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Considerações acerca da denominada desaposentação

Considerações acerca da denominada desaposentação

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Defende-se que o STF julgue inconstitucional a possibilidade de desaposentação, tendo em vista a análise dos institutos da renúncia e da desistência, dos direitos fundamentais e dos precedentes jurisprudenciais.

1-                 Introdução:

A presente reflexão visa contribuirpara a questão relacionada à desaposentação, a qual deverá ser examinada de forma definitiva pelo E. Supremo Tribunal Federal como contraponto a tese de sua admissão pelo sistema jurídico atual, cuja única finalidade é contribuir para a discussão e a resolução da questão pela Corte Suprema.

Necessário se faz revisitar os fundamentos do sistema previdenciário, bem como alguns conceitos relativo a renúncia e desistência, bem como de direitos fundamentais e os precedentes que originaram parte da divergência hoje existente para que se possa apresentar conclusão acerca do tema.


2-                 O Sistema Previdenciário como direito social e as razões da cobertura de determinados eventos:

A concepção primáriado sistema previdenciário advém do pensamento  do Chanceler Alemão Otto Von Bismark, o qual idealizou um sistema através do qual se  garantia ao trabalhador o recebimento de auxílio estatal em caso de acometimento de incapacidade total de modo permanente ou transitório que impossibilitasse o trabalhador  de laborar, desde que o empregador e o trabalhador contribuíssem para o sistema.

As razões que levaram o conhecido chanceler alemão a instituir tal sistema são muito diversas daquelas que informam o atual sistema previdenciário, mas o esboçoda sistemática hoje adotada deriva daquele conceito de garantir ao indivíduo, que trabalhava e contribuía para o sistema,  o direito de receber o benefício naquele momento de  incapacidade.

A evolução do tema, no curso da história, acabou por ensejar o conceito de que o sistema previdenciário deveria abranger toda a população, a qual deveria, obrigatoriamente, contribuir para o sistema previdenciário universal.

Buscou-se, assim, as receitas necessárias paracobrir determinados riscos que poderiam abarcar qualquer uma das pessoas que compõe a sociedade, sendo esta a contribuição evolutiva de LordBeveridge, baseado nas ideias de um dos maiores economistas do mundo de todos os tempos,  John Maynard Keynes.  

Esta evolução permitiu a consolidação do entendimento de que ao Estado cumpria não só garantir os direitos individuais políticos e associativos, mas tambémde garantir aos indivíduos determinados serviços essenciais que ensejavam a atuação positiva do Estado de modo que deveria este realizar alguma conduta positiva para garantir tais prestações.

São os denominados direitos fundamentais de 2ª geração ou direitos sociais.

O Constituinte Originário de 1988, atento a esta gama de direitos, plasmou no art. 6º, da Constituição Federal, como direito social, a previdência social, o que é indisputável.

Necessário indicar que o direito socialestabelece a prestação do Estado de determinado elemento aos indivíduos, sendo certo que a prestação deve ser normatizada a fim de garantir o alcance  de tal prestação  aos indivíduos  da forma mais ampla e com a maior qualidade possíveis, além de admitir  a subdivisão de tal direito em possíveis subdivisões do direito à previdência social como no caso brasileiro, limitando-se a presente análise ao sistema geral de previdência social e quando necessário, suas intersecções com os demais sistemas.

Em vista destas circunstâncias, o legislador primário foi sábio, ante o período de instabilidade política e social atravessado pela Jovem República e até mesmo a natureza do povo brasileiro em não adequar-se à norma, mas de buscar adequar a norma ao seu estilo de vida, em consignar no Texto Maior, diversas diretrizes básica do direito previdenciário,embora muitas vezes criticado por isto.

Por este motivo, além dos princípios que regem a seguridade social previstos no art. 194, da Constituição Federal, quais sejam,:a universalidade da cobertura e do atendimento; a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; a seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; a  irredutibilidade do valor dos benefícios; a eqüidade na forma de participação no custeio; a diversidade da base de financiamento d  o caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados, estabeleceu um capítulo próprio destinado a ser observadas especificamente no que respeita à previdência social.

As diretrizes constitucionais do sistema previdenciário, que embora tenham sido levemente alteradas pela recente reforma previdenciária apresentada pela Emenda Constitucional n. 20\98 eEmendas Constitucionais ulteriores, foram mantidas praticamente intocadas e  indicam que o mesmo deve cobrir eventos de doença, invalidez, idade avançada, a maternidade, com especial proteção à gestante, proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário, a concessão de salário família ou auxílio reclusão aos segurados de baixa renda , a pensão por mote e a aposentadoria por tempo de contribuição, cuja filiação é obrigatória e depende da realização de contribuições e que existe a necessidade ser observado o equilíbrio atuarial, tudo nos termos do art. 201, da Carta Magna.

Denota-se, assim, que a diretriz do sistema previdenciário no âmbito constitucional estabelece quais os eventos que devem ser cobertos pela legislação que lhe der efetividade, mas em nenhum momento indica a forma como deverá ser promovida a garantia de atendimento a tais postulados.

Neste momento, é imprescindível compreender a razão para que seja providenciada a cobertura social das situações narradas no texto constitucional.

Em relação à doença e a incapacidade, a razão é evidente, desde o momento da idealização do sistema por Otto Von Bismark, eis que enquanto enfermo ou inválido , o indivíduo não tem como prover o seu próprio sustento, justificando-se a intervenção do sistema previdenciário junto àquele que é filiado e contribuinte ao sistema de modo a garantir-lhe o recebimento de determinado nível de renda estabelecido na legislação.

Domesmo modo a proteção à idade avançada decorre da compreensão que a partir de determinada idade a capacidade laborativa do indivíduo diminui consideravelmente ou mesmo reduz drasticamente  a sua possibilidade  de permanecer exercendo atividade laboral, razão pela qual o Estado vê-se premido a auxiliar o indivíduo que por conta da idade não possui condições ou em tese não possuiria condições, observada a média nacional, de permanecer exercendo atividade laboral.

Observe-se que a idade a partir da qual existe a presunção absoluta de incapacidade laboral a fim de que o Estado auxilie o indivíduo de idade avançada deve ser fixada pela legislação ordinária, porque tal elemento é mutável e deriva do aumento da expectativa de vida e da melhoria das condições tecnológicas e sociais aos indivíduos que lhe permitam permanecer produtivos por maior período de tempo.

No que respeita a proteção à maternidade, tem-se que esta situação reconhece a circunstância de que a mulher trabalhadora, durante determinado período de sua gestação,tem sua capacidade laborativa reduzida, seja porque a proximidade do momento de dar a luz requer especiais cuidados, seja porque após o nascimento da criança, esta requer especiais cuidados.

Neste período de reduzida capacidade laboral, deve o Estado auxiliar a gestante a fim de que a mesma tenha condições de gerar seu filho com tranquilidade.

Aliás, os especiais cuidados referentes à gestante são inclusive reconhecidos com a concessão da licença maternidade plasmado como direito social no art. 7º, inciso VIII, da Constituição Federal e que demonstra a especial relevância da proteção à maternidade.

Saliente-se, apenas,que a licença maternidade e a proteção previdenciária da maternidade embora questões conexas, tem-se que são situações distintas, eis que a licença maternidade cinge-se a direito oposto ao empregador, cujo pagamento sem labor pode se estender, ao passo que no salário maternidade tem o prazo indicado na lei previdenciária, que podem ser distintos, embora, por coerência deveriam ser estabelecidos pelo mesmo prazo como forma de ser garantida de forma mais efetiva a proteção à maternidade, sendo esta questão legislativa a ser examinada pelas instâncias próprias.

No que respeita à proteção ao trabalhador em desemprego involuntário,situação que é uma realidade na sociedade capitalista,  a proteção previdenciária decorre do próprio reconhecimento de que o desempregado involuntário é um risco de não ter condições de manter-se trabalhando por razões alheias ao mesmo, garantindo a sua subsistência.

Com relação à pensão por morte, o risco coberto remete ao falecimento do indivíduo e a situação de penúria que a ausência de sua remuneração ensejará ás pessoas que dependem do indivíduo economicamente.

A circunstância envolvendo o auxílio-reclusão aos dependentes do segurado de baixa renda tem por objeto garantir aos dependentes docontribuinte ao sistema, que mantenham determinada fonte de subsistência enquanto o contribuinte encontra-se preso e impedido de garantir o provimento da necessidade básica de seus dependentes.

A questão envolvendo o salário família remete ao auxílio estatal decorrente do aumento da família pelo nascimento de filhos do segurado e a necessidade de ser estabelecido auxílio de renda a fim de ser minorado os efeitos da redução de poder aquisitivo decorrente do ingresso na família de novo membro, limitado o auxílio àqueles que não possam garantir padrões mínimos fixados para a sobrevivência da família e a  manutenção de dependentes do indivíduo, cujos limites são fixados pela lei ordinária, posto que mutáveis.

A última circunstância protegida decorriado tempo de serviço, atualmente considerado como tempo de contribuição, mas cuja a concepção protetiva permanece a mesma.

Esta cobertura não é usual em alguns sistemas previdenciários e tem como base a consideração de que após determinado período de tempo de trabalho com a contribuição ao sistema, o indivíduo faz jus à prestação do Estado com vistas a que não seja mais necessário o trabalho.

Cinge-se a conceitoinovador que deriva do conceito de sistema de previdência privado em outros sistemas jurídicos e importado ao sistema  brasileiro na esfera pública e tem por escopo  garantir  ao indivíduo o gozo de benefício após determinado período de tempo de serviço de contribuição, considerando o valor das contribuições vertidas.

A descrição dos eventos cobertos é importante para que se compreenda que a ocorrência dos eventos podem ensejar a circunstância da compreensão do sistema da substituição da remuneração do indivíduo por tempo determinado, como são os casos relacionados àproteção à maternidade, ao salário-família, do desemprego voluntário, do auxílio-doença e  auxílio-reclusão, ou definitivos, nos casos dos eventos relacionados à incapacidade total e permanente, a idade, a pensão por morte, limitada em relação a alguns até que os mesmos não sejam mais considerados dependentes da fonte de renda, e ao tempo de contribuição.

Por esta razão, em relação aos riscos de natureza transitória, os benefícios tem natureza também transitória, e que em virtudede  fatos posteriores a sua concessão,  podem alterar as  condições em que foram deferidos, inclusive a limitação temporal.

Em relação às prestações de natureza permanente, estasnão estão sujeitas a limitação por fato posterior, salvo no que respeita a cura da incapacidade decorrente do avanço tecnológico da medicina.

Por se tratarem de prestações definitivas, o seu cálculo é efetuado no momento em que o benefício é devido, seja considerado o momento do óbito do indivíduo, seja a ocorrência da incapacidade total e permanente edo implemento da idade, do mesmo modo que a aposentadoria por tempo de contribuição e, anteriormente, a aposentadoria por tempo de serviço.

Saliente-se que em razão de tais riscos estarem cobertos pelo sistema, é vedado ao indivíduo utilizar-se dos mesmos fundamentos que ensejarem a concessão do benefício na forma geralem outro sistema previdenciário, eis que a concessão da prestação está fundada na implementação dos requisitos e se o Estado já cobriu os riscos, não existe risco descoberto a ser suportado por outra espécie de seguro social.

Aliás esta ilação decorre da própria consideração de que o risco já fora coberto em determinado sistema, impossibilitando a utilização do mesmo risco para a concessão de outro benefício já  coberto por prestação do Estado.

Por este motivo, o evento já coberto e protegidoatravés da efetiva prestação material no sistema geral de previdência social  não deve ser coberto por outro sistema previdenciário especial e vice-versa.


3-                 Distinção entre renúncia e desistência à prestação previdenciária

A próxima questão a serenfrentada é a distinção entre renúncia e desistência, sem que seja necessário adentrar à tormentosa ponderação acerca da possibilidade, ou não, do indivíduo renunciar a determinado direito social.

A ponderaçãode que, em qualquer caso que não  se deseje, voluntariamente,   a prestação pecuniária previdenciária  ocorre a renúncia, com o máximo respeito às teses lançadas pelos dignos doutrinadores, é  incorreta.

Relembre-se que a desistência remete apenas ao não exercício de um direito, resguardada a possibilidade do mesmo ser requerido posteriormente,e a renúncia, à impossibilidade de ser requerido tal  prestação em momento ulterior.

A renúncia ao direito de direito à prestação previdenciáriaenseja a consideração de que os fatos que deram ensejam ao direito e o próprio direito à prestação não podem ser exercidos em nenhuma esfera, isto porque, se o indivíduo renuncia à prestação previdenciária, não pode ter coberto o mesmo evento por outro benefício ou  sistema,  pois ao renunciar ao benefício, estaria renunciando à proteção previdenciária  em relação ao evento ocorrido, com a impossibilidade do aproveitamento do evento ocorrido para que fosse constatada a ocorrência de outro  evento no mesmo ou em outro sistema previdenciário.

A renúncia a direito social é controversa na doutrina, onde existem alusões à impossibilidade de renúncia a direito fundamental e social.

Ao revés, a desistência na percepção da proteção previdenciária indica que o indivíduo apenas não deseja a prestação previdenciária a que teria direito naquele momento, optando por utilizar o evento coberto por determinada prestação previdenciária de modo diverso, o que seria lícito, eis que não ocorreu renúncia ao direito da prestação previdenciária em relação ao evento, mas apenas a opção pelo não exercício do direito de exigir do Estado a prestação que teria direito.

Neste caso, a desistência à determinada proteção previdenciária remeteria apenas à sua não utilização, admitindo-se a existência do risco e a utilização do risco e dos elementos que ensejariam a prestação previdenciária para a obtenção de outra espécie de proteção, como ocorre em relação aos casos em queo indivíduo possui direito desde logo à aposentadoria por tempo de contribuição proporcional e opta pela na não utilização de tal direito, desistência,  com a permanência do labor até implementar os requisitos para a obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição total, ou mesmo entre a aposentadoria por idade não gozada e o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

Registre-se que se indica as situações em que o indivíduo tem direito a determinado benefício, mas não exerce tal direito com vistas a obter benefício mais proveitoso.

Este fato não é incomum no sistema e a possibilidade de desistênciaou  o não exercício é admitida tanto na teoria dos direitos sociais e fundamentais, sem controvérsia, e é prevista na própria lei previdenciária, ao estabelecer a impossibilidade de cumulação de determinados benefícios.

Em algumas ocasiõesocorre que a desistência imposta pelo sistema, plenamente aceitável, em relação ao  recebimento de uma de duas ou mais  prestações titularizadas pelo indivíduo, eis que o duplo seguro do risco  naquelas situações é considerado como contrário à própria razão da previdência social, que são exatamente as razões que impedem a cumulação de benefícios previstos no art. 124 e a disposição do art. 86, §2º, da Lei 8.213\91.

Anote-se que não existe nenhuma norma que indique a impossibilidade à desistência de um benefício em relação a outro.

A ilação de que a disposição do art. 18, §2º, da Lei 8.213\91 veda a desistência à aposentadoria é equivocada, até porque o citado dispositivo cuida apenas da vedação da cumulação de benefícios pelo indivíduo já aposentado e não da revisão ou modificação do ato concessório da aposentadoria.

Do mesmo modo, rejeita-se as teses muito difundidas de que existiria a renúncia ao direito de prestação previdenciário que somente seria admitido nos casos em que fosse possível a obtenção de direito prestacional mais proveitoso, porque tais assertivas possui a grave contradição de apontar a possibilidade de renúncia condicionada, quando a renúncia é ato próprio que não demanda a aceitação de quem quer que seja,  sendo certo que tal parcela da doutrina contradiz a sua própria fundamentação acerca da irrenunciabilidade de direito social, ao admitir a renúncia condicionada e utilizam o termo renúncia que a própria teoria indicada e assentada repeliria. 

Cingindo-se a desistência, o ato concessório cinge-se a elemento legal e eficaz até a desistência, motivo pelo qual válida a prestação previdenciária promovida até então, porque válida a relação desenvolvida, sendo desnecessária a devolução das prestações previdenciárias até então adimplidas pelo sistema, porque realizados no momento em que válida a relação prestacional que somente se encerrou pela desistência de se continuar a receber o benefício.

Feita esta consideração, necessário o exame da desistência voluntaria da proteção previdenciária em diversas situações.


4-                 Da possibilidade da desistência da proteção previdenciária de um sistema com vistas a perceber a proteção previdenciária em outro sistemaprevidenciário mais vantajoso:

A primeira situação e mais simplesde ser examinada remete à circunstância  em que o indivíduo   desiste da proteção previdenciária em determinado sistema para buscar a proteção qualificada do mesmo ou outro risco em outro sistema previdenciário mais benéfico.

Nesta situação, tem-se que a desistência da proteção previdenciária em um sistemacom obtenção de proteção previdenciária em outro sistema é possível, sendo admissível a comprovação do preenchimento de determinados elementos referentes ao risco coberto perante o outro sistema previdenciário, eis que as receitas relacionadas ao risco serão compensadas pelos diferentes sistemas, sendo esta uma das ilações autorizadas pelo art. 94, da Lei 8.213\91.

Considerando que nesta situação a desistência da proteção previdenciária não ensejará prejuízo ao sistema de proteção social, restandomantido o equilíbrio previdenciário,   que apenas repassará a respectiva contribuição ao sistema especializado, a pretensão de desistência da proteção em um sistema com o aproveitamento dos requisitos para a obtenção do risco em outro sistema é perfeitamente possível à míngua de qualquer proibição legal.

Não háque se falar em qualquer restituição ao valor da prestação previdenciária da qual ocorreu a desistência, porque a relação jurídica permaneceu hígida até o momento da desistência, mantendo-se a relação previdenciária que simplesmente se desfez pela desistência à obtenção da proteção previdenciária, cujos efeitos não são retroativos, mas, apenas perspectivos a partir do momento da desistência da prestação, sendo certo que a suas contribuições ao sistema serão repassadas ao novo sistema previdenciário para que aquele novo sistema obtenha os recursos necessários para fazer frente  à nova relação jurídica e a prestação previdenciária em favor do indivíduo ao qual estará vinculado. 


5-                 Da desistênciaà prestação previdenciária para a obtenção de outro benefício mais vantajoso em razão de outros riscos sociais no mesmo sistema previdenciário:

     Ao mesmo tempo, não se vislumbra qualquer impedimento à desistência deuma prestação previdenciária para a obtenção de outra prestação previdenciária no caso de serem os riscos previdenciários cobertos por cada uma das prestações distintos.

Isto porque malgrado possa existir incompatibilidade no recebimento de ambas as prestações previdenciárias, tem-se os riscos cobertos por cada uma das prestações previdenciárias remete a um risco previdenciário diverso e, observado que o indivíduo faz jus a mais de uma prestação previdenciária em vista de riscos previdenciários distintos, ainda que implementados em momentos distintos.

Esta possibilidade decorre do concurso de riscos previdenciários que devem ser protegidos, mas cuja proteção simultânea é vedada pelo sistema, o que não impede a opção pela proteção de apenas um dos riscos previdenciários.

Não háque se falar em qualquer restituição ao valor da prestação previdenciária da qual ocorreu a desistência, porque a relação jurídica permaneceu hígida até o momento da desistência, mantendo-se a relação previdenciária que simplesmente se desfez pela desistência à obtenção da proteção previdenciária, cujos efeitos não são retroativos, mas, apenas perspectivos a partir do momento da desistência da prestação, com a manutenção de apenas uma das prestações previdenciárias decorrentes da multiplicidade de riscos previdenciários que pode o indivíduo exigir a proteção estatal.


6-                 Da desistência à proteção previdenciária em relação a determinado risco previdenciário para a obtenção de prestação previdenciária mais benéfica em decorrência do mesmo risco previdenciário:

A questão mais complexa sobre o tema remete à situação em que o indivíduo pretende a desistência de determinada prestação previdenciária vinculada a determinado risco previdenciário para obter prestação mais benéfica em decorrência do mesmo risco previdenciário no mesmo sistema previdenciário.

A resposta a tal ponderação passa pela compreensão de do equilíbrio econômico-financeiro e atuarialdo sistema previdenciário e a salvaguarda de determinado risco previdenciário.

É cediço que o sistema previdenciário requer, para a sua manutenção, a observância do equilíbrio econômico-financeiro e atuarial, cuja forma de obtenção de recursos é indicada pelo texto constitucional e pelas normas infraconstitucionais, sendo certo que tais normas visam manter o equilíbrio econômico-financeiro e atuarial do sistema.

Neste momento, necessário indicar que o sistema previdenciário brasileiro cinge-se a sistemaprevidenciário de natureza contributivo e de repartição.

Como ensinamCarlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazari tal natureza do sistema previdenciário remete àquele em que “as contribuições sociaisvertem para um fundo único, do qual saem recursos para a concessão de benefícios a qualquer beneficiário que atenda os requisitos previstos na norma previdenciária. A participação do segurado continua sendo importante, mas a ausência de contribuição em determinado patamar não lhe retira o direito a benefício e serviços, salvo nas hipóteses em que se lhe exige alguma carência. Como salienta Feijó Coimbra,  este modelo repousa no ideal de solidariedade, no pacto de gerações – já que cabe a geração de trabalhadores pagar as contribuições que garantem os benefícios dos autuais inativos, e assim, sucessivamente (....) (in Manual de Direito Previdenciário, 12ª Edição, Editora Conceito, 2010, p. 62).

Ao mesmo tempo, o art. 195, da Constituição Federal estabelece as formas de custeio do sistema de seguridade social, nele incluída a previdência social, sendo certo que deve ser promovido o desconto da contribuição previdenciária de todo aquele queapresentar remuneração obtida com o trabalho do indivíduo, nos termos do inciso II, do referido dispositivo constitucional, permanecendo imunes ao pagamento de contribuição as prestações previdenciárias.

Saliente-se que a fonte de custeio do sistema não leva em consideração qualquer outra situação relativa à contribuição do indivíduo ao sistema que não o exercício de trabalho pelo mesmo.

Deste modo, desimportante para que se promova o custeio do seguro social que o indivíduo obtenha a prestação previdenciária em razão de determinado risco social, sendo certo que se o mesmo indivíduo além da prestação previdenciária, efetivar atividade laboralremunerada, sobre tal atividade deve incidir a contribuição ao sistema.

Por este espectro demonstra-se a desvinculação da contribuição ao fato do indivíduo perceber prestação previdenciária, estando vinculada ao exercício de alguma atividade laboral remunerada, sendo certo que sobre o valor da prestação previdenciária, até porque não se cuida de remuneração no sentido próprio da palavra, não incide a contribuição ao sistema.

Se a contribuição ao sistema deriva do exercício de atividade remunerada, persistindo o indivíduo que recebe a prestação previdenciária a perceber remuneração sobre trabalho efetivado, sobre o resultado de tal labor deve recair a contribuição ao sistema por expressa dicção do art. 195, inciso II, da Constituição Federal e do art. 12, §4º, da Lei 8.212\91.

Ao mesmo tempo, a disposição do art. 11, §3º, da Lei 8.213\91 estabelece que o aposentado que continuar laborando é automaticamente considerado como segurado obrigatório, o quedecorre do próprio princípio da filiação obrigatória de todo aquele que exerce atividade remunerada, salvo aqueles sujeitos a regime próprio de previdência social.

A questão primordial em relação à admissão da desistência da prestação previdenciária para aproveitamento de tal períodopara a obtenção de outra prestação previdenciária no mesmo sistema previdenciário e para o mesmo evento é especialmente tormentosa, eis que admissível a desistência de prestação previdenciária para a obtenção de prestação previdenciária referente a risco social distinto ou mesmo em sistema previdenciário distinto, o que poderia levar a conclusão de que quando se está diante do mesmo risco social no mesmo sistema previdenciário, a solução seria a mesma.

Contudo, a solução deve ser diversa quando se pretende outra prestação decorrente do mesmo risco social, posto que existem elementos que distinguem esta situação das demais.

Nas situações em que o risco social é diverso, o indivíduo submetido a uma situação de risco social e que diante de sua atividade remuneradaou de sua idade  e em momento posterior, vislumbra a possibilidade de risco social  diverso e que possui prestação previdenciária mais vantajosa, pode promover a opção pelo recebimento de prestação previdenciária que lhe seja mais vantajosa haja vista a submissão a dois riscos sociais inacumuláveis, com a desistência da obtenção da prestação previdenciária em relação a um dos riscos sociais.

No que respeita a desistência do recebimento de prestação previdenciária em um sistema para que se possa computar o período de contribuição àquele sistema junto a outro sistema previdenciário não existe qualquer óbice, pois ao indivíduo é facultado escolher qual prestação previdenciária entende ser mais vantajosa, aquela já obtida ou aquela que lhe será deferida em outro sistema previdenciário com o computo das contribuições vertidas para o atendimento a determinado risco social.

No caso em que se pretende a desistência de determinada prestação previdenciária para o computo da situação base para a obtenção de outra prestação previdenciária mais vantajosa em momento ulterior, tem-se que existe vedação sistêmica a tal procedimento.

Isto porque o sistema previdenciário visa conceder prestações a determinados riscos sociais ou previdenciários ao tempo em que solicitada a intervenção domesmo através de requerimento.

Reconhecendo o sistema a ocorrência do risco social, a prestação previdenciária deve ser aquela quando noticiado o risco social, não se permitido alteração da prestação pelo mesmo risco social apenas pela alteração fática dos pressupostos para a concessão da prestação e que não indiquem a alteração do risco social, posto que este já se encontra acobertado pelo sistema.

Admitir-se a desistência da cobertura de determinado risco social para que fosse concedida a mesma ou similar cobertura em situação mais vantajosa à mesma espécie de risco social pela alteração da situação fática que não a modificação do risco social, sob pena se subverter a própria razão da existência da previdência social, que é garantir a proteção ao risco social e ao equilíbrio econômico financeiro e atuarial do sistema, posto que a cobertura do risco social deve ser efetivada ao tempo em que o risco ocorreu ou então ao tempo em que foi solicitada a proteção pelo indivíduo, não se admitindo a desistência da proteção para a concessão da mesma proteção em situação mais vantajosa.

Além disto, a própria desvinculação entre o fato que enseja a contribuição e as prestações demonstra a possibilidade daquele que teve coberto o risco social permanecer como contribuinte ao sistema.

Necessário recorrer a exemplos para que se possa compreender adequadamente o conceito abstrato.

No campo do risco social da idade, caso fosse concedida a prestação previdenciária em razão do implemento da idade e o indivíduo continuasse laborando, por certo que neste período de labor, poderia acabar vertendo contribuições mais relevantes ao sistema.

  Contudo, ao solicitar a desistência da primeira prestação previdenciária em relação à idade para, na sequencia, solicitar a mesma prestação previdenciária de proteção à idade, somente ensejaria a alteração do valor da prestação em vista do cálculo mais benéfico decorrente das ultimas contribuições prestadas no período mais próximo ao segundo pedido.

Neste caso, a parte teria desistido de prestação previdenciária relativa ao risco da idade, que já lhe fora concedido, para requerer a mesma proteção contra o evento idade em momento seguinte, ou seja, ontologicamente, a mesma proteção, o que não deve ser admitido.

A circunstância de serem vertidas contribuições ao sistema posteriormente a solicitação da cobertura do risco é circunstância laterale admitida para o custeio do sistema, na forma do art. 195, inciso II, da Constituição Federal, mas não tem qualquer relevância à proteção do risco que cuja proteção já fora solicitada e obtida.

Do mesmo modo, em relação ao risco decorrente da contribuição por montante de tempo considerável, que dá ensejo à aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou total, sendo certo que ambas visam proteger o mesmo risco social.

Assim, se foi solicitada a proteção do risco referente ao tempo de contribuição quando o indivíduo fazia jus à prestação proporcional, não pode ele, em momento ulterior, solicitar a desistência da proteção referente ao tempo de contribuição para que lhe seja concedido, em virtude do pagamento de contribuições em momento posterior à concessão da primeira prestação previdenciária, a aposentadoria por tempo de serviço integral.

Ambas as prestações visam o mesmo risco social, qual seja, o período de contribuição e se o indivíduo entendeu ser necessária a proteção de tal risco em momento mais próximo, ainda que posteriormente tenha contribuído para o sistema, não pode ele desistir da proteção social aoperíodo de contribuição para solicitar, na sequencia, pedido de proteção ao  período de contribuição social mais benéfico.

A situação indicada apenas indicaria uma elevação do montante da prestação previdenciária para o mesmo risco social já coberto anteriormente, o que vai contra o equilíbrio econômico financeiro e atuarial do sistema.

A desistência de uma prestação para a concessão de outra prestação com maior valor acaba por abalar o equilíbrio econômico financeiro e atuarial do sistema que é calculado de acordo com os benefícios concedidos e o cálculo das receitas vertidas, alterando a situação da prestação em relação a uma só situação de risco social, como seria o caso de aumento da renda mensal inicial da pensão por morte obtida em momento anteriore solicitada a revisão após a edição da Lei 9.032\95 e cujo incremento do valor do benefício foi obstado pela Corte Suprema.

Ademais, as prestações previdenciárias concedidas atendem ao risco social, sendo vedada a sua desistência para a concessão da mesma pretensão só que com a renda mensal inicial superior, que é o motivo para que se possa admitir a desistência de beneficio seguido de novo pedido da prestação.

Neste aspecto, o regime previdenciárioassimila-se ao seguro e uma vez constatada a realização do risco, deve a prestação ser concedida  de acordo com o tempo em que a prestação foi solicitada, sendo irrelevante a modificação posterior das condições fáticas.

Embora tenha se cuidado de situação envolvendo pensão por morte e a impossibilidade dos dependentes que pretendem a concessão da pensão por morte anterior à edição da Lei 9.032\95 à integralidade da mesma, o Supremo Tribunal Federal sinalizou que os fundamentos que embasaram tal decisão impedem que os benefícios concedidos com base em determinado risco social, possam ser restabelecidos com base em recolhimentos posteriores ao primeiro requerimento de proteção ao risco, porque devem manter o equilíbrio atuarial no momento em que foi solicitada a prestação previdenciária.

Neste sentido, vale transcrever a ementa do referido julgado:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INTERPOSTO PELO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), COM FUNDAMENTO NO ART. 102, III, "A", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, EM FACE DE ACÓRDÃO DE TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO: PENSÃO POR MORTE (LEI Nº 9.032, DE 28 DE ABRIL DE 1995). 1. No caso concreto, a recorrida é pensionista do INSS desde 04/10/1994, recebendo através do benefício nº 055.419.615-8, aproximadamente o valor de R$ 948,68. Acórdão recorrido que determinou a revisão do benefício de pensão por morte, com efeitos financeiros correspondentes à integralidade do salário de benefícios da previdência geral, a partir da vigência da Lei no 9.032/1995. 2. Concessão do referido benefício ocorrida em momento anterior à edição da Lei no 9.032/1995. No caso concreto, ao momento da concessão, incidia a Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991. 3. Pedido de intervenção anômala formulado pela União Federal nos termos do art. 5º, caput e parágrafo único da Lei nº 9.469/1997. Pleito deferido monocraticamente por ocorrência, na espécie, de potencial efeito econômico para a peticionária (DJ 2.9.2005). 4. O recorrente (INSS) alegou: i) suposta violação ao art. 5o, XXXVI, da CF (ofensa ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido); e ii) desrespeito ao disposto no art. 195, § 5o, da CF (impossibilidade de majoração de benefício da seguridade social sem a correspondente indicação legislativa da fonte de custeio total). 5. Análise do prequestionamento do recurso: os dispositivos tidos por violados foram objeto de adequado prequestionamento. Recurso Extraordinário conhecido. 6. Referência a acórdãos e decisões monocráticas proferidos quanto ao tema perante o STF: RE (AgR) no 414.735/SC, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Eros Grau, DJ 29.4.2005; RE no 418.634/SC, Rel. Min. Cezar Peluso, decisão monocrática, DJ 15.4.2005; e RE no 451.244/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, DJ 8.4.2005. 7. Evolução do tratamento legislativo do benefício da pensão por morte desde a promulgação da CF/1988: arts. 201 e 202 na redação original da Constituição, edição da Lei no 8.213/1991 (art. 75), alteração da redação do art. 75 pela Lei no 9.032/1995, alteração redacional realizada pela Emenda Constitucional no 20, de 15 de dezembro de 1998. 8. Levantamento da jurisprudência do STF quanto à aplicação da lei previdenciária no tempo. Consagração da aplicação do princípio tempus regitactum quanto ao momento de referência para a concessão de benefícios nas relações previdenciárias. Precedentes citados: RE no 258.570/RS, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 19.4.2002; RE (AgR) no 269.407/RS, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 2.8.2002; RE (AgR) no 310.159/RS, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 6.8.2004; e MS no 24.958/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1o.4.2005. 9. Na espécie, ao reconhecer a configuração de direito adquirido, o acórdão recorrido violou frontalmente a Constituição, fazendo má aplicação dessa garantia (CF, art. 5o, XXXVI), conforme consolidado por esta Corte em diversos julgados: RE no 226.855/RS, Plenário, maioria, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 13.10.2000; RE no 206.048/RS, Plenário, maioria, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. p/ acórdão Min. Nelson Jobim, DJ 19.10.2001; RE no 298.695/SP, Plenário, maioria, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.10.2003; AI (AgR) no 450.268/MG, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 27.5.2005; RE (AgR) no 287.261/MG, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 26.8.2005; e RE no 141.190/SP, Plenário, unânime, Rel. Ilmar Galvão, DJ 26.5.2006. 10. De igual modo, ao estender a aplicação dos novos critérios de cálculo a todos os beneficiários sob o regime das leis anteriores, o acórdão recorrido negligenciou a imposição constitucional de que lei que majora benefício previdenciário deve, necessariamente e de modo expresso, indicar a fonte de custeio total (CF, art. 195, § 5o). Precedente citado: RE no 92.312/SP, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 11.4.1980. 11. Na espécie, o benefício da pensão por morte configura-se como direito previdenciário de perfil institucional cuja garantia corresponde à manutenção do valor real do benefício, conforme os critérios definidos em lei (CF, art. 201, § 4o). 12. Ausência de violação ao princípio da isonomia (CF, art. 5o, caput) porque, na espécie, a exigência constitucional de prévia estipulação da fonte de custeio total consiste em exigência operacional do sistema previdenciário que, dada a realidade atuarial disponível, não pode ser simplesmente ignorada. 13. O cumprimento das políticas públicas previdenciárias, exatamente por estar calcado no princípio da solidariedade (CF, art. 3o, I), deve ter como fundamento o fato de que não é possível dissociar as bases contributivas de arrecadação da prévia indicação legislativa da dotação orçamentária exigida (CF, art. 195, § 5o). Precedente citado: julgamento conjunto das ADI´s no 3.105/DF e 3.128/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, Red. p/ o acórdão, Min. Cezar Peluso, Plenário, maioria, DJ 18.2.2005. 14. Considerada a atuação da autarquia recorrente, aplica-se também o princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial (CF, art. 201, caput), o qual se demonstra em consonância com os princípios norteadores da Administração Pública (CF, art. 37). 15. Salvo disposição legislativa expressa e que atenda à prévia indicação da fonte de custeio total, o benefício previdenciário deve ser calculado na forma prevista na legislação vigente à data da sua concessão. A Lei no 9.032/1995 somente pode ser aplicada às concessões ocorridas a partir de sua entrada em vigor. 16. No caso em apreço, aplica-se o teor do art 75 da Lei 8.213/1991 em sua redação ao momento da concessão do benefício à recorrida. 17. Recurso conhecido e provido para reformar o acórdão recorrido.

(RE 415454, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 08/02/2007, DJe-131 DIVULG 25-10-2007 PUBLIC 26-10-2007 DJ 26-10-2007 PP-00042 EMENT VOL-02295-06 PP-01004)

Este precedente é de suma importância pela assertiva constante no voto do Ministro Gilmar Mendes que o equilíbrio econômico financeiro e atuarial deve observar a data em que foi requerido o benefício para o resguardo atuarial do sistema e a sua manutenção futura.

O Ministro Ricardo Levandowski, em seu judicioso voto, após tecer considerações sobre as espécies de pensão por morte no sistema brasileiro, conclui que após a concessão do benefício não pode ocorrer a alteração no cálculo da renda mensal do benefício.

Registre-se, ainda, que o argumento que indica que existiria inconstitucionalidade no fato daquele que recebe prestações previdenciárias de aposentadoria não poder gozar de outros benefícios salvo o salário família, mesmo contribuindo para o sistema, tem-se que a regra do art. 18, §2º, da Lei 8.213\91 apenas traduz a sistemática de que a aposentadoria revela o benefício de inatividade remunerada, sendo certo que quando tal benefício é concedido, o sistema presume a inatividade do indivíduo, sendo desnecessária a concessão de qualquer outro benefício, porque a aposentadoria é considerado como a situação em queo indivíduo não mais deverá se ativar e não deve receber benefício conectado ao trabalho por ventura desempenhado além da cobertura da inatividade.

A razão da aposentadoria, qual seja, inatividade remunerada impede o reconhecimento de que mesmo em vista do labor efetivado após a concessão de tal benefício, o indivíduo faça jus à prestações relacionadas à substituição de sua remuneração, posto que o sistema já identificou a desnecessidade do indivíduo continuar trabalhando e  o reconhecimento desta circunstância  impede a concessão de benefício previdenciário ligado a substituição do valor da remuneração obtida exclusivamente com o labor.

O risco social já se encontra atendido pela concessão de prestação previdenciária visando o atendimento à inatividade remunerada, decorrendo a vedação prevista no art. 18, §2º, da Lei 8.213\91 da própria interpretação sistemática dos riscos sociais, daí porque admissível a concessão do benefício do salário-família ao mesmo e a concessão de salário maternidade à segurada aposentada, na forma do art. 103, da Lei 8.213\91, eis que a razão de tal prestação é a garantia da estabilidade dos proventos recebidos quando da gravidez, para permitir a gestante dedicar-se exclusivamente a gestação.

Não há, assim, qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade na limitação prevista no art. 18, §2º, da Lei 8.213\91 porque decorrente da própria consideração dos riscos sociais.

Se o risco social já se encontra coberto quando do reinício da atividade laboral, não pode ser solicitada a desistência da cobertura do risco social para conceder-se a mesma cobertura ao risco social considerando-se a situação do segurado aposentado, cujo risco social já fora atendido, sob pena de subverter a própria idéia do sistemae promover-se interpretação do sistema contra a própria definição de sistema e sua sustentação teórica e prática.

   Anote-se que a filiação obrigatória do segurado aposentado que ativa-se novamente decorre da filiação obrigatória daquele que exerce atividade econômica, mas a concessão de benefícios resta restrita pelo próprio risco social já coberto.

Por estes motivos, não é possível admitir-se adesistência à proteção previdenciária em relação a determinado risco previdenciário para a obtenção de prestação previdenciária mais benéfica em decorrência do mesmo risco previdenciário, especialmente as situações denominadas “desaposentação” e “despensão” com vistas a receber o mesmo benefício com valor mais vantajoso e decorrentes do mesmo risco social.


7-Conclusão:

Por todo o exposto, verifica-se a existência de argumentos que podem ensejar a consideração, pelo E.  Supremo Tribunal Federal da inconstitucionalidade do instituto da desaposentação no direito brasileiro e que devem ser examinados por aquela Augusta Corte quando do julgamento a fim de até mesmo indicar a forma como deve o sistema previdenciário ser interpretado.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Gustavo Tinôco de. Considerações acerca da denominada desaposentação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3219, 24 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21592. Acesso em: 4 maio 2024.