores representados que terão através do representante eleito meio eficaz de comunicação e reinvindicação.

Deve o representante adotar um papel de interlocução entre os trabalhadores e o empregador, a fim de que a esse último sejam apresentadas as demandas e necessidades daqueles, objetivando a evolução e melhoria das condições de trabalho. No caso da ocorrência de lesão efetiva aos direitos sociais dos trabalhadores representantes, caberá ao representante apresentar tais fatos ao sindicato profissional, ao Ministério Público do Trabalho ou à Superintência do Trabalho para fins de apuração e providências administrativas e judiciais que a situação por ventura necessite.


6. CONCLUSÃO

A representação dos trabalhadores na empresa é direito fundamental de titularidade dos trabalhadores. Trata-se de mecanismo importante na defesa dos interesses dos representados. Ao represente dos trabalhadores atribui-se o status de garantia constitucional em razão de seu nítido caráter assecuratório de direitos constitucionais e legais dos trabalhadores, tais como direito à intimidade, vida privada, integridade física, limitação da jornada de trabalho, intervalos para descanso e piso remuneratório.

A representação dos trabalhadores, por certo, não substitui a atuação sindical, mas atua como instrumento efetivo no preenchimento de lacunas presentes na relação entre o sindicato e o empregador, aos quais, deve-se ressaltar, recai dever de atuar efetivamente na sua implementação, não sendo possível que aos trabalhadores seja negada a escolha de um repressentante com base no argumento de que o direito em questão estaria pendente de legislação complementar.


Referências

BARROS, Alice Monteiro de.Representante dos empregados no local de trabalho. In Rev. TRT - 3ªR. - Belo Horizonte, 28 (58): 179-188, Jan.98/Dez.98.

BATALHA, Wilson de Souza Campos e BATALHA, Sílvia marina Labate. Sindicatos. Sindicalismo. São Paulo: LTr, 1994.

BRITO FILHO, José Claudio Monteiro de. Direito Sindical. São Paulo: LTr, 2007.

GIUGNI, Gino. Direito sindical. São Paulo: LTr, 1991.

GOTTSCHALK, Elson. A participação do empregado na gestão da empresa. São Paulo: LTr, 1996.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 1999.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de Direito Sindical. São Paulo: LTr, 2006.

OIT. Oficina Internacional de Trabalho. Participación de los trabajadores en las decisões de la empresa. Genegra: 1981.

SILVA, Walkure Lopes Ribeiro da. Representação e participação dos trabalhadores na gestão da empresa. São Paulo: LTr, 1998.

SIQUEIRA NETO, José Francisco. Liberdade sindical e representação dos trabalhadores nos locais de trabalho. São Paulo: LTr, 2000.

URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra atos anti-sindicais. São Paulo: LTr, 1989.

Sites consultados

http://www.gesetze.juris.de/betrvg/index.html

http://www.legifrance.gouv.fr

http://www.mtin.es/

http://www.normattiva.it

http://www.presidencia.gov.br/


Notas

  1. A ausência de personalidade jurídica não implica na ausência de legitimidade para pleitear em juízo direitos de titularidade dos trabalhadores representados. Nesse sentido v. Nascimento (2006:283) e Brito Filho (2007:294/295).
  2. Artículo 62. Delegados de Personal
  3. La representación de los trabajadores en la empresa o centro de trabajo que tenga menos de cincuenta y más de diez trabajadores corresponde a los delegados de personal. Igualmente podrá haber un delegado de personal en aquellas empresas o centros que cuenten entre seis y diez trabajadores, si así lo decidieran éstos por mayoría.

    Los trabajadores elegirán, mediante sufragio libre, personal, secreto y directo a los delegados de personal en la cuantía siguiente: hasta treinta trabajadores, uno; de treinta y uno a cuarenta y nueve, tres.

    Artículo 63. Comités de empresa

    El comité de empresa es el órgano representativo y colegiado del conjunto de los trabajadores en la empresa o centro de trabajo para la defensa de sus intereses, constituyéndose en cada centro de trabajo cuyo censo sea de cincuenta o más trabajadores.

  4. Article L2313-1
  5. Les délégués du personnel ont pour mission:

    1° De présenter aux employeurs toutes les réclamations individuelles ou collectives relatives aux salaires, à l'application du code du travail et des autres dispositions légales concernant la protection sociale, la santé et la sécurité, ainsi que des conventions et accords applicables dans l'entreprise;

    2° De saisir l'inspection du travail de toutes les plaintes et observations relatives à l'application des dispositions légales dont elle est chargée d'assurer le contrôle.

    (…)

    Article L2313-7

    Dans les entreprises de moins de cinquante salariés, lorsque l'employeur envisage de procéder à un licenciement collectif pour motif économique, les délégués du personnel sont consultés dans les conditions prévues par le titre III du livre II de la première partie.

    (...)

    Article L2313-8 

    Dans les entreprises de moins de cinquante salariés, les délégués du personnel exercent les missions du comité d'entreprise en matière de formation professionnelle.

    A ce titre, ils bénéficient des moyens prévus aux articles L. 2315-1 et suivants.

  6. Article L2323-1
  7. Le comité d'entreprise a pour objet d'assurer une expression collective des salariés permettant la prise en compte permanente de leurs intérêts dans les décisions relatives à la gestion et à l'évolution économique et financière de l'entreprise, à l'organisation du travail, à la formation professionnelle et aux techniques de production.

    Il formule, à son initiative, et examine, à la demande de l'employeur, toute proposition de nature à améliorer les conditions de travail, d'emploi et de formation professionnelle des salariés, leurs conditions de vie dans l'entreprise ainsi que les conditions dans lesquelles ils bénéficient de garanties collectives complémentaires mentionnées à l'article L. 911-2 du code de la sécurité sociale.

    Il exerce ses missions sans préjudice des dispositions relatives à l'expression des salariés, aux délégués du personnel et aux délégués syndicaux.

  8. § 1 Errichtung von Betriebsräten
  9. 1.In Betrieben mit in der Regel mindestens fünf ständigen wahlberechtigten Arbeitnehmern, von denen drei wählbar sind, werden Betriebsräte gewählt. Dies gilt auch für gemeinsame Betriebe mehrerer Unternehmen.

    2.Ein gemeinsamer Betrieb mehrerer Unternehmen wird vermutet, wenn

    zur Verfolgung arbeitstechnischer Zwecke die Betriebsmittel sowie die Arbeitnehmer von den Unternehmen gemeinsam eingesetzt werden oder

    die Spaltung eines Unternehmens zur Folge hat, dass von einem Betrieb ein oder mehrere Betriebsteile einem an der Spaltung beteiligten anderen Unternehmen zugeordnet werden, ohne dass sich dabei die Organisation des betroffenen Betriebs wesentlich ändert.

    § 2 Stellung der Gewerkschaften und Vereinigungen der Arbeitgeber

    1.Arbeitgeber und Betriebsrat arbeiten unter Beachtung der geltenden Tarifverträge vertrauensvoll und im Zusammenwirken mit den im Betrieb vertretenen Gewerkschaften und Arbeitgebervereinigungen zum Wohl der Arbeitnehmer und des Betriebs zusammen.

    2.Zur Wahrnehmung der in diesem Gesetz genannten Aufgaben und Befugnisse der im Betrieb vertretenen Gewerkschaften ist deren Beauftragten nach Unterrichtung des Arbeitgebers oder seines Vertreters Zugang zum Betrieb zu gewähren, soweit dem nicht unumgängliche Notwendigkeiten des Betriebsablaufs, zwingende Sicherheitsvorschriften oder der Schutz von Betriebsgeheimnissen entgegenstehen.

    3.Die Aufgaben der Gewerkschaften und der Vereinigungen der Arbeitgeber, insbesondere die Wahrnehmung der Interessen ihrer Mitglieder, werden durch dieses Gesetz nicht berührt.

    (…)

    § 7 Wahlberechtigung

    Wahlberechtigt sind alle Arbeitnehmer des Betriebs, die das 18. Lebensjahr vollendet haben. Werden Arbeitnehmer eines anderen Arbeitgebers zur Arbeitsleistung überlassen, so sind diese wahlberechtigt, wenn sie länger als drei Monate im Betrieb eingesetzt werden.

    § 8 Wählbarkeit

    3.Wählbar sind alle Wahlberechtigten, die sechs Monate dem Betrieb angehören oder als in Heimarbeit Beschäftigte in der Hauptsache für den Betrieb gearbeitet haben. Auf diese sechsmonatige Betriebszugehörigkeit werden Zeiten angerechnet, in denen der Arbeitnehmer unmittelbar vorher einem anderen Betrieb desselben Unternehmens oder Konzerns (§ 18 Abs. 1 des Aktiengesetzes) angehört hat. Nicht wählbar ist, wer infolge strafgerichtlicher Verurteilung die Fähigkeit, Rechte aus öffentlichen Wahlen zu erlangen, nicht besitzt.

    4.Besteht der Betrieb weniger als sechs Monate, so sind abweichend von der Vorschrift in Absatz 1 über die sechsmonatige Betriebszugehörigkeit diejenigen Arbeitnehmer wählbar, die bei der Einleitung der Betriebsratswahl im Betrieb beschäftigt sind und die übrigen Voraussetzungen für die Wählbarkeit erfüllen.

  10. Defedendendo a autoaplicabilidade do dispositivo, Walküre Lopes Silva (1998:170) e Siqueira neto (2000:363).
  11. A legislação nacional, as convenções coletivas, as sentenças arbitrais ou as decisões judiciárias poderão determinar o tipo ou os tipos de representantes dos trabalhadores que devam ter direito à proteção ou às facilidades visadas pela presente Convenção. A aplicação das disposições da Convenção n. 135 poderá se assegurada mediante a legislação nacional, convenção coletivas e todo outro modo que seria conforme à prática nacional (Convenção n. 135 da OIT, artigos 4º e 6º)
  12. CF, artigo 8º (...) III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA NETO, Alberto Emiliano de. Representação dos trabalhadores nas empresas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3015, 3 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20114. Acesso em: 25 abr. 2024.