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Nova educação para novos tempos

Ou educação para o novo milênio.

Nova educação para novos tempos. Ou educação para o novo milênio.

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O texto analisa a necessidade de redimensionar o conceito e a prática da educação em razão da realidade contemporânea.

Estima-se que a quantidade de informações produzida pela humanidade vem dobrando a cada duas décadas. E, mesmo imaginando o impensável a atividade de leitura por dez horas por dia, numa média de quinze páginas por hora e sem finais de semana livres. Ainda assim, não conseguiríamos ler toda essa carga de informação. Mas cabe um questionamento: tal forte carga de informação possui qual utilidade?

O acúmulo de informações principalmente assistemáticas faz com que em vez de termos cientista, teríamos apenas um idiot savant[1].

Se pensarmos que cada vez mais o conhecimento deve tender à globalização e não à especialização, como muito tempo se acreditou, obrigando a obter informações das mais diversas áreas para então criar o conhecimento, veremos é impossível acessar toda a informação ao mesmo tempo. Mais que isso, é simplesmente inútil.

Apesar dessa constatação, a escola (seja a do nível básico, secundário e mesmo superior) continua tentando formar seus discentes como se ainda estivéssemos no século passado e não no limiar de nova era, num novo milênio.

Continuamos ensinando fatos e cobrando memorização, num nítido desvio onde a escola esquece seu principal papel: o de ensinar a aprender.

As datas e os nomes da História são ensinados (como no latim insignare, como ato de depositar, signos, definições) dentro do aluno tão diferente do aprender, mas não se fazem relações críticas entre os diversos fenômenos, entre as épocas.

Há uma conhecida estória de seis cegos{C}[2] de uma parábola hindu que encontraram um elefante. E, cada qual apalpava uma parte do corpo do animal e saía relatando aos demais, como era o animal segundo seu tato.  Infelizmente o nosso sistema educacional não se diferencia muito dessa visão cognitiva do elefante.

Enfim, espera-se que o aluno faça sozinha a parte mais difícil da tarefa, que é justamente montar o elefante, como um sistema completo e inteiro em seu arcabouço de representação mental.

A interdisciplinaridade tão cogitada, mas tão pouco praticada, não apenas leva a formação mais completa do estudante e do cidadão, preparando-o para interagir com as informações esparsas e construir seu conhecimento, como também permite uma compreensão mais profunda das próprias questões.

Já se definiu inteligência{C}[3] como a capacidade de formular analogias, compete à escola ser o ambiente propício à formação de tais competências criando projetos de estudo multidisciplinares.

O conhecimento é comparável a uma esfera e, à medida que amplia seu volume, aumenta o número de pontos em contato com o desconhecido. O que confirma a velha e verdadeira máxima socrática: - “Só sei que nada sei”.

Ao invés de pretender dominar o maior volume possível dessa esfera, devemos aprender a navegar dentro da esfera. Assim como os bons navegantes que não decoram todos os pontos geográficos, ou todos os atóis nem as ondas. Pois os bons navegantes norteiam-se pelas estrelas e pelos mapas.

Por outro lado, a maior parte da informação é mero ruído quando não se encaixa em algum modelo, quando não possui utilidade plausível e imediata.

Daí, o grande valor da pesquisa e dos pesquisadores que ainda merecem ser descobertos, reconhecidos e estimulados no sistema educacional brasileiro.

De qualquer forma o individuo deve ser sabedor da existência de determinadas informações e onde se localizam para que no momento adequado, as acesse.

Nesse diapasão, é papel primordial da escola é criar ambientes de aprendizagem fundamentados na pesquisa, enquanto busca e avaliação de informações.

Com o advento da microeletrônica e da informática principalmente na estocagem de informações (mas não podemos chamá-las de conhecimento) posto que este seja construído no interior de cada pessoa, não se “passa”, não se transmite conhecimento mecanicamente em memórias quase infinitas, o processamento de dados em frações de minuto e a impossibilidade, no decurso de uma vida, de acesso à cultura universal são reveladores da impropriedade dos métodos escolares vigentes.

O papel dos educadores deve ser repensado e novas estratégias formuladas para a formação desses profissionais devem ser previstas. Enquanto isso a escola está imobilizada, quase fossilizada na antiquada formação de erudição que sequer atinge, em vez de se arrojar na formação de sujeitos críticos e dotados de autonomia de aprendizagem.

Com as céleres transformações nos meios e nos modos de produção, o resultado da revolução tecnológica e científica, nos traduza uma nova era da humanidade. Introduzindo-nos na tão afamada modernidade líquida conforme definiu Zygmunt Bauman[4].

A natureza do trabalho e a relação econômica travada entre as pessoas e países sofreram também enormes transformações, mudando a natureza do que hoje podemos entender por profissão[5].

Assim a educação não apenas deve se adaptar às novas necessidades como, principalmente, tem que assumir papel de ponta nesse processo.

O atual estágio de transformação produzido pela Terceira Onda[6] (posto que a primeira onde se refira à descoberta da agricultura e a segunda onda é atinente ao advento da revolução industrial). Outros autores propõem outras designações, mas todos apontam na mesma direção, isto é, o papel fundamental do conhecimento nas relações de produção e, ipso facto, na ordem e no poder do mundo.

Reparemos que enquanto que a primeira onde o valor econômico de um produto era dado quase que exclusivamente pela matéria-prima, e seu valor era facilmente deduzido pelo pensamento de Adam Smith, na segunda onda o valor do trabalho agregado passa a sobrepujar aquela (ao invés de escravos, passamos a ter trabalhadores assalariados). Evidentemente que o conhecimento já estava presente nessas etapas, mas não possuía valor próprio e autônomo.

Vamos observar que o mero hábito de escovar os dentes já se pode analisar que a escova de dente já é um produto que reflete a afirmação anterior, questionando; o que vale o plástico nesta contido? Por quanto tempo de trabalho fora investido para fabricá-la? Hoje em dia o trabalho em grande parte está cada vez mais automatizado, e resta a derradeira questão: o quanto estamos pagando?

No preço da escova há embutido o valor do conhecimento, do design, envolvendo equipes de desenhistas, o know-how dos técnicos em ergonomia da arcada dentária, os consultores e especialistas em higiene bucal, os dentistas, os ferramenteiros e engenheiros de produção, os homens do marketing e da propaganda, cuidando da embalagem, rótulo e logotipo até os profissionais de distribuição de vendas.

Enfim, por detrás de cada produto, há uma gama enorme de investimento não só de matéria-prima, mas de serviços e técnicas[7] que são recompensadas pelo preço.

Platão em sua maravilhosa e utópica república previa e efetivamente propunha a instrução contínua até a idade de quarenta anos (considerada avançada para a época) em todos os campos artísticos e científicos. O que representava proposta para uma elite, o que deveria ser na construção de uma sociedade humanista e democrática, a premissa para a maioria dos cidadãos.

Com os progressos da automação, centenas e milhões de desempregados se tornaram delinquentes, com a redução do trabalho humano na produção de bens e serviços, se não criarmos um novo sentido da vida na nova sociedade.

Bem, afinal o que tudo isso tem a ver com a educação? Afinal, tudo. Pois a educação é que arquiteta o profissional do futuro[8] (e o futuro já começou) terá como principal tarefa aprender.

Sim, pois para executar as tarefas repetitivas (e mecânicas) existirão os computadores e robôs. Ao homem compete ser criativo, imaginativo, crítico e inovador.

A carga labora do trabalho desse profissional do futuro podemos estimá-la em cinco horas diárias (sendo modesta e razoável, pois do contrário disso seria imaginar horas de desempregados, delinquência e barbárie).

E, nessas cinco horas diárias laborais, uma hora seria pelo menos dedicadas ao que podemos chamar de produção propriamente dita e, as demais horas laborais restantes seriam destinadas ao estudo, pesquisa e a aprendizagem. A preocupação da capacitação constante e atualizada reciclagem com o capital humano atende a sofisticação e dinâmica do capitalismo contemporâneo.

Hoje, as profissões baseadas no conhecimento e, não na venda da força de trabalho já funcionam desta maneira. E é fácil constatar que uma única boa e inovadora ideia justificará o salário de vários anos de um empregado.

Evidentemente têm que preparar seus alunos para esta realidade, para esta dinâmica, eles terão que aprender a aprender, e aprender a fazê-lo com autonomia e mesmo perante adversidades.

O conceito de educação permanente{C}[9] será (e, ainda o é) válido mais do que nunca. O homo studiosus como a realização dos mais velhos sonhos humanistas e platônicos, libertando o homem das tarefas desumanizantes (aquelas que qualquer máquina pode fazer) e tornando a cultura, o saber e a arte sua principal tarefa.

Nesse cenário, onde está afinal a diferença entre a escola e o trabalho (ou profissão)?

Existe a cruel piada que menciona: “quem sabe faz e, quem não sabe ensina” reflete bem a desqualificação do profissional da educação”. O amadorismo[10] é hoje a pior praga da profissão do professor. Daí, a ideia de sacerdócio, de sacrifício justificando a incompetência e o castigo com os maus salários, a pedagogia do afeto (onde tudo gira em torno de amor e ódio) que tanto asfixia a pedagogia do intelecto.

A própria gestalt{C}[11] das escolas reflete sua contradição com a exigência dos novos tempos: seu visual estético e funcional mais se parece com um cartório de notas do que propriamente um ambiente estimulador do prazer intelectual.

Mas, para promovermos a mudança, não basta a lamúria, a mera boa-vontade ou mesmo determinação política. Há de se mirar principalmente nos avanços da humanidade e sinceramente integrá-los na escola, inserindo-os no projeto pedagógico.

Afinal, por que a escola tem que ser atrasada e mais enfadonha do que a TV ou um videogame? Ninguém possui sadomasoquismo cognitivo daí ser curial o uso da tecnologia educacional.

Ao conceituar tecnologia temos que perceber que este envolve o conhecimento, a segunda reflete a capacidade de aquisição apenas é, pois uma questão técnica e ideológica.

Como contraponto ao conceito de tecnologia, podemos exemplificar pelo Kuwait um país que pode comprar os computadores mais potentes e caros, os carros mais velozes, os blu-rays mais modernos, porém não sabe construir ou sequer consertar qualquer uma destas mercadorias.

O oposto disto é Robinson Crusoé{C}[12], o personagem de Daniel Defoe que com suas mãos nuas, tendo escapada de um naufrágio, reproduzia em sua ilha deserta, toda a tecnologia que ele conhecia (da época), usando apenas seu conhecimento e a vontade de transformar a realidade.

Na educação e igualmente em outros setores essa distinção é fundamental, pois não há máquina que substitua o professor. Assim como a televisão não substituiu o rádio, nem o videocassete substituiu o cinema e, nem o e-mail exterminou os correios e telégrafos.

A tecnologia educacional pode se dar, por exemplo, ao usar uma lata de água com um pedaço de madeira para explicar a flutuação dos corpos; como apertar a tecla de um vídeo sobre o assunto e deixar os alunos assistirem passivamente, em contrapartida, nada tem de tecnologia.

Há de se fazer uso consciente e consistente da tecnologia educacional para que possa motivar, instigar e propiciar o ambiente de aprendizagem.

Isso nos remete para a formação de um novo educador. Por mais que cogitemos em usar o videocassete, o computador, o Datashow ou ainda o velho quadro negro (que na maioria das vezes é verde) é na formação do educador que desenvolvemos a tecnologia educacional, preparando líderes, mediadores, empreendedores e estimuladores, mais do que até que meros detentores de conhecimentos específicos.

O professor do século XXI{C}[13] deve orientar os educandos sobre onde colher a informação, como tratar a informação e, pensá-la criticamente e, analisar como utilizar a informação obtida.

O educador será então o tutor, o mentor, o encaminhador, da autoformação e o conselheiro da aprendizagem dos alunos, ora estimulando o trabalho individual, ora em grupos, reunidos por interesses comuns ou interesses complementares.

A verdade é que quanto menos informações inúteis colocarmos na cabeça de nossos alunos, mais espaço sobrará para as grandes ideias, disse o físico russo Lev Landau[14] quando propôs a mudança dos conteúdos de ensino de física em seu país – de cerca de cento e cinquenta itens curriculares para apenas cinco.

Precisamos repensar a educação para não cair nas armadilhas da “ditadura dos conteúdos” que por vezes é a grande justificativa para a falta de inovação.

Afinal mais coerente e válido o aluno entender vem e profundamente cinco princípios da Física básica do que nada entender sobre cento e cinquenta princípios.

Mais vale aprender menor quantidade de conteúdos, mas aprender com prazer intelectual, sendo capaz e apreciar a pesquisa, ler por conta própria e descobrir as demais informações, utilizando o professor como consultor para as dúvidas.

Precisamos transformar a sala de aula num ambiente interativo e facilitador da aprendizagem. Precisamos calcular e argumentar com as ferramentas de interação lúdica entre os alunos e seus objetos para servirem de reflexão e pesquisa.

E para obter tal efeito várias técnicas se podem aplicar, desde uso do vídeo e de jogos até mesmo da arte dramática ou a construção de maquetes. Mas, já existe um instrumento que reúne todas essas possibilidades: o computador.

Infelizmente há poucas e honrosas exceções que usam as possibilidades multimídias do computador[15] para a educação[16].

A classe seria estimulada a alimentar um banco de dados sobre determinado tema, construindo a relação entre o saber na escola e “linkando” com a realidade prática.

É preciso que os alunos consigam ir mais longe e sabendo utilizar os dados, relacioná-los, sintetizá-los, analisá-los e, enfim, avaliá-los.

Todos esses elementos juntos constituem o que se pode chamar de pensamento crítico. O que fazem com que os alunos transcendam as respostas simples, desafiando ideias e conclusões, conseguindo um entendimento coerente do mundo. Enfim, conhecendo o elefante por inteiro, desprovido da cegueira da alienação.

A habilidade de pensar criticamente tem pouco valor se não for exercitada diariamente nas situações reais. Eis aí, a relevância das simulações feitas em computador ou não, têm seu papel fornecendo cenário interessante e propício para o desenvolvimento do intelecto.

A tomada de decisões que é motor básico de quase toda a simulação, podendo levar o aluno a uma série de questionamentos, visando algumas abordagens em que a resolução do problema. E, por fim, realizar a transferência de conhecimento.

Existem muitas táticas simples que o professor pode utilizar e que são motivadoras, como encorajar a dramatização de papéis que tenham diferentes perspectivas, elaborando vocabulários, visitando novos pontos de vista.

Também devemos evitar as armadilhas da rotina de ensinar igual tantas vezes que se impõe. Dar todo o tempo para as respostas (o silêncio por vezes é um precioso aliado), pois as respostas pensadas, não apressadas são as metas do pensamento crítico.

Encorajar os alunos a explicarem como chegaram as suas conclusões, pedindo para eles verbalizarem como estão pensando sobre um problema enquanto raciocinam. O principal é usar a imaginação, a engenhosidade, a criatividade para que se promova o prazer intelectual, o prazer de pensar.

O uso do computador exige um professor preparado, dinâmico[17] e investigativo, pois as perguntas e situações que surgem na classe fogem do controle pré-estabelecido do currículo.

Outro fator relevante é distinguir apropriadamente treinamento de educação. A educação significa transferência de conhecimentos de uma pessoa à outra; treinamento consiste no ensino da técnica.

O treinamento tem por finalidade desenvolver uma habilidade específica, como por exemplo, operar uma máquina, realizar um procedimento rotineiro ou atender a uma pessoa dentro de uma faixa estreita de responsabilidade.

Já a educação tem como objetivo disseminar o pensamento crítico bem como a capacitar a aprender novos conteúdos por conta própria. Estimulando o autodidata[18].

O treinamento capacita o profissional enquanto que a educação desenvolve a pessoa. Tal diferença é sutil, porém imensa, e o processo ou fracasso de um investimento em educação corporativa reside na percepção da aplicação adequada dos procedimentos educacionais, como materiais capacitadores, motivações, conteúdos e, principalmente bases conceituais.

Até hoje se considera que o lugar da educação é na escola e que no ambiente profissional as tarefas de aprendizagem devem ficar a cargo do chamado treinamento (o que em sua terminologia nos remete ao adestramento animal).

É questionável se o papel da escola é formar seus alunos para o mundo profissional, vez que o conhecimento traz a capacidade de ser sujeito crítico e autônomo deixando de ser apenas mero apanágio de cidadania e, passem ter o fundamento da atividade profissional.

Também a empresa deixa de precisar de sujeitos prontos e acabados, plenamente formados para usar na produção, pois o aprender passa a ser a nova linha de montagem.

Enfim, o tradicional “treinamento” deve ser cada vez mais substituído pela educação permanente no ambiente profissional. Nesse sentido, as potencialidades dos ambientes interativos de aprendizagem gerados por simulações com computadores, está cabendo cada vez mais, no ambiente empresarial.

O uso de jogos que representa a forma mais antiga de simulação da humanidade (homo ludens[19]) expande-se nas empresas e seus resultados se revelam muito positivos.

Por fim, a educação como processo{C}[20] possui papel fundamental, e há de ser contínua, sendo um dos métodos, senão o principal a garantir ocupações criativas às pessoas (capaz de garantir não só o emprego, mas a luta pela dignidade e pela cidadania).

Entende-se que a educação do século XXI não tem a finalidade única de preparar os alunos para o mercado de trabalho, mas facilitar a adaptação aos diferentes trabalhos que aparecem com a evolução da produção diante da globalização, onde talento e criatividade são importantes, assim como formar cidadãos democráticos e conscientes dos seus direitos e deveres e que resgate a humanidade existente dentro de cada um de nós.

Só assim, finalmente, a educação será o diferencial para toda a civilização humana.


[1] O idiot savant é pessoa altamente bem informada sobre um assunto, mas sabe pouco de qualquer outra coisa. Langdon usou o termo idiot savant (ou idiota-prodígio) para identificar a síndrome, aceita na época em que um idiota era alguém com QI inferior a 25. Mas possuem habilidades são sempre ligadas a uma memória extraordinária, porém com pouca compreensão do que está sendo descrito.

[2] Certo dia, um príncipe indiano mandou chamar um grupo de cegos de nascença e os reuniu no pátio do palácio. Ao mesmo tempo, mandou trazer um elefante e o colocou diante do grupo.  Em seguida, conduzindo-os pela mão, foi levando os cegos até o elefante para que o apalpassem. Um apalpava a barriga, outro a cauda, outro a orelha, outro a tromba, outro uma das pernas.  Quando todos os cegos tinham apalpado o paquiderme, o príncipe ordenou que cada um explicasse aos outros como era o elefante, então, o que tinha apalpado a barriga, disse que o elefante era como uma enorme panela. O que tinha apalpado a cauda até os pelos da extremidade discordou e disse que o elefante se parecia mais com uma vassoura. "Nada disso”, interrompeu o que tinha apalpado a orelha. "Se alguma coisa se parece é com um grande leque aberto". O que apalpara a tromba deu uma risada e interferiu: "Vocês estão por fora. O elefante tem a forma, as ondulações e a flexibilidade de uma mangueira de água...". "Essa não", replicou o que apalpara a perna, "ele é redondo como uma grande mangueira, mas não tem nada de ondulações nem de flexibilidade, é rígido como um poste...". Os cegos se envolveram numa discussão sem fim, cada um querendo provar que os outros estavam errados, e que o certo era o que ele dizia. Evidentemente cada um se apoiava na sua própria experiência e não conseguia entender como os demais podiam afirmar o que afirmavam. O príncipe deixou-os falar para ver se chegavam a um acordo, mas quando percebeu que eram incapazes de aceitar que os outros podiam ter tido outras experiências, ordenou que se calassem. "O elefante é tudo isso que vocês falaram.", explicou. "Tudo isso que cada um de vocês percebeu é só uma parte do elefante”. Não devem negar o que os outros perceberam. “Deveriam juntar as experiências de todos e tentar imaginar como a parte que cada um apalpou se une com as outras para formar esse todo que é o elefante.” Algumas conclusões sobre essa história...  A experiência das coisas que cada homem pode ter é sempre limitada. Por isso, a sensatez obriga a levar em conta também as experiências dos outros para se chegar a uma síntese. A pessoa, o ser humano, apresenta muitas facetas. Existe o risco de polarizar a atenção em algumas delas, ignorando o resto. Fazendo isso, estaríamos repetindo os cegos da parábola.  Cada um ficaria com uma visão unilateral e parcial. Para obtermos uma visão o mais integral possível do que é uma pessoa, devemos reunir, numa unidade, os numerosos aspectos que podem ser observados no ser humano.

[3] Inteligência vem do latim intellectus que por sua vez deriva do verbo intelligere que significa inteligir, entender e compreender. Composto de íntus significando dentro e lègere que significa recolher, escolher. Existem dois "consensos" de definição de inteligência. O primeiro, de Intelligence: Knowns and Unknowns, um relatório de uma equipe congregada pela Associação Americana de Psicologia, em 1995: "Os indivíduos diferem na habilidade de entender ideias complexas, de se adaptarem com eficácia ao ambiente, de aprenderem com a experiência, de se engajarem nas variadas formas de raciocínio, de superarem obstáculos mediante o pensamento. Embora tais diferenças individuais possam ser substanciais, nunca são completamente consistentes: o desempenho intelectual de uma dada pessoa vai variar em ocasiões distintas, em domínios distintos, a se julgar por critérios distintos. Os conceitos de 'inteligência' são tentativas de aclarar e organizar esse conjunto complexo de fenômenos." Uma segunda definição de inteligência vem de Mainstream Science on Intelligence, que foi assinada por cinquenta e dois pesquisadores em inteligência, em 1994: "uma capacidade mental bastante geral que, entre outras coisas, envolve a habilidade de raciocinar, planejar, resolver problemas, pensar de forma abstrata, compreender ideias complexas, aprender rápido e aprender com a experiência. Não é uma mera aprendizagem literária, uma habilidade estritamente acadêmica ou um talento para sair-se bem em provas. Ao contrário disso, o conceito refere-se a uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreensão do mundo à sua volta - 'pegar no ar', 'pegar' o sentido das coisas ou 'perceber' uma coisa".

Em Psicologia, o estudo da inteligência não compreende o caráter ou a sabedoria, e conforme a definição que se tome, pode ser considerado um dos aspectos da linguagem ou personalidade.

[4] Zygmunt Bauman é sociólogo polonês, nascido em 1925. Publicou mais de quarenta livros, entre os quais a Modernidade Líquida que fora publicada perto do ano de 2000. A propalada virada do século trazia um mundo em pânico, pois havia diversas previsões de panes tecnológicas em programas de computadores espalhados pelo mundo, seria o famoso "bug do milênio". O título da obra decorre da modernidade da sociedade que avança em vários sentidos, porém, questionável em suas atitudes e o seu contexto enquanto sociedade. A liquidez vem do fato que os líquidos não têm forma, ou seja, são fluídos que se moldam conforme o recipiente nos quais estão contidos, diferentemente dos sólidos que são rígidos e precisam sofrer uma tensão de forças para amoldar-se às novas formas.

[5] A história da educação é repleta de períodos críticos nos quais restou evidente que as premissas e estratégias testadas e aparentemente confiáveis se perderam em fantasias e exigem revisão e reforma. Contudo, a crise atual difere das demais crises pretéritas. A ideia de que a educação pode ser um produto a ser adquirido e conservado encontra-se em franco declínio e, certamente, não mais depõe a favor da educação institucionalizada. O outro desafio para as premissas básicas da educação vem da natureza errática e essencialmente imprevisível da mudança contemporânea. Diferindo do labirinto behaviorista, o mundo de hoje mais se assemelha a um aparelho para esquecer-se do que um lugar de aprendizagem. Portanto, uma memória tão solidamente fortalecida parece potencialmente incapacitante em muitos casos, desencaminhadora em muitos mais casos, inútil na maioria das vezes.

[6] A Terceira Onda é sinônima de revolução técnico-científica, como um modo de vida e consumo, que se baseia em fontes de energias alternativas, diversificadas e renováveis. O grande centro de produção deste momento destaca a produção da indústria eletrônica produzindo computadores, celulares e equipamentos de comunicação cada vez mais velozes e atualizados. A primeira onde se refere à revolução científica, época em que a humanidade aprendeu a domesticar animais e cultivar. A segunda se deu quando ocorreu a primeira e segunda revolução industrial tendo durado cerca de trezentos anos. A Terceira Onda trouxe a desmassificação dos meios de comunicação, jornais perderam leitores para a internet, a TV digital abriu uma sobrevida para a televisão se modernizar através da informática, e as empresas precisam atender aos nichos de consumo de informação e produção.

[7] Lembrando-se que para se conhecer meios e técnicas a educação se faz indispensável. Para se calcular esse preço também esta se faz necessária. Assim como para desenhar a escova de dente “ideal” precisamos do conhecimento, da transmissão de conhecimentos veiculada pela educação e aprendizagem constante.

[8] Brasil, País do futuro é o título em português da obra de autor judeu austríaco Stefan Zweig que no final da metade do século XX radicou-se em Petrópolis (RJ), para fugir do nazismo. Seu principal biógrafo, Alberto Dines, a obra constitui-se em "caso único de livro convertido em epíteto nacional" foi recebida fora do país como uma revelação, mas também como incompreensão. Embora a II Guerra já estivesse em seu auge, em 1941, Zweig conseguiu realizar a proeza de fazer o lançamento simultâneo da obra em vários idiomas: alemão, sueco, inglês, francês e duas edições em português - no Brasil e em Portugal; a edição espanhola saiu posteriormente. 

[9] A educação permanente parte da reflexão sobre a realidade do serviço e das necessidades existentes, para então formular estratégias que ajudem a solucionar estes problemas. Ainda nesta perspectiva, a educação permanente é considerada como educação no trabalho, pelo trabalho e para o trabalho nos diferentes serviços cuja finalidade é atingir a qualidade de vida seja na formação dos profissionais seja dos serviços.

[10] Pouco mais da metade, exatamente cinquenta e cinco por cento dos professores do ensino médio da rede pública do Brasil não tem formação específica da área em que atua. Em física, a proporção de especialistas cai para 17,7%; em química, a 33,3%.  Vide: o link http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/12/1390053-55-dos-professores-dao-aula-sem-ter-formacao-na-disciplina.shtml

[11]Gestalt, palavra de origem alemã sem tradução exata em português, refere-se a um processo de dar forma, de configurar “o que é colocado diante dos olhos, exposto ao olhar”: a palavra gestalt tem o significado” (...) de uma entidade concreta, individual e característica, que existe como algo destacado e que tem uma forma ou configuração como um de seus atributos”. A amplificação da percepção ou dos gestos não é “leitura do corpo”. O gestaltista está atento aos diversos indícios comuns de reações emocionais subjacentes, tais como discretos fenômenos de vasodilatação no rosto ou no pescoço (traduzidos em ligeiras e efêmeras modificações da cor da pele), minicontrações do maxilar, mudanças no ritmo da respiração ou da deglutição, mudanças bruscas no tom da voz, mudanças na direção do olhar e, é claro, aquilo que chamo de” microgestos” automáticos das mãos, pés ou dedos. Em geral, o gestalt-terapeuta sugere amplificar esses gestos inconscientes, considerados, de certa forma, como “lapso do corpo”, reveladores do processo em curso, imperceptíveis para o cliente.

[12] Robinson Crusoe é romance escrito por Daniel Defoe publicado em 1719 na Inglaterra. É confessional e didático o seu tom, e a obra refere-se à autobiografia fictícia do personagem-título, um náufrago que passou vinte e oito anos numa remota e deserta ilha tropical próxima a Trinidad, encontrando canibais, cativos e revoltosos antes de ser resgatado. Supõe-se o autor ter sido influenciado por Alexander Selkirk, um náufrago escocês que viveu durante quatro anos numa ilha do Pacífico chamada de "Más a Tierra", que fora renomeada em 1966 para ilha Robinson Crusoe.  É também provável que Defoe tenha sido influenciado pela tradução em latim ou inglês de O Filósofo Autodidata, de Ibn Tufail, romance do século XII na época recém-lançado pela primeira vez na Europa e que também gira em torno de um personagem isolado em uma ilha deserta.

[13] O professor do novo milênio tem trilhas relevantes a seguir para o desenvolvimento humano, a saber: aprimorar o educando como pessoa humana; preparar o educando para o exercício da cidadania; construir uma escola democrática; qualificar o educando para progredir no mundo do trabalho; fortalecer 

a solidariedade humana; fortalecer a tolerância recíproca; zelar pela aprendizagem dos alunos; colaborar com a articulação escola-família; participar ativamente da proposta pedagógica da escola e respeitar as diferenças.

[14] Lev Davidovich Landau (1908-1968) foi físico e matemático soviético. Recebeu o prêmio Nobel de Física de 1962, por sua teoria da matéria condensada, em particular do hélio líquido. Tinha um amplo campo de pesquisa o que incluiu a teoria da supercondutividade e superfluidez, a eletrodinâmica quântica, a física nuclear e a física de partículas.

[15] A primeira experiência de uso da tecnologia como ferramenta de ensino deu-se com as máquinas concebidas pelo psicólogo americano Burrhus Frederic Skinner, programadas para fazer perguntas que ganhavam complexidade a cada resposta correta. Acreditava-se que o reflexo condicionado pela tal máquina estimularia o aprendizado. Com a explosão dos computadores na década de 70, o assunto ressurgiu na contramão do que pregava Skinner: a nova corrente de entusiastas da tecnologia, encabeçada pelo doutor em matemática Seymour Papert, defendia a tese de que caberia às crianças programar as máquinas – e não o contrário.

[16] Os especialistas costumam estar de acordo sobre um ponto básico: o computador pode, sim, dar contribuições relevantes à sala de aula, mas tudo depende de como se faz uso da tecnologia.

[17] É generalizada a convicção de que a aprendizagem será contínua ao longo da vida (98%); muitas das aulas serão dadas à distância (62%), o aluno poderá montar seu próprio curso (55%), ferramentas como TV, vídeo e teleconferência serão primordiais (55%). Por consequência, as salas de aula não teriam lugar físico específico (41%). Afinal, o estudante iria aprender mesclando experiências profissionais, ajudado por múltiplos mecanismos espalhados pelos mais diversos locais. São nítidas, na pesquisa, a insegurança diante da velocidade da produção do conhecimento e a percepção de defasagem da escola com a realidade.  O principal anseio é que diminua ou desapareça a diferença entre a profissão, submetida a velozes mudanças, e a sala de aula.  A boa escola será aquela que submeter seus alunos à maior quantidade possível de experimentações e pesquisas, nas quais o professor desempenhe o papel de facilitador.

[18] O autodidatismo é grande alvo de estudos acadêmicos, especialmente devido à expansão de sistemas educacionais online. Tais estudos visam à compreensão das práticas pedagógicas, a relação entre o uso de tecnologia e a concepção de conhecimento e educação envolvidos no processo. Entre os mais famosos autodidatas temos o músico Jimi Hendrix, os escritores Ray Bradbury, José Saramago e Leonardo da Vinci.

[19] Homo ludens, o jogo como elemento da cultura é o título de uma obra escrita por Johan Huizinga. Tomando o jogo como fenômeno cultural, o livro se estrutura sob extensa perspectiva histórica, recorrendo inclusive ao estudo etimológico e etnográfico de sociedades distantes temporal e culturalmente. Reconhece o jogo como algo inato ao homem e mesmo até aos animais, considerando-o uma categoria absolutamente primária da vida, logo anterior à cultura tendo esta evoluída no jogo. Huizinga define a noção de jogo de forma ampla como: “O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da 'vida cotidiana".

[20] O processo educativo engloba a escolarização em todos seus aspectos teóricos e práticos, como o processo de aprendizagem, os métodos de ensino, o sistema de avaliação da aprendizagem e o sistema educacional como um todo. É determinado por fatores sociais, políticos, pedagógicos, e como tal precisa ser definido de acordo com seu contexto histórico-social.


Autor

  • Gisele Leite

    Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

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