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Regra matriz de incidência e exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS

Regra matriz de incidência e exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS

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O presente trabalho trata da atual discussão acerca da exclusão do ICMS (Imposto sobre a circulação de mercadorias e prestação de serviços) da base de cálculo do PIS (Programa de Integração Social) e da COFINS (Contribuição para o fim social).

Sumário

1                        Introdução.

2                        Regra Matriz de Incidência Tributária do ICMS.

3                        A exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.

4                       Considerações finais.

5                        Bibliografia

Palavras-chave: Exclusão do ICMS. Base de cálculo. PIS. COFINS.

1.Introdução

O presente trabalho trata da atual discussão acerca da exclusão do ICMS (Imposto sobre a circulação de mercadorias e prestação de serviços) da base de cálculo do PIS (Programa de Integração Social) e da COFINS (Contribuição para o fim social).

O conflito surgiu com a Medida Provisória nº. 66, de 29 de agosto de 2002, posteriormente convertida na Lei nº.10.637, de 30 de dezembro de 2002, que não previu a exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições.

2.Regra Matriz de Incidência Tributária do ICMS

O fato gerador do tributo é a circulação de mercadorias ou prestação de serviços, dentre outras. Vale destacar que a circulação deve ocorrer de forma qualificada, devendo ser proveniente de negócio mercantil.

Contudo, nem toda circulação de mercadoria caracteriza o fato gerador, tendo em vista que, se a circulação do bem se dá para consumo próprio, não haveria a cobrança de ICMS, pois deve ter caráter mercantil e não apenas uma relação de consumo.

Quanto ao aspecto material do ICMS, está prevista constitucionalmente no art. 155 da Constituição Federal, atribuindo aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir imposto relativos à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e atribui a característica da não cumulatividade, conforme abaixo:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

 II -  operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

        I -  será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

No tocante ao aspecto temporal do tributo, ocorre no momento da realização da operação ou da prestação do serviço. Ainda, quanto ao aspecto pessoal, tem-se como sujeito ativo os Estados e Distrito Federal, e os sujeitos passivos estão dispostos em Lei Complementar nº 87/96.

A base de calculo do ICMS é, em regra, o valor da operação relativa à circulação de mercadoria ou o preço do serviço do transporte interestadual ou intermunicipal e de comunicação. A alíquota, por sua vez, está prevista no artigo 155, parágrafo 2º, incisos III a VIII, da Constituição Federal.

3.  A exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS

As leis complementares que instituíram as contribuições do PIS e da Cofins, estabeleceram sua incidência sobre o faturamento da pessoa jurídica. Nesse contexto, o conceito de faturamento abrange a receita bruta obtida na venda de mercadorias e serviços pela pessoa jurídica, descontadas tão somente os valores referentes ao IPI, as vendas canceladas, devolvidas e os descontos concedidos.

Contudo, a lei não excluiu da base de cálculo do tributo o valor devido a título de ICMS, que deveria compor os valores entendidos como integrantes do faturamento da empresa.

Dessa forma, levando-se em consideração a natureza tributária do ICMS, isto é, como despesa e não como receita, sua inclusão na base de cálculo do PIS e da Cofins caracteriza violação constitucional e legal ao conceito de faturamento. Ainda, a inclusão do ICMS na base de cálculo de PIS/COFINS não siginifica ganho de riqueza e, em razão disso, acaba por onerá-la de forma mais gravosa e em desacordo com o princípio da igualdade previsto no artigo 5º da Constituição Federal

Cumpre ressaltar que o PIS e a COFINS são espécies tributárias autônomas, inseridas no ordenamento jurídico pela Constituição Federal de 1988, destinadas a assegurar direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

O Supremo Tribunal Federal (STF) já entendeu que o ICMS não deve entrar na base de cálculo das Contribuições do regime cumulativo ou do regime não-cumulativo de PIS  e COFINS, uma vez que o imposto não integra o conceito de receita ou faturamento. Contudo, a Receita Federal entende que as leis não precisam estabelecer sua exclusão expressa.

Devido a este impasse, são recorrentes as ações no Poder Judiciário com pedido de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins e, apesar da matéria ainda estar pendente de julgamento de repercussão geral no STF, há diversas decisões favoráveis aos contribuintes nos tribunais.

Assim, a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e do COFINS faz com que os contribuintes em uma mesma situação contribuam em maior ou menor grau para o custeio da seguridade social. Dessa forma, a participação de cada contribuinte no financiamento da seguridade social vai variar de acordo com a alíquota estabelecida para o produto por ele produzido.

Ainda, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 240.785 em outubro de 2014, o Supremo Tribunal Federal determinou, que é inconstitucional a inclusão do ICMS na base de cálculo de PIS/COFINS e, dessa forma, mantendo uma posição favorável aos contribuintes:

TRIBUTO – BASE DE INCIDÊNCIA – CUMULAÇÃO – IMPROPRIEDADE. Não bastasse a ordem natural das coisas, o arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro. COFINS – BASE DE INCIDÊNCIA – FATURAMENTO – ICMS. O que relativo a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços não compõe a base de incidência da Cofins, porque estranho ao conceito de faturamento.


(RE 240785, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 08/10/2014, DJe-246 DIVULG 15-12-2014 PUBLIC 16-12-2014 EMENT VOL-02762-01 PP-00001)

            Também nesse sentido foi a apelação AC 6342 PI 2007.40.00.006342-5:

TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DA COFINS E DO PIS . EMPRESA OPTANTE PELO SIMPLES. VEDAÇÃO LEGAL. 1. Consoante § 5º do art. 5º da Lei 9.317 /96, "a inscrição no SIMPLES veda, para a microempresa ou empresa de pequeno porte, a utilização ou destinação de qualquer valor a título de incentivo fiscal, bem assim a apropriação ou a transferência de créditos relativos ao IPI e ao ICMS". 2. A opção da impetrante pelo SIMPLES (faculdade formal e não imposição legal) não gera direito ao desmembramento de alíquotas ou dedução de parcelas do tributo recolhido a tal título, uma vez que a empresa passa a contribuir de forma unificada mediante pagamento mensal do tributo que representa a unificação dos impostos, por alíquota fixa sobre a receita bruta auferida, e não sobre os produtos vendidos ou mercadoria circulada (faturamento). 3. Aplica-se, nesse contexto, por analogia, a jurisprudência que está consolidada no STJ, assim como nesta Corte, sobre pedido formulado por empresas optantes pelo SIMPLES para aproveitamento de créditos acumulados de IPI. 4. Ressai inviável a pretensão de destacar o ICMS do cálculo do PIS e da COFINS quando o contribuinte recolhe tributo de forma unificada calculada sobre a receita bruta, situação distinta daquele contribuinte que recolhe o PIS e a COFINS calculada sobre o faturamento. 5. Apelação desprovida.

(TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL AC 6342 PI 2007.40.00.006342-5 (TRF-1)

Já na Ação Declaratória nº 94.03.055894-6, a autora da ação pleiteou a ilegitimidade da obrigação de recolhimento do COFINS e, alternativamente, a exclusão de sua base de cálculo do valor referente ao Imposto sobre operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre prestação de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS), com fundamento no artigo 102, III, “a”, e artigo 195, I, além do art. 5º, LIV e LV, ambos da Constituição Federal. Por isso, discute-se o valor correspondente ao ICMS, isto é, se ele compõe, ou não, a receita ou o faturamento do contribuinte, seja por consistir em ônus tributário, seja por supostamente não integrar em definitivo seu patrimônio, ou seja, a recorrente busca é excluir parte do valor recebido do conceito de receita bruta, sem pertinente disposição legal.

            Nesse sentido, foi o que decidiu-se na apelação abaixo:

“O que sustenta a recorrente é que o decidido pela Corte de origem discrepa da tipologia do tributo, tal como prevista no artigo 195, inciso I, alínea ‘b’, da Constituição Federal, considerado o teor primitivo do preceito, ou seja, anterior à Emenda Constitucional n. 20/98, no que, na citada alínea, fez inserir como base de incidência da contribuição devida pelo empregador, juntamente com o faturamento, conflita, ou não, com o dispositivo constitucional. A tríplice incidência da contribuição para o financiamento da previdência social, a cargo do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, foi prevista tendo em conta a folha dos salários, o faturamento e o lucro. As expressões utilizadas no inciso I do artigo 195 em comento hão de ser tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e jurisprudencialmente. Por isso mesmo, esta Corte glosou a possibilidade de incidência da contribuição, na redação primitiva de Carta, sobre o que pago àqueles que não mantinham vínculo empregatício com a empresa, emprestando, assim, ao vocábulo ‘salários’, o sentido técnico-jurídico, ou seja, de remuneração feita com base no contrato de trabalho – Recurso Extraordinário n. 128.519-2/DF. Jamais imaginou-se ter a referência à folha de salários como a apanhar, por exemplo, os acessórios, os encargos ditos trabalhistas resultantes do pagamento efetuado. Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Esta decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços. A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação de serviços, implicando, por isso, mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS.

O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrálo. A conclusão a que se chegou a Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência da unidade da Federação. No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar n. 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem natureza de faturamento. Não pode, então servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ‘b’ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. (...) Conforme salientado pela melhor doutrina, ‘a Cofins só pode incidir sobre o faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas’. A contrario sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostra-se fiel, no emprego de

institutos, de expressões e vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência. (...)

Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se, na expressão ‘folha de salários’, a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão ‘faturamento’ envolve em si, ônus fiscal, como é relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor

da mercadoria. (...) Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso. Por tais razões, conheço deste recurso extraordinário e o provejo para, reformando o acórdão proferido pela Corte de origem, julgar parcialmente procedente o pedido formulado na ação declaratória intentada, assentando que não se inclui na base de cálculo da contribuição, considerado o faturamento, o valor correspondente ao ICMS. Com isso, inverto os ônus da sucumbência, tais como fixados na sentença prolatada.”

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim, cumpre destacar que legislação reconhece a exclusão de tributos não-cumulativos, como o ICMS, do conceito de receita bruta. Isso porque o tributo não é custo da atividade empresarial, e podem ser qualificados os valores despendidos, isto é, gastos com funcionários, compra de matéria-prima, entre outras despesas administrativas.

Assim, não seria possível o ICMS integrar a base de cálculo da Cofins uma vez que o alcance do conceito constitucional de faturamento e receita não permite referida dilação na base de cálculo da exação e isso representaria afronta aos princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva, indo contra o disposto no art. 154, I, da Constituição Federal.

Portanto, como já destacado, o ICMS não pode ser caracterizado como receita bruta, ou como outras receitas. Por isso, tal fato violaria o artigo 110 do Código Tributário Nacional e os artigos 195, inciso I, alínea "b", bem como o artigo 239 da Constituição Federal pois exige-se o PIS e COFINS sobre o faturamento/receita somado ao ICMS.

Como o ICMS, sendo um tributo estadual, é considerado despesa dos sujeitos passivos da COFINS e do PIS, e como receita do erário estadual, é injurídico tentar englobá-lo na hipótese de incidência daquele tributo estadual na base de cálculo da COFINS e do PIS.

Portanto, sua inclusão resulta em tributação de riqueza que não pertence aos contribuintes e, ao arcarem com a obrigação, eles suportam uma carga tributária além do que está legalmente definido para o regular exercício da suas atividades econômicas e aquém do que permite a Constituição Federal.

5     BIBLIOGRAFIA

AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do (Coord.). Curso de direito tributário. São Paulo: Celso Bastos, 2002.

MARTINS, Ives Gandra da Silva. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

Recurso Extraordinário nº 240785, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO.

Ação Declaratória nº 94.03.055894-6.

Apelação Civel AC 6342 PI 2007.40.00.006342-5 (TRF-1).


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