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Função social das propriedades: confrontos e soluções

Função social das propriedades: confrontos e soluções

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Objetiva-se examinar aspectos da função social da propriedade, sua aplicação e implicação na propriedade, levando-se em consideração a função social da propriedade imobiliária, dos contratos e a função social da empresa.

Sumário: I- Introdução. II-A “nova” propriedade. Atuação social do homem. III – Propriedade-função e propriedade direito subjetivo. IV – O princípio da função social. Da abstração à concretude. Interesses individuais e interesses coletivos. V – O direito de propriedade. Da absolutização à sua relativação. VI – A função social integrada à estrutura e ao conceito de propriedade. VII – O cumprimento da função social. VIII – A faculdade de uso e sua extensão. IX – A função social da propriedade X a função social da empresa e do contrato. Conclusão.


I - Introdução

Objetiva este pequeno estudo examinar aspectos da função social da propriedade, sua aplicação e implicação na propriedade, levando-se em consideração a função social da propriedade imobiliária, dos contratos e a função social da empresa.

Em algumas situações da vida de relação em sociedade, em dado momento, poderão coexistir propriedades que tenham objetos diversos, mas com pontos de conexão – ambas cumprindo ao mesmo tempo, sem choques, a função social inerente a cada espécie de propriedade. Essa hipótese não só é  salutar para o o sistema, mas também para atingir os anseios da sociedade que, por sua vez, é beneficiada em tais circunstâncias. Mesmo que os titulares das propriedades em conexão não tenham como primeira motivação da manifestação de vontade na relação de conexão visado diretamente cumprir com a função social de suas propriedades.

No entanto, em determinado momento pode existir um confronto entre as propriedades em razão de questões atinentes a relação jurídica base oriunda de um contrato, que para solução será necessário que o interprete examinar quais das hipóteses atende aos princípios constitucionais da função social da propriedade, da empresa e do contrato e assim, conferir proteção que o sistema oferece. Em outras palavras, a balança deve pender para a situação que permite o cumprimento da função social da propriedade, nesse contexto englobando propriedade imobiliária, propriedade empresarial e relação contratual.

Para tanto, será necessário recordar aspectos da função social da propriedade, rememorando dados de sua existência e as implicações trazidas para na fixação dos contornos do histórico e até então absoluto, direito de propriedade. Assim, será analisado, ainda que de modo não tão profundo, como a função social se apresenta e é cumprida nos pontos salientes acima destacados, bem como quais influências produziu e produz no direito de propriedade.

Uma premissa metodológica deve ser, desde logo, fixada, qual seja, a propriedade, hoje, não possui mais a mesma configuração que inspirou nosso primeiro código civil. Urge entender a nova propriedade (que, na verdade, já não é tão nova assim, pelo que se tem escrito a respeito desde o final do século XIX), e a reconstrução (ressignificação) de seu conceito, levando-se em consideração a influência nascida da funcionalização do direito.


II – A “nova” propriedade. Atuação social do homem.

Já de algum tempo as estruturas da construção oitocentista da propriedade vêm sendo atingidas por misto de evolução e crise, diante da ausência de resposta adequada aos fenômenos sociais à sua volta.

Não se pode mais conceber o direito de propriedade com a feição de outrora, como assinalou na Itália Pugliatti em 1964:

La proprietà oggi non è proprietà (esclusivamente) individuale, ma è pur sempre propreità dell' individuo; è, sotto ogni aspetto, proprietà privata, ma attegiata ed orientata in modo da consentire la più idonea tutela dell' interesse pubblico.

Non conserva però il carattere spiccatamente individualistico della proprietà tradizionale perchà se fondamentalmente e garanzia dell' attuazione di un interesse che è del singolo proprietário, constituisce anche uno dei mezzi più largamente impiegabili per l'attuazione di interessi che transcendono la sfera individuale.[1]

A aproximação do interesse individualístico ao interesse social, em tema de propriedade, fez surgir diversas expressões nominativas do momento. Alguns, talvez, em razão do próprio sentido da expressão social, chamaram o movimento de socialização do direito de propriedade, seja para admiti-lo [2] seja para negá-lo. [3]

A despeito de ter sido identificado um marco inicial da positivação da função social através das Constituições Mexicanas e de Weimar, filosoficamente não é tranquilo estabelecer quem teria primeiro sustentado que a propriedade tem uma função social como ocorreu à partir do final do século retrasado. Entretanto, creio que desde pelo menos a Lei romana Júlia Agrária Campana do ano 61 expedida pelo cônsul Júlio César para distribuir as terras da Campânia a cidadãos pobres e veteranos de guerra[4], dos tempos das presúrias em Portugal e até mesmo nas regras de concessão de nossas terras em Sesmarias já estava presente a necessidade de exploração efetiva da terra, com o cultivo e moradia, elementos básicos da função social da propriedade imobiliária.[5]

Não há dúvida, no entanto na época moderna, de que foi a partir do momento em que os textos constitucionais passaram a reconhecer a existência, não só de direitos mas também de obrigações a serem cumpridas pelo proprietário em beneficio de outros não proprietários, sentido que se deve dar à expressão “atendimento do bem coletivo”, é que houve uma preocupação dos teóricos quanto ao estudo do assunto.

Antes de se tornar uma noção legislada, pode-se atribuir a Leon Duguit o fomento da discussão a respeito da função social da propriedade, ou da propriedade-função, tendo enfrentado também objeção de autores de seu tempo, arraigados à noção de propriedade resultante da Revolução Francesa, com argumento de inexistência de lei impondo obrigações ao proprietário. Mas para ele, as leis positivas e os códigos poderiam permanecer intactos em seus rígidos textos, pois na força das coisas, sob pressão dos fatos, das necessidades práticas, se formariam constantemente instituições jurídicas novas.[6]

Na sua reflexão sobre o direito subjetivo, Duguit afirma que o homem tem direito de ser livre, mas que há uma nova concepção de liberdade, que não é um direito subjetivo, mas sim a consequência da obrigação que se impõe a todo homem de desenvolver, o mais completamente possível, sua individualidade. Isto é, sua atividade física, intelectual e moral, a fim de cooperar o melhor possível com a solidariedade social. Para o constitucionalista francês: “El hombre no tiene el derecho de ser libre; tiene el deber social de obrar, de desenvolver sua individualidad y de cumplir su misión social.”[7]

E escrevendo sobre os Fundamentos do Direito, o referido autor reitera a mesma ideia afirmando que, “sendo todo o indivíduo, com efeito, obrigado pelo direito objectivo a cooperar na solidariedade social, resulta disso, necessariamente, que ele tem o direito de praticar todos aqueles actos pelos quais coopera na solidariedade social e de impedir que, seja quem for, obste à realização do papel social que lhe incumbe.” [8]

Se a conduta do homem é boa ou ruim, ou mesmo indiferente, é o momento histórico e cultural, ou o poder social dominante, com suas escolhas, que vai dizer. Ela será valorada e enquadrada socialmente conforme essa valoração, trazendo consequências boas ou ruins, também levando em consideração a noção de bom e de ruim do próprio grupo.

Disso resulta que, de fato, por estarmos vivendo em sociedade, cada um tem uma missão, um papel a cumprir, conforme sua posição social, adquirida, herdada, construída. Sem prejuízo da sua individualidade, que deverá desenvolver conforme os ditames de seu tempo e conforme estimula e limita a ordem jurídica.

O desempenho desse papel ou função social é necessário à sobrevivência do grupo e para socialização dos efeitos de sua conduta em benefício dos outros membros do grupo, que com ele interagem, gerando a interdependência social entre os diversos componentes do grupo.

É neste sentido a visão externada por Duguit, a respeito da função do proprietário ou, dito de outro modo, da função da propriedade capitalista. Veja-se a passagem que ora se transcreve:

“Todo individuo tiene la obligación de cumplir en la sociedad una cierta función en razón directa del lugar que en ella ocupa. Ahora bien, el poseedor de la riqueza, por lo mismo que posee la riqueza, puede realizar un cierto trabajo que sólo él puede realizar. Sólo el puede aumentar la riqueza general haciendo valor el capital que posee. Está, pues, obligado socialmente a realizar esta tarea, y no será protegido socialmente más que si la cumple y en la medida que la cumpla. La propiedad no es, pues, el derecho subjetivo del propietario; es la función social del tenedor de la riqueza.[9]

Criticava Duguit, como se percebe, o abuso e a inércia no exercício do direito de propriedade, porquanto reconhecia no sistema vigente, como ocorre ainda entre nós, que o proprietário tinha o direito de usar, gozar e dispor e como correlato, o direito de não usar, de não gozar e não dispor e, por conseguinte, de “dejar sus tierras sin cultivar, sus solares urbanos sin construcciones, sus casas sin alquilar y sin conservar, sus capitales mobiliários improductivos.”[10]

Entre nós Carlos Maximiliano comentando o parágrafo 17 do art. 72 da Constituição de 1891, que manteve a plenitude do direito de propriedade, consagrada no inciso XXII do art. 179 da Const. de 1824, em obra de 1918, já assinalava:

“Hoje, pelo menos entre juristas philosophos, não mais acceitam a doutrina da propriedade illimitada, nem tão pouco o conceito individualista de uma prerogativa, que é mantida por motivos sociaes. Ninguém adopta a definição proposta pela escola do século XVIII, que inspirou a dos Códigos Civis da França e da Itália, e é attribuida erroneamente ás fontes do Direito Romano: Jus utendi e abutendi re sua, quatenus júris ratio patitur.”[11]


III - Propriedade-função e propriedade direito subjetivo.

Josserand, partindo da noção de que o absoluto não é deste mundo, porque todas as faculdades jurídicas, pela razão de que se realizam em um meio social, comportam fatalmente limites, encontrando-se comprimidas em nome de situações, de aspirações igualmente respeitáveis, que reivindicam e devem obter a sua parte legítima[12], critério que se aplica aos direitos reais, portanto ao direito de propriedade, assinala:

“Este derecho es relativo en su ejercicio, en su realización, en el sentido de que no puede ser utilizado impunemente sino en el plano de su misión social, en la línea de su espíritu en otro caso, su titular, a decir verdad, no usa ya, sino que abusa del derecho de propiedad; comete un abuso del derecho de propiedad es decir, una desviación de ese derecho con relación a su objeto, y compromete con ele su responsabilidad. Si los poderes públicos nos reconocen derechos, no es para realizar la injusticia, sino para hacer uso legítimo y regular de dichos derechos.”[13]

Se direito é, como ensina Caio Mario, recentemente desaparecido, “o princípio de adequação do homem à vida social”[14], tinha razão Buzaid ao afirmar que toda “prerrogativa e todo poder jurídico são sociais na sua origem, na sua essência e até na missão que estão destinados a realizar”. Tal noção se aplica também às “prerrogativas de caráter altruístico como as de caráter egoístico, tais como o direito de propriedade imóvel”. Uma vez que cada egoísmo concorre a um objetivo final, “é absolutamente evidente que cada um de nossos direitos subjetivos deve ser orientado e tender para esse fim; cada um deles tem a sua missão própria a realizar, conforme o espírito da instituição” e remata:

“...na realidade e na sociedade organizada, os pretendidos direitos subjetivos são direito-função; eles devem permanecer no plano da função a que correspondem; de outro modo seu titular comete um desvio, um abuso de direito; o ato abusivo é o ato contrário ao fim e ao espírito da instituição.”[15]

Caio Mario escrevendo sobre as tendências atuais do direito civil e analisando o confronto entre função social e direito subjetivo afirma que: “o direito moderno entende que os bens não são dados ao homem para que ele utilize até os extremos das tendências egoísticas e sacrifício geral, porém com a subordinação de seu exercício a condicionamentos proveitosos ao maior número.”[16]

No mesmo sentido é a definição de função por Celso Mello: "é o exercício, no interesse de terceiro, de um poder que, se dispõe, exclusivamente dos efeitos de se cumprir o dever de atender determinada finalidade." [17]

A importância desta discussão para a propriedade, ou para o direito de propriedade é fundamental, como reconheceram Laura B. Varela e Marcos Ludwig, ao afirmarem que a incompatibilidade entre direito subjetivo e função social é precisamente o “nó dogmático” da questão e, como tal, é o ponto “de partida para qualquer reflexão sobre a reconstrução” do direito de propriedade. Trata-se, no fundo, “da oposição entre deveres e liberdades, entre um direito civil renovado e o direito civil oitocentista.”[18]

Eros Grau salienta que não há incompatibilidade entre direito subjetivo e função. Ser titular de um direito subjetivo “é estar autorizado pelo ordenamento jurídico a praticar ou não praticar um ato – isto é, a transformar em ato a potência, ou seja, a aptidão para a prática de tal ato. A transformação da faculdade em ato, quando e se juridicamente permitida, deve ser exercida dentro dos limites da permissão” e:

“A permissão jurídica para o exercício de uma faculdade pode perfeitamente ser concedida mediante a introdução, como elementos dela [=da permissão] integrantes, de vários requisitos, aí incluídos tantos quantos atribuam deveres e ônus para o titular da permissão, i.e, do direito subjetivo.”[19]

Com efeito, o direito subjetivo, seja ele qual for, está adstrito a uma finalidade social, embora se reconheça, em primeiro plano, uma finalidade individual nas mãos do seu titular. Mas, a realização da finalidade individual é também decorrência de uma finalidade social, considerando que todos devem desenvolver o mais amplamente possível sua personalidade e a projeção desta para o mundo exterior.

Ora, vivendo o indivíduo em sociedade, não reconhecer a ordem jurídica, finalidade social no direito subjetivo, seria o mesmo que afirmar que o exercício abusivo de um direito (expressão que para alguns encerra uma contradição), por ser exercício (sem finalidade social) mereceria proteção do sistema, o que ninguém em sã consciência admite e que o Código Civil repudia no art. 187. Portanto, nenhum direito subjetivo pode alcançar tal exagero, se não fatalmente delimitará coesão da organização social.

Na expressão de Pontes de Miranda, todo o direito subjetivo "é linha que se lança em certa direção" e até "onde pode ir, ou até onde não pode ir". Seu conteúdo ou o seu exercício "dizem-no as regras limitativas, que são regras que configuram, que traçam a estrutura dos direitos e de sua exercitação",[20] não sendo então, absurdo, conjugar-se direito subjetivo e função, mesmo que se encare a expressão em sentido técnico. Não se compraz com exercício do direito, por exemplo, o fazê-lo, com espírito emulativo, como agora expressamente reconhece o novo Código Civil no § 2º do art. 1228.

Por sua vez, Junia Verna assinala que a “compatibilização entre direito subjetivo e função social passa pela nova caracterização da propriedade. Tem ela, agora, como vetor, a sua finalidade. É dizer o direito subjetivo subsiste, é preservado enquanto seu titular não usar a propriedade de modo a contrariar o interesse social, a utilidade social”.[21]

Surge então uma nova concepção de propriedade, que continua sendo um direito subjetivo individual e de natureza privada[22] e como tal deve ser analisado. Entretanto, sem perder esta natureza, isto é, “deve a propriedade ser exercida de modo tal que o seu titular utilize a coisa sem impor sacrifício ao maior número.”[23] Exercer faculdades inerentes a propriedade está necessariamente atrelada a função social do bem objeto de sua titularidade.

O trinômio – poderes, limites e deveres – passa a estar compreendido no novo conceito técnico de propriedade[24]. Este, por sua vez, não desfruta mais de “uma quase antropomórfica posição jurídica de absoluta soberania.”[25]

A funcionalização do direito subjetivo de propriedade permite a construção de uma sociedade livre, justa e solidária – mandamentos constitucionais –, porque tempera o egoísmo do impulso hedonístico do proprietário.

Com efeito, por força dos princípios constitucionais fundantes do sistema, todo direito subjetivo, independente de sua natureza, deve estar direcionado a atender a tais fundamentos, que na verdade o funcionalizam, como reconhece Perlingieri ao afirmar que o “perfil mais significativo, referindo-se ao direito subjetivo, é constituído pela obrigação, ou dever, do sujeito titular do direito de exercê-lo de modo a não provocar danos excepcionais a outros sujeitos, em harmonia com o princípio de solidariedade política, econômica e social. Isso incide de tal modo sobre o direito subjetivo que acaba por funcionalizá-lo e por socializá-lo.”[26]

Em verdade, em tempos mais recentes, já se afirma que a propriedade é uma situação jurídica complexa, face ao feixe de relações que permite, reclamando uma atenção especial do operador. Neste sentido, colhe-se em Tepedino:

“A construção, fundamental para a compreensão das inúmeras modalidades contemporâneas de propriedade, serve de moldura para uma posterior elaboração doutrinária, que entrevê na propriedade não mais uma situação de poder, por si só e abstratamente considerada, o direito subjetivo por excelência, mas una situazione giuridica soggetiva típica e complessa, necessariamente em conflito ou coligada com outras, que encontra a sua legitimidade na concreta relação jurídica na qual se insere.”[27]

Em razão da multiplicidade de situações proprietárias[28]é que se vai vincular como determinado bem, ou melhor, como o exercício do direito (nele compreendida suas faculdades e possibilidades) conferido a alguém, está ou não cumprindo com sua função social, para daí fixar-se se merece ou não a proteção conferida pelo sistema.


IV – O princípio da função social. Da abstração à concretude. Interesses individuais e interesses coletivos.

O aspecto mais importante do princípio da função social da propriedade é a sua concretude. A despeito de ser discutido e analisado a todo instante, de nada adianta ao princípio se dele não extrairmos aplicação prática. O confronto pode surgir quando se analisa a conduta do titular do direito e sua conformação com a ordem jurídica vigente. Em outras palavras, seu interesse individual, egoístico e o interesse coletivo (dos outros) impactados por sua ação ou inação.

Os institutos jurídicos existem e sobrevivem se e quando atendem aos interesses do homem. Muito pouco adianta sua existência se não resultarem em benefício para o homem. Não atende na atualidade a ideia de função social do passado, caracterizada “pela apropriação em si, como forma máxima de expressão e de desenvolvimento da liberdade humana”, dogmática vigente na codificação oitocentista e em nosso código civil anterior.[29]

A função social da propriedade incide, em nosso pensar, em qualquer propriedade, até mesmo, excepcionalmente, em bens de consumo individual, como se pode vislumbrar na hipótese de alguém que tenha alimentos para consumo próprio e resolve destruí-los, sem qualquer razão, em prejuízo da riqueza geral e de seu próprio sustento e de outros tantos que passam fome, ainda que se mostre mais saliente no que diz respeito a bens de produção ou a bens que abrigam atividade de produção.

Vale transcrever, nesta parte, a lição de Cunha Gonçalves: “O caráter social da propriedade, porém, não é o fundamento dela; só respeita ao modo do exercício de certas espécies de propriedade, como são a da terra e de outros instrumentos de produção. Durante milhares de anos, a propriedade foi exercida sem que ninguém divisasse sequer o seu aspecto social...”.[30]

Na prática, então, será necessário, no conflito de interesses (que convencionamos chamar de menor intensidade social), estabelecer quando determinados bens estão afetados à função individual, (que, na realidade, cumpre assim sua função social), e quando esses mesmos bens excedem ao padrão necessário à função individual, pois aqui sim, o princípio da função social terá aplicação, mas em desfavor do proprietário que não o estiver observando.

Assim, o bem de natureza imóvel em que o proprietário o utiliza diretamente através de moradia ou de cultivo ou na produção de renda para seu sustento e de sua família através da locação, quando outrem então, servindo-se da posse, cumpre com a função social atinente ao bem, seja residindo seja produzindo outros bens e riquezas socialmente relevantes, merece proteção do sistema. Nessas circunstâncias sua legitimação decorre do cumprimento da função social individual mas também da função social geral.

Por certo que a decisão final a respeito (se o proprietário cumpre ou não com a função social) deverá ser dada pelo Poder Judiciário, órgão incumbido pelo Estado para dirimir os conflitos de interesses. Somente no exame do caso concreto é que se poderá afirmar se determinada propriedade está cumprindo ou não com a função social. Mesmo que no interesse individual do titular, ou está indevidamente retida, para fins de especulação, ou acumulada sem destinação ao uso para o qual se volta ou que o titular esteja agindo de modo emulativo, exercendo ou pretendendo exercer seu direito com abuso, porque não atende aos limites impostos pelo seu fim econômico e social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (art. 187 do C.C./2002).

Nesse sentido é a opinião de Celso Bastos e Ives Gandra, após reconhecer que a aplicação do princípio da função social pode e deve ser invocada para a proteção de interesses prejudicados, por exercício anti-social da propriedade, sustentam eles:

“O intérprete das normas - quem diz a verdade jurídica - não é o Legislativo, nem o Executivo, mas o Judiciário. Ora, as disposições constitucionais são normas. Assim, o titular do poder público de dizer sobre elas é, pois, o Judiciário.” [31]

Evidente que este exame não se faz aleatoriamente, sem critério, ou com base em critérios eminentementes subjetivos. Nesta parte, razoável parece a lição de Celso Bastos:

“Na medida em que haja o uso degenerado, exclusivamente personalista e egoísta, até mesmo deturpado à luz dos interesses pessoais do próprio possuidor, o direito de propriedade vai expor-se a sanções fundamentalmente de duas ordens: as decorrentes da infringência às normas do poder de polícia, ou então à perda da propriedade na forma da Constituição. A função social visa a coibir as deformidades, o teratológico, os aleijões, digamos assim, da ordem jurídica.” [32]

Destaque-se ainda que o princípio de função social tem ou deve ter muito maior alcance do que aparenta. Não é mera exortação ou conselho de simples valor moral,[33] nem tem natureza metodológica e classificatória,[34]do direito de propriedade.


V – O direito de propriedade – da absolutização à sua relativização.

Interessará mais de perto nesse estudo o exame da faculdade de uso e o elemento de proteção ou elemento externo, qual seja a possibilidade de reivindicação do bem objeto da titularidade, garantia máxima contra a ingerência alheia que, de regra, ocorre através da posse, consentida ou não.

Tradicionalmente, a civilística indica as seguintes características como sendo as principais do direito de propriedade: absoluto, exclusivo, perpétuo, elástico e ilimitado.[35]Seriam estes atributos puramente clássicos ou históricos? A resposta negativa se impõe, pois continua a propriedade sendo um direito do indivíduo, mas agora como pessoa e não como proprietário no sentido individualístico de titulação egoística oitocentista. É necessária outra leitura, com os olhos fitos na função social do bem, conforme a sua natureza.

Na interpretação da norma jurídica, deve-se buscar sempre seu sentido atual, adquirindo conteúdos novos, pois o seu texto nada mais é do que um complexo de palavras, haja vista sua constante evolução, respondendo pelas novas necessidades e pelos novos problemas jurídicos decorrentes da mudança do tempo, com significações novas[36] que, às vezes, quando da edição da norma, sequer se podia pensar nelas. É a interpretação e leitura que mantêm o direito vivo.

A característica do direito de propriedade mais afetada pelo princípio da função social foi o de ser um direito um direito absoluto, no sentido de sua utilização ampla, irrestrita e ilimitada pelo titular.

Na dicção de Caio Mario, “o que é certo, absolutamente certo, é que a propriedade cada vez mais perde o caráter excessivamente individualista que raiava pelo absoluto. Cada vez mais se acentuará a sua função social, marcando a tendência crescente de subordinar o seu uso a parâmetros condizentes com o respeito aos direitos alheios e às limitações, em benefício da coletividade.”[37]

Tepedino e Schreiber salientam que a propriedade afasta-se de sua tradicional feição “de direito subjetivo absoluto, ou ainda, limitado apenas negativamente, para converter-se em uma situação jurídica complexa, que enfeixa poderes, deveres, ônus e obrigações...”[38]

Nesse ponto interessante a observação de José Afonso da Silva, para quem os conservadores da constituinte insistiram para “que a propriedade privada figurasse como um dos princípios da ordem econômica, sem perceber que com isso estavam relativizando o conceito de propriedade.”[39]


VI - A função social integrada à estrutura e ao conceito de propriedade.

Deve-se também estabelecer uma segunda premissa em tema de função social: ser ela (a função) parte integrante (essencial) da estrutura, do conteúdo do direito, influenciando na sua caraterização e no seu conceito. Em outras palavras, impregnando o direito de propriedade ou, de outro modo, ser parte integrante do complexo direito de propriedade, impondo-lhe um novo significado.

O legislador constituinte não disse que esta ou aquela propriedade atenderá a sua função social, mas disse que o direito de propriedade que ele garante deve atender à sua função social tenha ela o objeto que tiver.

A premissa, como dito acima, é aquela que enquadra o princípio da função social como parte integrante do direito de propriedade, como elemento de sua estrutura, conformando-a, atuando de dentro para fora e não como os limites, que são exteriores e, portanto, de fora para dentro. Tal questão não é meramente acadêmica, tendo grande importância prática nas consequências que acarreta ao próprio direito o descumprimento de sua função social.

É conhecida a classificação que examina os institutos jurídicos levando-se em consideração dois elementos fundamentais, a saber: a estrutura e a função. Na lição de Perlingieri “estrutura e função respondem a duas indagações que se põem em torno do fato. O “como é?” Evidencia a estrutura, e o “para que serve?” Evidencia a função”.[40]

Pode-se afirmar, com segurança, que a função social não é limite ao direito de propriedade, mas faz parte de seu conteúdo, fundindo-se "com o próprio núcleo do conceito de propriedade"[41], erigindo-se “numa das vigas mestras de nossa ordem econômica e social."[42]

Laura B. Varela e Marcos Ludwig salientam que a função social é a essência dinâmica da estrutura jurídica, afastando deste modo a tradicional teoria dos limites, que são externos. Lembra-se, deste modo, que a “reconstrução do direito de propriedade, estrutura fundamentalmente civil, tem sua essência dinâmica na função social.”[43] É essa essência dinâmica que impõe ao titular a necessidade de atuar positivamente na direção do cumprimento da função social do bem de sua titularidade.

Isabel Vaz assinala que a “idéia de propriedade, na atual Constituição, foi inseparavelmente concebida ao lado da idéia de função social, acarretando consequências jurídicas até então inexistentes.”[44]A função social “é intrínseca à propriedade privada. As concepções individualistas sucumbiram ante a força das pressões sociais em prol de sua democratização.”[45]


VII – O cumprimento da função social.

O princípio da função social, como se disse, não tem o sentido de estabelecer limites ao direito de propriedade, pois estes têm conteúdo apenas negativo, bem próximo da visão tradicional, própria do exercício do poder de polícia de administração[46], mas imprime-lhe concepção positiva própria de princípios constitucionais impositivos. Assume, portanto, “um papel do tipo promocional”, atuando como conformador da lei ordinária ao conteúdo constitucional, possibilitando o reconhecimento da inconstitucionalidade das leis que o ignorarem, expressa ou implicitamente, servindo de farol iluminador, de interpretação da disciplina proprietária pelo juiz e pelos operadores do direito. Na falta de disposição expressa, representa, ainda, um critério que legitima a analogia e também o afastamento das normas nascidas como expressão do individualismo, servindo também como princípio de valência geral, para o proprietário, quando do exercício de seu direito, abortando os fins antissociais ou não sociais.[47]

Izabel Vaz faz importante distinção entre propriedade estática e propriedade dinâmica. A propriedade estática é aquela que produz frutos, sem que o proprietário tenha de desenvolver alguma atividade para tal. Proporciona ao seu titular, independente de qualquer atuação econômica desenvolvida, os benefícios inerentes à sua própria natureza, tais como aluguel, moradia, rendimentos, dividendos. O aspecto dinâmico repousa na ideia de ação, de atividade econômica organizada.[48]

Funcionalizar determinado instituto é inserir algo dinâmico na sua estrutura. Mesmo na visão “jurídica” de função exige-se uma atividade, que se exercita não no interesse próprio ou não somente no interesse próprio, mas exclusivamente ou conjuntamente no interesse de outrem.

A propriedade estática acima referenciada, pode-se dizer, equipara-se à propriedade individual, que também tem uma função social, em que pese respeitáveis opiniões em contrário. Estar a propriedade produzindo algum fruto para seu titular, sem exploração (no sentido próprio da palavra) de outrem (mão-de-obra escrava, juros extorsivos, aluguéis ou rendas superdimensionadas) ou no exercício de atividade lícita, como utilização direta pelo titular ou por membros de sua família, é indicativo de cumprimento de sua função social.

A função social na propriedade é uma função impulsiva, isto é, impõe ao titular o exercício de uma atividade compatível com o bem objeto de seu direito.

A aplicação de capital próprio (em dinheiro ou de outra espécie) para produzir fruto civil, é legítima, se dentro de certos limites, cumprindo uma função econômica e também social, pela geração de impostos, empregos, pelo fomento ao comércio e à indústria.

Izabel Vaz salienta que o “aperfeiçoamento do conceito de função social se revela quando o legislador impõe, não apenas uma “limitação dimensional” à propriedade, cujo titular sofre as consequências da redução quantitativa de seu patrimônio, mas quando passa a exigir do proprietário uma utilização do imóvel conforme os princípios da função social”.[49]

Fachin salienta que a função social relaciona-se “com o uso da propriedade, alterando, por conseguinte, alguns aspectos pertinentes a essa relação externa que é o seu exercício. E por uso da propriedade, é possível apreender o modo com que são exercitados as faculdades ou os poderes inerentes ao direito da propriedade.”[50]

O uso do bem, que naturalmente se dá pelo exercício da posse, é a parte mais sensível na temática da função social. Como salienta Teori Zavascki, por função social da propriedade “há de se entender o princípio que diz respeito à utilização dos bens, e não à sua titularidade jurídica, a significar que sua força normativa ocorre independentemente da específica consideração de quem detenha o título jurídico de proprietário” e conclui:

“Utilizar bens, ou não utilizá-los, dar-lhes ou não uma destinação que atenda aos interesses sociais, representa atuar no plano real, e não no campo puramente jurídico. A função social da propriedade (que seria melhor entendida no plural, “função social das propriedades”), realiza-se ou não, mediante ato concretos, de parte quem efetivamente tem a disponibilidade física dos bens, ou seja, do possuidor, assim considerado no mais amplo sentido, seja ele titular do direito de propriedade ou não, seja ele detentor ou não de título jurídico a justificar sua posse.”[51]

Carlos Sundfeld ressalta a necessidade de utilização do bem para cumprir a função social: “Ora, se estiver legitimado a apropriar-se de algo, há o indivíduo, obrigatoriamente, de cumprir os interesses sociais que possibilitaram tal legitimação. Para cumpri-los, deve assumir um papel ativo, colocando em atividade a riqueza de que é detentor, em benefício da coletividade. Assim, sendo, pode e deve o ordenamento jurídico impor ao proprietário obrigações de fazer, consistentes na própria utilização da coisa em prol da sociedade.”[52]

Orlando Gomes, escrevendo antes da publicação do atual texto constitucional, foi enfático quanto à obrigação de utilização da coisa em razão da função social:

“Deveres e ônus que reduplicam e são estabelecidos numa escala que vai desde as proibições restritivas do exercício do direito até à condenação da propriedade inerte traduzida na obrigação do proprietário de utilizar seu bem na forma de interesse coletivo. Sua atividade deixa de ser livre em face da operatividade externa da função sobre a estrutura, primando o elemento teleológico sobre o estrutural.”[53]

Como de regra, as expressões utilizadas pelo legislador constitucional a respeito da função social da propriedade estão associadas a uma possível inércia do titular no exercício de seu do direito, impondo-lhe comportamentos positivos, coerentemente com a nova mentalidade de propriedade, cujo direito subjetivo contém um poder-dever ou poder-função[54]. Todavia, por óbvio que, em determinada situação de confronto entre a função social da cidade e a função social da propriedade ou mesmo no confronto entre o exercício da função social por alguém num bem titularizado por outrem, pode implicar em necessidade de comportamento omissivo ou em necessidade de justificar sua inciativa.

Nesse ponto, retornando ao inicio das discussões “modernas” a respeito da função social da propriedade, recorre-se a preocupação, já naquele tempo, que levou Leon Duguit a questionar a inércia do titular do direito que propriedade que tinha campos disponíveis para o cultivo ou imóveis que podiam servir a outrem através da locação.

Afirma ele que não são meros “contratos de derecho privado, sino que forman en su conjunto un verdadero sistema legal”, que “son el sostén de un servicio de utilidad pública”, permitindo a lei a todo inquilino “con la condición de llenar ciertas formalidades, inponer al proprietario la prórroga de su arriendo en las mismas condiciones durante cierto período después de la guerra”, da mesma forma, que não permite que “el importe del alquiler no se fija por el libre juego de los convenios y si por decisión del Poder Público, como una tarifa de servicio público”, e ainda que “el proprietario no está ya en libertad de alquilar o de no alquilar”, deve “alquilar, y a un precio que debe dar a conocer previamente”, podendo “el juez siempre incluso decidir que el precio es excesivo, reducir-lo y condenar al arrendador.”[55]

Ora, entre nós a intervenção do estado no dominio dos contratos se dera de modo mais acentuado exatamente nos contratos de locação de imóveis, primeiro residencial e, depois, nos não residenciais, estabelecendo regras que permitissem a continuidade do vinculo, eliminando a chamada denuncia vazia.

Quantas leis foram editadas, inclusive as chamadas leis temporárias, visando garantir o direito de moradia como a Lei 1.300 de 1950 que devia viger até 31.12.52 conforme previsão do seu artigo 22 e que foi prorrogada pelos menos por oito vezes, até ser revogada pela Lei 4.494 de 25.11.64. Depois a Lei 6.649/79, substituída pela atual Lei 8.245/91, que passou a regular toda locação urbana – residencial e não residencial, que também já experimentou alterações.

Nas chamadas locações comerciais o Decreto 24.150/34 consagrou a ação renovatória. Num primeiro momento (justificável face a intervenção no direito de propriedade, símbolo da liberdade de atuação do homem), com requisitos rígidos (contrato escrito com prazo mínimo de 5 anos de vigência), flexibilizados parcialmente na nova lei. Tal flexibilização se deu em razão da prática dos locadores (que tem a decisão de alugar ou não alugar) de elaborarem contratos com prazos menores para não permitir a renovação compulsória da locação.

O mencionado Dec. 24.150/34, neste aspecto, prestigiando uma outra característica da função social do contrato, preocupou-se em garantir a proteção do fundo de comércio implantado e desenvolvido pelo esforço contínuo e persistente do locatário de imóveis comerciais, de tal sorte que, na hipótese de oposição à renovação compulsória da locação, o locador se via obrigado a indenizar o locatário por todo o investimento e esforço produzido com a finalidade de estabelecer um determinado fundo de comércio de interesse daquela determinada comunidade.

Até mesmo na Lei 8.245/91, que restabeleceu a chamada denuncia vazia, é mister que o contrato residencial tenha sido firmado por pelo menos 30 meses, garantindo uma certa estabilidade no mercado de locações, e possibilitou a revisão trienal do valor locativo para ajustá-lo à realidade mercadológica.

Desse modo, se um imóvel, que tem uma função social a cumprir, não se destina a uso próprio ou específico do proprietário, a única forma de transformar a propriedade estática em dinâmica, e com isso cumprir com a função social da propriedade, é “delegando” a funcionalidade à terceiro. Este, por sua vez, o fará por meio do exercício da posse direta (e.g., locação, comodato, uso, habitação, usufruto, superfície ou concessão de uso para fins de moradia ou para outros fins socialmente relevantes), considerando que o uso do bem – pelo titular ou por outrem – é que possibilitará o cumprimento de sua função social. Desta forma se  permitirá sua legitimação como direito.


VIII – A faculdade de uso e sua extensão.

Pela regra do art. 1228 do Código Civil como também se dava com o art. 524 do Código Civil de 1916 com redação diversa, a faculdade de uso é a primeira referida pelo legislador quando cuida do direito de propriedade.

Diz o § 4º do artigo 182 da C.F., que não cumpre a função social a propriedade não edificada, não utilizada ou subutilizada permitindo ao Poder Público municipal exigir do proprietário que promova seu adequado aproveitamento. Por sua vez, a primeira parte do § 1º do art. 1228 do Código Civil estabelece que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais. 

Ora, na parte de que estamos tratando, a faculdade inerente ao domínio atingida é a de uso, visto que nela sempre se entendeu como compreendida a faculdade de não utilizar, não cultivar, não edificar, não alugar, não arrendar etc...

Pode-se arriscar então uma primeira conclusão: na propriedade imóvel urbana (e também na rural, embora este não seja objeto deste ensaio) estaria suprimido o direito de não usar a coisa, pela força impulsiva, atribuída a tais tipos de bens, em razão do princípio da função social.

Bem, poder-se-ia objetar que na prática tal conclusão não funcionaria.

Com tal afirmação estar-se-ia, se verdadeira a conclusão, obrigando todos os proprietários rurais ou urbanos que têm terra inaproveitada, subutilizada, a dar uma destinação imediata ao bem: alienando, arrendando, alugando, construindo, morando, cultivando, etc.

Em verdade, na função promocional do direito é isso que se quer do titular num primeiro momento, mas nem sempre será possível. Isso porque, por diversas circunstâncias, pode-se exigir do titular (até mesmo pela função social da cidade) que este se mantenha inerte, não edificando o imóvel, ou que o utilize sem a edificação de impacto à comunidade naquele dado momento.

Contudo, em imóveis edificados e que tenham como destinação específica habitação ou exploração comercial/industrial é possível exigir comportamento positivo do titular no sentido de cumprir com a função social do bem de sua titularidade ou posse. Tal situação se tornará evidente nas hipóteses de conflito de interesses entre particulares ou entre o Poder Público representando a comunidade em face do titular do direito.

Nesse ponto, a distinção entre faculdade e direito merece referência.

Para Santoro-Passarelli, “faculdade” é expressão que designa poderes particulares privados de autonomia, que podem distinguir-se ao analisar o conteúdo de um direito subjetivo.[56] Para Leoni Oliveira, “faculdade” expressa o conteúdo do direito subjetivo e não tem existência própria, mas está sempre vinculada a um direito subjetivo.[57]

As faculdades, explica Orlando Gomes, constituindo, como constituem parte componente do direito, não podem ter vida independente deste. Como corolário da dependência, estão submetidas, no seu exercício, às normas que disciplinam o direito em que se integram. O conteúdo de um direito pode ser desfalcado de uma ou de algumas das faculdades que o compõem, sem que o direito deixe de existir.[58]

Não pode haver dúvida de que o legislador do Código Civil de 2003 agiu corretamente ao substituir a expressão “direito” por “faculdade”. A extinção ou perda de uma determinada faculdade - conteúdo de um direito subjetivo - não implica a deste, mas o contrário ocorre. A perda ou extinção do direito subjetivo importa, necessariamente, na supressão de suas faculdades, que nascem com ele, podendo morrer antes ou junto, nunca depois do direito. Se porventura o direito contiver apenas uma faculdade, aí sim a extinção ou perda desta importará na perda ou extinção daquele.

Ora, não há dúvida de que nem sempre o titular de um direito de propriedade tem a faculdade de uso, que corresponde à possibilidade de exercício direto da posse, seja porque assim o recebera (ex. legado da nua-propriedade) seja porque a cedê-la gratuita ou onerosamente. Quando cede a alguém por algum contrato (locação, comodato, concessão etc.) que não implique na transferência do próprio direito subjetivo, apenas a faculdade foi transferida a outrem. Este outrem que está permitindo, com sua atividade ou com o exercício da faculdade cedida, cumprir com a função social do bem.

O proprietário tem o direito, mas está impedido de uma importante faculdade, aquela que permite a fruição direta das utilidades da coisa.

Saliente-se que há, à disposição do titular, um amplo complexo de opções de utilização da faculdade de uso e das outras faculdades também (e.g., utilização direta em diversas atividades, utilização por terceiro, como salientado, através de locação, comodato, arrendamento, incorporação, concessão de uso, concessão de superfície, multipropriedade, usufruto, uso, habitação e outras que se imaginar), as quais vão corresponder à modalidade de uso. Pois é em razão da possibilidade de uso do bem que, supõe-se, alguém adquire um imóvel (é obvio que não ignoramos a aquisição a título de formação de capital imobiliário, que em certa medida é criticada pela doutrina).

É por meio do uso da coisa que o proprietário cumpre sua função social. O não uso da faculdade pertencente ao direito só cumpre função tipicamente individual, que pode trazer ou não consequências para o titular, conforme a natureza do bem.

Conforme ensinamento de Orlando Gomes são as faculdades que dinamizam os direitos. Um direito em “que o titular não usa as faculdades correspondentes conserva-se estático.”

Portanto, a opção menos contundente, isto é, aquela que entende ínsita na faculdade de uso a faculdade de não uso, atenderia a uma noção tradicional e individualista da propriedade como poder absoluto do titular, ignorando, no dizer de Schreiber “a ultrapassada concepção individualista da propriedade e a sua atual funcionalização a interesses sociais, como fruto de uma ótica mais solidária e menos excludente.”[59] No mesmo sentido colhe-se em Luiz Fernando de Camargo Prudente do Amaral:

“Além disso, o fato de a propriedade privada ser garantida pelo constituinte não implica o reconhecimento dos direitos do proprietário como o faziam os ordenamentos ao tempo do liberalismo puro. Ao contrário, a atual formatação do regime jurídico da propriedade, isto é, de sua disciplina, encontra maior semelhança com aqueles que atribuíam ao proprietário inegáveis deveres.”[60]

Por outro lado, o direito subjetivo de propriedade é um direito-dever, um poder-função, um direito-função.

Direito-função, na visão de Goffredo T. Junior, é o direito de a pessoa exercer a função que lhe é designada por norma jurídica e, concomitantemente, a obrigação de exercê-la. Em virtude do mandamento da norma jurídica, o titular do direito-função fica na obrigação de exercer a função que lhe é atribuída por meio da norma.[61]

A noção de poder jurídico, conforme esclarece Leoni Oliveira, é distinta de direito subjetivo, sendo fato distintivo a circunstância de que o seu titular não age no interesse próprio, mas sim no interesse alheio. Salienta ainda que alguns entendem que essa figura está ligada a uma função, não sendo, portanto livre a atuação do titular, mas necessariamente no interesse alheio e, por esta razão, também chamado de poder-dever, isto é, que o exercício constitui um dever.[62]

Dever jurídico, para este mesmo autor, ocorre quando “o agir do devedor não está caracterizado por prestação de conteúdo econômico, mas diz respeito, principalmente, a um comportamento de conteúdo pessoal.”[63]

Não há conflito entre direito subjetivo e função, servindo esta última como característica de dinamização daquele. Assim se dá com a função social na propriedade.

Assim o direito subjetivo de propriedade é um direito-função, um poder-dever, um poder-função, porque confere poderes, mas também atribui deveres ao titular. Neste sentido a opinião de ilustres autores: Fabio Konder Comparato[64]; Eros R. Grau[65]; Raimundo B. Falcão[66]; Rosah Russomano[67]; Luiz E. Fachin[68]; Laura B. Varela e Marcos Ludwig[69]; Orlando Gomes[70]; Judith Martins-Costa e Gerson Branco[71]; Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber[72] e Perlingieri.[73]

Ora, o cumprimento deste poder-dever, ou dito de outro modo, da função social da propriedade, está no exercício positivo da faculdade de uso do bem, seja diretamente ou através da atuação de outrem.

Celso Bastos obtempera que a concepção clássica de propriedade não se afastou da ideia de um direito abstrato de caráter perpétuo que “era usufruído independentemente do exercício deste direito”, o que significaria dizer que o direito não se perderia pelo não uso, mas que “parece ser uma característica do direito de propriedade moderno o estar determinado pelo uso econômico da coisa” e é este uso  que determina e legitima a propriedade, de modo que “é como se a propriedade se apagasse quando a utilização econômica desaparece.”[74]

Então, estando inerte o proprietário ou não tendo interesse demonstrado do exercício da função social e existindo alguém não proprietário que esteja dando o destino adequado, deve-se privilegiar a atividade desenvolvida no imóvel se nesta se mostra saliente a função social por vários aspectos, seja não só pela utilização do bem, mas pela função social da própria atividade em si.


IX – A função social da propriedade X a função social da empresa e do contrato

Cumpre destacar neste aspecto, que ninguém ignora que a função social está presente também na atividade empresarial, seja por sua natureza de propriedade empresarial seja pela própria atividade em si. Entretanto,  a só existência formal da empresa não cumpre ainda nenhuma função social, que está, nesse caso, em estado de potencia, impondo aos titulares do controle a obrigação de desenvolver a atividade prevista no estatuto ou no contrato, para só então, cumprir com a função social da propriedade, considerando esta uma modalidade de propriedade.

Aqui aparece um primeiro “conflito” objeto deste estudo, entre a função social da propriedade imóvel e a função social da empresa e de seu estabelecimento situado que está ou estará num determinado imóvel de titularidade própria ou alheia, considerando que a propriedade da empresa é uma das espécies de propriedade garantida pela constituição, desde que cumpra com sua função social.

Isto é, na empresa a função social está presente em dois aspectos salientes: como direito de propriedade e como atividade em si mesmo. A primeira está sujeita a todas as observações que acima se fez a respeito da propriedade em geral e a segunda, à sua peculiar atividade.

Neste sentido Comparato assinala que “em se tratando de bens de produção, o poder-dever do proprietário de dar à coisa uma destinação compatível com o interesse da coletividade transmuda-se, quando tais bens são incorporados a uma exploração empresarial, em poder-dever do titular do controle de dirigir a empresa par aa realização dos interesses coletivos.”[75]

Um imóvel que faça parte do patrimônio de empresa pode corresponder a duas situações. Se fizer parte da atividade da empresa a exploração de ramo imobiliário, deverá então alienar ou ceder, onerosamente ou não (nesta hipótese se o estatuto permitir) o imóvel para que outrem nele resida ou explore atividade negocial, conforme a finalidade do bem. Nesta hipótese, a empresa estará cumprindo ao mesmo tempo a função social da empresa e a função social da propriedade. Mas se o bem faz parte do patrimônio, mas não tem correspondência direta com a atividade empresarial, para cumprir a função social da propriedade, deverá a empresa destinar o bem a locação ou a outro tipo de cessão, onerosa ou gratuita (repita-se, se permite o estatuto).

A função social da atividade empresarial foi objeto de destaque de Guilherme Calmon e Bruno Bartholo, na seguinte passagem:

“Sem dúvida, tal relevância, fruto do dinamismo e do poder de transformação do regime empresarial, se expressa pelas mais distintas maneiras, dentre as quais cumpre ressaltar a criação de uma extensa rede de interação e de interdependência entre agentes econômicos assalariados e não assalariados que gravitam em torno dos empreendimentos empresarias, a grande parcela de bens e de serviços produzidos por aqueles e consumidor pela população, além da significativa fração das receitas fiscais provinda do exercício dessa atividade.”[76]

Ora, não reconhecer que o princípio da função social altera a faculdade de uso, condicionando-o ou impondo comportamento positivo ao titular, no sentido de dar utilidade racional, seja no interesse individual, seja no interesse coletivo, corresponderia verdadeiramente a ignorar a própria existência do princípio da função social.

Assim, não se pode tolerar que o titular de bem o tenha para fins especulativos, a título de capital, ao passo que, lançando mão no momento que bem entender, deixa o imóvel urbano sem utilização alguma, ou o reivindique daquele que está dando cumprimento à função social seja pelo exercício de uma atividade produtiva que cumpre função econômica de relevante importância social pela geração de empregos diretos e indiretos, além de impostos ou aquele que a cumpre através de moradia, sem que dê motivação para tal. Ou seja, há necessidade de que a denuncia do contrato acaso existente seja motivada (cheia) pela necessidade exercício de atividade diretamente pelo titular do bem como nas hipóteses de retomada para uso próprio na locação comercial ou para uso próprio ou de parentes próximo na locação residencial.

Não se deve admitir, por conta do princípio da função social da propriedade que o proprietário, no exercício do direito de reivindicação simplesmente afirme que pretende o imóvel de volta pela simples condição de ser proprietário dele, consagrada na velha expressão: quer porque quer, sem nenhuma razão específica. Ou até mesmo, que tenha uma motivação, mas que esta em verdade corresponda ao abuso do direito, considerando os danos que pode causar para a outra parte ou para a coletividade de pessoas que interagem com a empresa, para hipótese de imóveis não residenciais.

Necessariamente quando alguém está cumprindo com a função social do bem pertencente a outrem, seja com a moradia ou com atividade empresarial, o exercício do direito de reivindicar deve está condicionado à informação na petição inicial do despejo ou da reivindicatória como causa de pedir da necessidade do exercício de tal direito, com a indicação da função social que se pretende dar ao imóvel, o que implica na necessária produção de prova a respeito.

Nas hipóteses de locação, quando o proprietário reivindicante indica na inicial ou na contestação (nas hipóteses de retomada nas locações comerciais) e prova no curso da demanda sua necessidade, como, por exemplo, a moradia própria ou dos parentes indicados na lei de locação ou para uso empresarial próprio, ou seja, que pretende cumprir diretamente com a função social do bem, sua pretensão deverá ser acolhida observando-se um tempo razoável para desocupação do bem. Caso contrário, sua pretensão deverá ser rejeitada com base no princípio da função social da propriedade e na função social da empresa, paras hipóteses de imóveis não residenciais.

Desde 1934 em especial, nos imóveis ditos comerciais a lei procurou preservar o exercício da atividade pelo inquilino, considerando a importância econômica e social da atividade desenvolvida no imóvel. Esta buscou proteger o empresário do poder especulativo do proprietário ao intervir diretamente na relação contratual para possibilitar a sua renovação compulsória, preenchidos determinados requisitos previstos na lei (Dec. 24.150). Tais requisitos foram sendo flexibilizados ao longo do tempo no sentido de conferir ainda maior proteção àquele que investiu, com risco próprio, na propriedade alheia, tornando-a produtiva de bens e riquezas, não só no interesse próprio, mas indiretamente no interesse de todos aqueles que se beneficiam com aquela atividade. Isto é, os empregados (salários, benefícios sociais e previdenciários), os consumidores finais da atividade produtiva (serviços ou bens de consumo especifico), a comunidade (através de impostos, contribuições fiscais e parafiscais geradas pela atividade) e, ainda, possibilitando renda para o titular da propriedade. Renda está que se verificará (ou poderá se verificar) em correspondência real com o valor de mercado do bem em razão da existência das ações revisionais de contrato.

Fabio Ulhôa Coelho assinala que “cumpre sua função social a empresa que gera empregos, tributos e riqueza, contribui para o desenvolvimento econômico, social e cultura da comunidade em que atua, de sua região ou do país, adota prática empresariais sustentáveis visando à proteção do meio ambiente e ao respeito aos direitos dos consumidores.”[77]

Merece destaque o que a Lei 6.474/76 (que cuida das sociedades anônimas, mas que na sua parte principiológica deve ser aplicada a todo tipo de empresa) estabeleceu no § único do art. 116 a respeito da obrigação do acionista: “O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, o que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.”

Deve-se atentar ainda que os imóveis dados em locação ou comodato, por vezes, tem uma vocação peculiar, de modo que, salvo demonstração de que o imóvel terá outra destinação que cumpra com maior amplitude a sua função social como, por exemplo, a demolição de moradia unifamiliar para construção de um prédio residencial ou não, ou que o destinará à locação para a hipótese do imóvel estar no regime de comodato, e, no mesmo sentido, o imóvel comercial que passará a ter, com a retomada outra destinação possível para o local, somadas aquelas hipótese nas quais a lei autoriza a denuncia “cheia”, não se deve admitir a retomada pelo simples fato de pretender o locador, atendendo à parte egoística de seu direito subjetivo.

Se o imóvel comercial tiver destinação específica de grande relevância para a comunidade à sua volta, como, por exemplo, hospitais, clínicas, escolas (em sentido amplo), indústrias, supermercados, ou seja, imóveis que só podem ser destinados à mesma atividade, salvo projeto de construção para adaptação à outras atividades ou construções de outra natureza, a denúncia só fará sentido por descumprimento da obrigação de pagamento dos alugueres ou outra infração grave, como, por exemplo, o próprio descumprimento da função social da propriedade pelo locatário.

Admitir-se simplesmente a paralisação de uma atividade pelo simples capricho do titular do direito de propriedade em prejuízo não só daquele que desenvolve atividade no imóvel, mas de todos que direta ou indiretamente são beneficiados com a atividade ali exercida sem que haja um justo motivo, é tentar amenizar o impacto que a função social trouxe para estrutura do direito de propriedade como já assinalado.

Se, para cumprir a função social da propriedade, o proprietário reivindicante terá que exercer diretamente atividade no imóvel, esta, segundo a lei, não poderá ser a mesma do locatário, em respeito ao seu fundo de comércio (art. 52 inc. II e § 1º da Lei 8.245/91). Entretanto, na hipótese de imóvel que tenha vocação específica concernente, por exemplo, à sua localização (escola, clínica, hospital, supermercado, padaria etc.), seja em razão de sua natureza, seja em razão de leis municipais que tenham estabelecido modalidade específica de exploração para o local, a situação suscita melhor reflexão.

A reivindicação (seja através de ação de despejo, seja por meio de pedido de retomada),nessas hipóteses (de imóveis com vocação específica), só poderá ocorrer se o titular possuir projeto aprovado alterando a natureza da atividade a ser exercida no imóvel, por ele ou por terceiro. Isso porque, do contrário, que diferença faz o dinheiro (de atividade lícita certamente) do locatário atual para um futuro locatário? Neste ponto, pode-se até tomar emprestado as regras de pagamento estabelecidas no direito das obrigações – até um terceiro, estranho ao negócio, sem interesse jurídico evidente pode pagar no lugar do devedor e extinguir a obrigação.

Assim, se não há diferença entre o poder liberatório da moeda do atual ocupante para o futuro ocupante. Apenas pode ser considerado como abusivo o exercício do direito de retomada ou de reinvindicação da coisa, violando a boa-fé e os bons costumes exigidos pelo art. 187 do Código Civil.

Assim, para receber a proteção do sistema, o exercício de um direito não pode se dar de modo abusivo. Neste ponto Heloísa Carpena afirma que “para se proceder à caracterização do abuso de direito deve-se tentar identificar o seu motivo legítimo, o qual deve ser extraído das condições objetivas nas quais o direito foi exercido, cotejando-as com a sua finalidade e com a missão social que lhe é atribuída, com o padrão de comportamento dado pela boa-fé e com a consciência jurídica dominante.”[78]

Na mesma linha Fernando Noronha assinala que para caracterizar o abuso de direito basta observar se há “manifesta desproporção entre o interesse que o agente visa realizar e aquele da pessoa afetada, ou, dizendo de outro modo, entre as vantagens do titular do direito e os sacrifícios suportados pela outra parte. Se todos os direitos têm finalidade social, não é possível tutelar pretensões que representam sacrifício manifestamente desproporcional.”[79]

Então, naqueles exemplos figurados (escolas, hospitais, clínicas, indústrias, supermercados, padarias, comércios de bairros e outros de considerável impacto comunitário e social), havendo interesse do locatário em dar continuidade à sua atividade e estando cumprindo com as obrigações impostas no contrato – ainda que seus contratos tenham sido firmados por imposição do proprietário em prazos inferiores àqueles compreendidos nas hipóteses de proteção legal através de ações renovatórias ou por vezes em decorrência de prorrogações verbais facilmente comprovadas – e, em sendo possível constatar estabilidade na atividade exercida com beneficio para a comunidade no seu entorno, deve-se privilegiar a atividade exercida. Isso porque, deste modo a propriedade, ainda que não seja do possuidor, estará cumprindo com sua função social.

Há na hipótese um confronto de situações em torno da função social (função social da propriedade imobiliária e função social da empresa e função social do contrato), no qual o interprete deverá observar qual das situações permite ao imóvel cumprir com sua função social: o interesse reivindicante ou o interesse do possuidor direto, uma vez que a função social, como se disse, faz parte da estrutura do direito. Não se trata, portanto de faculdade do titular optar entre dar uma destinação que cumpra com a função social ou simplesmente ficar inerte.

Nas relações que decorrem do desdobramento da posse que visa, num primeiro plano, atender aos interesses dos participes do negócio jurídico, resultantes de contratos de locação (residencial e não residencial), comodato ou outro qualquer daqueles já referidos, que não tenham prazo determinado ou que se transformaram em contrato de prazos indeterminados, que em princípio podem ser rompidos unilateralmente por qualquer das partes, há a atração do princípio da função social do contrato, da boa-fé e do abuso do direito.

A função social do direito, como gênero, abraça todas estas figuras de importância indiscutíveis no momento histórico e cultural que se vive.

A função social do contrato é uma das vertentes da função social da propriedade, considerando que a ideia de propriedade constante do art 5º inc. XXII da C.F., não abrange apenas a noção clássica de propriedade. Todo direito que tenha conteúdo econômico existente no patrimônio de alguém está associado à noção de propriedade que a constituição garante.

Então, em certa medida, podemos ter nas hipóteses acima aventadas um confronto entre propriedades diversas numa certa relação jurídica, ambas, na qual, o exercício das respectivas titularidades, permitam ao seu titular o cumprimento da função social de sua propriedade, convivendo de modo harmônico, como no exemplo da propriedade imobiliária destinada à locação comercial e a propriedade da empresa que se serve do imóvel para desenvolvimento de suas atividades. Ambas, com função correspondente a peculiaridade da natureza do bem. Ambas atendendo ao postulado da função social da propriedade, da função social da empresa e da função social contrato que celebraram, além de simultaneamente permitirem o cumprimento dos postulados básicos da república federativa do Brasil, qual seja o princípio da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social, contribuindo para erradicação da pobreza e das desigualdades sociais construindo de uma sociedade mais justa e solidária, em razão da circulação de bens e riquezas possibilitando aos membros do grupo social a satisfação de necessidades básicas (educação, saúde, alimentos, medicamentos etc.), mesmo que circunscrita a uma pequena região ou área de atuação, gerando empregos diretos e indiretos, impostos, contribuições sociais, e, o que é mais importante, permitindo a produção de capital e consequente transferência de renda, fatores estes preponderantes para o desenvolvimento social de um determinado local ou região.

Se a utilidade do imóvel refere-se à moradia, que o destine a locação, comodato ou o aliene. Da mesma forma se possui imóvel com estrutura comercial, que atenda ao fim econômico, possibilitando a exploração por outrem da atividade que lhe é peculiar, que ceda ou mantenha o uso existente para que a função social seja cumprida se não pretender cumpri-la diretamente.

Caso se trate de imóvel rural, que o torne produtivo, com aproveitamento racional e adequado, respeitando o meio ambiente, as relações com os trabalhadores e com os demais proprietários. O próprio princípio da reforma agrária e tornar produtiva uma área improdutiva. Neste aspecto, devemos considerar a aplicabilidade dos princípios fundamentais de Direito Agrário, pelos quais se encontrará a função social da propriedade como um dos seus princípios mais peculiares.

Na verdade, para que a propriedade seja considerada um direito humano, deve cumprir sua função social. Neste sentido também é a opinião externada por Fabio Comparato na seguinte passagem: “(...)é preciso verificar in concreto, se se está ou não diante de uma situação de propriedade considerada como direito humano, pois seria evidente contra-senso que essa qualificação fosse estendida ao domínio de um latifúndio improdutivo, ou de uma gleba urbana não utilizada ou subutilizada, em cidades com sérios problemas de moradia popular.”(...)“É preciso, enfim, reconhecer que a propriedade-poder, sobre não ter natureza de direito humano, pode ser uma fonte de deveres fundamentais, ou seja, o lado passivo de direitos humanos alheios.” [80]

Poder-se-ia objetar que a proposição apresentada criaria contratos perpétuos, mas por óbvio que não se trata de tal situação, considerando que os interessados podem de comum acordo distratarem o negócio vigente entre eles e pode-se também exercer o direito de denuncia motivada, incluindo-se dentre as hipóteses, a inércia do locatário, comodatário, superficiário etc. em dar a destinação prevista no contrato (hipótese de infração contratual), colocando em risco o próprio direito do titular em razão da ausência de cumprimento da função social da propriedade, isso sem falar na possibilidade de se revisar periodicamente as bases do contrato, por todo o seu prazo de vigência, de modo a se permitir a manutenção do seu respectivo e necessário equilíbrio.

O que se afirma com arrimo na doutrina citada neste estudo é que não faz sentido, romper-se um vinculo que assegura a outrem o direito de moradia ou o exercício de atividade produtiva, quando este cumpre regularmente com seus compromissos contratuais e legais, apenas por capricho do titular do direito, estribado em ajuste verbal ou de prazo de indeterminado, por entender compreendido em seu direito a possibilidade de findar relações jurídicas que são socialmente relevantes.

Certamente, assim fazendo, estará exercendo seu direito de denuncia em flagrante abuso do direito, uma vez que violará, a um só tempo, os fins econômicos e sociais do seu direito, além da boa-fé e dos bons costumes (art. 187 do CC já mencionado) e dependendo do bem objeto de sua titularidade, afetando a função social da empresa e de todos aqueles que dela dependem e que também merecem proteção contra atos realizados sem fundamento razoável.

Neste passo, merece transcrição a visão de Capanema que apesar de reconhecer como legitimo o direito do locador retomar o imóvel, mas tal direito não pode e nem  deve ser exercido sem qualquer motivação, pois assim fazendo, estar-se-ia “ultrapassando os limites de sua função social e da boa-fé, incidindo na figura do abuso de direito, a que alude o artigo 187 do Código Civil.”[81]

Percebe-se desta orientação que o individual deve ceder ao social presente no cumprimento da função social da propriedade, da empresa e do contrato.

Esta situação se mostra mais sensível quando o conflito de interesses é travado entre empresas, ou seja, entes que têm, como se viu uma função social a cumprir e causa mais impacto social quando descumprida do que a propriedade imobiliária. Esta se ficar sem uso, com uso inadequado ou subutilizada, uma vez que nesta espécie de bem, alguém por iniciativa própria pode entrar no bem e passar a exercer posse funcionalizada, suprindo a falta do proprietário, mas com consequências drásticas para este em razão da possibilidade da aquisição da propriedade pela usucapião.

Contudo, na empresa, tal situação não se mostra, à primeira vista, viável (não que seja impossível), isto é, alguém tomar posse da empresa e usucapir suas cotas sociais ou o estabelecimento. Assim, a paralisação de uma atividade num determinado local causa maior impacto social negativo do que um imóvel abandonado, face às inter-relações resultantes de sua atividade com os destinatários de sua atividade, com seus fornecedores, com as prestadoras de serviços públicos, com a fazenda publica nos três níveis.

Ora, não se mostra razoável que uma empresa, adquira ou alugue um imóvel para deixa-lo sem qualquer atividade com o objetivo, por exemplo, de impedir que um concorrente seu se instale no local. Essa hipótese viola ao mesmo tempo a C.F. na parte que cuida da liberdade de iniciativa e na parte que exige o cumprimento da função social da empresa e da propriedade (aqui destacando-se uma da outra). Se, pretende impedir a concorrência, que é salutar para a coletividade, que instale uma filial no local.   

Neste ultimo aspecto, o art. 421 do Código Civil estabelece que a liberdade de contratar deve ser exercida em razão e nos limites de sua função social. Na liberdade de contratar está inserida, por certo, a liberdade de distratar e na função social está compreendida a noção que não mais se deve tolerar que ele sirva apenas ao interesse de uma das partes ou mesmo de ambas, “como fator de seu enriquecimento exclusivo, como no passado se pensava”, uma vez que o contrato “modernamente deve servir também à sociedade, como mecanismo de construção de um estado de bem-estar, gerando empregos e contribuindo para reduzir as desigualdades sociais.”[82]

Na visão de Flávio Tartuce os contratos devem ser interpretados de acordo “com a concepção do meio social em que estão inseridos, não trazendo onerosidade excessiva ou situações de injustiça às partes contratantes, garantindo que a igualdade entre elas seja respeitada, equilibrando a relação em que houver a preponderância da situação de um dos contratantes sobre e outro.”[83]

Emilio Betti assinala que o direito não dá seu apoio ao capricho e ao arbítrio individual “mas a funções práticas que tenham uma relevância e uma utilidade social e que, por isso mesmo mereçam ser estavelmente organizadas”[84]e no dizer de Miguel Reale a realização da “função social da propriedade somente se dará se igual princípio for estendido aos contratos, cuja conclusão e exercício não interessam somente às partes contratantes, mas a toda coletividade.”[85]

E ainda, no que diz respeito à proteção dos interesses não proprietários relacionados à função social da propriedade, se mostram razoáveis as ponderações de Schreiber:

“A crise de legitimação da propriedade privada e o movimento solidarista evidenciaram a necessidade de se tutelar, com o instituto da propriedade, não apenas os interesses individuais e patrimoniais do proprietário, mas também interesses supraindividuais, de caráter existencial, que poderiam ser prejudicados pelo irresponsável exercício do domínio (e.g. preservação do meio ambiente e bem-estar dos trabalhadores). Altera-se, assim, drasticamente a função da propriedade que passa a abarcar também a tutela de interesses sociais relevantes.”[86]


Conclusão

Na formação ou formulação de um conceito deve se ter os cuidados, em especial quando o conceito formulado procura refletir a exata noção do objeto definido e, ao mesmo tempo, permitir uma constante atualização do conceito em razão das alterações do próprio objeto definido.

A função social é então um destes conceitos que amorfo e impreciso,[87] ajusta-se, amolda-se, como o direito à realidade social de seu tempo. Há necessidade de sensibilidade e argúcia do operador para dar a real eficácia que o princípio reclama, sob pena de manter-se na moldura do quadro que espelha realidade ultrapassada.

A importância econômica e social, do princípio da função social da propriedade não se verifica apenas pelos deveres que impõe ao proprietário (e também ao possuidor), mas pela conseqüência que traz para este mesmo proprietário, quando deixa de dar finalidade social ao bem da vida no seu patrimônio.   

Se, descumprir a função social da propriedade, da empresa e do contrato, conseqüência nenhuma tiver, seria a função social um princípio inativo, sem utilidade, o que corresponderia a um contrassenso para um princípio que tem como objetivo a funcionalização dos institutos jurídicos.

Sendo um princípio jurídico-constitucional atrai para si, em geral, as conseqüências por violação das regras constitucionais.

Uma corrente de pensamento considerada como pós-positivista entende os princípios como normas jurídicas vinculantes, “dotados de efetiva juridicidade, como quaisquer outros preceitos encontráveis na ordem jurídica”.

As normas de direito seriam o gênero dos quais são espécies os princípios e as regras.[88] Portanto, a inobservância de um princípio significa a violação de uma norma do sistema e, como tal, deflagra uma sanção que pode ser de não reconhecimento de um direito ou sua deslegitimação, como pode ser o estabelecimento de uma obrigação.

No que nos interessa, é preciso investigar que fenômeno se dá (diante da existência de mais de uma possibilidade) quando o proprietário faz opção por desatender ao princípio da função social da propriedade em contraposição àquele que está cumprindo com a função social, seja da propriedade do titular, seja do contrato, seja da empresa.

A consulta que se deve fazer aos textos referidos que trataram da propriedade sob o enfoque de sua funcionalização, permitem estabelecer um sentido para o significado da conduta antissocial do proprietário, símbolo de resistência ao preceito constitucional, passível de punição do sistema, como na imposição de manter-se vinculado a uma determinada relação jurídica contratual.

Portanto, não pode ser considerado como razoável a atitude do proprietário, que sem motivo razoável, pretenda, em prejuízo ao princípio da função social da propriedade, da empresa e do contrato, recuperar a posse do bem, cedida a outrem que está cumprindo com sua função social, na hipótese com a função social da posse resultante de contrato, para fins de moradia ou de atividade empresarial, para simplesmente atender ao direito “potestativo” de recuperar o bem de sua propriedade.

Tal atitude viola, não só a Constituição Federal nos seus princípios fundantes como também no princípio da função social da propriedade, além de violar o art. 421 e 187 ambos do Código Civil, desmerecendo, portanto, proteção do sistema.


Notas

[1]  PUGLIATTI, Salvatore. La Proprietà nel Nuovo Diritto. Milano: Dott. A. Giuffré Ed., l964, p.107

[2]  Cf. se vê em Mazeaud& Mazeaud (Lecciones  de Derecho Civil, Derechos Reales, B. Aires, Ediciones Juridicas Europa - America, vol. IV, parte segunda,  p. 18, ítem 1303), Hedemann (Derechos Reales, vol. II, Editorial Revista de Derecho Privado, Madrid, 1955, p. 24), Jaime Briz (Derecho Civil, Derecho de Cosas, Tomo II, Edit. Revista de Derecho Privado, Madrid, 1973, p. 92/93), Perlingieri (Inttroduzione. ob. cit., p. 23, 51, 73), Caio Mario (Condominio e Incorporação. ob. cit., p. 29, 37).

[3]  Cf. Francesco Messineo. Manual de Derecho Civil y Comercial. Ediciones Juridicas Europa-America, Tomo III, 1954, p.254/255

[4] JUNQEIRA, Messias. As Terras Devolutas na Reforma Agrária. SP: Ed. Revista dos Tribunais, l964, p. 8

[5] TORRES, Marcos Alcino de A. A Propriedade e a Posse. Um confronto em torno da função social. Lumen Juris, 2007, capitulo I, item 1.4, p. 16-25.

[6]DUGUIT, Leon. Las Transformaciones Generales del Derecho privado desde el Código de Napoleón., 2ª ed., Madrid: Francisco Beltran, Librería Españo y Extranjera (Trad. Carlos Posada), 1920, p. 19.

[7] Idem, idib p. 52, 53

[8] DUGUIT, Leon. Fundamentos do Direito. 2a ed. Lisboa: Editorial Inquérito Ltda:, (Trad. Eduardo Salgueiro), s/d, p.25

[9] DUGUIT, Leon. Les Transformaciones... ob cit. p. 178.

[10] Ibid, p. 173

[11] MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios-Constituição Brasileira. RJ: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1918, p. 717/718, preservada a grafia e os destaques do original.

[12] JOSSERAND, Louis. Derecho Civil. La propiedad y los otros derechos reales y principales. Buenos Aires: Bosch y Cia. – Editores, Tomo I, v. III, (trad. de Santiago Cunchillon y Manterola), l952, p. 103

[13] Ibid, p. 104.

[14] PEREIRA, Caio Mario da S. Instituições de Direito Civil. 12a ed. RJ: vol. IV,1997, Forense, p. 64

[15] BUZAID, Alfredo. Da Ação Renovatória... ob cit. p. XXIV/XXV.

[16] PEREIRA, Caio Mario da S. Tendências atuais do direito civil. R.F., nº 247, l974, p. 66.

[17] MELLO, Celso Antonio B. de. Curso de Direito Administrativo. Ed. RT - 1986, p.10

[18] VARELA, Laura Beck e Marcos de Campos Ludwig. Da Propriedade às Propriedades: Função social e Reconstrução de um Direito. In A Reconstrução do Direito Privado. Ed. RT, Judith Martins-Costa (Org), 2002, p. 765

[19] GRAU, Eros Roberto. Parecer em consulta do MST. In A Questão Agrária e a Justiça. Editora RT, 2000, p. 197/198.

[20] MIRANDA, Pontes. Tratado de Direito Predial. 2ª edição: José Konfino, vol. I.,1953, p. 89

[21]  SOUZA, Junia Verna Ferreira de. Solo Criado: Um Caminho para Minorar os Problemas Urbanos. Temas de Direito Urbanístico. Ed. RT,  Adilson A. Dallari e Lucia Valle Figueiredo (Coord), 1991, p.148

[22]  PEREIRA, Caio Mario da S. Condominio e Incorporações.  9ª edição: Forense Ed, 1995, p.40

[23] Idem, Reforma do Direito Civil. Revista de D. Civil, nº 58, p. 15.    

[24] MESSINEO, Francesco. Manual de Derecho Civil...ob cit. p. 256.

[25] TEPEDINO, Gustavo. A Nova Propriedade. RF, v. 306, l989, p. 74.

[26] PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Renovar.Trad. de Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 120/121.

[27] TEPEDINO, Gustavo. Contornos Constitucionais da Propriedade Privada, in Temas de Direito Civil, RJ: Renovar, 1999, p. 279.

[28] Ver nosso : Impacto das novas ideais na dogmática do Direito de Propriedade. A multiplicidade dominial.  In Transformações do Direito de Propriedade Privada. Coord. Mauricio Mota e Marcos Alcino torres, Ed. Elsevier, 2009, p.81 e ss.

[29] TEPEDINO, Gustavo. A Nova Propriedade. RF, nº 306, l989, p. 74.

[30] GONÇALVES, Luiz da  Cunha. Tratado de Direito Civil. Ed. Max Limonad, vol. XI. Tomo I, s/d, p.200/201

[31] BASTOS, Celso Ribeiro, MARTINS, Ives G. Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva Ed, 2º vol, 1989, p.. 253.

[32]  Idem, Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva Ed. . 2º vol, arts. 5º e 7º., 1989, p. 125.

[33]  Ibidem p.252.

[34]  PERLINGIERI, Pietro. Perfis do D. Civil. ob. citada, p.226

[35] MAURO,Laerson Mauro. Voce Conhece Direito Civil (Coisas). Ed. Rio, s/d . p. 177., ítem 171.

[36] RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito. 6ª ed. Coimbra: Armênio Amado, 1979, p. 231/232.

[37] PEREIRA, Caio Mario da S. Direito Civil-Alguns aspectos da sua evolução. Edit. Forense,2001, p. 79.

[38] TEPEDINO, Gustavo & Anderson Schreiber. Função Social ... op. cit. p. 49.

[39] SILVA, Jose A da. Curso de Direito Constituicional...ob cit. p. 681.

[40] PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil – Introdução ao Direito Civil Constitucional, RJ, Renovar, 1997, p. 94, destaques no original.

[41] BASTOS, Celso R. A função social como limite constitucional ao D. de Propriedade. Revista de Dir. Constitucional e Ciência Política. nº. 6, vol. 4, 1988, p. 25

[42] BASTOS, Celso R. e MARTINS, Ives Gandra.  Com. à Const. do Brasil. Ob. cit. ,  p.122

[43] VARELA, Laura B. e Marcos de C. Ludwig. Da Propriedade às Propriedades: Função social ... op cit. p. 768/769.

[44] VAZ, Isabel. Direito Econômico das Propriedades. RJ: Editora Forense, 1992, p.328

[45] FRANÇA, Vladimir da Rocha França. Perfil constitucional da função social da propriedade. Rev. Informação Legislativa, nº 141, Brasília, l999, p.14

[46]  SILVA, José Afonso. Direito Urbanistico Brasileiro. ob. citada, p. 65, ítem 13.

[47]  PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil . ob. cit., p.226/227/228.

[48] VAZ, Isabel. Direito Econômico das Propriedades. RJ: Edit. Forense, 1992, p. 330 e 333.

[49] VAZ, Isabel. Direito Econômico ...ob cit. p. 328.

[50] FACHIN, Luiz E. A Função Social da Posse e a Propriedade Contemporânea. Sergio A Fabris Editor, 1988, p. 17

[51] ZAVASCKI, Teori Albino. A Tutela da Posse na Constituição e no novo Código Civil, Rev. Direito e Democracia, Canoas, vol 5, n. 1, 2004, p.8, destaques no original.

[52] SUNDFELD, Carlos Ari. Função Social da Propriedade... op. cit  p. 6.

[53] GOMES, Orlando. Novas Dimensões... op cit. p. 12.

[54] RIOS, Roger Raupp. A Propriedade e sua função... op. cit. p.312

[55]  Ibidem, p.12/15

[56] PASSARELLI, F. Santoro. Teoria Geral do Direito Civil. Coimbra: Atlântida Editora, (Trad de Manuel Alarcão), 1967, p.52.

[57] OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes. Introdução ao Direito Civil. Lúmen Júris, v. 1, 1998, p.406.

[58] GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 18a ed: Edit. Forense, 2002, p.120.

[59] SCHREIBER, Anderson. Direito Civil e Constituição. Atlas, SP, 2013, p. 244-245

[60] AMARAL, Luiz Fernando de C. P. do. A função social da empresa: uma análise à luz do princípio de sua preservação. In Temas Relevantes de Direito Empresarial. Coord. Tatiana Bonatti Peres. Lumen Juris, RJ, 2014, p. 101.

[61] JUNIOR, Goffredo Telles. Iniciação na Ciência do Direito. ob cit. p. 294

[62] OLIVEIRA, J.M. Leoni. Introdução ao Direito Civil...ob cit. p.408

[63] Ibid, p. 374.

[64] Cf. Função Social da Propriedade dos Bens de Produção. op. cit. p.75

[65] Cf. A Ordem Econômica...ob cit, p. 249;

[66] Cf A Função Social da Propriedade. op. cit. p. 313.

[67] Ibid., p. 265

[68] Cf Da Propriedade como conceito jurídico. op. cit., p. 24

[69] Cf Da Propriedade às Propriedades... op. cit. p.787.

[70] Cf. Introdução ao Direito Civil. ob. cit. p. 76.

[71] COSTA, Judith Martins & Gerson Branco. Diretrizes Teóricas...ob cit. p.148/151 passim.

[72] Cf Função Social da Propriedade e Legalidade Constitucional. Revista da PUC-RJ, Direito, Estado e Sociedade, v. 9, nº 17, p. 48.

[73] Cf. Introduzione allá problemática dela proprietá. Jovene Editore, 1970, p. 70

[74] BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 17a ed: Ed. Saraiva, l996, p. 193.

[75] COMPARADO. Fábio Konder. Função social da propriedade dos bens de produção. Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro. Ano XXV, n. 63, jul-set de 1986.

[76] GAMA, Guilherme C. Nogueira da e BARTHOLO, Bruno P. Função Social da Empresa. In Questões Controvertidas. Direito de Empresa. Série Grandes Temas de Direito Privado, v. 8, coord. Mario Luiz Delgado e Jones . Alves. Editora Método, SP, p. 408.

[77] COELHO, Fábio Ulhôa. Princípios do direito comercial. SP: Saraiva, 2012, p. 37.

[78] CARPENA, Heloísa. Abuso de Direito no Código de 2002. Ed. Renovar, p. 382

[79] NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. Ed. Saraiva, 2003, vol. I, p. 372.

[80] COMPARATO, Fabio Konder. Direitos e Deveres em Matéria de Propriedade... op. cit. p. 140/141

[81] SOUZA, Sylvio Capanema. Locação não residencial. Denuncia Vazia. Função Social da Propriedade e da Empresa. Prazo para desocupação. In RSDE nº 5, julho/Dezembro de 2009, p. 356.

[82] CAPANEMA, Sylvio. A nova ordem jurídica e os paradigmas da função social do direito e da boa-fé objetiva e suas figuras parcelares. In Revista do M. Público do R. de Janeiro, nº 47, jan/mar 2013, p. 258.

[83] TARTUCE, Flávio. Função Social dos Contratos. Ed. Método, 2ª ed, p. 239.

[84] BETTI, Emilio. Teoria Geral do Negócio Jurídico. Ed. LZN, 2003, p. 150, apud TARTUCE, Flávio. Função Social dos Contratos, ob. citada.

[85] REALE, Miguel. Função Social do Contrato. Ed. RT, 2005, p. 266.

[86] SCHREIBER, Anderson. Direito Civil e Constituição, ob. cit., p. 246.

[87] PEREIRA, Caio M. da S. Evolução do Direito de Propriedade. Revista do Curso de Direito da Universida de Federal de Uberlândia, v. 11, l982, p. 225.

[88] ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constituiconais. Ed. Revista dos Tribunais, 1998, p. 28.


Autor

  • Marcos Alcino de A. Torres

    mestre e doutor em Direito Civil pela UERJ, prof. Adjunto de Direito da Civil da UERJ, Coordenador do Mestrado e Doutorado em Direito da Cidade. Presidente do Forum Permanente de Direito da Cidade da EMERJ. Coordenador de Direito das Obrigações da EMERJ. Diretor Cultural do IMB (Instituto dos Magistrados Brasileiros).Desembargador Presidente da 27ª C.C. do TJ-RJ.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORRES, Marcos Alcino de A.. Função social das propriedades: confrontos e soluções. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4468, 25 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42659. Acesso em: 2 maio 2024.