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Alguns temas de Direito Internacional Privado

Alguns temas de Direito Internacional Privado

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Principais pontos relacionados aos direitos da personalidade à luz do Direito Internacional Privado, e em cotejo com o cenário internacional.

I – DIREITOS DA PERSONALIDADE

De início, aludo ao tema dos  direitos da personalidade na órbita do direito internacional privado.

No entendimento de Haroldo Valladão(Direito Internacional Privado, volume II, 1977, pág. 12 e 13),  acerca dos direitos da personalidade, à luz de Wolff, ou ainda da expressão direitos pessoais absolutos, o direito à vida, à liberdade, à honra, ao nome, à imagem, não pode depender, para a segurança e proteção da pessoa, no Brasil, de outra lei que não seja a brasileira, que é básica para a sua própria personalidade e suas qualidades essenciais.

Daí a lição: “Os direitos da personalidade, inclusive o nome, serão protegidos segundo o direito brasileiro”.

O artigo 7º, I, da Lei de Introdução ao Código Civil, de 1942, revogada, adotando unitária e universalmente o domicílio, fugiu à realidade.

A Lei introdução, artigo 7º, em seu caput, dizia:

Art. 7o  A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

O artigo 27 do Código Bustamante submete à lei pessoal tanto a capacidade de exercício como a de direito. Mas há as restrições de ordem pública que devem ser aplicadas. 

A capacidade de direito ou de gozo que é inserida a quem possui personalidade jurídica, se define como sendo a aptidão genérica para aquisição de direitos e deveres, e a capacidade de fato ou de exercício que é a aptidão de exercer por si os atos da vida civil. 

A determinação do inicio da personalidade natural será dada pela lex domicilii dos pais. A lex domicilii ainda determinará as normas sobre o fim da personalidade, as presunções de morte, a comoriência e a ausência. 


II  AS QUESTÕES  DA ALTERAÇÃO DO NOME, DAS INCAPACIDADES 

Quanto a alteração do nome, matéria de ordem pública, adota-se a lex fori.

Por sua vez, as incapacidades apenas especiais, de ser proprietário, de ser tutor, de testar, que Teixeira de Freitas entendia de aplicar a lex fori, hoje se submetem à lex causae.

O entendimento apresentado por Haroldo Valladão, em seu Anteprojeto de Lei Geral, é no sentido seguinte: “As incapacidades especiais de direito regem-se segundo a lei reguladora da substância dos mesmos direitos, na media em que não forem incompatíveis com o direito brasileiro”. Trata-se de norma de ordem pública.

Outro tema importante diz respeito à questão da capacidade.

O Código Bustamante, em seu artigo 27, determina que a capacidade das pessoas individuais se rege pela sua lei pessoal, salvo as restrições estabelecidas para seu exercício por este Código u pelo direito local.

O  Tratado  de Montevideo, de 1889(artigo 1º) falava que a capacidade das pessoas se regia pela lei do domicílio. Já o Tratado de Montevideo de 1940 submetia a tal lei até a existência.

Quanto à idade mínima de 18 anos para a capacidade civil, adotada pelo Código Civil de 2002, ao contrário dos 21 anos do Código Civil de 1916, foi seguida a orientação que já constava do Código Civil da Alemanha 1974, em idêntica conclusão à norma inglesa(1967) e ainda às leis do México, Panamá, Guatemala.

A emancipação voluntária, concedida pelo pai, pela mãe, pela autoridade tutelar etc, será concedida de acordo com a lei do domicílio do filho.

A interdição, a decretação da impossibilidade moral de agir permanente, subordina-se à lei domiciliar do interditando ou interdito.

Entende-se que a pessoa que mudar seu domicílio para o Brasil, conserva-se capaz, se já o era pela lei domiciliar anterior, e torna-se capaz se o vier a ser pela lei brasileira.

Os débitos alimentares disciplinam-se pela lei reguladora de institutos do direito de família, de que são acessórios. Fundam-se nas relações de parentesco(ius causae), devendo reger-se em atenção ao interesse do alimentando, pela sua lei domiciliar. Mas, há perplexidades na matéria, diante da redação dos artigos 67 e 68 do Código Bustamante e ainda do artigo 17 da Lei de Introdução. Mas, dir-se-á que as questões pertinentes ao direito de família, no direito internacional privado, regem-se pela lex domicilii. 


III - A NACIONALIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS 

Determina o artigo 11 da Lei de Introdução: 

Art. 11. As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituírem.

§ 1o Não poderão, entretanto ter no Brasil filiais, agências ou estabelecimentos antes de serem os atos constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas à lei brasileira.

§ 2o Os Governos estrangeiros, bem como as organizações de qualquer natureza, que eles tenham constituído, dirijam ou hajam investido de funções públicas, não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou susceptiveis de desapropriação.

§ 3o Os Governos estrangeiros podem adquirir a propriedade dos prédios necessários à sede dos representantes diplomáticos ou dos agentes consulares. (Vide Lei nº 4.331, de 1964) 

Discute o citado artigo 11 da Lei de Introdução qual o direito a que deve-se seguir no que concerne à constituição, o funcionamento e a dissolução da sociedade e fundação, tendo em vista que a pessoa jurídica poderá ter sido constituída em um determinado país para exercer suas atividades em outro Estado; os sócios poderão ter várias nacionalidades ou ainda domicílios de outros países; o capital social poderá estar subscrito em vários Estados; a sede da pessoa jurídica poderá estar em dado país e o exercício da atividade em outro.

O artigo 32 do Código Bustamante adota o princípio da territorialidade para reger o conceito e o reconhecimento das pessoas jurídicas, prescrevendo, outrossim, no artigo 33, que a capacidade civil das corporações será disciplinada pela lei que as tiver criado ou reconhecido; das fundações, pelas normas da sua instituição aprovada pela autoridade correspondente; se o exigir o seu direito nacional e das associações, pelos seus estatutos, em iguais condições, aditando ainda, no artigo 334, que a capacidade civil das sociedades civis, comerciais ou industriais regular-se-á pelas disposições atinentes ao contrato social. 

O artigo 11 da Lei de Introdução impõe a lei do Estado em que as pessoas jurídicas de direito privado se constituírem, desprezando, como ensinou Maria Helena Diniz(Lei de introdução ao Código Civil brasileiro interpretada, 1994, pág. 288), o critério da nacionalidade, do domicílio dos sócios ou dos fundadores, do país da subscrição do capital social, da sede empresarial, da autonomia de vontade, não quebrando o princípio da lei domiciiliar. Assim a pessoa jurídica irá submeter-se à lei do Estado em que se constituir, que irá determinar as condições de sua existência ou do reconhecimento de sua personalidade jurídica. 

No Brasil, o reconhecimento das pessoas jurídicas estrangeiras é disciplinado no artigo 11 da Lei de Introdução ao Código Civil, que consagra o critério da constituição e a questão da autorização para funcionamento de sociedade estrangeira no Brasil é prevista no par. 1º do mesmo artigo.

A conceituação da empresa brasileira, que exige a constituição e a sede social no Brasil é disciplinada na lei societária dentre os critérios doutrinários de atribuição da nacionalidade brasileira, adotamos uma dupla exigência: o do local da constituição, citado acima, conjugado ao da sede, nos termos dos artigos. pertinentes do D.L. 2.627 mantidos pelo artigo 300 da Lei 6404/76 que versa sobre as Sociedades Anônimas. Também o Código Civil, em seu artigo 1.126, manteve a mesma orientação.

Podemos constatar que o direito societário brasileiro não enfrentou a questão nas reformas societárias mais recentes, prevalecendo o mesmo sistema consagrado pelo legislador societário de 1940.

Ensinou Marilda Rosado de Sá Ribeiro(Palavras sobre a nacionalidade da pessoa jurídica no exterior): 

"Os lucros do investimento podem ser reinvestidos no exterior ou remetidos para a matriz, para distribuição aos acionistas, tudo de acordo com a decisão da empresa. Então surge um confronto de interesses difícil de ser solucionado. De um lado o Estado hospedeiro, atado ao princípio da jurisdição territorial e às limitações dele decorrentes, sem poder interferir nas decisões das matrizes.

De outro, a pretensão de controlar investimentos exportados, sob a alegação de que a riqueza nacional, exportada através do investimento, deve servir também aos fins do Estado exportador de capital e, portanto, da comunidade nacional de onde se origina. A edição de leis com caráter de extraterritorialidade obedece a essa segunda motivação, as quais não têm sido aceitas pacificamente.

A convergência de interesse das diferentes disciplinas da esfera internacional, sobretudo pelo crescimento do fenômeno da transnacionalidade, leva a uma análise, segundo um método integrativo de dois critérios distintos, oriundos do direito internacional privado e do direito econômico. Pelo primeiro critério, seria estudada a submissão do regime de funcionamento interno da sociedade a uma legislação estatal determinada. E de acordo com o segundo, o importante é o domicílio do controlador, para o reconhecimento de regimes diversos de atuação no mercado."

Por sua vez, o Código Bustamante estabeleceu, no artigo 16, que a nacionalidade de origem das corporações e das fundações será determinada pela Lei do Estado que as autorizar ou as aprovar, ditando, no artigo 17, que a nacionalidade das associações será a do país em que se constituírem, e nele deverão, então, ser registradas, se a legislação local exigir, estipulando, no artigo 18, que as sociedades comerciais ou industriais, que não forem anônimas, terão a nacionalidade avençada no contrato social, e, na sua falta, a do lugar onde tiver sede a sua gerência ou direção principal.

Prescreve, por sua vez, o artigo 19, que a nacionalidade das sociedades anônimas será determinada pelo contrato social e, eventualmente, pela lei do local onde, normalmente se reúna a junta geral dos acionistas, ou, em sua falta, pela do lugar onde estiver funcionando seu principal Conselho Administrativo ou Junta Diretiva. 

A Lei de Introdução determina que a nacionalidade das pessoas jurídicas reger-se-á pela mesma lei que as criou. Assim as sociedades constituídas no Brasil serão brasileiras, mas, se vierem a mudar para o exterior, irão se desnacionalizar, pois passarão a submeter-se à lei do Estado em cujo território vierem a exercer as suas atividades. 

O Código Bustamante, em seus artigos 31 e 32,  determinou que as pessoas jurídicas estrangeiras constituídas em conformidade com a lei do lugar onde nasceram (Lex loci actus) serão tidas como válidas em outros Estados que as reconheceram. Para tanto a pessoa jurídica estrangera gozará, no território brasileiro, da mesma capacidade que tem no país de origem. O artigo 11 da Lei de Introdução sujeita a pessoa juridica à lei do Estado em que se constituiu. À lei desse país se deverá recorrer para reconhecer, ou não, a entidade estrangeira como sujeito de direito.  

O critério da incorporação, segundo o qual a nacionalidade da pessoa jurídica é atribuída pelo país em que a mesma se constitui, é predominante no direito inglês e norte-americano. O critério da sede é consagrado na maioria dos países da Europa continental. Não seria apenas a sede estatutária, mas sim a sede social.

O critério do controle surge como exceção à regra de atribuição da nacionalidade às pessoas jurídicas. A nacionalidade da pessoa jurídica segundo o critério do controle é determinada em função dos interesses nacionais que a animam, e este critério se caracteriza principalmente pela nacionalidade dos detentores do capital da sociedade.

Já se entendeu que se a pessoa jurídica deslocar sua sede para o Brasil, exercendo aqui as suas atividades, ou se conservar sua sede no estrangeiro, abrindo aqui filial, sucursal, agência ou estabelecimento, deverá, para evitar fraudes à lei, obter a aprovação de seu estatuto social ou ato constitutivo pelo governo federal do Brasil. A lei brasileira reger-lhe-á as relações jurídicas, a capacidade de gozo ou de exercícios de direitos etc. Firmada estará a competência da lei domiciliar(RF, 45:459 e 33:323). 

O pedido de autorização deverá ser instruído com: 

a) a prova de a sociedade encontrar-se legal e regularmente constituida de acordo com a lei do seu país; 

b) cópia integral do seu estatuto social e da ata da Assembleia Geral que autorizou seu funcionamento no Brasil e fixou o capital e fixou o capital destinado às operações no territorio brasleiro; 

c) o rol de sócios, devidamente qualificados; 

d)comprovante  da nomeação do representante no Brasil, devidamente munido de poderes para aceitar as condições em que for dada a autorização; 

e) apresentação do último balanço da firma; 

f) autenticação de todos os documentos pelo Consulado, traduzidos em vernaculo por tradutor juramentado. 

A sociedade ou fundação estrangeira,  mesmo sendo nulo o ato de sua constituição, poderá ser reconhecida como organização de fato, sem personalidade jurídica, quanto às operações já levadas a efeito. 

O parágrafo terceiro do artigo 11 da Lei de Introdução abre exceção á aquisição de imóveis situados no Brasil por pessoas jurídicas de direito público estrangeiro ao permitir que adquiram prédios para sede de representantes diplomáticos ou agentes consulares, atendendo-se à ficção da extraterritorialidade dos edifícios das embaixadas e legações e ao privilégio necesário para assegurar o livre exercício de funções diplomáticas e de atividades consulares. 


IV – OS VICIOS DO CONSENTIMENTO. A  FORMAÇÃO DO CONTRATO E A AUTONOMIA DE VONTADE

Os vícios do consentimento dos negócios jurídicos regem-se pela lex fori . Essa a linha já adotada por Teixeira de Freitas, Esboço, 1860, artigo 850 e artigos 789, n. 4 e 6 e 790, n. 3.

Quanto à forma dos atos jurídicos, adota-se lex regit actum.

Ainda, quanto à forma dos atos jurídicos, o Código Bustamante, artigo 180, aplica, de forma simultânea, o locus regit actum, a lei do lugar do contrato e a de sua execução, à necessidade de escritura ou documento público para a eficácia de determinados atos e à de fazer constar por escrito.

A Lei de Introdução prescreve no artigo 9º: 

Art. 9˚ Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituirem.

§ 1˚ Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.

A Lei de Introdução, no seu artigo 9º, não acolhe o princípio da autonomia da vontade como elemento de conexão para reger contratos na seara do direito internacional privado, que deverão ser disciplinados pela lei do local em que se constituíram quanto à forma extrínseca. 

No caso das relações trabalhistas, a Convenção de Roma de 1980, artigo 6º, tratando de contrato individual de trabalho, a aplicação da lei escolhida não poderá privar o trabalhador de sua proteção, que lhe foi conferida pela lei: a) do país onde o trabalhador, ao executar o contrato, habitualmente exerceu seu oficio; b) do Estado em cujo território se encontra situada a empresa que contratou o empregado, que não realiza de modo habitual seu trabalho no mesmo pais. 

Nos casos de contratos de transferência de tecnologia, o artigo 17 da Lei de Introdução se aplica. 

Observo que o critério da lex loci estabelecido no artigo 9º da Lei de Introdução não pode ser aplicado para dirimir dissídio oriundo de contrato de trabalho de marítimo engajado em navio estrangeiro, uma vez que o princípio relevante é o da lei do pavilhão, a teor dos artigos 279 e 281 do Código Bustamante. 

A livre vontade das partes quando da contratação é elemento essencial para a validade dos instrumentos negociais, pois os contratantes devem se integrar e se manifestar neste sentido, mesmo que defendam interesses opostos. Além disso, este elemento é visto como importante na medida em que se confere a vontade individual à faculdade de escolher, de forma expressa ou tácita, a lei competente em determinados assuntos.

Os  artigos 7o e 8o da “Inter-American Convention on the Law applicable to International Contracts”, assim dispuseram:

Art. 7˚. O contrato rege-se pelo direito escolhido pelas partes. O acordo das partes sobre esta escolha deve ser expresso ou, em caso de inexistência de acordo expresso, depreender-se, de forma evidente, da conduta das partes e das cláusulas contratuais consideradas em seu conjunto. Esta escolha poderá referir-se à totalidade do contrato ou uma parte do mesmo. A eleição de determinado foro pelas partes não implica necessariamente a escolha do direito aplicável.

Art. 8˚. As partes poderão, a qualquer momento, acordar que contrato seja total ou parcialmente submetido a um direito distinto daquele pelo qual se regia anteriormente, tenha este sido ou não escolhido pelas partes. Não obstante, tal modificação não afetará a validade formal do contrato original nem os direitos de terceiros.

Ante o surgimento de fatos imprevistos e excepcionais que tornem o contrato oneroso para uma das partes, os contratos internacionais, sobretudo os de longa duração, devem procurar prever tais possibilidades.

Orlando Gomes, em parecer transcrito por Luiz Olavo Batista(Luiz Olavo. Dos Contratos Internacionais: Uma Visão Teórica e Prática. São Paulo: Saraiva, 1994. P. 82. ), define a cláusula de “hardship”, como:

"uma cláusula que permite a revisão do contrato se sobrevierem circunstâncias que alterem substancialmente o equilíbrio primitivo das obrigações das partes. Não se trata de aplicação especial da teoria da imprevisão à qual alguns querem reconduzir a referida cláusula, (...). Trata-se de nova técnica para encontrar uma adequada reação à superveniência de fatos que alterem a economia das partes, para manter... Sob o controle das partes, uma série de controvérsias potenciais e para assegurar a continuação da relação em circunstâncias que, segundo os esquemas jurídicos tradicionais, poderiam levar à resolução do contrato". 

A cláusula de “hardship” consiste numa norma de revisão, cujo objetivo é a reorganização do equilíbrio contratual, com o propósito de readaptá-lo, preservando a equidade das partes ao novo contexto gerado pela superveniência de fato imprevisível, ou, não sendo possível a reorganização, proceder à resolução do contrato sem onerar excessivamente qualquer das partes.


V – A QUESTÃO DO REGISTRO NO BRASIL DOS ATOS FEITOS NO EXTERIOR

A Lei 6.015/73 assim determinou, em seu artigo 129, I,  que estão sujeitos ao registro: 

“ todos os documentos de procedência estrangeira, acompanhados das respectivas traduções, para produzirem efeitos em repartições da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios ou em qualquer instância, juízo ou tribunal.”

Por outro lado, impõe-se a tradução de qualquer ato redigido em língua estrangeira no Brasil ou no exterior, para ter efeito no Brasil. 

Fala-se com relação ao casamento realizado no exterior. A esse respeito, tem-se segundo o  artigo 1.544 do Código Civil, que o casamento de brasileiros realizado no exterior deverá ser registrado no Brasil no período de 180 dias, a contar da data em que um ou ambos os cônjuges regressar ao Brasil. Tal registro se efetuará no cartório do respectivo domicilio ou, em sua falta, no 1o Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir.

Art. 1.544. O casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros, deverá ser registrado em cento e oitenta dias, a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio, ou, em sua falta, no 1o Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir.

O casamento passará a ter efeito a partir da data de sua realização somente se a união for registrada no Brasil no prazo de 180 dias, a partir da volta de um dos cônjuges ou de ambos ao Brasil. Se o casal não conseguir efetuar o registro dentro do prazo, o casamento passará a ter efeito a partir da data do registro no Serviço de Registro Civil do domicílio do casal no Brasil.

O instrumento de procuração lavrado em notário francês dispensa o visto da autoridade consular, nos termos dos arts. 28 a 30 do Decreto n. 91.207/85, permanecendo a obrigatoriedade de seu registro em cartório, nos termos do art. 129, § 6º, da Lei n. 6.015/73, após ser devidamente traduzido por tradutor juramentado.


VI - OS CASAMENTOS EM NAVIOS E AERONAVES E EM OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS

Quanto aos casamentos em navios ou aeronaves, regem-se, quanto à forma, pelos princípios sobre a situação territorial daqueles meios de transporte, pela lei do Estado de sua nacionalidade, se militares onde quer que se encontrem e se outra espécie, quando em alto-mar ou território que não pertença a nenhum Estado, pela lei do Estado subjacente, se ali navegando, ancorados ou em pouso. É o que se lê do Código Brasileiro do Ar. O Anteprojeto de Lei Geral, estudado pelo Professor Haroldo Valladão, vai na mesma linha, em seu artigo 2º, parágrafo segundo, e ainda no artigo 45, parágrafo segundo.

Os misseis e satélites artificiais consideram-se sempre situados no território do Estado de sua nacionalidade(Anteprojeto, Lei Geral, artigo 45, parágrafo único).

Com relação aos casamentos celebrados em território que não são de nenhum Estado, coisa comum de todos, tendo como exemplo a Antártica, os Corpos Celestes, o Espaço Interplanetário, à falta de regulamentação do uso, regem-se, segundo Haroldo Valladão(Direito Internacional Privado, volume II, 1977, pág. 73), pela lei do grupo ou comunidade ali estabelecidos provisoriamente.


VII – A VALIDADE EXTRÍNSECA DO CASAMENTO

Outra  questão que coloco diz respeito à validade extrínseca do casamento.

Quanto à validade extrínseca, quanto à forma do casamento, o princípio tradicional é o locus regit actum, do lugar da celebração. É certo que o Código Civil Italiano de 1865, artigo 9º, vendo-se a corrente nacionalista de Mancini(que o aceitava quanto as partes que não tivessem a mesma nacionalidade o critério antes exposto), fixou para a forma o locus como regra e a lei nacional comum como exceção facultada aos interessados A Lei de Introdução ao Código Civil da Alemanha 1896, artigo 11, determinava para os casamentos a forma da lei alemã para os casamentos ali realizados.


VIII – A MORTE PRESUMIDA

Aqui se põe,  nesse artigo, o estudo do instituto da morte presumida, com a consequência de declaração de ausência. A justiça e a lei brasileira decidirão acerca do Curador e da arrecadação dos bens existentes no Brasil. Nesse sentido, o Código Bustamante, artigos 78 e 81, e ainda Polônia.

No passado, no Brasil,  o artigo 99 do Decreto  4.857, de 9 de novembro de 1939, regulou o registro do óbito, o assento de óbitos de pessoas desaparecidas em naufrágios, inundações, incêndios, terremoto ou qualquer outra catástrofe, quando não for possível encontrar o cadáver para exame, passados três anos do fato e estiver provada a sua presença no local do desastre.

Assim, desde que não se faça a prova da morte com certidões do registro civil ou por outra forma equivalente, considera-se como se tendo verificado. Essa a lição de Ruggiero (Instituições de direito civil, volume I, pág. 355).

O Código civil italiano revogado aboliu a presunção de morte e não conhecia o instituto da declaração de morte, admitida nos ordenamentos civis da Áustria, Alemanha, que admitiam os institutos da presunção e declaração de morte.

Há os casos de calamidade, desastres naturais que exigem essa declaração.

Ainda no passado, as Leis 256, de 2 de julho de 1896 e 349, de 11 de julho de 1904, na Itália, relativas a desaparecimentos de guerras na África, nas quais a presunção se admitiu não quanto a todos os efeitos gerais que derivam da morte, mas apenas quanto à liquidação de pensões pertencentes às famílias dos presumidos mortos, foram, na Itália, de grande valia. Da mesma forma, o Decreto 23, de 17 de janeiro de 1909, relativo à verificação das mortes em virtude de terremoto ocorrido em 28 de dezembro de 1908. Posteriormente, o Decreto-lei 1467, de 15 de agosto de 1919, formulou regras adequadas à matéria, em face da tragédia da primeira guerra mundial.

Assim, no sistema italiano, a declaração de morte era pedida pelos herdeiros legítimos, pelo cônjuge, pelos parentes ou afins, em linha reta ou colateral, até ao quarto grau, ou pelo Ministério Público. Uma vez declarada a morte os bens são deferidos aos herdeiros legítimos ou testamentários, considerando-se dissolvido o matrimônio, podendo o cônjuge supérstite contrair um novo casamento. Se o desaparecido regressa, recupera-os no estado em que se encontravam ou se ressarce pelo preço por que foram alienados, considerado de boa-fé o que se encontrava na posse. Como a declaração de morte se baseia em presunção, admite-se a prova da existência da pessoa ou de sua morte em momento diverso daquele que foi fixado na sentença.

Há a morte presumida que se dá com a declaração de ausência, a teor do artigo 6º, segunda parte e ainda artigo 9º , IV,  no caso dos artigos 22 a 39 do Código Civil). 

Se uma pessoa desaparecer sem deixar notícias, qualquer interessado na sua sucessão ou o Ministério Público, como fiscal da lei, poderá requerer ao juiz a declaração de sua ausência e nomeação de um curador. O Código de Processo Civil de 1973 determinava, no artigo 1.161, que se deveria publicar, de dois em dois meses, até perfazer um ano, sete editais chamando o ausente. Sem sinal de vida do ausente, poderá ser requerida a sua sucessão provisória e o início do processo de inventário e partilha de seus bens, ocasião em que a ausência do desaparecido passa a ser considerada presumida, tendo efeito que se assemelha ao desaparecimento.

Feita a partilha, seus herdeiros deverão administrar os bens, prestando caução real, com o objetivo de garantir a restituição no caso de o ausente aparecer. Dez anos depois do trânsito em julgado da sentença de abertura da sucessão provisória, sem que o ausente apareça ou cinco anos depois das últimas notícias daquele que conta com 80 anos de idade, será declarada a morte presumida do desaparecido a requerimento de qualquer interessado, convertendo-se a sucessão que era provisória em definitiva. Se o ausente retornar até dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva terá os bens no estado em que se encontrarem e terá direito ao preço em que os herdeiros houvessem recebido com sua venda. Mas, se regressasse após esses dez anos, não teria direito a nada, conforme o artigo 1.168 do CPC de 1973.

O CPC de 2015 possui as seguintes disposições:

Art. 744.  Declarada a ausência nos casos previstos em lei, o juiz mandará arrecadar os bens do ausente e nomear-lhes-á curador na forma estabelecida na Seção VI, observando-se o disposto em lei.

Art. 745.  Feita a arrecadação, o juiz mandará publicar editais na rede mundial de computadores, no sítio do tribunal a que estiver vinculado e na plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça, onde permanecerá por 1 (um) ano, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da comarca, durante 1 (um) ano, reproduzida de 2 (dois) em 2 (dois) meses, anunciando a arrecadação e chamando o ausente a entrar na posse de seus bens.

§ 1o Findo o prazo previsto no edital, poderão os interessados requerer a abertura da sucessão provisória, observando-se o disposto em lei.

§ 2o O interessado, ao requerer a abertura da sucessão provisória, pedirá a citação pessoal dos herdeiros presentes e do curador e, por editais, a dos ausentes para requererem habilitação, na forma dos arts. 689 a 692.

§ 3o Presentes os requisitos legais, poderá ser requerida a conversão da sucessão provisória em definitiva.

§ 4o Regressando o ausente ou algum de seus descendentes ou ascendentes para requerer ao juiz a entrega de bens, serão citados para contestar o pedido os sucessores provisórios ou definitivos, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública, seguindo-se o procedimento comum.

O novo Código Civil, no art. 1.571, § 1º, passou a admitir a presunção de morte como causa de dissolução do casamento. Contraria, assim, o que dispunha o art. 315, parágrafo único, do Código de 1916, que expressamente excluía a morte presumida como causa de dissolução do matrimônio. Ou seja, por mais duradoura que fosse a ausência, não tinha ela o condão de dissolver o casamento. Com a revogação deste dispositivo pelo art. 54 da Lei do Divórcio, e não tratando esta expressamente do tema, entenderam alguns autores ser possível a dissolução do matrimônio pela morte presumida.

Ainda que se efetuasse a sucessão definitiva, com a presunção de morte, não se considerava dissolvido o casamento, de sorte que o cônjuge presente não podia contrair novo casamento. Agora, porém, não há mais óbice,  ensinou José da Silva Pacheco (Inventários e partilhas. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 67) (grifo nosso). “Se a lei admitiu, para efeitos patrimoniais, uma presunção de morte do ausente há mais de vinte anos ou que completou 95 anos de idade, não se vê razão para não admitir a mesma presunção em matéria de casamento. Se houve para um caso uma forte razão de fato a justificar a presunção, também haverá no outro caso” (CRUZ,Guilherme Braga da. Direitos de família. 2. ed. Coimbra: Coimbra, 1942, v. 1, p. 123).

Ensinou Maria Helena Diniz (Curso de direito civil, volume I, 24ª edição, pág. 222) que, pelo artigo 7º, I e II, e parágrafo único do Código Civil e pela Lei 6.015/73, artigos 85 a 88, admitida está a declaração de morte presumida sem decretação de ausência em casos excepcionais, para viabilizar o registro do óbito resolver problemas jurídicos gerados com o desaparecimento e regular sucessão causa mortis como: se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida ante as circunstâncias em que se deu o acidente; naufrágio, incêndio, sequestro, inundação, desastre (RT 781: 228) e se alguém, desaparecido em campanha (ação militar) ou feito prisioneiro não for encontrado em até dois anos após o término da guerra.

Mas, diga-se que nessas hipóteses listadas, a declaração de morte presumida apenas poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do óbito.

O óbito, nesses casos, deverá ser justificado judicialmente diante da presunção legal da ocorrência do evento morte. É a data provável do óbito, fixada por sentença, que irá demarcar o dies a quo em que a declaração de morte presumida, como ensinou Maria Helena Diniz (obra citada) irradiará efeitos.  

Mas, anote-se,  a sentença declaratória de morte presumida, apesar de ter eficácia para todos, erga omnes, não fará coisa julgada material, sendo suscetível de revisão a qualquer momento, desde que apareçam provas relativas à localização do desaparecido, que, se vier a retornar a seu meio, voltará ao estado anterior, na medida que possível deixando de existir a declaração judicial de seu óbito, que deverá retroagir ex tunc, à data de seu desaparecimento, tratando-se de presunção iuris tantum.


IX  – A ABERTURA DA SUCESSÃO PROVISÓRIA OU DEFINITIVA

A abertura da sucessão provisória, ou da definitiva, é matéria do direito das sucessões,  regulada, pela respectiva lex causae no Brasil, do que se lê do artigo 10 da Lei de Introdução.

Os efeitos da ausência, quanto ao cônjuge e aos filhos regem- se pela lex causae dos direitos de família, no Brasil a lei do domicílio. A Convenção de Montevideo( 1869, artigo 10 e 12 e 1940) estão em convergência a tal posição.

A declaração de ausência decretada pelo Juiz de domicílio, da residência habitual e da nacionalidade será, em principio, reconhecida noutros Estados e no Brasil, salvo as restrições anteriores que envolvam ofensa à ordem pública internacional.

Questão importante diz respeito à possibilidade de novo casamento do cônjuge presente, proibido nos Estados em que a declaração de ausência constitui uma presunção de morte, como é o caso do Código Civil da França, artigo 139.

Alguns autores entendem ser matéria de ordem pública para sua proibição. Assim se  lê de Espinola Filho(Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro), Serpa Lopes, dentre outros.

Contra essa posição, se encontrava Haroldo Valladão(obra citada, pág. 10) para quem  se trata de uma questão da prova da morte e a solução natural será sempre, ou a nulidade do segundo casamento ou ainda a restauração do primeiro. 


x - FORUM PRORROGATAE JURISDICTIONIS E EXEQUATUR DE LITTERAE REQUISITORIALES

Dita o artigo 12 da Lei de Introdução: 

Art. 12.  É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.

§ 1o  Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil.

§ 2o A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segundo a forma estabelecida pele lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências.

O parágrafo primeiro do artigo 12 é norma de cunho processual. Ali se define a competência do juízo no Brasil para conhecer das ações que tinham respeito a imóveis no Brasil. 

Pelo artigo 12 da Lei de Introdução, o réu domiciliado no Brasil, seja brasileiro seja estrangeiro, sujeitar-se-á à competência da autoridade judiciária brasileira, perante a qual, conforme os moldes legais atinentes à forma processual e meios de defesa, será intentada qualquer ação que lhe diga respeito. Aplica-se o princípio da prevenção, se dois forem os réus e só um deles estiver domiciliado no Brasil, admitindo a competência do juiz que vier a formar conhecimento da causa em primeiro lugar. 

É certo que há juristas que entendem que a competência da Justiça brasileira nesses casos é obrigatória. Mas há estudiosos que têm outro ponto de vista, no sentido de que tal obrigatoriedade só diz respeito à disposição do artigo 12, § 1º, como pensou Maria Helena Diniz(obra citada, pág. 302). Os artigos 314 e 316, do Código Bustamante, são no sentido de que se as partes não convencionaram o foro de eleição, a justiça brasileira decidirá a demanda se o réu for domiciliado no Brasil e se o cumprimento da obrigação se der no país. 

Possível será a renúncia do foro do domicílio, exceto o caso do artigo 12, § 1º, que alude às ações sobre imóveis situados no Brasil. Nada impede a renúncia ao foro assegurado para eleger outro, esteja o réu domiciliado no Brasil ou deva a obrigação aqui ser cumprida. É o critério do forum prorrogatae jurisdictionis que envolve o principio da submissão voluntária, pela qual respeitadas determinadas condições especiais, como a situação dos bens, poderá uma pessoa domiciliada em determinado Estado sujeitar-se voluntariamente à competência da autoridade judiciária de outro país, desde que tal eleição não venha a implicar fraude à lei aplicável de conformidade com as normas de Direito Internacional Privado do Brasil nem vier a afrontar a ordem pública nacional. 

Pelo Código Bustamante, da redação do artigo 318, será, em primeiro lugar, competente para conhecer dos pleitos a que dê origem o exercício das ações civis e mercantis de toda a classe o juiz a quem os litigantes se submetam expressa ou tacitamente, sempre qeu um deles, pelo menos, seja nacional do Estado contratante  que o magistrado pertença, ou tenha nele o seu domicílio, e salvo o direito local contrário. A submissão não será possível para as ações reais ou mistas sobre bens imóveis se a proiíbe a lei de sua situação, pois será, então, competente o juiz da situação dos bens.

A exigência de que um dos litigantes seja cidadão, ou domiciliado no Estado a que pertence o magistrado admitido, prevalece apenas para os Estados contratantes, e não para os demais. Essa submissão voluntária, segundo a doutrina, somente deverá referir-se às questões patrimoniais, em que se pode fazer predominar a autonomia da vontade e às pessoais, inclusive as relativas ao direito de família.

Mas, essa submissão deve ser repellida se a ação tiver por objeto uma pretensão que fira à ordem pública. Essa submissão poderá ser expressa, se feita pelos interessados, renunciando ao seu próprio foro, designando o juiz a que se submeterem(Còdigo Bustamante, art. 321) ou, ainda, tácita, se o autor se dirigir ao magistrado movendo a ação, ou se o réu praticar, depois de intimado para o juízo, qualquer ato que não seja a exceção declinatória(Código Bustamante, artigo 322). A revelia não é considerada como submissão tácita. 

Quanto ao artigo 12, § 2º, norma de conteúdo processual, dir-se-á que apesar dela se referir apenas à competência em sentido estrito, o juiz poderá levantar o conflito de jurisdição a ser decidido na forma da lei brasileira. As cartas rogatórias ou litterae requisitoriales consistem em pedidos feitos pelo juiz de um país ao outro, tendo por fim solicitar a prática de atos processuais. Ter-se-á a carta precatória caso o juiz deprecado for da mesma categoria e a carta de ordem, se de categoria inferior. 

A carta rogatória subordina-se à lei do país rogante, no que diz respeito ao conteúdo ou matéria de que é objeto; quanto ao procedimento, disciplina-se de acordo com as normas do país rogado(Còdigo Bustamante, artigo 391). Por sua vez, as formalidades da rogatória seguem o locus regit actum; devendo a rogatória conter a indicação exata das diligências  que deverão ser realizadas e cumpridas sem qualquer limitações ou ampliações. 

Ensinou Moniz de Aragão(Comentários ao Código de Processo Civil, volume II, 2ª edição, pág. 172 e seguintes) que as cartas ou comissões rogatórias possibilitam o intercâmbio de atos processuais entre magistrados de países diversos, e tanto podem ser expedidas como recebidas pelos magistrados brasileiros. A legislação do país de origem da carta rogatória lhe determina a forma e o modo de encaminhamento; a do país de destino, além de lhe determinar o modo de reconhecimento e cumprimento ainda lhe investiga o conteúdo, de modo a ver se é possível realizar o ato solicitado. 

O primeiro de todos os requisitos para que seja cumprida a carta rogatória enviada à Justiça brasileira é reconhecer-se, ao país rogante, o exercício da jurisdição no caso concreto. Isso porque se o assunto estiver reservado apenas à jurisdição brasileira, nenhuma rogatória a tal respeito poderá ser cumprida no país. O segundo requisito determina que é necessário examinar o ato em si, cuja prática foi rogada através da carta. Se se tratar de ato processual meramente ordinatório, destinado a impulsionar o processo em busca da sentença, poderá ser praticado. É o caso das citações, intimações, notificações, inquirições, exames de livros, avaliações e vistorias. 

Mas, se a matéria envolver decisão, seja de natureza final ou mesmo das chamadas interlocutórias, em processo, não será possível cumprir a carta, pois será necessário proceder à homologação da sentença, a fim de ser executada. Por fim, é necessário observar se o ato, cuja realização foi rogada, não infringe o ordenamento jurídico interno, de sorte que não haja lesão à ordem pública. 

Cumpridas as exigências acima mencionadas da carta rogatória será autorizado. É o que chamamos de exequatur. 

Bem registrou Maurício Ejchei(Carta rogatória e o cumprimento de atos estrangeiros no Brasil, Ius Navigandi): 

"A  execução de Cartas Rogatórias consta em nossa legislação desde meados do século XIX. Anteriormente ao Aviso Circular nº 1, de 1847, era comum que juízes as recebessem diretamente da parte interessada e as cumprissem sem qualquer formalidade.

A maior parte das Cartas Rogatórias era proveniente de Portugal, e seu cumprimento no Brasil se dava sem que o governo imperial tivesse qualquer ciência a respeito, inclusive as de caráter executório. O Aviso Circular n.1 e regulamentos posteriores disciplinaram a matéria, permitindo seu recebimento por via diplomática ou consular, por apresentação do interessado, ou por remessa direta de juiz a juiz.

O surgimento do exequatur deu-se com a Lei n. 221, de 10 de novembro de 1894, que instituiu um procedimento prévio de admissibilidade, primeiramente da alçada do Poder Executivo, e, com o advento da Constituição de 1934, do Poder Judiciário, sendo competência do Supremo Tribunal Federal. Proibiu-se, na Lei nº 221, a concessão de exequatur para medidas de caráter executório, que, entretanto foram mantidas pela jurisprudência do STF. Com a entrada em vigor da EC n. 45, a competência foi transferida para o Superior Tribunal de Justiça."

Havendo Convenção na matéria com o país ao qual será remetida, por ela se regerá o procedimento a seguir. Na ausência de Convenção, a carta deverá ser traduzida para o idioma do país de destino e encaminhada através da via diplomática. 

Na lição de Pontes de Mirada(Comentários ao Código de Processo Civil, I/178, n. 4) e ainda de Oscar Tenório(Carta Rogatória, in Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro, VII/305, n. 19), o juiz deverá enviar a rogatória ao Ministério da Justiça, o qual, depois de lhe examinar os requisitos formais, a remeterá ao Ministério do Exterior, que a despachará ao país de destino, por intemédio dos representantes diplomáticos brasileiros, para que a apresentem às autoridades locais, a fim de ser praticado o ato rogado, consoante a legislação respectiva vier a dispor. 

Lecionou Egaz Moniz(obra citada, pág. 194) que a tradução, imposta pelo texto, poderá ser feita fora da comarca de origem. Discute-se o problema do cumprimento da carta rogatória na ausência de relações diplomáticas. Arthur Briggs(Cartas Rogatórias, pág. 156/157) apresenta duas soluções para o caso: a via consular e a remessa direta, de governo a governo. A primeira não é, entretanto, adotada no Brasil, preconizando-se a solução pela segunda via. 

Francisco Campos (Parecer, in Revista Forense, 126/35-51) ensinou que se nenhuma das duas soluções acentuadas for viável, à luz do ZPO alemão, parágrafo 203, e do ZPO austríaco,parágrafos 121 e 122, aplica-se o edital, situação válida em determinadas situações, por ser inacessível à Justiça brasileira o lugar onde se encontra a pessoa. 

De todos os atos praticados no cumprimento da carta serão intimadas as partes, que poderão opor embargos, quando vierem a discordar. Interpostos os embargos, o juiz dará vista ao embargado e, depois, ao Ministério Público, não sendo este recorrente ou recorrido. Após concluídos os atos necessários ao cumprimento da carta, e pagas pelo interessado as custas respectivas, será devolvida à autoridade competente de acordo com a Constituição e sua Emenda Constitucional 45/2004, que é o Superior Tribunal de Justiça. 


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