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O instituto da filiação na contemporaneidade

O instituto da filiação na contemporaneidade

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Artigo voltado para o estudo do Instituto da Filiação na Contemporaneidade, fazendo incursão na Filiação pré e pós Constituição de 1988, voltando-se para inovações como, a igualdade entre os filhos e a filiação socioafetiva.

Resumo: Neste artigo, é traçado um breve estudo sobre o Instituto da Filiação na contemporaneidade, definindo seu histórico pré e pós Constituição de 1988, dando maior ênfase para o segundo período, com sua definição, o estudo dos seus dois gêneros, Filiação Biológica e Filiação Socioafetiva, passando pelo parentesco, espécies de filiação e, por fim, falando sobre suas formas de reconhecimento, ou seja, reconhecimento voluntário ou o reconhecimento judicial, dando ênfase em todas as fases do estudo, aos aspectos mais contemporâneos relativos à filiação, que representem de algum modo, uma mudança nos paradigmas da sociedade, como a socioafetividade, a possibilidade de filiação entre filhos socioafetivos e pais em união estável, a possibilidade de, além da mulher, o homem se submeter à técnica de inseminação artificial heteróloga, a questão da posse do estado de filho, e também a filiação em relação a casais homoafetivos, tudo à luz da lei e da doutrina.

Palavras-chave: Instituto da Filiação; socioafetividade; união estável; casais homoafetivos; inseminação artificial heteróloga.


1. INTRODUÇÃO

O presente estudo é feito com a intenção de verificar como é na contemporaneidade o Instituto Jurídico da Filiação, iniciando com um breve histórico de tal instituto pré Constituição Federal de 1988, passando a uma análise com maior ênfase no período pós Constituição Federal de 1988, verificando a problemática de como se regulam as relações de filiação hoje conhecidas, e de que forma ou até que ponto o ordenamento jurídico consegue suprir as novas demandas sociais e onde ele ainda é frágil.

Justifica-se, portanto, tal estudo porque a filiação passou por transformações desde seu início, sendo que as mais importantes ocorreram a partir da Constituição Federal de 1988 até o presente momento, surgindo novos vieses na filiação como a questão da garantia constitucional de igualdade entre os filhos, o reconhecimento da filiação socioafetiva, ante a até então filiação biológica ou consanguínea, e as novas espécies de filiação ligadas à socioafetividade, que necessitam de segurança jurídica, o que nem sempre ocorre de forma expressa, mas sim análoga à lei.

Será estudado o Instituto do Parentesco, que tem grande relação com o Instituto da Filiação, em seguida será estudado dentro da filiação, os seus gêneros, biológico e socioafetivo, sendo que desse último se depreenderão espécies, por adoção (heterossexual), adoção homoafetiva, em decorrência da técnica de inseminação artificial heteróloga, posse do estado de filho, adoção à brasileira e aquela consistente no “filho de criação”.

Feita a análise inicial do histórico da filiação, do parentesco, dos gêneros e espécies de Filiação, o estudo se voltará em seu momento derradeiro, para como se dá o vínculo de filiação na prática, ou seja, o ato de reconhecimento da paternidade e da maternidade em relação aos filhos nascidos, através do Reconhecimento Voluntário e do Reconhecimento Judicial, abordando-se também sobre a possibilidade do desfazimento do vínculo de filiação, por parte do filho ou mesmo dos pais, fechando assim, a lógica do estudo sobre o Instituto da Filiação, ao passar por sua origem, desenvolvimento na contemporaneidade e materialização.

Por fim, todo o estudo do presente artigo como já explanado, tem o condão de mostrar como é o Instituto da Filiação na contemporaneidade, de modo que ao seu fim, pretende-se que reste demonstrando o quão importante foi para tal instituto, a previsão de igualdade na filiação constante da Constituição Federal de 1988, bem como o reconhecimento das relações oriundas da socioafetividade, consubstanciados na lei e na doutrina.


2. BREVE HISTÓRICO SOBRE A FILIAÇÃO NO BRASIL PRÉ E PÓS CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

O instituto da filiação é um dos mais importantes no ordenamento jurídico atual, sendo que muito evoluiu desde seu início até o presente momento, podendo se criar duas fases distintas como marcos importantes de tal instituto, ou seja, o período pré Constituição, que será estudado inicialmente, e o período pós Constituição Federal de 1988, que será analisado a posteriori.

Filiação provém, em termos gerais, do latim filiatio, que tem como significado, procedência, laço de parentesco dos filhos com os pais (LÔBO, 2015, p.199).

No Brasil, os primeiros ordenamentos jurídicos vigentes foram as Ordenações Afonsinas, promulgadas por Dom Afonso V e com vigor no Brasil colônia a partir de 1500, Ordenações Manuelinas promulgadas em 1521 por Dom Manuel I e Ordenações Filipinas, promulgadas em 1603 pelo Rei Filipe I da Espanha, vigorando no Brasil até 1916. Foi no período das Ordenações Filipinas que se teve a primeira menção à filiação, sendo inclusive feita a distinção desde aquela época entre a filiação legítima e a filiação ilegítima (FUJITA, 2011, p. 17).

Para melhor compreensão, os filhos ilegítimos constantes das Ordenações Filipinas, classificavam-se em espúrios e naturais (decorrentes de casais solteiros e desimpedidos de casarem-se) como demonstra Jorge Shiguemitsu Fujita:

Os filhos ilegítimos espúrios (incestuosos, adulterinos e sacrílegos) podiam, no máximo, promover ação de investigação de paternidade, visando apenas à obtenção de alimentos, portanto não lhes era reconhecido o direito à sucessão causa mortis. Já para os filhos ilegítimos naturais, embora fosse reconhecida a sucessão testamentária, era proibida a sucessão legítima. Ademais, mesmo entre os filhos ilegítimos naturais, as Ordenações faziam uma diferenciação entre os filhos de pessoas da nobreza e os filhos de pessoas plebeias. (FUJITA, 2011, p. 18).

A proclamação da Independência do Brasil ocorreu em 7 de setembro de 1822 e com ela, criou-se a Assembléia Constituinte que gerou a primeira constituição brasileira em 1824, permanecendo vigentes, contudo, as Ordenações Filipinas, conforme foi determinado pela lei de 20 de outubro de 1823 (FUJITA, 2011, p. 18).

A Constituição Imperial estabeleceu no seu art. 179, n° 13, que a lei seria igual para todos, fosse para proteger ou para castigar, recompensando cada um na proporção de seus merecimentos, todavia, não ficou claro para os juristas da época, se ainda persistiria a distinção entre filhos de nobres e peões (plebeus), o que foi resolvido com o advento da Lei n° 463, de 2 de setembro de 1847, que determinou o fim da diferença jurídica entre filhos de nobres e plebeus para efeitos de sucessão (FUJITA, 2011, p. 19).

Em 1858, foi promulgada a Consolidação das Leis Civis, de Augusto Teixeira de Freitas, importando para o presente estudo, mencionar a distinção entre filhos legítimos e ilegítimos existente, onde eram classificados como filhos naturais aqueles “cujo pai e mãe ao tempo do coito, não tinham entre si parentesco, ou outro impedimento para casarem” e espúrios “os nascidos de pais com impedimentos para se casarem, em virtude de parentesco entre si, ou do estado de casado de um ou de ambos os pais” (FUJITA, 2011, p. 19).

Com a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889, promulgou-se o Decreto n° 181, de 24 de janeiro de 1890, chamado de “Estatuto do Casamento”, sendo importante destacar acerca da filiação, o disposto no art. 7°, § 1°, dizendo que:

Art. 7° - São prohibidos de casar-se:

§1° - Os ascendentes com os descendentes, por parentesco legítimo, civil ou natural ou por afinidade, e os parentes collateraes, paternos ou maternos dentro do segundo gráo civil.

Estabelecia ainda o mencionado Decreto, no art. 8°, parágrafo único, quanto à prova do parentesco que, o legítimo se verificaria de forma notória pela confissão, pelo ato do nascimento dos contraentes ou então, pelo casamento de seus ascendentes.

A filiação legítima, portanto, decorria (entre outros) do casamento dos pais, entendimento firmado também com o advento do Código Civil de 1916 classificando a filiação em quatro espécies: a legítima, a legitimada, a ilegítima e a adotiva (FUJITA, 2011, p. 20).

Concebia-se a filiação legítima com o casamento, fazendo-se prova desta, pela certidão de nascimento ou por qualquer outro meio admitido em direito.

A filiação legitimada era a que resultava do casamento dos pais, estando o filho concebido, ou mesmo depois de havido o filho (art. 353).

Já a filiação ilegítima, não nascia de um casamento, sendo que somente os filhos naturais podiam ser reconhecidos, pelos pais, de forma conjunta ou então separadamente, no próprio temo de nascimento, ou mediante escritura pública, ou por testamento (art. 357).

A Constituição Federal de 1937 teve sua importância, sendo um marco na evolução cultural no Brasil, pois equiparou os filhos naturais e os filhos legítimos (art. 126 CF/37).

O Decreto-lei n° 3.200, de 19 de abril de 1941 estabeleceu no seu art. 14 a proibição de fazer constar em suas certidões de registro civil a circunstância de ser legítima, ou não, a filiação salvo, a pedido do próprio interessado ou em decorrência de determinação judicial (FUJITA, 2011, p.21).

Com o Decreto-lei n° 4.737, de 24 de setembro de 1.942, passou a existir a possibilidade de se reconhecer de forma voluntária ou forçada, os filhos adulterinos após o desquite de seu pai ou de sua mãe.

Em 30 de setembro de 1943 com o Decreto-lei n° 5.860, determinou-se que só seria possível vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, se provado erro ou falsidade de registro (Art. 348).

No ano de 1962, uma lei muito importante promoveu várias alterações no Código Civil de 1916, sendo esta, a Lei n° 4.121, de 27 de agosto do mesmo ano ou o chamado “Estatuto da Mulher Casada”. Vale destacar que o marido era considerado o chefe da sociedade conjugal, com a colaboração da mulher em relação ao interesse comum do casal e dos filhos, conforme art. 233 C.C/16.

Através da Lei n° 4.655, de 2 de junho de 1965, passou-se a reconhecer ao legitimado adotivo, direitos e deveres iguais aos do filho legítimo, exceto nos casos de sucessão, caso concorresse com o filho legítimo superveniente à adoção (art. 9°).

Por fim, a Lei n° 6.515, de 26 de dezembro de 1977 (Lei do Divórcio) permitiu que, por meio de testamento cerrado, fosse reconhecido filho nascido fora do matrimônio, permitiu o direito à herança de filho independentemente da natureza de sua filiação e deu maior proteção aos filhos na separação judicial, destinando a guarda dos mesmos para o cônjuge inocente (FUJITA, 2011, p.24).

Conforme se observa no histórico traçado acerca da filiação no Brasil, até pouco antes do advento da Constituição Federal de 1988, foram feitos avanços no que concerne aos direitos do nascido fora do casamento, porém, ainda fazia-se a distinção entre o filho tido como legítimo do casamento e aquele legitimado a posteriori ou mesmo apenas existente fora do casamento, sem que fosse reconhecido.

Por certo que todo o conceito de sistema patriarcal mencionado na Lei 4.655/65, também os conceitos de filhos legítimos por terem sido havidos no casamento e ilegítimos (bastardos) os havidos fora do matrimônio, são decorrentes da cultura mais conservadora do país, nos períodos em que as mencionadas leis foram formuladas, sendo lógico que, com o passar do tempo, mudanças ocorreriam na cultura do Brasil e, consequentemente, estas disparidades seriam repensadas, sobretudo, a partir da Constituição Federal de 1988.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, uma grande mudança paradigmática ocorre em relação a diversos aspectos do direito, inclusive no instituto da filiação, com a previsão do tratamento igualitário aos filhos, ou seja, nenhum filho pode, a partir de então, sofrer qualquer tipo de preconceito ou discriminação por ter sido concebido de forma diversa do concebido em decorrência da união matrimonial (casamento entre homem e mulher). Não se fala mais à essa altura em filhos espúrios, sacrílegos, adulterinos, incestuosos, etc., mas apenas em filhos, sendo vedada constitucionalmente, qualquer adjetivação preconceituosa em relação a esse.

O Código Civil por outro lado, manteve-se o mesmo de 1916 por mais alguns anos, sendo alterado apenas no ano de 2002, pela Lei 10.406, trazendo também em seus dispositivos, previsões legais acerca da filiação, porém, dispositivos esses criticáveis na conjuntura atual em alguns aspectos, conforme se verá mais a frente.

A Carta Magna de 5 de outubro de 1988, portanto, sedimenta o novo entendimento, de igualdade entre os filhos, quebrando os paradigmas conservadores mais antigos, através do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, insculpido no art. 1º, inciso III, bem como o art. 3º, inciso IV que quebra o paradigma do preconceito quanto à origem (de forma genérica mas que se encaixa à filiação, pondo fim ao famoso filho “bastardo” e demais classificações pejorativas), o art. 5º caput, que estabelece o Princípio da Igualdade de todos perante a lei, e o mais importante dispositivo constitucional no que tange a filiação que é o art. 227 §6º conforme se verá abaixo:

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana; [...]

Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

[...]

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...](Grifos Nossos).

Art. 227 – É dever da família, da sociedade [...]

[...]

§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

A Constituição Federal, na condição de “Carta Magna”, é basilar para o instituto da filiação, possuindo força normativa própria, porém, é importante que se encontre na lei infraconstitucional a reafirmação deste instituto, frisando o Princípio da Igualdade, bem como os demais dispositivos legais específicos de tal instituto, como se verifica no Código Civil, nos capítulos intitulados “Da Filiação” (CC 1.596 a 1.606) e “Do reconhecimento dos filhos” (CC 1.607 a 1617).

Abaixo serão transcritos os dois principais dispositivos legais do Código Civil quanto à filiação, no que concerne às significativas mudanças no seu instituto:

Art. 1.596 – Os filhos havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Art. 1.597 – Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II – nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV – havidos a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentário, decorrentes de concepção artificial homóloga;

V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

O art. 1.596 do Código Civil remete ao chamado “Princípio da Igualdade na Filiação”, que é essencialmente um grande marco no ordenamento jurídico brasileiro pela quebra de paradigma ocorrido, ou seja, não pode mais haver qualquer designação discriminatória relativa à filiação, tornando-a una. Nas palavras de Paulo Lôbo, “É o ponto culminante da longa e penosa evolução por que passou a filiação, ao longo do século XX, na progressiva redução de odiosas desigualdades e discriminações (...)” (LÔBO, 2015, p. 200).

Já o art. 1.597 do Código Civil, insere sob a proteção legal nos incisos III, IV e V, aqueles nascidos em decorrência do uso de técnicas de reprodução assistida, quais sejam a concepção artificial homóloga e inseminação artificial heteróloga, que representam grande mudança de paradigma, deixando para trás a antiquada visão paternalista e religiosa sobre o tema, e trazendo à lume um entendimento mais concatenado com as mudanças culturais e tecnológicas sofridas ao longo do tempo.

A este ponto, vale expor o que entende na atual conjuntura a doutrina quanto ao conceito de filiação, a partir dos novos pressupostos legais que foram acima expostos, iniciando pelo entendimento de Paulo Lôbo:

Filiação é a relação de parentesco que se estabelece entre duas pessoas, uma das quais nascida da outra, ou adotada, ou vinculada mediante posse de estado de filiação ou por concepção derivada de inseminação artificial heteróloga (LÔBO, 2015, p. 199).

Ana Cláudia Silva Scalquette define filiação como:

[...] a relação de parentesco em linha reta de primeiro grau que se estabelece entre pais e filhos, seja essa relação decorrente de vínculo sanguíneo ou de outra origem legal, como no caso de adoção ou reprodução assistida com utilização de material genético de pessoa estranha ao casal. (SCALQUETTE, 2014, p. 86).

Maria Helena Diniz entende que, “filiação é um conceito relacional: é a relação de parentesco que se estabelece entre duas pessoas e que atribui reciprocamente direitos e deveres.” (DINIZ, 2011, p. 478).

Jorge Shiguemitsu Fujita entende que:

Filiação é, no nosso entender, o vínculo que se estabelece entre pais e filhos, decorrente da fecundação natural ou da técnica de reprodução assistida homóloga (sêmen do marido ou do companheiro; óvulo da mulher ou da companheira) ou heteróloga (sêmen de outro homem, porém com o consentimento do esposo ou companheiro; ou o óvulo de outra mulher, com a anuência da esposa ou companheira), assim como em virtude da adoção ou de uma relação socioafetiva resultante da posse do estado de filho. (FUJITA, 2011, p. 9 ).

Observando os diferentes conceitos doutrinários transcritos acima, conclui-se que, tem em comum todos eles, o fato de mencionar, uns de forma bem clara outros de forma intrínseca, a existência de uma filiação biológica e outra filiação socioafetiva, esta última, representando inovação no instituto da filiação a partir da concepção da Constituição Federal e demais leis infraconstitucionais que, estabelecem de algum modo a filiação socioafetiva, bem como a própria doutrina, conforme visto, de modo que pretendem com isso, declarar que se deve admitir sem nenhum tipo de discriminação, como já visto na “Carta Magna” ambas as modalidades de filiação citadas, a depender de cada caso.

Outro aspecto a se ressaltar é a figura do parentesco, que aparece como sendo vinculado ao gênero filiação de acordo com os entendimentos doutrinários transcritos anteriormente acerca desse, logo, importante se verificar a seguir como é entendido este instituto no ordenamento jurídico contemporâneo, verificando seus conceitos doutrinários, espécies e de que maneira ele é importante na formação do vínculo de filiação.

2.1. PARENTESCO

O parentesco, abrangido dentro dos entendimentos doutrinários acerca da filiação antes da C.F de 1988, era classificado em parentesco legítimo e ilegítimo, sendo legítimo aquele originado na família constituída pelo casamento e ilegítimo aquele originado fora do casamento (LÔBO, 2015, p. 190).

No ordenamento jurídico atual, o instituto do parentesco encontra-se insculpido no Código Civil, entre os art. 1591 até o art. 1595 valendo destacar o que dispõe o art. 1.593 CC que diz, “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”, ou seja, ao estabelecer “outra origem” para além da consanguinidade, se está abrindo margem para o que chama-se de filiação socioafetiva, ou filiação decorrente dos laços de afetividade, que representa uma inovação no instituto da filiação e será melhor estudado oportunamente.

É o parentesco nas palavras de Paulo Lôbo, “a relação jurídica estabelecida pela lei ou por decisão judicial entre uma pessoa e as demais que integram o grupo familiar.” (LÔBO, 2015, p. 190).

Nota-se que, para além dos casos onde já exista a presunção da relação de parentesco, há a possibilidade de se concedê-la via judicial. Prossegue Paulo Lôbo dizendo que, “Para além do direito, o parentesco funda-se em sentimentos de pertencimento a determinado grupo familiar, em valores e costumes cultuados pela sociedade, independentemente do que se considere tal.” (LÔBO, 2015, p. 190).

Ana Cláudia Silva Scalquette, também apresenta um conceito do que seja parentesco:

As relações de parentesco são estabelecidas entre ascendentes e descendentes, entre pessoas que provém de um mesmo tronco comum sem descenderem umas das outras - como é o caso dos colaterais -, entre um cônjuge ou companheiro e os parentes do outro- ao que se conhece por vínculo de afinidade-, por vínculo civil- no caso de adoção – ou por outra origem, a exemplo do que se tem na filiação decorrente de reprodução assistida em que é utilizado material genético de terceiro. (SCALQUETTE, 2014, p. 80).

Maria Berenice Dias também define parentesco, dizendo que “As relações de parentesco são identificadas como vínculos decorrentes da consanguinidade e da afinidade, ligando as pessoas a determinado grupo familiar” (DIAS, 2013, p. 350).

Segue dizendo em outro trecho de sua obra que, “Ocorreu verdadeira desbiologização da paternidade-maternidade-filiação e, consequentemente, do parentesco em geral.” (DIAS, 2013, p. 351).

Cézar Fiuza define o parentesco como, “(...) relações entre certas pessoas pertencentes a um mesmo grupo familiar.” (FIUZA, 2009, p. 977).

A classificação que se dá ao instituto do parentesco se extrai do art.1.593 do CC, quais sejam, parentesco natural ou consanguíneo, por afinidade, civil e outra origem. Neste estudo, será utilizada a definição de cada espécie de parentesco, de acordo com o que preleciona Ana Cláudia Silva Scalquette, por acompanhar o que disposto no texto legal (classificação):

  • Parentesco Natural ou Consanguíneo, “é o vínculo estabelecido entre pessoas que descendem de um mesmo tronco (tronco comum) e, dessa forma, estão ligadas pelo mesmo cônjuge” (SCALQUETTE, 2014, p. 80) (ex: irmãos);

  • Parentesco Por Afinidade (afim), “é o que liga uma pessoa aos parentes de seu cônjuge ou companheiro, isto é, aquele decorrente do casamento ou da união estável, conforme previsto em lei (art. 1.595, CC)” (SCALQUETTE, 2014, p.80) (ex: nora, genro, sogros);

  • Parentesco Civil, “é o parentesco decorrente da adoção, estabelecido entre o adotante e o adotado, estendido a seus parentes” (SCALQUETTE, 2014, p. 81) (filhos adotivos);

  • Parentesco por Outra Origem, “pode-se entender como “outra origem” a inseminação ou fertilização artificial com doador – hipótese trazida pelo art. 1.597 (...)” (SCALQUETTE, 2014, p.81) (ex: nascido da inseminação artificial heteróloga).

A classificação que se dá ao parentesco não se restringe à forma disposta na lei, podendo variar a depender do doutrinador, neste sentido, traz-se como exemplo as classificações de Maria Berenice Dias, que classifica o parentesco como, natural e civil, biológico ou consanguíneo, linha reta e linha colateral (DIAS, 2013, p. 351) e Paulo Lôbo, que classifica o parentesco em natural, civil e por afinidade (LÔBO, 2015, p. 191).

Maria Berenice Dias fala a respeito do parentesco, que o ordenamento jurídico passou por um processo de “desbiologização da parentalidade, impondo o reconhecimento de outros vínculos de parentesco” (DIAS, 2013, p. 352). Portanto, o parentesco não se liga apenas aos vínculos biológicos, mas também àqueles originados por outros meios como, adoção ou métodos de reprodução assistida, ao exemplo da inseminação artificial heteróloga, onde um terceiro doa o sêmen que será fecundado na mulher com prévia autorização do marido (conceito à luz da letra de lei, sem considerar ainda, outros entendimentos sobre o gênero do doador).

Paulo Lôbo, segue a mesma linha de pensamento da Maria Berenice Dias, ao dizer que “Dentre as espécies de parentesco não biológico, além da afinidade, situam-se a adoção, a posse de estado de filiação e o derivado de inseminação heteróloga” (LÔBO, 2015, p. 191).

Conclui-se a esta altura, portanto, que o parentesco está intimamente ligado a filiação e, que o vínculo de consanguinidade não é condição sine qua non para formá-lo, sendo possível, o parentesco decorrente da adoção, inseminação artificial heteróloga, por afinidade, entre outros, que nada mais são do que o reflexo do processo de mudança pela qual a sociedade passa todo o tempo, onde o direito deve acompanhar essas mudanças, para evitar deixar à margem da legalidade aquele que no direito buscar refúgio. Com isso, pode-se dizer que relevante mudança no instituto da filiação, foi a filiação socioafetiva, que deu maior segurança jurídica para aqueles que estabelecem relação de parentesco, de filiação, porém, sem vínculo sanguíneo, conforme se estudará a seguir.


3. FILIAÇÃO BIOLÓGICA E FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA

Para o melhor entendimento quanto à filiação biológica e a filiação socioafetiva, sobretudo dentro do que determina o atual ordenamento jurídico (sem levar ainda em conta os entendimentos mais contemporâneos de doutrinadores) importante definir o que é “pai”.

Na biologia “pai é unicamente quem, em uma relação sexual, fecunda uma mulher que, levando a gestação a termo, dá à luz um filho.” (DIAS, 2013, p. 360).

A definição descrita acima parece um tanto ultrapassada, exceto pelo fato de que é científica (no sentido biológico) logo, não deve mesmo ter uma conotação diferente da apresentada.

Para o direito, por outro lado, a figura do pai não se restringe como já estudado, ao ascendente biológico, podendo ser também pai, aquele que a lei determinar nos casos de adoção ou inseminação artificial heteróloga (art.1.593 e art.1.597, inc.v CC).

Ante o exposto, pode-se avançar para a filiação biológica e a socioafetiva, iniciando pela primeira, com a definição de Caio Mário:

É um fenômeno excepcionalmente complexo. Antes de tudo biológico, é examinado pelos cientistas como forma de perpetuação das espécies; é um fenômeno fisiológico, um objeto de indagações sociológicas e históricas, um capítulo da Higiene e da Eugenia. Pertence ao mundo físico e ao mundo moral (Dusi), exprime simplesmente o fato do nascimento e a situação de ser filho, e, num desenvolvimento semântico dentro da Ética, traduz um vínculo jurídico. Compreende simultaneamente o fato concreto da procriação e uma relação de direito. (PEREIRA, 2006, p.1).

Maria Berenice Dias, entende que a filiação biológica, é aquela que decorre da “verdade biológica” (DIAS, 2013, p. 360), sendo considerado “pai” o ascendente biológico do indivíduo, gerando-se o que Maria Berenice Dias critica chamando de “paternidade jurídica.” (DIAS, 2013, p. 360).

Jorge Shiguemitsu Fujita diz que, “Filiação biológica ou natural é a relação que se estabelece, por laços de sangue, entre uma pessoa e seu descendente em linha reta do primeiro grau.” (FUJITA, 2011, p. 63).

Pode-se classificar a filiação biológica, como resultante da reprodução humana “natural ou carnal” e resultante das técnicas de reprodução assistida, conforme preleciona Jorge Shiguemitsu Fujita:

A filiação resultante da reprodução humana natural ou carnal é aquela que envolve uma relação sexual entre um homem e uma mulher com a consequente concepção, pouco importando a sua origem: se ocorreu dentro do matrimônio ou fora do matrimônio, ou entre noivos ou namorados, ou entre meros “ficantes” (termo contemporaneamente utilizado que significa aqueles que, ocasional e descompromissadamente, decidiram ter momentos de intimidade sexual), dos quais resultaram a gravidez e o consequente nascimento de uma criança.

Já a filiação oriunda da reprodução assistida não tem como base a cópula carnal, mas sim, um “conjunto de técnicas que têm como fim provocar a gestação mediante a substituição ou facilitação de alguma etapa que se mostre deficiente no processo reprodutivo”.( FUJITA, 2011, p.63).

O problema da filiação biológica ocorre no momento em que se deixa a “verdade real” (DIAS, 2013, p. 360) de lado, para dar mais importância à “verdade biológica”, como verifica-se nos muitos casos do cotidiano forense onde busca-se a legitimação da paternidade socioafetiva em detrimento de uma paternidade “fictícia”, existente apenas biologicamente. Isso se deve à presunção da paternidade, que ocorre nos casos insculpidos no Código Civil art. 1.597, incisos I e II in verbis:

Art. 1.597 Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II – nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

No caso do inciso I, o prazo conta-se a partir do “efetivo início da convivência entre cônjuges e companheiros.” (LÔBO, 2015, p.202).

Para além das presunções de paternidade constantes do artigo legal supra, Paulo Lôbo menciona em seus escritos, outras modalidades:

  • a) a presunção pater is est quem nuptiademonstrant, impedindo que se discuta a origem da filiação se o marido da mãe não a negar;

  • b) a presunção matersemper certa est, impedindo a investigação de maternidade contra mulher casada. A maternidade manifesta-se por sinais físicos inequívocos, que são a gravidez e o parto, malgrado a manipulação genética se tenha encarregado de pôr dúvidas quanto à origem biológica;

  • c) a presunção de paternidade atribuída ao que teve relações sexuais com a mãe, no período da concepção;

  • d) a presunção de exceptio plurium concubentium, que se opõe à presunção anterior, quando a mãe tiver relações com mais de um homem no período provável da concepção; (LÔBO, 2015, p. 202).

A presunção de paternidade representa um mecanismo jurídico que visa “proteger” e dar “estabilidade” ao instituto da família, com seu sistema legal “especial” para tal fim (DIAS, 2013, p. 360) como visto no dispositivo legal exposto acima.

Para a lei, “pai é o marido da mãe”, independentemente da verdade biológica do indivíduo, o que em tese, dirime a incerteza do marido em relação aos filhos de sua esposa. A esta presunção dá-se o nome de pater is est, e não se estende para os casos de união estável, fixando-se nas filiações em decorrência das relações entre pessoas legalmente casadas, ao que se pode chamar de “filiação matrimonial.” (DIAS, 2013, p. 366).

Para os casos de filiação em decorrência de inseminação artificial heteróloga, a paternidade é presumida com base na verdade afetiva, ou seja, neste caso se tem a certeza de que não é possível a paternidade ser biológica devido ao procedimento utilizado para a concepção, não havendo oposição por parte do marido, não há que se falar em presunção da paternidade “acreditando ser este o pai biológico”(DIAS, 2013, p. 369), mas sim, como explicado acima, presume-se pai, pela verdade afetiva que quer dizer, o ato de o marido aceitar a paternidade do indivíduo concebido (art. 1.597, inc.v CC).

A filiação biológica era exclusiva, incorporando-se a filiação socioafetiva no ordenamento jurídico de forma gradativa, como se observa nos escritos de Paulo Lôbo:

Sob o ponto de vista do direito brasileiro, a filiação é biológica e não biológica Por ser uma construção cultural, resultante da convivência familiar e da afetividade, o direito a considera como um fenômeno socioafetivo, incluindo a de origem biológica, que antes detinha a exclusividade. (LÔBO, 2015, p. 199).

Neste sentido, vale destacar o entendimento que Valter Kenji Ishida estabelece acerca da filiação biológica e filiação socioafetiva:

Duas teses se digladiam no cenário do direito de família: a primeira, tradicional, defende o vínculo biológico ou a chamada herança genética. A segunda, mais moderna, lastreia o vínculo da paternidade na convivência diária, ou seja, na denominada afetividade. (ISHIDA, 2015, p. 78).

Entendemos que, atualmente, deva-se reconhecer a possibilidade do vínculo socioafetivo, mas com base principalmente no melhor interesse da criança e do adolescente e com cuidados de exame profundo da situação fática oferecida, evitando-se favorecer interesses oportunistas ou de má-fé como é mencionado no REsp 119.346-GO. (ISHIDA, 2015, p. 79).

Apesar desse autor referir sobre a filiação biológica e a socioafetiva sob uma ótica voltada para a criança e o adolescente, com menção à importante tendência moderna no ordenamento jurídico brasileiro que é priorizar o melhor interesse da criança acima de tudo (no que tange à proteção de seus direitos) pode-se interpretar tal entendimento de forma extensiva ao indivíduo já adulto, que objetive definir sua filiação, seja biológica ou socioafetiva, respeitado seu melhor interesse, desde que não seja um interesse escuso,mas legítimo.

Agora, em relação à filiação socioafetiva, essa é definida por Jorge Shiguemitsu Fujita como:

Aquela consistente na relação entre pai e filho, ou entre mãe e filho, ou entre pais e filho, em que inexiste liame de ordem sanguínea entre eles, havendo, porém, o afeto como elemento aglutinador, tal como uma sólida argamassa a uni-los em suas relações , quer de ordem pessoal, quer de ordem patrimonial. (FUJITA, 2011, p. 71).

Jorge Shiguemitsu Fujita transcreve o entendimento de outro autor, chamado Rolf Madaleno, onde diz que a “filiação socioafetiva é a real paternidade do afeto e da solidariedade; são gestos de amor que registraram a colidência de interesse entre o filho registral e o seu pai de afeto” (FUJITA, 2011, p. 71).

No ordenamento jurídico atual, prevalece a filiação socioafetiva sobre a filiação biológica, como por exemplo, no caso da inseminação artificial heteróloga ou então na adoção, onde a presunção se dá pela afetividade.

Maria Berenice Dias diz que:

A filiação socioafetiva corresponde à verdade aparente e decorre do direito à filiação. A consagração da afetividade como direito fundamental subtrai a resistência em admitir a igualdade entre a filiação biológica e a socioafetiva. A necessidade de manter a estabilidade da família faz com que se atribua um papel secundário à verdade biológica. (DIAS, 2013, p. 381).

Conclui-se a esse ponto, que a filiação socioafetiva ganhou grande relevo no ordenamento jurídico brasileiro, dentro do instituto da filiação, de modo que veio garantir legalmente (por meio dos dispositivos legai estudados) que pais e filhos, que tenham uma ligação que supera aquela relativa à consanguínea (que desenvolvam um vínculo afetivo muito consistente a ponto de considerarem-se pais e filhos reciprocamente) possam ser formalmente considerados como tal, ainda que existentes os pais biológicos.

3.1. ESPÉCIES DE FILIAÇÃO

Necessário se faz, agora que já se consegue diferenciar os gêneros “filiação biológica” e “filiação socioafetiva”, conhecer as espécies de filiação, onde se iniciará a verificação de como é efetivamente que se dá a filiação na conjuntura contemporânea, seja de acordo com o texto da lei ou então com outros dispositivos e a doutrina, auxiliando na analogia para a aplicação da lei no caso concreto.

A primeira espécie de filiação é a biológica, que já foi estudada a pouco e não sofre desdobramentos, porque é objetivamente ligada à consanguinidade, onde pai e mãe são os ascendentes biológicos do filho. Portanto, as espécies de filiação que serão estudadas a seguir, serão as relacionadas à filiação socioafetiva, porque essas sim desdobram-se em espécies.

Para tanto, será utilizada a classificação prelecionada por Jorge Shiguemitsu Fujita, que traz de forma pertinente algumas espécies de filiação socioafetiva classificando-as, por adoção, adoção homoafetiva, técnica de reprodução heteróloga, posse do estado de filho, adoção à brasileira e aquela consistente no “filho de criação”.

Iniciando pela filiação por adoção, tem-se uma ou mais pessoas, maiores ou menores, capazes ou incapazes, ingressando em determinada família adotante, sem que necessariamente exista uma relação de parentesco consanguíneo ou por afinidade entre estes, sendo que desfrutam ainda, de todos os direitos e deveres inerentes à filiação (FUJITA, 211, p. 72).

Trata-se do instituto da adoção, que é uma das formas previstas onde se estabelece o que se chama como gênero de filiação socioafetiva, onde deverão ser cumpridos alguns requisitos formais da adoção, para que com o tempo se possa determinar se o adotando está ambientado e desenvolvendo uma boa relação socioafetiva com seus adotantes.

A adoção pode ocorrer bilateralmente, quando se tem um casal adotando determinado indivíduo, ou então unilateralmente, quando apenas uma pessoa é que está buscando habilitar-se como pai ou mãe do adotando, podendo ser esta pessoa (adotante) solteiro(a) ou então casado(a) (mesmo que em união estável) com o pai ou mãe biológico do adotando.

Um exemplo se dá quando determinada mulher até então solteira, submete-se a um procedimento de reprodução assistida, na modalidade inseminação artificial heteróloga, onde um terceiro doador desconhecido doa o sêmen para que seja fecundado e, posteriormente, esta vem a conhecer uma pessoa com a qual pretende se casar, ensejando então que o futuro cônjuge ingresse com uma ação de adoção unilateral, para ser considerado pai do filho biológico de sua futura esposa.

Nesse exemplo, existe uma relação de parentesco consanguíneo do nascido com sua mãe, com o terceiro doador anônimo que, nesse caso não terá qualquer relação com o nascido (apesar de ser biologicamente seu progenitor) e por fim, uma relação de parentesco por socioafetividade (filiação socioafetiva) com o pai socioafetivo (marido da mãe biológica).

Na Filiação pela adoção homoafetiva (por singular ou por casal) existe a possibilidade de que uma pessoa homossexual ou casal homoafetivo tenha acesso à adoção, da mesma forma que teriam os heterossexuais.

Neste sentido, Jorge Shiguemitsu Fujita diz:

No plano singular, prevalece a possibilidade, embora contestada de adoção por parte de um pretendente homossexual, tendo em vista o direito constitucional à liberdade, incluindo a de opção sexual, assim como a exigência de que a adoção constitua um efetivo benefício para o adotando (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 43).(FUJITA, 2011, p. 74).

A polêmica se estabelece quando se fala na adoção pretendida por um casal homossexual, haja vista o disposto no § 2º, do art. 42, do Estatuto da Criança e do adolescente, que preceitua que, para a adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. Portanto, a lei civil não preconiza, de modo expresso, a sua aquiescência relativamente a parceiros do mesmo sexo pretendentes à adoção. (FUJITA, 2011, p. 74).

Nesse tipo de filiação, importante salientar que, pelo fato de ser ainda um tema polêmico e novo no Brasil, existem correntes de doutrinadores que se posicionam a favor e contra a adoção homoafetiva.

Os que se opõe à ideia alegam, entre outras coisas, que a criança tem que ter a referência de um pai (homem) e uma mãe (mulher) enquanto os que apoiam a adoção homoafetiva, defendem que o rol de entidades familiares elencadas no art. 226, § 3º da Constituição Federal é meramente exemplificativo, o que permitiria a inclusão de qualquer outra entidade tida por muitos como familiar, incluído a filiação homoafetiva. (FUJITA, 2011, p. 74).

Independente das discordâncias existentes no mundo jurídico sobre o tema, a jurisprudência tem sido majoritária no entendimento favorável à concessão do direito de adoção para o homossexual ou casal homoafetivo, pautado pelo melhor interesse da criança, a existência de um vínculo afetivo saudável entre adotante e adotado, além de um contexto vantajoso para ambas as partes.

Outra modalidade de Filiação é aquela consequente da técnica de reprodução assistida heteróloga, prevista no Código Civil art. 1.596, inciso V, que fala sobre a presunção de serem concebidos na constância do casamento os filhos havidos por técnica de reprodução assistida por doador ou heteróloga, com autorização prévia do marido, requisito sine qua non para a validade do ato quando oriundo de casal.

Jorge Shiguemitsu Fujita diz a esse respeito:

O Código Civil de 2002 oferece, em seu art. 1.596, inciso V, a presunção de serem concebidos na constância do casamento os filhos havidos por técnica de reprodução assistida por doador ou heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Serão filhos matrimoniais aqueles resultantes de técnica de reprodução assistida envolvendo o óvulo do cônjuge virago e o sêmen de terceiro, desde que tenha havido a priori a autorização do cônjuge varão, o qual não precisa ser, necessariamente, estéril, ou que não tenha a possibilidade de procriar, “por qualquer razão física ou psíquica”. (FUJITA, 2011, p. 76).

Como se observa no excerto acima, o autor fala em “filhos matrimoniais”, ou seja, aqueles que têm relação de filiação com o casal, apesar de terem origem na reprodução heteróloga envolvendo um terceiro, que neste caso, não terá nenhuma relação com o nascido por essa técnica senão a de mero “dador” ou “doador”.

Difere-se da inseminação artificial homóloga, prevista no art. 1597, inciso III do Código Civil, onde o material genético (gameta) manipulado na inseminação é do próprio marido, não se exigindo o cumprimento de qualquer formalidade de consentimento por parte deste.

Existem outras relações na realidade social, que ultrapassam os dispositivos sobre o tema no Código Civil, ensejando que se faça uma equiparação por analogia dos mencionados dispositivos para atender a essas relações diversas que surgem, como por exemplo, nas relações de união estável e na relação homoafetiva.

Um grande problema sobre esse tema é que não existe uma lei específica que regule a Reprodução Assistida no Brasil, senão um apanhado principiológico, um dispositivo legal no Código Civil (art. 1596, V) e a Resolução 2.121/2015 do Conselho Federal de Medicina que, apesar de não se tratar de lei, regula atualmente a reprodução assistida e é utilizada como parâmetro para definir algumas peculiaridades sobre a inseminação artificial heteróloga, como por exemplo, a questão do anonimato do doador do gameta, que apesar de ser biologicamente o progenitor do nascido, não tem qualquer relação de paternidade com este, ou então em relação à quebra de paradigma, ao estabelecer que qualquer pessoa pode submeter-se ao procedimento de inseminação artificial heteróloga, ou seja, é possível que um homem casado ceda seu gameta para ser introduzido em um óvulo de uma terceira doadora anônima também, o que representa um grande avanço vez que não se limita à atual letra de lei.

Portanto, nos casos mencionados (que ultrapassam o art.1596, V, C.C.) de união estável, união homoafetiva ou qualquer nova relação que venha a surgir na sociedade, onde uma das partes (pai ou mãe biológico) se submeta a inseminação artificial heteróloga, se faz necessário para seu cônjuge (que não tem ligação biológica com o nascido) buscar eventual direito de filiação com o nascido na justiça, através de uma ação de adoção unilateral (segundo o que se extrai de consultas jurisprudenciais) onde caberá ao juiz analisar um conjunto de fatores para deferir ou não o reconhecimento do(a) requerente como pai ou mãe do nascido.

Na filiação decorrente da inseminação artificial heteróloga, o nascido pode requerer na justiça o direito de ter acesso à sua origem genética, para fins de conhecer sua herança genética, prevenindo assim algumas doenças ou até as tratando, ou mesmo para saber quem é seu progenitor ou progenitora, com a finalidade de conhecer sua “identidade”, ligada ao direito de personalidade do indivíduo (art. 12 C.C.).

A filiação pode ocorrer também pela chamada “posse de estado de filho” ou “posse de estado de filiação”, que está diretamente ligada à filiação socioafetiva, visto que se trata daquela onde existe comprovadamente um vínculo afetivo, amoroso e duradouro entre as partes (paterno-filial ou materno-filial) bem como, reputação ou fama na qualidade de filho perante terceiros (FUJITA, 2011, p. 78).

Nessa espécie de filiação, uma vez que está consolidada, só é possível revertê-la nos casos de vício, dolo ou coação, conforme disposto no art. 1.609 do Código Civil, ou seja, esse vínculo de filiação socioafetiva é tão forte que se sobrepõe por vezes à filiação biológica, como por exemplo, em um caso onde determinado menor seja adotado por um casal e, alguns anos mais tarde seus pais biológicos busquem na justiça reaver para si o estado de “pais” desse menor. Muito provavelmente (claro que no direito sempre é possível haver surpresas por conta do princípio do livre convencimento do juiz) a decisão do juiz será no sentido de manter a relação de filiação socioafetiva e afastar a possibilidade de filiação com os pais biológicos.

A filiação chamada “à brasileira” ou “adoção à brasileira”, consiste no reconhecimento registral sem respaldo legal algum, de estado de “filho” em relação a determinado “pai”, “mãe” ou ambos, de modo que esta relação “inexiste” a princípio para o direito, ocorrendo apenas de fato.

Trata-se, portanto, de procedimento irregular, conforme assevera Jorge Shiguemitsu Fujita:

Consiste no reconhecimento registral de determinada pessoa como sendo filho de outros que não se traduzem como seus pais biológicos, sem obedecer aos trâmites legais, caracterizando um procedimento irregular, tipificado de crime de parto suposto, constante no art. 242, do Código Penal. (FUJITA, 2011, p. 79).

Apesar da irregularidade do ato registral desta “filiação à brasileira”, a jurisprudência, a depender do caso concreto, garante àquele que tenha desenvolvido laço socioafetivo com seu “pai”, “mãe” ou ambos, a condição de “filho”, não bastando o vínculo biológico para distrato da relação de filiação entre filho e pais socioafetivos, por mera liberalidade.

Nesse sentido, o art. 1604 do Código Civil dispõe que não se pode "vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro".

Interessante também observar que uma das possibilidades de desfazimento do vínculo socioafetivo entre “filho(a)” e “pais” pode ocorrer quando da maioridade do até então menor que tenha vivido sob a modalidade de filiação socioafetiva, pela inafastabilidade de seu direito em buscar sua origem genética, mesmo que a filiação tenha decorrido de uma adoção regular por exemplo (art. 27 e art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA).

Tal prática ainda ocorre no Brasil, porém, o rigor em relação a essas relações não reconhecidas (a princípio) pelo direito tem aumentado, sobretudo por conta de casos onde pessoas de outros países vem para o Brasil e literalmente compram crianças de famílias carentes, registrando-as como sendo seus filhos e levando-as para o exterior. O problema é que não se sabe o que ocorre com essas crianças depois que saem do Brasil, podendo de fato serem simplesmente criados no exterior como filhos, ou então serem objeto de fins mais nefastos como o tráfico de órgãos, violência de todo gênero incluindo a sexual, etc.

Por fim, tem-se a chamada “filiação consistente no filho de criação”, que se refere àqueles indivíduos que mantém, educam e amam sem vínculo biológico de paternidade ou maternidade, determinadas pessoas como se filhos fossem sem, contudo, proceder com a adoção desses, apenas mantendo a guarda.

Jorge Shiguemitsu Fujita diz a esse respeito que:

Os denominados “filhos de criação” são os que, embora pertencentes a outrem, são sustentados, educados , amados e providos por casais que os consideram como filhos próprios, embora apenas se encontrem sob a guarda, e não sob o amparo de uma adoção. (FUJITA, 2011, p. 81).

Trata-se de uma adoção informal ou de fato, não podendo, para alguns, ser considerados filhos adotivos, por não haver amparo legal, inexistindo equiparação aos filhos biológicos, para os devidos efeitos jurídicos. (FUJITA, 2011, p. 81).

Verificou-se, portanto, as espécies de filiação que predominam no instituto da filiação atualmente, sendo que vale destacar que a filiação socioafetiva por vezes pode predominar em relação à filiação biológica, sendo que depois de feito o reconhecimento voluntário da paternidade/maternidade do filho socioafetivo, apenas se comprovado erro, dolo, coação, falsidade do registro, ou a posteriori, quando da maioridade do filho socioafetivo, é que se poderá desconstituir tal relação. (art. 1604 e 1609 Código Civil; art. 27 e art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente).

O reconhecimento voluntário a propósito, é um tema que será estudado a seguir, porque diz respeito às formas de reconhecimento dos pais em relação aos filhos, o que se aplica tanto na filiação biológica como também na filiação socioafetiva.

Destaca-se para o presente artigo a esse ponto, as espécies de filiação que tem maior ligação com a atual conjuntura social e cultural pela qual o país passa, ou seja, aquelas espécies que se conformam com o gênero filiação socioafetiva, como é o caso da filiação por adoção, que é diretamente voltada para a relação de socioafetividade, ao passo que traz para si também questões ligadas à mudança cultural como a adoção unilateral por parte de casal homoafetivo por exemplo.

Outra espécie que merece destaque para esse estudo é a filiação decorrente da posse de estado de filho, que também conjuga-se dentro da filiação socioafetiva, por se tratar de reconhecimento de vínculo de filiação entre aquele(a) filho(a) que manteve uma relação de aparente filiação com um “pai”, “mãe” ou ambos, de modo socioafetivo, ensejando que tal relação, apesar de não prevista ainda na lei de forma específica seja reconhecida.

Por fim, merece destaque a filiação decorrente da inseminação artificial heteróloga, que também liga-se diretamente com a filiação socioafetiva em relação ao nascido e o pai o mãe socioafetivos que assumem esse estado de filiação ao concordar que o cônjuge se submeta ao procedimento de inseminação que utilizará o material genético desse com o de um terceiro(a) doador(a) de sêmen ou mesmo óvulo para tal procedimento. Inova no sentido de que a lei prevê tal procedimento apenas para a mulher sendo que o marido é quem concorda com o procedimento, sendo portanto, pai sociafetivo, ao passo que na prática, conforma-se o texto legal em conjunto com a Resolução 2.121/2015 para estender tal vínculo aos casos onde o marido será o pai biológico e a sua esposa é que será a mãe socioafetiva, bem como para casos onde haja união estável ou união homoafetiva.

3.2 RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO E JUDICIAL NA FILIAÇÃO

Compreendido o que seja filiação, seus gêneros e suas espécies, agora se estudará as formas de reconhecimento do vínculo de filiação, que são duas, Reconhecimento Voluntário e Reconhecimento Judicial.

O Reconhecimento voluntário, como o próprio termo leva a concluir, é aquele onde o pai, a mãe ou ambos, de forma livre e de espontânea vontade, reconhecem sua condição de pais de determinado indivíduo, podendo este, ser menor ou mesmo maior de idade.

Tal reconhecimento é obrigatório apesar de pressupor-se ser também voluntário, e está disciplinado no art. 52 da Lei n° 6.015/1973 – Lei dos Registros Públicos in verbis:

Art. 52. São obrigados a fazer declaração de nascimento:

1º) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto, observado o disposto no § 2º do art. 54; (Redação dada pela Lei nº 13.112, de 2015)

2º) no caso de falta ou de impedimento de um dos indicados no item 1º, outro indicado, que terá o prazo para declaração prorrogado por 45 (quarenta e cinco) dias; (Redação dada pela Lei nº 13.112, de 2015)

3º) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior achando-se presente;

4º) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior os administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido o parto;

5º) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe;

§ 1° Quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à casa do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do médico ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas pessoas que não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido.

§ 2º Tratando-se de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de dúvida, poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para esclarecimento do fato.

Observa-se que existem outras previsões, na falta da possibilidade de pai e mãe procederem com o reconhecimento, atribui-se a um parente maior de idade mais próximo essa tarefa de reconhecimento do nascido, sendo que subsidiariamente essa competência vai passando para outras pessoas, administradores do hospital, médicos e parteiras que tiverem assistido ao parto e pessoa idônea da casa em que ocorrer o nascimento fora da residência da mãe.

Os parágrafos 1° e 2° ainda estabelecem situações onde existam dúvidas quanto a declaração de nascimento por parte do oficial de registro, podendo ir à casa do recém nascido auferir in loco os fatos, ou mesmo requerer ao juiz nos casos de declaração que extrapole o prazo legal, providências para que se esclareçam os fatos.

Paulo Lôbo diz que “O reconhecimento voluntário é ato livre, pessoal, irrevogável e de eficácia erga omnes” (LÔBO, 2015, p. 232) e que o ato de reconhecimento, no direito contemporâneo, “além de personalíssimo, apresenta as características de voluntariedade, irrevogabilidade, incondicionalidade” (LÔBO, 2015, p. 232).

Ainda em relação ao reconhecimento voluntário, uma vez que seja feito, dele não se pode vindicar, como dispõe o art. 1604 do Código Civil que diz, “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”.

Nesse sentido diz ainda Maria Berenice Dias, “o registro faz público o nascimento, tornando-o incontestável” (DIAS, 2013, p. 373).

O reconhecimento voluntário, portanto, só é possível quando não há ainda registro de pai, mãe ou ambos em relação ao filho, se houver por algum motivo dois registros de filiação da criança, prevalecerá o primeiro em detrimento do segundo e, é assegurado ao filho no caso de omissão dos pais no seu registro, a ação de prova de filiação, conforme estabelece o artigo 1.606 do Código Civil, que não pode ser confundido com o reconhecimento forçado, sequer com a investigação de paternidade, in verbis:

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo.

Na relação de casamento (diferente de um casal não casado que reconhece o filho) não há que se falar em reconhecimento, porque presume-se com certeza a maternidade da mulher que concebeu a criança e ocorre a presunção pater is est , em relação ao marido, conforme já verificado anteriormente.

O reconhecimento voluntário será possível então quando não tiver sido feito registro do filho ou quando for feito apenas por uma das partes, devendo ser feito pelo pai ou mãe, ou então como diz Orlando Gomes a esse respeito, que o reconhecimento voluntário poderá ser feito através de “procurador com poderes especiais”, “podendo realizar-se antes do nascimento, em vida ou depois da morte do filho” (GOMES, 1998, p. 342).

É possível aplicar-se o reconhecimento voluntário ainda, segundo Paulo Lôbo, além dos pais sem vínculo de casamento, ao “cônjuge e o companheiro de união estável, estes sem anuência dos respectivos cônjuge e companheiros, em relação a filhos havidos com outras pessoas”, desde que os filhos reconhecidos estejam entre 16 e 18 anos (LÔBO, 2015, p. 233) pois do contrário, sendo absolutamente incapazes (art. 3° do Código Civil) não poderão expressar com valor jurídico o que desejam para si.

Existem 4 modalidades de reconhecimento voluntário, que se aplicam na maioria dos casos à figura do pai, porém, pode haver casos onde quem fará o reconhecimento será a mãe, fazendo valer as mesmas regras dispostas no art. 1609 do Código Civil, in verbis:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

A primeira modalidade que se extrai do texto legal supra no inciso I, diz respeito àquela mais comum, feita no próprio termo ou registro de nascimento, onde o pai ou mãe, que não tenha o nome constante de tal registro, promove reconhecimento formal, perante oficial de registro competente, com a assinatura final de testemunhas (LÔBO, 2015, p. 235).

Ana Cláudia Silva Scalquette diz a esse respeito que, a mãe poderá contestar sua maternidade, “desde que provando a falsidade do termo ou das declarações nele contidas” (SCALQUETTE, 2014, p. 91).

A segunda modalidade (inc. II) diz respeito ao reconhecimento indireto, , ou seja, aquele que é feito por incidente em qualquer ato notorial idôneo, sendo que necessita de uma declaração “explícita e inequívoca” (VENOSA, 2007, p. 237).

Em suma, essa modalidade, serve para os casos onde “a” ou “as” partes não querem reconhecer de imediato em certidão de nascimento seu vínculo paterno ou materno com o filho, por questões pessoais, não ficando prejudicada eventual investigação de paternidade/maternidade para comprovar o que seja declarado.

A terceira modalidade (inc. III) diz respeito ao reconhecimento feito através de testamento ou reconhecimento testamentário, sendo que não se faz imprescindível um testamento próprio para tal feito, podendo ser o reconhecimento de paternidade ou maternidade, feito através de testamento genérico (que trate também de outros assuntos ligados à sucessão testamentária).

Caberá também eventual investigação de paternidade para comprovar o alegado (LÔBO, 2015, p. 237) vez que pode se tratar de declaração falsa, sendo que será também averiguado se já existe registro feito em relação ao suposto “filho(a)”, salvo nos casos de invalidação do termo de registro anterior ao suscitado no testamento (LÔBO, 2015, p. 237).

Por fim, se tem a quarta modalidade (inc.IV) que trata do reconhecimento incidental, feito mediante manifestação expressa e direta ao juiz, onde interessante dizer que não é necessário que seja o juiz competente para julgar o pedido de reconhecimento, bastando que o juiz receba “manifestação clara de que o manifestante é pai (ou mãe) de determinada pessoa”, para que o juiz então reduza-a a termo. (LÔBO, 2015, p. 238).

Ana Cláudia Silva Scalquette ainda faz duas ressalvas quanto ao reconhecimento voluntário, sendo que na primeira ela diz que “o reconhecimento de filho não pode estar sujeito a condição ou termo (art. 1.613,C.C.)” (SCALQUETTE, 2014, p. 92) e, diz ainda, que “o filho maior não poderá ser reconhecido sem seu consentimento, e ao filho menor caberá impugnar esse reconhecimento nos quatro anos que se seguirem a sua maioridade ou emancipação (art. 1.614, C.C.)” (SCALQUETTE, 2014, p. 92).

O Reconhecimento Judicial, também chamado de Reconhecimento Forçado, é aquele “decorrente de uma decisão judicial, também conhecido como investigação da paternidade ou da maternidade” (LÔBO, 2015, p. 241).

Cabe a qualquer filho a propositura da ação de investigação de paternidade, pessoalmente, ou por meio de seu “representante legal, se incapaz, em face de seu genitor ou de seus herdeiros ou legatários” (SCALQUETTE, 2014, p. 90).

Cézar Fiuza diz, “É garantida ao filho, a fim de provar seu estado de filho de homem não casado com sua mãe, ou para provar que é filho de mulher não casada com o pai” (FIUZA, 2009, p. 985).

Tal ação investigatória é imprescritível (art. 1606 C.C.) no que tange ao seu caráter declaratório da paternidade, não influindo com a imprescritibilidade em relação a outros assuntos relacionados como, por exemplo, os alimentos (art. 206, § 2° do C.C.) que prevê prescrição em 2 anos para requerer alimentos a partir da data de seu vencimento. O art. 1606 C.C. dispõe in verbis:

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo.

No mesmo sentido é a Súmula 149 do STF que diz, “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”.

Quanto aos meios de prova, contemporaneamente, pode-se dizer que nas ações de investigação de paternidade ou maternidade, o meio de prova mais cabal, é o exame de DNA, pois determina com muita precisão se existe vínculo biológico entre pai, mãe ou ambos e o filho (a) mas existem outras formas de se comprovar o vínculo de paternidade ou maternidade, inclusive em se tratando de pais socioafetivos, onde o exame de DNA de nada adiantaria.

A ação de investigação de maternidade é um tanto rara, mas pode ocorrer, e os meios de prova são via de regra mais fáceis, sendo que pode-se comprovar a maternidade através da certidão de casamento dos pais, através do parto que seja realizado durante o casamento e sua identidade com a mãe. Para os casos onde a mãe seja solteira, “dever-se-á provar a gravidez, o parto e a identidade do interessado com a provável mãe” (FIUZA, 2009, p. 984).

Outra forma de se comprovar o vínculo de filiação é através do reconhecimento da Posse de Estado de Filho, onde o interessado (filho) pretende que seja comprovado o vínculo socioafetivo entre ele e seu pai, mãe ou ambos, também no plano da socioafetividade, excluindo-se nessa modalidade, os casos de pais biológicos.

A posse de estado de filho não encontra respaldo na legislação de forma expressa, porém, parte da doutrina entende que se legitima tal modalidade, no que dispõe o art. 1.605 do C.C., que diz “poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito: (...) II – quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos”.

Muitas são as definições doutrinárias a esse respeito que confluem no mesmo resultado, valendo destacar a definição de Orlando Gomes que diz ser a posse de estado de filho, “um conjunto de circunstâncias capazes de exteriorizar a condição de filho legítimo do casal que o cria e educa” (GOMES, 1999, p. 324) e também a definição de Paulo Lôbo que diz:

“a posse de estado de filiação constitui-se quando alguém assume o papel de filho em face daquele ou daqueles que assumem os papéis ou lugares de pai ou mãe ou de pais, tendo ou não entre si vínculos biológicos”. Acrescentando, ainda, que a posse de estado de filho é a exteriorização da convivência familiar e dos vínculos afetivos.” (LÔBO, 2004, p. 49).

Maria Berenice Dias diz ainda a esse respeito que “A filiação que resulta da posse do estado de filho constitui modalidade de parentesco civil de “outra origem”, isto é, de origem afetiva (CC 1.593).” (DIAS, 2013, p. 381).

Por fim, ressalta-se que a jurisprudência tende a refutar o entendimento de vínculo de filiação na posse de estado de filho, a despeito dos vários entendimentos doutrinários no sentido contrário, o que torna ainda mais imprescindível que se regule adequadamente o tema.

Concluindo, verificou-se á essa altura, que existe a possibilidade de reconhecimento voluntário por parte do pai, da mãe ou de ambos em relação ao(s) filho(s) mas também existe o reconhecimento forçado ou judicial, que ocorre quando promove-se judicialmente ação por parte daquele que se considere filho, em relação a seus pais conjuntamente ou separadamente, para o fim de ter reconhecido seu vínculo de filiação, sem prejuízo de ação visando o contrário, como já visto em outro momento do estudo, ou seja, o filho(a) requerendo a desvinculação do vínculo de filiação em relação a seus pais, sejam biológicos, ou afetivos. Importante para o instituto da filiação também e para o presente artigo, a questão contemporânea (apesar de a prática ser antiga) da posse de estado de filho, que apesar de ser comum a ocorrência na sociedade, não encontra ainda respaldo legal expresso, senão através de interpretações da lei a partir da doutrina.


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve por finalidade verificar o instituto da filiação na atual conjuntura, com os temas clássicos que ajudam a conformar o entendimento sobre o instituto da filiação, sem deixar de lado também os temas mais contemporâneos e de relevância para o instituto, sendo que foi abordado o histórico da filiação antes da Constituição de 1988, passando para o instituto da filiação pós Constituição de 1988, onde se constatou que, dentre as principais grandes mudanças no instituto, talvez a primeira mais importante tenha sido a que diz respeito à igualdade dos filhos, disposta na Constituição Federal art. 227 §6°, bem como o art. 1.596 do Código Civil.

Após um breve histórico sobre a história e evolução da filiação no Brasil, foi estudado quais são seus dois gêneros, ou seja, a filiação biológica e a filiação socioafetiva, a relação de parentesco e a filiação consanguínea, em relação àquela nascida a partir do afeto, sendo que, essa última representa grande mudança no paradigma existente a partir da Constituição de 1988, sendo um grande marco para as relações que se formaram a partir de então pela afetividade, e que ensejam os mesmos direitos daqueles que tem relações de filiação biológicas.

Uma vez compreendido o que é filiação e seus gêneros, passou-se a estudar suas espécies, onde se discorreu sobre cada uma, com destaque para as espécies que inovam no instituto da filiação, tendo alguma ou nenhuma legislação específica tratando do tema, como é o caso da filiação decorrente da inseminação artificial heteróloga, por exemplo, que representa uma espécie de filiação relativamente moderna, ao passo que não tem lei específica que trate do assunto, apesar de se tratar de algo tão importante no que tange à reprodução humana, ou então, a filiação decorrente de casais homoafetivos, que representa também um dos temas que “empresta” disposições legais não específicas para conseguir suprir as demandas judiciais que inovam na sociedade e exigem que o ordenamento jurídico se adéque ou mesmo, a questão da posse de estado de filho, que apesar de ser claramente uma relação onde ocorre filiação por socioafetividade, ainda não existe lei que a regule ou mesmo jurisprudência favorável na praxis.

Depois de compreendido o conceito, gêneros e espécies do instituto da filiação, passou-se a estudar de forma derradeira, como é que se forma no sentido jurídico e formal a filiação, ou seja, o reconhecimento dos pais em relação aos filhos, tratando também ao longo do artigo e também a esse ponto, da possibilidade de desfazimento da relação de filiação entre as partes (pais e filhos) tanto para as relações de filiação biológicas, quanto para as relações de filiação socioafetivas.

Conclui-se, portanto, que representa marco de evolução no instituto da filiação, a questão da igualdade entre todos os filhos, passando esses a serem vistos com plena igualdade de direitos, a questão referente à socioafetividade, que amplia a relação de filiação para além da biológica, pressupondo ainda o cabimento da filiação mesmo entre casais em união estável e homoafetivos e, por fim, as formas de busca de vínculo de filiação e também do seu desfazimento, por meio da justiça, que também representa ponto importante do presente instituto, porque garante aos pais e aos filhos, segurança jurídica e representa, junto com todos os outros temas suscitados acima, temas contemporâneos do instituto da filiação, e que ainda renderão muita discussão na sociedade e entre juristas, doutrinadores e demais operadores do direito.

Por fim, espera-se que o presente artigo possa servir de fonte para eventuais pesquisas e, que auxilie de alguma forma, para as discussões que existem acerca do tema, que gera muita polêmica, sobretudo nessas questões relativamente “novas” envolvendo a filiação socioafetiva.


REFERÊNCIAS

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Abstract: In this article, it’s drawn a brief study about the Institute of Filiation in contemporaneity, setting it’s pre and post 1988’s Constitution history, giving a great emphasis to the second period, with it’s definition, the study of it’s two descriptions, Biological Filiation and Social-affective Filiation, passing through parentage, filiation kinds and, at least, talking about the ways of recognition, which means, volunteer recognition or the judicial recognition, giving emphasis to all stages of the study, the more contemporaneous aspects on the filiation, that somehow represent, a change in the society paradigm, like the social-affectiveness, the possibility of mefiliation of social-affective children and parents in a stable relationship, the possibility of, in addition to the woman, the man to submit heterologous artificial insemination, the question of the son of state ownership, and also filiation in relation to homoaffective couples, all under the law and doctrine.

Keywords: Institute of Filiation; social-affective; stable relationship; homoaffective couples; heterologous artificial insemination.


Autores

  • Waldyr Grisard Filho

    Waldyr Grisard Filho

    Doutor e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, Professor na Faculdade de Direito de Curitiba, Membro do Instituto dos Advogados do Paraná – IAP e do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Juiz substituto do TRE-PR, Advogado em Curitiba.

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  • Juliano Dias Barbosa Ribas

    Advogado com atuação nacional e escritório sediado em Curitiba - Paraná. Bacharel em direito pela Faculdade de Direito de Curitiba - UNICURITIBA. Pós-graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG. Pós graduado em Direito Previdenciário pela Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG.

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