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A competência normativa das agências reguladoras

(Limites e possibilidades)

A competência normativa das agências reguladoras. (Limites e possibilidades)

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Estado-gerente - agências reguladoras - competência normativa - interesse público.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO SETOR ECONÔMICO. 1.1 O LIBERALISMO ECONÔMICO. 1.2 O INTERVENCIONISMO ESTATAL. 1.3 O ESTADO REGULADOR. 2 FUNDAMENTOS DA REGULAÇÃO. 2.1 OBJETIVOS DA REGULAÇÃO. 2.1.1 Igualdade social. 2.1.2 Desenvolvimento. 2.2 PRINCÍPIOS DA REGULAÇÃO. 2.2.1 Princípio da democracia econômica. 2.2.2 Cooperação. 2.2.3 Interesse público. 2.2.4 Proteção ao Consumidor. 2.2.5. Eficiência. 3 A FUNÇÃO REGULATÓRIA4 A EXPERIÊNCIA NORTE-AMERICANA. 5 AS AGÊNCIAS REGULADORAS NO BRASIL. 5.1 NATUREZA JURÍDICA. 5.2 CARACTERÍSTICAS. 5.2.1 Autonomia administrativa. 5.2.2 Investidura de seus dirigentes. 5.2.3 Autonomia financeira. 5.2.4 Participação. 5.3 DIFERENÇA ENTRE AGÊNCIA REGULADORA E AGÊNCIA EXECUTIVA. 6 A COMPETÊNCIA NORMATIVA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS. 6.1 O PROCESSO LEGISLATIVO ORDINÁRIO E O FATO ECONÔMICO. 6.2 O EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA NORMATIVA PELO PODER EXECUTIVO. 6.3 PRODUÇÃO DE NORMAS COMO ATRIBUIÇÃO DAS AGÊNCIAS. 6.4 DESLEGALIZAÇÃO E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. 6.5 EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA NORMATIVA PELAS AGÊNCIAS REGULADORAS - POSICIONAMENTOS. 6.5.1 Poder normativo com natureza de direito regulatório. 6.5.2 Poder normativo com natureza de direito regulamento. 6.5.3 Poder normativo com natureza de ato administrativo geral e abstrato. 6.6 MECANISMOS DE CONTROLE. 6.6.1 Princípio da separação dos poderes. 6.6.2 Discricionariedade. 6.6.3 Controle administrativo. 6.6.4 Controle político. 6.6.5 Controle financeiro. 6.6.6 Controle social. 6.6.7 Controle jurisdicional. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objeto de análise as agências reguladoras brasileiras no âmbito federal, entidades concebidas para regular a intervenção do Estado na economia, fenômeno este que tem se manifestado após a  Reforma do Estado brasileiro iniciada na década de 90 e que até agora gera tantas posições adversas.

Em virtude da inserção dessa nova entidade na estrutura da Administração Federal, muitas dúvidas surgiram sobre a polêmica função normativa desses órgãos, principalmente sobre a possibilidade de inovação no ordenamento jurídico por meio de normas gerais e abstratas, tendo em vista a tecnicidade peculiar a seus respectivos setores de atuação. Mais do que uma breve polêmica, no decorrer da presente monografia, busca-se mostrar a necessidade da mudança de paradigmas remanescentes do antigo modelo de Estado-empresário, para a efetiva consolidação do Estado Regulador.

Para tanto, o presente trabalho está dividido em seis capítulos, além desta introdução, conclusão e referências bibliográficas.

O primeiro capítulo expõe a evolução histórica dos modelos estatais, partindo do Liberalismo Estatal, passando pelo Intervencionismo Estatal e finalmente chegando ao Estado Regulador.

O segundo capítulo procura esclarecer os fundamentos da regulação, esmiuçando seus objetivos e princípios norteadores que identificam-se com a nova ordem constitucional.

O terceiro capítulo faz um breve relato sobre a função regulatória, como meio eficaz de promover o bem-estar social fazendo com que a Administração Pública volte-se para sua atividade fim.

O quarto capítulo aborda a experiência norte-americana na atividade regulatória, na qual firmou-se na década de trinta, sendo utilizada como parâmetro no modelo brasileiro.

O quinto capítulo descreve a atividade regulatória no Brasil, citando as agências reguladoras no âmbito federal, sua natureza jurídica, características e individualidades.

O sexto capítulo aborda a parte mais polêmica do trabalho, tratando sobre a competência normativa das agências reguladoras, expondo posicionamentos doutrinários que, após quase vinte anos de transição, geram tanta discussão sobre a legitimidade acerca do poder normativo das agências reguladoras.


1 A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO SETOR ECONÔMICO

1.1 O LIBERALISMO ECONÔMICO

O modelo político e econômico adotado no século XVIII caracterizou-se pela passagem de três fases distintas no que tange à sua participação do Estado na atividade econômica.

Primeiramente, observamos que após a Revolução Francesa tivemos uma notada ausência de regulação econômica. Norteando-se por princípios liberais, o Estado não manifestava-se a fim de prestar as mínimas garantias a fim de proteger os direitos do cidadão. Apenas alguns serviços foram encampados pelo poder público e, logo em seguida, foram transferidos a particulares.

Observamos, dessa forma, que os serviços públicos sempre estiveram velados pela “longa manus” do ente Estatal, quer como titular quer como poder concedente. Entretanto, vemos que as relações entre Estado liberal e sociedade estão bem divididas. A realização de atividades públicas por particulares era feita mediante contratos, e limitava ao extremo a intervenção Estatal na atividade privada. Tal procedimento alcançava o propósito das correntes liberais da época, onde se objetivava o “Estado Mínimo”.

No início do século XX, o processo de desenvolvimento econômico e social foi atribuído ao Estado. Essa iniciativa passou a intensificar-se após a Segunda Guerra Mundial. O Poder Público passou a promover o bem-estar social. A igualdade social foi tomada como pilar básico pelo pensamento liberal, é reconhecida atualmente de maior importância do que a liberdade individual e econômica.

1.2 O INTERVENCIONISMO ESTATAL

No início do século XX, os organismos estatais intervencionistas tiveram uma proliferação acentuada, principalmente no período pós-guerra e perduraram até a década de 70. Seu crescimento deu-se devido o grande crescimento econômico de economias capitalistas, associado à evolução proporcionada pelo conflito de classes sociais, que adquiriu contornos cadavez menos revolucionários e mais institucionalizados.

Tendo em vista a mudança dos instrumentos da Administração Pública para atender à nova realidade, foi necessário que sua estrutura fosse aprimorada, ocasionando um grande aumento do Poder Executivo.

Enquanto o Estado foi capaz de manter todos os serviços a que se comprometeu, foi possível mascarar as origens dos conflitos sociais e saciar necessidades imediatas da classe operária, de modo que conflitos fundamentais foram afastados do centro da vida política. Todavia, a provisão estatal adquiriu tamanha importância que o capitalismo tornou-sedependente de práticas intervencionistas, as quais passaram a ditar a tônica da vida econômica e política. Essa dependência criou um endividamento público sem precedentes, que resultou em um esforço governamental para reduzir seus programas de bem estar social.

O ente Estatal assumira o papel de controlar a produção de bens e serviços, tornando-se produtor direto e  planejador da economia, até então bastante autocentradas e voltadas ao suprimento de suas demandas. O planejamento de investimentos públicos, além de atender a uma lacuna deixada pelo mercado, visava também o desenvolvimento de regiões, ou setores específicos. Em contrapartida, não se imaginou que o Estado tinha uma capacidade limitada de assumir tamanha

Ao término do período próspero do Pós-Guerra, chegou ao fim o tempo em que se permitia ao Poder Público atuar como ator e interventor na economia, gerando os bens necessários ao desenvolvimento de seus nacionais.

Nos países periféricos, este foi o período do aumento da dívida externa, de desvalorização dos produtos colocados por estes no mercado internacional e redução de ajuda externa. Constata-se que, sob o aspecto econômico, a década foi verdadeiramente desastrosa. Ao mesmo tempo, não se pode negar que o aumento da participação social e política dos cidadãos foi bastante significativa, iniciando uma fase em que o respeito ao princípio democrático e aos direitos  fundamentais não mais poderia ser afastada.

1.3 O ESTADO REGULADOR

Surge tal modalidade de Estado como consequência da redefinição do papel do Estado social. Relaciona-se especificamente com a atribuição à iniciativa privada da prestação de bens e serviços antes ofertados, com exclusividade ou  não, pelo estado. O Estado sai de cena como prestador e surge como agente normativo e regulador da atividade econômica.

Em verdade, o Estado Regulador, pressupõe o Estado de Direito e o monopólio na produção de normas jurídicas, mas não se exaure nestes termos.

O termo Estado Regulador não prescinde da caracterização do Estado de Bem-Estar Social, concepção esta que põe o Estado como agente prestador de serviços e empresário, que atua ativamente. O Estado de Bem-Estar Social  evidencia-se por "um conjunto de propostas mais ou menos homogêneas, compostas pelo reconhecimento de uma função intervencionista estatal orientada a promover o reconhecimento econômico e social".1                                                  

Esclarece William Glade (1988) que:  O poder regulatório, tendo em vista a complexo mundo  contemporâneo, tem se balizado muito por princípios, objetivos genéricos e programa. É bem verdade, que suas normas  maleáveis, são princípios gerais, caracterizando um notável grau  de discricionariedade devido ao elevado nível de especialização das suas normas, variando de acordo com a realidade  socioeconômica atual.                                            

Com a queda do modelo intervencionista, começou a eclodir uma infinidade de demandas que até então eram  supridas, bem como outras que naturalmente começaram a surgir. Todos esses serviços, que haviam sido inseridos no texto Constitucional dos países que adotaram o modelo intervencionista, ocasionaram uma corrida ao judiciário, uma vez que,sendo encampadas pelo Estado, tornaram-se objetos de reivindicação.

Reconhecendo o mercado como grande orientador das atividades privadas, por essência livre de interferências e  direcionamentos do Estado, passa a se conceber necessário, entretanto, para seu bom funcionamento, o desenvolvimento de uma nova estrutura reguladora estatal afinada com a necessidades de um complexo sistema industrial.  Essa faceta adicional de complementaridade toma várias formas, entre elas a da necessidade de proteger o ambiente, de estabelecer padrões para produtos em defesa a saúde e da segurança do consumidor (e também, de enfrentar as demandas mais exigentes do mercado exportador), de obrigar a competição, onde a abertura da economia não basta para  estabelecer mercados disputáveis (especialmente, talvez, no setor  produtor de bens não comercializáveis), de supervisionar indústria de “utilidade pública”, operada pelo setor privado, de   obrigar a transparência no mercado de capitais, exigindo maior exposição das informações financeiras verificadas, e de assegurar   a estabilidade e a integridade do setor financeiro, de brigar melhor gerenciamento de intermediários financeiros, cujas operações criaram grandes dificuldades no México, Brasil, Venezuela e Argentina, por exemplo. Justamente por isso, a maioria das nações ainda está precisando de novos sistemas  reguladores, para restaurar a saúde de seus programas de previdência social, lidar com problemas aparentemente insolúveis de saúde, fornecer serviços de educação mais adequados às necessidades de um mercado de trabalho em constante evolução, e com maior eficiência do que a que tem caracterizado o setor educacional até então, fornecer ao trabalhador ambientes saudáveis e seguros, que as principais economias industriais vão exigir cada vez mais como condição para receber os produtos importados das nações recém-industrializadas e em desenvolvimento.2

No Estado Regulador há uma alteração da suposição de que o Estado que deva prestar, através de seus agentes,  os serviços públicos. Não só os serviços industriais devem estar inteiramente no âmbito do setor privado, como também os  serviços públicos. A orientação é a substituição do Estado-prestados pelo Estado-regulador. Por essa orientação, todos os  serviços públicos que puderem ser prestados pela livre iniciativa, deverão sê-lo. Apenas educação e seguridade social  devem permanecer sob o controle do Estado, evitando-se sua mercantilização.


2 FUNDAMENTOS DA REGULAÇÃO

Nesse contexto, a regulação surge como uma nova forma de intervenção do Estado na atividade econômica. A  Doutrina entende por regulação, “toda forma de organização da atividade econômica através do Estado, seja a intervenção através da concessão de serviços públicos ou o exercício do poder de polícia” É notório que sem este mecanismo estaríamos entregues à um Estado Neo-liberal, onde os efeitos danosos da omissão do Estado traria conseqüências  catastróficas, caso o controle do mercado econômico fosse totalmente entregue à atividade privada.

2.1 OBJETIVOS DA REGULAÇÃO2.1.1 Igualdade social

O Estado busca a igualdade social no momento em que passa a prover as condições mínimas para seus nacionais,  bjetivo este que perdura até hoje. Pilar este que norteia a atividade pública e o Estado Democrático de Direito, certo de que o ente público deve orientar-se no interesse do bem comum, garantindo dessa forma, uma busca constante pela igualdade abstrata mínima entre os administrados.

2.1.2 Desenvolvimento

Toda a atuação do Estado sobre a economia deve ser pautada pela busca do desenvolvimento econômico, isto é,  pela busca de oferta permanente de bens e serviços a ser usufruído por uma comunidade, em quantidade  proporcionalmente superior a seu incremento demográfico. O Estado deve buscar constantemente a satisfação geral sem, contudo, alterar o aspecto estrutural da economia.3

2.2 PRINCÍPIOS DA REGULAÇÃO

 

Entende-se por princípios da regulação o conjunto de fundamentos que norteiam a atividade intervencionista do  Estado no ramo da economia privada de interesse público. Compreendendo-se nos seguintes tópicos:

2.2.1 Princípio da democracia econômica

Consiste no balizamento da atividade regulatória a fim de propiciar aos agentes econômicos uma maior participação, caracterizando-se na aproximação da Administração e esses agentes por meio da simplificação do processo econômico por meio da exclusão de determinados agentes desse processo.

2.2.2 Cooperação

Tal princípio consiste na busca de mecanismos que promovam a harmonização das relações econômicas,  minimizando a concorrência desleal. Tendo em vista a livre iniciativa, tal objetivo só é capaz de prosperar com a regulação de certos ditames a cargo do ente Estatal.

2.2.3 Interesse público

Na definição de BANDEIRA DE MELLO: 

Interesse público deve ser conceituado como o interesse resultante do conjunto de interesses que os indivíduos pessoalmente tem quando considerados em sua qualidade de  membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem.4

Segundo Márcio Pestana (2008), em Direito Administrativo Brasileiro:

Daí percebe-se a presença de dois vetores axiológicos: o coletivo ou público, de um lado, e o individual ou privado de outro. A supremacia, no caso, daquele sobre este último não quer dizer que este inexista e que aquele tenha caráter absoluto. O que se quer ferir, com tintas carregadas de vibrantes pigmentos, é que o interesse coletivo deve, sempre, prevalecer sobre o interesse do indivíduo. Tal não equivale a dizer que os direitos e interesses individuais sejam desprezados, dando margem à arbitrariedades e excessos.5

 

 

Ora, nesse prisma, a regulação mais do que nunca se presta a propiciar o bem comum por meio do controle da  economia privada.

A função regulatória foi e está sendo essencial para a eficiência do processo de desestatização, certo de que na  maior parte dos ritos de migração tratam-se de processos complexos, que são realizados mediante contratos de longo prazo. Isso faz com que ocorram mudanças inesperadas no curso do contrato, que deve ser adaptado a nova realidade mediante o julgamento isento dos princípios que o norteiam.

2.2.4 Proteção ao Consumidor

Outro princípio norteador da atividade regulatória caracteriza-se pela sua profundidade no Direto Brasileiro, servindo de modelo para diversas economias, tanto que possui previsão no texto constitucional, dentre os direitos fundamentais (CF, art. 5º, XXXII), bem como em legislação específica (Código do Consumidor).

A defesa do consumidor, reconhecida como direito fundamental pode ser explicada pelo fato de que em uma  economia de mercado, é inconcebível que o indivíduo como sujeito de direito, e por sua vez, o pólo mais fraco nesta relação diga-se de consumo, não seja resguardado pelo Estado através de uma política regulatória.

2.2.5. Eficiência

 

Convencido de que a eficiência exigida na prestação de serviços e na produção de bens e utilidades encontra-se  com o setor privado, apresentou-se no cenário mundial a proposta de transformação do Estadoempresário em um Estado-mínimo.

A busca da eficiência, caracterizada pela prestação de serviços com excelência tanto na qualidade como na quantidade, constitui fator preponderante nas econômicas atuais, emprestando-se uma importância nunca antes vista à macroeconomia, objetivando a utilização dos recursos na melhoria do resultado dos processos, que são a satisfação dosconsumidores dos serviços.6


3 A FUNÇÃO REGULATÓRIA

Como já visto, percebe-se um rápido processo de transformações tanto na sociedade em geral, quanto no mercado. A figura do Estado Liberal, no qual o intervencionismo Estatal na economia era inadmissível, foi superada, com a instituição de Estado intervencionista no momento pósguerra, quando era necessária, por um lado, uma reconstrução dos paísesparticipantes das duas grandes guerras e, por outro, da estruturação dos países que não foram afetados diretamente pelas guerras, mas que almejavam iniciar seu processo de industrialização.

Naquele momento não havia a possibilidade do capital privado desempenhar tais atividades, tendo em vista a  dificuldade de concentração de capital. É nesse contexto que o Estado assume para si a figura do Estado Empresário, para o desempenho das atividades de base, de infra-estrutura, às quais fazia-se de suma importância na época de acordo com o contexto histórico.

Dessa forma, justificou-se a atividade empresarial do Estado em setores tais como, siderurgia, mineração, produção de gás e petróleo, serviços públicos como telecomunicações, água, energia elétrica, saneamento básico, etc.

Entretanto, com o passar do tempo, verificou-se que o desempenho de tais serviços pela Administração Pública passou a ser inadequado, tanto no aspecto administrativo, quanto empresarial. Podemos citar como alguns dos problemas enfrentados: a) ineficiência do serviço; b) defasagem no aprendizado de novas técnicas; c) morosidade.

Portanto, como o advento da Constituição da República de 1988, em seu art. 173 caput, verificamos uma inovação:“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interessecoletivo, conforme definidos em lei”.

Desta forma, vemos que a regra é a proibição da exploração direta da atividade econômica pelo Estado, exceto nos casos imperativos da segurança nacional ou de relevante interesse coletivo, fora essas hipóteses, o Estado só deverá exercer a atividade econômica quando não por possível ao particular, objetivando-se, desta forma, que a Administração Pública volte-se para sua atividade fim.


4 A EXPERIÊNCIA NORTE-AMERICANA

As primeiras agências reguladoras dos EUA surgiram no âmbito dos Estados-membros, em 1839, Rhode Island e em 1844, a New Hampshire, ambas disciplinavam o transporte ferroviário. Mais tarde, em 1889, foi criado o Insterstate  Commerce Commissin (I.C.C), pelo governo americano, esta com âmbito nacional, considerada a primeira agênciareguladora do mundo. Tinha por objetivo minimizar as disputas entre as empresas do transporte ferroviário e os empresários rurais.7 Essa idéia de regulação foi influenciada pela colonização inglesa, que naquele contexto tabelava os preços cobrados por alguns serviços pelos imigrantes do Reino Unido.

Com o tempo, foram criadas uma série de agências, tais como:

FDA- Food and Drug Administration, em 1932, para regular o setor de alimentos e medicamentos;

AAA- Agriculture Adjustment Administration, em 1933, para regular o setor agrícola;

SEC- Securits anda Exchange Comission, em 1933, para regular o mercado financeiro;

FDIC- Federal Deposit Insurance Corporation, em 1933, para regular o setor de seguros;

FCC- Federal Communications Comission, em 1934, para regular o setor de telecomunicações;

NLRB- Nacional Labor Relations Bord, em 1935, para regular o setor do trabalho;

FMC- Federal Maritime Commission, em 1936, para regular o transporte marítimo,

CAB- Civil Aeronautics Board, em 1938, para regular o setor aeronáutico.8

O então presidente Franklin Roosevelt utilizou-se da regulação como instrumento de políticas econômicas para enfrentar a grande crise de 1929. Essas agências reguladoras intervieram fortemente na economia americana, que até então era regida por princípios do liberalismo (laissezfaire).

 

Dentre os poderes conferidos às agências, a competência normativa é, sem dúvida, o mais discutido na doutrina e o mais questionado judicialmente. Há muito tempo os Estados Unidos discutem a magnitude da delegation doctrine no campo da edição de normas primárias por agências reguladoras. Duas doutrinas se contrapõem: a delegation doctrine e a non-delegation doctrine.

A Constituição americana elenca em seu artigo 1º § 1º, que “all legislative powers herein granted shal be vested in a Congress of the United states”, havendo margem para que tal dispositivo seja interpretado como atribuição exclusiva do Congresso – Poder Legislativo – a edição de leis.

Porém, o § 8º do mesmo artigo atribui ao Congresso o Poder de “make all laws witch shall be necessary and proper for carring into execution” - (interpretação da corrente delegation doctrine) atribuir a outras entidades estatais o poder de produzir normas que originariamente seriam de sua competência.

Cabe ressaltar ainda que, no contexto da administração norteamericana, as agências comportam classificação em duas espécies: regulatory agencye non-regulatory agency.

As agências reguladoras têm poderes conferidos por delegação do Congresso Nacional. Compreendem as capacidades normativa e decisória. Condicionam direitos, liberdades e atividades econômicas. Resolvem, ainda, conflitos entre pessoas a elas vinculadas. Já as agências não reguladoras correspondem àquelas que são investidas para prestaçãode serviços públicos quando não exercidos pela administração centralizada, com poderes bem mais limitados, cuja atividade se reduz a reconhecer benefícios e ajudar aos mais desfavorecidos na prestação de serviços sociais.

Embora a estrutura regulatória americana tenha servido de parâmetro à brasileira, é de se observar que há dessemelhança jurídica entre os sistemas administrativos. No Brasil, há uma regulação legal detalhada do funcionamento da Administração Pública, inclusive, com a diferenciação feita entre Administração Pública direta e indireta e a exemplificação das entidades integrantes desta última. Nos Estados Unidos, inexiste essa forma de organização legal, havendo vários entescom funções administrativas e, dentre esses, as agências.

Assim, falta um texto normativo genérico, pois cada agência tem regulamentação específica, a depender da lei que estabelece sua criação e que dispõe sobre sua estrutura e formas de atuação. É certo que essa legalização totalmente dispersa não mais subsiste nestes moldes, pois os Estados Unidos adotaram algumas regras gerais, principalmente emrelação ao processo administrativo.

Cabe ressaltar que a regulamentação dos diversos setores da economia norte-americana não se deu necessariamente com a passagem da exploração de serviços ao capital privado. Muitas agências foram criadas ser que em nenhum momento tivesse sido o Estado o titular da exploração.


5 AS AGÊNCIAS REGULADORAS NO BRASIL

No Brasil, as agências reguladoras são um instituto bastante recente, surgido a partir de 1996 e fruto do processo de desestatização que desencadeou a partir de 1990, com a Lei nº 8.031/90 que estabeleceu o chamado “Plano Brasil Novo”, posteriormente regulamentado pela Lei nº 9.491/97, que disciplina o Plano Nacional de Desestatização.

Importante esclarecer que a inserção de agências reguladoras no ordenamento jurídico não mantém sempre relação direta com o processo de desestatização, pois, como visto anteriormente, nos Estados Unidos essas agências foram criadas dissociadas desse processo, porque na maioria dos setores sequer conheceram o fluxo de estatização. Mas, semdúvida, países que adotaram políticas estatizantes tendem a adotar o modelo de administração centralizador e hierarquizado.

Para a efetivação de tal reforma, necessária se fez a elaboração de emendas à Constituição, servindo de base para a edição de normas infraconstitucionais. Tais normas disciplinaram a privatização de serviços prestados em exclusividade pelo Poder Público, afastaram distinções entre empresas de capital nacional e estrangeiro, facilitando o ingresso de recursos com a aquisição de empresas estatais por empresas com capital estrangeiro.

As primeiras agências reguladoras no Brasil surgem num ambiente de privatização, com a missão de regular um setor ainda pouco explorado, o da prestação de serviços públicos por particulares mediante contrato de concessão como o poder público titular do serviço. Neste primeiro momento as agências tratavam de disciplinar a concessão desses serviços públicos de titularidade exercida pela União por meio de sua administração direta As agências reguladoras constituem-se autarquias especiais, estando sujeitas, portanto, ao comando constitucional do art. 37, XIX, o que implica na sua criação e extinção por lei específica. O seu caráter reside na maior autonomia administrativa a elas conferida.

Vale registrar que existe grande diversidade de modelos em todo o mundo e o brasileiro segue uma tendência prevalecente no Europa Continental de instituir entes em regime público administrativo.

No âmbito federal, foram criadas as seguintes agências reguladoras:

Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, instituída pela Lei nº 9.427/96, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com sede e fora no distrito Federal e prazo de duração indeterminado, tendo por finalidade regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal;

Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, instituída por meio da Lei nº 9.472/97, vinculada ao Ministério das Comunicações, com a função de órgão regulador das telecomunicações, com sede no Distrito Federal;

Agência Nacional do Petróleo – ANP, instituída pela Lei nº 9.478/97, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com sede no Distrito Federal, tendo como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo;

Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, instituída pela Lei nº 9.782/99, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede no Distrito Federal, tem por finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária,inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem com o controle de portos, aeroportos e de fronteiras;

Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, instituída pela Lei nº 9.961/00, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede na cidade e estado do Rio de Janeiro, tem por objetivo funcionar como órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde;

Agência Nacional de Águas – ANA, instituída pela Lei nº 9.984/00, vinculada ao ministério do Meio Ambiente, com sede no Distrito Federal, com a finalidade de implementar, em sua área de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrando o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, instituída pela Lei nº 10.233/01, vinculada ao Ministério dos Transportes, com sede no Distrito Federal, atuando no transporte ferroviário de passageiros e cargas ao longo do Sistema Nacional de Viação, na exploração da infraestrutura ferroviária e o arrendamento dos ativos operacionais correspondentes, no transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, no transporte multimodal e no transporte de cargas especiais e perigosas em rodovias e ferrovias;

Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, instituída pela Lei 10.233/01, vinculada ao ministério dos Transportes, com sede no Distrito Federal, atuando na navegação fluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e de longo curso, nos portos organizados, nos terminais portuários privativos e no transporte aquaviário de cargas especiais e perigosas;

Agência Nacional de Cinema – ANCINE, criada pela MP nº 2.228-1/01 vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, com sede no Distrito federal e escritório central na cidade do Rio de Janeiro, tem por finalidade atuar como órgão de fomento, regulação e fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica,Agência Nacional de Desenvolvimento da Amazônia – ADA – instituída pela MP nº 2.175-5/01, é vinculada ao Ministério da Integração Nacional, com sede e foro em Belém, no estado do Pará, tem por objetivo implementar políticas e viabilizar instrumentos de desenvolvimento da Amazônia.

Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, instituída pela Lei nº 11.182/05, é vinculada ao ministério da Defesa, com sede no Distrito Federal, podendo instalar unidades administrativas regionais, a quem compete, por delegação da União federal, regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária.

No âmbito estadual, há uma tendência na criação de um único órgão regulador, abrangendo uma pluralidade de áreas de atuação. Trata-se de agência “multisetorial”, isto é, sem especialização, com competência para todos os serviços. A título de exemplo, no Rio de Janeiro, foi criada a Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos do Estado do Rio de Janeiro – ASEP-RJ, pela Lei estadual nº 2.686, de 13.12.97.

Outro exemplo é a Comissão de Serviços Públicos de Energia – CSPE, instituída pela Lei Complementar nº  833/02, que é agência reguladora criada pelo estado de São Paulo, tendo por objetivo controlar e fiscalizar as concessionárias de energia elétrica e de gás canalizado no estado, assegurando a qualidade do fornecimento de energia à população paulista. É vinculada à Secretaria de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento.

5.1 NATUREZA JURÍDICA

A criação das agências reguladoras não era prevista no Decreto-Lei nº 200/67, que compreende como componentes da administração indireta as pessoas jurídicas de direito público interno com personalidade de direito público ou privado, as quais a lei transfere o exercício de determinada função administrativa. Portanto são previstas no referido diploma legal, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

As agências reguladoras são instituídas no Brasil com a natureza jurídica de autarquia especial. Autarquia - por  realizarem atividade típica estatal, como regulação, fiscalização e intervenção em serviços públicos e atividades econômicas; e Especial – por se atribuir às mesmas um plus em relação às demais autarquias.

Com o surgimento das agências reguladoras, a doutrina tem se preocupado em buscar, no esquadro da  administração tradicional, a natureza jurídica das mesmas. Clareando este novo campo, vieram as leis instituidoras da Agência Nacional de Eletricidade, da Agência Nacional de Telecomunicações e da Agência Nacional de Petróleo, primeiras a serem criadas, conceituando as referidas agências como autarquias reguladoras com mandato fixo para seus dirigentes.

Entretanto apenas a Anatel e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) possuem  previsão expressa na Constituição Federal. Os artigos 21, XI, e 177, § 2º, III, alterados, respectivamente, pelas Emendas Constitucionais nº 8/95 e 9/95, prevêem a promulgação de leis que disponham sobre a exploração das atividades detelecomunicações e de petróleo e a instituição dos respectivos órgãos reguladores. Com fundamento nesses dispositivos, foram promulgadas as leis nº 9.472/97, instituidora da Anatel, e nº 9.478/97, criadora da ANP.

Logo em seguida, leis ordinárias criaram outras autarquias com competência normativa.

A doutrina identifica as agências reguladoras como entidades sob regime especial, às quais seriam atribuídas  prerrogativas próprias de acordo com a natureza de suas atribuições. O regime especial, diferenciado do comum aplicado às demais autarquias no ordenamento jurídico brasileiro, tem previsão expressa em diversos dispositivos das leis instituidoras das agências.

Como exemplo, podemos citar a lei instituidora da Anatel, que em seu art. 8º, §2º, dispõe que "a natureza de  autarquia especial conferida à Agência é caracterizada por independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira". Assim, não obstante a disciplina jurídica das agências seja tratada em leis esparsas, podem-se verificar alguns caracteres comuns a essas entidades, sendo  observado um modelo específico de instituição.Uma dessas características diz respeito à autonomia decisória, tendo em vista que os conflitos administrativos se desencadeiam e são solucionados pelos próprios órgãos da entidade autárquica de regime especial.

Segundo Carvalho Filho (2008), o poder revisional exaure-se no âmbito interno, sendo inviável juridicamente eventual recurso dirigido a órgãos ou autoridades da pessoa federativa à qual está vinculada a autarquia". Os conflitos podem  envolver as entidades sob seu controle direto, como concessionários e permissionários entre si, ou os usuários dos serviços públicos por elas regulamentados. Nesse sentido é que a lei da ANP estatui, no art. 20, que o seu regimento interno disporá sobre os procedimentos a serem adotados para a solução de conflitos entre agentes econômicos, e entre estes e usuários e consumidores, com ênfase na conciliação e no arbitramento.9

A lei instituidora da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, confere à agência, no art. 1º, parágrafo único, "autonomia nas suas decisões técnicas". A autonomia decisória de última instância na esfera administrativa conferida às entidades autárquicas sob regime especial, no entanto, não exclui a possibilidade de apreciação, pelo Poder Judiciário, dequalquer ameaça ou lesão a direito, em consonância com o texto constitucional.

 

Nesse sentido, a lei criadora da Anvisa estabelece, no art. 7º, III, entre suas competências, a de "estabelecer normas, propor, acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária". A lei da ANA determina, no art. 4º, II, que compete à agência "disciplinar, em caráter normativo, a implementação, a operacionalização, o controle e aavaliação dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos". A lei criadora da ANAC, no art. 8º, XXX, dispõe que compete à agência "expedir normas e estabelecer padrões mínimos de segurança de vôo". À Aneel foi outorgada, no art. 2º de sua lei instituidora, a finalidade de "regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal". O que diferencia as autarquias de regime  especial das de regime comum é, assim, justamente o poder regulamentar mais amplo conferido àquelas, o que constitui uma exigência dos tempos modernos.

5.2 CARACTERÍSTICAS5.2.1 Autonomia administrativa

A atuação das Agências Reguladoras aloja-se na intersecção entre a incidência dos vetores publicistas e dos vetores de natureza privada. Portanto, seu papel é extremamente delicado, pois, se de um lado tem o dever de,  concretamente desempenhar as funções que a lei lhe direcionou, de outro, há de contarem com independência,  sensibilidade e tecnicidade suficientes para, pormenorizadamente, conhecer o segmento onde atuam, com isto empreendendo políticas realistas que também confortem e atendam às expectativas do segmento privado.10

A maior autonomia de atuação no regime especial, no entanto, encontra limites no controle administrativo exercido pelo Ministério a que estão vinculadas essas entidades, sob a forma de supervisão ministerial, e na "direção superior da administração federal" prevista no art. 84, II, da Constituição Federal.

 

Pode-se verificar a extrema autonomia das agências no tocante à modalidade diferenciada de licitação. A consulta, cuja previsão genérica surgiu em nosso ordenamento jurídico na Lei Geral de Telecomunicações – Lei nº 9.472/97, é uma modalidade não prevista na Lei nº 8.666/93, para os casos de fornecimento de bens e serviços não classificados como comuns.

Vemos assim, que a Lei nº 9.742/97 criou a possibilidade da Anatel disciplinar uma modalidade de licitação diversa. Não bastasse a duvidosa constitucionalidade dessa previsão, nosso Congresso, posteriormente, estendeu essa modalidade de licitação a todas as agências reguladoras federais, por meio da Lei nº 9.986/00.11

5.2.2 Investidura de seus dirigentes

Segundo Pestana (2008), as Agências Reguladoras são dirigidas em regime de colegiado, por um Conselho Diretor ou Diretoria composta por conselheiros ou diretores, sendo um deles o seu presidente ou o diretor-geral ou o diretor- presidente. O presidente ou o diretor-geral será brasileiro, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceitono campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados, devendo ser escolhidos pelo Presidente da  República e por ele nomeados, após a aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea f, do inciso III, do art. 52, da Constituição Federal (arts. 4º e 5º da Lei 9.986/2000).

Este mandato dos conselheiros dos diretores terá o prazo fixado na lei de criação da respectiva agência, devendo ainda, dispor sobre a nãocoincidência de mandato, consoante os artigos 6º e 7º da Lei nº 9.986/2000.

Tais prazos não devem, no entanto, ultrapassar o do mandato do Presidente da República que procedeu à nomeação.

A estabilidade outorgada aos dirigentes das agências confere maior independência, não muito comum na maior parte das entidades da Administração Indireta, em que os dirigentes, por ocuparem cargos de confiança do Chefe do Poder Executivo, acabam por curvar-se a interferências, mesmo que ilícitas.12

Cabe ressaltar que tanto os conselheiros como os diretores, somente perderão o mandato em caso de renúncia, de condenação judicial transitada em julgado ou de processo administrativo disciplinar, bem como na ocorrência de qualquer situação que seja expressamente prevista na lei de criação de cada agência (art. 9º da Lei 9.986/2000).

5.2.3 Autonomia financeira

Tamanha é a independência regulatória, que compreende ainda a autonomia financeira, que se alcança pelo gerenciamento de recursos próprios. As agências reguladoras são dotadas de receitas próprias, obtidas pela denominada taxa de regulação.

Vale lembrar que a natureza jurídica da taxa de regulação tem ensejado controvérsia, oscilando a doutrina entre a natureza contratual e a tributária. No que tange a serviços públicos, sua natureza é contratual, visto que a base de cálculo é a receita auferida pela concessionária.

Entretanto, existem agências que para exercerem a fiscalização das concessionárias, não podem limitar-se a ao cumprimento de normas contratuais, senão manifestando seu poder de polícia. Desta forma, verifica-se a natureza tributária, tendo em vista manifestar-se o efetivo poder de policia, foto gerados de taxa, na forma do art. 145, II, da constituição da República Federativa do Brasil, bem como do art. 78 do Código Tributário Nacional.13

5.2.4 Participação

 

 

A participação na regulação é característica que confere legitimidade à atuação reguladora, perfazendo-se através da garantia de ampla publicidade de seus atos, com a adoção de instrumentos efetivos que garantam a sua aplicação e, ainda, através de um processo administrativo pautado no devido processo legal, com abertura a qualquer portador de  interesses, que se insere no conceito de processualidade aberta.

Partindo desse ponto, o princípio da participação encontra-se intimamente associado ao do consensualismo, que consiste em alternativa à imperatividade, sempre que possa ser dispensado o poder coercitivo.

A aplicação da consensualidade estabelece o consenso nas relações entre Estado e sociedade, criando atrativos para que a sociedade civil atue, sempre que possível, em parceria com o Estado.

Moreira Neto (2001) estabelece uma tipologia da consensualidade em referência às funções do Estado, que se apresenta na produção de normas, com a adoção de formas alternativas de composição.14

5.3 DIFERENÇA ENTRE AGÊNCIA REGULADORA E AGÊNCIA EXECUTIVA

 

Primeiramente, é preciso esclarecer que, no modelo proposto no Brasil, não há um apego à hermenêutica vocabular, de modo que falar em agências nem sempre explicita o objeto de forma precisa. Necessário se faz destacar que, na Administração Pública brasileira, veremos casos em que a palavra "agência" significa órgão (caso da ABIN - Agência Brasileira de Inteligência), fundação (pode ser o caso das agências executivas) ou autarquia especial (as agências reguladoras).

As agências executivas não representam um tipo novo de entidade. Trata-se de uma qualificação dada tanto às autarquias como às fundações públicas que tenham um plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento institucional, visando à obtenção de maior autonomia, para torná-las mais ágeis e eficazes. Tais organizações, então disciplinadas pelos artigos 51 e 52 da Lei nº 9.649/98 e pelos Decretos 2.487/98 e 2.488/98, celebram contrato de gestão com o respectivo Ministério Supervisor e possuem maior autonomia administrativa, como a prevista no parágrafo único do art. 24 das Lei nº8.666/93. Como exemplo, temos o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, indústria e Comércio Exterior.

De maneira diversa, a criação das agências reguladoras propugna a despolitização das decisões, eliminando-se o conteúdo político, priorizando o conteúdo técnico. Tal recurso visa a afastar a interferência partidária e burocrática, além de atender à pluralidade de interesses, com regulações específicas, setorizadas e independentes. Entrementes, tais quais as agências executivas, também celebram contratos de gestão, fixando metas e objetivos a serem perseguidos.

Diferentemente das Agências Reguladoras, que predominantemente, preocupam-se em fiscalizar e regular a atividade desenvolvida por concessionários, permissionários e autorizatários, as Agências Executivas impressionam-se com a operacionalidade e a produtividade da autarquia ou fundação, conforme depreende -se da aludida Lei 9.649/98.15


6 A COMPETÊNCIA NORMATIVA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS6.1 O PROCESSO LEGISLATIVO ORDINÁRIO E O FATO ECONÔMICO

 

O Brasil, assim como outros países, tem o problema do processo legislativo. É bem verdade que tal processo  funciona como uma garantia da democracia, pois cada projeto de lei deve passar por um conjunto de procedimentos específicos a fim de que possa fazer parte de nosso ordenamento jurídico.

O problema é que os representantes da população, eleitos por esta, os quais fazem parte desse processo, em sua grande maioria são pessoas comuns, e que de direito entendem nada ou quase nada. Muitas vezes por esse motivo é que elementos importantes de um projeto de lei são deixados para trás durante esse processo.

Outro fator prejudicial ao processo legislativo é o tempo. Um projeto é encaminhado em determinado período porque visa atender uma série de problemas neste dado momento, mas devido à demora do processo, o fator fático se modifica, os problemas se alteram e as necessidades passam a ser outras, fazendo com que todo o trabalho tenha se prejudicado devido lentidão no andamento do processo.

A estricto seunsu, o problema ganha proporções quando analisado no prisma do Direito Econômico, quando visa a estabelecer regras para a rápida solução de problemas os quais necessitam de imediata normatização.

Torna-se extremamente inviável o trâmite ordinário para tratar de temas relacionados ao Direito Econômico, sem falar do conhecimento técnico específico para produção de normas atinentes a esse setor.16

Portanto, tornou-se necessário que a produção dessas normas fosse ao mesmo tempo célere e emitida por alguém independente de qualquer ideologia política, mas que observasse os critérios técnicos eeconômicos de cada setor.

Neste cenário é que entram as agências reguladoras com sua função normativa.

 

6.2 O EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA NORMATIVA PELO PODER EXECUTIVO

Dentro do esquadro da separação dos poderes, com seus freios e contrapesos, é atribuída ao Poder Executivo a competência normativa.

Porém, não se confunde a competência normativa com a competência legislativa que é própria do Poder Legislativo.A Constituição brasileira, em sua repartição de funções, a fim de estabelecer equilíbrio entre seus titulares, prevê,  expressamente, a possibilidade de emissão de normas primárias com preponderância do Poder Executivo. As hipóteses são veiculadas nos artigos 62 e 68 da Constituição Federal, instituindo a medida provisória e a lei delegada.

Nas hipóteses veiculadas no artigo 62, é permitido ao Poder Executivo, por meio da Medida Provisória, pela pena do Presidente da República, inovar no ordenamento jurídico, sujeita a medida à conversão em lei ou rejeição pelo Congresso Nacional. Tal possibilidade já sofreu limitação pela Emenda Constitucional nº 32, a qual altera o §1º do artigo 62 da Carta Magna, salvaguardando matérias pelas quais o Executivo não poderia inovar, como nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral, direito penal, processual penal e processual civil, organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o artigo 167, §3º, II, que vise à detenção e sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer ativo financeiro.

Como exemplo de limitação exercida sobre a lei delegada, frisamos o artigo 68 da Constituição Federal, que em seu §1º elenca as matérias que não serão objeto de delegação dos atos de competência exclusiva da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal. São eles: organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros, a nacionalidade, a cidadania, os direitos individuais, políticos e eleitorais, os planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.17

Fora das hipóteses previstas nos referidos artigos 62 e 68 da  Constituição Federal, não é expressamente previsto o exercício de poderes normativos de natureza primária ao Poder Executivo, nem a possibilidade de delegação a este pelo Poder Legislativo.

Neste sentido, dispõe o art. 25 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias:                                                                                                             

Art. 25 – Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei. Todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada  pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange a:                                                                                               

I – ação normativa;

Assim sendo, a doutrina interpreta tal dispositivo como sendo a proibição de delegação de competência normativa ao Poder Executivo, fora das hipóteses supramencionadas.

Sabidamente, a forma de exercício da função normativa pelo Poder Executivo é por excelência, é o regulamento, onde a doutrina vem enfrentando, há tempos, a possibilidade ou não de inovar a ordem jurídica pelos mesmos.

6.3 PRODUÇÃO DE NORMAS COMO ATRIBUIÇÃO DAS AGÊNCIAS

O Ponto mais controvertido acerca das competências das agências reguladoras é, sem dúvida, a competência de produzir normas gerais e abstratas de caráter técnico, capaz de inovar, em certa medida, no ordenamento jurídico no âmbito próprio das finalidades das agências reguladoras.

Dessa forma, essas entidades passam a deter competência para ditar normas com força de lei, com base apenas nos conceitos vagos contidos na legislação.

 

Como já evidenciado pelos argumentos acima expostos, a evolução dos mercados e da tecnologia fizeram com que o fato econômico sofresse transformações muito rapidamente de modo que o processo legislativo não conseguia, efetivamente, atingir seus objetivos.

É importante lembrarmos que ao se estabelecer que as agências podem expedir normas específicas sobre seus respectivos setores regulados, está se criando um mecanismo que torna, de fato, o sistema jurídico mais eficiente, quando se busca através dessas normas perseguir os objetivos do Estado, dentre eles o bem-estar social, a justiça, uma concorrência leal, um mercado livre de especulações e abusos, para que os indivíduos, os administrados, possam exercer a autonomia da vontade.

Assim, essas normas poderão ter natureza praeter legem, quando houver omissão de legislador, mas nunca contra legem18 – devido ao princípio da legalidade administrativa.

Para melhor compreendermos essa natureza da norma, é mister a conceituação de ato administrativo normativo, que é o ato geral e abstrato que contém um comando do Poder Executivo, visando a uniformização e correta aplicação da lei. Assim, esclarecemos tais atos normativos não são capazes de formular políticas públicas para seu respectivo setor, pois esta é função do Legislativo. Entretanto, a função normativa das agências dá-lhes certa discricionariedade para atuar com uma aproximação e um tecnicismo maiores do que o legislador ordinário.19

 

6.4 DESLEGALIZAÇÃO E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Por deslegalização, entende-se “como a retirada, pelo próprio legislador, de certas matérias do domínio da lei, para atribuí-las à disciplina das agências”.20

Alexandre da Silva Amaral (2008), nos traz vários posicionamentos acerca da “deslegalização”, argumenta que tal fenômeno não encontra acolhida na doutrina desenvolvida por Marçal Neto Filho, para quem “a deslegalização ou delegificação não se afigura como aplicável ao Direito brasileiro”.

Também traz o posicionamento de Di Pietro (2008), que reconhece a existência de função reguladora apenas às agências que têm previsão constitucional, como a ANATEL e a ANP, por força dos artigos 21, XI e 177, § 2º, III, como, por exemplo, aduzindo que a delegação realizada pela lei instituidora da agência padece de inconstitucionalidade, porque nãopodem regular matéria não disciplinada em lei, haja vista a ausência de fundamento constitucional para os regulamentos autônomos no direito brasileiro. Ademais, não poderiam regulamentar leis, porque tal competência é privativa do Chefe do Executivo.21

Com o passar do tempo, o princípio da separação das funções do poder do Estado sofreu modificações e, por conseguinte, flexibilizou-se também o princípio da legalidade, que adquiriu concepção diversa da que se tinha no século XVIII. É importante discutir sobre a evolução do princípio da legalidade, pois se não nos desvencilharmos da antiga e ultrapassadaconcepção, não poderemos trabalhar com a questão das agências reguladoras, e com isso provocaríamos a sua extinção, haja vista que suas normas não são lei.

A Constituição da República do Brasil, ao adotar o princípio da legalidade, o fez nos seguintes termos: art. 5º, II. Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei (CF/88).

 

A expressão “em virtude de lei” dá margem a controvérsias quanto à sua significação. Examinando cláusula semelhante no direito italiano, afirma Massimo Severo Giannini (1977):                                                                                               

Não é necessário que a norma de lei contenha todo o  procedimento e regule todos os elementos do provimento, pois, para alguns atos do procedimento estatuído e para alguns  elementos do provimento pode subsistir discricionariedade.22

 Para Rodrigo Santos Neves (2009), a Constituição da República estabeleceu reservas absolutas e reservas  relativas de lei. São exemplos de reserva absoluta de lei as matérias tributária e penal, quando o Estado somente poderá dispor sobre essas matérias por meio de lei formal. Aqui o legislador deve esgotar o tema, sem deixar margem de discricionariedade para o agente público. Já em se tratando de agências reguladoras, tendo em vista a especialização exigida para se tratar dos ordenamentos setoriais e da evolução tecnológica, seria inconcebível o engessamento do sistema,não se dando liberdade discricionária aos referidos entes reguladores para, efetivamente, regular o mercado respectivo.23

6.5 EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA NORMATIVA PELAS AGÊNCIAS REGULADORAS - POSICIONAMENTOS

O poder normativo das agências é objeto de análise dos mais respeitados juristas do país. Há uma busca para interpretar os dispositivos que atribuem função normativa às agências com o cuidado de não macular a Constituição Federal.

Não há, entretanto, um consenso entre os doutrinadores, muito menos entre estes e a jurisprudência dos Tribunais Superiores. Ribeiro Henrique Cardoso (2006), verifica que há maior discordância entre os estudiosos das agências egressos do Direito Econômico e dos administrativistas. Tal fato se deve, em parte, à gama de atribuições das agências, ora instrumento de regulação econômica, ora intimamente relacionada à prestação de serviços públicos.24

 

Portanto, podemos concluir que algumas agências estão mais voltadas ao Direito Econômico, enquanto outras estão relacionadas, basicamente, ao Direito Administrativo. Enquanto os teóricos administrativistas adotam conduta conservadora, os entusiastas economistas adotam postura tendenciosamente desprendida do Direito Constitucional.

Existem três posicionamentos básicos acerca da natureza do poder de emitir normas por parte das agências com seus respectivos limites. O primeiro nos remete ao entendimento de que as normas das agências são decorrentes da atividade regulatória, com status de lei, o segundo vislumbra espécie de regulamento conferido às agências, e o terceiro, mais restritivo, vislumbra nas agências um ente estatal com poderes normativos inferiores ao regulamento, equiparando seus atos aos demais atos administrativos normativos.

6.5.1 Poder normativo com natureza de direito regulatório

Nesta primeira interpretação, busca-se na Constituição Federal o fundamento para a emissão de normas primárias pelas agências reguladoras, estando estas normas no mesmo patamar que a lei ordinária ou qualquer espécie normativa constante do artigo 59 da Constituição Federal.

Posicionam-se os cultores deste pensamento de que é constitucional a delegação legislativa, relacionada à possibilidade de elaboração de uma lei, em face da delegação do Congresso Nacional ao Presidente da República. A doutrina é pacífica quanto a este posicionamento, tanto que existe expressa previsão constitucional neste sentido, no caso da lei delegada, conforme o artigo 68 da Carta Magna.

 

Cabe lembrar ainda, da possibilidade do Chefe do Executivo editar medida provisória, na forma do artigo 62 da Constituição Federal. Em ambos os casos, é verificada a adoção do sistema de freios e contrapesos, com o exercício de parte da função normativa pelo Poder Executivo.

Verifica-se que os adeptos desta corrente amparam-se na Constituição Federal, em seu artigo 174, para sediar a regulação em geral, e nos que prevêem a criação das agências reguladoras, no caso dos artigos 21, XI e 177, § 2º, III.

  art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. C F / 88.

 art. 21. Compete à União:                      

XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos  termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a  criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; ”                       

C F / 88

art. 177. Constituem monopólio da União:                   

(...)                  

§ 1º A União poderá contratar com empresas estatais  ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a   IV deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei.                  

§ 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre:                

(…)                  

III – a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União.” C F / 88

6.5.2 Poder normativo com natureza de direito regulamento

De acordo com esta primeira teoria, o poder normativo das agências reguladoras produz uma espécie de regulamento, semelhante ao editado por Decreto, pelo presidente da República.

Para os adeptos desta corrente, tal delegação de poderes se faz presente nos artigos 21, XI e 177, § 2º, III, em relação às agências com previsão constitucional, e no artigo 174 da Constituição Federal, relativo às agências criadas por lei, sem previsão expressa.

Ribeiro Henrique Cardoso (2006), argumenta que o poder regulamentar não é privativo do chefe do Executivo, podendo ser exercido pelas agências reguladoras nos setores atribuídos às mesmas.

Entretanto, há discordância quanto à espécie de regulamento, seu fundamento, e a possibilidade de inovação no ordenamento. Sobre a possibilidade de inovação, os posicionamentos são os seguintes: existir tal possibilidade, dentro dos standarts (termo adotado pela doutrina norte-americana para evocar os parâmetros veiculados nas leis para direcionar a atividade normativa da agência) definidos em lei; não haver tal possibilidade, em razão tal possibilidade, em razão da fixação dos standarts por lei; não haver autorização para inovação, em razão de extenso regramento feito por lei; ou ainda, permitir tal possibilidade, desde que haja consulta popular e respeito a procedimentos administrativos da norma.

Neste contexto, o Poder Executivo, ao agir por meio de suas agências, encontraria limites na fixação dos padrões nas leis instituidoras da cada agência. Tais atos normativos estariam sob o controle da legalidade, pois estas normas de baixa densidade encontrariam na lei uma espécie de bloqueio, caso as contrariassem.

6.5.3 Poder normativo com natureza de ato administrativo geral e abstrato

Para Manuel Gonçalves Ferreira Filho (2000), a atividade normativa exercida pelas agências reguladoras é tipicamente uma atividade de execução, configurando atos normativos inferiores ao regulamento, relacionando-se ao poder normativo do Estado.25

A atuação é balizada pela lei e pelo regulamento, decorrendo sua atividade da discricionariedade administrativa. Em contrapartida, para outra parte da doutrina, a discricionariedade envolvida é unicamente técnica.

Para o exercício de atividade tipicamente administrativa, as normas estariam no mesmo patamar de resoluções, portarias ou instruções, emitidas pela administração pública, nada podendo inovar, sem a possibilidade de contrariar leis ou regulamentos baixados pelo chefe do Executivo.

Embora os adeptos desta corrente concordem quanto à natureza das normas das agências, como atos administrativos abstratos inferiores à lei e ao regulamento, discordam quanto ao seu fundamento. Variam entre discricionariedade técnica e poder hierárquico. Concordam, entretanto, quanto à impossibilidade de inovar no ordenamento jurídico, a fim de estabelecer direitos e obrigações não previstas em lei.

6.6 MECANISMOS DE CONTROLE6.6.1 Princípio da separação dos poderes

O princípio angular que rege o Estado Democrático de Direito é , ao lado do princípio da legalidade, o princípio da separação dos poderes que, com a Revolução Francesa, tornou-se um dogma constitucional, de referência obrigatória nas constituições modernas, sendo garantidor dos direitos do Homem.

Difundido através da obra de Montesquieu, De L'Espirit des Lois, de 1748, a teoria da separação dos poderes foi concebida para assegurar as liberdades individuais, como um mecanismo eficaz de evitar governos absolutistas. Sua influência mais remota dista de Aristóteles, mas sua concepção moderna foi construída moldada partir dos grandes conflitossociais.

A obra de John Locke, Dois Tratados sobre o Governo, publicada em 1690, imprime a primeira sistematização doutrinária de separação depoderes, no século XVIII, elencando a existência de quatro funções fundamentais, exercidas por dois órgãos do poder, mas foi com Montesquieu que a teoria de separação dos poderes foi concebida com um sistema na forma de três poderes independentes e harmônicos entre si: um Executivo, um Legislativo e um Judiciário.

 

Com a ampliação das funções do Estado contemporâneo, impõe-se uma nova visão de teoria da separação dos poderes, preferindo-se substituí-la, atualmente, pela expressão colaboração de poderes no parlamentarismo e, no presidencialismo, independência orgânica e harmônica dos poderes.

Desta forma, verifica-se que não há uma independência absoluta entre os poderes, mas sim uma interferência recíproca, em um sistema de freios e contrapesos, mantendo assim o equilíbrio a fim de evitar-se arbítrios.Nesse esquadro, a independência das agências reguladoras não afasta a necessidade de controle. Tanto que a legitimidade de suas decisões deve ser aferida de forma constante pelos diversos meios de controle, não apenas do Legislativo, do Judiciário e do Legislativo, mas principalmente do controle social.

Alexandra da Silva Amaral (2008), norteada pela exposição de Alexandre Aragão, acredita que a complexidade e a autonomia das agências reguladoras não contrariam o princípio da divisão de funções estabelecido pelas constituições contemporâneas, devendo ser entendido sem o caráter mítico e absoluto da idéia clássica de separação dos poderes.26

 

 

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2008), adverte que a independência das agências reguladoras deve ser entendida em termoscompatíveis com o regime constitucional brasileiro. Nesse sentido, salienta que a independência em relação ao Poder  Judiciário praticamente não existe, na medida em que suas decisões estarão sempre submetidas à apreciação do seu controle, por força do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal.

Também afasta a idéia de independência do Poder Legislativo, na medida em que os atos normativos das agências não podem contrapor-se com as normas constitucionais ou legais, estando sujeitas, inclusive, ao controle financeiro, contábil e orçamentário exercido com o auxílio do Tribunal de Contas.

Concluindo, considera que a independência é maior em relação ao Poder Executivo, em função de sua natureza  especial, que lhe confere autonomia funcional e administrativa.27

6.6.2 Discricionariedade

Quando se trata de controle da administração pública, em especial, dos atos administrativos, a questão que se coloca diante do estudioso do direito é quanto à discricionariedade dos atos administrativos.

Em relação à liberdade de decisão do administrador, pode-se dizer que existem atos administrativos que são provenientes de uma certa margem de liberdade, ao menos em abstrato, na apreciação do mérito do ato. Também há atos produzidos que não dão essa margem de liberdade na sua apreciação, devendo o administrador executar exatamente o queestá estabelecido na lei. No primeiro caso, verifica-se que o administrador agiu com um poder discricionário, no segundo, entretanto, o administrador agiu com poder vinculado.

Segundo Rodrigo Santos Neves (2009), a discricionariedade surge como uma consequência do princípio da legalidade administrativa, isto é, a administração somente pode agir em virtude de lei. No entanto, o âmbito da  legalidade é muito inferior ao da legitimidade, isto é, a administração pública sempre que perseguir o interesse público estaráagindo com legitimidade.28

 

Entretanto, algumas a legalidade e a legitimidade não são coincidentes. A administração pode muito bem atuar com legitimidade, mas com ilegalidade, no caso de agir no interesse público mas não estar devidamente autorizada para isso. Bem como pode atuar com legalidade, mas ilegitimamente – quando o ato é praticado conforme a lei, mas é contra o interesse público, ou contrário ao objetivo legal.

A discricionariedade surge como a solução para o legislador, o qual torna-se impotente para prever todas as hipóteses fáticas a fim de trazê-las a solução. Ou também, muitas vezes o legislador se omite, para que o administrador encontre a solução mais adequada diante do caso concreto. Ao dar uma certa liberdade na apreciação do caso concreto aoadministrador, o legislador não estabelece uma liberdade absoluta à administração pública, e assim o faz para proteger o interesse público, preservando-se a finalidade do Estado.

Cingindo neste mesmo princípio, Marcelo Alexandrino e Paulo Vicente (2007) disciplinam que a discricionariedade poderá ser utilizada sempre que a lei der expressamente liberdade à Administração para assim atuar, dentro de limites bem definidos; quando a lei utiliza conceitos jurídicos indeterminados, no caso concreto, a Administração depara-se com situações em que não existe possibilidade de determinar, com certeza, a ocorrência ou não do enquadramento do fato no conteúdo da norma; nessas situações, a Administração, dentre as possibilidades de atuação juridicamente legítimas, determinará a que mais adequadamente se conforma ao interesse público, não sendo possível ao Judiciário substituí-lanesse juízo valorativo.29

A doutrina e a jurisprudência modernas enfatizam a tendência de limitação ao poder discricionário da administração, a fim de possibilitar um maior controle judicial dos atos administrativos. Essa imposição de limites ao poder discricionário visa a evitar o indevido uso da discricionariedade administrativa, como manto protetor de atos que, embora praticados sob o fundamento da discricionariedade, revestem-se, em verdade, de arbitrariedade. Nesse aspecto, assumem relevância os princípios implícitos da razoabilidade e da proporcionalidade apontados pela doutrina, sem exceção, com as maiores limitações impostas ao poder discricionário da Administração.


6.6.3 Controle administrativo

Rodrigo Santos Neves (2009), apoiado no entendimento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2008), expõe que o controle administrativo consiste naquele exercido pela própria Administração Pública (em geral) sobre sua própria atividade. “...é o poder de fiscalização e correção que a Administração exerce sobre sua própria atuação sob os aspectos delegalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante provocação”.30

Esse poder de controle sobre a própria atividade também é chamada de auto-tutela. No âmbito das agências reguladoras existem inúmeras formas de controle administrativo, que pode ser interno, isto é, exercido pelos seus próprios agentes, ou externo. O regulamento da Anatel é mais detalhado sobre o assunto, trazendo uma série de exemplos. Emseu artigo 31 prevê a suspensão do salário do conselheiro caso utilize-se de atos protelatórios com a finalidade de atrasar andamentos dos trabalhos da agência, até que dê andamento ao feito:  

Art. 31 – O Conselheiro Diretor decidirá por maioria  absoluta, nos termos fixados no Regimento Interno.               

§ 3º O Conselheiro que impedir, injustificadamente, por mais de trinta dias, a deliberação do Conselho, mediante pedido de vista ou outro expediente de caráter protelatório, terá  suspenso o pagamento de seus vencimentos, até que profira seu voto, sem prejuízo da sanção disciplinar cabível.

Outra forma de controle administrativo exercido sobre as agências são suas Procuradorias, que exercem papel importante na legalidade dos seus atos normativos, na análise prévia destes, bem como dos editais, licitações e contratos a serem firmados nos termos do art. 56, V, do Regulamento:                

Art. 56, inciso V – assistir as autoridades no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados, inclusive examinando previamente os textos de atos normativos, os editais de licitação, contratos e outros atos dela decorrentes, bem assim os atos de dispensa e inexigibilidade de licitação.

Verifica-se ainda a figura do Ombudman como mais uma forma de controle administrativo. A expressão e o instituto têm origem sueca, do início do século XIX, e era vinculada ao Poder Legislativo, tendo poderes de fiscalizar até mesmo decisões judiciais e de altos funcionários do governo. Este era um representante da sociedade no seio da AdministraçãoPública. Já no nosso sistema essa figura aparece na forma de Ouvidor.

Apesar de não ter as mesmas prerrogativas do Ombudman, fica condicionado a receber denúncias e reclamações, para logo após cobrar das autoridades que imponham as medidas necessárias ao atendimento do interesse público.

Existe ainda a possibilidade de qualquer cidadão exercer o direito de peticionar, na forma do artigo 69 do  Regulamento da ANATEL, para que a agência exerça tais controles internos, bem como recorrer contra ato da agência, no prazo de trinta dias, contados da publicação do ato, devendo a agência formular resposta fundamentada no prazo de até noventa dias, contados do protocolo da petição.

Outra modalidade é o controle administrativo externo, pois ainda que as agências disponham de independência funcional, elas não são imunes ao controle no âmbito da Administração. No exercício desta modalidade, podem os órgãos centrais de vinculação ao setor da agência, no caso específico da ANATEL, o Ministro das Comunicações, instaurarprocesso administrativo disciplinar para apurar irregularidades no exercício das funções dos conselheiros, podendo assim provocar a extinção de seus mandatos, lembrando ainda que o processo pode ser instaurado diretamente pelo Presidente da República:                                      

Art. 40 – Os integrantes do Conselho Consultivo perderão o mandato, por decisão do Presidente da República, a ser tomada de ofício ou mediante provocação do Conselho Diretor  da Agência, nos casos de:                                       

I – conduta incompatível com a dignidade exigida pela função;                                       

II – mais de três faltas não justificadas consecutivas a  reuniões do Conselho;                                       

III – mais de cinco faltas não justificadas consecutivas a reuniões do Conselho (Regulamento da Anatel).

Por fim, verifica-se uma outra situação híbrida de controle,intitulada como controle administrativo intersetorial, que consiste na necessidade sentida de coordenar as atividades regulatórias das diversas agências quando atuem em setores tão próximos que possam suscitar conflitos de competência. Pode-se verificar este caso na Resolução conjunta nº 01, de 24 de novembro de 1999, entre a Anatel, a ANP e a Aneel, tratando sobre o compartilhamento de infra-estruturas entre os trêssetores econômicos.

6.6.4 Controle político

O controle político é exercido antes mesmo do surgimento da agência, por meio do projeto de lei que a cria, por meio dele são fixadas suas competências, a estrutura da administração, o valor da taxa de regulação, bem como a organização e remuneração de seus agentes.

Ademais, cabe ressaltar que as agências deverão, por força de lei, implementar as diretrizes políticas traçadas pelos órgãos da Administração direta, conforme disciplinam o artigo 7º da Lei nº 9.478/97, a qual institui a Agência Nacional do Petróleo – ANP, artigo 2º da Lei nº 9.427/96 que cria a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, artigo 19, incisos XXIX e XXX, da Lei nº 9.472/97, que cria a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL.

Pelo fato de ser uma autarquia, a agência reguladora está sujeita ao poder de supervisão e tutela, exercido pelo Poder Executivo, que com ela celebra um contrato de gestão contendo as diretrizes políticas de sua atuação administrativa, consubstanciando importante instrumento de controle e de avaliação de desempenho dos dirigentes.31

Apesar das decisões das agências reguladoras estarem sujeitas à supervisão da Administração direta, elas não se submetem ao recursohierárquico impróprio, funcionando, portanto, como última instância administrativa para julgamentos dos recursos contra seus atos.

O controle do pelo Chefe do Executivo pode dar-se também por ato normativo, mediante decreto, com a alteração do regulamento da agência, restringindo sua atuação, além da edição de medidas provisórias.

Sendo assim, o congresso pode sustar as atos normativos das agências, isto é, sustar normas reguladoras. Caso as agências editem suas normas e invadam a competências do Congresso e a do Chefe do Executivo (de formular políticas públicas), exorbitando da competência normativa que é somente técnica, que lhes foi atribuída pela deslegalização, sendo passível de controle pelo Congresso.32

Outra modalidade de controle pelo legislativo é exercida quando da criação da agência e do mercado regulatório. Cite-se, por exemplo, a Lei 9.473/97, que instituiu a ANATEL, contendo 216 artigos. As agências devem agir conforme as disposições dessa lei, ou com outra que venha substituir suas normas reguladoras também não podem ultrapassar esseslimites.

6.6.5 Controle financeiro

Assim como toda a Administração Pública, as agências reguladoras estão sujeitas ao controle financeiro exercido pelo Congresso

Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, em conformidade com o artigo 70 da Constituição Federal. Tal controle tem caráter técnico e, por isso deve ser realizado pelo Tribunal de Contas.

O controle financeiro deve ser exercido devido ao fato de que as agências atuam sobre seus respectivos setores com recursos públicos, devendo, dessa forma, sofrer controle de seus gastos, tendo em vista o princípio de economicidade em sua atuação, citando como exemplo o disposto no art. 5º, § 3º, do regulamento da Anatel, aprovado pelo Decretonº 2.338/97:                                    

Art 5º, § 3º - A fixação de contas anual da  administração da Agência, depois de aprovada pelo Conselho Diretor, será submetida ao Ministro de Estado das Comunicações, para remessa ao Tribunal de Contas da União – TCU, observados  os prazos previstos em legislação específica.

O controle financeiro exercido pelo Tribunal de Contas deve ser realizado, por serem as agências autarquias federais e não entes com função reguladora, e sua apreciação deve limitar-se à verificação da busca do interesse público e da economicidade, e não do mérito administrativo.

Tal controle deve ser exercido apenas em relação aos atos de gestão, no tocante aos gastos da agência, e não sobre suas decisões sobre a regulação do seu setor.

6.6.6 Controle social

Assumindo papel relevante na regulação, o controle social consiste na participação intensa da sociedade, garantindo ao processo regulatório a legitimidade necessária, não apenas para a imposição de normas gerais e decisões corretas, mas também para a plena aceitação das soluções impostas aos conflitos de interesses submetidos à sua apreciação.33

O controle social esta vinculado, de certa forma, com a idéia de democracia e de transparência no exercício do poder, levando sempre em consideração a prevenção do arbítrio. Os mecanismos da audiência pública e consulta pública são os mais utilizados na forma de participação popular na atividade regulatória, em que, no primeiro caso, a sociedade erepresentantes de classe comparecem à audiência e formulam críticas e sugestões para o incremento da política pública, a sociedade e entidades de classe, representando consumidores e agentes econômicos, participam dando suas contribuições formalmente, até determinando prazo. As sugestões são recolhidas e avaliadas, sendo ou não acolhidas, de uma forma ou de outra a decisão deverá ser motivada.

Outro mecanismo de controle são as ouvidorias criadas em todas as agências, as quais apresentam as seguintes características: a) ou são centros de recolhimento de reclamações dos usuários e agentes; ou b) são pessoas com livre acesso às informações e reuniões da agência, devendo apresentar periodicamente um relatório das atividades da agência.Criado pela Anatel, o Conselho Consultivo é integrado por doze membros, dentre eles representantes indicados pelo Senado Federal, pela Câmara dos Deputados, pelo Poder Executivo, pelas entidades de classe prestadoras de serviços de  telecomunicações, por entidades representativas da sociedade (dois de cada órgão), onde as decisões são por maioria simples, cabendo ao Presidente do conselho o voto de desempate.

Diante destes instrumentos de controle social, verifica-se o efetivo controle da atividade regulatória pela sociedade.

6.6.7 Controle jurisdicional

Por fim, analisamos o controle judicial como mecanismo de controle da atividade regulatória. Sua primeira finalidade é aferir a legalidade dos atos da Administração Pública, a partir da provocação daquele que se sentir lesado, através dos vários instrumentos previstos na Constituição Federal, como o mandado de segurança, a ação popular, a ação civil pública, o mandado de injunção e o habeas data.

Entretanto, a extensão desse controle não deve cingir-se ao exame estrito da legalidade e licitude do ato inquinado de vício. Cumpre também ao judiciário avaliar não apenas a conformidade do ato com a lei, mas em conjunto com a sua adequação moral-administrativa e à finalidadepública. Nesse sentido, o Judiciário deverá investigar se a norma reguladora atendeu ao princípio da participação e nesse sentido, se permitiu o acesso dos vários grupos anteriormente mencionados, que são legitimados para acompanhar as decisões.

O controle da legalidade em seu sentido amplo, envolve a chamada juridicidade, compreendendo tanto a legalidade, em sentido estrito, quanto a legitimidade, que consiste na verificação do usoantijurídico da discricionariedade e a licitude, que importa no exame de eventual desvio moral.

Salienta Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2001) que a deslegalização não abre um campo de ação arbitrária para o órgão regulador, mas um espaço discricionário de decisão, onde o legislador delimita para a Administração reguladora um âmbito decisório que esta poderá preencher com decisões normativas ou concretas, sujeitas as estritas regras de validação.34

É indispensável, portanto, que o Judiciário exerça sua função de controle, tendo em vista a adequação do novo modelo estatal à velha estrutura da Administração hierarquizada e centralizadora. Apesar da independência das esferas administrativa e judicial, cinge o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV), não se eximindo a Administração Pública de ter seus atos apreciados e revistos pelo Judiciário.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reforma administrativa do nosso país revelou-se como a única alternativa de solucionar a inviável posição em que se encontrava o aparelho estatal sendo titular na prestação de serviços públicos.

No Brasil, esta mudança de paradigmas materializou-se a partir da década de noventa, quando ocorreram várias privatizações, possibilitando uma grande inovação tecnológica concomitantemente com o enxugamento da máquina administrativa.

Entretanto, com a abertura da economia, o capital privado não poderia ficar à deriva, a ponto de dar margem à especulação do mercado.

Por esta razão foi foram criadas as agências reguladoras, importadas do modelo norte-americano, com a finalidade de regular e fiscalizar a atividade econômica de seus respectivos setores.

Quando da inserção destes novos entes em nosso ordenamento jurídico, surgiu a polêmica que cerca a capacidade que estas agências tem no tocante à sua autonomia decisória bem como de serem dotadas de capacidade normativa comparável a do Poder Legislativo.

É preciso reavaliar o nosso sistema jurídico a fim adequar o modelo regulatório de modo que o Estado possa atingir suas finalidades norteando-se nos princípios democráticos, e na supremacia do interesse público.

Com base no estudo realizado, conclui-se que o Brasil, tendo “importado” seu modelo regulatório, e verificando-se o progresso da economia norte-americana, ao projetar os resultados alcançados na qualidade dos bens e serviços prestados à coletividade, bem como a inserção de novas tecnologias nos diversos setores.da economia brasileira, vislumbra-se um crescimento semelhante ao lá atingido, muito embora estejamos aproximadamente com seis décadas de atraso.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

 

 

1 CAVALCANTI, Francisco Queiroz Bezerra. A independência da função reguladora e osentes reguladores independentes. Revista de Direito Administrativo. v. 219. Rio deJaneiro: 2000. p. 46.

2 GLADE, William. A complementaridade entre a reestruturação econômica e a reconstrução do Estado na América latina. In: PEREIRA, L. Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988. p.135.

3 NUSDEO, Fábio. Desenvolvimento econômico - Um retrospecto e algumas perspectivas. In. SALOMÃO FILHO, Calixto  (coordenador). Regulação e Desenvolvimento. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 15.

4 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p 214.

5 PESTANA, Márcio. Direito Administrativo Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. p. 144.

6 MEIRELLES, Ely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2003. p. 376.

7 CARDOSO, Ribeiro Henrique. O Poder Normativo das Agências Reguladoras. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 101.

8 AMARAL, Alexandra da Silva. Princípios Estruturantes das Agências Reguladorase os Mecanismos de Controle. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 72.

9 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 20. ed. Riode Janeiro: Lúmen Júris, 2008, p. 105.

  10 PESTANA, Márcio. op cit., p. 61.

11 ALEXANDRINO, Marcelo; VICENTE, Paulo. Direito Administrativo Descomplicado.Rio de Janeiro: Impetus, 2007. p. 486.

12 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas,2008. p. 448.

13 AMARAL, Alexandra da Silva. op cit., p. 72.

14 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações de Direito Administrativo. Rio deJaneiro: Renovar, 2001. p. 40.

15 PESTANA, Márcio. op cit., p. 65.

16 NEVES, Santos Rodrigo. Função Normativa e Agências Reguladoras, Uma Contribuição da Teoria dos Sistemas à Regulação Jurídica da Economia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 105.

17 CARDOSO, Ribeiro Henrique. op cit., p. 157.

18 MEIRELES, Ely Lpes. op cit., p. 162.

19 NEVES, Santos Rodrigo. op cit., p. 107.

20 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. op cit., p. 60.

21 AMARAL, Alexandra da Silva. op cit., p. 41.

22 GIANNINI, Massimo Severo. Diritto Pubblico Dell'economia. Bolonha: II Mulino,1977. p. 401.

23 NEVES, Santos Rodrigo. op cit., p. 107.

24 CARDOSO, Ribeiro Henrique. op cit., p. 157.

25 FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Estudos, Documentos, Debates: reforma do Estado, papel das agências reguladoras e fiscalizadoras. n. 18, São Paulo: FIESP/CIESP e Instituto Roberto Simonsen, 2000. p. 142.

26 AMARAL, Alexandra da Silva. op cit., p. 76.

27 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op cit., p. 131.

28 NEVES, Rodrigo Santos. op cit., p. 133.

29 ALEXANDRINO, Marcelo. VICENTE, Paulo. op cit., p. 163.

30 NEVES, Rodrigo Santos. op cit., p. 147.

31 AMARAL, Alexandra da Silva. op cit., p. 76.

32 NEVES, Santos Rodrigo. op cit., p. 154.

33 AMARAL, Alexandra da Silva. op cit., p. 87.

34 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. op cit., p. 189.


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