Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/54715
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Medidas assecuratórias e provas no âmbito do processo penal

Medidas assecuratórias e provas no âmbito do processo penal

|

Publicado em . Elaborado em .

INTRODUÇÃO 

O presente trabalho visa apresentar os conceitos apresentados pela doutrina acerca de assuntos como as medidas assecuratórias, provas, meios de provas e os sujeitos do processo penal. Está organizado em quatro tópicos principais, sendo estes os grandes grupos a serem estudados, e seus consequentes subtópicos, que vêm a desenvolver o assunto em questão.

O primeiro tópico, de nome “medidas assecuratórias”, expõe de maneira clara e objetiva o tema proposto, a partir de uma análise atual exposta nos subtópicos “sequestro”, “hipoteca legal” e “arresto”. O tópico denominado “provas”, desenvolve o tema em três subtópicos, sendo estes o conceito; a classificação das provas quanto ao objetivo, sujeito, forma, possibilidade de renovação em juízo, momento procedimental, previsão legal e finalidade; e os princípios da prova. O tópico subsequente, denominado “meios de prova”, aborda várias formas de percepção da verdade e formação do convencimento, tais como a prova pericial, a confissão e a interceptação telefônica, trazendo o conceito de cada uma destas formas e o embasamento legal para a aplicação de tais meios ao processo. Culmina com o tópico “sujeitos do processo penal”, o qual apresenta uma abordagem a respeito dos sujeitos do processo, sejam eles principais ou acessórios, bem como frisa que os sujeitos do processo não se resumem àqueles que se encontram somente na relação processual, mas também aos que de alguma forma interferem no processo. O referido tópico versa sobre o papel de cada um dos sujeitos no processo penal, suas funções e contribuições ao processo, assim como a ocasião em que devem figurar e suas contribuições à busca pela verdade processual.

A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, enriquecida com a análise de uma audiência de instrução e julgamento, especificada com detalhes no relatório que acompanha o trabalho.  


1.    MEDIDAS ASSECURATÓRIAS

As medidas assecuratórias podem ser definidas como providências tomadas no decorrer do processo criminal, com o intuito de garantir o ressarcimento pecuniário da vítima da infração penal e evitar o lucro do acusado com a prática criminosa. Além disso, as medidas assecuratórias são utilizadas para o pagamento das custas processuais e de eventuais multas. Portanto, são medidas de caráter instrumental, uma vez que têm como finalidade impedir o prejuízo que teria em virtude da demora na conclusão da ação penal. Existem três espécies de medidas assecuratórias: o sequestro, a hipoteca legal e o arresto.

        1.1 Sequestro

O sequestro, como leciona Nucci, consiste em reter os bens móveis ou imóveis do indiciado ou acusado, ainda que em poder de terceiros, quando adquiridos com o proveito da infração, de modo que este não venha se desfazer de tais bens no decorrer da ação penal, visando viabilizar a indenização da vítima ou impossibilitar que o agente criminoso se beneficie com a prática delituosa.

De acordo com o Código de Processo Penal o sequestro pode ser decretado tanto na fase do inquérito policial quanto ao longo doa ação penal (art. 127 CPP), recaindo sobre os bens imóveis ou móveis adquiridos pelo acusado ou indiciado em virtude da infração penal, como dispõe o art. 125 do CPP: “caberá sequestro dos bens imóveis adquiridos pelo indiciado com os proventos da infração, ainda que tenham sido transferidos a terceiros”.

Além disso, para a determinação do sequestro, é necessária apenas a existência de indícios veementes da proveniência ilícita, não se exigindo, portanto, uma prova cabal e inequívoca em relação a isso (art. 126 CPP). Entretanto, como bem lembra Nestor Távora, “a ordem de sequestro deve permitir conhecer o motivo pelo qual o objeto ou os objetos que carecem da cautela estão vinculados à atividade ilícita, sua importância como prova, bem como indicar precisamente qual o alcance do sequestro”.

Igualmente, o sequestro poderá ser decretado somente pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou do ofendido, bem como, mediante representação da autoridade policial. Após efetividade a medida assecuratória o art. 128 do CPP ordena sua inscrição no Registro de Imóveis, a fim de tornar pública a restrição, garantir a eficácia do provimento condenatório final, assim como, proteger o interesse de terceiro contra uma possível evicção.

O sequestro também poderá ser embargado, ou seja, admitirá o procedimento contraditório através de uma peça autônoma, que poderá ser realizado pelo próprio acusado, concedendo-lhe o direito de provar que tais bens não foram adquiridos a partir dos proventos da atividade delituosa, ou por terceiro, nesse caso, tem-se como fundamento o fato de que o bem foi adquirido onerosamente e de boa-fé. É importante salientar que o art. 130, parágrafo único, assevera que nos embargos, não poderá ser pronunciada decisão antes de passar em julgado a sentença condenatória.

Nos termos do art. 131 do CPP, o sequestro poderá ser levantado, ou seja, o sequestro como se trata de uma medida acautelatória poderá ser revogada ou substituída, quando apresentar qualquer das hipóteses expressas no art.131 do CPP. Primeiramente o levantamento poderá ocorrer caso a ação penal não for intentada no prazo de 60 dias, contados da data de sua efetivação (não de sua inscrição no Registro de Imóveis), uma vez que, deve-se concluir que não houve prova suficiente do crime ou indícios da autoria. Contudo, existem decisões afirmando que havendo justo motivo para a demora na propositura da ação penal, não caberá o levantamento. A segunda hipótese ocorre caso o terceiro, a quem tiver sido transferido os bens, prestar caução, garantindo o ressarcimento dos danos causados pelo delito e a terceira situação de levantamento ocorre nos casos em que for extinta a punibilidade ou  o réu for absolvido por sentença judicial transitada em julgado.

Uma vez transitada em julgado a sentença condenatória, como dispõe o art. 133 do CPP, o juiz, de ofício ou mediante o requerimento do interessado, deverá determinar a avaliação e venda dos bens em leilão público, sendo que, o dinheiro apurado será destinado ao Tesouro Nacional, no que não couber ao lesado ou ao terceiro de boa-fé.

Por fim, deve-se salientar quanto ao sequestro de bens móveis, é necessário bastante atenção, pois quando os bens forem produtos diretos do crime não caberá o sequestro, mas sim a medida de busca e apreensão prevista no art. 240 do CPP. Porém se for considerado provento da infração, estará sujeito ao sequestro. Além disso, ressalte-se que caberá o recurso de apelação para q sentença que concede ou nega o sequestro.

        1.2 Hipoteca Legal

A hipoteca legal é uma medida assecuratória que visa “assegurar a indenização do ofendido pela prática do crime, bem como ao pagamento das custas e defesas processuais” (NUCCI, 2008, p.319). Diante disso, cabe ressaltar que o Código Civil, no art. 1489, inciso III, afirma que lei concede hipoteca ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinquente, para a satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais.

De acordo com o art. 134 do CPP, a hipoteca legal é uma medida processual, ou seja, é cabível apenas na fase processual, uma vez que sua redação dispõe: “a hipoteca legal sobre os imóveis do indiciado poderá ser requerida pelo ofendido em qualquer fase do processo, desde que haja certeza da infração e indícios suficientes da autoria”. Nesse ponto, é importante destacar uma crítica à confusão contida no texto legal do referido dispositivo, pois se utiliza o termo indiciado, quando o correto seria réu, já que trata-se de uma medida tipicamente processual. Ademais, Mirabete alerta ao fato de que alguns tribunais vêm entendendo que é a especialização da hipoteca legal pode ocorrer antes do início da ação penal. Além disso, os legitimados para requerer tal medida são: o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros e excepcionalmente o Ministério Público.

O procedimento seguido na inscrição da hipoteca legal está expresso no art. 135 do CPP, onde a especialização da hipoteca legal ocorre “mediante requerimento, em que estimará o valor da responsabilidade civil, e designará e estimará o imóvel ou imóveis que terão de ficar especialmente hipotecados”. Após o juiz receber o pedido, irá mandar proceder ao arbitramento do valor da responsabilidade e a avaliação do imóvel ou imóveis. Além disso, o pedido dessa medida assecuratória deverá ser acompanhado das “provas ou da indicação das provas em que se fundar a estimação da responsabilidade, com relação dos imóveis que o responsável possuir, se outros tiver, além dos indicados no requerimento e com os documentos comprobatórios do domínio (art. 135. § 1º do CPP).  O prazo para o juiz ouvir as partes é de dois dias (art. 135, §3º do CPP). Por fim o juiz irá proferir a decisão, autorizando “somente a inscrição da hipoteca do imóvel ou imóveis necessários à garantia da responsabilidade” (art. 135, §4º do CPP). É importante salientar que a especialização da hipoteca poderá ser cancelada caso o réu seja absolvido ou quando extinta a punibilidade por sentença irrecorrível. Por fim, passando em julgado a sentença condenatória, os autos serão remetidos ao juiz cível. (art. 143 do CPP), cabendo o recurso de apelação contra a decisão que concede ou nega a especialização da hipoteca legal.

        1.3 Arresto

O arresto consiste na retenção de qualquer bem do acusado, com a finalidade de assegurar à vítima o ressarcimento do dano, evitando-se a dissipação do patrimônio do acusado.

Conforme o art. 136 do CPP, o arresto de bens imóveis poderá ser decretado de início, podendo ser revogado caso não for promovido o processo de inscrição da hipoteca legal no prazo de 15 dias. Há também a possibilidade de arresto de bens móveis penhoráveis, nos termos em que é facultada a hipoteca legal dos imóveis, no caso do responsável não possuir bens imóveis ou quando possuir o seu valor não for suficiente (art. 137 do CPP), portanto o arresto de bens móveis é considerado uma medida residual.

O processo de especialização do arresto, bem como, o da hipoteca legal correrão em auto apartado (art. 138 do CPP). Quanto ao levantamento ou cancelamento do arresto, ocorrerá em virtude da absolvição do réu ou extinção da punibilidade por sentença irrecorrível. Passando em julgado a sentença condenatória os autos tanto da hipoteca quanto do arresto serão remetidos ao juiz cível.

O Ministério Público tem legitimidade para promover a especialização do hipoteca legal sobre bens imóveis, já do arresto sobre bens móveis, nos casos em que houver interesse da Fazenda Pública, ou se o ofendido for pobre e requerer (art. 142 do CPP). Entretanto cabe salientar que neste último caso a legitimidade do Parquet ocorre somente se não houver Defensoria Pública devidamente estruturada. Ademais, o Ministério Público não deverá mais atuar sobre os interesses da Fazenda Pública, uma vez que cada ente federativo possui o seu próprio órgão de advocacia pública.

Finalmente, os autos do arresto serão remetidos ao juiz cível, como leciona Nestor Távora: “como a sentença condenatória penal é título executivo judicial na esfera cível, as pretensões de ressarcimento serão resolvidas nesse juízo”. E ao contrário das demais medidas assecuratórias, não cabe recurso específico da decisão que concede ou nega o arresto, mas admite-se o mandado de segurança.


2.   PROVAS

        2.1. Conceito

Segundo Fernando Capez (2012, p. 360), “prova é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz [...] e por terceiros, destinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação.”

Trata-se de um tema muito importante, uma vez que a produção de provas destina-se a formação do convencimento do magistrado. Deve ser fruto do contraditório, oportunizando a participação do interessado; observada a legitimidade, tendo em vista a vedação, pelo nosso ordenamento, de provas ilícitas; e, em regra, produzida no curso do processo.

Para Nucci:

Há fundamentalmente três sentidos para o termo prova: a) ato de provar: é o processo pelo qual se verifica a exatidão ou a verdade do fato alegado pela parte no processo (ex.: fase probatória); b) meio: trata-se do instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo (ex.: prova testemunhal); c) resultado da ação de provar: é o produto extraído da análise dos instrumentos de prova oferecidos, demonstrando a verdade de um fato. (2010, pag.384).

2.2 . Classificação

A prova pode se classificar de diferentes maneiras, segundo o critério analisado. A doutrina de Capez relaciona a classificação da prova quanto ao objeto, efeito ou valor, sujeito ou causa, forma ou aparência. Nestor Távora, ainda cita outros quatro critérios, os quais sejam a possibilidade de renovação em juízo, o momento procedimental, a previsão legal e a finalidade. Considerando as duas doutrinas, têm-se:

a) Quanto ao objeto:

- direta: refere-se diretamente ao fato probando, evidenciando a afirmação de tal fato de forma positiva. Ex.: testemunha visual

- indireta: leva-se em consideração fatos de natureza secundária, objetivando negar o que aconteceu, trata-se, portanto, de uma prova negativa.

b) Quanto ao efeito ou valor:

- plena: é aquela necessária para a condenação, a que possibilita um juízo de certeza do julgador.

- não plena: não há a certeza, mas apenas uma probabilidade; é limitada quanto à profundidade.

c) Quanto ao sujeito ou causa:

  - real: emerge do fato; refere-se a uma coisa externa. Ex.: cadáver.

- pessoal: oriundas da pessoa. Ex.: depoimento.

d) Quanto à forma ou aparência:

- testemunhal: expressa pela afirmação de uma pessoa. Ex.: interrogatório

- documental: expressa através de documentos. Ex.: contrato.

- material: obtida por meio de químico, físico ou biológico. Ex.: exame de corpo de delito

e) Quanto à possibilidade de renovação em juízo:

- repetível: é aquela que pode ser renovada em juízo

- irrepetível: é aquela realizada em provas que se exaurem rapidamente, exigindo que a produção probatória seja feita rapidamente, sob pena de que tal prova possa ser destruída.

f) Quanto ao momento procedimental:

- cautelar preparatória: é produzida antes do processo penal.

- cautelar incidental ou antecipação probatória: produzida no curso do processo penal.

g) Quanto à previsão legal:

- nominada: ocorre quando a legislação prevê o meio de prova.

- inominada: é aquela em que não há previsão legal, no entanto, não é vedada pelo ordenamento jurídico.

h) Quanto à finalidade:

- anômala: ocorre quando há um desvio de finalidade. Não é observado o meio legal mais apropriado, sendo substituído por outro menos eficaz.

- irritual: é aquela desprovida de conformação típica, pois não atende o rito legal.

- material: é aquela que corporifica a demonstração do fato. Ex.: instrumento do crime.

2.3. Princípios

São princípios da prova:

a)    Autorresponsabilidade das partes: a produção de provas é reponsabilidade das partes, devendo assumir a consequência se erros, inatividade ou atos intencionais.

b)    Audiência contraditória: deve ser oportunizada a manifestação da parte contrária, não sendo admissível a produção de uma delas sem o conhecimento da parte contrária.

c)    Oralidade: deve-se predominar a palavra falada. Ex.: depoimentos

d)    Imediatidade do juiz: decorre do princípio da oralidade. Aproxima o magistrado do contexto probatório, uma vez que as provas são produzidas perante a autoridade.

e)    Concentração: também é expressão do princípio da oralidade. Busca-se concentrar a produção de provas em uma audiência uma. Caso não seja possível, no menor número delas.

f)     Publicidade: os atos devem ser públicos. Admite-se o sigilo, entretanto, em casos excepcionais.

g)    Livre convencimento motivado: o magistrado possui liberdade para decidir, devendo, no entanto, se limitar aos fatos e circunstâncias constantes nos autos.

h)   Aquisição ou comunhão: a prova pertence ao processo. Deve-se considerar o interesse da justiça.


3.   MEIOS DE PROVA

Os meios de prova são os recursos de percepção da verdade e formação do convencimento. É tudo aquilo que pode ser utilizado, direta ou indiretamente, para demonstrar o que se alega no processo. Desse modo, o Código de Processo Penal (CPP) não traz de forma exaustiva todos os meios de prova admissíveis, ou seja, podemos utilizar as provas nominadas, que são aquelas disciplinadas na legislação, trazidas nos arts. 158 a 250 do CPP, e também as inominadas, que constituem aquelas ainda não normatizadas (atípicas).

        3.1. Prova Pericial

O juiz não tem a possibilidade de conhecer toda e qualquer matéria que lhe é posta para julgamento, tamanha a diversidade e complexidade, por vezes, de tais questões. Então surge a necessidade de se valer de técnicos dotados de conhecimentos teóricos quando a matéria fuja do âmbito do conhecimento jurídico do juiz. Esses profissionais são os peritos, responsáveis pela prova pericial.

As perícias, como regra, passam a ser realizadas por um perito oficial, isto é, pessoa que integra os quadros do próprio Estado, e portador de diploma de curso superior, sendo-lhes assegurada autonomia técnica, científica e funcional. É fundamental o nível universitário, sendo pré-requisito necessário para aqueles que almejam ingressar nos quadros da polícia técnica. Sendo perito oficial é necessário apenas um profissional para análise do caso e elaboração do laudo, e a exigência de dois peritos fica suprimida. Na ausência de perito oficial, a autoridade pode valer-se dos peritos não-oficiais ou juramentados, ou seja, pessoas idôneas, portadoras de curso superior preferencialmente na área específica, com habilitação técnica relacionada à natureza do exame, que serão no caso concreto, nomeadas e compromissadas a bem e fielmente desempenharem o seu cargo. Estes continuam sendo em número de dois. 

A realização da perícia vai culminar na elaboração do laudo, que deve ser produzido no prazo de dez dias, comportando prorrogação, em casos excepcionais, a requerimento dos peritos e mediante autorização da autoridade. O laudo concatena tudo o que foi observado pelos peritos, sendo o produto da análise técnica, podendo ser datilografado, e devendo ser subscrito e assinado pelos peritos, e, se presente, pela autoridade. A perícia poderá ser autorizada pela autoridade policial ou judiciária, ex officio ou por provocação. Ressalvado o exame de corpo de delito, que não pode ser denegado quando a infração deixe vestígios, as demais perícias, se não necessárias ao esclarecimento da verdade, poderão ser indeferidas pela autoridade.

Quanto à apreciação dos laudos periciais, o juiz não fica vinculado à conclusão da prova pericial, segundo dispõe expressamente o art. 182 do CPP. O julgador pode aceitar ou rejeitar o laudo, no todo ou em parte, afinal, o juiz é livre para decidir, desde que o faça de forma motivada.

       3.2. Interrogatório do Acusado

Pode-se definir o interrogatório como sendo a resposta dada pelo acusado às perguntas que lhe são formuladas, para esclarecimento do fato delituoso e suas circunstâncias. Terá o imputado contato com a autoridade, o que lhe permite indicar provas, confessar a infração, delatar outros autores, apresentar as teses defensivas que entenda pertinente, ou valer-se, se lhe for conveniente, do direito ao silêncio.

Desse modo, o interrogatório reveste-se de enorme importância já que consiste na única oportunidade em que o réu, de viva voz, no exercício de sua autodefesa, pode apresentar sua versão dos fatos para o juiz, ou seja, é o único momento processual em que ocorre uma audiência entre o acusado e o julgador. Por conta disso, diz o art. 185 do CPP, pode ser realizado a qualquer momento, havendo possibilidade, ainda, de ser renovado pelo juiz (art. 196). Configurando sua falta nulidade absoluta (art. 564, III, e).

Quanto à natureza jurídica do ato, à essência do instituto, destacam-se posições diferenciadas. Parte da doutrina considera o interrogatório como um meio de defesa, já que o acusado pode se calar, sem que tal silêncio importe em qualquer prejuízo a ele e não é obrigado a dizer a verdade. Outros entendem que o interrogatório é um meio de prova, porque colocado no Código de Processo Penal no capítulo que trata das provas e como tal considerado pelo julgador ao formar sua convicção. Contudo, parece ganhar força, segundo a doutrina mais moderna, uma posição intermediária, que confere um caráter misto à natureza jurídica do interrogatório. Ele é meio de defesa e fonte de prova, visto que o acusado tem a oportunidade de oferecer sua versão para os fatos ao tempo em que o juiz pode colher, do interrogatório, valiosos dados que serão utilizados no momento de proferir a sentença.

Apontam-se algumas características próprias do interrogatório. Assim, ele é marcado pela publicidade, isto é, assim como os demais atos judiciais, ele é público, realizado de portas abertas. Ressalvada a exceção tratada no § 1º, do art. 792 do CPP, quando o juiz, percebendo a inconveniência da presença do público, poderá limitar o ingresso de pessoas à audiência. É também um ato personalíssimo, na medida em que somente o próprio réu pode a ele submeter-se, vedada, assim, a possiblidade de sua realização através de representação. O interrogatório é ainda contraditório, quando admite a intervenção das partes (art. 188). A oralidade é outra característica do interrogatório, tendo em vista que consiste no único ato processual no qual o réu pode, de viva voz, dar ao juiz sua explicação para os fatos que se lhe imputam.

3.3. Confissão

Consiste na admissão por parte do suposto autor da infração, de fatos que lhe são atribuídos e que lhe são desfavoráveis. O reconhecimento da infração por alguém que não é sequer indiciado não é tecnicamente confissão, e sim autoacusação. Confessar é reconhecer a autoria da imputação ou dos fatos objeto da investigação preliminar por aquele que está no polo passivo da persecução penal. Desse modo, com relação a sua natureza jurídica, pode ser classificada como um meio de prova admissível para a demonstração da verdade dos fatos.

Classifica-se a confissão como simples ou qualificada. Simples quando o acusado limita-se a admitir a prática do crime e qualificada quando, embora confessando o delito, invoca algum benefício em seu favor, capaz de excluir o crime ou diminuir-lhe a pena. Pode ser judicial, quando produzida em juízo, ou extrajudicial, quando formulada fora dos autos da ação penal, geralmente na fase de inquérito policial. Fala-se, ainda, em confissão explícita, quando o agente admite, expressamente, ser o autor do delito. Ou implícita, quando o autor busca ressarcir, à vítima, os danos oriundos do crime que cometeu.

Outras das características da confissão estão previstas no art. 200 do CPP. A primeira delas é a retratabilidade, ou seja, a possibilidade que tem o agente de desdizer o que dissera anteriormente, de retirar a confissão anterior. É comumente utilizada quando, em juízo, o acusado volta atrás em relação ao que dissera antes, ao ser interrogado na fase policial. A outra característica é a divisibilidade, isto é, o teor da confissão pode ser desmembrado, tomado em partes, já que o magistrado pode se convencer de parte do que foi admitido, e desconsiderar o restante. Por fim, vale ressaltar que a confissão do réu serve para configurar a circunstância atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal.

3.4. Perguntas ao Ofendido

O ofendido é o titular do direito lesado ou posto em perigo, é a vítima, sendo que suas declarações, indicando a versão que lhe cabe dos fatos, têm natureza probatória. A vítima não se confunde com a testemunha, pois não é previamente compromissada e, se mentir, não responderá pelo crime de falso testemunho, podendo, a depender do caso concreto, praticar o delito de denunciação caluniosa do art. 339 do Código Penal, ou ainda, de comunicação falsa de crime ou contravenção (art. 340 do CP). Ademais, sua oitiva independe do prévio arrolamento pelas partes, sendo que o juiz tem o dever jurídico de ouvi-la.

Embora não sendo uma testemunha, não se ignora o caráter de meio de prova das declarações do ofendido. Devido a isso, considerou o legislador relevante sua oitiva, dedicando-lhe um capítulo próprio na parte concernente à prova e a jurisprudência tem especial apreço pela palavra da vítima. No depoimento do ofendido, vigora o princípio do contraditório e, por isso, é livremente admitido que as partes formulem perguntas dirigidas à vítima em audiência.

        3.5. Prova Testemunhal

Considera-se testemunha a pessoa desinteressada que declara em juízo o que sabe sobre os fatos, em face das percepções colhidas sensorialmente. Ganham relevo a visão e audição, porém, nada impede que a testemunha amealhe suas impressões através do tato e do olfato. Em geral, o testemunho é dado oralmente, e a pessoa declarará, perante o juiz, os fatos que presenciou. É vedado à testemunha levar seu depoimento por escrito, mas ela poderá consultar apontamentos. Além disso, a testemunha deve prestar compromisso de dizer a verdade, caso contrário, poderá ser processada por mentir em juízo, pelo crime de falso testemunho (art. 342 do Código Penal).

As testemunhas devem ser ouvidas individualmente, sendo que o juiz pode, nos termos do artigo 209 do CPP, ouvir a testemunha de ofício. Os depoimentos são reduzidos a termo. Primeiramente o juiz faz as perguntas, posteriormente a acusação e pôr fim a defesa, sendo que tal ordem não pode ser alterada.

Em princípio, toda pessoa pode ser testemunha. No entanto, o artigo 207 do CPP prevê que as pessoas que, em razão da função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo são proibidas de depor, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.

Aponta a doutrina os caracteres da prova testemunhal, sendo eles: judicialidade, ou seja, para que um testemunho seja capaz de fundamentar uma sentença, é preciso que ele tenha sido prestado em juízo, com a observância dos diversos princípios pertinentes ao Processo Penal. Fala-se, ainda, no princípio da objetividade, segundo o qual a participação da testemunha é apenas informativa e não opinativa, razão pela qual deve abster-se de emitir opiniões pessoais sobre os fatos. Outra característica é a oralidade. Assim, é vedado à testemunha que leve seu depoimento previamente escrito, devendo ele ser prestado de viva voz, perante o juiz e os demais sujeitos processuais.

3.6. Do Reconhecimento de pessoas e coisas

Segundo Tourinho Filho, reconhecimento é o “ato pelo qual se faz a verificação e confirmação da identidade de pessoa ou coisa. No reconhecimento há a fusão de uma percepção presente com uma pretérita.” Visa à identificação de acusado, testemunha, ofendido ou objeto. Não existe, no termo, diferenciação do seu significado costumeiro; sua execução, todavia, deve ser cautelosa. Bem lembra o citado autor que a memória humana se distancia das lembranças e detalhes à medida que o tempo decorre, além de estar suscetível a enganos dada a elevada semelhança física existente entre algumas pessoas ou coisas. Por tal razão, assevera o mesmo, ao tratar do reconhecimento de pessoas, que “de todas as provas contidas no nosso diploma processual penal, esta é a mais falha, a mais precária.”

O art. 226 do CPP fixa os atos sequenciados que devem operar-se para o reconhecimento de pessoas, o qual pode ser realizado na fase preliminar ou processual. Ainda que refira-se apenas à pessoa, aplica-se, no que couber, analogicamente, ao de objetos:

  Art. 226.  Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma:

I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;

Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;

III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;

IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.

Parágrafo único.  O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento.

Na circunstância de haver mais de um indivíduo a praticar o reconhecimento, devem eles efetuá-lo separadamente, não permitindo-se, inclusive, sua comunicação.

Os reconhecimentos fotográfico e fonográfico submetem-se aos mesmos requisitos supracitados. Todavia, apesar de sua utilização (principalmente do primeiro), constituem provas perigosas em virtude do alto nível de equivocidade que as rodeia.  Entendem o STF e STJ que sua força probante reside apenas quando analisadas e ponderadas em conjunto com os demais elementos de prova existentes. 

Quando realizado em juízo, o reconhecimento, diverge a doutrina sobre a possibilidade ou não de manter-se escondido quem o fará. Pelos princípios da publicidade, ampla defesa e do contraditório, entende-se pela impossibilidade de aplicar-se o inciso III do art. 226. Em posição oposta, está, a exemplo, Nucci, ao defender que “para que se possa invocar ter havido o reconhecimento de alguém ou de algo, é fundamental a preservação da forma legal. (...) em outros termos, o reconhecimento exige a formalidade (art. 226, C.P.P.)”.

3.7. Acareação

Consiste em pôr em presença, uma da outra, duas ou mais pessoas cujos depoimentos apresentem conflitos entre si, para que expliquem os desconcertos. Segundo Tourinho Filho “não basta, contudo, a simples dissensão; é preciso que esta incida sobre pontos relevantes do fato objeto do processo, ou de alguma de suas circunstâncias importantes”. Pode ser praticada durante a fase preparatória ou processual, não consistindo em diligência obrigatória, mas dependente do juízo da autoridade que a venha ter como necessária, ou do requerimento das partes.

São passíveis de acareação os acusados entre si, acusado e testemunha, testemunhas entre si, acusado e ofendido, testemunha e ofendido, ou mesmo os ofendidos entre si. O procedimento dá-se com a intimação dos acareados, os quais serão postos face a face na presença da autoridade, que, por sua vez, lerá o que fora dito antes por eles, com destaque para os pontos contraditórios, depois indagará, a cada um dos acareados de cada vez, se, considerando a declaração alheia, confirma seu depoimento. A modificação será levada a termo, assinado por todos os participantes do ato e subscrito pelo escrevente. Mantidas as declarações, a autoridade a apenas consignar o que já haviam declarado.

Residindo um dos acareados em outra comarca, o morador daquela onde tramita o processo será chamado para dar esclarecimentos acerca do que declarara, havendo a possibilidade de mudar sua versão. Porém, não vindo isto a ocorrer, será enviada precatória à comarca do ausente, onde o juízo deprecado procederá de forma similar ao deprecante para com o acariado. É uma situação de acareação onde não há simultânea presença física dos indivíduos. Prevê Nestor Távora que “ [..] a acareação, em tais situações, será ordinariamente realizada por videoconferência”.

        3.8. Documentos

Art. 232.  Consideram-se documentos quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares.

Parágrafo único.  À fotografia do documento, devidamente autenticada, se dará o mesmo valor do original.

Para o Código, seriam documentos os escritos em papel (material, substrato de escrito), cabendo citar a esclarecedora distinção ensinada por Tourinho Filho de que “enquanto o instrumento é o escrito pré-constituído para prova (recibo, etc.), os papeis não são, embora eventualmente possam exercer tal função: uma carta, um anúncio etc.”. Tal conceito estrito, porém, não convém aos dias atuais, como bem lembra Nestor Távora e Rosmar Alencar: “ [...] em face da interpretação progressiva da lei, considera-se documento qualquer objeto representativo de um fato ou ato relevante [...], v.g., fotos, desenhos, esquemas, planilhas, e-mails, figuras digitalizadas”.

O documento pode ser público (quando elaborado por funcionário público no exercício de sua função, bem como aqueles que a lei tenha equiparados a estes) ou particulares ( elaborado por particular), originais ( escritos na forma genuína) ou cópias (reprodução do original), nominativos ( contém a indicação da pessoa que produziu o escrito) ou anônimos ( não indica o seu responsável).

A produção de documentos ocorre espontaneamente, quando apresentados pelas partes, ou de forma coacta, quando determinada pelo magistrado (por meio de requisição ou de busca e apreensão), e sua apresentação é permitida, como regra geral, em qualquer fase do processo, sendo apta a parte adversária a manifestar-se sobre a prova. As exceções encontram-se nos artigos 233 e 479 do CPP.  Veda o primeiro o uso de cartas interceptadas ou ilegalmente obtidas como provas, sem obstar, todavia, que o destinatário as apresente em sua defesa, ainda que sem consentimento do signatário. Já o artigo 479 CPP prevê que durante o julgamento no júri, a apresentação de documento se sujeita a sua prévia juntada aos autos com antecedência mínima de 3 dias úteis

A dúvida quanto à autenticidade ou veracidade do documento permite a abertura do incidente de falsidade documental, por meio do qual far-se-á o exame daquele.

Documentos produzidos em língua estrangeira podem ser imediatamente juntados aos autos, mas a sua tradução não é considerada imprescindível. Porém, se necessária, será realizada por tradutor oficial, e, na ausência deste, por pessoa idônea nomeada pelo juiz. Para Távora e Alencar: “ caso o documento seja realmente utilizado, entendemos que a necessidade de tradução é presumida, pois [...] a publicidade dos autos e a necessidade de acessibilidade do conteúdo assim o exigem”.

Findo o processo, e não ocorrendo motivo para que os documentos originais permaneçam nos autos, podem eles ser restituídos, mediante requisição da parte produtora e oitiva do Ministério Público, permanecendo retidas apenas suas cópias. Antes do trânsito em julgado da sentença, e inexistindo necessidade de sua manutenção nos autos, os documentos apreendidos por determinação da autoridade deverão ser restituídos ( art. 118, CPP).

 3.9. Indícios e Presunções

Art. 239.  Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.

Tourinho Filho, em seu CPP comentado, traz o ensinamento de Mittermayer, para quem:

O indício é um fato em relação tão precisa com outro fato, que de um juízo chega a outro por uma conclusão natural. É preciso, então, que haja na causa dois fatos, um verificado e outro não provado, mas que se trata de provar racionalmente do conhecido para o desconhecido; aplicado ao processo criminal, o indício é o fato, circunstância acessória que se prende ao fato principal, e que por isso concorre para se chegar à conclusão, ou de ter sido cometido o crime, ou de ter nele tomado parte um indivíduo determinado, ou de ter sido o crime consumado deste ou daquele modo. (C.J.J.A. Mittermayer, Tratado da prova em matéria criminal, p 361)

Serve à formação do pensamento e da convicção do julgador, o indício, devendo ser considerado em relação a todo o conjunto de provas e demais indícios que hajam sido levantados pelas investigações e pela instrução processual. 

A presunção é, nas palavras de Távora, “ o conhecimento daquilo que normalmente acontece, a ordem normal das coisas, que uma vez positivada em lei, estabelece como verídicos determinados acontecimentos”. Ele constitui regra geral e abstrata sobre eventos.

O indício pode ser positivo (indica a presença de fato ou elemento que se quer provar) ou negativo (aponta a impossibilidade lógica de uma alegação). Já a presunção divide-se em: homnis, aquela que trata de fatos da vida cotidiana; e Juris, a qual é positivada. Esta subdivide-se em presunção relativa (ou juris tantum), quando o fato tido, a priori, como verdadeiro, admite prova em contrário, e presunção absoluta (juris et de jure), quando inadmite prova que contrarie a declaração da lei.

        3.10. Busca e Apreensão

Busca é a procura de objetos ou pessoas realizada pela autoridade competente, ou por mando desta, para fins legais. A apreensão é a medida que sucede a busca. Tendo sido encontrado o bem ou pessoa, far-se-á sua apreensão. A existência de cada momento, porém, não é imprescindível ao outro, de tal modo que é possível a busca se apreensão (quando frustrada a diligência primeira), bem como a apreensão sem busca – a exemplo, o indivíduo que entrega o bem à autoridade.

O Código de Processo Penal arrola tal diligência como meio de prova. Esta classificação, porém, não abarca plenamente as características do instituto. É certeira a lembrança de Távora, ao reproduzir a sensata lição de Marcellus Polastris Lima, para o qual “[...] a busca e apreensão, com finalidade de preservar elementos probatórios ou assegurar reparação do dano proveniente de crime, ontologicamente, não é prova, tendo, ao contrário, natureza jurídica de medida cautelar que visa a obtenção de uma prova para o processo .[..]”

  Art. 240.  A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 1o  Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:

a) prender criminosos;

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;

d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;

g) apreender pessoas vítimas de crimes;

h) colher qualquer elemento de convicção.

§ 2o  Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.

A busca denomina-se domiciliar quando deva passar-se na residência de um indivíduo; neste caso, sujeitando-se ao direito fundamental presente no art. 5º, XI, que determina a impossibilidade de violação de tal asilo, “salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia, por determinação judicial”. Entenda-se o conceito de domicílio segundo o de casa presente no art. 150, § 4ª CP, que a tem como qualquer compartimento habitado, aposento ocupado de habitação coletiva ou compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. Já o dia compreende o intervalo que vai das 6 até as 18h. Esta forma de busca torna imprescindível a expedição de mandado judicial para que possa ser realizada (exceto quando operada pelo próprio magistrado).

O mandado de busca e apreensão, justamente por seu caráter de perturbação à direitos alheios, não pode ser genérico nem carente de fundamentação. É essencial a indicação, o mais precisa o possível, da casa a ser atingida e a identificação de seu proprietário ou morador – no caso de busca pessoa, denominação ou sinais que permitam a identificação do indivíduo submetida às diligência -, os motivos e fins do procedimento e a subscrição pelo escrivão e assinatura da autoridade que expedir a ordem. Sua execução pode ficar a cargo de oficial de justiça e/ou da polícia, que, antes de penetrarem na casa, mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta. Havendo desobediência, esta será arrombada e forçada a entrada. Em casa habitada, a busca será feita de modo que não moleste os moradores mais do que o indispensável para o êxito da diligência.  Se é determinada a pessoa ou coisa que se vai procurar, o morador será intimado a mostrá-la. Recalcitrando ele, será permitido o emprego de força contra coisas existentes no interior da casa, para o descobrimento do que se procura. Ausentes os moradores, ou sendo incapazes para consentir os habitantes presentes na casa no momento da diligência, proceder-se-á a mesma, sendo qualquer vizinho intimado a assisti-la. Descoberta a pessoa ou coisa que se procura, será imediatamente apreendida e posta sob custódia da autoridade ou de seus agentes. Encerrada a medida, os executores lavrarão auto circunstanciado, assinando-o com duas testemunhas presenciais. Não sendo encontrada a pessoa ou coisa procurada, os motivos da diligência serão comunicados a quem tiver sofrido a busca, se o requerer.

Segue o mesmo procedimento a busca efetuada em compartimento habitado ou em aposento ocupado de habitação coletiva ou em compartimento não aberto ao público, onde alguém exercer profissão ou atividade.

A diligência que, porventura, esteja em iminência de prolongar-se para muito além das 18h, deverá ser interrompida, dês que não represente considerável prejuízo.

Para o fim de apreensão do que se procura, indo no seguimento de pessoa ou coisa, é possível que os executores da diligência venham a adentrar território de outra comarca, ainda que localize-se esta em diferente Estado. Nessa hipótese, os mesmo deverão apresentar-se à autoridade local competente antes ou após sua busca, a variar segundo a urgência desta. Determina o § 1o do art. 250 CPP que:

Entender-se-á que a autoridade ou seus agentes vão em seguimento da pessoa ou coisa, quando:

a) tendo conhecimento direto de sua remoção ou transporte, a seguirem sem interrupção, embora depois a percam de vista;

b) ainda que não a tenham avistado, mas sabendo, por informações fidedignas ou circunstâncias indiciárias, que está sendo removida ou transportada em determinada direção, forem ao seu encalço.

Existindo fundadas razões por parte da autoridade local para duvidar da legitimidade das pessoas as quais, nas referidas diligências, entrarem pelos seus distritos, ou da legalidade dos mandados que apresentarem, poderão exigir as provas dessa legitimidade, resguardando-se de frustrar a diligência

Os limites do mandado de busca e apreensão são rígidos, impossibilitando-se a ampliação do seu objeto. Excepciona tal regra, segundo Távora e Alencar, apenas quando do encontro de “elementos que autorizem a prisão em flagrante, notadamente quando simbolizarem a existência de crime permanente”.

A busca pessoal, por sua vez, segundo Tourinho Filho “é a que se faz nas vestes ou nos objetos que a pessoa traga consigo (valises, pastas, bolsas etc.), como também imediatamente sobre o corpo, e, às vezes, até dentro do corpo”.  No caso de automóveis, alerta Távora de que se este “não é apenas um meio de transporte, sendo utilizado como residência, como ocorre com o trailer, alguns barcos, a parte traseira do interior da boleia do caminhão, o tratamento é o mesmo dado à busca e apreensão domiciliar”.

A busca em mulher será feita por outra mulher, desde que não configure retardamento ou prejuízo da diligência.

É dispensável o mandado de busca pessoal quando da realização de prisão (para a revista do preso), quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou, ainda, quando a durante o curso de busca domiciliar.

A busca e apreensão pode ser determinada de ofício ou a requerimento de alguma das partes, lembrando-se que a busca domiciliar está adstrita à clausula de reserva jurisdicional. Não configurando-se risco à inviolabilidade do domicílio, é desnecessário a emissão de mandado judicial para que a autoridade policial possa agir.

Esta diligência pode ser efetuada anteriormente ao inquérito policial, durante a investigação preliminar, na fase processual, na fase recursal e até mesmo na fase executória.

3.11. Interceptação Telefônica

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

Regulamenta a possibilidade, constitucionalmente prevista, de interceptação telefônica, a lei 9.296 de 24 de julho de 1996, a qual aplica-se, também, à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

As interceptações telefônicas apresentam-se como lícitas, se adequadas aos ditames legais, e ilícitas, estas popularmente conhecidas como “grampos”, quando em desarmonia com a lei. Este instituto pressupõe a existência de três sujeitos: dois interlocutores e um interceptador do diálogo telefônico daqueles, sem que os mesmo tenham conhecimento de tal ato. Sendo de conhecimento de um dos interlocutores a captação da conversa, está-se diante de uma escuta telefônica, a qual também insere-se no corriqueiro sentido atribuído à palavra “grampo”. Há divergência doutrinária quanto às escutas estarem ou não abrangidas pela supracitada norma. Os posicionamentos dividem-se em: licitude da escuta mediante prévio mandado, licitude da escuta ainda que efetuada sem mandado e ilicitude da escuta por violar direito fundamental.

Gravação telefônica, em sentido estrito, é o meio de prova no qual o diálogo é registrado por um dos interlocutores à indiferença ou ignorância do outro – nesta última hipótese fala-se em gravação clandestina. Prescinde de mandado. Em uma concepção larga, é a denominação dada ao fruto da interceptação ( termo, aqui, também em sentido amplo, abarcando a interceptação, a escuta e a gravação) telefônica.

Observe-se que o registro de confissão por parte de indiciado é prova ilícita se decorrente de interrogatório clandestino, este realizado pela autoridade policial sem asseguração dos direitos e garantias fundamentais processuais e constitucionais. 

O registro telefônico é o histórico das chamadas efetuadas de um número a outro, e encontra-se sob guarda da empresa concessionária do serviço telefônico. Sua obtenção não rege-se pela lei 9. 296/96, nem está protegido pelo art. 5, inc. XII, CF, na mesma medida que as gravações, em virtude de não tratar-se ele de comunicação atual, presente, de dados, mas de dados salvos, armazenados (deitando-se assim sobre a ideia de algo pretérito). O acesso aos registros depende de autorização judicial ou requisição de autoridade com atribuição legal para tal prática.

Interceptação ambiental é, nas palavra de Távora o “ [...] registro de conversa em sede diversa da telefônica ou digital, ou seja, a captação de áudio e/ou de imagem ambiente, realizada por terceira pessoa [...]”.  Este meio de prova é válido quando ocorra em lugar público ou de acesso deste, se sem autorização do juiz e sem conhecimento dos interlocutores quando possíveis de favorecer a defesa do imputado, ou, logicamente, quando resulte de autorização judicial. A gravação sem autorização do magistrado e sem consentimento dos envolvidos na conversa embebe a prova de ilicitude, não tendo a permissão dada por apenas um dos sujeitos o condão de purgá-la.

A gravação ambiental, análoga à telefônica, não abarca terceiro alheio ao diálogo, sendo realizada por um dos interlocutores, à indiferença ou ignorância do outro. Ela é lícita e prescinde de permissão judicial.

Disciplinada também pela lei 9.296/96 é a interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática. Sistema de telemática abarca um complexo de tecnologias de transmissão de dados à distância para fins comunicação, estando incluso o próprio sistema de informática.  O STJ já decidiu:

REsp 879181 / MA: [...] 4. - É competente o Juízo Cível para o processamento e julgamento de ação cautelar que pede informação a respeito do nome do responsável pelo envio de e-mail difamatório, que pode ser obtida por meio do IP (Internet Protocol) do computador do usuário, uma vez que não se caracteriza quebra de sigilo por meio de interceptação telefônica, não se enquadrando, pois, na Lei 9.296/96. 5. - É juridicamente possível o pedido à empresa de telefonia de exibição do nome do usuário de seus serviços que, utiliza-se da internet para causar danos a outrem, até por ser o único modo de o autor ter conhecimento acerca daqueles que entende ter ferido a sua reputação. [...]

Na fase de investigação preliminar, a concessão de permissão para a interceptação depende de requerimento do Ministério Público ou de representação da autoridade policial com prévia oitiva daquele. Já no momento processual, cabe requisição do Ministério Público ou determinação de ofício pelo juiz. Entende a doutrina, majoritariamente, que o ofendido por meio de seu advogado, o querelante ou o assistente da acusação podem, também, requere-la.

No que tange à suas formalidades, segundo o art. 8º da Lei 9.296/96 , a interceptação de comunicação passar-se-á em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas. Se ocorrer o incidente ocorrer na fase inquisitiva, será apensado imediatamente antes da autoridade emitir relatório conclusivo; se na processual, dar-se-á sua junção segundo o período do seu termino, podendo ela passar-se após recebida a denúncia ou queixa, ou após a audiência de instrução e julgamento e antes das alegações finais.

A violação da privacidade do indivíduo é medida excepcional, devendo o pedido de interceptação evidenciar o fummus comissi delicti (indício razoável da autoria ou participação em fato criminoso) e periculum in mora ( urgência e indispensabilidade da diligência), bem como é  obrigatório à sentença que lhe conceda apresentar-se fundamentada, não constituindo, ademais, prerrogativa irrestrita, como se percebe pela leitura dos seguintes artigos da lei 9.296/96.

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

        I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

        II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

        III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

        Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Art. 4° O pedido de interceptação de comunicação telefônica conterá a demonstração de que a sua realização é necessária à apuração de infração penal, com indicação dos meios a serem empregados.

[...]

Art. 5° A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova.

Curial é a lembrança de que a investigação deve direcionar-se para fim de apuração criminal (cuja sanção cominada seja de reclusão), todavia, seus frutos podem ser dispostos para a instrução de fato conexo apenado com detenção, ou como prova emprestada para inquirição de ilícitos civis ou administrativos.

O prazo legal de duração para a interceptação é de 15 dias, prorrogáveis por igual período. Entende o STF, diante da omissão da lei quanto ao número de vezes que possa ocorrer a prorrogação, pela possibilidade ilimitada de renovação do prazo.

Deferido o pedido, cabe sua execução à polícia judiciária ( e, a depender das circunstâncias do caso concreto, à polícia militar), que poderá requisitar  serviços e técnicos especializados às concessionárias de serviço público. A autoridade deverá cientificar o Ministério Público, sendo-lhe facultado o acompanhamento da atuação policial.  Se diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição ( registro escrito do conteúdo do áudio. Observe-se que entendem o STF e o STJ, em posicionamento jurisprudencial, que basta a transcrição das partes essenciais das conversas, desde que possibilitado às partes acesso à mídia em sua integridade). Findada, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.

O encontro fortuito de provas ou indícios relativos a crimes ou pessoas conexos ou diversos dos originalmente visados não pode ser desconsiderado, sendo tais informações admitidas, segundo doutrina majoritária e posicionamento jurisprudencial do STF e STJ.

Partindo de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada, por meio do incidente de inutilização, a gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial. Isso dar-se-á durante o inquérito, a instrução processual ou mesmo após esta. O incidente será assistido pelo Ministério Público, e, facultativamente, pelo acusado ou seu representante legal.

Prevê, ainda, a lei 9.296/96:

 Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

 Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.


4.   SUJEITOS DO PROCESSO PENAL 

No sistema processual penal brasileiro a relação processual é representada pelo acusado, pelo ofendido e pelo juiz, que pode ser considerado um substituto do Estado-juiz. Pois, como se sabe, é uma função precípua do Estado defender bens indisponíveis, exercendo seu poder de jurisdição e punibilidade. O sistema acusatório adotado no Brasil ilustra muito bem o desempenho de alguns desses sujeitos. Esse sistema se baseia na divisão das funções de julgar, defender e acusar. No caso do juiz, cabe a ele julgar a causa usando sempre da imparcialidade. O Ministério Público é o órgão legitimado a acusar, e a função de defender que é intrínseca à função dos defensores, possibilitando a ampla defesa e o contraditório.

Todavia, é importante frisar que os sujeitos do processo não se resumem àqueles que se encontram na relação processual, mas, sim, todos aqueles que de certa forma interferem no processo, podendo ser divididos em duas categorias: a) principais ou essenciais: juiz, acusador e acusado, são essenciais para construir a relação processual. b) secundários acessórios ou colaterais: poderão intervir de forma eventual no processo pra extrair algum tipo de pretensão.

4.1. Do Juiz

O juiz deve conduzir o processo de forma imparcial, como já foi dito. O princípio da imparcialidade rege o processo penal de forma rigorosa, visto que este proporciona um julgamento justo e isento de vinculações subjetivas, como está garantido na Constituição Federal através do seu art. 5º, inciso XXXVII. A inobservância do princípio da imparcialidade do juiz leva à suspeição ou impedimento do mesmo. Como preleciona Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar:

Observa-se que tanto o impedimento como a suspeição devem ser reconhecidos exofficio pelo juiz, afastando-se voluntariamente de oficiar no processo e encaminhando-o ao seu substituto legal. A CF/88 confere ao magistrado as garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios (art.95) para que ele possa atuar com isenção- o que inclui-se declarar-se suspeito ou impedido. De todo modo, caso não reconheça a situação de imparcialidade, o juiz deve ser recusado e os permissivos legais para tanto se encontram no art. 254 do CPP (hipóteses de suspeição) e no art. 252 (hipóteses de impedimento)[1].

O juiz estará impedido nas seguintes hipóteses ( art.252): I - tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito; II - ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha; III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão; IV - ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.

É importante atentar ao fato de que as causas de impedimento estão taxativamente previstas neste artigo, e estão atreladas a um vínculo entre o juiz e o objeto da causa, que podem ser alegadas a qualquer tempo pelas partes. Os atos praticados pelo juiz impedido devem ser considerados totalmente nulos. Os juízos coletivos também estão sujeitos ao impedimento como consta no art. 253 do CPP. A jurisprudência a seguir ilustra uma das causas de impedimento:

Ementa: PROCESSUAL PENAL. PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RELATOR QUE ATUOU NA INSTÂNCIA INFERIOR. IMPEDIMENTO. ART. 252 , III , DO CPP . ORDEM CONCEDIDA. 1. O art. 252 do Código de Processo Penal , prevendo as hipóteses taxativas de impedimento, tem por objetivo garantir a imparcialidade do magistrado, preservando, de tal forma, a indispensável isenção para o exercício da função jurisdicional. 2. O objetivo da lei é evitar que o julgador que já tenha atuado na instância inferior, manifestando-se, de fato e de direito, sobre a questão, não se manifeste novamente em grau recursal. 3. Se o relator do acórdão impugnado atuou em 1ª instância, indeferindo o pedido de revogação da prisão preventiva decretada contra corréu, tendo, ainda, presidido audiência de oitiva de testemunhas de defesa, observa-se patente o seu impedimento para julgar o recurso em sentido estrito interposto contra a sentença de pronúncia. 4. Ordem concedida para anular o julgamento do Recurso em Sentido Estrito , reconhecendo, nos termos do art. 252 , III , do CPP , o impedimento do Juiz ALBERTO JORGE CORREIA DE BARROS LIMA, devendo outro ser proferido como entender de direito.

Encontrado em: (P/ PACTE) T5 - QUINTA TURMA -->DJe 31/08/2009 - 31/8/2009 LEG: CPP-41 LEG:FED DEL: 003689 ANO:1941... ART : 00252 INC:00003 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL HABEAS CORPUS HC 113176 AL 2008/0176088-7 (STJ) Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA 

As causas de suspeição, diferentemente do que ocorre com o impedimento, sofre preclusão temporal, posto que a presunção da parcialidade é Iuris tantum, devendo ser declarada pelo juiz, e se não o for, pode ser arguida por qualquer das partes. Os atos praticados pelo juiz estarão sujeitos a uma nulidade relativa. As causas de suspeição são estas (art.254): I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles; II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia; III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes; IV - se tiver aconselhado qualquer das partes; V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes; VI - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.

É interessante mostrar que com a dissolução do casamento faz cessar o impedimento ou suspeição, salvo se dele sobrevier descendentes. Porém, mesmo sem esta ressalva, não funcionará como juiz o sogro, o padrasto, o cunhado, o genro ou enteado de quem for parte no processo (art. 255, CPP). Além disso, o art. 256 do CPP estabelece que a suspeição não deverá ser declarada ou reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la.

Muitos tendem a confundir, suspeição, impedimento e incompatibilidade (art. 112 CPP) do juiz.  Nos dizeres de Marcellus Polastri Lima, “enquanto a suspeição advém do vínculo ou relação do juiz com as partes do processo, o impedimento revela o interesse do juiz em relação ao objeto da demanda, e a incompatibilidade, via de regra, encontra guarida nas Leis de Organização Judiciária, e suas causas estão amparadas em razões de conveniência” (LIMA, 2009, p. 318).

4.2. Do Ministério Público

As prerrogativas do Ministério Público estão descritas na CF/ 88 e uma delas está totalmente atrelada ao processo penal, no art. 129, Inc. I da CF está estabelecido que esse órgão é titular da ação penal pública. Entretanto, o Ministério Público pode atuar como custus Legis, ou seja, fiscal da lei, pois, como descreve o art. 127, caput da CF, o Ministério Público tem o dever de defender o regime democrático, a ordem jurídica e dos interesses individuais e sociais indisponíveis.

Outro aspecto importante das funções do Ministério Público se encontra na sua legitimação para acusar o autor das infrações penais de ações penais públicas. Como se disse, há uma legitimação, o órgão não é obrigado a oferecer denúncia, nem depois de oferecida a denúncia o órgão é obrigado a condenar, pode ele pedir pela absolvição.

O CPP deve ser interpretado à luz da Constituição Federal de 1988, dessa forma o art. 257 do CPP só transporta o entendimento da CF/88 ao dizer que cabe ao Ministério Público a promoção privativa da ação penal pública e a fiscalização da execução da lei. Como a função precípua do Ministério Público é a realização da justiça e a defesa da ordem jurídica, o mesmo é submetido a certos impedimentos, como os do art. 252 e 254 do CPP, no que lhe for compatível, e a vedação do art. 258 do CPP, no que diz que os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que Ihes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes. No entanto, é bom frisar a Súmula nº 234, que diz não ser passível de impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia, a participação do Ministério Público na fase investigatória.

A atuação do Ministério público é bem diversificada, nos órgãos de primeiro grau aquele funciona, em geral, como parte. Nas ações de iniciativa privada, sua atuação é como fiscal da lei. Na ação privada subsidiária da pública assume o papel de intervitente adesivo obrigatório. No segundo grau de jurisdição o órgão do Ministério Público pode atuar tanto como parte, como fiscal da lei.

4.3. Funcionários do poder judiciário e auxiliares do juízo

Os funcionários do poder judiciário, também conhecidos como servidores são pagos pelo Estado. Esses funcionários são os escrivães, oficiais de justiça, assessores, auxiliares e muitos outros. É importante destacar a importância dos servidores públicos no poder judiciário, visto que cada vez mais a estes são atribuídas funções de relevância na administração da justiça, e, consequentemente, seu papel pode ter um impacto acentuado no processo.

Tendo em vista esses fatores dispostos acima, o CPP no art. 274 dispõe que as prescrições sobre suspeição do juízes se estendem aos serventuários e funcionários da justiça, no que lhes for aplicável. Dessa forma, a alegação de suspeição deve ser analisada pelo magistrado, que pode acatá-la ou não, em decisão irrecorrível, passível de mandado de segurança.

4.3.1. Auxiliares do juízo

Os auxiliares da Justiça são aqueles que contribuem com o juiz para seu esclarecimento sobre pontos relevantes no processo, que exigem conhecimentos específicos. Os auxiliares são classificados em peritos e intérpretes. Muitas vezes, as testemunhas são confundidas como auxiliares do juízo, porém, não se enquadram nesse conceito, apesar de serem sujeitos processuais.

Os assistentes técnicos são os peritos designados pelas partes, ou seja, são de confiança das partes, esses não constituem a perícia oficial. Na área criminal, os peritos são divididos em: peritos criminais, peritos médico legistas e odontolegistas. Os peritos oficiais são concursados que exercem cargo público específico. Todavia, se no juízo da causa não houver um quadro oficial de peritos e intérpretes, o juiz deve nomear peritos sem a intervenção das partes. O perito nomeado (ad hoc) estará sujeito à disciplina judiciária (art. 275, CPP) e à condução coercitiva ao juízo, quando este não alegar justa causa (art. 278, CPP), além disso, este será obrigado a aceitar o encargo sob pena de multa. Esta mesma multa se aplica nos seguintes casos: a) deixar de acudir à intimação ou ao chamado da autoridade; b) não comparecer no dia e local designados para o exame; c) não der o laudo, ou concorrer para que a perícia não seja feita, nos prazos estabelecidos.

Por desempenhar um papel importante no processo, os peritos e intérpretes estão sujeitos às mesmas suspeições dos juízes, no que lhes for aplicável (art.280, CPP). Quanto aos peritos especificamente existem vedações expressas no CPP que constam no art.279, são elas: a) os que estiverem sujeitos à interdição de direito mencionada nos nº I e IV do art. 49do Código Penal; b) os que tiverem prestado depoimento no processo ou opinado anteriormente sobre o objeto da perícia; c) os analfabetos e os menores de 21 (vinte e um) anos.

4.4. Do acusado e defensor

O acusado e seu defensor são umas das partes mais importantes do processo, nesse contexto aparece nitidamente a influência da Defensoria Pública, tendo em vista seu papel dentro do processo de defender o acusado, desenvolvendo os princípios essenciais da ampla defesa e do contraditório. Segundo o CPP, nenhum acusado será processado ou julgado sem defensor (art.261). Nesse sentido, visando uma igualdade entre as partes, o art. 44, I, da Lei Complementar 80/1994 prevê a contagem em dobro dos prazos processuais para a Defensoria Pública. Pois, enquanto as Defensorias Públicas dos Estados se acharem deficientes e não se equipararem aos respectivos Ministérios Públicos, os prazos serão contados em dobro, ou seja, esse benefício é temporário, até que as Defensorias se igualem aos respectivos Ministérios Públicos. A defensoria também possui um papel fundamental nas unidades prisionais, devendo zelar pelos direitos dos apenados e daqueles que cumprem medidas de segurança.

Existem figuras diferentes dispostas no CPP que podem gerar confusão, são elas o procurador o defensor e o curador. O procurador, pode ser denominado assim, quando é nomeado pelo acusado, ainda que em situação de interrogatório, ou quando o procurador é constituído por meio de instrumento procuratório. O defensor é aquele que, caso o acusado não o tiver, será nomeado pelo juiz, podendo o acusado a todo tempo nomear outro de sua confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha habilitação (art. 263, CPP). O curador será nomeado quando o acusado for maior de dezoito anos e tiver doença mental ou desenvolvimento incompleto ou retardado.

O art. 265 do CPP estabelece que o defensor não pode abandonar a causa, ressalvado motivo imperioso, devendo previamente comunicar o magistrado, estabelecendo-se multa de 10 a 100 salários mínimos, além das demais sanções cabíveis, como a representação perante a Corregedoria da Defensoria Pública. Se o defensor não comparecer à audiência, por motivo injustificado, o juiz poderá adiar a audiência. Cabe ao defensor provar o impedimento até a abertura da audiência, não o fazendo, o juiz não adiará qualquer ato, devendo nomear defensor substituto, ainda que provisoriamente ou só para efeito do ato (art. 265, CPP). Todavia, esse dispositivo deve ser interpretado de forma a não ferir os direitos de ampla defesa do réu, posto que colocar um defensor alheio à causa pode prejudicá-lo. Por final, o defensor público também se sujeita aos impedimentos elencados no art. 267 do CPP, no que diz que os parentes do juiz não funcionarão como defensores. 

4.5. Do Assistente do Ministério Público

O art. 268 do CPP acentua que em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendida ou representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no art. 31 (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão).

O interesse do assistente não se resume, apenas, à obtenção de reparação em ação civil exdelicto, ele tem o direito de ver a pena sendo aplicada corretamente. Pois, o assistente ao ter seus direitos feridos, ao sofrer os efeitos do crime, o terceiro tem direito de intervir no processo. Entretanto, o juiz só admitirá o assistente enquanto não passar em julgado a sentença e este receberá a causa no estado em que se achar (art. 269, CPP) e para se tornar habilitado o assistente deverá requerer em até 5 dias após a sessão da qual pretende atuar (art. 430, CPP), além disso, o corréu não pode figurar como assistente do Ministério Público.

O Ministério Público deve ser ouvido previamente sobre a admissão do assistente (art.272, CPP). Do despacho que admitir ou não a assistência não cabe recurso (art. 273, CPP). Ao assistente são permitidos certos atos, são eles: propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598. O assistente, também, poderá interpor: a) recurso em sentido estrito da sentença que decretar a extinção da punibilidade e da decisão que julgar deserta a apelação interposta por ele mesmo; b) apelação da sentença absolutória; c) carta testemunhável; d) embargos de declaração; e) recurso extraordinário, com exceção da decisão concessiva de habeas corpus.

4.6. Do querelante e do assistente de defesa

O querelante figura na relação processual no polo ativo, quando se tratar de ação penal privada e subsidiária da pública, quando Houver desídia do Ministério Público. É plausível destacar que nas ações privadas personalíssimas, a falta do querelante, o não atendimento às notificações para a prática de atos do processo importam em perempção, extinguindo-se a punibilidade do acusado, assim como a morte do querelante (art. 60, CPP).

O assistente da defesa é uma figura encontrada nos juizados especiais (Lei 9.099/95), visto que quando se tratar de crimes de menor potencial ofensivo, devem comparecer na audiência, o infrator, a vítima, e o eventual responsável civil pelos danos causados. Esse responsável civil, pode ser considerado um verdadeiro assistente da defesa, pois ajuda na composição dos danos civis.


CONCLUSÃO

Neste trabalho, abordamos as medidas assecuratórias, as provas, os meios de prova e os sujeitos do processo, em aplicação à análise de audiência acompanhada pelos membros da equipe. Concluímos que é perfeitamente identificável o que é abordado pela doutrina, quando observado o caso concreto, podendo ser observados os sujeitos que configuram os polos da relação processual com clareza, bem como os meios de prova utilizados pelo juiz durante a busca pela verdade processual, e as providências cautelares tomadas a fim de assegurar a eficácia da futura decisão judicial.

Foram cumpridos todos os objetivos propostos, uma vez que, a partir deste trabalho, foi possível concretizar a proposta de aproximação entre o conhecimento doutrinário e o conhecimento prático, ambos de fundamental importância para a construção do saber jurídico. ­


BIBLIOGRAFIA

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo:  Ed. RT, 2009.

TOURINHO FILHO, Fernando C. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 6. ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2010.

TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 9. ed. Bahia: Editora JusPodivm, 2014. 


Nota

[1] TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8.ed. Salvador: Juspodium, 2013, p. 521.


Autores


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelas autoresa. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.