Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/35172
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Matriz histórica do controle de constitucionalidade

Matriz histórica do controle de constitucionalidade

Publicado em . Elaborado em .

Sintetizam-se os diferentes marcos teóricos e as matizes ideológicas que ambientaram o surgimento do controle de constitucionalidade das leis.

Introdução

 A celebre decisão proferida em 1803, pelo então Chief Justice da Suprema Corte norte-americana John Marshal no caso Marbury Vs Madison, consagrou-se enquanto marco inicial da Doutrina do controle de constitucionalidade[1], sendo proclamada por Luis Roberto Barroso como “a mais célebre decisão judicial de todos os tempos”[2].

Com argúcia e clareza insuperáveis, Marshal contrapôs as Constituições rígidas às Constituições flexíveis, evidenciando enquanto pressuposto lógico da opção pela rigidez constitucional o Princípio da Supremacia da Constituição. Assim, ou a Constituição é lei fundamental e qualquer órgão jurisdicional frente ao exame de uma lei que com esta colida, deve considera-la nula, afastando-a, ou reduzir-se-ão as constituições escritas a absurdas tentativas de limitar um poder que é, por natureza, ilimitável.[3]

Consolidava-se, assim, o judicial review of legislation, o sistema difuso e concreto de fiscalização da constitucionalidade das leis, aclamado por toda doutrina como a principal garantia dos direitos e liberdades individuais, e reconhecidamente, um dos maiores contributos do constitucionalismo norte- americano ao Direito constitucional moderno.[4] Não obstante, observa Mauro Cappelletti:

“Se esta corajosa, decidida afirmação de John Marshal efetivamente iniciou, na América e no mundo, algo de novo e de importante, ela foi, porém, ao mesmo tempo, como já me parece ter exaustivamente demonstrado, não um gesto de improvisação, mas, antes, um ato amadurecido através de séculos de história; história não apenas americana, mas universal.”[5]

Cumpre concordar com o jurista italiano. Hoje, quando mesmo nas ciências exatas abandonam-se os dogmas da neutralidade e da pureza científica enquanto requisitos para cientificidade do conhecimento[6], não há como olvidarmos que determinados institutos apenas se consubstanciam de todo compreensíveis à luz da ambiência histórica em que foram forjados.

A transição do Estado absolutista para o Estado Liberal fomentou diversas teorias de limitação do poder. Cada qual, elaborada pelos mais renomados pensadores, refletiram as particularidades (históricas, filosóficas, sócio-econônicas e culturais) do Estado em que se originaram. Neste caldeirão de diferentes concepções de uma mesma ideia: a proteção dos direitos e garantias individuais dos homens, é que surgem e se desenvolvem o Constitucionalismo e com ele, o Controle de Constitucionalidade das leis[7].

 Nesta linha, para que possamos compreender com maior clareza as diversas modalidades e sistemas que o Controle de Constitucionalidade das leis pode apresentar, assim como os diferentes desígnios que lhe sustenta, parece-nos necessário assinalar, ainda que de forma breve pontual [8], as principais teorias que povoaram a ante-sala do surgimento do Controle de Constitucionalidade das leis.


2- A Proteção Contra o Estado: Nasce o Estado Liberal

Os séculos XVI e XVII consagraram a doutrina da soberania, dissipando a dispersão do poder medieval. Soberano é o Estado e o Estado é a monarquia absolutista. A expressão; L’ Etat cet moi, de Luiz XIV, imortalizaria a onipotência do rei na época. Visando à expansão de seu império e sob a égide da política econômica mercantilista, o monarca subsidiava as empresas e companhias de navegação, conferindo toda sorte de proteção à mais nova classe social emergente, a burguesia

Século XVIII, a classe burguesa firmara-se social e economicamente vitoriosa. Eram banqueiros, empresários e comerciantes. Construíam mansões, adquiriam títulos de nobreza, socorriam financeiramente a aristocracia perdulária e movimentavam a economia. Suportavam a carga do Estado, mas não tinham o direito de decidir sobre o destino deste Estado[9] , pois era próprio da ordem absolutista que não tivessem nada a decidir: eram súditos. O rei era o Estado. O Estado intervencionista, outrora fundamental para o resguardo e fortalecimento dos propósitos burgueses, agora representava o obstáculo da insegurança e incerteza. Formava-se uma esfera de interesses exterior ao Estado absolutista, uma esfera da própria sociedade e, uma vez ocupado os espaços privados, voltava-se para o público e demandava à participação.

Esta societeé inflamada pelo jusnaturalismo-racionalista que reconhecia ao homem direitos inerentes a sua natureza e anteriores ao Estado, não almejava que este lhe concedesse proteção. Exigia por proteção contra o Estado. É no escopo de realizar a limitação do poder estatal com fins a garantir[10] o respeito aos direitos e liberdades individuais da sociedade,[11] positivando-os em um documento normativo, que surge e se desenvolve o Constitucionalismo.


3 - A experiência Inglesa:  Edward Coke, Jonh Locke e Bolingbroke

 Na Inglaterra, ainda no Século XVII, antes que o iluminismo Francês consagrasse a lei como soberana criação da vontade racional, a necessidade de impor limites ao poder Estatal, salvaguardando direitos inerentes à natureza humana, já havia formulado o precedente imediato do controle judicial de constitucionalidade das leis[12].

Vigorava, na doutrina Inglesa, a concepção de que a lei não era criada, mas apenas declarada pela vontade do parlamento ou do soberano.A common law, lei prevalente à statutory law, (lei escrita), podia somente ser complementada pelo legislador, sem, no entanto, ser violada por este.[13] Em sua Luta contra o absolutismo do Rei Jame I Stuart e propugnando pela extensão das cartas de franquia medievais[14] a todos os Ingleses, o Juiz Sir Edward Coke, entendia ser da competência dos juízes defender o povo contra o arbítrio do parlamento e do próprio soberano. Neste intuito, poderia o juiz, zelando pela supremacia da common law, desconsiderar as leis que lhe fossem contrárias[15].

A doutrina encampada por Sir Coke predominou, por algumas décadas, na Inglaterra e em suas colônias, sendo afastada com advento da Revolução Gloriosa (1688) e a conseqüente afirmação da constituição costumeira e flexível, consagrando-se a supremacia do parlamento, sistema ainda vigente na Inglaterra. Sua filosofia, entretanto, sedimentaria na ex-colônia Norte-Americana os pilares do judicial review of legislatation .   

A experiência Constitucional inglesa exerceria marcante influência sobre a principal questão a qual se dedicaram os pensadores da época: a limitação do poder Estatal. Dentre outros[16], se faria sentir na obra daquele que é considerado “o pai do liberalismo” e da concepção de limitação do poder, John Locke.

Inspirado nos efeitos constitucionais da revolução de 1688[17], Locke elabora um modelo contractualista de Estado, fundamentado na tutela dos direitos naturais de segurança, liberdade e propriedade. Neste objetivo reside não só seu fundamento, mas também o seu limite. Assim, concebe, pioneiramente, um sistema de Separação de Poderes[18],visando através do mútuo equilíbrio, concretizar a limitação do poder Estatal. Sustenta, ainda, que a nenhum destes poderes seria permitido violar os direitos naturais, sob pena de violar a legitimidade do próprio Estado e autorizar o exercício do direito de insurgência[19].

É importante observar que o princípio da Separação de poderes, em seus primórdios na doutrina Inglesa , nada tinha do caráter rígido e absoluto que adquiriu, no resto da Europa, após a revolução Francesa. No início do século XVIII, o escritor político Bolingbroke defendia, que para a manutenção do equilíbrio, a independência recíproca entre os órgãos constitucionais atuaria como pré-requisito para a sua interdependência e recíproco controle[20]. Desta forma, no intuito de manter o equilíbrio entre os poderes, concebe um sistema de separação de poderes impregnado por limites internos, que visa a impedir que algum destes sobreponha-se aos demais, tornado-se arbitrário e soberano. Este ideal de matriz liberal, posteriormente encampado por Beijamin Constant[21], seria desenvolvido nos Estados Unidos, dando origem ao moderno sistema de freios e contrapesos.

Isto posto, insurge uma pergunta: Como o princípio da Separação dos poderes adquiriria a matriz democrática, que o tomando como um mecanismo a assegurar a soberania da lei, afastara da Europa até o início do século XX, a doutrina de controle judicial de constitucionalidade das leis, considerando-a uma discrepância antimajoritária, uma excentricidade americana? Para a resposta de tal indagação, cumpre empreendermos a breve análise de alguns pensadores franceses do período da Ilustração.


4 - Da soberania do povo à Supremacia da Constituição: Rousseau e Sieyès

Ao contrário do movimento ocorrido na Inglaterra,[22] a Revolução Francesa pretendia romper totalmente com os privilégios estamentais do sistema monárquico, criar uma nova ordem sobre os direitos naturais dos indivíduos e edificar um novo Estado. É na construção deste novo Estado que se destaca a teoria política de Rousseau.

Para dissolver o ancien régine, não bastava assegurar aos cidadãos o direito de liberdade e de propriedade, era preciso reconhecer que todos os homens nasciam iguais em direito e obrigações. E se este binômio, igualdade – liberdade, é inerente à natureza humana, somente através de um contrato social - consciente , voluntário , associativo e unânime-  os homens poderiam prescindir de parte de suas liberdades individuais em prol de uma liberdade coletiva convencional, legitimando a criação do Estado. A partir desta premissa, Rousseau transpõe a liberdade enquanto autonomia, no plano individual, para a liberdade como soberania popular, apontando à lei enquanto o veículo de expressão da vontade da maioria. [23]

 A lei jamais seria desigual, posto que é geral e abstrata[24], tão pouco seria arbitrária, pois é fruto da vontade geral. Por via de conseqüência, a melhor forma de garantir o respeito aos direitos dos cidadãos é conferir ao poder legislativo, responsável pela elaboração das leis, soberania absoluta, concebendo-se, como o fez Montesquieu[25], um modelo de separação de poderes rígido, com a principal função, de impedir qualquer interferência ilegítima dos demais poderes sobre a incontrastável vontade da maioria: as leis.

Ao erigir à vontade geral ao status de condição de legitimidade do poder político, as premissas filosóficas rousseaunianas exerceram irrefutável influência sobre o pensamento político contemporâneo, sedimentando os alicerceis do conceito de Estado Democrático. Sustentam, ainda, o sentimento refratário a qualquer forma de controle das leis, atribuindo à sua natureza contramajoritária, um caráter ilegítimo. Não obstante, ao elevar a vontade da maioria, à condição de dogma incontestável, identificando a lei como único ato estatal soberano[26], acaba por possibilitar que uma maioria ocasional suprima os direitos da minoria, sendo este o principal foco de seus críticos, que lhe apontam como subsidiária de regimes totalitários[27].

Sem embargo, conforme se denota no próprio pensamento de Rousseau, a manifestação da vontade geral não se esgota nas leis. Estas são, em última análise, emanações do poder político Estatal. É precípuamente na formação deste Estado, ao estabelecer o Contrato Social, que a vontade geral consagra-se enquanto fundamento da legitimidade do poder político.

A partir desta ideia é que se desenvolve, nos alvores da Revolução Francesa, a obra do padre Emmanuel Joseph Sieyès, que almeja conciliar o ideal democrático de soberania popular, com o de matriz liberal de limitação do poder. Neste intuito, identifica dois momentos de manifestação da vontade geral, propondo um modelo de democracia dual em que se distinguem em um primeiro nível o poder constituinte, e, em um segundo nível um poder constituído.

Em um primeiro momento, o povo soberano estabeleceria o contrato social, elaborando através do poder constituinte a constituição. Este poder não conheceria qualquer limitação jurídica a não ser o direito natural. Já em um segundo momento, o poder constituído manifestaria a vontade geral, dentro dos limites estatuídos pelo poder constituinte.[28] Assim, Sieyès promove à junção entre os pensamentos de matriz democrática de Rousseau, com as ideias de matriz liberal de Locke, identificando na supremacia da constituição, o limite jurídico estabelecido pelo próprio povo - a sua vontade permanente - , para as posteriores manifestações da soberania popular corporificadas nas leis.

Sob a força destes argumentos, em caloroso discurso pronunciado na Convenção Nacional de 18 de Termidor do ano III da República, o autor defende que a observância de tais limites não poderia ficar condicionada à boa vontade e coerência do legislador. Para que a supremacia da Constituição se concretize e ganhe efetividade faz-se imprescindível à instituição de um órgão que vise garanti-la. Desta forma, propugna pela a criação de um Tribunal Constitucional responsável por refrear o ímpeto de eventuais maiorias irresponsáveis. [29]

A compreensão da Constituição como o instrumento jurídico (formal e escrito) que positiva e fundamenta-se nos direitos e liberdades individuais; o reconhecimento que esta ocupa o epicentro do ordenamento jurídico, sendo dotada de Supremacia e rigidez; e a previsão de um órgão com competência para efetivar e garantir esta supremacia. Nos pensamentos de Sieyès do final do século XVIII , já vislumbravam-se presentes  os pressupostos[30] para o do controle judicial de constitucionalidade das leis. Do outro lado do Atlântico, na recente Federação dos Estados Unidos da América,  a primeira constituição escrita do mundo (1787) nasce enquanto ato fundador do novo Estado, criando a conjuntura política propícia para que tais premissas germinassem e dessem origem ao sistema judical review. Na Europa todavia, o instituto aguardaria, ainda, por mais de um século para enfim florescer nos diversos ordenamentos jurídicos.


5 - A constituição enquanto norma fundamental: a solução de Kelsen

 Podemos destacar duas principais razões que contribuíram para que Controle de Constitucionalidade Leis tenha permanecido tanto tempo ausente do continente Europeu. 1) A Teoria de Rousseau repercutira por todo continente europeu, sedimentando à ideia da lei como intrinsecamente boa e afirmando a supremacia do legislador. 2)Na época, faltava um sentimento de Constituição que a compreendesse como uma norma jurídica[31]. No ano de1862, em célebre conferencia proferida em Berlim, Ferdinand Lasalle imortalizaria o conceito reducionista com que a carta magna era compreendida: Uma mera folha de papel[32]

 Apenas no primeiro pós-guerra,através do gênio e do rigor metodológico incomparável de Hans Kelsen, a Europa conheceria sua primeira experiência com um sistema de fiscalização de constitucionalidade das leis.

Nos antípodas da construção de Lassale, Kelsen desenvolve sua teoria a partir da total separação entre a deontologia ( o deve ser), onde se inclui o direito, e a ontologia (o ser), com o escopo de conferir à ciência do direito um método e um objeto próprios. Assim, configura o ordenamento jurídico como uma pirâmide normativa, na qual o fundamento de validade de uma norma, somente poderia assentar em outra norma superior. Esta estrutura hierárquica de diferentes graus de criação do direito tem em seu ápice uma norma fundamental, a constituição.[33] À constituição caberia regular a produção das demais normas jurídicas, funcionando como parâmetro de validade das leis.

No intuito de salvaguardar a supremacia da constituição enquanto norma fundamental, preservando a coerência e a higidez de todo o ordenamento jurídico desenvolve o sistema concentrado e abstrato de controle de constitucionalidade das leis, consagrado inicialmente na constituição da Áustria de 1920; e que viria a se difundir pela maioria dos ordenamentos europeus e até mesmo fora da Europa após a Segunda Guerra Mundial.  


6- À guisa de conclusão

O estudo do passado ajuda-nos a entender o presente. O estudo da matriz histórica do controle de constitucionalidade permite-nos identificar os diversos marcs teóricos e ideológicos subjacentes às diversas noções de controle.

 Neste diapasão, em seus primórdios, o Estado Liberal surge da necessidade de se limitar o poder Estatal no intuito de salvaguardar os direitos e liberdades individuais inerentes a natureza humana. Diversos pensadores trataram do tema, formulando suas teorias de limitação do poder. É neste contexto que exsurge o constitucionalismo como uma teoria normativa de limitação do poder e dos direitos e garantias individuais, afirmando-se a supremacia da Constituição.

O Princípio da supremacia da Constituição possui um caráter dúplice, tutelando não só a higidez do ordenamento jurídico, como também os direitos e garantias dos cidadãos, considerados inaliénaveis pelo poder constituinte. No intuito de garantir tal supremacia, os Estados desenvolvem toda uma mecânica de controle das leis e atos do poder público, a que se denomina Controle de Constitucionalidade.


Notas

[1] Quase a totalidade da Doutrina de direito constitucional consagra o lide case Marbury Versus Madison como o precursor do controle de constitucionalidade das leis. Não se pretende olvidar a importância, tanto política quanto jurídica, do célebre lide case para o surgimento e desenvolvimento da Teoria do Controle de Constituionalidade das Leis. Ao contrário, tendo em vista o seu notório conhecimento, optou-se por conferir a este uma simles abordagem pontual. No entanto as bases ideológicas que propulsionaram o judical review encontram-se melhor retratadas no subítem 3 do 2º Cap. Para uma melhor abordagem do eminente decisão do juiz Marshal V. BARROSO, Luis Roberto  Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva Ed., 1996, p. 156 e segs.

[2]Idem, p. 156.

[3] CAPPELLETTI, Mauro , o Controle judicial de Constitucionalidade das leis no Direito Comparado, Trad. Aroldo Plínio Gonçalves, Porto Alegre: Sergiio Fabris Ed.1992,. P.48.

[4] Entre outros, ENTERRIA, Eduardo Garcia de. la Constitución como norma y el tribunal constitucional. Madrid:Civitas,1991, p.53  e GRANT, James, El control Jurisdicional de la Constitucionalidad de las leyes.Una Contribuició de las Americas a la Ciência Política, Publicaión de la Revista de la Faculdad de Derecho de México, 1963. Apud CAPPELLETTI, Mauro, ob. Cit. p. 47.

[5] CAPPELLETTI, Mauro op. cit, p.63 No mesmo sentido Ver CLÈVE, Clèmerson Merlin.  A Fiscalização Abstrata da Constitucionalidade no Direito Brasileiro . 2ª ed. rev. e ampla. São Paulo:Revista dos Tribunais Ed, 2000.p.25: “A supremacia da Constituição decorre menos de postulados teóricos e mais de uma concepção histórica progressivamente incorporada à consciência jurídica da civilização ocidental.” 

[6] Para um abrangente estudo sobre o impacto das modernas teorias da física sobre a concepção de método científico recomenda-se a instigante obra de Marcelo Gleiser, A Dança do Universo, editora Cia. Das Letras.

[7] Neste sentido, ressaltam os compêndios que, descendo ao varejo das miudezas, podemos falar, não de um mais de diversos modelos diferentes de constitucionalismo. Por todos Ver CANTILHO, J.J.Gomes . Direito Constitucional e Teoria da Constitucição. 2002 Coimbra: Almedina,, . p.54 e 55.

[8] Tendo por foco temático a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, a análise do processo histórico-filosófico de formação do controle de constitucionalidade, dentro dos limites de pertinência do presente estudo, fica adstrita mera contextualização de abordagem expositiva. Para um estudo aprofundado das raízes da jurisdição constitucional e seu papel no moderno Estado de Democrático de Direito recomenda-se a magnífica obra do professor Gustavo Binenbojm, A Nova Jurisdição Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 2001. Por questão de justiça informamos que as prestigiosas lições do professor serviram de trilha e inspiração para o presente capítulo de nosso estudo.

[9] KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise, Rio de Janeiro: Ed.UERJ Contraponto. 1999. p.60

[10]   Como se sabe, os direitos naturais já eram reconhecidos desde a época dos Estados gregos. Entretanto faltava-lhes meio institucional de garantir-lhes tutela, uma vez que não integravam a ordem jurídica. A grande virada do Constitucionalismo foi justamente a positivação dos direitos e liberdades individuais, abarcando-os dentro da órbita Estatal e assim, conferindo-lhes garantia institucional, através do poder jurisdicional. Neste ponto o controle judicial de constitucionalidade das leis revela-se de fundamental importância, pois confere a tais direitos maior concretude e imperatividade, subtraindo-lhes do arbítrio, de eventuais maiorias legislativas. Neste sentido CAPPPELLETTI, Mauro, ob. cit. p 56 e segs.

[11] Observe-se que o primeiro referente da Constituição no Estado Moderno fora a própria sociedade em geral e em específico, a luta pelos direitos do Homem. Neste sentido e elucidando o processo através do qual a sociedade deixa de ser o referente da Constituição para dar lugar ao estado moderno Ver CANOTILHO, J.J.Gomes ob. Cit. p.87/382. No mesmo sentido. PIÇARRA, Nuno, A separação de Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Contributo para o Estudo das suas origens e evolução. Coimbra: CoimbraEd.1989. p.173 e segs.

[12] CAPPELLETTI, Mauro, ob. cit. p.57

[13]Idem, ob.cit.p.58

[14] As cartas jurídicas da rule of law , como por exemplo a Magna Carta de 1215, foram inicialmente concebidas como um “ modus vivendi entre o rei e os barões, que consistia fundamentalmente no reconhecimento de certos direitos de supremacia ao rei em troca de certos direitos de liberdade consagradas na carta de franquia” , ensina CANOTILHO, JJ Gomes, ob. cit. p.380

[15] No conhecido Bonham’s casse (1610) Coke afirmou a tese da competência judicial para deixar de aplicar leis votadas pelo Parlamento que se afigurassem contrárias a common law. In Nelson Saldanha, Formação da Teoria Constitucional apud BINENBOJM, Gustavo. A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira: legitimidade democrática e instrumentos de realização. Rio de Janeiro: Renovar Ed. 2001, p19

[16] Além de John Locke, Montesquie, Bolinbroke, Madison, dentre outros pensadores que abordaram à temática da limitação do poder, fazem expressa referência à experiência constitucional Inglesa enquanto parâmetro de algum ponto de sua obra.

[17] LOCKE, John, Segundo Tratados sobre o Governo No prefácio do Segundo tratado sobre o governo Locke propõe-se a justificar os efeitos da Glorious Revolution: a entrega do trono a Guilherme de Orange e a declaração de direitos de 1688, o Bill of Rights

[18] Ressalta-se que o modelo de Separação de poderes proposto por Locke identifica os poderes Executivo, legislativo, federativo(conjunto de faculdades que todo homem possui antes de entrar na sociedade) e poder de prerrogativa ( poder moderador) Idem ob. Cit. p.160. Desta forma, o autor não reconhece autonomia ao judiciário, sendo este entendido enquanto parte da função executiva.

[19] Idem, ob. Cit. p.173

[20] BOLINGBROKE, Henri The Craftsman, vol. VII, p.87 Apud PIÇARRA, Nuno ob.cit. p.86

[21] CONSTANT, Beijamin, Da liberdade dos antigos à liberdade dos modernos, in Filosofia Política, Editora L&P, s.d., p.16. Apud BINENBOJM, Gustavo op. Cit. p.21.

[22] Como todos sabem, o sistema Político Inglês manteve a constituição mista e a monarquia.

[23] ROUSSEAU, J.J., Do Contrato Social apud, PIÇARRA, Nuno. ob. Cit. cap.VI. p.126 e segs

[24]O movimento iluminista teve como um de seus pilares a ideologia  racionalista. A partir desta, a abstração e generalidade das leis seriam frutos da razão e eqüivaleriam a sua justiça. É o culto racionalista à razão humana como única e universal e a crença na Lei enquanto fruto da razão, que sustentam a coincidência da vontade da maioria com a vontade de todos. Sob tal perspectiva, o pensamento de Rousseau adquire maior completude, diante da impossibilidade lógica da expressão da vontade da maioria vir à suprimir quaisquer direito de algum grupo minoritário, visto que ambas coincidem-se na vontade geral principal. O principal contributo para a formação desta ideia fora o gênio do filósofo Immanuel Kant. Dentre sua vasta obra destacam-se particularmente nesta área: Teoria crítica da Razão Pura (que proporcionou uma verdadeira  “virada copernica” sob o enfoque de análise da Razão) e Paz Perpétua.

[25] Conforme informa Nuno Picárra Em sua clássica obra o espírito das lei Montesquie formula um modelo de separação de poderes rígido segundo o qual caberia ao judiciário “dizer o direito escrito nas leis”. Ob. cit., cap V, p. 107 e seg.

[26] ROUSSEAU, J.J, ,Do Contrato Social apud, PIÇARRA, Nuno. ob. Cit. capVI. P. 132

[27] Ao longo da história, diversos autores dirigiram críticas as teorias de Rousseau , apontando-a como facilitadora de governos totalitaristas e por via de conseqüência, possibilitando a supressão dos direitos individuais das minorias. Dentre todas, a célebre obra de Beijamin Constant, Da liberdade dos antigos à liberdade dos modernos, in Filosofia Política, Editora L&P, s.d., p.16. Apud BINENBOJM, Gustavo, ob. Cit. p. 22.

[28] SIEYÈS,Emmanuel Joseph, A constituinte burguesa. O que é o terceiro Estado?, Editora Líber Júris, 1988, p.113 e segs. Apudo BINENBOJM, Gustavo, ob. cit. p. 23.

[29]Idem, P. 24

[30] Conforme os ensinamentos de Clèmerson Merlim Clève, podemos apontar como pressupostos para a fiscalização de constitucionalidade dos atos normativos os seguintes pressupostos a saber. I) existência de um constituição formal; II) compreensão da constituição como lei fundamental e III) A previsão de pelo menos um órgão dotado de competência para o exercício desta atividade. CLÈVE, Clèmerson Merlin, ob. cit. P. 28 e segs. Sobre a importância da positivação dos direitos naturais para o desenvolvimento do controle de constitucionalidade e do constitucionalismo como u m todo Ver CAPPELLETTI, Mauro. ob. cit .p. 56 e segs.

[31] ENTERRIA, Eduardo Garcia de, La Constituicion como norma y el Tribunal Constitucional, Madrid, 1981, p.501 e segs. No mesmo sentido. MIRANDA, Jorge Teoria do Estado e da Constituição, Rio de Janeiro: Forense. 2002. p. 244 e 245.

[32] Ferdinand Lasalle, Sobre a essência da Constituição, 1862. Sob clara influência marxista, Lasalle desenvolve sua teoria sociológica da constituição.  Segundo esta, a Constituição ficaria adstrita aos fatores reais do poder. Caso não refletisse a estes, a Constituição e as leis em se, não passariam de uma mera folha de papel, não possuindo qualquer poder de conformar a realidade. MIRANDA, Jorge. Ob. cit. p. 341.

[33] KELSEN, Hans, Teoria Geral do direito e do Estado, São Paulo:Martins Fontes/ Brasília, Ed1990. P. 325 e segs.; e Teoria Pura do Direitos. São Paulo: Martins Fontes Ed., 1987,pag.64 e segs. 


Autor

  • Daniel Pacheco Avila

    Procurador da Fazenda Nacional. Diretor do Centro de Altos Estudos da PGFN na 2ª Região. Mestrando em Finanças Públicas, Tributação e desenvolvimento na UERJ. Durante o ano de 2013 atuou como assessor do consultor jurídico do Ministério do Planejamento; Orçamento e Gestão. Entre 2012 e 2009 fui Procurador Seccional na Procuradoria da Fazenda em Itaboraí. Entre 2008 e 2009 atuei como representante do Ministério da Fazenda Junto ao CARF.

    Textos publicados pelo autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AVILA, Daniel Pacheco. Matriz histórica do controle de constitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4750, 3 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35172. Acesso em: 26 abr. 2024.