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A prevalência da tuberculose no sistema prisional.

Violação do direito à saúde do preso

A prevalência da tuberculose no sistema prisional. Violação do direito à saúde do preso

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O presente trabalho tem por objetivo demonstrar as violações do direito a saúde nas pessoas privadas de liberdade, e as consequências fisiológicas e anatômicas que virão decorrentes desse contato com o bacilo da tuberculose.

1. INTRODUÇÃO

A desestruturação do sistema prisional traz à baila o descrédito da prevenção e da reabilitação do condenado. Nesse sentido, a sociedade brasileira encontra-se em momento de extrema perplexidade em face do paradoxo que é o atual sistema carcerário brasileiro, pois de um lado temos o acentuado avanço da violência, o clamor pelo recrudescimento de pena e, do outro lado, a superpopulação prisional e as nefastas mazelas carcerárias. Vários fatores culminaram para que chegássemos a um precário sistema prisional. Entretanto, o abandono, a falta de investimento e o descaso do poder público ao longo dos anos vieram por agravar ainda mais o caos chamado sistema prisional brasileiro. Sendo assim, a prisão que outrora surgiu como um instrumento substitutivo da pena de morte, das torturas públicas e cruéis, atualmente não consegue efetivar o fim correcional da pena, passando a ser apenas uma escola de aperfeiçoamento do crime, além de ter como característica um ambiente degradante e pernicioso, acometido dos mais degenerados vícios, sendo impossível a ressocialização de qualquer ser humano. Nesse contexto, a superlotação tem como efeito imediato a violação a normas e princípios constitucionais, trazendo como consequência para aquele que foi submetido a uma pena privativa de liberdade uma "sobre pena", uma vez que a convivência no presídio trará uma aflição maior do que a própria sanção imposta. Sendo assim, a saúde pública no sistema prisional é inexistente.

O dia 24 de março é o Dia Mundial de Combate à Tuberculose (TB), que segundo o Ministério da Saúde (MS), é uma doença infecciosa e transmissível que afeta prioritariamente os pulmões, sendo causada pelo bacilo de Koch. A TB é um sério problema de saúde pública, com profundas raízes sociais, que além dos fatores relacionados ao sistema imunológico de cada pessoa, o contágio, muitas vezes, está ligado à pobreza e à má distribuição de renda. Por isso, alguns grupos populacionais possuem maior vulnerabilidade devido às condições de vida, falta de higiene e intempéries a que estão expostos. As pessoas que vivem com HIV/Aids e as pessoas privadas de liberdade estão expostas a risco 28 vezes maior que a população em geral, conforme o MS.


2. BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PRISÕES

A antiguidade desconheceu totalmente a privação de liberdade estritamente considerada como sansão penal. Embora seja inegável que o encarceramento de delinquentes existiu desde tempos imemoráveis, não tinha caráter de pena e repousava em outras razões. Até fins do século XVIII a prisão serviu apenas aos objetivos de contenção e guarda de réus, para preserva-los fisicamente até o momento de serem julgados ou executados. Recorria-se, durante esse longo período histórico, fundamentalmente, pena de morte, penas corporais (mutilações e açoites) e às infamantes. Por isso, a prisão era uma espécie de antessala de suplícios. (BITENCOURT, 2001, p. 11-14)

2.1. Idade Média

As sanções criminais na idade média estavam submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impunham em função do status social a que pertencia o réu. Referidas sansões podiam ser substituídas por prestações em metais ou espécie, restando a pena de prisão, excepcionalmente, para aqueles casos em que os crimes não tinham suficiente gravidade para sofrer condenação à morte ou a penas de mutilação. No entanto nessa época surgem a prisão de Estado e a prisão eclesiástica. Na prisão de Estado, na idade média, somente podiam ser recolhidos os inimigos do poder, real ou senhorial, que tivessem cometido delitos de traição, e os adversários políticos dos governantes. A prisão de Estado apresenta duas modalidades: a prisão custódia, onde o réu espera a execução da verdadeira pena aplicada (morte, açoite, mutilações etc...) ou como detenção temporal ou perpétua, ou ainda até receber o perdão real. A prisão eclesiástica, por sua vez, destinava-se aos clérigos rebeldes e respondia a ideias de caridade, redenção e fraternidade da igreja, dando ao internamento um sentido de penitencia e meditação. Recolhiam-se os infratores a uma ala dos mosteiros para que, por meio da penitencia e oração, se arrependessem do mal causado e obtivessem a correção ou emenda. (BITENCOURT, 2001, p. 11-14)

2.2. Idade Moderna

Durante os séculos XVI e XVII a pobreza se abate e se estende por toda a Europa. No ano de 1556 os pobres formavam quase a quarta parte da população. Essas vitimas da escassez subsistiam das esmolas, do roubo e assassinatos. O parlamento tratou de envia-los às províncias. No ano de 1525 foram ameaçados com o patíbulo; em 1532 foram obrigados a trabalhar nos encanamentos para esgotos, acorrentados de dois em dois; em 1554 foram expulsos da cidade pela primeira vez; em 1561 foram condenados às Galés e em 1606 decidiu-se finalmente, que os mendigos de Paris seriam açoitados em praça pública, marcados nas costas, teriam as cabeças raspadas e logo seriam expulsos da cidade. (BITENCOURT, 2001, p. 11-14)

O Princípio da Humanidade da Pena aparece com CesareBeccaria, em uma época de injustiças contra os menos favorecidos, em que as decisões pareciam não conhecer a realidade social. John Howard, sensibilizado pelo sofrimento nas prisões, trouxe soluções simples que ajudariam a melhorar a insatisfação generalizada, assim como Jeremy Benthan que já afirmava ser muito melhor evitar a infração do que encontrar um jeito para puni-la. Conceitos e realidades antigos, datados do século XVIII, mas que continuam atuais. (BITENCOURT, 2001, p. 11-14)

Os primeiros sistemas de execução da pena privativa de liberdade (sistemas penitenciários) têm origem nos Estados Unidos da América(BITENCOURT, 2001, p. 57-80) e foram denominados de sistema filadélfico ou pensilvânico (sistema celular dos Quackers) (FOUCAULT, 1999, p. 201) e sistema auburniano ou “silent system”. No primeiro, um rigoroso isolamento celular era mantido durante toda a pena de prisão e o indivíduo ficava a mercê de um tutor (Quacker), que o acompanhava promovendo estudos e leituras bíblicas e esperando alcançar o arrependimento e a purificação espiritual do apenado. O segundo propiciava o trabalho comum durante o dia, mantendo a regra do isolamento celular apenas para noite. A disciplina deste sistema penitenciário exigia que o trabalho comum fosse executado totalmente em silêncio (daí a denominação de silent system) e tinha por finalidade formar operários padrões para o nascente capitalismo industrial do norte dos Estados Unidos (daí a implantação deste sistema em Auburn no estado americano de Nova Iorque). (FOUCAULT, 1999, p. 200).


3. PENA

A sanção penal refere se a punição estabelecida em lei penal, esta por sua vez admite duas espécies de sanção: a pena, ou seja, a privação da liberdade, restrita de direitos e multas e a medida de segurança, que é uma sanção detentiva e restritiva.

Segundo Luiz Flávio Gomes (2006):

Sempre que a norma venha a disciplinar algum aspecto do ius puniendi, será de Direito penal. Ela pode ser primária ou secundária. Norma primária é a que cuida do âmbito do proibido (quais condutas são proibidas, quais são determinadas);norma secundária é a que norteia o castigo (a sanção).

Como norma secundária de acordo com CAPEZ, Fernando e BONFIM, Edilson Mougenout (2004, p.632):

A pena é a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novastransgressões pela intimidação dirigida à coletividade.

3.1. Fases históricas da pena

3.1.1. Vingança privada

Prevalecia o sentimento de vingança, era olho por olho, dente por dente.Naquela época destacavam-se o TALIÃO e a COMPOSIÇÃO, que foram contemplados no código deHammurabi (1.780 a.C.), considerado um dos mais antigos ordenamentoslegislativos do mundo.

3.1.2. Vingança divina

A igreja tinha o Direito Canônico e para a igreja o crime era um pecado contra as leis humanas e divinas. Este tipo de vingança teve grande influencia nas prisões modernas. No séc. XVIII, Cesare Beccaria1, influenciado pelo movimento filosófico-humanitário que tem o traço marcante de Voltaire, Rousseau e Montesquieu escreveu a obra DOS DELITOS E DAS PENAS (1764) como resposta a crueldade das penas e da vingança institucional em nome do Estado. Com Beccaria esboçou-se a demarcação dos limites entre a Justiça Divina e a Justiça Humana, entre os pecados e os delitos e proclamou-se a utilidade social da pena, retirando-lhe o caráter de vingança, estabelecendo uma proporcionalidade entre a pena e o crime.

3.1.3. Vingança pública

O estado tem a responsabilidade de decretar o que é ou não é crime e suas respectivas sanções, estabelecendo, assim, o caráter preventivo, retributivo e ressocializador do Direito Penal.

3.2. Finalidade da pena

A pena tem por finalidades retribuir o mal justo pelo mal injusto, impondo-se ao descumpridor da norma penal um gravame de privação de bem jurídico, ou seja, pena privativa de liberdade, restritivas de direito ou multa. A prevenção evita que a prática de crimes seja feita pelo apenado e os que cogitarem praticar conduta similar e a Readaptação Social, esta é uma característica que tem como objetivo corrigir o caráter do delinquente, para que no egresso não volte a delinquir.

E para a finalidade da pena existem três teorias, que são elas:

3.2.1. Teoria absoluta ou da retribuição

Esta teoria não sepreocupa com a readaptação social do infrator. Os principais defensoresdessa teoria foram Emmanuel Kant e George Wilhelm Friedrich Hegel.

3.2.2. Teoria relativa, finalista, utilitária ou da prevenção

Esta teoria é defendida por Bentham, Beccaria, Fuerbach, entre outros, ou seja, é destinada ao controle da violência, podendo ser negativa ou positiva. É negativa por que cria nos potenciais criminoso, um contraestimulo à prática de crime, intimidando os membros da coletividade acerca da gravidade e imperatividade da pena e positiva porque procura demonstrar e reafirmar a existência, a validade e a eficiência do Direito Penal,evitando-se a ideia da vingança particular, por parte do ofendido e seus semelhantes.

3.2.3. Teoria mista, eclética, intermediária, conciliatória ou unificadora da pena

Esta teoria tem duas funções, a de punição ao infrator e prevenir a prática de crime. Esta teoria foi à adotada no Código Penal, no seu art. 59, caput, quando o legislador disse “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

3.3. Características da pena

3.3.1. Legalidade

A pena deve estar prevista em lei vigente, não se admitindo seja cominada em medidas provisórias, regulamento ou ato normativo infralegal (princípio da reserva legal - CP, art. 1° e CF. Art. 5°, XXXIX – não há pena sem prévia cominação legal).

O princípio da legalidade traz as seguintes garantias: lexscripta (lei escrita); lexpopuli (lei aprovada pelo parlamento); lex certa (lei taxativa, inclusive quanto à pena); lex clara (inteligível, compreensível); lexproporcionalis (pena proporcional à gravidade do delito); lexstricta (lei penal deve ser interpretada restritivamente); lexpraevia (vigência anterior ao fato criminoso);

3.3.2. Irretroatividade

A lei penal nova, inclusive no que diz respeito à pena, não pode retroagir para prejudicar o réu. (CF, Art. 5°, XL);

3.3.3. Personalidade

A pena não pode passar da pessoa do condenado (CF. Art. 5°, XLV). Assim, a pena de multa, ainda que considerada dívida de valor para fins de cobrança, não pode ser exigida dos herdeiros do falecido.

3.3.4. Individualização

A imposição e o cumprimento da pena deverão ser individualizados de acordo com a culpabilidade e o mérito do sentenciado (CF, Art. 5°, XLVI). Na verdade a individualização da pena se dá em três momentos: na cominação, quando da aplicação e na execução.

3.3.5. Inderrogabilidade

Salvo as exceções legais, a pena não pode deixar de ser aplicada sob nenhum fundamento. Assim, por ex., o juiz não pode extinguir a pena de multa levando em conta seu valor irrisório.

3.3.6. Proporcionalidade

A pena deve ser proporcional ao crime praticado (CF, art. 5°, XLVI e XLVII). Quanto maior a gravidade do delito, maior a pena e vice-versa. O princípio da proporcionalidade das penas deve ser observado não só pelo legislador, quando tipifica as condutas criminosas, mas também pelo Judiciário, quando da individualização da pena e pelo Juiz das Execuções Penais, na fase executória da pena imposta em uma sentença irrecorrível.

3.3.7. Necessidade e suficiência

O juiz aplicará a pena conforme seja necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime (art. 59. do CP). Quando desnecessária a pena pode deixar de ser aplicada (ex.: o perdão judicial). Se houver previsão de aplicação de duas penas alternativamente para o delito, deve o juiz aplicar a que seja suficiente (ex.: pena privativa de liberdade ou multa; pena de reclusão ou detenção).

3.3.8. Humanidade

Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, inc. III da CF). Nenhuma pena deve ser cumprida de forma desumana. No Brasil não são admitidas as penas de morte (salvo em caso de guerra declarada), perpétuas, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis (CF, art. 5°, XLVII).

Art. 5.º, XLVIII: a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado.

Art. 5.º, XLIX:é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.

Art. 5.º, L: às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação.

Art. 5.º, LXXV: o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.


4. DO DIREITO À SAÚDE

Um dos conceitos mais abrangentes segundopara o termo saúde foi elaborado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1948, e define “Saúde é o estado do mais completo bem estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade”. Considerando a saúde, enquanto expressão das relações que o ser humano estabelece com o ambiente e consigo mesmo, a mesma está relacionada a variáveis biológicas, sociais e psíquicas e envolve a vida em sociedade, as condições de moradia e trabalho e o meio em que o indivíduo está inserido. De acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil (CF), promulgada em 1988, saúde é um direito constitucional, assegurado a qualquer cidadão brasileiro, sendo dever do Estado oferecê-la mediante a força de seus dispositivos. Portanto, considerando um cidadão recluso como cidadão brasileiro, esse direito também lhe é inerente. Neste sentido, consideraremos detentos, presidiários ou reclusos, os indivíduos em sistema de reclusão fechado. (ARRUDA et al,2013)2

O artigo 25 (parágrafo 1) da “Declaração Universal dos Direitos Humanos” de 1948, cita pela primeira vez na história a saúde como direito:

Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica [...].

Verifica-se que o direito a saúde representa um conceito muito mais amplo do que apenas a ausência de uma enfermidade física ou psíquica, mas inclui o direito a alimentação, moradia, trabalho, educação, dignidade, à vida, não discriminação, igualdade, proibição contra a tortura, privacidade, acesso a informação e liberdade de associação, reunião e deslocamento. Gozar de saúde é usufruir de uma vida digna, desfrutando de um gama de direitos humanos.

Em 1978, a declaração de Alma- Ata descreve outro amplo conceito de saúde, agregado ao fato de esta ser um direito fundamental de qualquer indivíduo:

A saúde é um completo estado de bem estar físico, mental e social, e não meramente a ausência de doença e de enfermidade, é um direito humano fundamental [...]

O reconhecimento do direito à saúde e sua incorporação nas leis, políticas públicas e jurisprudências, visto que o mesmo está relacionado à dignidade humana, promove inquietações acerca de como conseguir este bem-estar e quais os direitos e responsabilidades dos cidadãos e dos Estados.

No Brasil o direito a saúde foi legalmente reconhecido na Constituição de 1988, Artigo 196 onde preconiza:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Este texto abrange um amplo espectro de saúde, considerando esse um direito universal, que inclui desde a saúde preventiva perpassando os estágios intermediários até atingir a saúde curativa. Seu enfoque está pautado na qualidade de vida, colocando a saúde como um elemento de direito e promoção de vida.

A Constituição Federal, no Artigo 197, estabelece:

É de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle. De acordo com o Artigo 198 da Constituição “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único”.

4.1. Direitos Fundamentais

Da mesma forma que os presos devem respeitar as regras e normas do presídio, a instituição carcerária tem o dever de garantir todos os direitos fundamentais dos reclusos que não forem alcançados pela sentença ou pela lei, a dignidade da pessoa humana deve ser o Princípio norteador que o Poder Público deve respeitar, independentemente de merecimento pessoal ou social, é um direito inerente da pessoa, da vida, não é necessário merecimento para que a pessoa seja merecedora do mesmo.

Sedundo Tatiane Aguiar Guimarâes Silva3:

A definição de dignidade não tem delimitação certa, mas não podemos achar que ela só existe como utopia, em vários momentos podemos perceber a sua existência, principalmente em situações de preconceitos de qualquer origem ou qualquer outra forma de discriminação ou não cumprimento de regras.

Entre os direitos que podemos considerar como pertencente ao conceito de dignidade pode pensar naqueles que se referem às condições mínimas e básicas de vida para o homem e seu meio familiar como educação, moradia, alimentação e saúde, além do direito ao voto e ao direito de igualdade, essas devem ser as garantias mínimas para uma vida com dignidade.

Dentre esses direitos merece destaque o direito a saúde, que está previsto no artigo 6° da Constituição Federal. Parando para pensar, se a população em geral já não recebe um tratamento adequado da saúde pública, passando por diversos problemas devido a uma saúde precária e sem soluções necessárias para todos os males, imagine a população carcerária que necessita de medidas preventivas eficazes no tocante a saúde prisional para que quando esse recluso volte para sociedade consiga uma adequada ressocialização.

4.2. Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário

A Portaria Interministerial nº 1777, de 09 de setembro de 2003, instituiu o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário. Este plano prevê a inclusão da população penitenciária no SUS, garantindo que o direito a cidadania se efetive na perspectiva dos Direitos Humanos. O acesso dessa população a ações e serviços de saúde é legalmente definido pela Constituição Federal de 1988, pela Lei n° 8.080, de 1990, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde, e pela Lei de Execução Penal n° 7.210, de 1984.

O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário contempla, essencialmente, a população recolhida em penitenciárias, presídios, colônias agrícolas e/ou agroindustriais e hospitais de custódia e tratamento, não incluindo presos do regime aberto e presos provisórios, recolhidos em cadeias públicas e distritos policias.

Segundo esse plano, para o correto atendimento dos presos, cada unidade prisional deve contar com uma equipe integrada formada por um médico, um enfermeiro, um dentista, um psicólogo, um auxiliar de enfermagem, um auxiliar de consultório odontológico e um assistente social. Cada equipe de saúde será responsável por 500 presos, nos estabelecimentos com menos de 100 presos não terão equipes exclusivas. Os profissionais designados para atuarem nestes estabelecimentos, com pelo menos um atendimento semanal, podem atendê-los na rede pública de saúde.

Agentes promotores de saúde, recrutados entre pessoas presas, atuarão sob a supervisão dessas equipes, receberão auxílio financeiro e terão direito a remissão de pena. Cada presídio contará com serviço médico interno disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde, para tratamento dos detentos e prevenção da tuberculose, hanseníase, AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis. A população carcerária passará a ser vacinada regularmente contra doenças como hepatite, influenza e tétano.

Este Plano Nacional possui algumas finalidades bastante específicas que são: prestar assistência integral resolutiva, contínua e de boa qualidade às necessidades de saúde da população penitenciária, contribuir para o controle e/ou redução dos agravos mais frequentes que acometem a população penitenciária, definir e programar ações e serviços consoantes com os princípios e diretrizes do SUS, de forma a proporcionar o estabelecimento de parcerias por meio do desenvolvimento de ações Inter setoriais, contribuindo para a democratização do conhecimento do processo saúde/doença, da organização dos serviços e da produção social da saúde.

As unidades de saúdes implementadas de acordo com o Plano Nacional de Saúde, no âmbito dos estabelecimentos prisionais, assim como os profissionais de saúde atuantes nestas unidades, serão monitorados por meio de sistemas de informações que constituem o Sistema de Informações em Saúde do Sistema Único de Saúde.

Estas unidades deverão ser cadastradas no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES/SUS), conforme Portaria nº 268, de 17 de setembro de 2003, para as quais foi criado especificamente o Serviço de Atenção à Saúde no Sistema Penitenciário, código 065, com as seguintes classificações:

  • 183 e 185 para presídios, penitenciárias, hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico, manicômios judiciários e colônias agrícolas com população de até 100 pessoas presas;

  • 184 e 186 para presídios, penitenciárias, hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico, manicômios judiciários e colônias agrícolas com população acima de 100 pessoas presas.

Com este cadastramento, os estabelecimentos prisionais que tiverem as unidades de saúde implementadas receberão um código no CNES e apresentarão o Boletim de Produção Ambulatorial, com a produção dos serviços realizados no Sistema Penitenciário.

Para que ocorra o cadastramento destas unidades, é imprescindível que os profissionais estejam registrados na "ficha de cadastro de profissionais do SUS".


5. A TUBERCULOSE

A Tuberculose (TB)4 é uma doença infecciosa crônica que vem afligindo a humanidade há cinco milênios. Seu agente etiológico, o Mycobacterium tuberculosis, ou bacilo de Koch, é o patógeno que mais mortes causou, entre as doenças infecciosas em adultos (RAVIGLIONE; SNIDER; KOCHI, 1995).

Ao desenvolver a forma pulmonar ativa da doença, o homem torna-se a principal fonte de infecção pelo bacilo, através da transmissão pessoa a pessoa por meio fala, espirro ou tosse, em que são eliminadas gotículas no meio externo circundante contendo o agente etiológico (SVS, 2009), ou seja, a transmissão é respiratória, com a chance do individuo se infectar relacionada ao ambiente, ao tempo de exposição, continuidade ao vigor da tosse de um individuo bacilifero, a condição de adoecimento, entretanto, é modulada pela imunidade e esta associada à nutrição (BRASIL, 2005a).

Podemos entender melhor as individualidades do adoecimento, quando compreendemos que há pessoas que conseguem destruir o bacilo de Koch na porta de entrada, e, os que não conseguem, existem ainda, os indivíduos que permanecem em equilíbrio com o bacilo, mesmo albergando ele atua, passando o hospedeiro a apresentar as manifestações que caracterizam a doença. Baseado nestas informações, afirma-se que as diversas situações de estresse do organismo, a exemplo do que ocorre nos procedimentos invasivos, podem provocar uma depressão do sistema imunológico, deixando assim a TB-infecção sujeita a entrar em atividade (SVANE, 1999). O mesmo ocorre na presença de co-infecções ou de idades. Observa-se ainda, que a desnutrição, assim como a dependência alcoólica, acelera a evolução dessa doença e pode determinar uma maior precocidade do óbito. Dessa forma, percebe-se que as condições e hábitos de vida, gerados pelo desenvolvimento humano, são primordiais à determinação do estado de saúde ou doença.

Esta doença vem merecendo atenção não só por sua capacidade infectocontagiosa, mas também por ser um agravo de saúde pública que afeta a população socialmente vulnerável. Apesar das evoluções tecnológicas do setor saúde e a adoção de políticas publicas de combate, a doença atinge índices alarmantes, principalmente nos países de terceiro mundo (TEIXEIRA, 2001).

Segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS (WHO, 2010), o Brasil, ocupa a 19ª posição entre os 22 países com maior carga da doença no mundo, pois em 2010 foram notificados no país, 70.601 casos novos da doença, com taxas de incidência de 37,9 e mortalidade de 2,5 casos por 100 mil habitantes (BARREIRA, 2011).

Para o controle da TB, é fundamental interromper a cadeia de transmissão da doença. Cada doente não diagnosticado tende a infectar de 10 a 15 pessoas em um ano, sendo que uma ou duas adoecem, mantendo a transmissão da endemia.(CASTILHO, 1982).

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) a investigação do contato é uma das estratégias mais apropriadas de vigilância para interromper a transmissão e o desenvolvimento subsequente da TB, só perdendo em efetividade para a busca ativa de sintomáticos respiratórios.

A probabilidade que a TB seja transmitida depende de alguns fatores, como o da contagiosidade do caso índice (doente bacilífero fonte da infecção); do tipo de ambiente em que a exposição ocorreu; da duração da exposição.

Quando uma pessoa inala as gotículas contendo os bacilos de Koch, muitas delas ficam no trato respiratório superior (garganta e nariz), onde a infecção é improvável de acontecer. Contudo, quando os bacilos atingem os alvéolos a infecção pode se iniciar.

5.1. Patogênese

A tuberculose pulmonar é dividida em primária (primoinfecção) e secundária. A forma primária é a que ocorre em indivíduos que ainda não tiveram contato com o bacilo, sendo, portanto, mais comum em crianças. A forma secundária desenvolve-se a partir de uma nova infecção (reinfecção exógena) ou da reativação de bacilos latentes (reinfecção endógena).5

Na primoinfecção, o Mycobacterium tuberculosis inalado atinge os alvéolos, onde ocorre um processo inflamatório inicial mediado por neutrófilos polimorfonucleares/ macrófagos alveolares e a formação de um nódulo exsudativo. Se esse primeiro mecanismo de defesa não for suficiente para conter o avanço do bacilo, a fração lipídica e a tuberculoproteína do bacilo combinam-se aos receptoresdos macrófagos, tornando-os ativados e capazes de apresentar os antígenos do microorganismo aos linfócitos T no tecido linfóide associado aos brônquios.

Nestes, os macrófagos ativados passam a secretar principalmente três tipos de citocinas: quimiotáxicas (p. ex.: leucotrieno B-4 e interleucina), interferon e fator de crescimento de fibroblastos, constituindo-se assim uma reação de hipersensibilidade. Os macrófagos ativados voltam aos alvéolos, aglomeram-se ao redor dos bacilos, transformando-se em células epitelióides, onde clones de células T formam um manguito periférico ao redor destas. Terminada a sua função fagocítica, as células epitelióides se agrupam e originam as células gigantes multinucleadas.

Essa reação produtiva constitui o granuloma, cuja função básica é a de barreira à disseminação do bacilo a outros locais do tecido normal. O conjunto de granulomas formados recebe o nome de nódulo de Ghon. Ao conjunto de nódulo de Ghon, linfangite e linfadenitedáse o nome de complexo primário da tuberculose que, dependendo do número e da virulência dos bacilos e do grau de hipersensibilidade e resistência do hospedeiro, pode evoluir para cura ou para doença.

A doença primária evolui a partir do foco pulmonar (processo pneumônico parenquimatoso) ou, com maior freqüência, do foco ganglionar. Esses gânglios podem fistulizar- se para um brônquio adjacente e determinar a disseminação broncogênica da tuberculose. Com a expansão das lesões destrutivas, os bacilos atingem os vasos sanguíneos e disseminam-se para o pulmão e outros órgãos. A lesão inicial parenquimatosa ou uma nova infecção originam a necrose central, liquefação e eliminação do material por um brônquio de drenagem com a formação da cavitação. A partir da cavitação, os bacilos disseminam- se pelo pulmão por via brônquica (disseminação broncogênica) e, tal como na forma progressiva da infância, por via hematogênica (tuberculose miliar).

5.2. Diagnóstico

O diagnóstico da tuberculose pulmonar em nosso meio baseia-se no encontro de duas baciloscopias diretas positivas no escarro, uma cultura positiva para Mycobacterium tuberculosis ou ainda imagem radiológica sugestiva ou outros exames complementares que, associados a achados clínicos, sugiram doença. O adequado conhecimento das imagens compatíveis com atividade da tuberculose é, portanto, um importante recurso para o diagnóstico precoce e início de tratamento.

A radiografia do tórax é o método de imagem de escolha na avaliação inicial e no acompanhamento da tuberculose pulmonar. Na tuberculose primária a radiografia do tórax pode ser normal, embora pequenos nódulos periféricos possam estar presentes e não ser visualizados. A linfonodomegaliamediastinal é a manifestação radiológica mais frequente na forma primária da tuberculose. Acomete entre 83% e 96% das crianças e sua incidência diminui entre os adultos.

A atelectasia obstrutiva decorrente da compressão extrínseca por linfonodomegalias ocorre em 9% a 30% das crianças com a forma primária da doença.

A pneumonia caseosa manifesta-se sob a forma de consolidações segmentares ou lobares, muitas vezes com aspecto semelhante ao da pneumonia bacteriana típica (padrão homogêneo, com bordas mal definidas e presença de broncograma aéreo).

A tuberculose miliar é caracterizada por opacidades retículo-micro nodulares difusas decorrentes da disseminaçãohematogênica do Mycobacterium tuberculosis pelo parênquima pulmonar.

Quando o complexo primário da tuberculose evolui para cura, pode manifestar-se radiologicamente por um nódulo pulmonar ou massa, também chamados tuberculomas, associados ou não a pequenos nódulos satélites e/ou gânglios mediastinais calcificados.

A presença dessas calcificações e dos nódulos satélites auxilia no diagnóstico diferencial de nódulo pulmonar solitário.

A maioria dos tuberculomas é menor que 3cm, embora lesões maiores que 5cm tenham sido descritas. Na forma pós-primária da tuberculose, as cavitações são mais freqüentes nos segmentos ápico-posteriores dos lobos superiores ou superiores dos lobos inferiores e apresentam- se em 40% a 45% dos casos.

No Brasil, esses achados estão presentes nas radiografias em até 100% dos casos, provavelmente relacionados ao diagnóstico tardio da doença. As cavidades apresentam-se com paredes espessas durante a sua fase ativa.

Após a cura, evoluem para cicatrização, cujos aspectos residuais são as estrias, calcificações e retrações do parênquima acometido. As cavidades podem também permanecer com suas paredes mais delgadas após a cura, representando a sequela ou inatividade do processo específico.

Alguns autores sugerem que esses achados devem ser descritos como “radiologicamente estáveis” ao invés de “inativos”, pela possibilidade de recrudescência futura de bacilos latentes.

Um achado sugestivo de atividade da tuberculose é a “pneumonia cruzada”, que decorre da disseminação broncogênica do Mycobacterium tuberculosis pelo parênquima pulmonar.

A disseminação broncogênica da tuberculose a partir de uma cavidade ou de um gânglio fistulizado determina também infiltrados retículo-micronodulares distantes como resultado da implantação dos bacilos em outras localizações do pulmão. As manifestações radiográficas da tuberculose associada à SIDA dependem do nível de imunossupressão e do tempo de doença. Assim, pacientes com função celular íntegra apresentam alterações radiográficas semelhantes às do individuo não infectado pelo HIV.

5.3. Sequelas

Sequela de TB é toda a alteração anátomo–patológica provocada pelo processo de cura da TB e que motiva posteriormente necessidade de intervenção clinico-terapêutica. É condição essencial a existência de exames bacteriológicos da expectoração (culturas) para o BK negativos.

A cultura deve ser realizada pois permite o diagnóstico diferencial com uma recaída de tuberculose que por definição tem que ter confirmação bacteriológica. Infelizmente, temos observado muitos casos de sequelas a serem incorretamente tratados com o regime de retratamento da TB e a serem considerados casos de TB recorrente.

De acordo com manual clínico de tuberculose6:

As sequelas variam desde lesões mínimas de fibrose com poucas repercussões funcionais, até grandes destruições parenquimatosas, o chamado “pulmão destruído”, com graves alterações funcionais levando à insuficiência respiratória crónica e cor pulmonale.

Muitas vezes as sequelas manifestam-se muitos anos depois do tratamento da TB. As sequelas podem surgir quer no pulmão, como consequência de uma TB pulmonar, quer na pleura, como consequência da TB pleural quer ainda em qualquer órgão como, por exemplo, nas trompas (levando a esterilidade feminina) ou nos ureteres. Contudo é ao nível pulmonar que surgem à maioria das sequelas. As sequelas devem ser abordadas como uma doença crónica (tratamento para toda a vida) e são uma patologia muito frequente no nosso país. As sequelas devem estar sempre presentes no diagnóstico diferencial, em doentes com história anterior de tuberculose.


6. VIOLAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE

No artigo 1° da convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, tem-se a seguinte definição:

Para fins da presente Convenção7, o termo ‘tortura’ designa:

[...] qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos graves, de natureza física ou mental, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões; de castiga-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir essa pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivos baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com seu consentimento ou aquiescência.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também chamada de Pacto de San José da Costa Rica, foi aprovada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em 22 de novembro de 1969. Ao Pacto, o Brasil aderiu em 09 de julho de 1992, ratificando-o em 25 de setembro de mesmo ano.

A Convenção traz em seu conteúdo diversas garantias aos direitos fundamentais, e nasce “reafirmando seu propósito de consolidar, neste Continente, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem”. Em seu artigo 11, o Pacto assegura a proteção da honra e da dignidade, afirmando que 'toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade' e ainda que 'toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou ofensas'. A Constituição Federal, em seu artigo 1º, também assegura a preservação da dignidade da pessoa humana, indistintamente, na medida em que tem como fundamento tal princípio.

A superlotação carcerária tem sido uma das maiores violações aos direitos humanos dos presos no Brasil, sobretudo pelas péssimas condições dos compartimentos de clausura. Celas em que se amontoam dezenas de presidiários, sem o mínimo de conforto e higiene, conforme determinam tanto as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos quanto a Lei de Execução Penal Brasileira.

6.1. Violação do direito a integridade física

O artigo 3º da LEP estabelece que ao condenado e ao internado sejam assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. A letra da lei é difícil de compatibilizar com a natureza da pena de prisão especialmente em um contexto em que o número de pessoas presas cresce rapidamente e outras prioridades da política pública impedem que se invistam recursos compatíveis com aqueles que seriam necessários para a garantia desses direitos. A situação de prisão está associada historicamente, a doenças como AIDS e tuberculose, à violação do direito à integridade física, e mesmo à violação ao direito à vida, de forma mais contundente do que ocorre com a população em geral.

A situação de encarceramento, como ocorre na maior parte dos lugares, traz inúmeros riscos aos direitos das pessoas encarceradas, com grande destaque para o direito à vida. Ao se compararem as taxas de pessoas mortas por 100 mil habitantes na população em geral e nas prisões, destaca-se uma diferença em que a primeira é mais de três vezes maior que a segunda. Pode-se argumentar que o recursos compatíveis com aqueles que seriam necessários para a garantia desses direitos. A situação de prisão está associada historicamente, a doenças como Aids e tuberculose, à violação do direito à integridade física, e mesmo à violação ao direito à vida, de forma mais contundente do que ocorre com a população em geral. O perfil da população prisional é predominantemente jovem e comparar apenas as taxas entre as pessoas presas e os grupos populacionais mais jovens. A taxa que mais se aproxima daquela observada no sistema prisional é a da população de jovens (15 a 29 anos) negros e ainda assim a taxa no sistema prisional é de quase 13 pessoas mortas a mais para cada 100 mil pessoas.

Outra notória consequência do Encarceramento é a incidência de tuberculose, dadas as condições de confinamento de um grande número de pessoas em lugares que nem sempre têm condições de infraestrutura adequada e facilitam a disseminação da doença. Segundo dados do Portal da Saúde15, pessoas privadas de liberdade têm, em média, uma chance 28 vezes maior do que a população em geral de contrair tuberculose. O único grupo identificado como mais suscetível à tuberculose é o de pessoas em situação de rua, com 32 vezes maior chance de contrair a doença. De acordo com Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde16, estima-se aproximadamente 734 mil pessoas vivendo com HIV/aids em 2014, o que corresponde a uma taxa de prevalência de 0,4%. Ou seja, de cada 100 habitantes, 0,4 vivem com HIV/aids . De acordo com os dados informados sobre as pessoas privadas de liberdade com agravos transmissíveis em 31/12/2014, podem-se estimar as seguintes taxas de prevalência no sistema prisional:

Tabela 1. Pessoas com agravos transmissíveis em dezembro de 2014

Agravo

Homens

Mulheres

Total

Taxa de prevalência (por 100 mil hab.)

HIV

6.692

720

7.412

1,30%

Sífilis

2.388

590

2.978

0,50%

Hepatite

3.069

291

3.360

0,60%

Tuberculose

5.313

221

5.534

0,90%

Outros

2.094

644

2.738

0,50%

Fonte: DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL (infopem) 8

Os dados nos permitem afirmar que, a cada 100 pessoas presas em dezembro de 2014, 1,3 viviam com HIV. Da mesma forma, 0,5% da população prisional vivia com sífilis, 0,6% com hepatite, 0,9% com tuberculose e 0,5% com outras doenças. É preciso ressaltar que as taxas acima apresentadas não podem ser tomadas como taxas de incidência de doenças, uma vez que a incidência deve ser calculada à partir do número de casos novos de determinada doença surgidos no mesmo local e período.

Os casos informados pelos gestores prisionais não nos oferecem a informação sobre período de incidência da doença, ou seja, indicam apenas a quantidade de casos que prevalecem em um momento considerado e, portanto, tratam-se de prevalências.

Tabela 2. Taxa de agravos transmissíveis por 10 mil pessoas presas no segundo semestre de 2014

UF

HIV

Sífilis

Hepatite

Tuberculose

Outros

AC

14,14

96,61

51,84

96,61

2,36

AL

10,80

0,00

0,00

3,60

0,00

AM

233,30

230,76

24,09

273,87

54,52

AP

247,84

1070,22

2399,55

33,80

1126,55

BA

277,57

257,16

16,33

61,23

21,23

CE

20,84

18,99

3,24

61,23

21,25

DF

104,42

73,32

76,28

22,96

17,03

ES

76,12

91,70

40,76

28,77

52,74

GO

44,81

33,12

20,13

14,29

128,59

MA

136,67

41,76

20,88

586,56

277,15

MG

97,09

58,93

52,18

20,41

27,87

MS

102,74

65,24

72,74

122,98

101,24

MT

71,02

48,33

78,91

198,26

84,83

PA

80,28

28,43

3,35

129,62

1,67

PB

86,36

78,69

19,19

104,60

3,84

PE

95,12

46,25

19,77

243,95

14,17

PI

91,14

62,85

22,00

53,43

6,29

PR

110,60

49,45

28,18

44,13

4,25

RJ

44,66

9,68

3,23

83,12

23,82

RN

24,92

19,67

44,60

73,45

0,00

RO

46,91

56,09

44,87

28,55

84,64

RR

122,22

18,70

18,70

31,17

149,63

RS

530,13

56,18

130,13

237,16

6,76

SC

197,88

45,16

46,95

129,55

229,38

SE

34,07

0,00

0,00

68,14

0,00

SP

129,41

28,32

59,45

79,16

37,77

TO

46,38

28,54

7,14

10,70

10,70

BRASIL

126,82

50,96

57,46

94,67

46,85

Fonte: DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL (infopem)

Também é importante ser cauteloso na leitura dos dados para as UF: é possível que uma alta prevalência de HIV seja explicada por procedimentos de controle e diagnósticos de saúde mais eficientes o que indicaria maior qualidade nos serviços de saúde prisional. Os casos informados pelos gestores prisionais não nos oferecem a informação sobre período de incidência da doença, ou seja, indicam apenas a quantidade de casos que prevalecem em um momento considerado e, portanto, tratam-se de prevalências.

Também é importante ser cauteloso na leitura dos dados para as UF: é possível que uma alta prevalência de HIV seja explicada por procedimentos de controle e diagnósticos de saúde mais eficientes o que indicaria maior qualidade nos serviços de saúde prisional.

Sendo assim, percebe-se uma contradição entre a legislação e a prática. Enquanto a Constituição Federal e a Lei de Execução Penal asseguram o direito à saúde, há uma grande lacuna para a efetivação do direito à saúde para com os presidiários. (ARRUDA et al,2015)

Em 2014, foram registrados pelo MS 5.367 novos casos de TB na população privada de liberdade no Brasil. Também foi observada elevada frequência de formas resistentes relacionadas ao tratamento irregular e à detecção tardia nesse grupo populacional. Desde o ano de 2007, foi incluída a variável no campo institucionalizado com a categoria presídio na ficha de notificação do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde.


7. OS DIREITOS DO PRESO SEGUNDO A LEI DE EXECUÇÕES PENAIS - LEP

O preso adquiriu o status jurídico de sujeito de direitos. Trata-se de conquista histórica, obtida graças ao desenvolvimento do princípio da humanidade, que começou a firmar-se no inicio do século XX. A pessoa presa deixou de ser vista como objeto da execução penal ou do processo. A principal consequência dessa condição para o condenado e para preso provisório foi a afirmação de suas respectivas humanidades, isto é, o reconhecimento de que são seres humanos, todavia, presos, um status que lhes é inalienável, por mais arrepiante que seja o crime praticado pelo condenado, por mais repulsivo que seja o delito do qual o preso é acusado. A segunda consequência mais importante é a de que o preso passou a manter com o Poder Público que o custodia uma “relação jurídica de especial sujeição”. Ou seja, o preso tem direitos perante a administração carcerária e deveres que deve observar, estando sujeito às determinações da administração penitenciária. (PINTO, 2012)

Não é simples, nem é fácil a introjeção desses novos conceitos. No Brasil, em fins dos anos 70, e, portanto, em fins da ditadura militar, surgiu espaço político para a discussão aberta sobre a condição dos indivíduos presos. Essa abertura para o diálogo possibilitou a promulgação da Lei de Execução Penal (LEP), que dispõe sobre a execução das penas, tanto administrativamente, como judicialmente. (PINTO,2012)

Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foram inseridos no art. 5º diversas garantias para a pessoa presa. É importante lembrar que o art. 5º da Constituição Federal traz extenso rol de garantias de todo e qualquer cidadão contra o Estado, e por isso são denominados “direitos e garantias fundamentais”. (PINTO, 2012)

São as seguintes as garantias do preso inscritas no art. 5º:

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens serem, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

e) suspensão ou interdição de direitos;

XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;

b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados;

d) de banimento;

e) cruéis;

XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;

LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença. (BRASIL, 1988)

Tais garantias, por possuírem nível constitucional, compõem a mais alta esfera de direitos no Brasil. Além dessas garantias, existem outras, decorrentes de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e que possuem nível constitucional.

A Lei nº 7.210/1984 - Lei de Execução Penal assegura, em seu capítulo II, assistência ao preso, determinando que o recluso tenha direito à alimentação, vestuário, instalações higiênicas, além de atendimentos de saúde – médico, odontológico e farmacêutico, assistência jurídica, educacional, social e religiosa, além de acompanhamento ao egresso e assistência à família. (BRASIL,1984)

No entanto, o que se tem visto são constantes ofensas a tais preceitos, sendo tais agravos, segundo Carvalho Filho, a principal causa das rebeliões nos estabelecimentos prisionais. Quanto ao descumprimento da Constituição Federal, dos Tratados Internacionais e da LEP, a comunidade científica – de modo geral – aponta o fato de que o Brasil ainda é considerado uma democracia jovem. (PINTO,2012)


CONCLUSÃO

De acordo com o presente trabalho vimos que a Constituição Federal “assegura aos presos o respeito à integridade física e moral”, porém o que vimos é que o Estado não garante que esse direito de fato seja exercido as pessoas que são privadas de liberdade. E junto com este fato observamos o fracasso do sistema prisional que não cumpre seu papel perante a lei que é de reeducar e ressocializar o preso. Com isso o preso que já tem uma pena a cumprir, pena esta cumprida em condições precárias e subumanas e em muitas vezes com extrema violência e em celas superlotadas, acabam contraindo a tuberculose, doença infecciosa que é transmitida pelas vias respiratórias e facilmente transmitida em locais de precárias condições de vida. Isso faz com que o detento tenha uma pena a mais do que a decretada em seu julgamento, e esta sobrepena acarreta sequelas durante todo o resto de sua vida.

Com isso conclui se que o Poder público deve colocar em prática soluções que ajudem a atingir os objetivos da pena e respeitar o direito de cada ser humano.


REFERÊNCIAS

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SILVA, Tatiane Aguiar Guimarães, O Preso e o Direito Fundamental a Saúde. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 25 jan. 2011. Disponível em: <https://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.31019>. Acesso em 28 nov. 2016.


ANEXOS

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRELIMINAR. MÉRITO. MORTE DE EX-PRESIDIÁRIO POR TUBERCULOSE. CONTRAÇÃO DA DOENÇA NO PERÍODO DE ENCARCERAMENTO. AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. DEVER DE INDENIZAR. DANOS PATRIMONIAIS E EXTRAPATRIMONIAIS. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.

I - PRELIMINAR.

Sendo o juiz o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir acerca da necessidade de sua realização para a formação do seu convencimento. Entendendo suficientes os elementos trazidos aos autos para bem julgar, pode dispensar as diligências requeridas pelos litigantes, estando autorizado pelo sistema processual pátrio, que consagra o princípio da livre admissibilidade da prova. O juiz é livre para se convencer quanto ao direito e à justiça da solução a ser dada ao caso concreto.

II - MÉRITO.

1. O Estado deve prestar assistência à saúde dos detentos, na forma da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84). Caso em que a prova dos autos indica que o presidiário contraiu a doença durante o período de encarceramento; e que o Estado, embora ciente do mal, deixou de prestar assistência à saúde do preso, que faleceu pouco após a obtenção da liberdade. Aplicação da teoria do módulo reduzido da prova.

2. Danos emergentes indenizáveis, na forma do artigo 948, I, do Código Civil.

3. Pensionamento devido. Relevado, como parâmetro, o salário mínimo. Termo final. Em relação à autora-esposa, data em que completar 70 (setenta) anos de idade, conforme pedido expresso, sendo inaplicável a expectativa de vida do falecido, sob pena de julgado ultra petita. Em relação ao autor-filho, data em que completar 25 (vinte e cinco) anos de idade. Presunção de que o falecido utilizaria 1/3 de seus ganhos com gastos próprios.

4. Dano moral existente, relevado o caráter in reipsa. Valor da indenização fixado de acordo com as circunstâncias do caso concreto e os precedentes.

III - SUCUMBÊNCIA.

Revisão, na forma dos artigos 20 e 21 (parágrafo único) do Código de Processo Civil.

PRELIMINAR REJEITADA. APELO PROVIDO PARCIALMENTE. UNÂNIME.

(Apelação Cível Nº 70052438314, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO. TUBERCULOSE. FALHA DO ESTADO.RESPONSABILIDADE OBJETIVA. O Estado responde objetivamente por eventuais danos causados, seja de ordem moral ou material, porque incide a teoria do risco objetivo da administração. Mesmo em se tratando de conduta omissiva pela inoperância estatal no cumprimento de um dever prestacional, a responsabilidade estatal dá-se de forma objetiva, na esteira do disposto no art. 37, §6º, da Constituição Federal. Hipótese dos autos em que o Estado falhou com o dever de garantir a vida e a integridade física do de cujus na medida em que, após contrair tuberculose dentro do Presídio Central, não recebeu atendimento médico adequado para o tratamento da moléstia, inobstante os diversos pedidos de seus familiares, culminando no seu óbito.

DANO MORAL IN RE IPSA CONFIGURADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. Dano moral in reipsa. Valor da condenação (R$ 25.000,00 para cada um dos autores) fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, além da natureza jurídica da indenização.

PENSAO MENSAL. VIÚVA. VALOR. TERMO FINAL. Pensão mensal em favor da viúva coautora correspondente a 2/3 do valor percebido mensalmente pelo de cujus, devida até a idade em que a vítima completaria 77 anos de idade, com base na expectativa média de vida.

DESPESAS COM FUNERAL. RESSARCIMENTO. Condenação ao ressarcimento das despesas comprovadamente havidas com o funeral do de cujus.

APELOS PROVIDOS. UNÂNIME.

(Apelação Cível Nº 70051667269, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 27/02/2013)


Notas

1 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2005.

2 ARRUDA, AJCG de, OLIVEIRA MHB de, GUILAM MC et al. Direito a Saúde no Sistema Prisional: Revisão Integrativa. Ver enferm UFPE, Recife, 7(esp.): 6646-54, Nov. 2013.

3 SILVA, Tatiane Aguiar Guimarães. O Preso e o Direito Fundamental a Saúde. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF:25 jan. 2011. Disponível em https://conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.31019&seo=1 Acesso em 28 out. 2016.

4 SILVA, Antonia Giselda Santos da. MARTINS, Dalva Araújo. Ocorrência de tuberculose registrada no sistema de informação de agravos de notificação para município de Rio branco – AC. Fameta, 16 abr. 2008.

5 BOMBADA, S. FIGUEIREDO, CM. FUNARI, MBG. SEISCENTOS, M. FILHO, MT. Jornal de Pneumologia.Vol.27 no.6 São Paulo Nov./Dec. 2001. Disponível em: https://www.scielo.br. Acessado em: 29 out. 2016.

6 PERDIGÃO, Paula. Pneumologista consultora. Manual Clínico de Tuberculose, Apoio aos Cursos Clínicos Moçambique, 2008.

7 CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS DESUMANOS OU DEGRADANTES (1984). Tratado internacional. Disponível em: https://www.pge.sp.gov.br. Acesso em 30 out. 2016.

8 Levantamento Nacional de INFORMAÇÕES PENITENCIÁRIAS INFOPEN – dezembro 2014.


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