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A conciliação no PROCON/PA: um meio alternativo para a resolução do conflito nas relações de consumo

A conciliação no PROCON/PA: um meio alternativo para a resolução do conflito nas relações de consumo

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Os consumidores, embora podendo obter a satisfação de seus interesses no Judiciário, viam no procedimento resolutório do PROCON um meio mais simplificado e célere.

RESUMO

O presente estudo expõe a relevância da adoção das audiências de conciliação no curso do processo administrativo de reclamação do PROCON-PA, para a solução do conflito entre consumidores e fornecedores, através de um acordo e com vistas à obtenção da pacificação social, evitando-se assim sua judicialização. Contribui para fomentar os estudos acadêmicos na matéria de direito do consumidor, com ênfase no referencial teórico do acesso à justiça, a partir de um novo enfoque, que privilegie os atores do conflito como protagonistas sociais, fazendo pleno uso de sua cidadania. Por fim, sugere ao PROCON-PA a adoção de outros atos administrativos com envergadura coletiva, para permitir a prevenção dos conflitos de consumo e reduzir o número de reclamações em nível individual.

Palavras-Chave: Conflito de consumo, reclamação, conciliação e acesso à justiça.


1 INTRODUÇÃO

Muito mais que cumprir uma obrigação acadêmica de apresentar um trabalho conclusivo de curso junto à comunidade jurídica, o tema abordado e desenvolvido ao longo de seu texto tem a pretensão de oferecer uma contribuição aos estudos, já bastante consolidados pela doutrina e jurisprudência nacionais, acerca dos múltiplos meios de promoção à defesa do consumidor no Brasil.

A intensificação e diversificação das relações de consumo no século XXI refletem o desenvolvimento da economia de um país num dado momento de sua história. Por outro lado, também podem provocar o aumento do número de reclamações dos consumidores diante das falhas dos fornecedores de produtos e serviços no mercado. Concomitantemente, a adoção de modernas ferramentas tecnológicas trazem novas estratégias e induzem comportamentos de consumo em escala global, a exemplo das compras coletivas com o auxílio da internet, potencializando os conflitos de consumo.

Todo este cenário atual demanda dos órgãos de defesa do consumidor no Brasil e, notadamente no estado do Pará, a adoção de mecanismos administrativos que venham proporcionar a prevenção dos conflitos de consumo e a conferir a defesa em âmbito coletivo.

A Ação Coletiva de Consumo e a Convenção Coletiva de Consumo são os meios processuais judiciais e administrativos que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) [01] prevê para atender às pressões da sociedade pela efetiva prevenção e reparação dos conflitos de consumo no Brasil, afora o Termo de Ajustamento de Conduta de Consumo, disposto no Decreto Federal nº2.181/97.

Enquanto estes instrumentos de escopo coletivo não são aplicados com maior vigor, os consumidores, via de regra, buscam o serviço público prestado pelo PROCON para o tratamento e solução de suas reclamações em âmbito individual, constituindo a Conciliação o meio alternativo extrajudicial mais usual para a resolução de conflitos de consumo.

A resistência do fornecedor diante da reclamação do consumidor consistindo no dito conflito de consumo é um dos objetos de trabalho dos servidores do PROCON-PA, que tentam, através das sessões de conciliação, dirimir o dissenso entre os atores da relação de consumo.

Ao vivenciar pessoal e cotidianamente a experiência de compor, no plano administrativo, os conflitos entre consumidores e fornecedores, surgiu a necessidade de um olhar jurídico a respeito do impacto social das atividades conciliatórias na busca da pacificação social desta atividade estatal.

A metodologia aplicada constituiu-se de pesquisa bibliográfica, de observação das audiências realizadas, documental e etnográfica. Uma vez aplicados questionários fechados, entre abril e setembro de 2011, a 100 consumidores e 100 fornecedores, acerca de suas percepções quanto às expectativas que alimentavam e importância que davam à atividade de conciliação do PROCON-PA e tendo-se constatado que os questionados viam na tarefa institucional uma oportunidade de resolução dos problemas oriundos das relações de consumo, evitando sua discussão no Judiciário, passou-se à ampla leitura sobre o que diziam dados estatísticos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do Departamento Nacional de Defesa do Consumidor (DPDC), das jurisprudências dos tribunais e dos doutrinadores pátrios, que se debruçam recorrentemente sobre a temática.

O referencial teórico do acesso à justiça, capitaneado pelos processualistas Mauro Capelletti e Bryant Garth (2003), constitui a base deste trabalho e implicou uma releitura do que significou para os processualistas e para a comunidade jurídica brasileira o dever público de solucionar os conflitos sociais que brotam cotidianamente através das ações judiciais e extrajudiciais no aparelho estatal.

Na verdade, este trabalho lança uma perspectiva jurídica sobre a atividade administrativa das sessões de conciliação no PROCON-PA, dela extraindo sua relevância não só jurídica, mas social. Por outro lado, antecipa que o objetivo da conciliação é o de ampliar o acesso do cidadão à obtenção de uma resposta estatal satisfatória, resguardando-lhe seus direitos, sem retirar do Judiciário a última palavra sobre os conflitos de consumo, quando postos à sua apreciação. Na verdade, o tema está longe de ser esgotado, posto que deita raízes sobre os meios alternativos de resolução de conflitos, que vem ganhando notoriedade entre os estudos jurídicos e práticas institucionais pelo País.Espera-se, entretanto, que seja o trabalho compreendido como uma provocação ou mais algumas palavras sobre temática tão instigante para o cidadão e para quem milita diariamente dentro e fora dos tribunais com o direito do consumidor.


2 A RELAÇÃO DE CONSUMO

As interações relacionais exigem dos indivíduos um certo limite para o exercício das suas vontades. Coube à ciência jurídica a tarefa de estabelecer os fundamentos da vida em sociedade e a partir de uma ordem lógica justa e satisfatória, posto que não basta aos homens criar cercamentos aos seus interesses, mas também traduzir estas limitações da vida em comum em felicidade, em realização mútua.

No interior desta necessidade humana e social, o direito, objetivamente, é sempre um conjunto de normas impostas ao comportamento humano, autorizando o indivíduo a fazer ou a não fazer algo [02].

Esta definição, de elaboração simples e precisa, traduz a ideia de que o ser humano, embora plenamente livre para agir, pensar e exprimir seus sentimentos e convicções, sabe que a liberdade não se perde em seus horizontes. Noutras palavras, quando em interação com a natureza ou com a sociedade, o homem estará condicionado a alguma espécie de barreira, que o impedirá de fazer o que tem vontade.

O ato de se relacionar, de estar com o outro ser, inanimado ou não, impõe a ele a tarefa de não ignorar que não está sozinho. Todo o conhecimento humano sobejamente reconheceu que o homem é um ser gregário.

Ao criar limites para a vida relacional, o direito trará consigo, além dum sistema de normas – não importa se pelas condutas reiteradas ou se por um código escrito -, também um sistema de valores privilegiados. Este conjunto de valores é que determinará a identidade do homem e de sua sociedade. Nele está guardado sua espiritualidade, suas convicções e o porquê de suas escolhas. Lecionando sobre este pensamento, dizem Guilherme Assis de Almeida & Eduardo Bittar [03]:

Ao versar sobre os direitos, os deveres, os poderes, as faculdades, as instituições, as práticas burocráticas..., está lidando diretamente com questões de interesse humano, quando não com os próprios valores humanos. Assim, estão em jogo a liberdade, a moralidade, o comportamento, todos esses valores de intensa significação humana.

Dessa compreensão, que libertou o homem de seu estágio de selvageria, o direito foi-se ramificando em seus diversos objetos de estudo e se especializando, a partir das suas vertentes fundamentais, a saber o Direito Público e o Direito Privado [04]. Deste último, até meados do século XX, não havia outra ramificação além dos Direitos Civil, Comercial e do Trabalho. Desse rol de conhecimentos jurígenos, reguladores de relações particulares, apenas o Direito do Trabalho traduz normas estatais que durante muito tempo fora alvo de ataques da parcela da sociedade que detinha o poder de influenciar a criação normativa, razão pela qual este ramo é reconhecido como direito social, porque conseguiu se sobrepor às ideias de matriz individualista.

A relação de trabalho, objeto desse ramo especializado do Direito, era desigual e injusta, porque os interesses sob relação não se harmonizavam, mas um desumanizava o outro.

A Primeira Revolução da Produção, conhecida pela História por Revolução Industrial, criou a relação trabalhista, mas mantendo a velha exploração do homem pelo homem. Em todo o lugar onde houvesse casas fabris, havia a exploração de um sobre muitos. Um homem, detentor dos meios de produção e conhecedor sobre tudo o que produzia, ditava regras próprias sobre a conduta dos outros homens, regras estas que desfiguraram ideias mínimas de uma vida em sociedade. Explicando o nascimento da relação de trabalho, ensina Maurício Godinho Delgado [05]:

No contexto histórico-social em que se reúnem esses fatores econômicos, sociais e políticos, o Direito vigorante à época, consistente no Direito Civil, de formação liberal-individualista, não tinha resposta jurídica adequada ao fato novo da relação empregatícia. A matriz civilista clássica tendia a reduzir todas as questões surgidas no interior da relação de emprego a questões típicas e próprias ao velho modelo de contrato bilateral. Portanto, questões de natureza civil e contratual, tratadas sob a ótica individual dos sujeitos isolados da relação empregatícia – de um lado o empregado e de outro o empregador. Ambos tomados, pelo Direito Civil, como se indivíduos singelos fossem.

A humilhante condição de vida a que eram submetidos os empregados nas relações de trabalho era um fato inconteste e que se mostrava vergonhoso ao Estado ignorá-lo. Portanto, a ele coube a inafastável medida de criar um sistema legal protetivo, estabelecendo limites, coibindo abusos e conferindo direitos. Foi uma tarefa indigesta, mas necessária, uma vez que já se propagavam conflitos sociais que marcaram a humanidade.

2.1 Das Relações Civilistas às Relações Consumeristas

Com as relações de consumo, o difícil percurso para o reconhecimento da desigualdade relacional entre o indivíduo que compra um produto ou um serviço e aquele que os presta, foi menos desgastante, porém, não menos importante para o direito.

No plano fático, notadamente entre as sociedades de avançada industrialização, como a norte-americana, inúmeros eram os prejuízos suportados pelos consumidores diante da elevada produtividade sem qualidade dos fornecedores. O contratante deveria provar a culpa do contratado quanto aos vícios de fabricação e prestação do serviço, ônus este que traria desvantagens econômicas consideráveis ao prejudicado, resultando, na prática em injusto enriquecimento do contratado.

Como se vê, a responsabilização dependia da prova de culpa do fornecedor e que ficava a cargo do consumidor demonstrá-las, caso quisesse demandar em juízo. Por decorrência lógica desta relação desigual, o consumidor restava vulnerável, porque não detinha o conhecimento sobre a produção e o processo judicial, na esmagadora maioria dos casos, era meio bastante custoso para a efetivação da justiça.

Sensibilizado com as constantes queixas dos consumidores e diante da postura irresponsável dos fornecedores frente aos numerosos casos, alguns de notória repercussão pública, em 15 de março de 1962, o Presidente Kennedy encaminha mensagem ao Congresso Americano, pugnando pela criação de normas consumeristas que reconhecessem as relações de consumo e a vulnerabilidade do consumidor como sujeito merecedor de proteção estatal nas práticas comerciais. A mensagem daquele dia surtiu efeito global, quando, no ano de 1985, a ONU (Organização das Nações Unidas), adotando a Resolução nº39-248 [06], estabeleceu as Diretrizes para a Proteção do Consumidor, convocando seus países signatários a criarem legislação e políticas públicas voltadas para a defesa do consumidor diante de práticas injustas de fornecedores [07].

Estes fatos históricos apontam para o entendimento de que o Direito Civil já não poderia disciplinar a relação de consumo nos moldes contratualistas de séculos atrás. O contratante e o contratado no século das redes sociais apresentam uma roupagem que já não se compatibiliza com aquela que travestia uma igualdade formal, escondendo uma desigualdade material, manifesta no sentimento de impotência e frustração de quem se vê na condição de ter que assumir um prejuízo a que não dera causa e adquirir um outro produto, duplicando os lucros do fornecedor.

O Direito do Consumidor surge, como no Direito do Trabalho, como aquele nascido de um conhecimento jurídico que brotou do ramo do Direito Privado, rasgando seu tronco com a força do clamor de uma coletividade e não de um só indivíduo. Sua natureza é coletiva, não individualista.

Para este novel ramo do direito, haverá relação de consumo, segundo o Prof.º Rizzatto Nunes [08], sempre que se puder identificar num dos pólos da relação o consumidor, no outro, o fornecedor, ambos transacionando produtos e serviços.

No Brasil, já sob a ordem democrática da Constituição Cidadã de 1988, as relações de consumo, quando sob conflito, eram discutidas e resolvidas sob as normas civilistas do Código de 1917, o qual regia o futuro sob os reflexos das relações privatistas de séculos passados.

Apesar de entrar no ordenamento jurídico pátrio pelos umbrais da Constituição [09], foi apenas em 1991 que as relações consumeristas no Brasil passaram a receber proteção do Estado, com sua promulgação sob a Lei nº8.078/90, nominada pelo ADCT, em seu Art. 48, de Código de Defesa do Consumidor (CDC). Portanto, em meio ao reconhecimento constitucional e a vigência da Lei, todas as relações de consumo eram dirimidas à luz do Código Civil, Lei nº3.071/1916, vindo este a sofrer profunda reforma mais tarde com a Lei nº nº10.406/2002.

Cabe dizer que o novo Código Civil recebeu forte reflexo dos novéis institutos do CDC. Comentando estas transformações no mundo das leis, ensina o Profº Fábio Ulhoa Coelho [10]:

(...) Dois grandes regimes jurídicos disciplinavam os contratos privados, sendo um geral, estabelecido pelo direito civil, e outro específico, pelo direito comercial. (...) A compra e a venda, portanto, era civil ou comercial, segundo se inserisse ou não no contexto de cada regime jurídico, de acordo com tais conceitos. Com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, em 1991, o direito privado brasileiro passou a contemplar não só dois, mas três diferentes regimes jurídicos.

Porém, desde o início de sua vigência em 1991 até nossos dias, muitos fornecedores ainda insistem, como mecanismo de sua defesa, descaracterizar a relação de consumo, interpretando-a como uma relação entre particulares. Tal mecanismo mostra-se hoje inaceitável, diante do profundo amadurecimento doutrinário e jurisprudencial alcançado pelos operadores do direito brasileiro ao longo do tempo.

Alguns fornecedores tentaram afastar suas atividades do rol protetivo do CDC, tal como apontam as Súmulas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mesmo tendo a Lei definido os sujeitos que compõem a relação de consumo:

Súmula 297. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Súmula 321. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes.

Súmula 469. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de planos de saúde.

Insatisfeitos com as decisões do STJ, em Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADI nº2591 [11], o STF julgou improcedente em 2006 o pleito da Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF), ao compreender a atividade bancária como serviço prestado por fornecedor numa relação de consumo e não puramente civilista.

O doutrinador Rizzatto Nunes [12] explica que as resistências não se deram ao acaso, tendo uma razão palpável:

Passamos a interpretar as relações jurídicas de consumo e os contratos com base na lei civil, inadequada para tanto e, como isso se deu durante quase todo o século XX, ainda temos dificuldades em entender o CDC em todos os seus aspectos.(...) [p.43]

As ditas resistências se justificam apenas no plano histórico e dos costumes dos negócios que se cristalizaram ao longo do tempo. No plano jurídico, não há mais o que divergir.

A nota distintiva entre as relações civis e as de consumo está no reconhecimento legal de que o consumidor de produtos e serviços é um contratante frágil, vulnerável diante do pleno domínio técnico e econômico exercido pelo fornecedor contratado. Diversa é a situação nas relações civis, onde contratante e contratado têm condições iguais para celebrar um negócio. Nas relações de consumo, a vontade de um dos contratantes está mitigada, cabendo-lhe somente aceitar ou rejeitar o negócio.

As normas jusconsumeristas reequilibram os atores do mercado consumidor, pois cria responsabilizações objetivas ao contratado fornecedor, de modo que as relações de consumo não se encerram com a transferência de um produto ou serviço para o contratante consumidor.

A partir do CDC, o contratado tem o dever de informar aos contratantes tudo o que diz respeito à relação firmada, resguardados o segredo industrial e o sigilo bancário, constituindo um interesse público e não mais uma livre disposição de vontade entre as partes. Esta norma imperativa ainda encontra oposições incongruentes pelos fornecedores no mercado de consumo.

Feitas estas considerações preliminares, importa agora investigar os sujeitos envolvidos numa relação consumerista.

2.2Os Sujeitos da Relação de Consumo

Como ficou delineado, a Revolução Industrial trouxe profundas transformações sociais, engendrando novas relações como a de natureza trabalhista. Esta mesma Revolução levou o modo de produção capitalista para novos ciclos de desenvolvimento, como o fortalecimento das instituições financeiras. O dinheiro era um produto rentável para os bancos e que alavancou a busca de inovação no modo de produzir para os fabricantes de produtos e os prestadores de serviços, mais tarde.

O aumento dos produtos de mesma série e em escala cada vez maior exigia uma contratação também em massa: o contrato de adesão. Esta espécie de contrato é nada mais que uma fórmula jurídica negocial unilateral cujos traços característicos são sua uniformidade e imutabilidade. Foi a solução encontrada pelo fornecedor para acompanhar o ritmo da produção e do mercado como um todo.

O legislador deu sua definição no art. 54 do CDC, ao prescrever:

Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

Nesse novo contexto, a relação consubstanciada na venda e compra, entre contratado e contratante, facilitou as práticas administrativo-negociais do fornecedor e, em larga desproporção, fragilizou o consumidor, reduzindo sobremaneira sua autonomia de vontade.

Detendo o poder informacional sobre o produto ou serviço que concebe e elaborando sozinho as disposições obrigacionais, o fornecedor pôs em desvantagem a condição de contratante do consumidor. Na realidade concreta e cotidiana das relações de consumo, o fornecedor determina o modo como se dará a relação jurídica, deixando em evidência uma desigualdade em seu benefício.

Contudo, para o fornecedor o consumidor é um contratante com poderes de contratar e neste aspecto não o percebe como parte frágil na relação, devendo o princípio pacta sunt servanda ser plenamente obedecido, transformando o contrato num labirinto, para o consumidor.

O CDC não aboliu as obrigações contratuais do consumidor diante dos negócios que venha a firmar com o fornecedor, mas, diferentemente do Código Civil, firmou regramentos benéficos para o consumidor, tais como o da interpretação mais favorável ou o do direito à não surpresa, dentre muitos outros ao longo de seu texto. Os primeiros dispositivos que inauguram o Capítulo denominado "Da Proteção Contratual", esclarecem:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos documentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

Nesse escopo protetivo, o CDC estipulou os contornos dos sujeitos que compõem uma relação de consumo.

Regra geral, diz o Art. , caput, que é Consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Adiante, o legislador ainda contemplou como Consumidor aquele dito equiparado como a coletividade de pessoas, as vítimas de evento danoso e todas as pessoas expostas às práticas de oferta, publicidade, submetidas a cobranças e mencionadas em cadastros e banco de dados dos fornecedores. [13]

No Brasil, à luz das definições apresentadas na lei, a coletividade está no mesmo patamar do consumidor individual. Isto significa que esse consumidor é titular de direito a ser protegido pelo Estado, através de seus legitimados ativos, a saber o Ministério Público, os entes federativos, os órgãos e as entidades da administração pública destinados à defesa do consumidor e as entidades privadas legalmente constituídas há pelo menos um ano e que promovam a defesa do consumidor, conforme prevê o Art. 82 do CDC.

A tutela coletiva do consumidor, tanto em âmbito administrativo quanto judicial, é um marco notável para a ciência do direito, pois toda a construção do conhecimento jurídico via a coletividade de maneira informe, de modo a apenas ser a destinatária dos efeitos da aplicação das normas e não como titular de um rol de direitos. A consequência imediata dessa inovação jurídica é que o Fornecedor, quando anuncia seu produto de forma desleal, sabe agora que estará, com sua conduta, afetando um sujeito definido pelo direito, ainda que indeterminado. Assim, o direito concebe o consumidor da mesma forma que o fornecedor o vê quando expõe seus produtos e serviços no mercado de consumo.

O consumidor pode ser uma pessoa jurídica, desde que a aquisição não se preste à reinserção do produto na cadeia produtiva com o intuito de auferir lucro. Assim, será consumidora a empresa que recebe a prestação de serviços de telefonia, de energia elétrica e água encanada dos seus fornecedores. Perfilhando-se majoritariamente na doutrina finalista ou subjetivista, o STJ consolidou entendimento de que o consumidor não se define pelo seu caráter econômico, pelo seu poder de compra, mas o fim para o qual se presta o ato de consumo. Se o ato de consumo for para satisfação própria e imediata nele se exaurindo, este será consumidor. Se, de outro lado, o ato de consumo se prestar para otimizar, instrumentalizar ou dinamizar produto ou serviço seu, este não será consumidor. Nesse sentir, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp. nº836823-PR [14], da relatoria do Min. Sidnei Beneti, se respaldou no entendimento seguinte:

A aquisição de bens ou a utilização de serviços, por pessoa natural ou jurídica, com o escopo de implementar ou incrementar a sua atividade negocial, não se reputa como relação de consumo e, sim, como uma atividade de consumo intermediária. Com efeito, a prevalecer solução diversa, o microssistema do Código de Defesa do Consumidor deixaria de assim ser e passaria ser (sic) o conjunto de normas a regular todos os contratos.

Porém, a figura do "consumidor pessoa jurídica" despertou muitas controvérsias, apesar de sua previsão legal. A razão era simples: desconfiava-se da possibilidade de uma empresa ser tida como consumidora, uma vez que uma empresa não consome, mas fornece produtos ou serviços, sendo este seu fim último no mercado.

Foi a partir da consolidação jurisprudencial do STJ, hoje está pacificado que o consumidor também será pessoa jurídica quando firmar "consumo intermediário" [15] frente outra pessoa jurídica. Assim, a interpretação consolidada e majoritária dos tribunais informa que convém observar, quanto ao consumidor pessoa jurídica, o seu destino do ato de consumo e não apenas sua condição de vulnerabilidade, por ausência de conhecimento técnico ou de poder econômico de um diante do outro.

Desse modo, um pequeno estabelecimento comercial que adquire engradados de refrigerantes do distribuidor para otific-los, jamais poderá ser percebido como consumidor, mesmo sendo econômica e cognoscitivamente inferior à distribuidora, uma vez que sua aquisição não tivera como pressuposto o consumo próprio. Os refrigerantes foram reintroduzidos no mercado para consumo da coletividade dos consumidores, tendo para o estabelecimento a destinação objetiva do lucro. Pensar diferente provocaria uma grave distorção dos escopos sociais e jurídicos do CDC.

Doutrinando sobre um dos elementos caracterizadores do consumidor, ensina Fábio Henrique Podestá [16]:

A importância da apreciação do princípio da vulnerabilidade está vinculada ao próprio suposto de fato do microssistema que visa proteger o consumidor nos vários contextos em que atua no mercado, não sendo por outro motivo que a doutrina identifica as seguintes espécies: a) vulnerabilidade econômica (situação de fato prévia à decisão que toma o consumidor quando adquire bens ou usufrui serviços); b) vulnerabilidade congnoscitiva (assimetria informacional sobre o desconhecimento técnico e jurídico no ato de consumo).

Portanto, não basta que o consumidor seja vulnerável diante do fornecedor, mas que seja, de fato, a destinatária final do ato de consumo.

Se um salão de beleza compra copos descartáveis para oferecer maior conforto aos seus clientes, ela é fornecedora para seus consumidores e será consumidor para o fornecedor que lhe vendeu os copos descartáveis, posto que a aquisição não constituiu insumo para sua prestação de serviço. Mesmo que ela venha a adquirir um lote de xampus ainda assim será consumidora posto que o serviço poderá ser prestado sem este insumo. Entretanto, se este salão de beleza vende este lote de xampus para sua clientela, ela deixará de ser consumidora para ser fornecedora, porque sua aquisição reapresentou o produto na cadeia produtiva para consumo final.

Denota-se da distinção acima, que não será toda transação comercial da venda e compra de bens e serviços no mercado uma relação de consumo. A distinção está na intencionalidade da aquisição, se para consumo ou se para a sua reintrodução no mercado.

O outro sujeito relacional, o Fornecedor, é definido pelo Art. 3º do CDC como:

A pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Dessa forma, para o CDC, o Fornecedor não será apenas a pessoa jurídica, privada e nacional, mas também será a pessoa física, estrangeira, pública ou mesmo despersonalizada.

É senso comum entre os fornecedores a ideia de que o CDC constitui norma que lhe estatui apenas obrigações diante dos consumidores, e isto não é verdade. Exemplifique-se que o fornecedor tem o direito de submeter o produto viciado a conserto no prazo de até 30 dias, de modo que o consumidor não terá direito à sua troca, muito embora seria de notável avanço esta medida. No sistema pátrio, não se aplica a troca, mas à substituição, frustrado, impossibilitado ou expirado o prazo referido. Corrobora com esse entendimento o Prof.º Fábio Henrique Podestá [17]:

A rigor, enquanto o fornecedor não tiver oportunidade para sanar o vício no trintídio, não poderá o consumidor exercer as opções legais, o que significa pressuposto necessário para o seu exercício, sendo possível entretanto, imaginar hipóteses concretas em que a natureza do vício é de tal magnitude que não haverá interesse do consumidor no pedido de saneamento, como determinado produto alimentício que exige consumo imediato.

Questão bastante interessante diz respeito aos limites dessa relação jurídica. Tanto consumidores quanto fornecedores têm a convicção de que a compra de um bem ou a utilização de determinado serviço caracteriza e põe fim à relação de consumo. Porém, na prática não é assim. Por exemplo, a ação de vender, do fornecedor, e a de comprar, feita pelo consumidor, são ações que materializam as práticas comerciais e que para o direito do consumidor são apenas momentos de uma relação de consumo.

Este posicionamento explica a importância que o CDC conferiu à oferta e à publicidade dos produtos e serviços postos pelos fornecedores à disposição dos consumidores. Por óbvio, não há que se falar em consumo propriamente dito quando o consumidor contempla uma oferta atraente diante da vitrine do fornecedor, porém esta oferta vinculará o fornecedor ao consumidor no momento da concretização do ato contratual exaurida com a compra do bem, como bem explicita o art. 30 do CDC ao preconizar:

Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

Note-se que na oferta não há consumo, mas restará estabelecida a relação de consumo com o tão só ato de oferta do fornecedor ao consumidor. Eis a razão pela qual qualquer consumidor poderá exigir do fornecedor que precifique o produto que expõe em sua vitrine, posto que é de interesse público que assim se comporte, mesmo que não venha a adquiri-lo posteriormente, mesmo que não celebre contrato.

Outro aspecto importante diz respeito ao momento posterior à vinculação contratual entre consumidor e fornecedor. Ainda haverá relação de consumo, posto que o fornecedor deve responder pelos defeitos e vícios que apresentar seus produtos e serviços.

Nesse diapasão o legislador tratou da garantia contratual no art. 24 quando prescreve que a garantia legal de adequação do produto ou serviço independe de termo expresso, vedada a exoneração contratual do fornecedor.

A prestação de reparos e outras orientações ao consumidor feitas pelo fornecedor são ações posteriores à compra. O fornecedor almeja que o consumidor tenha a melhor impressão possível de seus produtos no mercado diante daqueles fabricados pelos seus concorrentes e, por isso, procura manter uma rede de serviços técnicos credenciados para cristalizar essa sensação positiva naquilo a que eles denominam de pós-venda.

Portanto, contraria-se aqui a ideia equívoca de que uma relação de consumo começa e termina com a simples transação comercial, ideia esta extremamente vantajosa para o fornecedor e funesta para o consumidor, subtraindo-lhe direitos, além de contrariar todo o sistema protetivo legal.

Ao tratar deste complexo tema da relação jurídica de consumo, colabora ainda o Prof.º Fábio Henrique Podestá [18], ao ensinar que:

Voltando ao tema da relação de consumo, se num primeiro momento coube ao legislador conferir o passo inicial para a estruturação e efetivação do direito do consumidor, tanto na esfera constitucional como infraconstitucional, num momento posterior é a doutrina que vai desenvolver a categoria essencial denominada relação jurídica de consumo, já que o Código do Consumidor, apesar de representar uma lei permeada de conceitos legais, não diz o que é aquela relação.

Logo, para que se possa falar de relação jurídica de consumo, impõe-se identificar o seu pressuposto lógico aplicável e geral que se chama de contatos de consumo, cujo nascedouro pode ocorrer tanto pela vinculação contratual entre um consumidor e um fornecedor, como também pela violação dos direitos de consumidor. [p. 51]

A situação jurídica que tangencie indivíduos figurando-os em polos relacionais que os qualifiquem como consumidores e fornecedores, caracterizará uma relação de consumo.

Já delimitadas as categorias jurídicas da relação de consumo e dos sujeitos dessa relação, é oportuno que se faça uma reflexão acerca da repercussão dos princípios e dos regramentos postos pelo CDC na realidade do mercado de consumo.

De um lado, os consumidores não mais se sentem desamparados, porque agora têm direitos a serem resguardados e defendidos quando sob os abusos do fornecedor. Já não há uma sensação de estar sozinho e fragilizado, porque existe lei e um sistema institucionalizado pelo Estado para a garantia e a aplicação das normas protetivas.

De outro lado, o fornecedor sentiu-se tolhido na sua liberdade de escolher a melhor prática comercial, que lhe garantiria vantagens na sua relação custo versus lucro. Esta impressão é falsa, posto que o legislador constituinte não teve esta pretensão. Ao contrário disso, o Estado brasileiro, ao regular a ordem econômica, a concebeu como elemento fundamental para o desenvolvimento do indivíduo, da sociedade e de si próprio, como se observa da norma constitucional que diz em seu Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V- defesa do consumidor.

Veja-se que o legislador preconiza o princípio da livre iniciativa para todo aquele que almeja se apresentar no mercado de consumo como fornecedor. Ele é livre para empreender atividade lucrativa, mas em harmonia com outros pressupostos, tais como a dignidade da pessoa humana e a justiça social. Elucidativa e sucinta foi a lição do Min. Moreira Alves no julgamento da ADI I319 [19]:

Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros.

Portanto, o fornecedor terá no Brasil o poder econômico para promover o desenvolvimento do País e de suas atividades, mas sob o fundamento da função social dos contratos, seja nas relações de consumo seja nas relações comerciais que empreender.

Mas quando o fornecedor ignora o consumidor, ciente de que há suficiente e inquestionável razão naquilo que lhe solicita, instala-se aí um conflito de consumo.

2.3 O Conflito de Consumo

Os sujeitos envolvidos numa relação jurídica específica não estão imunes a uma situação de oposição. Os interesses que buscam satisfazer, por via de regra, devem ser harmonizados, a exemplo dos instrumentos tocados numa orquestra. Quando um desses instrumentos sobrepõe sua nota, atravessando o compasso dos demais, provoca desarmonia, restando comprometida a musicalidade e, inevitavelmente, será rejeitada pelos seus ouvintes.

Nas relações jurídicas, a controvérsia impede a mútua realização dos interesses e estará apta, caso persista, a desfazer a comunhão inicial, rompendo com a relação construída.

Ao caracterizar o conflito, em sua obra Carlos Eduardo de Vasconcelos [20] deixa transparecer a confluência de sentidos que o termo evoca, ensinando que:

O conflito é dissenso. Decorre de expectativas, valores e interesses contrariados. Embora seja contingência da condição humana e, portanto, algo natural, numa disputa conflituosa costuma-se tratar a outra parte como adversária, infiel ou inimiga. Cada uma das partes da disputa tende a concentrar todo o raciocínio e elementos de prova na busca de novos fundamentos para reforçar a sua posição unilateral, na tentativa de enfraquecer ou destruir os argumentos da outra parte. Esse estado emocional estimula as polaridades e dificulta a percepção do interesse comum.

Nas relações de consumo, o fornecedor busca a satisfação de dois interesses que lhe são primordiais: o lucro e a fidelização. O mercado de consumo será o locus de obtenção desses interesses. Sem o consumidor comprar e continuar comprando, o fornecedor não alcançará seus objetivos, pondo em risco sua própria razão de ser.

O interesse do consumidor é único: obter dos fornecedores produtos e serviços na exata conformidade com que são apresentados no mercado. Esta conformidade significa que o produto ou serviço tem, objetiva e finalisticamente, que causar satisfação ao consumidor.

Quando o produto ou serviço trouxer consigo vício ou defeito que o torne impróprio, imprestável ou inadequado para os fins que dele razoavelmente se espera [21], o fornecedor estará desatendendo ao interesse do consumidor nas suas interações.

Mas não se pode, nesse estágio relacional, entender que se instalou o conflito de consumo entre consumidor e fornecedor.

Mesmo cediço que é dever do fornecedor apresentar no mercado produto e serviço adequado, seguro, saudável e que atenda à necessidade do consumidor, conforme preconizado pelo Art. 4º do CDC, a atividade humana não está desembaraçada dos erros que comprometam tais atributos. Embora a industrialização e o conhecimento humano tenham alcançado avanços consideráveis, o homem sempre irá falhar em suas ações. A qualidade é um objetivo a ser perseguido pelos fornecedores, não importando o ramo de sua atividade. É um dever impositivo e intrínseco à natureza da atividade produtiva e lucrativa.

Nesse sentido, haverá conflito de consumo toda vez que o fornecedor, ao tomar conhecimento de que o produto que fabricou ou o serviço que prestou não cumpriu a finalidade para o qual fora concebido e posto à oferta, nada fizer para retomar a satisfação do consumidor na relação de consumo.

Então, o elemento fundante do conflito de consumo será a resistência sem causa do fornecedor à pretensão do consumidor, levando este a procurar sua resolução através de um terceiro, o Estado.

Esclarecedora a posição adotada pela Prof.ª Ada Pellegrini Grinover [22], ao versar sobre o conflito numa relação jurídica:

A existência do direito regulador da cooperação entre pessoas e capaz da atribuição de bens a ela não é, porém, suficiente para evitar ou eliminar os conflitos que podem surgir entre elas. Esses conflitos caracterizam-se por situações em que uma pessoa, pretendendo para si determinado bem, não pode obtê-lo – seja porque (a) aquele que poderia satisfazer a sua pretensão não a satisfaz, seja porque (b) o próprio direito proíbe a satisfação voluntária da pretensão. (grifo nosso)

No conflito de consumo, o fornecedor deixa o consumidor assumir sozinho o dano material a que não dera causa, se omitindo de um dever que, por lei lhe cabe atender. Para o direito, o fornecedor enriquece ilicitamente quando, ao provocar este dano material, não efetua a substituição do produto ou a restituição da quantia devida pelo preço que foi pago ou, quanto ao serviço, sua reexecução ou restituição de quantia despendida. Se não resistisse à pretensão de reparação do consumidor, o fornecedor não teria dado vazão ao nominado conflito.

A doutrina pátria não se debruçou sobre os contornos que dão feição ao conflito de consumo de forma mais aprofundada, mas esta matéria é que dá habitualmente a nota das discussões entre os contendentes diante do Estado.

Ao regular as relações no mercado de consumo, o CDC traçou diretrizes para o fornecedor ao ditar-lhe os direitos básicos do consumidor, as práticas abusivas a serem vedadas e as sanções a que estão sujeitos aqueles que não as observar e resistir. Mas é importante que o fornecedor seja notificado pelo consumidor de que houve desarmonia na relação de consumo sob questão, para que possa dar resolutividade e reconduzir o consumidor à satisfação. E isto por um princípio básico: o fornecedor tem direito à informação da insatisfação do consumidor.

No entanto, a resistência infundada ou a reiteração de sua resistência instaura o conflito de consumo, e o fornecedor estará sujeito às sanções da lei. Mas cabe ressaltar, o CDC foi concebido para a defesa do consumidor e ao fazê-lo não descurou da importância do fornecedor para o aprimoramento e sucesso das relações de consumo, ao estabelecer a Política Nacional das Relações de Consumo, inaugurada em seus artigos 4º e 5º, assim ordenados:

Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(...)

III – harmonização dos interesses dos participantes dos interesses das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo; (...) (grifo nosso)

A norma em apreço deixa evidente que a vontade da lei é que haja harmonia nas relações de consumo e não a subversão da ordem econômica, reificando-se o consumidor em detrimento do fornecedor. Ambos são primordiais para o desenvolvimento econômico do País.

No entanto, a todo momento surgem novos métodos de produção para otif-la mais célere, eficiente e, sobretudo, com baixo custo, elevando-se os potenciais de lucratividade do fornecedor. No mesmo ritmo, novos modelos de administração de recursos materiais e humanos aparecem e sob o mesmo paradigma. Apesar de todo este cenário da maximização da qualidade, estas inovações não são capazes de evitar o cometimento de falhas e estas falhas, nalgum momento, irão repercutir nas relações de consumo, acarretando prejuízos ao consumidor.

A desarmonia pode levar ao conflito e este fragilizará a relação de consumo. Este panorama não é interessante para o fornecedor, que todos os dias busca superar seus concorrentes e conquistar mais consumidores.

Mas não bastou ao legislador ditar uma linha política de defesa do consumidor, posto que a lei só tomará corpo quando estiver materializada na atuação de agentes estatais ou outros pelo Estado autorizadas.

Linhas à frente será abordada a atuação desses agentes componentes do sistema legal protetivo e com funções claramente delineadas, que buscarão fortalecer a defesa do consumidor no Brasil e qual sua importância para a resolução dos conflitos de consumo.

2.4 A Defesa do Consumidor

A tutela do consumidor, na forma em que foi concebida pelo legislador constituinte, é reflexo do modelo político adotado pelo Estado brasileiro. A Constituição Federal de 1988, fundada nas bases do Estado Social, visou contemplar o maior número possível de relações sociais que estavam carecedoras da intervenção estatal. Ao ter reconhecido o consumidor como o elo mais fraco da cadeia produtiva, o Estado restabelece o desequilíbrio próprio da relação material de consumo.

Nesta nova concepção de Estado, a livre iniciativa, conjugada à defesa do consumidor, não são vistas como atuações antagônicas do fornecedor que age de boa-fé em suas práticas comerciais, mas como necessárias para o desenvolvimento com justiça social.

Se o constituinte imprimiu ao Estado o dever de defender o consumidor, isto significa que é um dever de justiça social estabelecer mecanismos legais e políticas públicas que obriguem a todos os membros da comunidade o respeito ao consumidor como sujeito titular de direitos.

Tecendo considerações introdutórias sobre a ideia de justiça social no Brasil, leciona o Prof.º Luís Fernando Barzotto [23]:

Por sua vez, a justiça social pode ser fundamentada no caráter social do ser humano. Carente de uma plenitude que só pode ser alcançada na relação com outrem, a pessoa humana se vê envolvida em uma rede de relações de dever. Todos devem algo a todos como membros da comunidade. Em primeiro lugar, todos devem ter reconhecida sua dignidade como seres humanos, o que no campo jurídico-político significa que todos têm direitos e deveres idênticos: "cada cidadão possui os mesmos direitos jurídicos e políticos", e nesta medida, todos podem desenvolver o "auto-respeito", que consiste na "consciência da própria dignidade e certa capacidade para pô-la em ação" e que depende apenas do status de pessoa humana membro da comunidade.

Assim, dada a velocidade com que vem crescendo as inovações técnicas e informacionais no mundo econômico e que exigem cada vez mais a intervenção do Estado para a regulação igualitária entre consumidores e fornecedores, cabe-lhe primar por desigualar estes desiguais na exata medida de sua desigualdade.

Retrocedendo um pouco no tempo, do século XIX ao início do século XX, eram notórias as figuras dos inventores e seus inventos. Na atualidade, o invento de um novo produto torna-se obsoleto antes que se descubra quem o inventou, dado o ritmo e a variedade das criações no mundo da produção e das mutações tecnológicas. Este ritmo alucinante de produção põe em xeque a qualidade, que é de interesse da coletividade dos consumidores.

Portanto, ao Estado Social não coube outra atitude senão constituir-se num participante ativo das relações sociais. Refletindo sobre a importância desse Estado de Bem-Estar, leciona o Prof.º Dirley da Cunha Júnior [24]:

As implicações cada vez mais intensas das descobertas científicas e de suas aplicações, que se processaram com maior celeridade, a partir da Revolução Industrial, o aparecimento das gigantescas empresas fabris, trazendo, em otificasa, a formação de grandes aglomerados urbanos, representam mudanças profundas na vida social e política dos países, acarretando alterações acentuadas nas relações sociais, o que exigirá que o Estado, gradativamente, vá abarcando maior número de atribuições, intervindo mais assiduamente na vida econômica e social, para compor os conflitos de interesses de grupos e de indivíduos, e sobretudo, para satisfazer as necessidades destes.

Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988 e do CDC, brotavam movimentos sociais que defendiam os interesses dos consumidores, ganhando o reconhecimento público, a exemplo do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), fundado em 1987, e do Movimento das Donas-de-Casa de Minas Gerais (MDC-MG) [25], fundado em 1983. Todos representaram a voz do consumidor diante das práticas abusivas dos fornecedores. Naquele tempo, não havia uma legislação protetiva interna e a Constituição de então era omissa quanto à existência de um direito do consumidor, pois não houve previsão quanto à ordem econômica nem enquanto direito fundamental. Alguns Estados da Federação já reconheciam a vulnerabilidade dos consumidores diante das inúmeras abusividades cometidas pelos fornecedores. O Estado de São Paulo foi pioneiro na criação de órgãos públicos de defesa do consumidor e que ficaram conhecidos como Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor (PROCON), surgidos a partir de 1976.

Cabe acrescentar que não existia um sistema que pudesse conferir unidade e coerência às ações de defesa que eram exercidas pelos órgãos públicos e entidades privadas. As leis protetivas também eram esparsas, tratando de temas muito específicos, como o tabelamento de preços, normas de pesos e medidas e de higiene na conservação e manipulação de alimentos.

O CDC causou uma ruptura com esse estado de coisas, pois definiu os participantes da relação de consumo, estabeleceu direitos e obrigações, firmou princípios de ordem pública, criminalizou condutas dos fornecedores e regulou os legitimados bem como norteou os mecanismos de promoção à defesa administrativa, judicial, individual e coletiva do consumidor. As normas consumeristas deram a amplitude e a clareza necessárias, fazendo com que todos os consumidores e fornecedores assumissem suas posições nas relações de forma harmônica e com desenvolvimento.

Para dar maior efetividade às ações de proteção e defesa, a lei conferiu ao Estado o dever de criar uma Política Nacional das Relações de Consumo, prevista nos seus artigos 4º e 5º com o escopo de atender às necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.

A Lei nº8.078/90 atribuiu ao Estado atuação direta, seja pela criação de órgãos protetivos, como os PROCONS (Procuradorias de Defesa do Consumidor) seja pelo incentivo à criação de entidades civis que tenham o mesmo objetivo. Atualmente, em âmbito administrativo, o consumidor pode reclamar seus conflitos de consumo no país, contando com 26 PROCONS estaduais e 1 do Distrito Federal [26] e com centenas de órgãos municipais e entidades privadas representativas. Mas a proteção estaria comprometida se não contemplassem a atuação de outros órgãos do poder público. Por isso, para fazer jus a esta política de proteção, a lei listou um conjunto de instrumentos, informando o art. 5º o seguinte:

Art. 5º. Para a execução da Política Nacional das Relações de Consumo, contará o Poder Público com os seguintes instrumentos, entre outros:

I – manutenção de assistência jurídica, integral e gratuita para o consumidor carente;

II – instituição de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor, no âmbito do Ministério Público;

III – criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento de consumidores vítimas de infrações penais de consumo;

IV – criação de Juizados Especiais de Pequenas Causas e Varas Especializadas para a solução de litígios de consumo;

V – concessão de estímulos à criação e desenvolvimento das Associações de Defesa do Consumidor.

O legislador criou um rol de agentes de proteção ao consumidor. A Defensoria Pública, embora expressamente não ter sido constituída entre os legitimados ativos para a defesa do consumidor em juízo, conforme se depreende do Artigo 82 do CDC, deverá prestar a assistência jurídica integral e gratuita ao consumidor carente.

O sistema de segurança pública dos Estados, o Ministério Público e o Poder Judiciário deverão contemplar em suas respectivas estruturas, órgãos destinados a receber as demandas individuais e coletivas dos consumidores.

É oportuno destacar neste tópico a importância da criação e atuação dos Juizados Especiais para a composição dos litígios oriundos das relações de consumo, posto que seu rito processual, em tese, deve oferecer maior celeridade e simplicidade possível às demandas de massa, tornando a prestação jurisdicional adequada às novas aspirações e necessidades sociais.

Nesta lista de órgãos protetivos, o legislador incluiu as entidades civis, cuja atuação em muito contribuiu para diminuir a elevada carga de ações consumeristas individuais sobre o sistema judicial brasileiro. Nesse sentir, manifesta-se o Profº Rizzatto Nunes [27]:

O CDC permite a proteção dos consumidores em larga escala, mediante ações coletivas e ações civis públicas. É por elas que o consumidor poderá ser protegido. Aliás, parece-nos pelo menos nas questões de competência da Justiça Estadual, aos poucos é verdade (e no caso brasileiro, não era de se esperar de outra forma que o CDC demorasse para ter implementação), começa-se a ter consciência da importância da ação coletiva, quer proposta pelo Ministério Público, quer proposta pelas Associações de Defesa do Consumidor, porque começa-se a perceber que, de fato, o fundamento primordial da Lei n.º8078, nas questões processuais, é exatamente este controlar como um todo as ações dos fornecedores.

Assim, o Estado, por meio dos poderes Executivo e Judiciário, cumpre o direito básico do consumidor, previsto no Art. 6º, VII, que diz:

São direitos básicos do consumidor:

(...)

VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados. (grifo nosso)

Insuficiente se mostrava a criação dessas portas legais para o acesso à ordem jurídica protetiva preconizada pelo CDC, tanto no âmbito administrativo quanto judicial. Era necessário então integrar essas portas, através da veiculação de um sistema de informações e coordenadas por um gestor nacional.

Expressamente, o legislador criou no Título IV do CDC o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), atribuindo à União a criação do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC). Vinculado ao Ministério da Justiça, por meio da Secretaria de Direito Econômico, o DPDC é o órgão gestor do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), que fora concebido a partir das experiências do PROCON de São Paulo. Assim, veja-se a ilustração abaixo representativa desse sistema:

Gráfico 1. Componentes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor:

Fonte: Cadastro de Reclamações Fundamentadas. 2009. DPDC-MJ

Atualmente o DPDC e sua ferramenta informacional alimentam as políticas de defesa do consumidor implementadas por todos os atores acima arrolados, suprindo a desarmonia anterior.

Percebendo lacunas deixadas na construção do Código, o legislador inseriu todos os PROCONS e entidades civis de defesa do consumidor no SNDC, consoante disposto no seu Art. 105, preconizando que integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor.

Assim, com livre acesso aos órgãos administrativos e judiciais, o consumidor brasileiro tem em suas mãos um sistema legal de defesa harmônico para atender às suas demandas, constituindo múltiplas portas de acesso para a tutela de seus direitos e resolução de eventuais conflitos em suas relações de consumo.

Mais à frente, aprofundar-se-ão essas distinções entre essas portas de acesso à obtenção da ordem jurídica promovidas pelo Estado aos participantes das relações de consumo.


3 O ACESSO À JUSTIÇA E O SISTEMA MULTIPORTAS

Prescreve o Art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Nesta diretriz, a norma constitucional deixa claro que nenhuma lei ou qualquer outro ato estatal poderá impedir ou dificultar o acesso do indivíduo à Justiça.

Mas, da proclamação ao exercício desta garantia, existia uma série de obstáculos que dificultavam, durante décadas, ao indivíduo, não só o pleno acesso, mas também à obtenção de uma prestação jurisdicional efetiva e equitativa às suas pretensões. Ainda hoje, alguns obstáculos persistem, mesmo após a implementação de reformas processuais e na reestruturação dos serviços judiciários no Brasil.

Contribuíram para tais reformas, os processualistas Mauro Capelletti e Bryant Garth. Os estudos, que desenvolveram no denominado Projeto de Florença [28] (1976), concluíram que os sistemas judiciais dos países pesquisados apresentavam semelhanças no acesso à Justiça, que denunciavam uma Justiça apenas para alguns. A Justiça cometia injustiças. Apontava o relatório a existência de uma atividade jurisdicional vagarosa, economicamente dispendiosa e que ignorava a existência de novos direitos. Resumindo o documento, afirma com propriedade Carlos Eduardo de Vasconcelos [29]:

Três iniciativas ou ondas foram vistas, inicialmente, como as mais básicas no sentido da efetividade do acesso à justiça: a primeira intenta frustrar o obstáculo econômico na fruição dos direitos humanos, o que se viabiliza pela assistência judiciária para as pessoas de baixa renda. A segunda tem por finalidade combater o obstáculo organizacional, possibilitando a defesa de interesses de grupo, difusos ou coletivos, por meio das ações populares ou coletivas. Já a terceira onda, objetiva combater o obstáculo processual de acesso à justiça, mediante a expansão e o reconhecimento dos direitos humanos, por todos os meios que reduzam o congestionamento crônico dos sistemas judiciários internos da maioria dos Estados.

A relevância dos estudos não ficou na constatação de que a Justiça não era para todos. Os pesquisadores divulgaram ações estatais promissoras em algumas sistemas judiciários e extrajudiciais em alguns países que já sinalizavam soluções ao fragilizado e deficiente sistema vigorante em todo o mundo.

Condensadas sob a proposição teórica do acesso efetivo à Justiça, Capelletti & Garth identificaram que não bastava ao Judiciário ser inafastável, pois ele também teria que prestar uma tutela efetiva a quem o procurasse.

Rumando no sentido destes novos ventos soprados pela redemocratização e busca da justiça social, sob a vigência da atual Carta Política, e mesmo antes da renovação institucional e política do país, foram criados procedimentos processuais e reformadas as estruturas da administração judicial para garantir maior efetividade à tutela jurisdicional ao indivíduo.

Neste propósito, surgem leis de abrangência coletiva, Juizados Especiais e Defensorias Públicas. Parece pouco, mas não é.

Chamados de ondas renovatórias, como já mencionado, os processualistas sugeriram três proposições de reformas fundamentais, que tinham três finalidades básicas, quais sejam a de proporcionar assistência judiciária para os pobres; a representação dos interesses difusos, material e processualmente considerados, e promoção de políticas visando um novo enfoque de acesso à justiça.

Ainda que não constitua o objeto principal deste trabalho discorrer em pormenores as contribuições dos estudiosos, é inarredável traçar alguns comentários, ainda que brevemente.

Para permitir que a parcela da sociedade desprovida de recursos pudesse atravessar a soleira do Judiciário brasileiro, sem prejuízo da manutenção de sua família, já existia a vigorante Lei nº1.060/1950, que garante a assistência judiciária gratuita, nos termos do Art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal.

A introdução dos Juizados Especiais no Artigo. 98, inciso I, da Lei Maior, antes chamadas de Juizados de Pequenas Causas, sob a vigência da EC nº01/69 do ordenamento anterior, simplificou o ajuizamento e processamento das ações de pequeno valor e de menor complexidade. Atualmente reguladas pelas Leis nº 9.099/95 e 10.259/01, os Juizados foram concebidos para tornar célere o processamento das ações que tenham menor complexidade [30], nas justiças estaduais e Federal.

Ademais, várias leis de natureza processual também foram editadas para evitar que a decisão do julgador não se tornasse de nenhuma ou pouca valia ao final da ação.

O constituinte de 1988 viu que as medidas até então adotadas não eram suficientes e fez ainda previsão da Defensoria Pública, no Art. 134 da Carta atual, para prestar a orientação jurídica e a defesa dos necessitados [31].

Segundo dados da Associação Nacional dos Defensores Públicos do Brasil (ANADEP), em seu Diagnóstico de 2009 [32], o país já contava com aproximadamente 4.515 advogados públicos distribuídos nas instituições mantidas pela União, Distrito Federal e Estados, sendo que alguns Estados ainda não criaram suas defensorias, deixando-as sob convênios firmados com seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A criação dos Juizados, das Defensorias Públicas e do benefício da gratuidade de justiça constituíram a chave que abriu as portas da prestação jurisdicional à maioria da população brasileira carente de conhecimentos sobre seus direitos e de recursos para disputas judiciais. Com isso, a primeira onda reformista preconizada por Capelletti & Garth [33] foi pouco a pouco tomando corpo no Brasil.

A segunda onda reformista sugerida pelos teóricos pode ser considerada das mais importantes para a sociedade. Embora a representação dos interesses difusos no Brasil antes de 1988 já podia se dar com a Ação Popular e a Ação Civil Pública [34], tais diplomas normativos ainda carregam consigo limitações à plena efetividade das tutelas coletivas.

Durante a realização da Audiência Pública para a Atualização do Código de Defesa do Consumidor, ocorrida na cidade de Belém do Pará [35], o jurista Kazuo Watanabe, membro da Comissão de Juristas nomeada pelo Senado Federal para a referida atualização, demonstrando que as tutelas coletivas de ordem processual ainda não detêm a amplitude que delas se espera, comenta que o Artigo 16, da Lei nº7.347/1985, que estabelece a Ação Civil Pública, limitando os efeitos da sentença prolatada à competência territorial do juiz, diminui a força coletiva da natureza da ação. O estimado processualista afirmou ser a norma contrária aos princípios que orientaram a criação da própria lei em que ela se insere.

Apesar de alguns retrocessos, os direitos de massa receberam a devida legitimação e proteção estatal através do CDC, preconizando, em seu Artigo 81, que a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

A representação ficou definida em seu Artigo 82 [36], conforme já assinalado neste estudo, de modo que não só o Ministério Público como também a Administração Pública e as entidades civis, ambos promotores de defesa do consumidor, receberam a legitimidade suficiente para o cumprimento de seu mister perante o Judiciário, qual seja, a defesa dos interesses da comunidade de consumidores a uma só vez e voz.

A propósito, o Anteprojeto que tramita na ordem do dia no Senado Federal para a atualização do CDC [37], e capitaneado pela mencionada Comissão de Juristas, prevê que a Defensoria Pública esteja legitimada concorrentemente com as demais instituições públicas a promoverem a tutela do consumidor. Esta medida além da disciplina das ações coletivas no diploma consumerista são propostas legislativas que serão levadas a texto final e que em muito completam e reforçam o sistema tutelar coletivo dos consumidores no Brasil.

Cabe também lembrar o Mandado de Segurança Coletivo, com previsão constitucional no Artigo 5º, inciso LXX, e regulado pela Lei nº12.016/09, instrumento concebido para alargar o escopo de proteção à coletividade diante da lesão a direito líquido e certo.

A segunda onda renovatória de acesso efetivo à Justiça no que diz respeito ao direito de representação expressa, na verdade, uma revolução em matéria processual. Corroborando com este pensamento, afirmaram Capelletti & Garth [38]:

A concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos direitos difusos. O processo era visto apenas como assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais. Direitos que pertencessem a um grupo, ao público em geral ou a um segmento do público não se enquadravam bem nesse esquema. As regras determinantes da legitimidade, as normas de procedimento e a atuação dos juízes não eram destinadas a facilitar as demandas por interesses difusos intentadas por particulares.

Hoje, as ações coletivas são tão comuns quanto as ações individuais, de maneira que mais uma lacuna foi preenchida no sistema judicial visando contemplar os direitos difusos.

Contudo, apesar dos avanços alcançados, ainda há uma demora considerável na obtenção da resposta judicial, mesmo não sendo mais custoso prosseguir na demanda ou de não haver mais óbices à representação das coletividades.

Como comprovação dessa afirmação, na atualidade, o serviço prestado pelos juizados brasileiros continua moroso, pois a demanda da sociedade não oti de crescer, conforme observam os dados apresentados pelo Departamento de Pesquisa Judiciária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) [39]:

Tabela 1. Volume de Ações Judiciais nos Juizados Especiais da Justiça Estadual de 2004 a 2008:

Justiça Estadual

Justiça em Números 2004 a 2008

Litigiosidade no Juizado Especial

2004

2005

2006

2007

2008

MagJE – Número de Magistrados no Juizado Especial

866

839

874

924

906

CnJE – Casos Novos no Juizado Especial

3.538.072

4.073.400

4.161.564

4.113.152

4.212.609

CpjJE – Casos Pendentes de Julgamento no Juizado Especial

3.272.316

3.525.387

3.793.969

4.047.922

4.026.472

SentJE – Número de Sentenças no Juizado Especial

3.154.978

3.755.365

4.065.142

3.991.470

4.072.377

ChJE – Casos Novos por 100.000 habitantes no Juizado Especial

2.019

2.212

2.265

2.236

2.222

CmJE – Casos Novos por Magistrados no Juizado Especial

4.155

4.839

4.731

4.451

4.627

kJE – Carga de Trabalho no Juizado Especial

7.707

9.250

9.063

8.832

9.035

TJE – Taxa de Congestionamento no Juizado Especial

53,7%

50,5%

48,9%

51,1%

50,6%

Data da última atualização: 04/06/2009 Fonte: CNJ-DPJ

Tabela 2. Volume de Ações Judiciais nos Juizados Especiais da Justiça Estadual em 2010:

Justiça Estadual

Casos Novos

Casos pendentes de baixa

Total de processos baixados

Sentenças

1º Grau

11.550.034

41.919.265

11.821.627

9.630.254

Juizado Especial

3.936.951

4.421.974

4.620.308

4.077.731

Total 1ª Instância

15.486.985

46.341.239

16.441.935

13.707.985

Fonte: CNJ-Justiça em Números 2010

Os dados são bastante emblemáticos quanto à crescente demanda da sociedade sobre a tutela jurisdicional e dispensam maiores interpretações. A cada ano mais de 4.000.000 de novas ações ingressam nos Juizados Estaduais brasileiros, ações estas titularizadas por indivíduos de baixo poder aquisitivo e cujo objeto material em disputa é de pouca monta e de menor complexidade jurídica.

Os jusprocessualistas Capelletti & Garth [40] já anteviam esta realidade, quando afirmaram:

O fato de reconhecermos a importância dessas reformas não deve impedir-nos de enxergar os seus limites. Sua preocupação é basicamente encontrar representação efetiva para interesses antes não representados ou mal representados. O novo enfoque de acesso à Justiça, no entanto, tem alcance muito mais amplo. Essa "terceira onda" de reforma inclui a advocacia, judicial ou extrajudicial, seja por meio de advogados particulares ou públicos, mas vai além. Ela centra sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas. (grifo nosso)

O sistema judiciário brasileiro, ao garantir o acesso à tutela jurisdicional aos mais necessitados, proclamado na primeira onda renovatória, descuidou que a administração judiciária não conseguiria absorver com qualidade todas as demandas da sociedade nas diversas controvérsias na qual se viam envolvidos seus cidadãos. Os dados acima espelham esta demanda sempre crescente.

No entanto, não resultou suficiente ao aparato estatal-judiciário promover a porta de entrada para o jurisdicionado ver apreciado e decidido seu pleito, uma vez que nem mesmo as medidas processuais antecipatórias de sua pretensão vêm suprindo e pacificando os conflitos que vivencia.

Mais juízes e serviços judiciais não têm sido aclamados como a solução única viável para aplacar os anseios da sociedade nesta seara da vida, mas um conjunto de outras saídas estatais vem sendo experimentadas e que foram previstas por Capelletti & Garth como a ideia de se promover um novo enfoque daquilo que seja o acesso à justiça, no sentido do acesso à ordem jurídica tutelar.

É óbvio que oacesso à prestação jurisdicional só poderá ser promovida pela função estatal na pessoa dos órgãos e serviços judiciais. Porém, Capelletti & Garth entendiam que o monopólio de dizer o direito na pessoa dos juízes não impede que outro órgão estatal venha a fazê-lo com vistas à pacificação social, como se verá adiante, informando ao cidadão os seus direitos.

3.1 Um Novo Enfoque de Acesso à Justiça

É sem sombra de dúvida que a expressão acesso à Justiça, cunhada pelos seus estudiosos, diz respeito à função jurisdicional do Estado, conforme já afirmado. Entretanto, Capelletti & Garth ampliaram seu conceito, indo além da ideia de Justiça como sistema formado por órgãos e instituições jurisdicionais.

Para os renomados processualistas, os direitos substantivos de massa que chegam aos tribunais sob a forma de litígios de direito público exigem das instâncias formais do Estado instituições e procedimentos adequados para atenderem a essas novas demandas da sociedade.De fato, têm razão os estudiosos. Mesmo garantida a legitimidade à representação coletiva para a tutela dos direitos de massa, tal como se depreende os afetos às relações de consumo, os indivíduos continuam a bater às portas da administração judiciária para a satisfação de suas pretensões, isoladamente. Convém asseverar que Capelletti & Garth não pretenderam retirar do Judiciário o monopólio de dizer o direito, frise-se mais uma vez, apenas anteciparam que os novos direitos iriam exigir do Estado, e não do Judiciário apenas, prestações positivas no sentido de, conforme Kazuo Watanabe [41], permitir que o cidadão tenha direito a obter uma ordem jurídica justa.

Atentos às incompreensões por que passaria a ideia do novo enfoque de acesso à Justiça, disseram Capelletti e Garth [42] ao final do seu Relatório de Florença:

Uma vez que grande e crescente número de indivíduos, grupos e interesses, antes não representados, agora têm acesso aos tribunais e a mecanismos semelhantes, através das reformas que apresentamos ao longo do trabalho, a pressão sobre o sistema judiciário, no sentido de reduzir a sua carga e encontrar procedimentos ainda mais baratos, cresce dramaticamente. (...) No entanto, uma mudança na direção de um significado mais "social" da justiça não quer dizer que o conjunto de valores do procedimento tradicional deva ser sacrificado. (grifo nosso)

Se ao Estado, dentro deste novo paradigma de acesso à Justiça, cabe o dever de informar e orientar o cidadão sobre os direitos de que é portador, então não apenas o Judiciário, mas também a Administração Pública pode e deve otific-lo para o exercício de sua cidadania.

Em seu interior, o Estado Social atua, não se limitando às abstenções de tolher a liberdade individual e coletiva, mas de atender ao rol de prestações positivas. Não é um mero expectador dos anseios sociais, mas um protagonista da efetivação dos direitos. Nesse sentir, exprimiu o constitucionalista Paulo Gustavo Gonet Branco [43]:

Os direitos de defesa, conforme a própria denominação os designa, oferecem proteção ao indivíduo contra uma ação, apreciada como imprópria, do Estado. Já os direitos a prestação partem do suposto de que o Estado deve agir para libertar os indivíduos das necessidades. Figuram direitos de promoção. Surgem da vontade de estabelecer uma "igualdade efetiva e solidária entre todos os membros da comunidade política". São direitos que se realizam por intermédio do Estado.

A partir da ampliação do conceito de acesso à Justiça, os estudos que sucederam ao Relatório de Florença defendem a ideia de que esse acesso poderá se dar em outras instâncias estatais, conferindo ao cidadão múltiplas portas para obtenção a uma ordem jurídica efetiva.

Como afirmaram os estudiosos Capelletti & Garth [44], a utilização de métodos e procedimentos alternativos ao modelo tradicional de resolução de conflitos pela sentença, a exemplo da mediação, conciliação e arbitragem, tendem a aceitar as limitações das reformas dos tribunais, envolvendo a simplicidade e julgadores informais. O novo sistema encorajará acordos e reduzirá o congestionamento do judiciário.

Com abordagens diferenciadas em vários países, como França, Portugal, Suíça e Estados Unidos, o sistema multiportas constitui saída judicial e extrajudiciais para a pacificação dos conflitos.

Portugal, por exemplo, vem adotando procedimentos de desjudicialização de conflitos, no sentido de que disputas judiciais sejam evitadas em seus tribunais, livrando-os dos congestionamentos processuais.

Nos EUA, país de longa tradição na resolução de conflitos extrajudiciais, desde meados do século passado, é adotado o procedimento dos chamados "tribunais multiportas" ou "multi-door courthouse". Sua característica essencial está no procedimento inicial, de modo que o Judiciário aprecia se a demanda tem condições de ser resolvida pela Administração Pública ou para conciliadores extrajudiciais, antes de se constituir num litígio judicial. [45]

O Brasil vem incorporando paulatinamente em sua legislação processual meios alternativos à pacificação de conflitos, como a instalação dos juízos arbitrais e das conciliações prévias no curso da ação. [46]

Há também uma mudança silenciosa na Administração Pública visando a prevenção de conflitos. A criação das agências reguladoras de determinadas atividades econômicas, a exemplo da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) [47] foram constituídas como instâncias administrativas de composição de conflitos entre fornecedores (prestadores dos serviços) e consumidores.

Outras agências que buscam compor conflitos e de relevante importância para os consumidores brasileiros são a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional de Águas (ANA), Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA), todas regidas por legislação própria. [48]

Comentando a atuação judicante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), do Ministério da Justiça, e sobre as agências governamentais mencionadas, informa o saudado processualista Freddie Didier Jr. [49]:

As agências reguladoras têm o poder de dirimir conflitos. Sucede que essa heterocomposição, embora formalmente bem parecida com a solução jurisdicional, é apenas um equivalente jurisdicional, na medida em que é possível submeter ao Judiciário o controle de suas decisões, tanto sob o aspecto formal, mas também sob o aspecto substancial, por exemplo.

No entanto, na prática, o que se tem visto é uma atuação mais regulatório-normativa do que compositiva, suscetível de muitas críticas quanto à sua inação neste aspecto, muito embora prevista legalmente a possibilidade de resolução de conflitos em sua esfera de atuação.

O estabelecimento de marcos legais da atividade econômica que visa controlar, tem como premissa a livre concorrência e a paridade de armas na busca do lucro entre os fornecedores.

Apesar de dever acolher as queixas dos consumidores e dar-lhes resolução diante dos fornecedores, o que se tem visto na prática é a simples aplicação de multas e encaminhamentos de demandas de forma individual, sem nenhum impacto político de proteção relevante, de forma coletiva e a prevenir conflitos. Este comportamento inadequado das agências reguladoras não é "privilégio" do Brasil apenas, conforme atestaram Capelletti & Garth [50]:

Outras soluções governamentais para o problema – de modo especial, a criação de certas agências públicas regulamentadoras altamente especializadas, para garantir certos direitos do público ou outros interesses difusos – são muito importantes, mas, também, limitadas. A história recente demonstra que, por uma série de razões, elas têm deficiências aparentemente inevitáveis. Os departamentos oficiais inclinam-se a atender mais facilmente a interesses organizados, com ênfase nos resultados das suas decisões, e esses interesses tendem a ser predominantemente os mesmos interesses das entidades que o órgão deveria controlar. Por outro lado, os interesses difusos, tais como os dos consumidores e preservacionistas, tendem, por motivos já mencionados, a não ser organizados em grupos de pressão capazes de influenciar essas agências. (grifo nosso)

Este fenômeno, de inevitável conflito de interesses entre consumidores e os grupos organizacionais controlados pelas agências governamentais, são corriqueiramente encontrados nas ações ajuizadas no plano federal, tendo de um lado, via de regra, um órgão ministerial, e de outro, em litisconsorte passivo, uma agência reguladora de serviços públicos essenciais, tais como a ANATEL e a ANEEL.

As normas editadas por esses organismos governamentais também têm sido alvo de muitas controvérsias não só jurídicas como políticas, posto que em muitas matérias ali tratadas usurpações legislativas são cometidas [51].

Há, contudo, outros espaços da Administração Pública que desempenham, com notoriedade e eficiência, a prevenção e resolução de conflitos, merecendo destaque a atuação da Advocacia-Geral da União (AGU), que tem se utilizado do procedimento da conciliação ou do arbitramento para promover o deslinde de controvérsias de natureza jurídica entre órgãos e entidades da Administração Federal. Assumem esta tarefa a Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF), os Núcleos de Assessoramento Jurídico da Consultoria-Geral da União e outros órgãos da instituição. Regulada pela Portaria nº1.281/07 e amparada na Lei nº9.028/95, a ideia é a de dirimir conflitos, numa tentativa de se evitar sua discussão em âmbito judicial.

Além da AGU, a Defensoria Pública da União (DPU), através da Lei Complementar nº80/94, tem entre suas missões institucionais, a finalidade de promover prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição, entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos. [52]

Todas estas incursões da Administração Pública, através da adoção de técnicas procedimentais de composição extrajudiciais de conflito vêm sendo denominadas pelos processualistas nacionais e estrangeiros de meios alternativos à pacificação social, constituindo o que têm chamado de sistema multiportas, amplamente difundido pela Universidade americana de Harvard desde a década de 70. [53]

Se a Administração Pública adotasse com maior ênfase, notadamente no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), as práticas resolutórias compositivas, abriria a possibilidade de reduzir a elevada e preocupante demanda judicial que vem sofrendo nos últimos anos, como apontam os dados do CNJ no documento "100 Maiores Litigantes" [54]:

Tabela 3. Relação dos Maiores Litigantes do Setor Público Federal

Fonte: Departamento de Pesquisa Judiciárias/ CNJ.

O processo administrativo apaziguador de conflitos passou a ser utilizado no Brasil de forma bastante tímida, mas o advento do rol de direitos fundamentais da Carta de 1988, como já comentado, trouxe ao Estado uma carga considerável de exigências sociais, pois, mais que proclamar direitos e garantias, era necessário dar pronta resposta às tutelas para o exercício da cidadania, mostrando-se mais simples e eficaz. Colabora nesta lição o posicionamento do doutrinador Cândido Rangel Dinamarco [55] a respeito do processo extrajudicial:

A primeira característica dessas vertentes alternativas é a ruptura com o formalismo processual. A desformalização é uma tendência, quando se trata de dar pronta solução aos litígios, constituindo fator de celeridade. Depois, dada a preocupação social de levar a justiça a todos, também a gratuidade constitui característica marcante dessa tendência. Os meios informais gratuitos (ou pelo menos baratos) são obviamente mais acessíveis a todos e mais céleres, cumprindo melhor a função pacificadora. Por outro lado, como nem sempre o cumprimento estrito das normas contidas na lei é capaz de fazer justiça em todos os casos concretos, constitui característica dos meios alternativos de pacificação social também a delegalização, caracterizada por amplas margens de liberdade nas soluções não jurisdicionais (juízos de equidade e não juízos de direito, como no processo jurisdicional).

Denominado por alguns processualistas brasileiros como equivalentes jurisdicionais [56], a exemplo de Fredie Didier Jr., estas formas de atendimento às demandas sociais, como já esclarecido, não visam afastar o cidadão do Poder Judiciário, mas o de prevenir a perpetuação dos conflitos ou mesmo o de impedir sua deflagração.

A atuação da Administração Pública como instância legitimada para a tutela dos direitos assegurados na Constituição, adotando as técnicas de mediação e conciliação com vistas à realização da cidadania, indo além de sua mera proclamação, foi prestigiada por Capelletti & Garth, denominando-os de fórmulas governamentais de solução dos conflitos. [57] Como otifica do Judiciário, as medidas têm expandido o dever do Estado de defesa do cidadão quando em conflito, mesmo tendo como litigante uma de suas instituições.

Conhecidos no Brasil pela denominação Métodos Alternativos de Resolução de Conflitos (MARC), a mediação, conciliação e a arbitragem constituem técnicas procedimentais extrajudiciais que têm por objetivo compor os conflitos e administrá-los até sua extinção, através da realização de um acordo, obtendo-se ao seu final a pacificação.

A natureza do conflito irá determinar a melhor técnica a ser adotada na composição. Disputas familiares, comunitárias, comerciais, locatícias e as de relação de consumo, que versarem sobre interesses patrimoniais, são as espécies mais visadas e passíveis de solução.

Sem que se fuja ao interesse deste trabalho discorrer-se-á sobre os meios judiciais e extrajudiciais usuais para a resolução dos conflitos de consumo.

3.2 Os Meios de Solução do Conflito de Consumo

O processo é o instrumento adequado para o deslinde do litígio. Dele o Estado se utiliza para distribuir justiça, não importa a função que venha a cumprir. Os conflitos de interesses são essenciais para a evolução das sociedades, mas o Estado deve geri-lo e como as divergências estão onde estão os homens, o processo terá escopos judicial, legislativo ou administrativo.

De todas as múltiplas espécies de disputas humanas, a de cunho consumerista é a que releva neste estudo. Ficou assentado que os conflitos de consumo podem ser dirimidos nas vias administrativa ou judicial, pois ao Estado caberá a defesa do consumidor.

No processo judicial, o consumidor que se sentir lesado ou ameaçado de sofrer lesão pela conduta de um fornecedor de produto ou serviço no mercado de consumo poderá se valer da atuação do serviço jurisdicional dos Juizados Especiais Cíveis Federal e Estaduais ou pela Justiça Comum. O conflito de consumo se dá por heterocomposição. A tradicional triangulação espelha a atuação jurisdicional estatal.

Esquema 1: Componentes da Jurisdição:

Juiz

Consumidor Fornecedor

Por outro lado, no processo administrativo, poderá o consumidor se utilizar do serviço prestado pelas administrações públicas federal, estaduais e municipais que foram designadas para a promoção da defesa dos consumidores. Cumprem este mister o Departamento Nacional de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), órgão de cúpula do sistema legal de proteção ao consumidor, os órgãos públicos de defesa do consumidor (PROCONS) e as entidades civis que tenham igual finalidade. Haverá aqui um terceiro que não tomará o lugar das partes, mas que assumirá a atribuição de tentar conduzi-los a uma solução a partir do embate de suas vontades. Com isso, buscar-se-á a autocomposição do conflito. A feição do processo administrativo desta natureza terá a seguinte configuração:

Esquema 2: Componentes da Conciliação:

 

Percebe-se que os sujeitos do conflito permanecem em iguais posições de animosidade em ambos os processos. Outra semelhança está no elemento subjetivo: de início, ambos almejam a prevalência de sua pretensão e dela não querem abrir mão.

Entretanto, as diferenças são fundamentais. Na heterocomposição, o Estado substituirá a vontade dos contendentes, o que não ocorre na autocomposição, uma vez que o terceiro elemento apenas subsiste para auxiliar os conflitantes a extrair da composição de suas vontades a solução que traga mútua satisfação.

Estes meios são portas de acesso à Justiça, que visam eliminar a contenda. Para Walsir Rodrigues [58], as diferentes formas compositivas são válidas, não se excluindo, mas complementando-se:

Os métodos de solução de conflitos podem ser divididos em dois grandes grupos: os heterônomos e os autônomos. Os primeiros são assim denominados porque atribuem a um terceiro o poder de dizer a solução para o caso concreto. Pode-se realizar de duas formas: por meio do monopólio público-estatal que se efetiva pela Jurisdição estatal, no qual o Estado-Juiz decide coercitivamente ou por meio da designação privada, na qual o árbitro, escolhido pelas partes, aponta a solução para o conflito existente entre elas. No processo de conciliação, há a figura de um terceiro que funciona como um intermediário entre os litigantes. O objetivo da conciliação é o entendimento entre as partes, independentemente da qualidade das soluções ou da interferência na interpretação das questões e que comporta-se de modo imparcial, propondo, inclusive, soluções para o problema, auxiliando as partes envolvidas no conflito na busca de um acordo. (...) (grifo nosso)

Desta forma, a composição dos conflitos de consumo no Brasil assume duas posições na ordem jurídica estatal: será judicial ou extrajudicial.

A autocomposição judicial dos conflitos se dá por uma única razão: os contendores são livres para decidirem, sem a intervenção estatal, o resultado de seus desentendimentos. O Estado jamais poderá turvar este direito, posto que também não deseja a perpetuação da divergência entre os litigantes.

Com previsão nas normas processuais brasileiras, a autocomposição judicial, como já explicitado acima, pode se dar antes ou durante o curso da ação, constituindo dever do juiz velar pela rápida solução do litígio e tentar, em qualquer tempo, conciliar as partes. [59] Para Fredie Didier Jr. [60], a autocomposição é fator que afasta o Estado do monopólio da jurisdição para a resolução dos conflitos, quando afirma:

É a forma de solução do conflito pelo consentimento espontâneo de um dos contendores em sacrificar o interesse próprio, no todo ou em parte, em favor do interesse alheio. É a solução altruísta do litígio. Considerada, atualmente, como meio alternativo de pacificação estatal. Avança-se no sentido de acabar com o dogma da exclusividade estatal para a solução dos conflitos de interesses. Pode ocorrer fora ou dentro do processo jurisdicional.

Apesar do prestígio que goza o processualista, humildemente ousa-se discordar no ponto em que toma como um dos escopos da autocomposição acabar com o dogma da exclusividade estatal. A uma, porque a jurisidição é o espaço estatal de resolução de conflitos disponível a todo cidadão. Ela é inerte, não se imiscuindo nas pendengas dos indivíduos de forma policialesca. A duas, porque os meios alternativos de pacificação não subtraem do Estado sua legitimidade e função de composição de conflitos. Ao contrário, os MARC’s são, como explicitado, portas de acesso à ordem jurídica para a pacificação social, nada mais que isso. Ademais, nada impede que um acordo extrajudicial, não homologado pelo juiz, venha a ser submetido ao crivo do serviço jurisdicional.

Diversa é a visão do processualista Cândido Rangel Dinamarco [61] ensinando que:

Já a autocomposição, que não constitui ultraje ao monopólio estatal da jurisdição, é considerado legítimo meio alternativo de solução dos conflitos, estimulado pelo direito mediante as atividades consistentes na conciliação. De um modo geral, pode-se dizer que é admitida sempre que não se trate de direitos tão intimamente ligados ao próprio modo de ser da pessoa, que a sua perda a degrade a situações intoleráveis. (grifo nosso)

A despeito dos avanços já alcançados pelo Judiciário quanto à autocomposição judicial, os consumidores brasileiros ainda se valem dos órgãos de defesa do consumidor, os PROCONS, para intermediar os conflitos de consumo diante dos fornecedores de produtos e serviços, através da formulação da Reclamação.

Segundo informações do DPDC, foram realizadas mais de meio milhão de resolução de reclamações junto aos órgãos de defesa de todo o país no ano de 2009. [62] São demandas sociais decorrentes de conflitos de consumo que não chegaram às portas do Judiciário brasileiro, porque a Administração Pública, atendendo a um direito fundamental, promoveu o acesso à Justiça, orientando consumidores e fornecedores e, ainda, intermediando conflitos com vistas à pacificação social.

A autocomposição extrajudicial realizada pelo PROCON no Brasil, por meio da Reclamação, tem sido alvo de algumas críticas no que pertine à possível incompatibilidade de seu mister definido na Lei nº8.078/90 (CDC) e sua atuação de compositora dos conflitos de consumo. Seus críticos alegam que os órgãos de defesa do consumidor não podem compor conflitos, mas fiscalizar e impor sanções aos fornecedores, constituindo seu processo natureza punitiva e não harmonizadora.

Este posicionamento não se coaduna com os princípios estabelecidos no CDC nem com o sistema protetivo nele previsto. Linhas à frente demonstrar-se-á, através da explanação da atuação do PROCON do Estado do Pará, que à Administração Pública não cabe apenas o fazer cumprir as leis, mas também o de promover a justiça social pela harmonização dos conflitos de consumo.


4 A CONCILIAÇÃO NO PROCON-PA

No Brasil era premente a necessidade da criação de uma representação dos consumidores, tais como o Ombdsman do Consumidor (Conselho Público de Reclamações), da Suécia e das Comissões de Conciliação para Queixas dos Consumidores, da França, órgãos governamentais representativos dos interesses da coletividade dos consumidores.

Refletindo sobre as exigências sociais deste direito público de massa, abordam Capelletti & Garth [63]:

Os novos direitos substantivos das pessoas comuns têm sido particularmente difíceis de fazer valer ao nível individual. As barreiras enfrentadas pelos indivíduos relativamente fracos com suas causas relativamente pequenas, contra litigantes organizacionais – especialmente corporações ou governos – têm prejudicado o respeito a esses novos direitos. Tais indivíduos, com tais demandas, frequentemente não têm conhecimento de seus direitos, não procuram auxílio ou aconselhamento jurídico e não propõem ações.

Neste tópico refletir-se-á sobre a atuação do PROCON-PA como instância administrativa de composição e solução de conflitos de consumo entre consumidores e fornecedores de produtos e serviços, bem como seus limites e obstáculos que inviabilizam ou dificultam a missão constitucional de defesa dos interesses e direitos dos consumidores.

Constituindo uma das Diretorias da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH) [64] do Estado do Pará, o PROCON-PA é órgão interno da Administração Pública Direta, destituído de personalidade jurídica.

Discorrendo sobre a estrutura da Administração Pública, ensina o administrativista José dos Santos Carvalho Filho [65] que se pode conceituar o órgão público como o compartimento na estrutura estatal a que são cometidas funções determinadas, sendo integrado por agentes que, quando as executam, manifestam a própria vontade do Estado.

Nesse sentir, o PROCON-PA é órgão administrativo interno componente da estrutura do Poder Executivo do Estado do Pará, por meio da SEJUDH e, embora destituído de personalidade jurídica, não perde sua autonomia para promover a defesa do consumidor no âmbito de sua circunscrição.

O fato de o DPDC ser órgão interno do Ministério da Justiça não significa que consequentemente todos os órgãos oficiais estatais ou municipais de defesa do consumidor devam compor semelhante estrutura. Os órgãos de defesa do consumidor no Brasil ocupam posições diversas na estrutura de cada Federação. Assim, o PROCON do Estado do Espírito Santo [66], por exemplo, compõe o quadro da Administração Pública Indireta da Federação, na qualidade de autarquia.

Abrigada no corpo de qualquer instituição estatal não-juridicional, o PROCON é órgão estatal de iniciativa direta dos governos componentes das Federações, constituindo um dos princípios da Política Nacional das Relações de Consumo, conforme preconizado no Artigo 4º, inciso I, alínea "a", do CDC.

Ao acolher o PROCON-PA em sua estrutura interna, a SEJUDH assumiu entre suas finalidades institucionais a formulação, coordenação e execução da Política Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, e em consonância com as diretrizes nacionais, capitaneadas pelo DPDC-MJ [67].

Dentro desta configuração, é de se perguntar quem teria legitimidade para titularizar a ação coletiva de consumo, se o Governo do Estado do Pará ou o PROCON-PA. Ambos concorrentemente são capazes para ocupar o polo ativo da ação. Conforme autorizado pelo Art. 82, incisos II e III, do CDC, tanto o Estado do Pará, por meio da SEJUDH, quanto o PROCON-PA, órgão interno de sua estrutura, pode demandar em juízo na defesa dos consumidores.

De fato, a norma em tela espanca qualquer dúvida. O Prof.º Rizzatto Nunes [68], ao versar sobre a legitimidade concorrente explica:

A norma protecionista estabeleceu que o exercício do "direito de ação" devia ser conferido a certos entes de maneira concorrente, isto para conferir maior garantia possível de proteção aos direitos por ela definidos. A pretensão legal é a de não privilegiar nenhuma entidade em especial, seja ela pública ou privada, na permissão para o ingresso das ações, visando dar a maior eficácia possível à proteção criada. (grifo nosso)

Reforça este entendimento a norma do Artigo 105, do CDC, ao informar que os órgãos federativos e as entidades privadas de defesa do consumidor integrarão o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC).

Definido o escopo legal e estrutural do PROCON-PA, partir-se-á para discorrer sobre os mecanismos administrativos pelos quais o órgão concretiza a defesa do consumidor.

4.1 A Reclamação

Instituído pelo Decreto Federal nº2.181/97, que organiza o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) e estabelece as normas gerais de aplicação de sanções administrativas previstas no Capítulo VII do CDC, a reclamação constitui o instrumento de abertura do processo administrativo em desfavor do fornecedor, [69]e que poderá resultar em aplicação de sanção estatal, realizada a partir de um ato de vontade do consumidor.

Em matéria constitucional, a reclamação é o exercício do direito de petição, insculpida no Artigo 5º, inciso XXXIV, alínea "a", da Constituição Cidadã de 1988 para a defesa de direitos ou contra a ilegalidade ou abuso de poder. Em síntese, preleciona o constitucionalista Dirley da Cunha Jr. Que o direito de petição afigura-se mais propriamente como uma garantia constitucional de defesa de direitos, destinada a reivindicar dos poderes públicos a proteção de direitos. [70]

Também colaborando com esta definição, ensina Nelson Nery Costa [71]:

O direito de petição pode ser definido como aquele que tem por objetivo apresentar um pleito de interesse pessoal ou coletivo, visando com tal medida ao interesse público. Trata-se, então, do direito que pertence a uma pessoa de invocar a atenção dos Poderes Públicos sobre uma questão ou situação determinada, servindo tanto para denunciar uma lesão concreta, como para pedir que seja revisto certo ato. (grifo nosso)

Das lições apresentadas se depreende que a reclamação se ajusta com adequação como petição administrativa na defesa de direitos do consumidor.

A prática cotidiana dos atendimentos realizados pelo PROCON no Estado do Pará tem revelado que os consumidores, ao buscarem a tutela administrativa de suas pretensões consumeristas, não manifestam interesse de provocar a sanção estatal contra o fornecedor do produto ou serviço, traduzida na simples aplicação de multas e inscrição de seu nome no Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. O que se tem verificado é que a coletividade dos consumidores tem almejado do PROCON-PA atuação no sentido de intermediar a relação conflituosa de consumo com vistas a resgatar o bem violado ou sob ameaça de lesão.

Desta feita, o processo administrativo construído a partir do procedimento reclamatório, tem se prestado mais apto à resolução dos conflitos que propriamente à simples aplicação de medida sancionatória contra o fornecedor, que, raras vezes, tem de fato coibido condutas infrativas reiteradas dos fornecedores no mercado de consumo.

Atento a estes anseios dos consumidores, o legislador já previu a resolução administrativa de conflitos de consumo, ao dispor na definição da Política Nacional das Relações de Consumo o seguinte:

Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(...)

(...) III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, CF), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Dentro desta perspectiva, o processo administrativo reclamatório não terá caráter sancionatório se, antes, não se constituir em instrumento de pacificação social nas relações de consumo.

O nominado Decreto Federal nº2.181/97, no que pertine ao processo administrativo de consumo, também previu sua instrumentalidade pacificadora quando prescreve:

Art. 4º No âmbito de sua jurisdição e competência, caberá ao órgão estadual, do Distrito Federal e municipal de proteção e defesa do consumidor, criado, na forma da lei, especificamente para este fim, exercitar as atividades contidas nos incisos II a XII do art. 3º deste Decreto e, ainda:

II – dar atendimento aos consumidores, processando, regularmente, as reclamações fundamentais;

III – fiscalizar as relações de consumo;

IV – funcionar, no processo administrativo, como instância de instrução e julgamento, no âmbito de sua competência, dentro das regras fixadas pela Lei nº 8.078, de 1990, pela legislação complementar e por este Decreto;

Combinando-se as normas, denota-se que ao instituir o SNDC, o ato normativo pretende que o processo administrativo não criará óbices para que o consumidor dele se utilize para a reparação de seu direito. Ademais, é seu direito básico, prescrita no Artigo 6º, inciso VII, do CDC, o acesso aos órgãos administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos que venha a sofrer nas relações que travar com o fornecedor.

O fornecedor de produtos e serviços, ao ser demandado no PROCON-PA pelo consumidor, poderá promover a resolução imediata da reclamação ou por meio do Processo de Reclamação. Terá então duas oportunidades para atender ao conflito de consumo, se fundamentada a pretensão do consumidor.

Para uma ideia mais real do impacto social da importância da atuação do PROCON no Brasil, o Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), divulgou que foram realizadas e atendidas 812.471 queixas dos consumidores no período de 01.09.2009 a 31.08.2010, como observa no gráfico abaixo:

Gráfico 2. Volume de Atendimento às Petições Administrativas e de Reclamações:

Fonte: CADASTRO NACIONAL DE RECLAMAÇÕES FUNDAMENTADAS 2010-DPDC/MJ

Esses dados demonstram que a tutela dos direitos difusos, preconizada por Capelletti & Garth, realizada pelo PROCON, tem de alguma forma, contribuído para a realização da justiça, numa acepção mais ampla do termo e condizente com a terceira onda renovatória de acesso à justiça.

O volume de atendimentos registrados por estes dados exprimem as demandas no plano individual apenas, posto que o DPDC ainda não avaliou e compilou em suas pesquisas estatísticas o volume das intermediações no plano coletivo.

A dificuldade de se chegar a estes dados, que expressem a defesa em âmbito coletivo, se justifica pelo baixo índice de atividades administrativas e judiciais dos PROCONS nesta seara. Este fato será apreciado mais adiante, mas antecipe-se desde já que constitui uma das fragilidades do sistema protetivo consumerista no Brasil.

Valorizando a atuação dos órgãos governamentais como de extrema relevância social e mencionando a notoriedade dos Conselhos Públicos de Reclamações da Suécia e das Comissões de Conciliação para Queixas dos Consumidores da França, equivalentes do PROCON no Brasil, comentaram os renomados processualistas [72]:

O Conselho Público de Reclamações resolve com muita presteza e praticamente sem custos as reclamações. Ele se notabiliza por sua habilidade em usar sua experiência tanto para auxiliar os consumidores informalmente quanto para examinar imparcialmente as disputas dos consumidores, as quais podem ser muito complexas e altamente técnicas. Mesmo que suas decisões não sejam obrigatórias, tem havido plena aceitação delas em pelo menos 80% dos casos. A aceitação é estimulada pela publicação de uma "lista negra" dos empresários que deixam de atender às decisões dentro do prazo de seis meses.

É inconteste que se o processo administrativo se prestasse tão somente para a aplicação de sanções aos reclamados, pouco ou nenhum benefício imediato alcançaria o consumidor ao fazer uso do direito de petição ao PROCON-PA.

Embora não disciplinado em lei ou ensinamentos doutrinários, constituem atributos do processo administrativo de consumo a simplicidade, a celeridade, a informalidade, a confiabilidade e o empoderamento das partes. Este último atributo significa que a solução do conflito depende da livre manifestação da vontade dos contendores.

4.2 A Conciliação

A adoção do método da conciliação como alternativa de harmonização do conflito nas relações de consumo no curso do processo reclamatório do PROCON-PA vai além da simples busca de um acordo, estabelecido formalmente entre consumidor e fornecedor, na presença do poder público.

Nas audiências conciliatórias, consumidor e fornecedor têm a oportunidade de receber orientação e educação quanto aos limites de seus direitos e obrigações, pois o órgão tem se especializado em dirimir os conflitos de consumo e neste mister acumulou relevante capital de conhecimentos.

Porém, é prudente salientar que, no Brasil, não se confunde a conciliação com a mediação, posto que constituem técnicas procedimentais distintas. Tratando desta matéria, elucida Carlos Eduardo de Vasconcelos [73] que a conciliação é um modelo de mediação focada no acordo, estando apropriada para lidar com relações de consumo, equacionando interesses materiais.

Contribui com esta distinção a especialista em Psicologia Jurídica, Eliana Riberti Nazareth [74], ensinando que a conciliação é a mediação dirigida para o acordo:

É baseada no modelo desenvolvido pelo Programa de Negociação (PON, em inglês) da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Tende a focalizar as questões mais aparentes dos conflitos e buscar soluções práticas. Portanto, costuma privilegiar o que denominamos "posições" das partes. As questões de ordem subjetivas e emocionais não costumam ser abordadas. É o modelo que mais se assemelha ao nosso modelo de conciliação.

O processualista Walsir Edson Rodrigues Jr. [75] Ensina que a conciliação distingue-se da mediação por conferir ao seu intermediador determinado poder decisório, ausente na composição pela mediação.

Em distinção às técnicas, leciona Cândido Rangel Dinamarco [76] que a mediação trabalha o conflito, constituindo o acordo mera decorrência, objetivo fundamental da conciliação.

Das lições prestadas pelos estudiosos conclui-se que suas percepções não são dissonantes, pois distinguem a mediação da conciliação, conferindo a esta última uma atuação mais pragmática e que mais se aproxima da atuação jurisdicional.

O PROCON-PA se utiliza da técnica da conciliação como meio autocompositivo de pacificação dos conflitos de consumo, cujas razões serão expostas em tópico oportuno.

Nos seus movimentos internos de conciliação, o PROCON-PA busca evidenciar as qualidades da resolução imediata do conflito para os contendores e de que a solução por eles construída é mais salutar que aquela decidida por um terceiro, com poder para dizer o direito.

Abordando este tema da conciliação, afirmaram Capelletti & Garth [77]:

Existem vantagens óbivas (sic) tanto para as partes quanto para o sistema jurídico, se o litígio é resolvido sem a necessidade de julgamento. A sobrecarga dos tribunais e as despesas excessivamente altas com os litígios podem tornar particularmente benéficas para as partes as soluções rápidas e mediadas, tais como o juízo arbitral. Ademais, parece que tais decisões são mais facilmente aceitas do que decretos judiciais unilaterais, uma vez que eles se fundam em acordo já estabelecido entre as partes. É significativo que um processo dirigido para a conciliação – ao contrário do processo judicial, que geralmente declarar uma parte "vencedora" e a outra "vencida" – ofereça a possibilidade de que as causas mais profundas de um litígio sejam examinadas e restaurado um relacionamento complexo e prolongado. (grifo nosso)

Na prática processual administrativo-consumerista, uma vez não obtida a resolução imediata pelo fornecedor, o consumidor pode peticionar ao PROCON que se utilize da técnica da conciliação para que torne a se manifestar quanto à sua pretensão e com a intermediação do conciliador.

Ao buscar a composição administrativa do conflito de consumo, o consumidor não deseja litigar em juízo, porque não pretende ver o conflito se arrastar por mais tempo e obter da melhor forma possível a satisfação de seu interesse violado.

Para o fornecedor reclamado, a conciliação consistirá numa porta de acesso, uma oportunidade para atender à demanda do consumidor evitando-se sua rediscussão em âmbito judicial, podendo obter ao fim do processo custos menores de resolutividade e ao mesmo tempo evitar a aplicação de multa administrativa.

Tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, a adoção do método alternativo de resolução de conflito, pela conciliação no PROCON-PA, previne a perpetuação da disputa e os desgastes que ela acarreta.

O conciliador deverá ser o instigador da extinção do conflito, podendo fazer proposições quanto às pretensões resistidas, orientando o consumidor sobre seus direitos e ponderando junto ao fornecedor as melhores formas de atendimento à demanda do consumidor e das desvantagens de um futuro lítigio judicial, além de se mostrar passível à imposição de sanções pelo órgão.

Sua postura jamais poderá resvalar para a intimidação do fornecedor, sob o argumento de que o PROCON é órgão de defesa do consumidor. Portando-se desta forma, a conciliação perde sua razão de ser e frustra a possibilidade da solução pela via administrativa, empurrando-se o consumidor para litigar em juízo.

Em Instrução Normativa nº01/1999, o renomado civilista paraense Zeno Veloso, então Secretário de Justiça, reforçava o escopo resolutório de conflitos de consumo do processo de reclamação, antecedente à sua função sancionatória. Esta sua percepção do alcance social do processo administrativo foi acompanhada pelo Decreto Estadual n°1.602/09, que preconiza em seu Artigo 30, inciso I, que caberá à Divisão de Conciliação do PROCON-PA receber e analisar processo buscando solução para os casos e realizar audiências de conciliação entre consumidores e fornecedores.

4.3 A Defesa Individual e Coletiva

A sociedade de consumo engrendra litígios de massa e a atual estrutura da administração judiciária brasileira, como demonstrado ao longo deste breve estudo, não tem condições suficientes para promovê-los com qualidade e celeridade esperadas.

Maiores dispêndios orçamentários para robustecer sua burocracia e a contratação de maior número de julgadores e serventuários em muito colaboram para contornar este estado de coisas. Também, o emprego de modernas tecnologias no tratamento e tráfego da informação judicial, pode contribuir para promover maior celeridade à prestação jurisdicional. Até que se atinja este patamar ideal, alternativas devem ser experimentadas.

Conforme abordado no transcorrer deste estudo, a Administração Pública, no exercício de sua função executiva, abre suas portas para prevenir conflitos e solucioná-los por meio da utilização das técnicas procedimentais alternativas no bojo de seu processo.

Os PROCONS do Brasil têm feito uso de seus processos administrativos para orientar consumidores e fornecedores quanto aos seus direitos e deveres nas relações que firmam no mercado de consumo.

Ainda que o Decreto nº2.181/97 estabeleça que o processo administrativo do PROCON consista em veículo para apurar práticas infrativas [78] dos fornecedores, não há impedimento legal para que possa também oportunizar ao fornecedor abertura para a apresentação de resposta satisfativa de interesse do consumidor.

Da mesma forma que o processo judicial deve cumprir a função social de tutelar o direito aos que dele se socorrem, assim o processo administrativo consumerista não tem o condão de se transformar num labirinto kafkaniano, demonizando o fornecedor e frustrando o consumidor, conduzindo-o às portas do judiciário, reduzindo o processo administrativo a um mero instrumento para aplicação de multas.

Em outras palavras, o processo administrativo consumerista deve ter como premissa básica intermediar os conflitos de consumo com vistas à pacificação social. Portanto, o procedimento sancionatório em seu curso será decorrência da resistência injustificada do fornecedor de reparar o defeito ou o vício do produto ou do serviço posto à disposição do consumidor.

Delimitando o conceito do processo para a Administração Pública, leciona o Prof.º José dos Santos Carvalho Filho que o processo é indicativo das relações jurídicas entre seus participantes, assumindo natureza teleológica e valendo como instrumento para alcançar os fins visados pela Administração. [79]

Em sintonia com este entendimento, o processo administrativo de consumo sob os cuidados do PROCON-PA deve cumprir seu objetivo de conferir proteção e defesa dos consumidores que dele buscam resposta para a satisfação de seus interesses. Em petição, o consumidor requer do PROCON-PA a representação coletiva na defesa de seu direito no plano individual.

Em toda a sucessão dos procedimentos administrativos que lhe dão feição, o consumidor descreve o prejuízo a que fora lançado pela conduta do fornecedor, que entende indevida, e, por sua vez, o fornecedor apresenta defesa pela qual informa os elementos fáticos e jurídicos que o levaram a conduzir-se de tal ou qual modo.

Da apreciação dos fatos narrados e das provas demonstradas pelos contendentes, o PROCON-PA classificará a reclamação como fundamentada ou não-fundamentada, equivalente ao juízo de admissibilidade realizado no âmbito judicial.

Ao receber do consumidor a informação de que sua reclamação é pertinente, orientado quanto aos seus direitos e o modo como deve proceder diante do fornecedor, o PROCON-PA poderá instaurar procedimento sancionatório, após apreciação da resposta do fornecedor, conferido seu direito à ampla defesa e contraditório, ou perquirir do consumidor se este tem interesse na tentativa de resolução do conflito, através do procedimento da conciliação, com a intermediação do PROCON-PA junto ao fornecedor em audiência ou sessão oportunamente agendada.

Se o consumidor decidir pôr fim ao conflito em juízo, o processo inaugurará fase punitiva em desfavor do fornecedor. Caso tenha interesse em compor o conflito pela conciliação administrativa, o processo seguirá seus atos com vistas à obtenção de acordo que encerre e restaure a harmonia na relação jurídica de consumo.

É senso comum entre os consumidores que um conflito de consumo que se instala com o fornecedor em razão de certo vício de um produto, como seu inadequado funcionamento, e não reconhecida sua responsabilidade, não deve ser apresentado ao judiciário, porque entende que este deve se ocupar de litígios caros e de maior valor jurídico, a exemplo de um defeito do mesmo produto que venha a causar prejuízos mais relevantes. Esta equivocada percepção até soaria verídica sob a batuta do Estado Liberal, mas o fato é que no curso das audiências de conciliação conduzidas por este acadêmico, os relatos dos consumidores reforçam resquícios de sua permanência no inconsciente coletivo dos consumidores, notadamente, aqueles maiores de 30 anos.

Neste respeito, observe-se o gráfico que segue, elaborado pelo SINDEC-MJ, traçando o perfil dos consumidores que reclamam e peticionam ao PROCON sua representação coletiva em defesa de direitos.

Gráfico 2. Perfil do Consumidor Individual sob a relação Área x Faixa Etária entre 2005 e 2010:

Fonte: www.mj.dpdc/sindec.2010.

O gráfico também revela que os consumidores maiores de 50 anos de idade são os que mais reclamam contra os fornecedores prestadores de serviços de saúde e de assuntos financeiros no País. São consumidores que almejam do PROCON orientação, defesa e resolução de seus conflitos de consumo.

Traduzem os dados ainda que os consumidores com faixa etária entre 30 e 50 anos são os que mais buscam a tutela do PROCON no Brasil. São indivíduos que vivenciaram as mínimas políticas públicas adotadas pelo Estado fundado nas ideias de não-intervencionismo.

Muito embora o PROCON-PA tenha por missão institucional promover a representação coletiva dos consumidores no mercado de consumo, sua atuação tem sido restrita à proteção ao nível individual.

Todos os dias centenas de consumidores batem à porta do órgão estadual para reclamar da conduta de fornecedores que lhe tenham causado alguma espécie de dano ou então para realizar simples consulta quanto aos seus direitos.

É óbvio que esta demanda individual será processada e atendida, porém urge a necessidade da adoção de ferramentas de maior amplitude para abarcar o maior número de situações e evitar o aparecimento de conflitos ou a repetição dos já existentes.

Os dados abaixo expressam o volume de ações de defesa dos consumidores no âmbito do DPDC nos anos de 2009 e 2010:

Gráfico 3. Volume de Demandas Individuais:

Fonte: Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. 2009.DPDC/MJ.

Chama a atenção que, se no plano individual o índice de sucesso na pacificação de conflitos realizados pelos PROCONS do Brasil tem evitado a formação de litígios judiciais, constituindo uma porta de acesso à Justiça, no sentido aqui adotado, é certo que a atuação coletiva trará resultados mais satisfatórios.

Os dados são reveladores quando se observa que mais de 85% das reclamações apresentadas pelos consumidores no PROCONS são prontamente respondidas de forma satisfatória pelos fornecedores reclamados, através do instrumento da Carta de Investigação Preliminar (CIP).

A inexistência deste procedimento prévio poderia impulsionar a deflagração de um grande volume de ações judiciais nos Juizados Especiais contribuindo para amontoar e retardar ainda mais a prestação de serviços da Administração Judiciária no Brasil.

Indo mais a fundo quanto à importância social dos atos administrativos que consubstanciam a defesa do consumidor pelos PROCONS, observe-se a Tabela abaixo, que exprime o elevado grau de resolutividade de conflitos de consumo.

Tabela 4. Demandas Individuais por procedimento:

Fonte: Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas. 2010.DPDC/MJ.

Dos dados acima, colhidos no ano de 2010, denota-se que mais de meio milhão de ações deixaram se ingressar no sistema judiciário na matéria de consumo.

No âmbito estadual, o cenário nacional se repete e até com maior efetividade. De acordo com os dados do exercício administrativo de 2010, o sistema de proteção do consumidor no Pará, registrou mais de 11.000 demandas de consumidores. O gráfico abaixo revela o reduzido número de conflitos não solucionados:

Gráfico 4. Volume de Atendimentos por Solução Imediata e Reclamação em 2010:

Fonte:Fonte:PROCON-PA/Coordenação de Atendimento e Orientação ao Consumidor.2010

A solução imediata constituiu o maior número de satisfações alcançadas pelos consumidores que buscaram a intermediação do PROCON-PA para a resolução de suas queixas dos fornecedores.

Do volume de Reclamações formuladas, no importe inferior a 30% das queixas dos consumidores, apenas 76 dos mais de 3.000 Acordos foram descumpridos pelos fornecedores, um índice de eficácia superior a 95%.

No entanto, apesar do sucesso alcançado até aqui, os acordos firmados e as otificas multas aplicadas sob a atuação processual em âmbito individual pelo PROCON-PA não têm sido capazes de causar uma mudança comportamental dos fornecedores de produtos e serviços no mercado com o escopo de diminuir as reiteradas práticas infrativas e lesivas aos interesses dos consumidores.

A realidade tem demonstrado que decisões judiciais e administrativas sancionatórias atualmente compõem o custo da política de riscos da atividade econômica dos fornecedores, de modo que o sentido pedagógico da sanção fora esvaziado em sua eficácia.

Outra questão que tem exigido do PROCON-PA maior efetividade no cumprimento da prestação constitucional de promover a defesa do consumidor é a limitação à defesa individual sem adoção da defesa coletiva em suas rotinas administrativas.

Embora reconhecida eficácia constitua um ganho social relevante para o sistema protetivo nacional, a adoção de procedimentos de defesa coletiva, tais como a Reclamação por Ato de Ofício e o Termo de Ajustamento de Conduta de Consumo, visa prevenir conflitos, na medida em que coíbem as práticas reiteradas dos fornecedores nas relações de consumo. Sua prática cotidiana traria como resultado a diminuição do número de demandas da sociedade.

A Reclamação por Ato de Ofício está prevista no Decreto nº2.181/97, que assim diz:

Art. 33. As práticas infrativas às normas de proteção e defesa do consumidor serão apuradas em processo administrativo, que terá início mediante:

I – ato, por escrito, da autoridade competente;

Ao constatar que certo fornecedor ou conjunto de fornecedores vem adotando certa prática comercial abusiva prejudicando os consumidores, a autoridade competente baixará ato de ofício notificando o fornecedor para prestar esclarecimentos sobre determinada prática.

Se os esclarecimentos prestados reforçarem a convicção de que o fornecedor não reconhece a abusividade de sua conduta no mercado de consumo, a autoridade poderá cientificá-lo de que o PROCON entende pela ilicitude de sua prática, apresentando-lhe o volume de queixas individuais dos consumidores lesados e cientificá-lo de que a continuidade de sua conduta estará passível de sanções administrativas.

Este procedimento administrativo constitui um ato de defesa coletiva, posto que o PROCON não se reporta ao consumidor individual, mas a todos os consumidores homogeneamente considerados que foram lesados quanto àquela situação fática, de origem comum. Eventual multa a ser aplicada, terá outros parâmetros de aferição em relação àquela relacionada à reclamação individual.

Por outro lado, se o fornecedor revê sua conduta e muda sua prática, a resolutividade alcançada terá atingido seu fim de prevenir os conflitos de consumo, resultando na diminuição de demandas no órgão.

Previsto no Decreto Federal nº2.181/97, o Termo de Ajustamento de Conduta de Consumo, permite também ao PROCON-PA promover a prevenção dos conflitos de consumo, ao firmar com o fornecedor compromisso para modificação de sua conduta infrativa reiterada.

Políticas dessa natureza, voltadas para o desenvolvimento de políticas ampliativas, com foco mais abrangente e com caráter preventivo, em detrimento do simples registro e encaminhamento de reclamações no plano individual, fará com que o PROCON-PA e os demais órgãos de defesa na circunscrição do Estado, bem como aos demais órgãos do sistema ofereçam ao consumidor uma resposta mais rápida e eficiente às suas demandas, evitando ainda que outros conflitos de igual natureza venham a replicar nas relações de consumo.

Este cenário permitirá ao órgão estadual otimizar e direcionar suas políticas de defesa em campanhas preventivas e orientativas para consumidores e fornecedores do Estado do Pará, o que reforçará a queda nas demandas individuais.

Esta perspectiva de atuação poderá refletir também na redução da pressão social de conflitos de consumo junto aos órgãos jurisdicionais do Estado, contribuindo para a pacificação social, que é o fim último dos poderes públicos e da sociedade.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho buscou-se pôr em evidência que o processo administrativo reclamatório conduzido pelo PROCON-PA para a apuração de condutas infrativas dos fornecedores no mercado de consumo pode também oportunizar a resolução dos conflitos de consumo, através da composição administrativa entre consumidores e fornecedores com a utilização das sessões ou audiências de conciliação.

As respostas dadas pelos consumidores e fornecedores aos questionários aplicados antes das sessões de conciliação demonstraram que os consultados alimentavam expectativas quanto ao possível acordo e resolução do impasse.

Na pesquisa ficou demonstrado que a totalidade dos consumidores e fornecedores alimentavam expectativas positivas para a resolução da Reclamação.

Também ficou comprovado que os consumidores, embora podendo obter a satisfação de seus interesses no Judiciário, viam no procedimento resolutório do PROCON um meio mais simplificado e célere que o adotado naquela esfera governamental. Os consumidores expressaram que objetivavam na Reclamação a resposta positiva de sua Reclamação e não a tão só aplicação de multas, percebendo o órgão como meio distinto do Judiciário.

Quando perguntados sobre a compatibilidade entre Reclamação e Resolução do Conflito, os Fornecedores também foram unânimes em apontar que os institutos são inteiramente compatíveis e que as audiências constituem um meio de efetivo acesso à justiça e à ordem jurídica pelo cidadão.

As respostas às questões suscitadas foram dadas sem divergências, tanto entre consumidores quanto entre fornecedores, demonstrando a inteira aceitação social do PROCON por consumidores e fornecedores e a unidade de sua percepção e compreensão de seu mister constitucional.

Enquanto os consumidores almejava obter do fornecedor resposta satisfatória ao seu pleito e evitar sua rediscussão em ambiente judicial, o fornecedor, de sua parte, esperava responder ao pedido do consumidor e de prestar os esclarecimentos ao PROCON de forma a solucionar o impasse, evitando a imposição de sanções administrativas e de ser demandado no Judiciário pelo consumidor.

Os dados estatísticos do DPDC (Departamento Nacional de Defesa do Consumidor), do PROCON-PA e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) refletem a sociedade marcada pela conflituosidade e ao mesmo tempo ansiosa pela resposta estatal, que ponha termo às animosidades.

Os números compilados pelo DPDC e pelo PROCON-PA apontam a grande porta aberta pelo Estado para que consumidores e fornecedores possam solucionar por eles próprios, as divergências oriundas do consumo massificado atual e sua prestimosa colaboração para a desjudicialização dos conflitos.

Na mesma oportunidade em que cumpre seu mister constitucional de promover a defesa do consumidor, o PROCON-PA também colabora para a pacificação social, objetivo maior do Estado Democrático de Direito.

A conciliação, em âmbito administrativo, tem sido uma prática aceita pela sociedade e que vem sendo incorporada nas rotinas de muitos espaços públicos e, inclusive, tem sido incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com o slogan "Conciliar é Legal" [80], para que os tribunais brasileiros possam promover a referida desjudicialização dos conflitos sociais.

O referencial teórico proposto, a partir das contribuições do Relatório de Florença, desenvolvidos pelos processualistas Mauro Cappelletti e Bryant Garth, cunhadas sob a expressão acesso à justiça, constituiu o pano de fundo que traduziu e ressignificou o objeto deste trabalho, qual seja, a compreensão de que a utilização da conciliação como procedimento administrativo para a composição do conflito de consumo no PROCON-PA busca promover a pacificação social.

Mas há a necessidade de que o PROCON-PA passe a se utilizar também de instrumentos de abrangência coletiva para a prevenção e resolução dos conflitos de consumo, em âmbito administrativo, a exemplo da Reclamação por Ato de Ofício, bem como dos Termos de Ajustamento de Conduta de Consumo (TACC), ambos previstos no Decreto Federal nº.2181/97.

Estes instrumentos administrativos permitirão ao PROCON-PA uma atuação à altura da atribuição que lhe fora conferida histórica e legalmente pela sociedade e pelo Estado brasileiro.


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APÊNDICE A

QUESTIONÁRIO 1

AO CONSUMIDOR

1-Você já ouviu dizer que no PROCON sua Reclamação será atendida?

( ) Sim

( ) Não

2-Você buscou o PROCON porque:

( ) A Justiça é cara e demorada, mesmo através do Juizado de "Pequenas Causas".

( ) O PROCON me defende quando eu necessitar.

3-O que você espera da audiência de conciliação no PROCON?

( ) A solução da minha Reclamação.

( ) Que a "Empresa" (Fornecedor) seja multada, mesmo que atenda à minha Reclamação.

4-Para você, o que é o PROCON?

( ) Um órgão da Justiça que defende o consumidor.

( ) Um órgão da Administração Pública que defende o consumidor.

APÊNDICE B

QUESTIONÁRIO 2

AO FORNECEDOR

1-Você já ouviu dizer que no PROCON a Reclamação do consumidor será atendida?

( ) Sim

( ) Não

2-Em sua opinião, a Reclamação feita no PROCON tem se mostrado um instrumento útil para o Fornecedor?

( ) Sim

( ) Não

3-Para você, a audiência de conciliação se mostra compatível com as atividades do PROCON?

( ) Sim

( ) Não

4-Em sua opinião, a tentativa de conciliação realizada pelo PROCON constitui meio de acesso à justiça pelos consumidores e fornecedores?

( ) Sim

( ) Não


Notas

  1. Art. 81 e 107, da Lei n º8.078/90.
  2. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo: Saraiva, 2007, p.53.
  3. BITTAR, Eduardo C. B.; DE ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 2008, p.37.
  4. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo: Saraiva, 2007, p.122.
  5. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. São Paulo: LTR, 2008, p. 90.
  6. Disponível em: www.un.org/documents/ga/res/39/a39r248.htm Acesso em: 02.11.2011.
  7. NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 82.
  8. Ibidem, p.116.
  9. Art. 5º, Inciso XXXII- o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor. CF/1988
  10. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial- direito de empresa. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.179.
  11. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo>. Acesso em 31.10.2011
  12. NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 43.
  13. Art. 2º, § Único; Art.17; Art. 29, CDC.
  14. Disponível em: <http:www.stj.gov.br/portal_stj/publicação>. Acesso em 31.10.2011.
  15. Resp 541.867-BA, Disponível em: <http:www.stj.gov.br/portal_stj/publicação>. Acesso em: 31.10.2011.
  16. MORAIS,Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; CARAZAI, Marcos Marins. Código de Defesa do Consumidor Comentado.,São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p.73.
  17. MORAIS,Ezequiel ;PODESTÁ, Fábio Henrique; CARAZAI, Marcos Marins. Código de Defesa do Consumidor Comentado.,São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 157.
  18. MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; CARAZAI, Marcos Marins. Código de Defesa do Consumidor Comentado.,São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 51.
  19. STF, ADI 319 QO-Mins. Moreira Alves, Julg. em 03.03.1993, DJ: 30.04.1993.
  20. VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. São Paulo: Método, 2008, p. 19.
  21. Art. 12, § 1º, CDC.
  22. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 26.
  23. BARZOTO, Luís Fernando. Justiça Social - Gênese, estrutura e aplicação de um conceito, 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_48/artigos/ART_LUIS.htm. Acesso em: 02.11.2011.
  24. CUNHA JR., Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed. Salvador: JusPodvum, 2011, p. 601.
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  27. Balanço Social do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br>. Acesso em: 25.09.2011.
  28. NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 782.
  29. CAPPELLETTI ,Mauro; GARTH, Bryant. (Trad. Ellen Gracie Nothfleet). Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002.
  30. VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. São Paulo: Método, 2008, p. 44.
  31. Lei nº9.099/95, Art. 3º.
  32. Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do Art. 5º, LXXIV. CF/88.
  33. Disponível em: < www.anadep.org.br/biblioteca> Acesso em: 21.09.2011.
  34. CAPPELLETTI ,Mauro; GARTH, Bryant. (Trad. Ellen Gracie Nothfleet). Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002.
  35. Art. 1º, Lei 4.717/65; ACP Art. 1º, IV , Lei n°7.347/85.
  36. 5ª Audiência Pública para a Atualização do Código de Defesa do Consumidor. www.senado.gov.br.
  37. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: I – o Ministério Público; II – a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; III – as entidades e órgãos da administração pública, direta e indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código; IV – as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código, dispensada a autorização assemblear.
  38. Comissão de Juristas responsável pela atualização do CDC. Vide Anexos.
  39. CAPPELLETTI,Mauro;GARTH, Bryant. (Trad. Ellen Gracie Nothfleet). Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002, pp. 49-50.
  40. Departamento de Pesquisa Judiciária-DPJ-CNJ. Disponível em: <http//:www.cnj.jus.br> Acesso em: 15.09.2011.
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SALDANHA, Celso de Jesus Pereira. A conciliação no PROCON/PA: um meio alternativo para a resolução do conflito nas relações de consumo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3118, 14 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20863. Acesso em: 10 maio 2024.