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Poder constituinte originário e poder de reforma constitucional

Poder constituinte originário e poder de reforma constitucional

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Análise do procedimento de elaboração de uma Carta Magna e o procedimento para sua reforma e atualização.

Introdução

O presente trabalho acadêmico aprofunda-se na análise e reflexão sobre dois importantes objetos de estudo do Estado, são eles o Poder Constituinte Originário e o Poder de Reforma Constitucional.

Nesse sentido, segue o presente memorial penetrando no contexto de formação e reforma da Lei fundamental de uma sociedade política, estabelecendo conceitos e análises dos sistemas legais que vigerão posteriormente. Restando esclarecer, que toda essa análise encontra-se dentro de uma disciplina chamada Teoria Geral do Estado e da Constituição.

A TGE que é o principal requisito para o posterior estudo de Direito Constitucional, é a análise do Estado como um todo, sua importância pode ser compreendida através das palavras do emérito Professor Dalmo de Abreu Dallari, in verbis:

“O estudo de Teoria geral do Estado (TGE) é de profunda importância para futuros operadores do direito, sendo requisito obrigatório para conclusão de curso e aptidão para o bacharelado e a advocacia. Tal exigência é explicada pela amplitude de conhecimentos que a referida disciplina propicia aos seus estudantes, afinal é através de seu estudo que se conhece e compreende os fenômenos do Estado, desde sua origem, formação, estrutura, organização, funcionamento e suas finalidades, compreendendo-se no seu âmbito tudo possui relevância para o Estado ou através dele.”

Portanto, o estudo de TGE e de seus objetos epistemólogicos são vitais para o futuro operador de direito, afinal atualmente há a preocupação de formação de juristas e não meros mecanicistas de direito, ao passo que em um mundo de tal complexidade jurídica, filosófica e social, entender o funcionamento desse organismo político que nos rodeia deve ser o diferencial para os futuros constitucionalistas do século XXI.

Antes de iniciarmos a análise do Poder Constituinte Originário e o Poder de Reforma Constitucional, é necessário entender o universo que rodeia esses dois objetos de estudo, portanto, se faz necessário conhecer o conceito e a evolução histórica do Direito Constitucional, a fim de entender a disciplina em que estão enquadrados os dois tópicos do presente trabalho acadêmico.

Conceito de Direito Constitucional

Ao ramo do direito responsável por analisar e controlar as leis fundamentais que regem o Estado dá-se-lhe o nome de direito constitucional. O seu objeto de estudo é a forma de governo e a regulação dos poderes públicos, tanto na sua relação com os cidadãos como entre os seus vários órgãos.

O poder político é formado pelas instituições às quais a sociedade lhes tenha outorgado o monopólio do uso da violência. Ou seja, o poder político tem a capacidade de coerção para obrigar a cumprir os seus mandatos imperativos através da violência legítima, sempre que este uso seja necessário.

O direito constitucional, que pertence ao direito público, é sustentado na Constituição, que é um texto jurídico-político que fundamenta o ordenamento do poder político. A Constituição é a norma suprema de um país, pelo que prevalece sobre qualquer outra normativa ou lei.

A Constituição é caracterizada pelo seu rigor, uma vez que apenas pode ser modificada mediante certas condições excepcionais que constam no seu próprio texto. A estrutura constitucional contempla um preâmbulo, uma parte dogmática (com os direitos fundamentais processuais e substantivos) e uma parte orgânica (com a criação dos poderes constituídos).

Entre os princípios doutrinais do direito constitucional, destacaremos a divisão de poderes (Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judicial) e a proteção do estado de direito (o poder estatal submetido a uma ordem jurídica), a soberania nacional e os direitos fundamentais (estabilidade e controlo da constitucionalidade, que é o mecanismo jurídico que garante o cumprimento das normas constitucionais).


História do Direito Constitucional

O Direito Constitucional surge num momento – o final do século XVIII – e num contexto – a Europa Ocidental e a América do Norte – em que o Estado estava firmemente consolidado como forma de organização típica da comunidade política. Como consequência deste fato, a realidade estatal é configurada, desde o princípio, como o marco do Direito Constitucional.  Paulo Bonavides diz que “a origem da expressão Direito Constitucional, consagrada há mais de um século, prende-se ao triunfo político e doutrinário de alguns princípios ideológicos na organização do Estado Moderno”.

O Estado deve ser considerado, deste modo, como uma realidade concreta na base de formação do Direito Constitucional e assim está colocado até este momento.

O conceito de Estado e categorias afins – como o Estado Nacional ou Soberania Estatal – são dois conceitos anteriores ao Direito Constitucional.

A origem e a história do Direito Constitucional estão associadas, portanto, ao surgimento e a evolução do Estado. O Direito Constitucional transforma o Estado/Nação em uma organização jurídico-político fundamental.

Na antiguidade a característica predominante era o governo único para governar as cidades-estados, como no Império Grego e Império Persa até o Império Romano onde tem início uma nova ordem, a ordem estatal.

A característica da Idade Média era o Regime feudal marcado pela concentração de riquezas e pelo predomínio do Direito Romano.           

Na Idade Moderna há a predominância do Estado absolutista caracterizado pelo Poder ilimitado do Rei.

Após a Idade Moderna verifica-se a predominância do Estado Liberal, onde o Estado se encontra sujeito ao império da lei; predomínio da economia privada, do Direito Privado. É com o Estado Intervencionista, em face das múltiplas atividades que o Estado passa a exercer.

A primeira cadeira de Direito Constitucional surge no século XVIII por ocasião da Revolução Francesa, com o objetivo de propagar na juventude o sentimento de liberdade, igualdade e fraternidade.

A origem da expressão Direito Constitucional, consagrada há cerca de um século, prende-se ao triunfo político e doutrinário de alguns princípios ideológicos na organização do Estado moderno. Impuseram-se tais princípios desde a Revolução Francesa, entrando a inspirar as formas políticas do chamado Estado liberal, Estado de direito ou Estado constitucional.

Consubstanciava-se numa ideia fundamental: a limitação da autoridade governativa. Tal limitação se lograria tecnicamente mediante a separação de poderes (as funções legislativas, executivas e judiciárias atribuídas a órgãos distintos) e a declaração de direitos.

Guizot, ministro da Instrução Pública, determinou, em 1834, na Faculdade de Direito de Paris, a instalação da primeira cadeira de Direito Constitucional. De França – aonde a expressão “constitucional” chegou ao Dicionário da Academia, um ano após a iniciativa de Guizot – o Direito Constitucional se trasladou a outros países, tornando-se de uso corrente no vocabulário político e jurídico dos últimos cem anos, período em que passou a designar o estudo sistemático das regras constitucionais.

Assim como o Direito Privado ganhara com a Revolução o Código de Napoleão, o Direito Público, graças a Guizot, ganhara com a Constituição aquele que, de futuro, seria o mais importante ramo da Ciência Jurídica: o Direito Constitucional, de características doutrinárias definidas. Um Direito Constitucional que aspirava a dar ao Estado as bases permanentes de sua organização, segundo as correntes do pensamento jurídico, individualista e liberal, tomando então por definitivo, absoluto, eterno, imutável.

Em virtude dessa origem histórica, sustentou-se, durante largo tempo, do ponto de vista doutrinário, que o Direito Constitucional e a Constituição eram distintos. E o eram, precisamente, por admitir-se, em coerência com a doutrina recém-exposta, a existência de Estados “sem Constituição”, ou apenas com uma “Constituição de fato”, nos quais não haveria lugar para o Direito Constitucional. Países dotados, pois, de Constituição de fato eram países sem Direito Constitucional, segundo o entendimento que prevaleceu, durante a primeira metade do século XIX, entre as noções liberais da Europa continental.

O Direito Constitucional era, então, o direito da Constituição, direito dos “povos livres”, referido a determinado texto, ou seja, a um conjunto de instituições, regidas pela “forma representativa”, sob a inspiração do liberalismo, daquela doutrina que diminuía ou confinava os poderes do Estado.

Tendo, historicamente, por base a filosofia jurídica do regime liberal, o Direito Constitucional acompanhou a crise do velho Estado burguês, até tornar nova configuração conceitual, mais jurídica do que filosófica, com a neutralização, para o estudioso ou pesquisador, dos valores aderentes às instituições, objeto daquela disciplina; valores, por conseguinte, já de nenhuma interferência na caracterização da Constituição ou do Direito Constitucional. Esse Direito Constitucional professadamente científico ou apolítico, o Estado liberal só o conheceu depois que seus juristas haviam, com máxima tranquilidade, cimentado um Estado de direito fora de todas as contestações contrarrevolucionárias do absolutismo.

Aquela acepção de fundo racionalista e normativista, decorrente, historicamente, do domínio político da classe burguesa à colher os primeiros frutos de sua vitória sobre os Estados da monarquia absoluta e sua respectiva organização de poder, cedeu lugar, hoje, a uma concepção mais ampla e verdadeira, muito menos tímida, aliás, aquela em que o Direito Constitucional é, conjuntamente, “técnica do poder” e “técnica da liberdade”; um Direito Constitucional político, sem ser, porém, contra ou a favor das instituições que abrange ou encerra. Enfim, para chegar a esse conceito, teve que se refletir o ocaso do constitucionalismo, com a queda de um sistema de valores e a decomposição de uma doutrina arraigadamente individualista. Não foi de emergência fácil e suave, porquanto veio no torvelinho de uma crise, que hoje açoita principalmente o ordenamento jurídico dos países constitucionais em desenvolvimento.

O Direito Constitucional deixa de ser, portanto, o que fora no século XIX: na doutrina, uma filosofia do Direito; na prática, uma espécie de direito público do liberalismo.

Ao termo de suas mais recentes transformações, alcançou ele o grau de autêntica Ciência Jurídica: a ciência das normas e instituições básicas de toda e qualquer modalidade de ordenamento político.

Podemos, enfim, concluir, com Marcel Prélot, que “o termo direito constitucional, sem epítelo nem determinativo, corresponde logicamente a qualquer conjunto de normas que venham a governar uma coletividade humana”.


Poder Constituinte: Teoria e legitimidade

É o poder de elaborar e modificar normas constitucionais. É o instrumento ou meio legítimo de se estabelecer a constituição, a forma de Estado, a organização e a estrutura da sociedade política. Existem 3 espécies de Poder Constituinte: Originário (poder de elaborar uma constituição), Derivado (poder de modificar uma constituição), Decorrente (o poder constituinte originário atribui aos Estados-membros o poder constituinte decorrente para criarem suas próprias constituições).

Já a Teoria do Poder Constituinte é resultado de um momento histórico, conforme explicado na evolução histórica já apresentada, portanto, é basicamente uma teoria da legitimidade do Poder. Surge quando uma nova forma de Poder ganha força para se sobrepor a vigente, a partir da Revolução Francesa, substitui-se a vontade do Soberania Monárquica pela Soberania Popular, portanto, a teoria do Poder Constituinte faz sua aparição histórica e revolucionária em fins do século XVIII.

Esse poder novo, oposto ao Poder decadente e absoluto das monarquias de direito divino, invoca a razão humana ao mesmo passo que substitui Deus pela Nação como titular da Soberania. Nasce assim a teoria do Poder Constituinte, legitimando uma nova titularidade do Poder Soberano e conferindo expressão jurídica aos conceitos de Soberania Nacional e Soberania Popular.

Cumpre, todavia não confundir o Poder Constituinte com a sua teoria.

Poder Constituinte sempre existiu em toda sociedade política, porque jamais deixou de haver o ato de uma sociedade estabelecendo os fundamentos de sua própria organização. Uma teorização desse Poder para legitimá-lo, numa de suas formas ou variantes, só veio a existir desde o século XVIII, por obra da sua reflexão iluminista, da filosofia do contrato social, do pensamento mecanicista anti-historicista e antiautoritário do racionalismo francês, com sua concepção de sociedade. Numa fórmula feliz, estabeleceu Egon Zweig a síntese dessa teoria: um conceito novo para instituir a suprema potestas nationis et rationis (o poder supremo da nação e da razão).

A Teoria do Poder Constituinte nem sempre existiu. Surgiu como o poder constituinte nacional (soberania a serviço do sistema representativo ou transcende a vontade governativa do monarca, do príncipe, de poderes absolutos).

A Teoria do Poder Constituinte só se faz inteligível à luz de considerações sobre o problema da legitimidade.

Emergiu de uma concepção em que a titularidade do poder era deferida exclusivamente e por inteiro à Nação, única legítima para postular obediência ou estabelecer comando na sociedade.

Do ponto de vista formal, o Poder Constituinte sempre existiu e sempre existirá, sendo assim um instrumento ou meio com que estabelece a Constituição, a forma de Estado, a organização e a estruturada sociedade política.

Do ponto de vista material ou de conteúdo, individualizado e não generalizado, formulado já em termos históricos no âmbito de uma teoria, o Poder Constituinte é conceito realmente novo, com o objetivo de exprimir uma determinada filosofia do Poder, incompreensível fora de suas respectivas conotações ideológicas.

A Teoria do Poder Constituinte empresta dimensão jurídica às instituições produzidas pela razão humana. Como teoria jurídica, prende-se indissociavelmente ao conceito formal de Constituição, separa o Poder Constituinte dos Poderes Constituídos, toma-se ponto de partida e matriz de toda a obra levantada pelo constitucionalismo de fins do século XVIII e primeira metade do século passado, assinala enfim o advento das Constituições rígidas.

A Constituição obriga os Poderes Constituídos, não obriga o Poder Constituinte. Institui o governo, distribui a competência, separa os poderes, arma-os de prerrogativas, mas não constitui a Nação nem o corpo político, sempre soberano para modificá-la.

O aspecto político de Poder Constituinte tem a função de fazer com que a Nação ou o Povo (governados), sejam sujeitos da Soberania.

Pelo conceito jurídico o Poder Constituinte, implica na existência prévia de uma organização constitucional do qual ele é legitimado para o seu exercício.

O Poder Constituinte reside na Constituição, e para o seu exercício se serve de determinados órgãos com caráter representativo.

O Poder Constituinte é competente para ultimar a mudança constitucional e poderá: reformar a Constituição ab-rogá-la, se limitar a pequenas emendas, ou uma revisão que venha resultar a feitura de uma nova Carta.

O Poder Constituinte tem natureza política soberana, inerente à sua essência, absoluto, desatado de vínculos restritivos que não os da direta e imediata expressão de sua própria vontade, presente e atualizada. Muito embora a Teoria Constitucional Moderna busque um caráter mais jurídico do que político ao Poder Constituinte Derivado.

Sob a óptica da Soberania Nacional faz da Constituinte um Poder à parte, distinto dos Poderes Constituídos provido de competência, tanto para a revisão total como parcial da Constituição. Exerce poderes limitados.

Sob a óptica da Soberania Popular abrange duas alternativas teóricas, seguidas historicamente: a francesa, segundo a qual a Constituinte é o povo (concepção falsa, visto que a Soberania é de natureza indelegável), e a americana, que vê na Constituinte ou Convenção apenas uma Assembleia limitada cujo trabalho se legitima unicamente com a aprovação do povo.

A titularidade do Poder Constituinte não se concentra nem se absorve num único titular, visível ou definido. Há um Poder Constituinte de titularidade indeterminada.

A legitimidade de um Poder Constituinte assentado sobre a vontade dos governados e tendo por base o princípio democrático da participação apresenta uma extensão horizontal (amplitude de cidadãos que decidem a matéria ou escolhem seus representantes), e vertical, (permite mensurar os graus de participação popular).

A Teoria de Sieyès

O Poder Constituinte, distinto dos poderes constituídos, é do povo (nação), mas se exerce por representantes especiais. Não se faz necessário, acrescentava Sieyès, que a sociedade o exerça de modo direto, por seus membros individuais, podendo fazê-lo mediante representantes, entregues especificamente à tarefa constituinte, sendo-lhe vedado o exercício de toda a atribuição que caiba aos poderes constituídos.

Alguns apontamentos sobre a Teoria de Sieyès

Sieyès publicou um panfleto intitulado “O Que é o Terceiro Estado?” meses antes da Revolução Francesa. Para ele, a nação (povo) se identificava com o Terceiro Estado (burguesia), que eram responsáveis por toda atividade econômica e serviços da cidade, sendo excluídos dos serviços lucrativos e honoríficos que eram ocupados pelos outros dois Estados: a nobreza e o clero, que eram partes privilegiadas que poderiam ser suprimidas sem afetar a subsistência da Nação, uma vez que ocupavam os cargos de decisão e as funções essenciais da coisa pública, subjugando e oprimindo o Povo, usurpando seus direitos. No manifesto o Terceiro Estado pedia justiça e reivindicava uma parte, bem como, solicitava que seus representantes deveriam pertencer ao Terceiro Estado, e sua representação igual a dos privilegiados.

Sieyès na idealização do “Terceiro Estado” parte de um conceito de Rousseau: o de Soberania Popular, que é na essência o Poder Constituinte do Povo, fonte única de que procedem todos os poderes públicos. Mas Sieyès é o teorista por excelência do sistema representativo e esse sistema se mostra infenso às teses do Contrato Social, sobretudo aquela cláusula única a que reduzia Rousseau todo o pacto de sociedade: “a alienação completa de cada associado com todos seus direitos na comunidade inteira”.

O Poder Constituinte, distinto dos Poderes Constituídos, é do Povo, mas se exerce por representantes especiais (a Convenção). Não se faz necessário, acrescentava Sieyès, que a sociedade o exerça de modo direto, por seus membros individuais, podendo fazê-lo mediante representantes, entregues especificamente à tarefa constituinte, sendo-lhe vedado o exercício de toda a atribuição que caiba aos Poderes Constituídos.

Neste sentido, um corpo de representantes necessita de uma Constituição na qual sejam definidos os seus órgãos, as suas formas, as funções que lhe são destinadas e os meios de exercê-las. As leis constitucionais regulam e organizam os Poderes Constituídos e não podem ser por eles atingidas, pois somente a Nação tem o direito de fazer a Constituição. O Poder Constituinte é, por assim dizer um Poder de Direito, que não encontra limites em direito anterior, sendo inalienável, permanente e incondicionado. A Nação não está submetida a Constituição. Os Poderes Constituídos, ao contrário, são limitados e condicionados, recebendo sua existência e sua competência do Poder Constituinte, organizados e atuando de acordo com a Constituição.

Assim sendo, a Nação, segundo o entendimento clássico de Sieyès, jamais deixa o estado de natureza, visto que independe de leis, regras ou formas. Tem ela, por conseguinte, enquanto titular do Poder Constituinte, o direito absoluto de mudar a Constituição. Com a Constituição é possível criar e organizar o Governo, produto do Direito Positivo; nunca porém a Nação, obra do Direito Natural.

As Constituições não podem assim vincular nem sujeitar a nação soberana, onde basicamente reside o Poder Constituinte, matriz de todos os Poderes Constituídos que emanam da vontade geral, vêm do Povo, ou seja, da Nação.

Como noção política, o Poder Constituinte, qual o concebeu Sieyès, se confunde com a vontade da Nação. É pode que tudo pode. Ao fazer a Constituição, ele não se autolimita, porque sendo a expressão mesma da vontade Nacional, não pode ser “acorrentado no exercício dessa vontade por nenhuma prescrição constitucional, por nenhuma forma constituída”.

A Constituição obriga os Poderes Constituídos, não obriga o Poder Constituinte; ela institui o Governo, distribui a competência, separa os poderes, arma-os de prerrogativas, mas não constitui a Nação nem o corpo político, sempre soberano para modificá-la. A doutrina de Sieyès coloca o Poder Constituinte fora da Constituição. Com essa doutrina, porém ele se mostrará posteriormente contraditório, carente de lógica, ao intentar conciliá-la com a aplicação do regime representativo em matéria constituinte, ou seja, com a adaptação do regime representativo ao ato fundamental de elaboração da Constituição.

Como afirma Sieyès, “uma Constituição pressupõe antes de qualquer coisa um Poder Constituinte”, é por essa razão, entre outras, que ela “somente pode ter por objeto assegurar os direitos do homem e do cidadão”. Um dos meios essenciais de afiançar, pois, os direitos individuais consistem em traçar limites ao Poder das Autoridades Constituídas, nomeadamente ao legislador impondo-lhe no ato constitucional regras superiores das quais não possa eximir-se e cuja alteração lhes escape: “essas regras limitativas, obra de uma autoridade constituinte superior, comporão a garantia dos particulares.”

A grande descoberta ou o grande passo que a Ciência deu e a que se reportava o abade Sieyès é indubitavelmente o que procede da verificação de que o Poder Constituinte existe como fato. Mas não como fato apenas, senão também como valor, em cujo nome atua com legitimidade os Poderes Constituídos, que não devem confundir-se com o Poder Constituinte.


Titularidade do Poder Constituinte

Hoje, a titularidade do poder constituinte pertence ao povo, que a exerce através de seus representantes. Porem, nem sempre foi assim. Ela já pertenceu à casta sacerdotal durante os governos teocráticos do mundo antigo, onde a sabedoria não era parte do povo e sim de um grupo minoritário que detinha o poder.

No trajeto, com o decorrer do tempo, a sociedade mudou e exigiu mudanças. A titularidade em questão, então, também passou por várias. Durante o absolutismo monárquico, a sociedade europeia era caracterizada pela obediência ao rei, que detinha todo o poder em suas próprias mãos.

Deixando para trás essa breve introdução do assunto, pode-se dizer que entramos no mundo atual, nos tempos modernos, onde o povo, a nação detém o poder em suas mãos, apesar de ser indiretamente. Ele, através de votações periódicas, elege seus representantes, que buscam, na teoria, a satisfação do povo mediante soluções para os déficits sociais.

Portanto, levar à população desse território o poder de definir seu destino indiretamente a satisfaz pela sensação de escolha. As decisões tomadas pelos representantes, porem, podem às vezes faltar com a colaboração popular. Afinal, o povo em si já tem opiniões distintas em relação ao seu próprio representante, sendo ele escolhido pela maioria, que pode ser representada por um pouco mais de 50% da população total, deixando o restante insatisfeito, porém sem direito de reclamar.

Sieyès, definindo a nação como sendo superior a tudo que possa existir, elimina o direito de reclamação de qualquer individuo nela contido, pois o bem comum social se torna mais importante que o bem individual. A soberania da nação, classificada como uma teoria jusnaturalista, foi feita por Sieyès e, com  adesões surgiram também teorias contrárias ao seu estudo. Os Positivistas surgiram com Hans Kelsen e, diferentemente dos jusnaturalistas que acreditavam que o poder constituinte se trata de algo natural, diziam que o direito se trata de algo que deve ser positivado, iniciando-se de alguma forma.

A nação, para determinar seu poder, formula uma Constituição, ou seja, um mandamento de direitos de todos seus cidadãos, para que haja o convívio em sociedade de forma positivada. Essa constituição detém os princípios básicos que todos devem conhecer dentro do território em questão e se trata do poder originário, pois se trata de um poder de origem, e não segue uma doutrina específica superior a dele.

A constituição não deve obediência a nenhum direito positivado, pois se trata da demanda do povo que, através de sua superioridade, reconhece o documento em questão para que haja, nesse território, uma lei que defina os direitos e os limites dos direitos de cada um que nele se encontra. O poder constituinte busca ser uma forma de suporte para a constituição, gerenciando a lógica nela embutida e justificando sua superioridade.

A ideia da constituição surge com a necessidade da sociedade e, com a capacidade de eleger uma Assembleia Constitucional, a população demonstra exercer seu poder. Essa assembleia vai ter a proposta de identificar as demandas da sociedade e positivá-las, de forma em que seja formulada uma constituição. Num segundo momento, essa constituição deverá ser votada e aprovada pela sociedade. Afinal, é a sociedade quem pediu para que houvesse uma e, sua soberania deve ser exercida a qualquer momento.

 Da mesma forma em que a constituição pode estar de acordo com os ideais da sociedade, pode também, ao decorrer do tempo, tornar-se ultrapassada. Modificações para que sejam aderidas as novas ideias e identidades sociais são possíveis e necessárias, para que esse documento esteja de acordo com o que o povo julga indispensável para a melhor convivência possível.

Montar uma Assembleia Constitucional, porém, faria com que se tornasse a atualização da constituição algo em longo prazo quando, na verdade, deveria ser feita rapidamente. Por isso, existem as Emendas Constitucionais.  Essas emendas são complementares à constituição já existente e, não precisa da formação de uma Assembleia Constituição, facilitando a feitoria.

Elas podem ser feitas diretamente pelo poder Legislativo, afinal, a tripartição do poder gerou a esse poder uma autonomia perante a feitoria de leis, tendo então a capacidade de gerar uma Emenda Constitucional. Apesar de esse ser o único que pode executar uma emenda, o poder Executivo também tem certa voz no momento em que uma complementação se torne necessária à Constituição.

O Poder Executivo pode apresentar ao Legislativo PECs. PECs são Projetos de Emendas Constitucionais, em outras palavras, ideias que podem ser aderidas à Constituição de forma facilitada, pois quem está mais ligado à sociedade é esse poder. O Executivo serve a população de forma direta, buscando satisfazer suas necessidades da forma mais agilizada, enquanto os poderes Legislativo e Judiciário estão à disposição da sociedade indiretamente, sendo utilizados de acordo somente à necessidade do povo.

 Essa divisão do poder mencionada, em que cada um dos três poderes trabalha de forma conjunta aos outros direta ou indiretamente buscando a satisfação popular se chama a Tripartição do poder. Ela existe para que não haja na sociedade, um representante ou um órgão superior, que seja inquestionável e que tenha o conhecimento de todas as necessidades populares. Cada órgão estabelecido nessa tripartição tem suas metas e responsabilidades civis, complementadas pelos outros órgãos, estabelecendo uma sociedade mais perto da ideal.

Monstesquieu, ao definir a Tripartição dos poderes, tem influência das ideias de John Locke e funciona visando uma metódica singular. Eles não acreditam que cada poder deve ser autônomo ou independente. Pelo contrário, são complementares e devem funcionar de acordo com os outros poderes existentes. O Poder Legislativo fica encarregado de buscar as necessidades do povo e formular leis que se adéquam aos interesses sociais. Composto pelo Congresso Nacional, esse órgão tem seus poderes definidos pela Constituição Federal, onde, por exemplo, demonstra caber a ele a competência exclusiva de “fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os de administração indireta.” (Art. 49, inciso X).

Já ao Poder Executivo, cabe fazer executar as leis e governar o Estado em questão. A esse órgão também cabe a realização de órgãos públicos e a execução das tarefas desse órgão, legislando-o, assim como é feito com a sociedade em si. Outra tarefa que deve ser realizada é a de vetar leis que apresentadas pelo Legislativo que, em vez de buscarem o bem social, tem outros fins.

Ao final da feitoria das leis e quando elas entram em vigor, cabe ao poder Judiciário, o último dos três órgãos, a administração da justiça dentro do território nacional. A ele cabe, então, julgar e fazer com que seja fielmente cumprida as ordens das leis.

Juntando as funções e todos que trabalham para que a Tripartição de Poder seja eficaz, há a sociedade idealizada dentro desse Estado. Todos, obviamente, a buscam para melhorar a vida que cada um segue dentro dele. O povo, então, dentro dessa sociedade estará satisfeito e realizado ao ver que sua titularidade do poder esteja sendo executada de forma particular e pertinente através desses representantes.

 Cabendo a eles moldar a sociedade aos parâmetros corretos, deve haver a positivação das ideias sociais. Esse positivismo inicia-se com a própria Constituição Federal, que pode ser modificada, como mencionado antes, de acordo com a sociedade. Para que haja melhores especificações da sociedade desse território, cabem aos representantes montarem códigos que expliquem e se adéquem ao perfil da população.

O suporte social que a constituição necessita pode depender da adesão social a uma decisão cultural, sem necessariamente se adequar ao pensamento do líder da sociedade, pois, apesar de ser quem representa a superioridade do povo, não detém o poder social em suas mãos. O povo pode aderir ou não aos seus líderes, devendo apenas respeitá-los. A obediência do povo em relação a eles pode ser desafiada, pois ela não pode agir cegamente da forma que os seus representantes exigem, e sim pensar naquilo que eles pretendem fazer para melhorar a sociedade como um todo.

Hoje, cabe a todos verificar e buscar satisfação à sociedade. Desde o momento em que votamos ao momento em que questionamos suas decisões, somos todos cidadãos de uma única República e devemos nos responsabilizar pela titularidade que cabe a nós.

Por muito tempo, como mencionado no início do assunto, a titularidade do poder constitucional, esteve nas mãos de uma única pessoa, o que dificultava a busca pelo bem social e, agora que a sociedade evoluiu a notar que o poder somos nós e não um único membro dela, deve ser conservada a capacidade de notar a importância de cada um.

Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado

Como já dito anteriormente, o Poder Constituinte é o poder de criar um texto constitucional, ou seja, uma Constituição, elemento que representa os ideais e a estrutura de uma organização política, geralmente representando os anseios sociais de uma nação. Podemos conceituar o Poder Constituinte como aquele capaz de criar, modificar ou implementar normas de força constitucional e visto que as normas constitucionais ocupam o topo do ordenamento jurídico, sendo seu horizonte norteador, justifica-se então a importância de um estudo mais minucioso acerca do tema, seus tipos e subdivisões. Segue abaixo a classificação e definição dos mesmos.

PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO - original, incondicionado, ilimitado;

 É o poder que cria e põe em vigor as normas constitucionais, sendo também chamado de inicial ou inaugural. Esse poder instaura uma nova ordem jurídica, ou seja, é a partir de sua obra - a nova Constituição - que todo o ordenamento jurídico passa a ter validade. O Poder Constituinte Originário ainda é dividido em seu momento de atuação, conforme explicado abaixo:

 • Poder Constituinte Originário Histórico: É aquele capaz de editar a primeira Constituição do Estado, isto é, de estruturar pela primeira vez o Estado.

• Poder Constituinte Originário Revolucionário: São todos aqueles posteriores ao histórico, que rompem com a ordem constitucional anterior e instauram uma nova.

A doutrina estabelece ser ele inicial (Inaugura uma nova ordem jurídica. Dessa forma ele rompe com a Constituição anterior, revogando-a. As normas infraconstitucionais existentes estarão também revogadas pelo fenômeno da não-recepção), ilimitado (esse poder não encontra qualquer limite para estabelecer as regras que deseja), autônomo (apenas ao seu titular é dado o poder de determinar as regras da nova constituição) e incondicionado (não precisa obedecer a qualquer regra para a produção de suas normas. Ele mesmo cria o processo legislativo que entende correto para a sua formação).

PODER CONSTITUINTE DERIVADO - Não é originário, é condicionado, limitado.

 Também conhecido como Poder Instituído, Constituído, Secundário ou de Segundo Grau, esse poder busca estabelecer as formas de atualização da obra oriunda do poder constituinte originário. Como poder constituído não possui as características do poder originário, tendo em vista a existência de limites, condições e regras para que possa ser exercido.


Poder de Reforma Constitucional

Considerações Preliminares

Para começarmos a começar a compreender o poder de reforma constitucional, primeiramente temos que retomar o conceito de Poder Constituinte Originário, que é um poder absoluto, independente e ilimitado, e que tem como finalidade a construção de um novo Estado a partir da elaboração de uma nova Constituição.

Por a Constituição Federal ser a Lei Maior do Estado, assim que promulgada, anula todo o ordenamento jurídico anteriormente previsto, porém, a Teoria da Recepção do Direito Constitucional prevê que esta nova constituição seja receptiva as leis compatíveis com o novo ordenamento, e descarte as que sejam contrárias, considerando-as inconstitucionais.

Assim que o Poder Constituinte Originário atinge seu objetivo primário, a Constituição é promulgada e publicada, tornando-se lei vigente. A partir daí este poder desfaz-se, ou como podemos exemplificar melhor, transforma-se em outro tipo, o chamado Poder Constituinte Derivado, Constituinte Reformador ou ainda mesmo Secundário.

A este novo poder cabe a própria reforma ou qualquer tipo de processo que estabeleça algum tipo de mudança formal no texto da Constituição. Ele é dependente, limitado, restrito e determinado, e as características de algumas dessas limitações serão mais pra frente detalhadas a fundo.

O Poder Constituinte Derivado decorre da norma constitucional. O Estado é composto pela União, seus estados, municípios e o Distrito Federal. Na Constituição está expresso que as entidades federativas são autônomas entre si, ou seja, soberanas, e portanto têm o poder de legislação. Devido a este tipo de poder que cada estado brasileiro, tais quais São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, têm sua própria constituição estadual, e cada município suas próprias leis, criando assim um ordenamento jurídico próprio, que não pode ir contra os princípios fundamentais da lei maior, que é a Constituição Federal.

A Amplitude da Reforma e seu Poder

Ao tratarmos de sua abrangência, a reforma pode ser chamada de reforma total ou reforma parcial da Constituição. Enquanto esta última está mais associada ao termo emenda constitucional, o seu equivalente para a primeira citada é a revisão ou simplesmente a reforma propriamente dita.

Na verdade, muitos doutrinadores acreditam que a expressão reforma constitucional, ou revisão, não é muito exata, mas que de qualquer maneira devemos conservá-la pela sua usualidade.

A proposição Schmittiana sobre essa distinção nos mostra alguns conceitos muito interessantes sobre os tipos diversos de reforma constitucional:

  1. a Destruição da Constituição, a forma mais agressiva, já que suprime não somente a constituição existente, mas também o próprio Poder Constituinte na qual foi baseada.

  2. A Supressão da Constituição, porém conservando o Poder Constituinte na qual baseada como por exemplo um golpe de Estado.

  3. A Reforma Constitucional, ou também conhecida como revisão, que é a alteração dos textos constitucionais vigentes no momento, como a recepção de novos ordenamentos e supressão dos antigos agora obtusos. Lembrando que esse tipo varia de acordo com  legalidade de sua legitimação. Podem ser reformas constitucionais e legítimas, ou caso contrário se não respeitarem os métodos de procedimento previstos anteriormente na constituição, são considerados inconstitucionais.

  4. O Quebramento da Constituição, a vedação de prescrições legais para um caso determinado. Lembrando que essas leis violadas devem permanecer inalteradas quanto às demais, portanto, nem suprimidas permanentemente e nem suspensas.

  5. A Suspensão da Constituição, como o próprio nome já nos diz é a supressão provisória de uma ou diversas prescrições legais.

Agora tratando-se da reforma total da constituição, a revisão, alguns doutrinadores acreditam ser possível outros a excluem em qualquer hipótese.

Fato é que diversas Constituições ao redor do mundo prevêem esta, como uma possibilidade, tal qual uma medida extrema a ser tomada, mas em via de regra utilizam-se freqüentemente das reformas parciais ou emendas.

Em oposição, em países onde essa possibilidade não têm previsão, existem casos de processos políticos que atuam em forma de reformas parciais instituídas, e que na realidade se traduzem em alterações totais do ordenamento jurídico, como as promulgações dos famigerados Atos Institucionais no Brasil, por exemplo.

Sobre isso, Paulo Bonavides, segundo Espedito Pinheiro de Souza, nos mostra que há de se ter muito cuidado com esse tipo de reforma, pois na sua inocente aparência, a remoção de um simples artigo da Constituição pode abalar todo o alicerce do sistema, atuar como reforma total da norma e desvirtuar-se de seu espírito original.

Por essa ação, como nos mostra os exemplos históricos, temos uma conseqüência iminente, que é a violação da Constituição Federal.

Revisitando a Teoria de Sieyès, ocorreria, portanto, a desvinculação de seu ânimo original, que não pode ser outro senão o que ocorreria se fosse possível que toda a população atendesse a Assembléia e pudesse deliberar sobre o assunto, e não a utilização do poder estatal em benefício de alguns poucos de um determinado grupo.

Concluindo, percebe-se que ainda que a possibilidade de reforma total esteja prevista, muitos doutrinadores e a própria análise histórica nos mostra que ela não é aconselhável, e que a regra geral para mudanças no ordenamento jurídico têm sido mesmo as emendas constitucionais, que são mais restritas e objetivas, portanto de certa forma mais eficazes, e com menos margens de possibilidade para qualquer tipo de abuso de poder político, que consista em um desrespeito a Constituição.


Limitações da Reforma Constitucional

Os limites podem ser procedimentais, circunstanciais, temporais ou materiais.

a) Procedimentais

· Iniciativa (art. 60, caput): só têm o poder de iniciativa os deputados, senadores e outros que a CF aponta. A iniciativa para os membros do Congresso Nacional é necessariamente coletiva, ou seja, para que uma proposta de EC, apresentada pelos congressistas, possa tramitar, deverá haver, no mínimo, assinatura de 1/3 dos congressistas. Não poderá haver iniciativa parlamentar individual. A única iniciativa individual será a do Presidente da República. As Assembleias Legislativas das unidades da federação poderão apresentar um projeto de EC se houver a adesão de, no mínimo, mais da metade delas (art. 60, inc. III, da CF).

· Votação (art. 60, § 2.º): a proposta, para ser aprovada na Câmara, deverá ser apreciada e Votada em 2 turnos. Só será aprovada se obtiver 3/5 dos votos, o que significa que, para se aprovar a proposta de EC, são necessários 308 votos a favor. Após essa aprovação, deverá ser aprovada no Senado da mesma forma.

· Promulgação (art. 60, § 3.º): a promulgação será feita pelas mesas da Câmara e do Senado. Aprovada a EC pelo Congresso, não irá para a aprovação do Presidente da República.

b) Circunstanciais                                                                  

Durante a vigência de intervenção federal, estado de defesa ou de sítio, o poder de reforma não poderá ser exercido. Essa limitação é chamada pela doutrina de limitação circunstancial, visto que é uma circunstância que limita o exercício do poder de reforma.

Se a norma constitucional decorrente do poder de reforma sobrevém durante a intervenção federal ou estado de sítio ou de defesa, essa norma será inconstitucional.

c) Temporais

Na Constituição de 1824, o poder de reforma foi criado, entretanto ficou limitado seu exercício durante um período de 4 anos, ou seja, o poder de reforma somente poderia ser exercido após 4 anos da vigência daquela Constituição. Na CF/88 não houve limitação temporal dessa forma.

Alguns doutrinadores entendem que existe uma limitação temporal no § 5.º, que dispõe que “a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”. Existe, entretanto, uma grande discussão sobre esse assunto.

d) Materiais

As limitações explícitas estão expressamente dispostas no § 4.º do art. 60 (cláusulas pétreas). Existem, entretanto, limitações que não estão dispostas nesse parágrafo, são essas as limitações implícitas.

As limitações implícitas são:

· Titular do poder constituinte originário (art. 1.º): o titular do poder originário não pode ser modificado pelo poder de reforma.

· Exercente do poder de reforma: não poderá haver delegação do poder de reforma. O Congresso Nacional não poderá delegar o poder de reforma a outro órgão.

· Processo de EC: não poderá ser modificado o processo de EC. Alguns autores entendem, entretanto, que o processo de EC poderá ser modificado para torná-lo mais rígido.

· Supressão da própria cláusula: impossibilidade de que se suprima a própria cláusula do § 4.º do art. 60.

O § 4.º do art. 60 dispõe que:

“Não será objeto de deliberação uma proposta de emenda tendente a abolir:

I– a forma federativa de Estado;

II– voto direto, secreto, universal e periódico;

III– a separação dos Poderes;

IV– os direitos e garantias individuais”.

Assim, a vedação atinge a pretensão de modificar qualquer “elemento conceitual” (ex.: a Autonomia dos Estados-membros é elemento conceitual do Estado Federal).

Inc. I: dispõe que o Estado Federal é imutável. Muitos doutrinadores entendem que há uma limitação implícita quanto à modificação da forma do governo e do regime de governo, tendo em vista o resultado do plebiscito de 1993.

Inc. II: dispõe que o voto direto, secreto, universal e periódico é imutável.

O art. 14, § 1.º, I, dispõe sobre a obrigatoriedade do voto. Essa obrigatoriedade, entretanto, não é limitação material e pode ser objeto de Emenda.

Inc. III: Dispõe sobre o princípio da separação de poderes. O Poder, embora seja único, repartiu-se em três e não pode ser abolido, ou seja, não poderá ser criado um novo Poder ou restringido um já existente.

Inc. IV: Não se podem suprimir os direitos e garantias individuais. Os direitos e garantias individuais estão claramente mencionados como cláusula pétrea. Se o constituinte quisesse que todos os direitos fossem intangíveis, ele não teria se referido aos direitos e garantias individuais e sim aos direitos e garantias fundamentais, que é o gênero.

Não fazem parte da cláusula pétrea, portanto, aqueles direitos que não foram incluídos no inc. IV, quais sejam, os direitos sociais e os direitos políticos que não são alcançados pelo inc. II. Há, entretanto, discussão em contrário.

Hoje, estão vigentes e eficazes trinta e uma ECs, mais seis ECs de Revisão.

A Constituição trouxe, no art. 3.º do ADCT, uma disposição de revisão constitucional após cinco anos da promulgação da Constituição, por voto da maioria absoluta em sessão unicameral. Houve uma flexibilização da revisão constitucional.

O art. 3.º não pode, entretanto, ser interpretado sozinho, devendo ser interpretado conjuntamente com o art. 2.º, que previa o plebiscito para alterar a forma e o regime de governo. Desse modo, em início, a regra do art. 3.º estaria condicionada ao resultado do plebiscito e só haveria a revisão se fosse modificada a forma ou o regime de governo.

No dia 5.10.1993 foi instalada, porém, a revisão constitucional e o STF entendeu que sua instalação não estaria condicionada ao resultado do plebiscito, sendo promulgadas, nessa ocasião, seis ECs Revisionais.

A EC Revisional, no entanto, estava submissa à cláusula pétrea do art. 60, § 4.º, da CF/88, não podendo, validamente, suprimir direitos individuais, forma federativa de Estado, voto direto, secreto, universal e periódico ou a separação dos Poderes.


O processo de Reforma Constitucional

Segundo Karl Loewenstein, em seu livro Teoria de La Constitución, o primeiro passo é perguntar o que se deve fazer para se saber em que circunstâncias, ou em que momento, é necessária a reforma constitucional?

Responde o autor que não é possível estabelecer critérios gerais, pelo fato de que as modificações que dizem respeito às relações sociais, econômicas ou políticas são as responsáveis por fazer com uma norma constitucional tenha perdido a sua eficiência funcional. Isto se explica por um casuísmo, pois não se pode deduzir, teórico-constitucionalmente, uma lista de categorias gerais sobre a possibilidade de reforma constitucional.

A reforma constitucional pode ocorrer para corrigir as seguintes situações:  realizar modificações(suplemento); suprimir algum dispositivo(supressão), ou substituir o texto existente por outro(mudança). O procedimento pode se estender a vários artigos ou somente a um dispositivo; a uma parte de um artigo ou várias palavras; ou apenas e tão somente a uma palavra dentro de uma frase.

Para Loewenstein, a reforma constitucional tem um significado formal e material. No sentido formal, entende-se a técnica sob a qual se modifica o texto, tal como existe no momento de se realizar a modificação da Constituição. No sentido material, é o resultado do procedimento da Emenda Constitucional, isto é, o objeto a que se refere o procedimento. Explicado em tese a reforma constitucional, quem detém o poder para fazê-la?

Para o professor Michel Temer, “...a competência reformadora se corporifica por meio de instrumento chamado Emenda à Constituição(...). O Congresso Nacional é o exercente dessa competência.” A cerca do procedimento, as propostas de reforma podem ser apresentadas pelo Presidente da República ou pelos membros do Congresso Nacional.

Na tradição democrática o Poder Constituinte derivado, ou instituído repousa sempre no Poder Legislativo ordinário. É o que tem ocorrido no Brasil, desde a implantação de sua primeira Constituição. Porém existem Constituições que atribuem tal incumbência a órgãos especiais, submetido, depois, o texto revisto a plebiscito.

Normalmente, porém, o Legislativo não necessita de poderes especiais para proceder à reforma constitucional, bastando-lhe seguir o processo estabelecido na Constituição. Dentro desse processo, algumas Constituições estabelecem diferença entre revisão e emenda. Habitualmente, as Constituições brasileiras não estabelecem diferença entre revisão e emenda.

Ferreira Filho, com base no direito comparado, aponta diversas técnicas de procedimento para se realizar a reforma constitucional. A primeira observação que ele faz é a de que o procedimento de revisão constitucional obedece a uma forma paralela à do procedimento legislativo comum, que é aquele pelo qual se estabelecem as leis ordinárias. No procedimento legislativo, o referido autor distingue determinadas fases. Duas delas, nós encontramos nitidamente nas revisões constitucionais. Uma é a fase introdutória ( a iniciativa). A outra é a deliberativa (quórum).

A primeira tem por finalidade desatar ou impulsionar a atividade dos mecanismos de reforma. E, na história contemporânea, vários são os sistemas que, de certa forma, se reconhecem as opções entre autocráticas e formas democráticas da criação do direito. São as seguintes:

  1. Iniciativa exclusiva do Poder Executivo: tem uma conotação autocrática e um sabor Bonapartista, já que se praticou durante os Impérios Napoleônicos que reservam unicamente para o governo a promoção das reformas constitucionais.

  2. Iniciativa exclusiva do poder legislativo: tem como compromisso democrático e um sabor pluralista.

  3. Iniciativa indistinta do Poder Executivo e do Poder Legislativo, inspirado na moderação e no equilíbrio dos poderes, mas que, na prática, tem sido degenerado em um predomínio da iniciativa executiva. Podemos afirmar que se assemelha ao modelo brasileiro dos dias de hoje.

  4. A iniciativa conjunta do Povo e do Poder Legislativo: é praticado na democracia direta e no regime representativo, que se expressa em forma semi-direta de democracia.

  5. Iniciativa de revisão automática pela própria Constituição: neste caso fixa-se uma periodicidade na reforma, cujos mecanismos deverão colocar-se em funcionamento a cada tantos anos.

Quanto à segunda fase – a deliberação -, está ligada ao estudo das chamadas Constituições rígidas, porque não podem ser modificadas da mesma maneira que as leis ordinárias. Ferreira Filho aponta o primeiro rol de Constituição que vincula a aprovação da emenda a uma maioria qualificada. Para tais Constituições, basta a maioria qualificada para aprovação de emenda. Como exemplo, cita-se a Constituição holandesa, que exige, para aprovação da emenda, proposta pela lei ordinária, a maioria de dois terços. Em alguns países da Europa, a proposta de emenda pode estar sujeita à referendum, como na Constituição Italiana, em que se a proposta tiver apenas a aprovação da maioria absoluta do Parlamento, deverá ser sujeita ao referendum popular.

Segundo o autor argentino Vanossi, deve-se examinar o aspecto do processo constituinte, separando os casos em que a reforma constitucional é matéria de decisão de órgãos especiais, daqueles em que o assunto compete a órgãos permanentes ou a poderes constituídos, por via de um procedimento diferenciado e agravado com relação ao procedimento legislativo ordinário.

Vanossi ensina que devemos considerar a questão tomando em conta – separadamente – os casos de diferença orgânica e os de simples diferença processual. Entende-se pelo primeiro a previsão da competência de um sujeito ou corpo que unicamente cumpre a função constituinte. Enquanto que o segundo aponta a predeterminação dos procedimentos “especiais” para a reforma a cargos de órgãos, cuja competência consiste no exercício de atribuições do poder constituinte ordinário (o Legislativo) e “extraordinariamente” assume o exercício da função constituinte.

Diferença orgânica. Cabe distinguir duas situações: trata-se de um órgão diferente em razão de sua eleição “ad hoc” (para fim específico) pelo povo com o fim de cumprir a função constituinte; ou então se trata de um órgão diferente cuja formação resulta da reunião ou integração a esses efeitos dos componentes de outros órgãos do Estado, e não de uma decisão especial. No primeiro caso, consideramos que se trata de uma Convenção Constituinte e no segundo de uma Assembléia Nacional.

Convenção Constituinte

A palavra convenção é a expressão técnica para uma corporação eleita com o encargo de elaborar o projeto da norma legal constitucional e que a expressão procede da revolução inglesa.

Assembleia Nacional

Neste sistema não se elege popularmente um órgão especial e “ad hoc” para produzir as reformas, pois em contrapartida se forma um órgão dessas mesmas características, valendo-se da reunião especial de outros órgãos existentes (que oportunamente foram eleitos pelo povo para cumprir funções do poder constituído).

Simples diferença processual. Trata-se, aqui, das reformas aprovadas pelo mesmo órgão legislativo ordinário, que ao proceder não perde sua “personalidade” própria, apenas requer um trâmite mais dificultoso que aquele seguido para aprovação das leis comuns. Noutras palavras, é o mesmo órgão que assume o poder legislativo e o poder constituinte reformador cuja diferença entre ambos é apenas por circunstâncias de caráter processual. Por isso podemos distinguir certas técnicas processuais, aplicadas neste critério de reforma, que podem ser classificadas segundo o nível crescente de sua complexidade.

Vanossi aponta as técnicas mais comuns encontradas no direito comparado, esclarecendo, todavia, que não há regra geral, elas as classificadas conforme o seu grau de complexidade.

Maioria Legal:

Tem lugar quando, para aprovação das leis comuns, se exige o voto da maioria dos membros do Corpo Legislativo (Parlamento ou Congresso, unicameral ou bicameral) com base naqueles que estão presentes bastando para assegurar o “quórum” de funcionamento. Todavia, para a aprovação de reformas ou emendas constitucionais, exige-se o voto da maioria, calculando-se esta com relação ao numero legal dos membros que compõe o Corpo.

Maioria Parlamentar Qualificada:

Tem cabimento quando, alem das exigências do “quórum” para cada uma das sessões válidas, se exige a maioria especial de votos calculada sobre o numero legal do Corpo Legislativo, correspondente à maioria superior exigida para a aprovação das leis comuns.

Além das maiorias parlamentares qualificadas, Loewenstein cita outras técnicas especiais:

  1. A adoção da reforma à emenda constitucional em uma sessão comum de ambas as Câmaras do Parlamento constituído.

  2. Outra modalidade de reforma: é aquela disposição segundo a qual uma reforma constitucional deve ser aprovada pelo Parlamento várias vezes em sessões consecutivas. Ou repetidamente dentro da mesma sessão, sendo também possível que se tenha que depender da adoção da emenda de aprovação da correspondente maioria legal, em lugar da constituída pelos membros presentes do Parlamento.

  3. Duas aprovações no mesmo período de sessão. Exige-se uma repetição do ato parlamentar de aprovação da reforma, com espaço de tempo, mas sempre dentro do mesmo período de sessões.

  4. Várias aprovações em períodos consecutivos. Tem a desvantagem de que pode ocasionar uma demora excessiva em circunstancias em que a reforma é necessária e urgente.

  5. Aprovação parlamentar com dissolução do Parlamento e repetida aprovação pelo novo Parlamento. O corpo legislativo aprova as reformas constitucionais, mas depois disso o Parlamento é dissolvido automaticamente e convoca a eleição popular para outro Parlamento que, uma vez reunido, aprova novamente as reformas tratadas pelo anterior.

  6. Aprovação parlamentar ou legislativa, com referendum facultativo. Pode ocorrer que, segundo a previsão constitucional vigente, ao mesmo tempo de realizar-se a reforma, esta mudança se sujeita à sua aprovação por via de referendum, onde se mede: pedido certo de cidadãos ou de certos órgãos do Estado; carência de certa maioria qualificada de votos na aprovação parlamentar.

  7. Referendum obrigatório. Existe na Suíça, Japão, Marrocos e Venezuela.

  8. Participação dos “Estados” ou “Províncias” nos Estados de forma federativa. Os “Estados” tem o poder de ratificação das reformas “introduzidas na Constituição Nacional”.

Por fim, uma passagem escrita por Loewenstein para falar sobre o processo de criação da reforma constitucional:

“... a ideologia do Estado Constitucional democrático exige que a competência para proceder à reforma constitucional não será o monopólio de um único detentor do poder, mas que deve estar a mais distribuída possível. Todos os detentores legítimos do poder – Governo, Parlamento e o Povo, organizados como eleitores devem poder participar na reforma. Através da máxima dispersão desta participação, a reforma constitucional realizada adquire o mais amplo consenso e com ela a mais elevada legitimidade.”

Nesse sentido, foi demonstrado como surge o texto constitucional e como ele é modificado.


Conclusão

Este trabalho nos proporcionou uma visão mais ampla em relação à estrutura do Estado, como este se formou, se organiza, funciona e quais são suas finalidades.

Com base nisso pudemos compreender a complexidade do universo que gira em torno do Poder Constituinte Originário e do Poder de Reforma Constitucional.

Além disso, esse estudo nos tornou capazes de fazer uma análise mais crítica e consistente sobre tudo que diz respeito a estes dois temas.

Concluímos ainda que o Estado é formado por inúmeras pessoas que são diferentes entre si e sua função é estabelecer uma ordem vigente que consiga proporcionar a coexistência pacífica entre os diferentes indivíduos. Ou seja, essa ordem tem que ter uma base forte o suficiente para controlar os desejos e interesses exclusivamente individuais e ao mesmo tempo, proporcionar o bem comum, de forma que os interesses da coletividade prevaleçam.

Através da pesquisa e leituras realizadas pelo grupo compreendemos que o Estado não poderá ser imutável, pois deverá acompanhar as alterações sociais. Dependendo da intensidade das mudanças, as alterações na ordem vigente num determinado Estado poderão ser mais ou menos profundas.


Bibliografia

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007

DEL NEGRI, André L. Controle de Constitucionalidade no Processo Legislativo: teoria da legitimidade democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2003

DE MORAES, Alexandre.  Direito Constitucional.  São Paulo: Saraiva, 19ª ed. 2011

DALLARI, Dalmo de Abreu.  Elementos de Teoria Geral do Estado. 26ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007

DE SOUZA, Espedito Pinheiro. Limites Expressos do Poder Constituinte de Revisão Constitucional. 7ª ed. São Paulo: PUC, 2001



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