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Encarceramento: cegueira e indiferença da vulnerabilidade e da desigualdade de gênero na Lei de Drogas

Encarceramento: cegueira e indiferença da vulnerabilidade e da desigualdade de gênero na Lei de Drogas

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Reflete-se sobre a perspectiva de gênero da acusada por tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no transporte a centros prisionais. A vulnerabilidade da mulher é fator relevante?

Resumo:O presente artigo objetiva que a perspectiva de gênero da mulher acusada por tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, em especial no transporte a estabelecimentos prisionais, possa constituir-se como fator relevante aos atores da primeira, segunda e terceira fases do processo de criminalização, em consideração às circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais ao redor das mulheres vulneráveis. A análise revela o tratamento que a jurisprudência dos tribunais brasileiros entrega ao previsto no art. 33, caput c/c o art. 40, inciso III, da Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006, que, na ausência da perspectiva de gênero, tem promovido o recrudescimento dos encarceramentos femininos, configurando-se, na hipótese, violência estrutural ou institucional. Examina-se, por fim, os termos do Projeto de Lei da Câmara (PLC) n.º 37/2013, que altera a Lei n.º 11.343/2006, apontando a omissão de dispositivo sob a perspectiva de gênero, o que o torna duvidoso quanto à sua eficácia social na prevenção do tráfico, pelo que, para comparação, traz-se à colação legislação estrangeira afirmativa da desigualdade e vulnerabilidade de gênero.

 Palavras-chave: Tráfico de Drogas, Mulheres, Perspectiva de Gênero, Vulnerabilidade. 

Sumário: Introdução. 1. Abordagem histórica, socioeconômica e cultural. 2. Conceito de gênero. 3. Feminização de delitos de drogas. 4. Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos. 5. Jurisprudência dos Tribunais. 5.1. Tribunais Superiores. 5.2. Tribunais Estaduais e do DF. 6. Legislação Estrangeira. 6.1. Inglaterra. 6.2. República da Costa Rica. 7. Projeto de Lei da Câmara n.º 37/2013. Conclusão. Referências.


Introdução

A sociedade – não só presente, mas também do futuro – verá a mulher cada vez mais envolvida nas diversas segmentações do crime: roubo, furto, receptação, drogas, etc.

O comportamento criminoso da mulher já não se encaixa nos delitos do sexo feminino – infanticídio, aborto, assassinato passional, entre outros –, tendo havido, no atual cenário histórico, socioeconômico e cultural brasileiro, recrudescimento da taxa de condenações por crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, principalmente pela agravante de transporte no interior de estabelecimento prisional.

Alterar a Lei n.º 11.343/2006 e revisar a jurisprudência nacional, para inclusão da perspectiva de gênero nos crimes do art. 33, caput, c/c o art. 40, inciso III, praticados por mulheres em situação de vulnerabilidade, terá relevância direta na redução dos encarceramentos femininos e, por consequência, evitar-se-á a estigmatização da mulher, da sua família e de seus filhos.

Demonstrar-se-á que não há na Lei n.º 11.343/2006 e nem no Projeto de Lei da Câmara (PLC) n.º 37/2013[2] – promove alterações na atual Lei de Drogas –, quaisquer dispositivos que façam distinção com foco na perspectiva de gênero.

Em outras palavras, a atual Lei de Drogas não têm norma que promova a igualdade substancial entre homem e mulher, com o escopo de conferir a esta tratamento diferenciado, quando em precedente situação de vulnerabilidade.

É o caso da condenação pelo art. 33, caput, c/c o art. 40, inciso III, da Lei n.º 11.343/2006, os quais, em seus preceitos primários, não preveem as circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais que levam a mulher – esposa, companheira, namorada, avó, mãe, filha, tia, sobrinha, prima, ou mesmo, em alguns casos, sem vínculo com o preso – a praticar a conduta de tráfico ilícito de drogas, com a qualificadora de transporte no interior de estabelecimento prisional.

Não bastasse a ausência da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, a demonstrar que a Lei de Drogas não está em conformidade (a) com a Constituição Federal (arts. 1º, III, 3º, I e 5º, I), (b) com as Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos, e (c) com o cenário histórico, socioeconômico e cultural brasileiro; tem-se, também, que os atores judiciários da segunda e da terceira fases do processo de criminalização (Magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública) cegam-se, no processo penal, quanto à presença da vulnerabilidade da mulher.

Isto porque, nos crimes de tráfico ilícito de drogas, com a agravante de transporte da droga no interior de estabelecimento prisional, os atores judiciários referidos acreditam não haver parâmetro legal de aplicação para isenção da pena por ausência de culpabilidade (CPP, art. 386, VI).

O presente artigo tem como pretensão demonstrar que o reconhecimento da precedente vulnerabilidade da mulher nos crimes de tráfico ilícito de drogas, com a qualificadora de transporte no interior de estabelecimentos prisionais, contribuíra para que a Lei de Drogas e as decisões judiciais integrem-se congruentemente à igualdade substancial já proclamada pelo Supremo Tribunal Federal, em favor das mulheres, na ADC 19 e na ADI 4429.

A omissão do Estado Brasileiro quanto à inclusão da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, arts. 33, caput, c/c 40, III, viola os direitos humanos da mulher, constituindo-se como violência estrutural[3] ou institucional.

CASTILHO (2008:101-123)[4] observa que:

É comum a utilização do termo “gênero” como sinônimo de “mulheres”. Acredita-se que a simples referência ou preocupação com as mulheres em determinado contexto basta para implementar a perspectiva de gênero. É importante, em qualquer estudo social, tornar visíveis as mulheres, mas isso, por si só, não configura a visão de gênero. A Criminologia Crítica feminista mostra como o sistema penal é sexista, como reproduz a desigualdade entre homens e mulheres, mesmo quando, aparentemente, suas regras estão formalmente destinadas a proteger as mulheres.

A partir da abordagem das circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais, que estão ao redor da mulher, alterca-se a necessidade de as análises magistrais, ministeriais e as das defensorias examinarem, sob a perspectiva de gênero, a presença ou não da precedente vulnerabilidade na Lei n.º 11.343/2006.

O artigo não objetiva o consenso de que todo e qualquer crime de tráfico ilícito de drogas, quando praticado por mulher, inviabilize a custódia.

É óbvio que há situações em que a custódia é o remédio para a proteção da ordem pública e para o interesse da justiça.

Vislumbra-se, contudo, que a peculiar situação de mulheres em precedente situação de vulnerabilidade, primárias, com bons antecedentes, não dedicadas às atividades criminosas e não integrantes de organização criminosa, quando, pela primeira vez, praticarem o crime do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, possam obter o direito ao exame – na denúncia e na sentença, expressamente declarados (CF, art. 93, IX) – de todas as circunstâncias que estão em seu entorno, para, se o caso: (a) afastar-se a culpabilidade (CPP, art. 386, VI), (b) reconhecer-se a coação irresistível (CPP, art. 386, VI c/c CP, art. 22), ou, em último caso, (c) serem condenadas.

Propõe-se o artigo em mais sete tópicos e quatro subtópicos, divididos da seguinte forma: 1. Abordagem histórica, socioeconômica e cultural; 2. Conceito de gênero; 3. Feminização de delitos de drogas; 4. Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos; 5. Jurisprudência dos Tribunais, 5.1. Tribunais Superiores, 5.2. Tribunais Estaduais e o DF; 6. Legislação Estrangeira, 6.1. Inglaterra, 6.2. República da Costa Rica; 7. Projeto de Lei da Câmara n.º 37/2013.


1. Abordagem histórica, socioeconômica e cultural.           

A história, para SOARES (1978:246)[5], mostra que as desigualdades jurídico-sociais tiveram início com o surgimento das propriedades privadas no final do período Homérico (séc. XII a VII a.C.) e, por consequência, os homens assumiram relevantes papéis nas sociedades (regime patriarcal), inclusive, o monopólio da política.

A educação feminina no regime patriarcal era baseada na privação: confinamento ao lar, severas prescrições, e desfavorecimento em relação ao homem, tudo controlado pelo mecanismo da violência manifestado física, psicológica e simbolicamente (BOURDIEU. Apud Küher, 2002:24)[6].

No século VIII a.C., Homero (HOMERO, 2002:117)[7] disse: (...) cada um dita a lei aos filhos e às esposas (...).

No plano religioso, o advento do cristianismo não proporcionou mudanças na condição da mulher, ratificando a ideia desta como inferior, submissa e devedora de obediência ao marido[8][9].

Percebe-se, então, que durante séculos a mulher esteve relegada às funções do lar e aos prazeres e desejos masculinos, sendo submetida a todo tipo de constrangimento, submissão, opressão e monopólio.

O capitalismo e a formação de uma sociedade de consumo fomentaram a opressão, a coação e o determinismo biológico[10] (ANDRADE, 2011:41-42) sobre a mulher, contribuindo, este último, para a hierarquização das diferenças de gênero e, por consequência, para a inferiorização das mulheres.

Impera, ainda hoje, o pensamento machista.

A propósito, quantas mulheres continuam a ser valorizadas mais pelo aspecto físico (mulher maça, mulher melancia, mulher jaca, mulher filé, etc.) do que pela (a) competência, (b) profissionalidade, (c) obras da inteligência, (d) riqueza da sua sensibilidade e, em última análise, pela própria dignidade do seu ser!

Infelizmente, a mulher é herdeira de uma história com imensos condicionamentos de violência estrutural ou institucional que, nas diversas épocas, tornaram o seu caminho difícil: reduzida à escravidão, deturpada nas suas prerrogativas, não raro marginalizada e ignorada na sua dignidade.

Na contemporaneidade, mesmo com o desenvolvimento jurídico, socioeconômico e cultural da humanidade, as antigas circunstâncias que se antepunham à mulher continuam presentes: patriarcado, inferioridade da mulher, dever de obediência, violência física, psíquica, moral, patrimonial, econômica, as quais denotam a dominação masculina e a desigualdade entre homens e mulheres.

Afora as exceções, as circunstâncias ao redor da mulher impediram-na de ser profundamente ela mesma.

Como epicentro da família, cuja proteção encontra-se no art. 226 da Constituição Federal, não há se admitir que a mulher vulnerável seja relegada ao jugo do patriarcado, da dominação masculina e da omissão do Estado, porque são violências que empobrecem a sociedade brasileira, mundial e a própria humanidade inteira das riquezas que, naturalmente, estão internalizadas na mulher.

Urge, no atual estágio da realidade jurídica, socioeconômica e cultural brasileira, assegurar – onde quer que seja e nos moldes que afirmado pela Constituição Federal, pelas Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos da Mulher e pelo microssistema da Lei Maria da Penha – a dignidade da pessoa humana, a liberdade, a justeza, a solidariedade e a igualdade material.

Cuida-se de um ato de justiça e de uma necessidade social incluir a perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, mormente nos casos – que são muitos – de crime do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, praticados por mulheres em precedente situação de risco (vulnerabilidade).

Em tal grau, dado que as normas penais, processuais penais e penitenciárias estão, em sua essência e na extensa maioria, formuladas para a prática de crimes tipicamente masculinos, o Estado Brasileiro e os atores das três fases do processo de criminalização têm o ônus de atualizarem esses sistemas, sob a perspectiva de gênero.

Neste terceiro milênio, não é cabível às instituições Legislativas, Judiciárias, Ministério Público e Defensoria Pública permanecerem passíveis e resignadas diante do fenômeno tratado neste artigo, qual seja, a cegueira e indiferença da vulnerabilidade e desigualdade de gênero no art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei de Drogas, os quais têm causado enorme recrudescimento de encarceramento de mulheres, cujas circunstâncias judiciais (CP, art. 59) são todas favoráveis.

É hora de condenar vigorosamente o explorador da vulnerabilidade da mulher (CP, art. 22), o qual a recruta para o crime de tráfico ilícito de drogas para o interior de estabelecimento prisional.

Assim não se podendo concluir, é hora, então, de dar vida a instrumentos legislativos e judiciários – inclusive de forma concreta nas análises magistrais e ministeriais – de defesa contra quaisquer tipos de violência contra a mulher, inclusive estrutural ou institucional.

Neste século XXI, não há mais se admitir a difusa cultura hedonista e mercantilista que, tomadas sob o aspecto da maldade, promovem o prazer pela violência e sistemática exploração da mulher, levando-as, entre outros fatores socioeconômicos, a cair no circuito do tráfico ilícito de drogas.

Para o Ministro Ricardo Lewandowski[11] as mulheres sofrem permanente coação moral e física que inibe a sua livre manifestação da vontade.

A força das sedimentações culturais que, ao longo dos séculos, plasmaram mentalidades e instituições, certamente, não permite atribuir precisas responsabilidades.

Entretanto, resulta que as desigualdades devem ser enfrentadas criativamente por meio do referencial do debate jurídico-científico, na espécie e quanto ao tema, sob a ótica da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006.

Espera-se, então – ao menos enquanto não houver alteração legislativa da Lei n.º 11.343/2006, inclusiva da perspectiva de gênero –, que os atores judiciários das segundas e terceiras fases do processo de criminalização, muito mais que numa simples atividade de subsunção do fato à norma, atualizem o conteúdo significativo do art. 33, caput, c/c o art. 40, inciso III, da Lei de Drogas, a fim de associá-los aos princípios fundamentais que alicerçam a ordem jurídica e democrática, entre os quais os da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), da construção de uma sociedade livre, justa e solidária (CF, art. 3º, I) e da igualdade substancial (CF, art. 5º, I).

Ver além e estabelecer novos horizontes de discussão, da mesma forma como se fez na ADC 19 e na ADI 4424 em relação à Lei Maria da Penha, permitirá discutir se a vulnerabilidade e a igualdade material, sob a perspectiva de gênero, devem compor o espaço de conformação do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, quando praticado por mulheres.


2. Conceito de gênero

A distribuição de poder entre homens e mulheres, a partir da desigualdade de gênero, envolve o exame de como se constituem essas relações, nos diversos estratos socioeconômicos e segmentos populacionais distintos.

ROWBOTHAM (2004:53)[12] afirma que o conceito de gênero viabiliza entender a forma pela qual o poder, nas relações entre homens e mulheres, é definido, estruturado e exercido, conclamando, contudo, para a necessidade de não se perder de vista outros fatores sociais que subordinam a mulher.

Segundo a socióloga inglesa da Universidade de Manchester, o conceito de gênero não deve congelar nosso olhar, tornando difícil enxergar aqueles aspectos da subordinação das mulheres afetadas por outros fatores sociais (ROWBOTHAM, 2004:53)[13].

No sentido de se promover constantemente redefinições para o conceito de gênero, ROWBOTHAM (2004:54)[14] anota:

...é importante perceber o gênero não como um conceito fixo, mas como sendo constantemente redefinido e moldado pelos indivíduos em situações históricas particulares nas quais eles se encontram.

CASTILHO (2006)[15] informa não haver definição da palavra gênero, demonstrando tratar-se – como o fez Sheila Rowbotham –, de termo que está em constante redefinição (construção) a despender das circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais, visto que é um modo de pensar que viabiliza a mudança nas relações sociais e, por consequência, nas relações de poder.

Confiram-se as anotações doutrinárias da Penalista e Criminologista da Universidade de Brasília:

       A palavra gênero começa a ser utilizada nos anos 80 do século XX, pelas feministas americanas e inglesas, para explicar a desigualdade entre homens e mulheres concretizada em discriminação e opressão das mulheres. Nessa época, as investigações sobre a condição social das mulheres já apontavam uma forte desigualdade entre homens e mulheres, que tendia a aumentar conforme a classe social, raça, etnia e outras condições de vida. A desigualdade abarcava a esfera pública e privada. Na primeira, era visível nos salários menores do que o dos homens em serviços iguais e na pequena participação política. Na esfera privada, se evidenciava pela dupla moral sexual e na delegação de papéis domésticos.

A desigualdade era e ainda é justificada, por setores conservadores religiosos, científicos e políticos, pela diferença biológica entre homens e mulheres. Muitos creem que as diferenças sociais são essenciais, naturais e inevitáveis.

O sexo é uma categoria biológica insuficiente para explicar os papéis sociais atribuídos ao homem e à mulher. “Gênero” veio como uma categoria de análise das ciências sociais para questionar a suposta essencialidade da diferença dos sexos, a ideia de que mulheres são passivas, emocionais e frágeis; homens são ativos, racionais e fortes. Na perspectiva de gênero, essas características são produto de uma situação histórico-cultural e política; as diferenças são produto de uma construção social. Portanto, não existe naturalmente o gênero masculino e feminino.

Gênero é uma categoria relacional do feminino e do masculino. Considera as diferenças biológicas entre os sexos, reconhece a desigualdade, mas não admite como justificativa para a violência, para a exclusão e para a desigualdade de oportunidades no trabalho, na educação e na política. É um modo de pensar que viabiliza a mudança nas relações sociais e, por consequência, nas relações de poder. É um instrumento para entender as relações sociais e, particularmente, as relações sociais entre mulheres e homens.

Gênero tem a ver com feminismo, mas não é igual a mulher ou a feminismo. As relações de gênero podem ser estudadas a partir da identidade feminina e masculina. Gênero significa relações entre homens e mulheres. Uma análise de gênero pode se limitar a descrever essas relações. O feminismo vai além ao mostrar que essas relações são de poder e que produzem injustiça.

A expressão gênero vem, paulatinamente, se incorporando nos instrumentos normativos internacionais e na legislação dos países. No Brasil, foi introduzida na Convenção de Belém do Pará (Decreto n. 1.973, de 01/08/1996), para esclarecer o conceito de violência contra a mulher como qualquer ato ou conduta baseada no gênero. Não há definição de gênero, mas do contexto se infere o conceito de relação de poder. Aparece também no Estatuto de Roma (Decreto n. 4.388, de 25/09/2002), com um significado mais restrito.

O Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma, incorpora (a) uma definição de gênero, (b) o princípio da não-discriminação baseada em gênero, (c) normas de procedimento e prova, proteção e participação em relação a vítimas e testemunhas de crimes de violência sexual, e (d) criminaliza em nível internacional a violência sexual e de gênero.

O primeiro ponto notável é a introdução do conceito gênero em um instrumento legal internacional. De acordo com o art. 7º, item 3, “entende-se que o termo “gênero” abrange os sexos masculino e feminino, dentro do contexto da sociedade, não lhe devendo ser atribuído qualquer outro significado”. É uma redação fruto de negociação intensa com o Vaticano e os países islâmicos, que reduzem o gênero a uma questão biológica. A expressão “dentro do contexto da sociedade” dá-lhe a perspectiva cultural necessária, embora de forma imprecisa e insuficiente.

Com a criação, no Brasil, da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, em 2003, fortaleceu-se a perspectiva de gênero em todas as políticas públicas.

O conceito de gênero segue em construção. A identidade sexual, antes dicotômica (masculino-feminino), ampliou-se para abranger homossexuais, lésbicas, transexuais, travestis etc., que não se identificam como homens ou mulheres. Hoje se sabe que o suposto sexo biológico e a identidade subjetiva nem sempre coincidem.

Uma das versões mais atuais do conceito de gênero, de Marta Lamas, alude a uma rede de inter-relações e interações sociais que se constroem a partir da divisão simbólica dos sexos. Lamas nega qualquer base biológica e mesmo cultural à noção de gênero. A seu ver, é uma lógica de pensamento, emoções e representação da subjetividade íntima das pessoas[16].             

No atual contexto da sociedade brasileira – a despeito das conquistas femininas em vários espaços dos segmentos sociais –, não há se negar que, nos estratos socioeconômicos mais baixos, a mulher continua, ainda, relegada na divisão social do trabalho, restringindo-se ao âmbito das privacidades familiar e amorosa, imunes e opacos às intervenções e às visibilidades externas, sendo vítima de todo e qualquer tipo de violência de gênero (TEIXEIRA:2010)[17].

A respeito da violência baseada no gênero, PIOVESAN (2009:229)[18] ensina:

...a violência contra a mulher constitui ofensa à dignidade humana, sendo manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens. (...) Vale dizer, a violência baseada no gênero ocorre quando um ato é dirigido contra a mulher porque é mulher, ou quando atos afetam as mulheres de forma desproporcional.

Hodiernamente, a violência sobre a mulher de estratos socioeconômicos vulneráveis é tão desprezível que ela serve de objeto –coisificação[19] (MELHEM, 2013:2) – para vender e transportar todo tipo de produto, inclusive, e o que é pior, drogas ilícitas dentro de seu próprio corpo.


3. Feminização de delito de drogas

GIACOMELLO (2013:2-3)[20] consigna que as mulheres, na escala das organizações criminosas de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ocupam posições baixas e se encontram em situação de vulnerabilidade.

Segundo a Doutora, Investigadora da Universidad Nacional Autónoma de México:

       São apresentadas principalmente como cultivadoras, coletoras, vendedoras de varejo, correios humanos (o que é geralmente conhecido como 'mulas' ou 'burreras', entre outros nomes) e introdutoras de drogas em centros de reclusão.

       (…).

….muitas delas são mães solteiras que entram no negócio das drogas somente para poder alimentar seus filhos.

       (…).

       Na América Latina coexistem processos mistos a respeito do papel das mulheres: por um lado, estas têm maior acesso à educação e uma maior presença nos espaços públicos, mas também são as principais protagonistas da pobreza e da pobreza extrema. Muitas vezes isto se combina com a maternidade e a responsabilidade tradicional das mulheres para com 'os outros'. O número de famílias monoparentais chefiadas por mulheres e de gravidezes adolescentes entre meninas dos níveis socioeconômicos mais baixos está aumentando, o que implica um maior número de mulheres em situação de pobreza e responsáveis únicas de seus filhos.

       (…).

       Estas mulheres encontram normalmente emprego nas atividades da economia informal muito mal remuneradas (atividades de limpeza) e desempenham uma dupla ou tripla jornada laboral. As redes de tráfico identificam muito bem as mulheres que relutam e as envolvem aproveitando sua vulnerabilidade e, por outro lado, há a falta de mecanismos preventivos e de proteção por parte do Estado.

       (…).

       Frente a isto, se faz necessário adaptar a perspectiva de gênero para analisar espaços como o narcotráfico, o que permite visibilizar como homens e mulheres se envolvem em atividades delituosas relacionadas com drogas de maneira diferente, a partir de diversos fatores, entre eles sua identidade de gênero e os papéis que a sociedade os atribuem[21]. (tradução nossa)

Em mesa redonda organizada pela Comisión Interamericana para el Control del Abuso de Drogas - CICAD (2014:34-38)[22], distribuiu-se questionário a 34 (trinta e quatro) Estados Membros da Organização dos Estados Americanos (OEA), entre eles o Brasil, obtendo deste país, no que toca à posição da mulher no tráfico ilícito de drogas e à situação de maior relevo que as leva ao encarceramento, a seguinte resposta:

Tem havido um aumento do número de mulheres condenadas por narcotráfico. A CIDH assinala que, do total de 549.577 pessoas privadas da liberdade: 30.039 são mulheres (6.6%). Tanto para os homens (24.8%) como para as mulheres (53.9%), o tráfico de drogas (não internacional) tem sido o principal motivo de encarceramento, ainda que para as mulheres, a proporção em comparação com outros tipos de delito é muito maior.

Na maioria dos casos estão envolvidas com atividades conexas, ocupando um posto marginal na estrutura do tráfico de drogas. A Secretaria de Políticas para as Mulheres e a Secretaria de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres indicam que as mulheres tendem a ter menos recursos para negociar sua liberdade e não serem presas.

Uma situação comum é quando as mulheres tratam de introduzir drogas nos estabelecimentos prisionais para seus cônjuges, companheiros, membros de sua família e, neste momento, são presas. Os contextos que facilitam a participação das mulheres no narcotráfico refletem a falta de oportunidades que há no mercado de trabalho formal, a atração de pertencer a uma rede poderosa, o desejo por adquirir status, poder numa cultura masculina e a sólida presença do narcotráfico nas comunidades economicamente instáveis. (tradução nossa)

O perfil da mulher presidiária no Brasil é o da mulher com filho, sem estudo formal ou com pouco estudo na escola elementar, pertencente à camada financeiramente vulnerável e hipossuficiente e que, na época do crime, encontrava-se desempregada ou subempregada.

BIANCHINI e BARROSO (2012)[23] dizem que, em geral, as mulheres criminosas são negras ou pardas (20.756 delas, enquanto apenas 9.318 são brancas – MACEDO, 2010 –, num universo em que a população negra ou parda é de 91 e a branca de 92 milhões de pessoas, no Brasil – SEADE, 2011:1).

Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN[24], datado de 2013, o encarceramento de mulheres cresceu 256% nos últimos 12 anos.

Atualmente, 7% de todos os presos no Brasil são mulheres, o que corresponde a algo em torno de 36 mil detentas[25].

Esses dados demonstram que a Lei n.º 11.343/2006, nos seus 8 anos de vigência, elevou substancialmente o número de mulheres presas, em boa parte dos casos condenadas pelo art. 33, caput, c/c o art. 40, III, dada a relação afetiva entre a mulher e o homem que a atrai para o tráfico ilícito de entorpecentes ou por problemas socioeconômicos.

ROSA (2011)[26], em questionamento que faz sob o título: “Levar drogas para parente no estabelecimento penal é tráfico?”, anota que aquilo que pode parecer só mais uma modalidade de tráfico, quem sabe, pode ser o sintoma de uma conduta, que está sendo mal avaliada por quem é incapaz de perceber o seu entorno, ou seja, no fundo, muitas destas mulheres não possuem escolha.

Não bastasse a ablepsia do legislador, a cegueira da desigualdade de gênero ilude – de quem mais se espera Justiça – os atores judiciários do processo de criminalização secundária e terciária, os quais não percebem as circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais que estão entorno da conduta de tráfico ilícito de entorpecentes da mulher (mormente em presídio).

Quais seriam, então, esses entornos?

Sem esgotar as possibilidades, tem-se que a mulher ao traficar (a) está, quase sempre, vinculada em família com pessoas que traficam; (b) tem o sentimento interno de consolo exposto por ter feito isso por amor ao marido, companheiro, namorado, filho, neto, sobrinho, etc. [especialmente no tráfico em presídio]; (c) é seduzida, ludibriada, oprimida e/ou coagida [especialmente no tráfico em presídio]; (d) somente denota o conceito social, biologizado (BOURDIEU Apud KÜHER, 2002:9)[27], de que lhe cabem apenas tarefas de cuidado, de zelo, de compaixão, de fraternidade pelos entes familiares e/ou queridos [especialmente no tráfico em presídio]; (e) está desempregada ou em subemprego; (f) tem filhos menores que são dependentes psicológica e economicamente; (g) tem pessoas maiores incapazes dependentes de cuidado físico, psicológico e econômico; e (i) não alcançam a capacidade própria de determinação diante do fato [especialmente no tráfico em presídio].

Esses fatores – tomados a título de exemplo – clarificam o quanto a Lei n.º 11.343/2006 e boa parte dos atores do processo de criminalização, nas três fases, não notam a vulnerabilidade e a desigualdade de gênero, que reforçam o papel dominado daquela que está instintiva e culturalmente subalterna, submissa, obediente e humilhada, principalmente no cenário da Lei de Drogas.

BOURDIEU (Apud KÜHER, 2002:51)[28] leciona que os atos de conhecimento e de reconhecimento práticos da fronteira mágica entre dominantes e dominados, que a magia do poder simbólico desencadeia, e pelos quais os dominados contribuem, muitas vezes à sua revelia, ou até contra sua vontade, para sua própria dominação, aceitando tacitamente os limites impostos, assumem muitas vezes a forma de emoções corporais – vergonha, humilhação, timidez, ansiedade, culpa – ou de paixões e de sentimentos – amor, admiração, respeito –, emoções que se mostram ainda mais dolorosas, por vezes por se traírem em manifestações visíveis, como o enrubescer, o gaguejar, o desajeitamento, o tremor, a cólera ou a raiva onipotente, e outras tantas maneiras de se submeter, mesmo de má vontade ou até contra a vontade, ao juízo dominante, ou outras tantas maneiras de vivenciar, não raro com conflito interno e clivagem do ego, a cumplicidade subterrânea que um corpo que se subtrai às diretivas da consciência e da vontade estabelece com as censuras inerentes às estruturas sociais.

Os mais cépticos, esmagadora maioria, entendem, contudo, inexistir fundamento jurídico para olvidar a prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

Mister, porém, como o fez o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande Sul[29], que estando presente a vulnerabilidade geradora de fundada dúvida quanto à culpabilidade da mulher deve-se aplicar o art. 386, inciso VI, do CPP, até mesmo em homenagem ao princípio do favor rei.

Não se há de negar que a enorme maioria das transportadoras de drogas para presos é constituída de mulheres advindas de estratos socioeconômicos vulneráveis e ligadas emocionalmente aos seus entes queridos.

Vislumbra-se, nesse prisma, não só o desemprego, a pobreza – até mesmo a miséria –, mas também a fidelidade do amor, do cuidado feminino e a subordinação aos presos.

Tais aspectos conduzem, neste ponto, à adequada interrogação sobre a dignidade da mulher e sua vocação.

Ao se dizer que a mulher é aquela que ama para, então, receber amor, não se está a entender só, ou antes de tudo, a relação esponsal específica do matrimônio, senão algo mais universal, baseado no fato, em si mesmo, do ser feminino no conjunto das relações interpessoais, que nas formas mais diversas estruturam a convivência familiar, comunitária, social e a colaboração entre as pessoas: homens e mulheres.

Em outras palavras, sob o foco de um horizonte mais ampliado, a mulher representa um valor particular como pessoa humana e, ao mesmo tempo, como pessoa concreta, pelo só fato de que a violência baseada no gênero ocorre quando um ato é dirigido contra a mulher porque é mulher (PIOVESAN, 2009:229)[30], a demandar, por essa razão, atuação concreta do Estado no sentido de afirmar a dignidade da pessoa humana, a liberdade, a justeza e a igualdade material entre homens e mulheres.

Por óbvio, se assim não fosse, não se teria na própria constituição federal e legislação ordinária parâmetros de distinção entre homens e mulheres, os quais concretizam a igualdade material retroafirmada –, como por exemplo, só para citar alguns, os arts. 7º, XX, 40, §1º, III, “a” e “b”, 143, §2º, 201, §7°, I e II, e 10, §, 1° (ADCT), todos da CF/1988 e, também, a própria Lei nº 11.340/2006.

Não se olvida, ainda, que muitas das mulheres que se envolvem com o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins (especialmente no transporte a estabelecimentos prisionais) são mães, pobres e responsáveis por pessoas que delas dependem econômica, psicológica e até fisicamente, capazes ou incapazes.

A necessidade de cuidar e sustentar as pessoas do núcleo familiar e/ou prestar solidariedade aos parceiros presos, por certo, supera o medo que essas mulheres têm de acabar na prisão ao tentarem introduzir drogas em estabelecimentos prisionais.

Por isso mesmo, diante da natureza velada ou face oculta da violência – direta ou indireta, estrutural ou institucional –, contra a mulher de estrato socioeconômico vulnerável, a expor a risco ela própria, a sua família e a paz social, reclama-se dos tribunais nacionais conferir efetiva hermenêutica constitucional e de direitos humanos da mulher, sob a perspectiva de gênero, ao art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006.

CHAVARRIA (2008:43-44)[31], ao examinar as condicionantes de vulnerabilidade da mulher condenada e privada da liberdade por força da Lei Drogas do Panamá, assentou:

No entanto, estas representações limitam a compreensão do fenômeno das mulheres dentro do tráfico de drogas e o polarizam. Por um lado se identifica estas mulheres como mães desinteressadas, despreocupadas pelos cuidados de seus filhos, ingênuas e débeis por se deixarem manipular por um homem que as engana e as utiliza para seus negócios ilícitos e onde elas não têm poder de decisão. Em outro extremo estão as mulheres identificadas como problemáticas, aquelas que em razão de seu vício não logram materializar as oportunidades que a sociedade lhes oferece, mães más, prostitutas, ladras e responsáveis por seu próprio destino. Ambas posturas complicam a compreensão integral do fenômeno e delimitam as soluções do problema ao não integrarem em suas análises os diferentes fatores que intervém em cada caso e como é necessário compreender a interação entre aspectos estruturais e situações particulares.

O aumento da participação das mulheres neste tipo de atividade é uma situação que se inscreve em um contexto onde a desigualdade de gênero é um fenômeno de dimensões estruturais, e que se tornou invisível ao longo da história.

Somente tomando em conta que a desigualdade de gênero tem dimensões estruturais que atravessam todas as situações sociais será possível criar estratégias que permitam resolver os problemas com sucesso.

Para Teresa Incháustegui (2002) ao considerar o enfoque de gênero na criação de soluções para um problema de interesse social e público facilita em se reconhecer as diferenças entre os sexos, como base para a eleição e formulação de políticas públicas, assim como nos procedimentos de evolução e reprogramação de políticas sociais.

No contexto latinoamericano, estas recentes manifestações de criminalidade feminina requerem o exame das completas condições sociopolíticas da região, exacerbadas pelas crises fiscais e a crescente deterioração econômica dos últimos anos, que tem aumentado os níveis de pobreza e o crescente desenvolvimento da chamada economia informal, controlada em grande parte pelo setor feminino. A seu turno, há que se destacar o espetacular desenvolvimento da agroindústria das drogas que como empresas transnacionais buscam recursos básicos de todo tipo, por isso de maneira informal, devido a ilegalidade de seu funcionamento (del Olmo: 2000)[32]. (tradução nossa)

A falta de leis e políticas adequadas para abordar os problemas das mulheres encarceradas, bem assim o papel dessas na sociedade e o estigma que sofrem, foi objeto de estudo da Criminologista Chilena GARCÍA (2007:1)[33], que, em esclarecedores linhas, anota:

A situação das prisões femininas é dramática. Não só porque as mulheres detidas sofrem o estigma de romper com o papel de esposas submissas e mães presentes que lhes foi atribuído pela sociedade, mas também pela falta de leis e políticas adequadas para abordar problemas como os de mães lactantes e dos filhos de mulheres encarceradas. Isso se soma a outras questões, como a violência sexual e a superlotação resultado do aumento da população carcerária feminina, geralmente por delitos relacionados com o microtráfico de drogas. Este artigo argumenta que, para resolver estes graves problemas, é necessário incluir um enfoque de gênero nas políticas penais e penitenciárias[34].

Indaga-se: na criminalização secundária, isto é, na definição da conduta punível em concreto e de quem é criminoso, tratando-se de tráfico [ilícito de drogas praticado por] mulheres [em situação de vulnerabilidade], os juízes examinam a prova e sentenciam desde uma perspectiva de gênero? Se a resposta for positiva significa que esses profissionais de direito estão atentos à desigualdade material entre homens e mulheres, estão conscientes de sua causa e, portanto, cuidam para que o processo penal não reforce a vitimização delas ou, em outras palavras, não reproduza a violência de gênero contra as mulheres. Se a resposta for negativa significa que o processo penal reproduz a violência contra as mulheres (CASTILHO, 2008:103)[35].

Percebe-se, então, que não se pode perder de vista os cenários históricos, socioeconômicos e culturais que criaram condições propícias para as desigualdades de gênero, ainda hoje vigentes, que necessitam ser eliminados do contexto social ligados às mulheres vulneráveis.

Essas circunstâncias trazem à tona o atualíssimo questionamento e resposta, que, à época do julgamento da ADI 4424, o Ministro Ricardo Lewandowski[36] fez para, entre outros fundamentos, solucionar a ação direta de inconstitucionalidade, confira-se:

O que acontece com a mulher, sobretudo a mulher fragilizada, que se situa nos extratos inferiores da camada social? Ela está exatamente nesta condição: sob permanente temor de sofrer um dano pessoal, ou que os seus filhos ou familiares sofram um dano, ou que o seu patrimônio, de certa maneira, sofra também algum atentado.

Não se duvida, pois – na conformidade das palavras do Ministro Lewandowski –, que é essa a fotografia da realidade socioeconômica e cultural brasileira, de modo que cabe aos atores das três fases do processo de criminalização tomarem providências para proteger a mulher em situação de vulnerabilidade, quando do tráfico ilícito de drogas com a agravante de transporte no interior de estabelecimento prisional.

A violência de gênero contra mulher, no âmbito do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, é epidemiológica, resulta da dominação masculina, de problemas socioeconômicos e da falta de políticas públicas adequadas, os quais implicam o recrudescido do número de mulheres encarceradas por esse delito.

São determinantes para a aceitação social dessa violência as relações hierarquizadas, o machismo e a omissão Estatal.

SOUZA (2009:50)[37], ao tratar da relação da violência de gênero com os direitos humanos, aponta que a ideia de perpetuação da submissão da mulher ao mando do homem, no sentido de coisificá-la, afronta o art. 1º, inciso III, da CF/1988:

(…). Mas há que se frisar que o legislador procurou, principalmente, firmar a posição de que a violência de gênero não se confunde com as demais formas de violência, porque ela caracteriza-se principalmente na cultura machista do menosprezo pela mulher, bem como na ideia de perpetuação da submissão da mulher ao mando do homem, autorizando a equivocada e nefasta disseminação da inferioridade do gênero feminino em relação ao masculino, permitindo a “coisificação” da mulher, numa afronta direta à doutrina da dignidade da pessoa humana, consolidada já na filosofia kantiana e expressamente inserida no art. 1°, inc. III, da CRFB.

As incidências e reincidências das múltiplas formas de agressões físicas, psicológicas, sexuais, morais e/ou patrimoniais contra a mulher exigem, efetivamente, não perder de vista a teleologia, no contexto subjetivo, que se extrai do art. 1º da Lei n.º 11.340/2006, porque a finalidade ali prevista permeia o campo de proteção alçado por normas de direitos humanos, espaço que, no âmbito da normatização brasileira, insere-se no cuidado à dignidade da pessoa humana.    SOUZA (2009:50)[38], depois de se referir ao contexto objetivo do art. 1º da Lei n.º 11.340/2006, explica o contexto subjetivo sob os argumentos de que:

...no contexto subjetivo, a preocupação é a proteção da mulher, contra os atos de violência praticados por homens ou mulheres com os quais ela tenha ou haja tido um relação marital ou de afetividade, ou ainda por qualquer pessoa (não importando sequer a orientação sexual), com as quais conviva no âmbito doméstico e familiar, tais quais o pai, o irmão, o cunhado, a filha, o filho, a neta, o neto etc., ou com quem mantenha ou já tenha mantido relação de intimidade, não havendo em relação a essas pessoas a exigência de que a violência tenha ocorrido no âmbito físico-espacial do lugar de convivência, podendo ocorrer em qualquer lugar.

Os fundamentos de Sérgio Ricardo de Souza alinham-se ao pensamento de BOURDIEU (Apud KÜHER, 2002:16)[39], que, ao discorrer sobre a diferença de gênero, divide-os em aspectos objetivo e subjetivo.

Alcança-se, então, que a proteção subjetiva constante do art. 1º da Lei n.º 11.340/2006, em virtude do espectro de proteção da dignidade da pessoa humana, merece ampliação da interpretação para o espaço de conformação da Lei n.º 11.343/2006, nos casos em que a mulher na situação de vulnerabilidade praticar o crime previsto no art. 33, caput, c/c o art. 40, III da Lei de Drogas.

Mais, as normas constitucionais não só admitiram, expressamente, a existência das igualdades materiais – tratar os iguais na medida de suas desigualdades –, como estabeleceram os alcances dos fundamentos (CF, art. 1º, III), objetivos (CF, art. 3º, I) e garantias (CF, art. 5º, I) da República Federativa do Brasil, os quais exigem comportamentos ativos e pedem ações afirmativas sob a perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, como as insertas na Lei 11.340/2006.

É patente, na Lei de Drogas, a desigualdade existente entre os gêneros a merecer o devido tratamento pelos atores das três fases do processo de criminalização, igualando-se substancialmente, dessa forma, homens e mulheres.

KI-MOON (2011)[40], à época, Secretário-Geral da ONU, no dia 25/11/2011 (dia Internacional para a Eliminação da Violência contra a Mulher), discorreu sobre as diversas formas de violência contra as mulheres, afirmando:

       A violência contra mulheres e meninas tem muitas formas e é generalizada em todo o mundo. Ela inclui estupro, violência doméstica, assédio no trabalho, abusos na escola, mutilação genital e a violência sexual em conflitos armados. Ela é predominantemente causada por homens. Seja em países desenvolvidos ou em desenvolvimento, a perversidade desta violência deve chocar a todos. A violência – e, em muitos casos, a simples ameaça da mesma – é uma das barreiras mais significantes para a plena igualdade das mulheres.

Sobre a concreção do princípio da igualdade, o Ministro Eros Roberto Grau, quando do julgado da ADI 3305/DF[41], conceituou que:

       A concreção do princípio da igualdade reclama a prévia determinação de quais sejam os iguais e quais sejam os desiguais. O direito deve distinguir pessoas e situações distintas entre si, a fim de conferir tratamentos normativos diversos a pessoas e a situações que não sejam iguais. 4. Os atos normativos podem, sem violação do princípio da igualdade, distinguir situações a fim de conferir a um tratamento diverso do que atribui a outra. É necessário que a discriminação guarde compatibilidade com o conteúdo do princípio.

O tratamento diferenciado, a se conferir na Lei n.º 11.343/2006, coerentemente com os preceitos constitucionais, constituirá ação afirmativa que visa buscar maior e melhor proteção à mulher vítima de violência de gênero em razão de sua vulnerabilidade, homenageando-se, em análise primeira, as diretrizes constitucionais e dos direitos humanos da mulher: dignidade da pessoa humana, liberdade, justeza, solidariedade e igualdade material.

Embora sobre o exame da Lei n.º 11.340/2006 – mas com largo espaço de aplicação na Lei n.º 11.343/2006 –, CORRÊA (2008)[42], Promotora de Justiça do Estado de Mato Grosso, ao examinar a desigualdade material existente entre homens e mulheres, leciona que o Estado tem a obrigação de criar normas de ação afirmativa que visam alcançar o ideal de igualdade efetiva, sob pena de a omissão constituir verdadeira inconstitucionalidade. Confira-se:

       Parece-nos claro que o ordenamento jurídico brasileiro não só permite ao Estado a promoção de políticas de ações afirmativas, como as impõe, a fim de que sejam alcançados os direitos fundamentais baseados no artigo 3º da Constituição Federal, pois na sua redação temos o emprego de verbos como 'erradicar, construir, reduzir e promover', devendo o ente público desenvolver um comportamento ativo, positivo e eficaz neste sentido.

De outra parte, o art. 5º, caput, da Constituição Federal, analisado em conjunto com o art. 3º, ao afirmar que todos são iguais perante a lei, estabelece que: o Estado garantirá a todos o direito à igualdade, sem ignorar as desigualdades existentes, que motivam, dentre outras medidas, a criação das normas de ação afirmativa, visando o alcance do ideal de igualdade efetivo idealizado pelo legislador constituinte ao descrevê-lo formalmente.

Muito já se disse sobre a desigualdade material existente entre homens e mulheres, cujos dados estatísticos demonstrados certamente serão capazes de convencer até os mais incrédulos que porventura se imaginem vivendo em um país em que tal igualdade seja real, sendo certo que o igual tratamento pela lei, para ser legítimo, pressupõe uma igualdade de fato preexistente. Constatando-se que não há igualdade de fato entre homens e mulheres, tratarem-se desiguais como se iguais fossem, é que constituiria a verdadeira inconstitucionalidade.

As ações afirmativas de proteção à mulher, nessa linha, têm encontrado largo campo de concretude.

Argumenta-se, neste artigo – por óbvio à censura dos juristas, porque até mesmo ao se partir do dissenso é possível alcançar o consenso – que o Estado omite-se de sua obrigação de punir, nos crimes de tráfico ilícito de drogas praticados por mulheres em situação de vulnerabilidade, quem realmente deva receber a reprimenda da lei penal, na espécie, o agente coator (art. 22 do CP). Caso não seja possível identificá-lo, considerando que a situação de vulnerabilidade gera fundada dúvida quanto à culpabilidade da mulher, que se aplique, em homenagem ao princípio do favor rei, o art. 386, inciso VI, do CPP – como o fez o Tribunal do Rio Grande do Sul na Apelação Criminal n.º 70058120841.

Manifesta a vulnerabilidade das mulheres, no crime do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, não há se permitir qualquer tipo de esvaziamento do conteúdo de proteção sob a perspectiva de gênero, que, amparada nos fundamentos constitucionais dos arts. 1º, III; 3º, I e 5º, I, requer, ainda sob a força de Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos, ações afirmativas do Estado no âmbito da Lei de Drogas.


4. Convenções e Tratados Internacionais de Direitos Humanos

O direito de as mulheres viverem uma vida livre de qualquer tipo de violência foi estabelecido pela Convenção de Belém do Pará[43], em 1994, porquanto constituem violação aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.   A despeito da Convenção do Pará, àquela época, não ter mencionado especificamente quanto à vulnerabilidade da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, essa situação de risco, sob as muitas formas de violência que se lhe antepõe, reclama previsão na Lei de Drogas.

Frequentemente, a introdução de mulheres no tráfico ilícito de drogas ocorre com ameaças diretas, indiretas, veladas e simbólicas para atuarem como “mulas” – até mesmo humanas – para os autores de organizações criminosas, não se olvidando – o que com maior frequência ocorre – serem elas as transportadoras de entorpecentes para o interior de estabelecimentos prisionais.

A violência contra a mulher constitui ofensa aos direitos humanos[44], porque limita suas liberdades fundamentais total ou parcialmente no sentido de gozar e exercer os direitos decorrentes dessas liberdades, constituindo-se, pois, em clara manifestação das relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens.

MORAES (Apud SARLET, 2009:119)[45] informa que os princípios da igualdade, da integridade [física] e moral [psicofísica, liberdade e solidariedade] são obtidos a partir da propensão ampliativa do princípio-base constitucional, qual seja, da dignidade humana.

O debate, portanto, passa pela violência que as mulheres sofrem nesse processo de recrutamento para o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, violência essa que, num horizonte mais ampliado daquele doméstico, traduz-se na exploração da vulnerabilidade da mulher e de sua família.

A propósito, a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos[46] (1993) realçou a importância de se atuar de modo afirmativo:

...no sentido de eliminação da violência contra as mulheres na vida pública e privada, a eliminação de todas as formas de assédio sexual, a exploração e o tráfico de mulheres, a eliminação de preconceitos contra o sexo feminino na administração da justiça e a erradicação de quaisquer conflitos que possam surgir entre os direitos das mulheres e os efeitos nocivos de certas práticas tradicionais ou consuetudinárias, preconceitos culturais e extremismos religiosos.

Em seu art. 1°, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (ONU)[47], de 18.12.1979, define a discriminação contra a mulher como:

...toda distinção baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil.

Descoberto o conceito de direitos humanos – como direitos inerentes a cada pessoa e anteriores a qualquer Constituição e legislação dos Estados –, alcança-se uma conclusão de trágicas consequências que, na contemporaneidade, incorre numa estranha contradição: justamente neste terceiro milênio em que muito se proclama os direitos fundamentais invioláveis da pessoa e, publicamente, afirma-se o valor da dignidade da pessoa humana, justeza, liberdade, solidariedade e igualdade, esses mesmos direitos são praticamente esquecidos ou negados, particularmente, nos momentos mais críticos da existência, como é o caso das mulheres vulneráveis recrutadas para o tráfico ilícito de drogas.

A propósito, embora sem menção ao tráfico ilícito de drogas, mas com claro viés de proteção de direitos humanos, a Regra 65[48], constante das REGRAS DE BANGKOK, impõe aos Estados signatários – servindo como norteamento aos Estados não signatários – que as decisões judiciais considerem a vulnerabilidade de gênero das jovens do sexo feminino, a fim de evitar a institucionalização.

O disposto na Regra 65 revela similaridade com a vulnerabilidade de gênero das mulheres relativamente ao crime do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, merecendo, por força do princípio Ubi eadem ratio ibi idem jus (onde houver o mesmo fundamento haverá o mesmo direito), tratamento idêntico nas decisões judiciais, a fim de se evitar o encarceramento (institucionalização).

Nesse prisma, constatadas a precedente vulnerabilidade da mulher no crime acima referido e a integral favorabilidade das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, as decisões judiciais devem evitar a custódia e, por consequência, em face da ausência de culpabilidade, conceder-lhes a absolvição na forma do art. 386, VI, do CPP.

Atualmente, em razão da tendência mundial de ampliação das proteções às mulheres, fala-se em danos estruturais e institucionais como violadores dos direitos humanos da mulher, os quais se manifestam como: (a) derivados dos efeitos da organização da economia na vida das mulheres; e (b) derivados da omissão quanto à perspectiva de gênero, neste caso, subdivididos, por exemplo, em: (b.1) comportamentos, (b.2) ideologias, (b.3) atitudes, (b.4) interpretações e aplicações das normas jurídicas, etc.

FREITAS[49], em tese de doutorado no programa de direitos humanos, junto à Universidade Carlos III de Madri, aborda a questão dos danos estruturais e institucionais como violadores de direitos humanos da mulher a partir da perspectiva de gênero. Na síntese, a doutoranda consigna:

A questão será abordada a partir de uma perspectiva de gênero, sublinhando-se que a sociedade e o Estado, envoltos pelo sistema patriarcal, praticam violência estrutural e institucional contra as mulheres, manifestada e transmitida por um tratamento desigual de gêneros, ou através dos comportamentos, ideologias, atitudes, quer através da criação e interpretação da aplicação das normas. Nós estamos falando sobre a violência estrutural e institucional contra as mulheres, engendrada pelo patriarcado e, como resultado, constitui um problema que deve ser enfrentado a partir da perspectiva de poder, dentro ou fora de casa, ou seja, na esfera pública e no campo privado[50]. (tradução nossa)

A revista eletrônica Alemã[51]: “Logo: Mulheres contra a Violência”, no que tange à violência estrutural contra as mulheres anota que:

       Relações desiguais de poder em uma sociedade são muitas vezes em detrimento das mulheres. As mulheres são particularmente afetadas pela violência estrutural e prejudicadas no seu desenvolvimento e sobrevivência. (…).

...outras formas de violência contra as mulheres, como violência doméstica, estão relacionadas à violência estrutural. (…).

A violência estrutural não afeta todas as mulheres de forma igual. As mulheres com deficiência são mais afetadas pela violência estrutural, em primeiro lugar por causa das dependências da deficiência associada e discriminação, por outro lado, por causa de seu gênero. No entanto, as mulheres provenientes de meios desfavorecidos, as mulheres com história de migração, as mulheres lésbicas e bissexuais, transexuais ou pessoas intersexo sofrem uma violência estrutural em maior extensão, devido às múltiplas experiências de discriminação[52].             

Se assim é, o questionamento e a resposta de CASTILHO[53] (2008:103) – já transcritas no tópico 4 deste artigo – alinham-se perfeitamente ao que os estudos jurídicos europeus têm intitulado de “violência estrutural ou institucional”.

Os Poderes Legislativo e Judiciário e as Instituições (Ministério Público e Defensoria Pública), sob pena de reforçarem[54] a violência estrutural e institucional, devem ser capazes de eliminar a ablepsia e indiferença da vulnerabilidade e da desigualdade de gênero na Lei n.º11.343/20006, quando praticados por mulheres em situação de vulnerabilidade.

Essa capacidade homenageia os direitos humanos da mulher e demonstra que o tráfico ilícito de drogas, praticados mulheres em situação de vulnerabilidade, é um problema histórico, social, econômico e cultural, sendo, também, decorrente das estruturas e instituições, públicas ou privadas.

Os direitos humanos das mulheres, pela importância que denotam, são, aqui e ali, invocados pelo Supremo Tribunal Federal para espancar as relações de desigualdade de gênero, a fim de ratificar e/ou conferir maior proteção aos direitos femininos, sejam eles materiais ou processuais, penais ou civis.

Confiram-se, na oportunidade, trechos de votos proferidos pelos Ministros Rosa Weber e Marco Aurélio, quando do julgamento da ADC 19:

                   (Ministra Rosa Weber)

...impende ter em mente o amplo reconhecimento do fato de que, uma vez marcadas, em uma sociedade machista e patriarcal como a nossa, as relações de gênero, pelo desequilíbrio de poder, a concretização do princípio isonômico (art. 5º, I, da Lei Maior), nessa esfera – relações de gênero – reclama a adoção de ações e instrumentos afirmativos voltados, exatamente, à neutralização da situação de desequilíbrio.

       Com efeito, a Constituição expressamente confere à mulher, em alguns dispositivos, tratamento diferenciado, protetivo, na perspectiva de, nas palavras da Ministra Cármen Lúcia, 'acertar na diferença de cuidado jurídico, a igualdade do direito à dignidade na vida' (Rocha, Cármen Lúcia Antunes. O Princípio Constitucional da Igualdade. Belo Horizonte: Editora Lê, 1990, p. 75)

                   (Ministro Marco Aurélio)

...a mulher é eminentemente vulnerável quando se trata de constrangimentos físicos, morais e psicológicos sofridos em âmbito privado. Não há dúvida sobre o histórico de discriminação e sujeição por ela enfrentado na esfera afetiva.

(...).

A legislação ordinária protetiva está em fina sintonia com a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, no que revela a exigência de os Estados adotarem medidas especiais destinadas a acelerar o processo de construção de um ambiente onde haja real igualdade entre os gêneros.

BRITTO (2003:216-217)[55], ao examinar a evolução histórica do constitucionalismo, entende que a Constituição Federal contém uma filosofia de eliminação dos preconceitos, por força do “constitucionalismo fraterno”, sintetizando, entre outras compreensões, o seguinte:

Efetivamente, se considerarmos a evolução histórica do Constitucionalismo, podemos facilmente ajuizar que ele foi liberal, inicialmente, e depois social. Chagando, nos dias presentes, à etapa fraternal da sua existência. Desde que entendamos por Constitucionalismo Fraternal esta fase em que as Constituições incorporam às franquias liberais e sociais de cada povo soberano a dimensão da Fraternidade; isto é, a dimensão das ações estatais afirmativas, que são atividades assecuratórias da abertura de oportunidades para os segmentos sociais historicamente desfavorecidos, como, por exemplo, os negros, os deficientes físicos e as mulheres [para além, portanto, da mera proibição de preconceitos].

Portanto, estreme de dúvidas a legitimidade constitucional das políticas de ações afirmativas, cumpre estabelecer que estas se desenvolvem também por medidas de caráter minimalista/reducionista na seara do direito penal, este como ultima ratio.

Tratar os desiguais na medida de suas desigualdades (homens e mulheres), no âmbito da Lei n.º 11.343/2006, conferindo-lhes diferenças na aplicação da lei penal e processual penal – como a muito já ocorre em relação a outros sujeitos considerados vulneráveis: (a) criança e adolescente; (b) idosos; (c) deficientes físicos; (d) os indígenas; e (f) a própria mulher no âmbito da Lei n.º 11.340/2006 –, é não fomentar a indesejada violência estrutural ou institucional e muito menos compactuar com os abusos da intensidade e grau da resposta estatal.

O encarceramento, de mulheres em situação de vulnerabilidade – em que pese a prática do tráfico ilícito de drogas com a agravante de transporte no interior de estabelecimentos prisionais –, como única resposta penal, não tem o condão de construir um Estado Democrático real porque carece de políticas públicas que atendam aos graves problemas socioeconômicos e culturais que se afiguram, precedentemente, na vida daquelas antes mesmo da prática do delito.

Nesse particular, o exame da jurisprudência dos tribunais nacionais é revelador quanto à cegueira ou indiferença da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006.


5. Pesquisas nos Tribunais

5.1. Tribunais Superiores.

No âmbito dos EE. Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça não há acórdãos, que tenham sido examinados à luz da Lei n.º 11.343/2006 (Lei de Drogas), sobre os prismas: (a) da desigualdade de gênero, (b) da vulnerabilidade da mulher e/ou (c) da hipossuficiência da mulher.

No campo pesquisa à jurisprudência[56], constata-se que há no STF:

a) 11 (onze) acórdãos com a pesquisa “tráfico-drogas-presídio”. Nenhum deles – ver-se-á exceção logo abaixo –, no entanto, aplicou a absolvição ou examinou esse crime sob a ótica da desigualdade de gênero, vulnerabilidade ou hipossuficiência da mulher no âmbito da Lei de Drogas.

Em pesquisa aos informativos, encontrou-se no Informativo n.º 522, 29 de setembro a 3 de outubro de 2008, o HC n.º 94.916/RS, o qual, ainda sob a égide da Lei n.º 6.368/1976, em caso específico de tráfico ilícito de drogas, com a agravante de ter ocorrido em estabelecimento prisional (transporte humano de maconha), a paciente (mulher) obteve a liberdade provisória ao fundamento de que – sem expressamente mencionar, mas em razão da vulnerabilidade – seu estado de saúde era debilitado e dela dependia, inclusive economicamente, uma filha.

O Ministro Eros Grau consignou que submeter a paciente ao cárcere seria incompatível com o direito, ainda que se pudesse ter como adequado à regra. Daí que a captura da exceção se imporia.

Confira-se a ementa:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA POSSIBILIDADE DE LIBERDADE PROVISÓRIA. IRRELEVÂNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CAUTELAR. VINGANÇA. A SUBMISSÃO DA PACIENTE AO CÁRCERE É INCOMPATÍVEL COM O DIREITO, AINDA QUE SE POSSA TER COMO ADEQUADO À REGRA. MANTER PRESA EM CONDIÇÕES INTOLERÁVEIS UMA PESSOA DOENTE NÃO RESTABELECE A ORDEM, ALÉM DE NADA REPARAR. SITUAÇÃO PECULIAR A CONFIGURAR EXCEÇÃO. EXCEÇÃO CAPTURADA PELO ORDENAMENTO JURÍDICO. ORDEM CONCEDIDA 1. Controvérsia a propósito da possibilidade, ou não, de concessão de liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes. Irrelevância para o caso concreto, face a sua peculiaridade. 2. Paciente primária, de bons antecedentes, com emprego e residência fixos, flagrada com pequena quantidade de maconha quando visitava o marido na penitenciária. Liberdade provisória deferida pelo Juiz da causa, posteriormente cassada pelo Tribunal de Justiça local. Mandado de prisão expedido há cinco anos, não cumprido devido a irregularidade no cadastramento do endereço da paciente. Superveniência de doença contagiosa [AIDS], acarretando outros males. Intenção, da paciente, de entregar-se à autoridade policial. Entrega não concretizada ante o medo de morrer no presídio, deixando desamparada a filha menor. 3. Dizer "peculiaridade do caso concreto" é dizer exceção. Exceção que se impõe seja capturada pelo ordenamento jurídico, mesmo porque, a afirmação da dignidade da pessoa humana acode à paciente. 4. A transgressão à lei é punida de modo que a lei [= o direito] seja restabelecida. Nesse sentido, a condenação restabelece o direito, restabelece a ordem, além de pretender reparar o dano sofrido pela vítima. A prisão preventiva antecipa o restabelecimento a longo termo do direito; promove imediatamente a ordem. Mas apenas imediatamente, já que haverá sempre o risco, em qualquer processo, de ao final verificar-se que o imediato restabelecimento da ordem transgrediu a própria ordem, porque não era devido. 5. A justiça produzida pelo Estado moderno condena para restabelecer o direito que ele mesmo põe, para restabelecer a ordem, pretendendo reparar os danos sofridos pela vítima. Mas a vítima no caso dos autos não é identificada. É a própria sociedade, beneficiária de vingança que como que a pacifica em face, talvez, da frustração que resulta de sua incapacidade de punir os grandes impostores. De vingança se trata, pois é certo que manter presa em condições intoleráveis uma pessoa doente não restabelece a ordem, além de nada reparar. A paciente apresenta estado de saúde debilitado e dela depende, inclusive economicamente, uma filha. Submetê-la ao cárcere, isso é incompatível com o direito, ainda que se possa ter como adequado à regra. Daí que a captura da exceção se impõe. Ordem deferida, a fim de que a paciente permaneça em liberdade até o trânsito em julgado de eventual sentença penal condenatória. (HC 94916, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 30/09/2008, DJe-236 DIVULG 11-12-2008 PUBLIC 12-12-2008 EMENT VOL-02345-02 PP-00243 RTJ VOL-00208-03 PP-01165)

No campo pesquisa à jurisprudência[57], no âmbito do STJ, afere-se:

a) que, com a pesquisa “tráfico-drogas-presídio”, há 88 (oitenta e oito) acórdãos, sendo que nenhum deles aplicou a absolvição ou examinou esse crime sob a ótica da desigualdade de gênero, ou vulnerabilidade, ou hipossuficiência da mulher no âmbito da Lei de Drogas;

b) que, com a pesquisa “tráfico-drogas-vulnerabilidade”, há 18 (dezoito) acórdãos, sendo que todos se referem à vulnerabilidade do adolescente no âmbito do ECA;

c) que, com a pesquisa “tráfico-drogas-presídio-absolvição”, há 3 (três) acórdãos, sendo que todos em HC e foram negados por não ser possível a dilação probatória.

d) que, com a pesquisa “tráfico-drogas-coação-irresistível”, há 5 (cinco) acórdãos, sendo que 4 em HC e foram negados por não ser possível a dilação probatória e 1 em RESp negado, neste tema, pela Súmula 7-STJ.

                   5.2. Tribunais Estaduais e do DF[58]

1) No TJDFT, sobre as pesquisas “tráfico-drogas-vulnerabilidade”, “tráfico-drogas-presídio”, “tráfico-drogas-desigualdade-gênero”, “tráfico-drogas-ausência-dolo” e “tráfico-drogas-absolvição”, há 1 (um) acórdão relacionado à vulnerabilidade da mulher (é dizer, a decisão judicial não foi cega à desigualdade de gênero).

No caso concreto, tráfico de drogas, o acórdão do TJDFT, em Habeas Corpus, considerou a condição social de extrema miséria e vulnerabilidade da mulher e concedeu a liberdade provisória.

Esse acórdão não abordou detalhadamente o que se fala neste artigo. É, todavia, um avanço.

Confira-se a ementa:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. NEGATIVA DE LIBERDADE PROVISÓRIA. APREENSÃO DE COCAÍNA. QUANTIDADE POUCO EXPRESSIVA DA DROGA APREENDIDA. PERICULOSIDADE ESCASSA. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE.

1 Paciente presa em flagrante por infringir o artigo 33 da Lei 11.343/2006 depois que policiais, averiguando denúncia anônima indicando o funcionamento de "boca de fumo" em uma invasão localizada na Avenida L-2 Sul, realizaram campana e lograram apreender pouco mais de três gramas e meio de cocaína que ela escondia dentro do colchão de dormir, num barraco de lona.

2 Nada obstante a gravidade do fato, não está evidenciada periculosidade capaz de justificar a prisão cautelar como imperativo de ordem pública. A paciente é uma jovem mulher que se conservou primária até os vinte e sete anos de idade, e que sobrevive com extrema penúria em um barraco de lona azul montado dentro da invasão existente na L-2 Sul, junto com dois filhos com quatro anos e com onze meses de idade.

3 O caso reflete com cores vivas a miséria e extrema vulnerabilidade das populações carentes que se amontoam nas grandes cidades vivendo de sobras e da caridade alheia. Não se trata de um simples caso de Polícia, mas, sobretudo, um pungente drama social, que demanda solução diferenciada, impossível de ser proporcionada no presídio, deixando ao desamparo duas crianças que passariam a ver a sociedade como sua inimiga.

4 A paciente faz jus à liberdade provisória clausulada, com acompanhamento pelo Núcleo Psicossocial Forense, em conjunto com a Vara de Infância e Juventude e a Secretaria de Assistência Social do Governo do Distrito Federal.

5 Ordem concedida em parte. (Acórdão n.656846, 20130020018063HBC, Relator: GEORGE LOPES LEITE, 1ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 07/02/2013, Publicado no DJE: 28/02/2013. Pág.: 194)

Nenhuma decisão absolutória por coação moral irresistível decorrente do tráfico de drogas em presídio.

2) No TJRS, há 1 (um) acórdão, em tráfico de drogas, o qual diz que a situação de vulnerabilidade gera fundada dúvida acerca da culpabilidade da mulher, aplicando, ao final, o art. 386, VI, do CPP (Apelação Crime Nº 70058120841, Terceira Câmara Criminal - Julgado em 03/04/2014).

Essa decisão, além de ser de vanguarda – porque visa o desencarceramento nos casos de precedente vulnerabilidade da mulher –, assegura o que se pretende neste artigo, que é o reconhecimento da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006.

Confira-se a ementa:

TRÁFICO DE DROGAS. MULHER QUE TENTA INGRESSAR NO ESTABELECIMENTO PRISIONAL COM DROGA NA CAVIDADE ANAL. FUNDADA DÚVIDA ACERCA DA CULPABILIDADE. 1. A introdução de drogas nos órgãos genitais e cavidade anal é uma forma grosseira de criminalidade, uma situação constrangedora e aberrante. Essas mulheres estão em grau concreto, elevado e insuportável de vulnerabilidade, frente à perversão do sistema prisional. 2. A compreensão acerca da culpabilidade, como grau de censurabilidade ou de reprovação que pende sobre o sujeito que pratica um fato típico e ilícito (conexão punitiva), não se restringe à previsão normativa, na medida em que o sujeito está inserido em uma realidade própria, social, diferenciada e temporal. A realidade contemporânea mostra a desmaterialização do ser humano enquanto pessoa, uma vez recolhido ao cárcere, o descumprimento das regras humanitárias mínimas e o descaso com a normatividade ordinária, constitucional e convencional. As exigências são cumpridas para o encarceramento, isto é, até a porta do cárcere. Após, a realidade é outra. Essa perspectiva contamina o detido e toda a sua família, a qual passa a cumprir a pena extramuros. A carga maior recai sobre as mulheres, cônjuges ou companheiras dos detidos, as quais passam à submissão de qualquer conduta para amenizar os efeitos do encarceramento. Isso vai desde a satisfação dos apelos do marido, companheiro ou de seu superior na galeria presidiária, a quem deve obediência caso queira continuar sendo protegido. 3. Submeter-se a introdução de drogas nos órgãos genitais, ao vexame da descoberta e às repetidas posições para expelir a droga conduzem à situação de miséria humana, de degradação, somente entendível na perspectiva de não possuir a mulher, outra alternativa, diante das explícitas ou veladas ameaças de assim agir sob pena de o marido, companheiro, filhos, ela própria, sofrer outras sanções, agora não determinadas pelo Estado, mas pelo comando paralelo. 4. Essa situação de vulnerabilidade gera fundada dúvida acerca da culpabilidade da mulher, comportando aplicação a nova redação do art. 396, VI, do CPP. APELO PROVIDO. POR MAIORIA. (Apelação Criminal Nº 70058120841, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 03/04/2014)

O Ministério Público do Rio Grande do Sul interpôs Recurso Especial e Recurso Extraordinário contra este acórdão, juntados em 16/07/2014[59].

Muito em breve, portanto, ter-se-á pronunciamento deste leading case nos EE. Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, caso superem os enunciados das súmulas de barreira, v.g., 279-STF, 284-STF, 282-STF, 7-STJ.       Encontra-se, ainda, no TJ/RS acórdão que, por maioria, absolveu a Apelante, condenada, em primeira instância, pelo crime do art. 33, caput, c/c o art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006. A maioria alcançou fundamentos diversos: Revisor absolveu com espeque no art. 386, II, do CPP. O Presidente absolveu com base no art. 386, VII, do CPP (Apelação Criminal n.º 70051788081, Terceira Câmara, Relator para o Acórdão Desembargador Revisor Diógenes V. Hassan Ribeiro, julgado em 23/05/2013).

3) No TJSC, não há acórdãos sobre as pesquisas “tráfico-drogas-vulnerabilidade”, “tráfico-drogas-presídio”, “tráfico-drogas-desigualdade-gênero”, “tráfico-drogas-ausência-dolo” e “tráfico-drogas-absolvição” que trouxessem a discussão, no âmbito da Lei n.º 11.343/2006, da desigualdade de gênero, ou da vulnerabilidade, ou da hipossuficiência e viabilizassem decisões como as do TJDFT e TJRS.

Há, todavia, uma decisão, na Apelação Criminal n.º 2008.067407-4, na qual o TJSC manteve a absolvição da recorrida por falta de provas.

4) No TJRJ, não há acórdãos sobre as pesquisas “tráfico-drogas-vulnerabilidade”, “tráfico-drogas-presídio”, “tráfico-drogas-desigualdade-gênero”, “tráfico-drogas-ausência-dolo” que trouxessem a discussão, no âmbito da Lei n.º 11.343/2006, da desigualdade de gênero, ou da vulnerabilidade, ou da hipossuficiência e viabilizassem decisões como as do TJDFT e TJRS.

Há 1 (um) acórdão absolutório por coação moral irresistível decorrente do tráfico de drogas em presídio, embora, em juízo, a apelada tenha mudado o depoimento dado em sede policial, chamando para si a responsabilidade pelos fatos apurados. (Apelação: 0404730-69.2009.8.19.0001, Juízo de origem: 1ª Vara Criminal Regional de Bangu, Apelante: Ministério Público)

5) Nos TJAC, TJAL, TJAM, TJAP, TJBA, TJCE, TJES, TJGO, TJMG, TJMS, TJMT, TJPA, TJPB, TJPE, TJPI, TJPR, TJRN, TJRO, TJRN, TJSE, TJSP, TJTO, não há acórdãos sobre as pesquisas “tráfico-drogas-vulnerabilidade”, “tráfico-drogas-presídio”, “tráfico-drogas-desigualdade-gênero”, “tráfico-drogas-ausência-dolo” e “tráfico-drogas-absolvição” que trouxessem a discussão, no âmbito da Lei n.º 11.343/2006, da desigualdade de gênero, ou da vulnerabilidade, ou da hipossuficiência e viabilizassem decisões como as do TJDFT e TJRS.

Em verdade as decisões encontradas mantiveram a condenação da mulher que traficou drogas, mormente em presídio.

Nenhuma decisão absolutória por coação moral irresistível decorrente do tráfico de drogas em presídio.

Com efeito, a fim de evitar a violência estrutural ou institucional, é preciso – enquanto o legislador não promove alterações sob a perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006 – que o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública intervenham de outra maneira nos crimes do art. 33, caput, c/c art. 40, III, da Lei n.º 11.343/2006, quando praticados por mulheres em situação precedente de vulnerabilidade.

De tudo o que foi exposto nesse artigo, pode-se afirmar que as mulheres encarceradas por tentar introduzir drogas nos centros penitenciários (a) têm baixa escolaridade, (b) têm filhos menores, (c) têm pessoas incapazes sob a dependência delas, (d) formam famílias, em sua maioria, monoparentais, e (e) são, na maioria dos casos, as únicas encarregadas pela economia familiar.

O impacto socioeconômico que o encarceramento tem na vida dessas mulheres, famílias e filhos permitem afirmar que o dano (violência estrutural e institucional) é desproporcional ao bem jurídico que se pretende proteger.

Apresentando-se, dessa forma, os fatos e as circunstâncias, está claro que os atores das três fases do processo de criminalização devem estabelecer parâmetros diferenciadores na Lei n.º 11.343/2006, sob a perspectiva de gênero, a fim de se evitar todo tipo de violência contra a mulher.

Há um desequilíbrio sancionatório atual na Lei n.º 11.343/2006, no que diz respeito ao art. 33, caput, c/c o art. 40, III, que se situa entre o bem jurídico tutelado: (a) a saúde pública vs (b) o impacto social de manter sob custódia mulheres pobres e vulneráveis, responsáveis pela economia familiar, pelos filhos menores e, até mesmo, por pessoas maiores incapazes.

Encarcerar mulheres que se encontram nessas circunstâncias, pela prática de tráfico ilícito de drogas, com a agravante de transporte no interior de estabelecimentos prisionais, é adicionar-lhes uma violência de graves consequências, entre elas a estigmatização da própria condenada e da família, elevando a escala de sofrimento que já passam pela pressão da pobreza/miséria, da intimidação do dominante, da vulnerabilidade socioeconômica e cultural; fatores que bem se inserem, por omissão do Estado e das Instituições, na denominada violência estrutural ou institucional contras as mulheres.

Não há se cegar que as circunstâncias históricas, socioeconômicas e culturais particulares da vulnerabilidade, nas quais se encontram ou vivem as mulheres, por certo, as impedem de incorporar-se à sociedade e acender melhores condições de bem estar, pelo que se veem mais expostas a cometer o tráfico ilícito de drogas, mormente no transporte para o interior de estabelecimentos prisionais.

Por tais razões, faz-se imperioso um olhar crítico sobre a Lei n.º 11.343/2006, no que concerne a ausência de previsão de dispositivo que, efetivamente, promova a igualdade material entre mulheres e homens, sob a perspectiva de gênero.

A respeito, entre as legislações mundiais que promoveram substancial alteração na legislação sobre drogas, com o escopo de incluir a perspectiva de gênero, tem-se o Reino Unido (Inglaterra) e a República da Costa Rica.


6. Legislação estrangeira

6.1. Inglaterra

Depois de um período de estudos, em janeiro de 2012, o Conselho de Condenação (Sentencing Council[60]) tornou público novos delineamentos em matéria de drogas.

Estes delineamentos permitem a combinação de fatores estritamente relacionados com o tráfico de drogas, inclusive sob a perspectiva de gênero (questões sociológicas, item “4” abaixo), como por exemplo:

1) modalidade do delito;

2) tipo de substância e quantidade;

3) outros de índole criminológica[61], como: a) nível de liderança, por exemplo: distinguindo entre o papel de liderança (leading role), papel significativo (significant role) e o papel menor (lesser role);

4) questões sociológicas[62], por exemplo: b) se a pessoa é a única e o principal responsável por outras que dela dependam; b.1) se a pessoa tem sua vulnerabilidade explorada; b.2) se a pessoa manifesta boa disposição e arrependimento; b.3) envolvimento devido à pressão, intimidação ou coerção, aquém de coação; b.4) incidente isolado; b.5) idade e/ou falta de maturidade em que afeta a responsabilidade do infrator. Entre outras.

6.2. República da Costa Rica.

Em agosto de 2013 – bem recentemente, portanto –, a República da Costa Rica introduziu reformas na Lei de Controle Penal de Drogas (Lei n.º 8204), buscando critérios de proporcionalidade e especificidade de gênero para diminuir as penas privativas de liberdade de mulheres em condições de vulnerabilidade que introduzem(iram) drogas em estabelecimentos prisionais de homens[63].

Incluiu-se o parágrafo único[64] ao art. 77 da Lei de Controle Penal de Drogas da Costa Rica (Lei n.º 8204) para reduzir as penas por introdução de drogas nos centros penitenciários, que são de 8 (oito) a 20 (vinte) anos por penas de 3 (três) a 8 (oito) anos, bem assim se incluiu penas alternativas à privação da liberdade se as mulheres detidas atenderem um ou mais dos seguintes critérios:

a) se encontram em condição de pobreza;

b) sejam chefe de família que está em condições de vulnerabilidade; c) tenham sobre sua responsabilidade pessoas menores de idade, adultas maiores, ou pessoas com qualquer tipo de deficiência para justificar a dependência na pessoa que a têm sobre sua responsabilidade; e

d) Seja ela própria uma adulta maior em condições de vulnerabilidade.

Entre os argumentos para alteração da Lei de Drogas da República da Costa Rica (Ley n.º 8204), aferem-se:

Estes dados tornam impostergável que os deputados e deputadas analisem e introduzam elementos para valorar o tráfico de drogas em pequena escala nos centros penais cometido por mulheres, revisando-se, pois, a política penitenciária. Neste sentido, é importante considerar que no sistema judicial se está penalizando, unicamente, a pessoa que tenta introduzir as drogas nos centros penitenciários, mas não observamos políticas integrais para prevenir o consumo de drogas dentro dos cárceres, que poderiam desestimular o tráfico.

Consideramos que é prudente e necessário desvincular esta modalidade de delito do tráfico de drogas dos casos vinculados com o crime organizado e narcotráfico, porque os dados refletem que não é realista nem proporcional que hoje as mulheres que infrinjam a lei de drogas para introduzi-las em pequena escala nos centros penitenciários (foram pegas em grau de tentativa) recebam a mesma penalidade, como se se tratasse de organizações criminais. A essa ponderação não pode ficar de fora o fato de que o encarceramento feminino marca o resultando de uma cadeia de situações econômicas, sociais, legais e familiares que impactam, fortemente, o tecido social e não previne o delito[65]. (tradução nossa)


7. Projeto de Lei da Câmara n.º 37/2013

O Projeto de Lei n.º 7.663/2010, renumerado no Senado Federal para Projeto de Lei da Câmara n.º 37/2013, traz as seguintes alterações no art. 33 da Lei n.º 11.343/2006:

Art. 6º A Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006, passa a vigorar com as seguintes alterações:

Art. 33 (...).

§4º Nos delitos definidos no caput e no §1º, as penas deverão ser reduzidas de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), quando:

I – o agente não for reincidente e não integrar organização criminosa; ou

II – as circunstâncias do fato e a quantidade de droga apreendida demonstrarem o menor potencial lesivo da conduta.

§5º Se os crimes previstos no caput e no §1º forem cometidos por quem exerce o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa, a pena é de reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos e pagamento de 800 (oitocentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§6º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. (NR)

Na Câmara dos Deputados foram acrescentadas 25 (vinte e cinco) emendas, nenhuma delas com a perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006.

Na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal foram apresentadas 9 (nove) emendas, todas apresentadas pelo Senador Romero Jucá. As emendas n.ºs. 1 (protocolo SF/14072.86557-86); 2 (protocolo SF/14575.10437-83); 3 (protocolo SF/14857.80879-41); 4 (protocolo SF/14757.46526-95); 5 (protocolo SF/14483.10492-29); 8 (protocolo SF/14418.39054-70) e 9 (protocolo SF/14969.81652-69) em nada mencionam acerca da desigualdade de gênero ou da vulnerabilidade ou da hipossuficiência da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

A emenda n.º 6 (protocolo SF/14261.60510-28), apenas sugere a exclusão da conjunção alternativa “ou” presente entre os incisos I e II do §4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/2006. Não faz, portanto, qualquer menção acerca da desigualdade de gênero ou da vulnerabilidade ou da hipossuficiência da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

A emenda n.º 7 (protocolo SF/14681.03526-95), apenas sugere a exclusão do art. 6º do Substitutivo ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) N.º 37/2013, a alteração do art. 35 da Lei n.º 11.343/2006. Não faz, portanto, qualquer menção acerca da desigualdade de gênero ou da vulnerabilidade ou da hipossuficiência da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

Há uma Petição para Defesa de Direitos[66] dirigida ao Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Senador Vital do Rêgo, que discute:

a) a disposição legal ou a regulamentar sobre as quantidades de drogas para diferenciar o usuário do traficante;

(b) a internação compulsória de dependentes químicos ou usuários de drogas;

c) as comunidades terapêuticas e Estado laico;

d) o recrudescimento do sistema penal; e

e) a reintegração socioeconômica de jovens, adolescentes e crianças.

A Petição, todavia, não faz qualquer menção acerca da desigualdade de gênero ou da vulnerabilidade ou da hipossuficiência da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

O Parecer de relatoria do Senador Antonio Carlos Valares (Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania), com trâmite datado de 04/12/2013[67], refere-se ao termo vulnerabilidade sob dois aspectos[68]:

1º) a vulnerabilidade social dos usuários e dependentes de drogas; e

2º) A Lei n.º 11.343/2006 define como atividades de prevenção aquelas direcionadas para a redução dos fatores de vulnerabilidade e risco e para a promoção e o fortalecimento dos fatores de proteção.

Logo, o Parecer não traz o foco da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006.

Em parecer de relatoria do Senador Antonio Carlos Valadares – lavrado no ano de 2014, cuja pauta encontra-se pronta para discussão, conforme trâmite do PLC n.º 37/2013, registrado em 16/07/2014[69] –, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, ao rejeitar a emenda n.º 5 (protocolo SF/14483.10492-29), sob a ótica do usuário de drogas e critério objetivo quanto à quantidade de entorpecente transportado para consumo, examinou a questão do recrudescimento de presos por tráfico ilícito de entorpecentes[70] – inclusive com menção às mulheres –, mas tudo sem o foco da desigualdade de gênero ou da vulnerabilidade ou da hipossuficiência da mulher no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, mormente no transporte de drogas para estabelecimentos prisionais.

Percebe-se, pois, que o Projeto de Lei da Câmara n.º 37/2013 e suas emendas não preveem a inclusão de dispositivo que reconheça a vulnerabilidade da mulher, quando do tráfico ilícito de drogas no transporte para o interior de estabelecimentos prisionais.

É dizer, o legislador está e continua cego à perspectiva de gênero. O PLC 37/2013 da forma como apresentado pelo substitutivo no Relatório do Senador Antônio Carlos Valadares, desde que promova o debate e inclusão da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, merece ser aprovado. Em assim não sendo, corre-se o risco de ser ter uma lei completamente descontextualizada com o cenário histórico, socioeconômico e cultural da mulher em situação de vulnerabilidade, bem assim – e o que é pior – de se estar, sob a legitimidade do processo legislativo, dando ensejo à violência estrutural ou institucional contra os direitos humanos da mulher.


Conclusão

A desproporcionalidade das penas e a cegueira ou indiferença da perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006 devem ser abordadas e corrigidas pelos atores das três fases do processo de criminalização, a fim de evitar os enormes e desnecessários danos às mulheres que se encontram em situação de vulnerabilidade, quando da prática do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins no interior de estabelecimentos prisionais.

É essencial conhecer a natureza e alcance da participação das mulheres na comercialização de substâncias ilícitas a fim de começar a desenhar viáveis alternativas jurídicas, sociais e econômicas inclusivas.

Este tema é complexo e transcende o campo da subsunção penal do fato à norma.

Também há necessidade de explorar o papel das relações de desigualdade de gênero, que, em razão de fatores históricos, socioeconômicos e culturais, aumentam a participação das mulheres no mundo do tráfico ilícito de drogas.

A situação de violência física, psicológica, moral, patrimonial, social e econômica resultam em exclusão social e laboral, situações que as mulheres enfrentam no Brasil e contribuem para suas explorações.

A omissão do Estado aos precedentes fatores de risco no entorno das mulheres, quando da prática do tráfico ilícito de drogas no interior de estabelecimentos prisionais, evidencia clara violência estrutural ou institucional contra os direitos humanos.

O Supremo Tribunal Federal na ADC 19 e na ADI 4.424 fixou claros parâmetros – asseguradores e garantidores dos direitos à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), da liberdade, justeza e solidariedade (CF, art. 3º, I) e da igualdade substancial (CF, art. 5º, I) – os quais devem ser observados pelos atores da segunda e terceira fases do processo de criminalização, a fim de, nas palavras da Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha[71], “acertar na diferença de cuidado jurídico, a igualdade do direito à dignidade na vida”.

A coleta de dados, tanto quantitativos quanto qualitativos, dos sistemas penitenciários das mulheres pode ajudar o Estado Brasileiro a intensificar seus esforços para conhecer e compreender as causas preexistentes e existentes que contribuem para o aumento da delinquência das mulheres em relação ao tráfico ilícito de drogas, evitando, assim, o recrudescimento do encarceramento feminino, em especial, na escala hierarquizada do tráfico, das “mulas” ou “transportadoras”, que, em regra, se encontram em situação de vulnerabilidade.

Considerar como última opção – já que neste artigo entende-se não haver culpabilidade e, por consequência, isentar-se da pena na forma do art. 386, VI, do CPP – os encarceramentos de mulheres com todas as circunstâncias judiciais favoráveis (CP, art. 59) e em situação de vulnerabilidade, por delitos não violentos e motivados (a) pela pobreza, (b) porque a família está em condições de vulnerabilidade, (c) porque há menores de idade ou adultos, capazes ou incapazes, mas que necessitam de constantes cuidados a justificar a dependência física, psicológica ou econômica da mulher, (d) porque a própria mulher encontra-se em situação de vulnerabilidade em razão de opressão, coação ou coerção.

Deve-se, portanto, fortalecer a introdução da perspectiva de gênero nos distintos âmbitos das políticas públicas (ações afirmativas) com escopo de atacar as diversas formas de violência contra os direitos humanos das mulheres, violência esta que lhes afeta pelo só fato serem mulheres.

O Estado Brasileiro, por meio de seus Poderes e Instituições, deve, imediatamente, introduzir a perspectiva de gênero na Lei n.º 11.343/2006, porquanto, o que se afere – pelos próprios dados do DEPEN (supra transcritos neste artigo) – é que ao longo desses 12 anos o encarceramento de mulheres cresceu 256% (duzentos e cinquenta e seis por cento), tendo a novel Lei de Drogas apenas 8 (oito) anos.

O desafio não é desenvolver programas de ajuda em novas ou velhas prisões, mas, sim, se evitar uma possível prisão. Deve-se combater essa tendência de criminalização e encarceramentos de mulheres com histórico precedente de vulnerabilidade.

A visão que se deve ter desse problema é mais sociológico e do que criminológico.

Caso os atores da segunda e terceira fases do processo de criminalização compreendam em não ser o caso de aplicar o art. 386, VI, do CPP – como o fez o Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul (Apelação Crime Nº 70058120841, Terceira Câmara Criminal - Julgado em 03/04/2014) –, que tenham em mente, então, que não é o mesmo sancionar com prisão mulheres que reúnam precedentes condições de vulnerabilidade que a um homem, ainda que aquelas mereçam – na visão dos que não se alinham com os argumentos deste artigo – uma reprovação jurídica. Constata a precedente vulnerabilidade, a resposta estatal a essas mulheres não pode ser igual a dos homens, porque as condições destes não são equivalentes às das mulheres (fatores históricos, socioeconômicos e culturais) e, também, porque os delitos por estes praticados afetam o tecido social e familiar de forma diversa.

Finalmente, o Estado Brasileiro deve ficar muito atento para não construir um caminho para fora do real cenário histórico, socioeconômico e cultural que estão entorno das mulheres vulneráveis, evitando, por isso, de lançar mão de prisões e mais prisões.


Referências Bibliográficas

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SOUZA, Sérgio Ricardo de. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2009, p. 50.


Notas

[2]      O Projeto de Lei da Câmara (PLC) n.º 37/2013 tramita, atualmente, no Senado Federal.

[3]      “(...), a violência estrutural são as condições de precariedade em que a família vive hoje: condições insalubres, moradias precárias, desemprego e falta de aplicação de direitos sociais fundamentais, problema enfrentado pela população brasileira nos dias de hoje.

A violência estrutural precisa ser compreendida no âmbito do contexto social e cultural para que se possam elucidar os mecanismos pelos quais o Estado, em seus diferentes níveis e poderes, restringe o acesso da grande maioria da população aos direitos básicos que lhe proporcionariam uma vida digna, gerando, dessa forma, um grave quadro de exclusão social. Essa compreensão tem ligação com o que Gilberto Velho afirma sobre a sociedade brasileira, ou seja, que a sociedade brasileira foi criada com a escravidão, e as marcas da escravidão, tanto metafórica como literalmente, produziram e estão presentes na sociedade. Em síntese, as desigualdades da sociedade brasileira são também heranças da escravidão (...).”. ROCHA, Enid; VELHO, G. apud COSTA, Marli M. M. da e PORTO, Rosane T. C. EXCLUSÃO SOCIAL, VIOLÊNCIA ESTRUTURAL E DELINQUÊNCIA JUVENIL: UMA ANÁLISE A PARTIR DE MICHEL FOUCALT. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais, Vitória, n.º 4, p. 83-103, jul-dez 2008.

[4]      CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer. A criminalização do tráfico de mulheres: proteção das mulheres ou reforço da violência de gênero? Cadernos pagu (31), julho-dezembro de 2008: 101-123. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/trafico-de-pessoas/criminalizacao_trafico_mulheres_elawiecko.pdf> Acesso em 28 ago 2014.

[5]      SOARES, Orlando. A Evolução do Status Jurídico-Social da Mulher. Rio de Janeiro: Rio, 1978. p. 246.

[6]      BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Tradução Maria Helena Küher. - 2ªed. - Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. p. 24.

[7]      HOMERO. Odisséia. São Paulo: Nova Cultura, 2002, p 117.

[8]      “Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor. Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da Igreja: sendo ele próprio o salvador do corpo.”  In: A Bíblia Sagrada/tradução João Ferreira de Almeida. Edição Revista Corrigida. Sociedade Bíblica do Brasil, 1969.

[9]      “Mulheres, obedeçam aos seus maridos, como obedecem ao Senhor. Porque o marido tem autoridade sobre a mulher, assim como Cristo tem autoridade sobre a Igreja. E o próprio Cristo é o Salvador da Igreja, que é o seu corpo. Portanto, as mulheres devem ser completamente obedientes aos seus maridos, assim como a própria Igreja é obediente a Cristo.” In: A Bíblia Sagrada/tradução na linguagem de hoje. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1998.

[10]     ANDRADE, Francisco Leal de. DETERMINISMO BIOLÓGICO E QUESTÕES DE GÊNERO NO CONTEXTO DO ENSINO DA BIOLOGIA: representações e práticas de docentes do Ensino Médio. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências, da Universidade Federal da Bahia como obtenção do grau de Mestre em Ensino, Filosofia e História das Ciências. Salvador-BA. 2011. pp. 1-242. Disponível em: <https://twiki.ufba.br/twiki/pub/PPGEFHC/DissertacoesPpgefhc/Francisco_Leal_de_Andrade_2011.pdf> Acesso em 29 ago 2014.

[11]     LEWANDOWSKI. Ricardo. Ministro do Supremo Tribunal Federal. Voto na ADI 4424. Julgada em 09/02/2012.

[12]     ROWBOTHAN, Sheila. Apud Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE. Observatório da Cidadania 2004 - Medos e Privações. P. 53. Disponível em: <http://www.ibase.br/pt/wp-content/uploads/2011/06/oc-relat%C3%B3rio-observat%C3%B3rio-da-cidadania-2004.pdf> Acesso em 29 ago 2014.

[13]     Idem 12.

[14]     Ibidem: 11, p. 54.

[15]     CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer. Dicionário de Direitos Humanos. Gênero. Escola Superior do Ministério Público da União. Publicado em 2006. Disponível em:<http://escola.mpu.mp.br/dicionario/tiki-index.php?page=G%C3%AAnero>. Acesso em 29 ago 2014.

[16]     Idem:15.

[17]     TEIXEIRA, Daniel Viana. Desigualdade de gênero: sobre garantias e responsabilidades sociais de homens e mulheres. Revista Direito GV, Vol. 6, n.º 1, São Paulo: jan-jun 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1808-24322010000100012&script=sci_arttext&tlng=pt#top7> Acesso em 30 ago 2014.

[18]     PIOVESAN, Flávia Cristina. Temas de Direitos Humanos. 3ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2009, p. 229.

[19]     MELHEM, Patrícia Manente. A coisificação da Mulher e o reforço da negação da vitimização: retorno à “lógica da honestidade”? 2013. Mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Disponível em: <http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/anais/cienciascriminais/IV/43.pdf> Acesso em 30 ago 2014.

[20]     GIACOMELLO, Corina. Mujeres, delitos de drogas y sistemas penitenciarios en América Latina. IDPC – Consorcio Internacional sobre Política de Drogas. Publicado em outubro de 2013. P. 2-3. Disponível em: <https://dl.dropboxusercontent.com/u/64663568/library/IDPC-Briefing-Paper_Women-in-Latin-America_SPANISH.pdf > Acesso em 1º set 2014.

[21]     Idem: 20, p. 2-3.

[22]     Organización de los Estados Americanos (OEA). Comissión Interamericana de Mujeres “Mujeres y drogas en las Americas. Un diagnóstico de política en construción”. 2014. P. 34 e 38. Disponível em: <http://www.oas.org/documents/spa/press/WomenDrugsAmericas-ES.pdf> Acesso em 1º set 2014.

[23]     BIANCHINI, Alice e BARROSO/ Marcela Giorgi. Mulheres, tráfico de drogas e sua maior vulnerabilidade: série mulher e crime. Perfil da mulher presidiária. 2012. Disponível em: <http://atualidadesdodireito.com.br/alicebianchini/2011/11/16/mulheres-trafico-de-drogas-e-sua-maior-vulnerabilidade-serie-mulher-e-crime> Acesso em 1º set 2014.

[24]     Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Agência Ministério da Justiça de Notícias. Publicado em 2013. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/noticias/numero-de-mulheres-presas-aumentou-256-em-12-anos.> Acesso em 1º set 2014.

[25]     Portal EBC. Número de presidiárias mais que triplicou em 12 anos, segundo DEPEN. Publicado em 25.07.2013. Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:F7Vap5s9TwkJ:www.ebc.com.br/noticias/brasil/2013/07/numero-de-presidiarias-mais-que-duplicou-em-2012-segundo-epen+&cd=4&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br> Acesso em 1º set 2014.

[26]     ROSA, Alexandre Morais da. Levar droga para parente no estabelecimento prisional é crime? Jornal Carta Forense. Publicado em 02.03.2011. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/levar-droga-para-parente-no-estabelecimento-penal-e-trafico/6722> Acesso em 1º set 2014.

[27]     BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Tradução Maria Helena Kühner. – 2ªed. - Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. P. 9.

[28]     Idem: 27, p. 51.

[29]     Apelação Crime n.º 70058120841, Terceira Câmara Criminal, TJ/RS, Julgado em 03/04/2014.

[30]     Relembra-se a oração: “...a violência baseada no gênero ocorre quando um ato é dirigido contra a mulher porque é mulher..”. PIOVESAN, Flávia Cristina. Temas de Direitos Humanos. 3ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2009, p. 229.

[31]     CHAVARRIA, Eugenia Mata. Análisis de los condicionantes de vulnerabilidad em la mujer privada de libertad sentenciada por la Ley Sobre Estupefacientes, Sustancias Psicotrópicas, Drogas de Uso no Autorizado, Legitimación de Capitales y Actividades Conexas (Ley Nº 8204) en Costa Rica. Projeto final para obter o título de mestrado junto à UNIVERSIDAD PARA LA COOPERACIÓN INTERNACIONAL (UCI). 2008. P. 43-44. Disponível em: <http://www.uci.ac.cr/Biblioteca/Tesis/PFGMCSH7.pdf> Acesso em 2 set 2014.

[32]     Idem: 31. Texto original:

Sin embargo, estas representaciones limitan la comprensión del fonómeno de las mujeres dentro del tráfico de drogas y lo polarizan. Por un lado se identifica a estas mujeres como madres desinteresadas, despreocupadas or los cuidados de sus hijos, ingenuas y  débiles por dejarse manipular por un hombre que las engaña y las utiliza para sus 'negocios ilícitos' y em donde ellas no tienen pode de decisión. En el outro extremo están las mujeres identificadas como 'problemáticas', aquellas que por sua adicción no han logrado materializar las oportunidades que la sociedad les ofrece, malas madres, prostitutas, ladronas y responsables de sua próprio destino. Ambas posturas complican la comprensión integral del fenómeno y delimitan las soluciones al problema al no integrar em sus análisis los diferentes factores que intervienen em cada caso y cómo es necesario comprender la interacción entre aspectos estructurales y situaciones particulares.

El incremento de la participación de las mujeres em este tipo de actividades es una situación que se inscribe em un contexto em donde la desigualdad de gênero es un fenômeno de dminsiones estructurales, el cual se há invisibilizado a través de la historia.

 Sólo tomando em cuenta que la desigualdad de género tine dimensiones estructurales que atraviesan todas las situaciones sociales sera posible crear estrategias que permitan resolver los problemas exitosamente.

Para Teresa Incháustegui (2002) el considerar el enfoque de género em la creación de soluciones a un problema de interés social y público facilita el reconocer las diferencias entre los sexos, como base para la elección y  formulación de politícas públicas, así como em los procedimientos de evaluación y reporgramación de políticas sociales:

'En el contexto latinoamericano, estas recientes manifestaciones de criminalidad femenina requieren el examen de las complejas condiciones sociopolíticas de la región, agudizadas por la crisis fiscal y el creciente deteríoro económico de los últimos años, que han incrementado los níveles de probreza crítica y el creciente desarrollo de la llamada 'economia informal', controlada em gran parte por el sector femenino. A su vez, hay que destacar el espectacular desarrollo de la agroindustria de las drogas que como empresas transcionales buscan recursos básicos de todo tipo, asi sea de manera 'informal', debido a la ilegalidad de su funcionamiento.' (del Olmo: 2000)

[33]     GARCÍA, Carmen Antony. Mujeres invisibles: las cárceles femininas en la America Latina. Este artigo é cópia fiel do publicado na revista NUEVA SOCIEDAD Nº 208, março-abril 2007. P. 1. Disponível em: <http://www.nuso.org/upload/articulos/3418_1.pdf> Acesso em 2 set 2014.

[34]     Idem: 33. Texto original:

        “La situación de las cárceles femeninas es dramática. No solo porque las mujeres detenidas sufren el estigma de romper con el rol de esposas sumisas y madres presentes que les asigna la sociedad, sino también por la falta de leyes y  políticas adecuadas para abordar problemas como el de las madres lactantes o los hijos de las mujeres encarceladas. Esto se suma a outras cuestiones, como la violencia  sexual y el hacinamiento producto  del aumento de la población penitenciaria femenina, generalmente por delitos relacionados con el microtráfico de drogas. El artículo sostiene que, para resolver estos graves problemas, es necesario incluir un enfoque de género en las políticas penales y penitenciarias.”

[35]     CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer. A criminalização do tráfico de mulheres: proteção das mulheres ou reforço da violência de gênero? Cadernos pagu (31), julho-dezembro de 2008:101-123. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cpa/n31/n31a06> Acesso em 2 set 2014. (acrescentou-se palavras em colchetes para o fim de adaptar ao tema aqui proposto)

[36]     ADI 4424. Trecho do voto do Ministro Ricardo Lewandowski.

[37]     SOUZA, Sérgio Ricardo de. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2009, p. 50.

[38]     Idem: 37, p. 30.

[39]     BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Tradução Maria Helena Küher. - 2ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. p. 16.

[40]     KI-MOON, Ban. Mensagem do Sr. Ban Ki-Moon, Secretário-Geral da ONU, no Dia Internacional para Eliminação da Violência contra a Mulher. Publicada em 25.11.2011. Disponível em: <http://www.unifem.org.br/003/00301009.asp?ttCD_CHAVE=152969> Acesso em 2 set 2014.

[41]     STF: ADI 3305, Relator (a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 13/09/2006, DJ 24-11-2006 PP-00060 EMENT VOL-02257-03 PP-00555 LEXSTF v. 29, n. 338, 2007, p. 98-110.

[42]     CORRÊA, Lindinalva Rodrigues. Os homens também necessitam da proteção especial prevista na Lei Maria da Penha? Diagnóstico crítico sobre a violência de gênero sofrida por mulheres e a constitucionalidade das medidas de caráter afirmativo que visam combatê-la. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1975, 27 nov. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12013> Acesso em: 3 set 2014.

[43]     Comissão Interamericana de Direito Humanos. Organização dos Estados Americanos (OEA). Convenção de Belém do Pará (1994). Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/m.Belem.do.Para.htm> Acesso em 3 set 2014.

[44]     Utiliza-se aqui a definição de direitos humanos enquanto “conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, buscam concretizar as exigências da dignidade, da liberdade, da igualdade, da fraternidade e da solidariedade humanas. ser reconhecidas positivamente em todos os níveis, sendo que tais direitos guardam relação com os documentos de direito internacional, por se referirem àquelas posições jurídicas endereçadas à pessoa humana como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional” BATISTA, Vanessa Oliveira/RODRIGUES, Luciana Boiteux de Figueiredo/PIRES, Thula Rafaela. A Emenda Constitucional n.º 45/2004 e a constitucionalização dos tratados internacionais de direitos humanos no Brasil. Revista Jurídica da Presidência da República, Brasília, vol. 10, n. 90, Edição Especial, Abril/Maio 2008, p. 1-44. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_90/Artigos/PDF/VanessaOliveira_Rev90.pdf> Acesso em 3 set 2014.

[45]     Apud. SARLET, Ingo Wolfgang (coord.). O conceito de dignidade humana: substrato axiológico e conteúdo normativo. In: Constituição, direitos fundamentais e direito privado. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 119.

[46]     Conferência Mundial Sobre Direitos do Homem (1993). Declaração de Viena e Programa de Ação. Capítulo II, “B”, n. 3, iten n.º 38. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/viena/viena.html>. Acesso em 3 set 2014.

[47]     CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER (1979). Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/discrimulher.htm> Acesso em 3 set 2014.

[48]     Organização das Nações Unidas (ONU). UN General Assembly. United Nations Rules for the Treatment of Woman Prisioners and Non-Custodial Measures for Woman Offenders (the Bangkok Rules). 2010. P. 22. Disponível em: <http://www.ihra.net/files/2010/11/04/english.pdf>. Acesso em: 3 set 2014.

[49]     FREITAS, Lucia Barros de. Discriminación sexista y otras formas de violencia estructural e institucional contra la mujer. Tesis Doctoral. Universidad Carlos III de Madrid. Diciembre 2004. P. 19. Disponível em: <http://dialnet.unirioja.es/servlet/tesis?codigo=2221> Acesso em 3 set 2014.

[50]     Idem: 49. Texto original:

El tema será tratado desde una perspectiva de género, subrayándose que la sociedad y el Estado, arropados por el sistema patriarcal, practican una violência estructural e institucional contra la mujer, manifestada e impartida por un trato desigualitario hacia los géneros, bien a través de los comportamientos, de las ideologías, de las actitudes, bien a través de la creación, de la interpretación y de la aplicación de las normas. Estamos hablando de la violencia estructural e institucional contra la mujer, engendrada por el Patriarcado y, por ello mismo, constituye un problema que debe ser enfrentado desde la perspectiva del poder, dentro o fuera del hogar, esto es, en el ámbito público y en el ámbito privado.

[51]     Bff: Frauen Gegen Gewalt. Strukturelle Gewalt. Sem data de Publicação. Disponível em: <https://www.frauen-gegen-gewalt.de/anzeichenmerkmale.html> Acesso em: 4 set 2014.

[52]     Idem: 51. Texto original:

Ungleiche Machtverhältnisse in einer Gesellschaft sind sehr häufig zum Nachteil von Frauen. Frauen sind besonders stark von struktureller Gewalt betroffen und in ihren Entwicklungs- und Lebenschancen eingeschränkt. (…).

…auch andere Formen von Gewalt an Frauen, wie z.B. häusliche Gewalt, stehen im Zusammenhang mit struktureller Gewalt. (…).

Strukturelle Gewalt trifft nicht alle Frauen in gleichem Maße. Frauen mit Behinderung sind in höherem Maße von struktureller Gewalt betroffen, zum einen aufgrund der mit der Behinderung einhergehenden Abhängigkeiten und Diskriminierungen, zum anderen aufgrund ihrer Geschlechtszugehörigkeit. Aber auch Frauen aus bildungsfernen Schichten, Frauen mit Migrationsgeschichte, lesbische oder bisexuelle Frauen, transgender oder intersexuelle Personen erfahren aufgrund der mehrfachen Diskriminierungserfahrungen in stärkerem Maße strukturelle Gewalt.

[53]     Indaga-se: na criminalização secundária, isto é, na definição da conduta punível em concreto e de quem é criminoso, tratando-se de tráfico [ilícito de drogas praticado por] mulheres [em situação de vulnerabilidade], os juízes examinam a prova e sentenciam desde uma perspectiva de gênero? Se a resposta for positiva significa que esses profissionais de direito estão atentos à desigualdade material entre homens e mulheres, estão conscientes de sua causa e, portanto, cuidam para que o processo penal não reforce a vitimização delas ou, em outras palavras, não reproduza a violência de gênero contra as mulheres. Se a resposta for negativa significa que o processo penal reproduz a violência contra as mulheres. (CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer. A criminalização do tráfico de mulheres: proteção das mulheres ou reforço da violência de gênero? Cadernos pagu (31), julho-dezembro de 2008:101-123. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cpa/n31/n31a06> Acesso em 2 set 2014.) [modificado o sentido da pergunta a fim de adaptar ao tema aqui proposto]

[54]     Segundo palavras do Ministro Dias Toffoli o Estado é “partícipe” da promoção da dignidade da pessoa humana (ADI 4424).

[55]     BRITTO, Carlos Ayres. Teoria da constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p, 216-217.

[56]     Revisão final da pesquisa da jurisprudência dos Tribunais Superiores foi realizada no dia 02/09/2014.

[57]     Idem: 56.

[58]     Revisão final da pesquisa da jurisprudência dos Tribunais Estaduais e do DF foi realizada no dia 02/09/2014.

[59]     Cf. andamento processual. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/?tb=proc> Acesso em 4 set 2014.

[60]     Sentence Council – Drug Offences Definitive Guideline. Publicado em 2012. P. 4. Disponível em: <http://sentencingcouncil.judiciary.gov.uk/docs/Drug_Offences_Definitive_Guideline_final_(web).pdf> Acesso em 4 set 2014.

[61]     Idem: 60, p. 4. Texto original:

Culpability demonstrated by offender’s role

One or more of these characteristics may demonstrate the offender’s role. These lists are not exhaustive.

LEADING role:

directing or organising buying and selling on a commercial scale;

substantial links to, and influence on, others in a chain;

close links to original source;

expectation of substantial financial gain;

uses business as cover;

abuses a position of trust or responsibility, for example prison employee, medical professional.

SIGNIFICANT role:

operational or management function within a chain;

involves others in the operation whether by pressure, influence, intimidation or reward;

motivated by financial or other advantage, whether or not operating alone;

some awareness and understanding of scale of operation;

supply, other than by a person in a position of responsibility, to a prisoner for gain without coercion.

LESSER role:

performs a limited function under direction;

engaged by pressure, coercion, intimidation;

involvement through naivety/exploitation;

no influence on those above in a chain;

very little, if any, awareness or understanding of the scale of operation;

if own operation, absence of any financial gain, for example joint purchase for no profit, or sharing minimal quantity between peers on non-commercial basis.

[62]     Ibidem: 60, p. 7. Texto original:

Factors reducing seriousness or reflecting personal mitigation:

Lack of sophistication as to nature of concealment;

Involvement due to pressure, intimidation or coercion falling short of duress, except where already taken into account at step 1;

Mistaken belief of the offender regarding the type of drug, taking into account the reasonableness of such belief in all the circumstances;

Isolated incident;

Low purity;

No previous convictions or no relevant or recent convictions;

Offender’s vulnerability was exploited;

Remorse;

Good character and/or exemplary conduct;

Determination and/or demonstration of steps having been taken to address addiction or offending behaviour;

Serious medical conditions requiring urgent, intensive or long-term treatment;

Age and/or lack of maturity where it affects the responsibility of the offender;

Mental disorder or learning disability;

Sole or primary carer for dependent relatives.

[63]     IDPC - International Drug Policy Consortium - Una red mundial para la promoción de un debate abierto y objetivo sobre las políticas de drogas. Reforma en la ley de drogas de Costa Rica beneficia a mujeres en condiciones de vulnerabilidade y sus famílias. Publicado em 20.08.2013. Disponível em: <http://idpc.net/es/blog/2013/08/reforma-en-la-ley-de-drogas-de-costa-rica-beneficia-a-mujeres-en-condiciones-de-vulnerabilidad-y-sus-familias> Acesso em 5 set 2014.

[64]     Art. 77 (...).

ARTÍCULO ÚNICO.

La pena prevista en el artículo anterior será de 3 a 8 años de prisión cuando una mujer sea autora o participe en la introducción em establecimientos penitenciarios de sustancias tóxicas, estupefacientes o sustancias psicotrópicas, y cumpla una o varias de las siguientes condiciones:

a) Se encuentre en condición de pobreza.

b) Sea jefa de hogar en condición de vulnerabilidad.

c) Tenga bajo su cargo personas menores de edad, adultas mayores, o personas con cualquier tipo de discapacidad que amerite La dependencia de la persona que la tiene a su cargo.

d) Sea una persona adulta mayor en condiciones de vulnerabilidad.

[65]     Asamblea Legislativa De La República de Costa Rica. Comision Permanente Especial De Seguridad Y Narcotráfico. REFORMA A LA LEY SOBRE ESTUPEFACIENTES, SUSTANCIAS PSICOTRÓPICAS, DROGAS DE USO NO AUTORIZADO, ACTIVIDADES CONEXAS, LEGITIMACIÓN DE CAPITALES Y FINANCIAMIENTO AL TERRORISMO, LEY N.º 8204 DEL 26 DE DICIEMBRE DE 2001, PARA INTRODUCIR LA PROPORCIONALIDAD Y ESPECIFICIDAD DE GÉNERO. EXPEDIENTE N.º 17.980. 26 de junio de 2012. PP. 1-18. Disponível em: <http://derechoaldia.com/attachments/article/358/_REFORMA.pdf> Acesso em 4 set 2014.

[66]     Konstantin Gerber. Advogado. “DIREITO DE PETIÇÃO PARA DEFESA DE DIREITOS”. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=148446&tp=1> Acesso em 5 set 2014.

[67] Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=113035> Acesso em 5 set 2014.

[68]     Disponível em: <file:///C:/Users/Usu%C3%A1rio/Downloads/sf-sistema-sedol2-id-documento-composto-21409.pdf> Acesso em 5 set 2014.

[69]     Trâmite do PLC n.º 37/2013. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=113035> Acesso em 5 set 2014.

[70]     Confira-se parte do texto:

“Cabe destacar que a subjetividade aberta pela lei de 2006, associada ao maior rigor punitivo que foi criado, fez com que, de 2007 a 2010, o número de presos por tráfico de drogas aumentasse 62%. Eram 65.494 pessoas em 2006 (10,5% da população carcerária) e passou para 106.491 pessoas presas (20% da população carcerária). Nesses quatro anos, o tráfico de entorpecentes ultrapassou o crime de roubo qualificado como tipo penal mais comum nas prisões. Esse cenário ainda piorou, alcançando, atualmente, 138 mil pessoas presas por crimes relacionados a drogas: 25% de um total de aproximadamente 550 mil presos.

As mulheres são particularmente afetadas por esse fenômeno. Em 2006, havia 5.800 mulheres presas por tráfico; em 2012, cerca de 14 mil. Hoje, as presas por tráfico representam cerca de 50% de toda a população carcerária feminina (dados do Infopen).

A propósito da taxa de encarceramento no Brasil, verificamos que ela triplicou nos últimos dezesseis anos. A proporção, que era de 1 preso para cada 627 adultos, em 1995, está em 1 preso para cada 262 adultos. Já é a terceira maior taxa entre os dez países mais populosos do mundo. Mantendo essa tendência de crescimento, em dois ou três anos o Brasil tomará o posto de terceira maior do mundo em números absolutos da Rússia, que registrou recentemente uma redução no número de presos, de 864.197 ao final de 2010 para 708.300 em novembro de 2012.2 A taxa de ocupação dos presídios brasileiros já atinge 177%, ou seja, está próxima do dobro da capacidade.

Além disso, a margem de subjetividade aberta por critérios como “circunstâncias sociais e pessoais” vem servindo para reforçar estereótipos e preconceitos com usuários de camadas sociais pobres e excluídas. Ocorre que, na prática, com base nesses termos, uma pessoa detida com uma pequena quantidade de droga, em uma favela, acaba sendo enquadrada como traficante e vai presa; em um bairro rico, como usuária e permanece em liberdade. De modo que, atualmente, o aspecto mais relevante na diferenciação entre usuário e traficante é a condição socioeconômica do investigado.

Considerando, portanto, que a Emenda nº 5-CCJ mantém a ampla margem de subjetividade contida no texto em vigor, que tem favorecido a prisão de usuários e dependentes de drogas, opinamos por sua rejeição.” Disponível em: <file:///C:/Users/Usu%C3%A1rio/Downloads/sf-sistema-sedol2-id-documento-composto-28847.pdf> Acesso em 27/08/2014.

[71]     ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O Princípio Constitucional da Igualdade. Belo Horizonte: Editora Lê, 1990, p. 75.


Autor

  • Ronio Neves da Cunha Junior

    Servidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Aluno Especial da Pós-Graduação em Mestrado na Universidade de Brasília - UNB (2014). Ex-aluno da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (ago 2008 a out 2009).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CUNHA JUNIOR, Ronio Neves da. Encarceramento: cegueira e indiferença da vulnerabilidade e da desigualdade de gênero na Lei de Drogas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4271, 12 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31986. Acesso em: 10 maio 2024.