Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/59464
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A PROPOSTA MAIS VANTAJOSA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA MODALIDADE DE LICITAÇÃO PREGÃO

UM OLHAR REFLEXIVO ACERCA DA ECONOMICIDADE, A LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA.

A PROPOSTA MAIS VANTAJOSA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA MODALIDADE DE LICITAÇÃO PREGÃO. UM OLHAR REFLEXIVO ACERCA DA ECONOMICIDADE, A LUZ DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA.

Publicado em . Elaborado em .

Análise da abordagem de como na Administração pública as aquisições de bens, de materiais, através da modalidade licitatória pregão, podem em muitos casos, não conduzir o certame à proposta mais vantajosa para o órgão licitante.

1 INTRODUÇÃO

Iniciamos a apresentação deste trabalho, citando, antes do aprofundamento nos tópicos a seguir, que em toda e qualquer relação de negócio, seja em esfera privada ou esfera pública, sempre busca-se o melhor negócio. Porém, os particulares são livres para a realização dos seus negócios. Ocorre que na Administração pública, isso se trata de uma obrigação, conforme as amarras que encontram-se dispostas pelo nosso ordenamento jurídico. Os órgãos de governo têm o dever legal, que os obrigam, exceto para alguns raros casos, a promover um procedimento prévio para as contratações públicas, que denomina-se Licitação.

Por seu turno, a obrigatoriedade de licitar encontra seu imperativo legal no art.37 da Constituição Federal de 1988, inciso XXI.

Essa breve exposição inicial, corolário do princípio da legalidade, insculpido no inciso II do art.5º da Constituição Federal em vigor e corroborado pelo caput do art.37, impõe ao administrador público regras e regula a sua discricionariedade, visando coibir o comprometimento da boa realização da finalidade de interesse público. Ou seja, subordina a atividade administrativa à lei.

Hely Lopes Meirelles (p.87), nos apresenta de forma didática, expressão que para nós é um ângulo de entendimento que representa bem o princípio da legalidade:

“No trato jurídico, a palavra administração traz em si conceito oposto ao de propriedade. E o que desejamos assinalar é que os termos administração e administrador importam sempre a ideia de zelo e conservação de bens e interesses, ao passo que expressões propriedade e proprietário trazem ínsita a ideia de disponibilidade e alienação. Por aí se vê que os poderes normais do administrador são simplesmente conservação e utilização dos bens confiados à sua gestão, necessitando sempre de consentimento especial do titular de tais bens e interesses para os atos de alienação oneração, destruição e renúncia. Esse consentimento, na Administração Pública, deve vir expressa em lei”

  Para Di Pietro (p.360):

“O Estado segue o princípio da vinculação positiva, segundo o qual a administração só pode fazer o que a lei permite”.

Para Gasparini, Diógenes (2011, p.538), em seu capítulo sobre licitação – aspectos gerais – duas são as finalidades da licitação: Primeiro, visa selecionar a proposta mais vantajosa, que traga os maiores benefícios financeiros aos órgãos licitantes. E em segundo lugar oferecer igual tratamento aos que desejam participar do processo, conforme expresso no art.3º da L8666/93, oferecendo assim, ao nosso ver, a isonomia necessária e a maior amplitude do número de participantes no certame.

Trouxemos agora alguns conceitos doutrinários sobre Licitação, que seguem uma mesma linha de raciocínio em suas definições, se coadunando com a expressa previsão legal.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2000, p.530) conceitua Licitação como:

“O procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental, pretende alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipuladas previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados”.

Usufruindo ainda a fluidez do brilho de Bandeira de Mello (2000, p.528):

“É um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa para as conveniências públicas”.

Para o insigne jurista, José Afonso da Silva (p.672):

“Licitação é um procedimento administrativo destinado a provocar propostas e a escolher proponentes de execução de obras, serviços, compras ou de alienações do Poder Público”.

E continua lecionando:

“O princípio da licitação pública significa que essas contratações ficam sujeitas, como regra, ao procedimento de seleção de propostas mais vantajosas para a Administração Pública. Constitui um princípio instrumental de realização dos princípios da moralidade administrativa e do tratamento isonômico dos eventuais contratantes com o Poder Público”.   

    Para a renomada doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (p.350):

“...um ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitam as condições do instrumento convocatório, a possibilidade de formularem as propostas dentre as quais selecionará e aceitará a que for mais conveniente para a celebração do contrato administrativo”.

Para tornar nítido o que formulamos em nosso raciocínio inicial, amparado com robustez doutrinária, dissemos que a administração pública, na aquisição, contratação de bens, tem o dever, com previsão legal expressa, de sempre buscar as propostas mais vantajosas. E que faz isto através de um procedimento administrativo prévio à contratação, denominado Licitação – também doutrinariamente já definido.

Vale seguir com a citação lúcida do nobre jurista José Afonso da Silva:

“A Administração Pública é informada por diversos princípios gerais, destinados, de um lado, a orientar a ação do administrador na prática dos atos administrativos e, de outro lado, a garantir a boa administração, que se consubstancia na correta gestão dos negócios públicos e no manejo dos recursos públicos (dinheiro, bens e serviços) visando o interesse coletivo”. (p.666).

Os princípios estampados no caput do art.37 da CF/88 são os principais norteadores da administração pública, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Porém, toda a carga e a dedução principiológica orientadora da atividade administrativa, de valor inegável a partir da CF/88, ainda é reforçada ou extraída do inciso XXI e §§ 1º a 6º do mesmo artigo, bem como de outros que estão explicitamente considerados no artigo 2º da Lei n.9.784/99, que trata do processo administrativo disciplinar.

Para inserir o leitor em toda a construção da nossa ideia, faremos a exposição logo adiante do que abordaremos em cada um dos capítulos e seus subtítulos.

Após informarmos que a administração pública na aquisição de bens rege-se por legislação com regras e princípios que impõe um processo licitatório, e que o mesmo possui um procedimento específico para que seja alcançada a proposta mais vantajosa para o ente público, resolvemos delimitar o nosso trabalho na modalidade de licitação chamada pregão, que definiremos mais adiante.

O presente trabalho tem o desiderato de lançar um olhar sobre a economicidade do procedimento do pregão, sob a luz do princípio constitucional da eficiência.

Nossa metodologia utilizada para a realização deste trabalho partiu de análise de experiência cotidiana pesquisada, empírica; indo em seguida buscar amparo na doutrina especializada e jurisprudência como forma de consolidar toda a nossa tese.

Objetivamos trilhar o caminho analítico com a referência necessária às evidências empíricas, sem perder o respaldo no fio condutor do rigor lógico.

Em nosso trabalho percorremos o seguinte caminho: no nosso capítulo 2, após esta introdução, fizemos uma abordagem sobre os pontos iniciais da modalidade de licitação Pregão, trazendo informações sobre o seu surgimento no nosso ordenamento, qual o seu conceito doutrinário, bem como as suas principais características. Seguimos pelo capítulo 3, fazendo uma incursão pelos princípios que serão mais relevantes ao longo do desenvolvimento da nossa ideia, com enfoque na economicidade do Pregão. O capítulo 4 do presente trabalho busca mergulhar nos instrumentos necessários para a realização do pregão, informando suas características e importância, as fases existentes no pregão, e instrumentos propriamente ditos, ou instrumento convocatório, quais sejam,  o Termo de Referência, ponto de partida do procedimento, e o Edital, que é o instrumento que convoca, dá publicidade ao certame.

Ultrapassada toda a base preliminar, já no capítulo 5 trataremos de discutir o que seja a proposta mais vantajosa, suas características, e especialmente para a administração pública. E inferimos daí um ponto de análise sobre a persecução do combate ao desperdício no setor público.

E já em raciocínio adiantado, passamos ao capítulo 6, onde faremos toda a reflexão sobre a proposta mais vantajosa para a administração pública na modalidade de licitação pregão, lançando um olhar sobre a economicidade. Perquiriremos ainda o caminho, do instrumento convocatório ao recebimento dos bens pela administração pública, analisaremos nesse ínterim possíveis deficiências na confecção do instrumento convocatório, e em outras fases do procedimento, para a partir desses dados trazer à reflexão mais apurada sobre a economicidade.

Por fim nos ateremos às nossas considerações finais com a nossa conclusão no capítulo 7.


2  DA MODALIDADE DE LICITAÇÃO PREGÃO

2.1  Surgimento

Esse modalidade de licitação, surge inicialmente no ordenamento jurídico pátrio com a edição da Lei Geral de Telecomunicação (9.472/97), que cria a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), que em seus artigos 54 a 56, já possibilitam encontrar a melhor proposta por meio de pregão. E esse diploma normativo não se estendia a outras entidades da Administração Pública direta ou indireta.

A modalidade de licitação Pregão foi instituída com importante diploma jurídico sobre o tema: a Medida Provisória nº 2.026, de 4 de maio de 2000. Este ato normativo alterou-se pela MP nº 2.182/2001, que o instituía apenas para a União. Essa restrição estava sendo considerada inconstitucional pela quase totalidade da doutrina, sob o entendimento de que se tratando de norma geral deveria contemplar os demais entes federativos. Finalmente a questão foi superada com a conversão na Lei Federal nº 10.520, de 17 de julho de 2002.

Esse conjunto normativo, culminando na Lei 10.520, não revogou a Lei 8.666/93. Trouxe ao nosso ordenamento jurídico uma nova figura, acrescentando o Pregão, como nova modalidade às já existente, quais sejam: a concorrência, a tomada de preços, o convite, o concurso e o leilão.

Quando o Pregão foi instituído por Medida Provisória, conforme acabamos de citar, a mesma dispunha que a adoção desta modalidade licitatória seria para a aquisição de bens e serviços comuns, no âmbito apenas da União. Porém ao ser instituído em 2002 a Lei do Pregão, observamos que a União pretendeu que esta modalidade fosse aplicável a todas as pessoas políticas, conforme estabelece os seus artigos 1º, § único, e 118.

Embora o art.1º da Lei Federal 10.520, de 17 de julho de 2002, estabeleça

que “para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta lei”, o art.4º do Decreto Federal nº.5.450, de 31 de maio de 2005, determina a obrigatoriedade dessa modalidade nas licitações para aquisição de bens e serviços comuns da União, sendo preferencial a utilização na sua forma eletrônica. (Grifos nossos)

2.2  Conceito

Em linhas gerais, apreendemos e podemos conceituar o pregão como uma modalidade de licitação, aplicável tão somente aos certames do tipo menor preço, que tem por objetivo a aquisição de bens e serviços comuns, cujo oferecimento de propostas dá-se, inicialmente, por meio de ofertas sigilosas, que facultarão, aos proponentes que fizeram as melhores propostas, o oferecimento de lances públicos, verbais ou por meio eletrônico, até que se atinja a proposta economicamente mais vantajosa para a administração pública.

Vejamos o que encontramos nos ensinamentos doutrinários.

Marçal Justen Filho conceitua o pregão como:

“Uma modalidade de licitação de tipo menor preço, destinada à seleção da proposta mais vantajosa de contratação de bem ou serviço comum, caracterizada pela existência de uma fase competitiva inicial, em que os licitantes dispõem do ônus de formular propostas sucessivas, e de uma fase posterior de verificação dos requisitos de habilitação e de satisfatoriedade das ofertas”.

Jacoby Fernandes leciona na seguinte direção:        

“O Pregão é uma nova modalidade de licitação pública e pode ser conceituado como o procedimento administrativo por meio do qual a Administração Pública, garantindo a isonomia, seleciona fornecedor ou prestador de serviço, visando à execução de objeto comum no mercado, permitindo aos licitantes, em sessão pública presencial ou virtual, reduzir o valor da proposta por meio de lances sucessivos”.

A legislação, através do que encontra-se expresso no art.4º, inc.X, da Lei nº.10.520/2002, como já dissemos inicialmente, traz como regra da fase externa do pregão, que este é uma licitação do tipo menor preço.

A licitação do tipo menor preço diferencia-se pela licitação de técnica, não pela ausência total de requisitos de qualidade. A característica que diferencia a licitação de menor preço reside no fato de que a seleção da proposta vencedora toma em consideração exclusivamente o preço das propostas, mas que atendam aos requisitos de qualidade mínima. (Marçal - 2013, pág.11).

Difundiu-se uma concepção de que o pregão comportaria a atenuação do princípio da vinculação ao edital, pela própria estrutura procedimental, assegurando ao agente administrativo competência discricionária para admitir ou rejeitar propostas, sanar defeitos nelas existentes, admitir novos documentos, entre outras questões. Tais entendimentos, Justen Filho considera que são incorretos, pois estariam infringindo tanto a Lei 8.666 como a Lei 10.520. Para o autor em tela, não existe suporte normativo que respalde essa concepção, pois o pregoeiro está tão vinculado à lei e ao ato convocatório num pregão, como se encontra a comissão de licitação nas demais modalidades licitatórias.

Ao nosso ver, a diferença básica nesse caso, é que a simplicidade do objeto licitado no pregão dispensa exigências mais rigorosas. Não devemos confundir as coisas. No pregão os requisitos são mais simples.

Para um melhor entendimento e objetivando esclarecer distinções entre modalidades de licitação, nas licitações de melhor técnica ou técnica e preço, certamente que estão previstos os requisitos mínimos de qualidade e técnica.

Ocorre que o diferencial nesses casos é que a proposta vencedora encontra um balanceamento na avaliação da qualidade técnica concomitantemente com o preço. A elevação da qualidade poderá ser um vantagem significativa para a Administração Pública, e nos casos por exemplo de técnica e preço, produz-se uma média entre vantagem técnica e econômica, podendo uma proposta de preço mais elevada sagrar-se a vencedora do certame.

Entendemos que se faz necessário tecermos agora alguns comentários sobre o que seriam bens ou serviços comuns, que encontram-se intrínsecos ao conceito dessa modalidade, qual seja, pregão.

O § único do art.1º da lei busca conceituá-los da seguinte forma: “Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efeitos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelos edital, por meio de especificação usuais no mercado”.

O anexo II do Decreto Federal nº 3.555/2000 relacionava os denominados bens ou serviços comuns em três grupos, assim: a) bens comuns de consumo; b) bens comuns permanentes; e c) serviços comuns.

Havia um questionamento se o rol de hipóteses constantes desse Anexo II do Decreto, apresentava-se como um elenco taxativo de hipóteses ou se, ao contrário, as enunciava de forma exemplificativa.

Existe uma ampla discussão doutrinária sobre a definição de bens e serviços comuns.

Não obstante, o entendimento ter sido pacificado no sentido de que o rol era meramente exemplificativo, o Decreto Federal nº 7.174, de 12 de maio de 2010, revogou o Anexo II do Decreto Federal nº 3.555/2000.

Em respeito ao princípio do julgamento objetivo, torna-se indispensável a definição do objeto licitado a partir de parâmetros precisos e objetivos, podendo o conceito de bens e serviços comuns ser prescindido da expressão “objetivamente definidos no edital”.

O objetivo deve se voltar para a aquisição de bens, cujo padrão de qualidade possa ser aferido com relativa facilidade pelo pregoeiro, para que o mesmo viabilize, sem necessitar de investigações técnicas sofisticadas, a aceitabilidade da proposta.

Destarte, torna-se imprescindível que o pregoeiro ao examinar o objeto licitável, verifique a adequação do mesmo ao conceito de bem ou serviço comum, acima explicitado, para a partir daí optar pelo modalidade pregão.

A doutrina majoritária, tem o entendimento de caso seja possível aferir com facilidade se o produto licitado é apto para satisfazer o interesse público, a opção deve ser pelo pregão.

2.3  Características

O pregão traz como principal característica, a presença de um procedimento diferenciado das demais modalidades de licitação, com o objetivo de permitir à Administração Pública, a celebração de contratos administrativos sob condições mais vantajosas.

O rito do pregão caracteriza-se pela inversão cronológica das fases. O julgamento das propostas é realizado antes da habilitação, e a adjudicação antes da homologação. Ressaltamos ainda que após a abertura dos envelopes contendo todas as propostas, segue-se ao oferecimento pelos participantes interessados, o oferecimento de lances sucessivos.

  Preconiza o eminente Professor Jacoby (2011) que o Pregão tem como características:

  1. Limitação do uso a compras e serviços comuns;
  2. Possibilidade de o licitante reduzir o valor da proposta durante a sessão;
  3. A inversão das fases de julgamento da habilitação e da proposta; e
  4. Redução dos recursos a apenas um, que deve ser apresentado no final do certame.

O critério de adoção do pregão está na existência de um objeto comum. A adoção inadequada do pregão para objeto não comum traz uma questão fundamental: um procedimento licitatório não apto a avaliar com maior profundidade a qualificação técnica do licitante e as virtudes de qualidade do objeto ofertado. O problema é a eventual seleção de uma proposta não satisfatória.

A modalidade Pregão tende a ampliar o universo de licitantes, permitindo, segundo avalia Marçal Justen Filho (2013, p.43), a participação de todo e qualquer sujeito que apresente condições mínimas e que oferte um produto qualquer.

A inversão das fases muda a ordem tradicional prevista na Lei 8.666¹. No caso do pregão, a competição entre os licitantes ocorre em momento procedimental que antecede o julgamento da habilitação. A observância dos requisitos de habilitação do licitante se dará para o que apresentar a melhor proposta.

     Em publicação de Orientações e Jurisprudências do TCU – Licitações e Contratos (2010, p.29), o mesmo elege e prestigia para o pregão o princípio da celeridade da seguinte forma:

“O princípio da celeridade, consagrado como uma das diretrizes a ser observada em licitações na modalidade pregão, busca simplificar procedimentos de rigorismos exacerbados e de formalidades desnecessárias. As decisões, sempre que possível, devem ser tomadas no momento da sessão”.

A estrutura procedimental do pregão é adequada a selecionar de forma mais célere, a proposta que propicie o menor desembolso possível para a Administração Pública, não sendo voltada para um aprofundamento da análise da capacidade do licitante nem da avaliação das variações da qualidade do produto que está sendo ofertado.

     Para Celso Antônio Bandeira de Mello (p.573):

“Apresenta característica distintiva com relação às outras modalidades, pelo menos duas muito salientes: uma, ao contrário delas, a de que o valor é determinante em suas variedades, o Pregão é utilizável em qualquer que seja o valor do bem ou serviço a ser adquirido; e a outra, a de que o exame de habilitação não é prévio ao exame das propostas, e sim posterior a ele.

A configuração do bem como comum independe do seu preço. O pregão não é reservado apenas para objetos de pequeno valor. A Administração não está autorizada a adquirir objeto pagando mais quando pode fazê-lo com objeto com preço inferior, mesmo quando o mais caro seja de qualidade superior. O essencial é que o de preço inferior satisfaça a sua necessidade administrativa.

Observa Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, “mesmo em se tratando de bem ou serviço comum, pode a administração definir características que restringem a competição, desde que tenha por objetivo assegurar a qualidade ou melhor desempenho e que essas restrições sejam facilmente compreendidas no mercado, e que nos termos do art.3º, inc.III, da Lei 10.520/2002 sejam justificadas nos autos do processo”.

Parece-nos inclusive que há um limite bastante tênue entre a vedação legal de restringir a competição e a recomendação doutrinária de oferecer  certa discricionariedade ao agente público que conduza o procedimento.

É importante um esforço para não confundir, e não conduzir mal essas duas situações sob pena de prejuízo ao erário público. Deve prevalecer a supremacia do interesse público. O interesse público primário, da coletividade como um todo.

Eis uma de nossas preocupações quanto à possibilidade de haver aquisições, a partir dessa modalidade licitatória, que conduzam a uma proposta que poderá não ser a mais vantajosa. Esse critério do menor preço não deve tornar irrelevante as características técnicas da proposta. Uma avaliação da qualidade mínima do objeto se faz necessária. Ou seja, nas licitações de menor preço não podem ser excluídas as exigências de qualidade mínima para satisfazer as necessidades da Administração Pública.

Para Justen Filho, na licitação de menor preço, o edital deve necessariamente estabelecer requisitos mínimos de qualidade e técnica, sob pena de nulidade insanável. O licitante que deixar de atender a tais exigências deverá ser desclassificado. Eis novamente a nossa preocupação: essa avaliação de requisitos de qualidade na prática, ocorre de forma ideal? Os mais diversos órgãos do setor público possuem condições ideais no que diz respeito aos servidores e o seu preparo técnico adequado que os permite avaliar de forma adequada? Discutiremos adiante.

Se, por um rigor maior, o critério for simplesmente o menor preço, o resultado será a aquisição do pior produto possível. Infere-se daí a importância do definição do instrumento convocatório, da melhor análise das amostras e da melhor fiscalização no recebimento dos objetos.


3  PRINCÍPIOS RELEVANTES À ECONOMICIDADE

Em sede de preliminares sobre princípios, abordamos que Marçal Justen Filho (2013, p.64) faz uma distinção entre princípios e regras, que achamos oportuno trazer à baila, aqui, agora, e que só reforça nosso entendimento de que existe a total cumplicidade, total complementariedade entre eles:

“Os princípios apresentam uma maior densidade axiológica, maior generalidade e menor precisão. A sua aplicação envolve uma atividade de ponderação diante do caso concreto. Não se pode extrair, de modo abstrato, uma solução exata e precisa a partir dos princípios. Já as regras são determinações normativas dotadas de menor generalidade e apresentam maior precisão. A sua aplicação se faz pela subsunção dos fatos a uma hipótese de incidência”.

E continua: “Os princípios propiciam maior adaptabilidade da ordem jurídica aos valores e às circunstâncias, mas isso se faz à custa da segurança e da certeza; as regras, por seu turno, ampliam o grau de previsibilidade e de segurança da ordem jurídica”.

“Nenhuma ordem jurídica pode ser composta apenas por princípios, porque isso geraria enorme insegurança. Não é desejável que o direito seja composto apenas por regras, pois isso acarretaria rigor e inflexibilidade”.

Em consonância com o Direito Administrativo, “Portanto, é necessária a conjugação de princípios e regras para a obtenção de uma ordem jurídica adequada e satisfatória”. Conclui o insigne jurista.

Estamos vendo a partir dessa análise doutrinária, que a carga principiológica da nossa constituição vigente, é de extrema importância e permeia toda a aplicação do Direito. E que princípios e regras, na sua aplicação, não são de modo algum compartimentos estanques. Possuem a necessidade de conjugação diante do caso concreto.

Em síntese, apertadíssima, o Jurista Inocêncio Mártires Coelho (G.Mendes, p.875), nos orienta que “Não se pode deixar de registrar que a Constituição de 1988 trouxe nova conformação no que tange ao tratamento do tema referente à Administração Pública, estabelecendo a principiologia do regime jurídico administrativo”.

Na esteira do entendimento, desse doutrinador, é de nossa compreensão que a CF88 construiu um arcabouço principiológico, valorativo, com determinação normativa, que não poderá jamais ser desprezado. Ao estudo do Direito Administrativo, estritamente legalista, essa necessidade de ponderação entre regras e princípios, também se faz necessária.

Para Djalma Pinto (2010, p.19), os princípios impedem a consumação de aberrações a pretexto de aplicação da lei. Representam valores extraídos do seio da sociedade que são normatizados, adquirindo, assim, força vinculante em relação ao legislador e ao aplicador do direito.

As cortes de contas, os órgãos de controle e o STF analisam diversos casos realizando o balanceamento de valores, e produz muitas de suas recomendações, decisões e entendimentos, privilegiando os princípios.

Jurisprudência do TCU

   Princípio – anulação

   TCU entendeu: “A nosso ver, a regra de que os atos devem ser anulados por ilegalidade – sumulada pelo STF 473 – não é absoluta. No caso de licitações, deve-se verificar se as falhas encontradas são meramente formais ou se, em decorrência delas, foram feridos princípios basilares como a isonomia, a economicidade, a moralidade e a publicidade”.

Fonte: TCU. Processo nº TC-300.147/1998-8. Decisão nº 640/1999 – Plenário.

Jurisprudência do STF

   Proposta – mais vantajosa – interesse público

Nota: “O STF entendeu que se a irregularidade praticada pela licitante vencedora, que não atendeu a formalidade prevista no Edital licitatório, não lhe trouxe vantagem nem implicou prejuízo para os demais participantes, bem como se o vício apontado não interferiu no julgamento objetivo da proposta, não se vislumbra ofensa aos demais princípios exigíveis na atuação da Administração Pública, correta a adjudicação do objeto da licitação à licitante que ofereceu a proposta mais vantajosa, em prestígio do interesse público, escopo da atividade administrativa”.

Fonte: STF. 1ª Turma. RMS nº 23.714-1/DF. DJ 13 out. 2000. P. 00021.

3.1  Princípio da Economicidade

Este princípio está estampado no art. 70 da CF/88, que em breve avaliação visa promover os resultados esperados com o menor custo possível.

Princípio que não é muito abordado pela doutrina jurídica, mas não podemos deixar de buscar a compreensão da sua normatividade, pois ele une qualidade, celeridade e menor custo na prestação do serviço ou no trato com os bens públicos.

Além de princípio constitucional a economicidade encontra-se em nosso ordenamento infraconstitucional, inclusive citaremos alguns artigos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União – lei nº 8.443, de 16/07/1992, especialmente os artigos 1º § 1º, 16, I, 37, IV, 43, II e 90 § 2º, que prestigiam a economicidade.

Embora o fundamento da economicidade seja ético, não se pode prescindir da racionalidade econômica estatal a serviço da realização do justo no âmbito global socioeconômico.

De acordo com o Conselheiro (Citadini, 1989):

“Ademais, não podemos esquecer que a inclusão da economicidade no texto constitucional vigente, embora novidade, está ligada a 2 princípios clássicos e informativos de nosso Direito Administrativo, quais sejam, o do interesse público e o da eficiência. Diríamos então que, se antes a economicidade era implícita, hoje, pela autonomia alcançada, ela é outro princípio constitucional a que todo administrador público fica obrigado a considerar”.

“Sem dúvida que as transformações havidas com a nova Constituição estão a exigir grandes esforços por parte da Administração. Os Tribunais de Contas precisarão contar com pessoas qualificadas, especialistas, para serem treinadas, com experiência na área pública, a fim de efetuarem fiscalização mais abrangente no futuro, cumprindo com seu papel”.

Antônio Roque Citadini é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

PUBLICADO NO JORNAL "O ESTADO DE S. PAULO", DE 30/04/89, P. 40.

Em que pese o trecho abaixo ter sido editado há tanto tempo, logo após a nossa atual Constituição, parece visivelmente nítido que o Conselheiro acerta em seu comento supramencionado e o mesmo continua hodierno, e traz como preocupação central o princípio da economicidade.

Passamos a defender ainda que além das Corte de Contas, os órgãos licitantes precisarão contar também com as pessoas qualificadas (critério objetivo) com elevado grau de compromisso (critério subjetivo), especialistas nos assuntos licitatórios que possam trazer os maiores benefícios ao erário público.

O princípio da economicidade, que de acordo com pequena inscrição doutrinária encontrada, está insculpido no artigo 70 da CF/88 brasileira, e tem sobremaneira, fundamental importância na qualidade dos gastos públicos.

Decidimos abordar este princípio, sob a ótica de luz intensa que ele deve receber do princípio constitucional da eficiência, um dos componentes do eixo de orientação da administração pública.

Façamos um recorte em nosso trabalho e procuramos com Gabardo, esclarecendo pois que não parece razoável, entender que o princípio constitucional da eficiência possa ser reduzido a um critério meramente econômico (para isso a Constituição e a doutrina já consagraram o princípio da economicidade). A economicidade é um critério componente da eficiência, segundo Emerson Gabardo, e não o contrário. (T.M., p.342).

Sob a ótica de Marçal (C.L8666, p.62), a economicidade é o resultado da comparação entre os encargos assumidos pelo estado e os direitos a ele atribuídos, em virtude da contratação administrativa. Quanto mais desproporcional em favor do Estado o resultado dessa relação, tanto melhor atendido estará o princípio em tela.

Economicidade é pois algo qualidade daquilo que é econômico e em certa medida algo fácil de ser mensurado, pois, se dermos ênfase ao dia-a-dia das nossas despesas domésticas, de nossa residência, encontraremos uma clara noção de economicidade.

3.2  Princípio da Eficiência

A explicitação do princípio da eficiência na administração pública, se deu com a edição da Emenda Constitucional nº19, de junho de 1998, que a introduziu no caput do art.37.

Em sede de licitações e contratação públicas, a implantação da eficiência empresta contribuição decisiva, otimizando os recursos públicos, e racionalizando estoques, quantidades e objetos contratados.

Ao falarmos em racionalizar, constitui uma das preocupações nossa aqui neste ensaio, as quantidades desperdiçadas por possíveis no dimensionamento quantitativo e qualitativo dos produtos adquiridos com a finalidade de serem aplicadas na gestão dos órgãos públicos.

Ao entendermos o quanto é descabida a realização da modalidade de licitação mais gravosa, quando possível fazê-lo por modalidade mais simples, pois a otimização dos recursos públicos e a agilidade na realização das rotinas administrativos inferimos desse princípio agora analisado, focamos em avaliar pelo prisma da eficiência que leve os agentes públicos envolvidos no comprometimento da montagem do termo de referência, base para o instrumento convocatório no pregão.

Merece referência a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello (p.122), ao afirmar:

“O fato é que o princípio da eficiência não parece ser mais do que uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito Italiano: o princípio da boa administração. Nesse sentido, o ideal de eficiência, como elemento da boa administração, representa a formalização jurídica de um interesse público geral definido politicamente e que é retroalimentado pela existência de uma estrutura pública organizacional”.

Corroborando com Bandeira de Mello, Inocêncio Mártires Coelho nos ensina que:

“O princípio da eficiência consubstancia a exigência de que os gestores da coisa pública não economizem esforços no desempenho dos seus encargos, de modo a otimizar o emprego dos recursos que a sociedade destina para a satisfação das suas múltiplas necessidades; numa palavra, que pratiquem a “boa administração”, de que falam os publicistas italianos”. (G.M., p.884).

Princípio tem conotação jurídica de norma. Desse modo, é dever da Administração pública, adstrita que é a estrita legalidade, ser eficiente, pois ela é a gestora de bens que pertencem a todos. A existência de atos que caracterizem a sua ineficiência, são, como ditos por Emerson Gabardo, patologia do sistema. (T.M.p.347).

Em uma avaliação de José Afonso da Silva, eficiência é um conceito econômico e não jurídico; não qualifica normas, qualifica atividades. Destarte, o referido princípio constitucional orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo. Rege-se, pois, pela regra da consecução do maior benefício com o menor custo possível. Portanto, o princípio da eficiência administrativa tem como conteúdo a relação meios e resultados.

Merece nosso registro também o que assinala o Professor André Ramos Tavares (p.1197):

“Certamente um dos aspectos mais salientes do princípio da eficiência é a busca da economicidade na Administração, exigida pelo art.70 da CF88, ao estabelecer a fiscalização do seu cumprimento “.

3.3  Princípio da Moralidade como cooperação

Trazemos uma abordagem do princípio da Moralidade como cooperação, para contribuir na contextualização do nosso trabalho aqui apresentado. É certo de que o princípio da moralidade é de ampla discussão doutrinária, trazendo uma variedade em sua interpretação. Mas partindo de uma análise em trabalho publicado pelo professor de direito administrativo da USP, Thiago Marrara, e buscando fundamentos em outros doutrinadores, procuramos enumerar três enfoques interpretativos sobre ele.

Antes de entramos na tese do referido professor, resolvemos trazer o entendimento de Diogenes Gasparini (pág.63), à luz do Professor de Toulousse, Hauriou, que o princípio da moralidade com status constitucional atual, extrai-se do conjunto de regras que regula o agir da administração pública.

Citemos entendimento manifestado pelo pleno do STF, por meio do RE579951, julgado em 20 de agosto de 2008, que que esta corte suprema entendeu que a vedação ao nepotismo na administração, não exige a edição de lei formal, por decorrer diretamente dos princípios constitucionais, sobretudo do princípio da moralidade. (Esse também é o entendimento de Gasparini – p.64)

          Segundo a tese do professor Marrara, em sede de direito administrativo, a compreensão da moralidade no direito brasileiro, deve ser necessariamente interpretada à luz de um Estado Social e Democrático de Direito, por ser a configuração estatal básica definida pela Carta Magna vigente no país; e portanto busca apontar para um conteúdo mínimo para o princípio da moralidade administrativa, ciente de que a sua exposição não tem a pretensão de oferecer a essência final da moralidade administrativa. Destarte, busca indicar um conteúdo central que sirva de parâmetro para o controle de sua observância, auxiliando a atividade decisional no âmbito administrativo.

Com esse intuito, o autor percorre em seu ensaio, três parâmetros que considera básico para a moralidade administrativa: 1) a moralidade-probidade, 2) a moralidade-razoabilidade e 3) a moralidade-cooperação.

Pretendemos, não por entender que as outras duas abordagens não possuem o devido relevo, mas em virtude da delimitação do nosso tema, focar nesse subtítulo, o parâmetro da moralidade-cooperação, que falaremos a seguir. Não obstante, faremos breves considerações sobre os outros dois parâmetros, quais sejam: probidade e razoabilidade, que acabamos de citar.

Partimos da observação de uma análise inicial de Moreira Neto (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo), de que o bom resultado que a moralidade administrativa impõe ao exercício das funções administrativa “só pode ser o que concorra para a realização da boa administração, inegavelmente o que satisfaz o direcionamento dos interesses públicos”. E sendo assim, a moralidade serve para impedir que os dirigentes estatais empregue seus poderes públicos no intuito de afastar as vontades democraticamente legitimadas.

Deduzimos do raciocínio inicial que ocorre legitimação estatal, a partir da prática administrativa correta e adequada do seu poder pelas autoridades públicas, sendo pressuposto básico para a aceitação por parte da sociedade que o Poder Público representa. Para Thiago Navarro, Na medida em que o poder é exercido moralmente, gera-se respeito pela ação estatal, fomentando a cooperação voluntária de um mínimo da sociedade a favor do Estado, permitindo assim que este continue a existir e ditar normas que regem e balizam os comportamentos sociais, sancionando os que não as observam.

Insere-se aqui um elemento finalístico para todas as ações estatais. Agir com moralidade administrativa significa agir conforme finalidades públicas legítimas.

Analisemos a operacionalização do princípio em questão, nos baseando na observação prática, em enumeração não exaustiva, da probidade, da razoabilidade e da cooperação.

Moralidade-probidade

          Para José Afonso da Silva (2008, p.669):

A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, sem prejuízo da ação penal cabível (art.37, § 4º). A probidade administrativa consiste no dever de o funcionário servir a administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer.

              Desrespeitar esse dever implica em improbidade administrativa.

          A probidade como subprincípio da moralidade, objetiva coibir o desvio dos interesses públicos, quer para evitar o enriquecimento indevido dos atores dessa cena, quer para prejudicar o Estado ou os cidadãos. A improbidade vem ganhando tamanho espaço no Brasil, infelizmente por seu reconhecido alto índice de corrupção.

          Nesse diapasão, o que está em jogo não é o mero erro administrativo, ou outras hipóteses de má-gestão, puníveis geralmente em esfera disciplinar. Tratamos, sim, do ato da má-administração marcado pela desonestidade de quem o pratica.

          A moralidade, nesse sentido, exige do administrador a boa-fé na prática dos seus atos e condutas. Impõe ao agente público exercer sua função visando a concretização dos interesses públicos primários, não devendo jamais utilizá-la para a realização de interesses meramente individuais, pessoais, desse mesmo agente, político ou não.

Conforme afirma Martins Jr., incontestavelmente, “a violação do princípio da moralidade como probidade é a contrariedade do interesse público”.  (T.M.p.167).                  

Moralidade-razoabilidade

O segundo vetor da concretização do princípio da moralidade administrativa, é a razoabilidade. Embora não esteja consagrado expressamente na nossa Carta Magna, é reconhecidamente um valor inconteste do ordenamento jurídico brasileiro.

A manifestação desse subprincípio é relevante quando surge uma margem de escolha ou um espaço de discricionariedade. Ele requer a avaliação da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito das ações estatais.

Adequação - é a aptidão do ato estatal para o atendimento do seu fim público. Esta regra traduz-se em um mandamento de correlação lógica entre o ato estatal e a finalidade pública que o justifica.

Necessidade – necessário é o ato do estado mais benéfico dentro os adequados. Quando vários atos podem atingir o interesse público primário, mas algum ou alguns desses atos podem ser desnecessários, na medida em que outra alternativa mais branda poderá atingir a mesma finalidade.

Proporcionalidade - é quando a medida estatal somente será aceitável caso os benefícios que causarem compensarem eventuais prejuízos ao particular. É um exame do custo-benefício da medida.

Reforçando, as três análises se aplicam a medidas estatais que possuam um poder de escolha ou uma margem de discricionariedade.

Moralidade-cooperação

E o terceiro vetor do princípio da moralidade, o da cooperação, o mais abordado neste trabalho, e certamente o aspecto menos abordado até hoje pela ciência do direito administrativo no Brasil, trata de uma moralidade baseada na observação prática, do sentido de cooperação. É de onde extraímos a ideia de que nesse contexto, consubstanciada na tese de Marrara, é um ângulo de análise da moralidade que possui grande valia para o nosso trabalho:

 “É a disposição para o apoio profissional mediante o qual esforços são somados para permitir a realização das tarefas públicas de modo adequado, eficiente e eficaz. Esse tipo de cooperação traz implícito um dever funcional de apoio recíproco entre agentes públicos com vistas a possibilitar o bom funcionamento do Estado.

A Cooperação administrativa é moralmente desejada quando promove eficiência e, simultaneamente não viola as normas”. (Princípios do Direito Administrativo – Thiago Marrara – Organizador).

É inerente ao princípio da moralidade administrativa, ao sustentar o adequado funcionamento do estado e promover o respeito mútuo nas relações jurídico-administrativas. Essa cooperação, ainda conforme Marrara, nada mais é do que trabalho conjunto, apoio, ajuda ou suporte operacional. Uma cooperação administrativa interna.

A aceitação dessa concepção de moralidade, torna inevitável ao se cotejar o princípio da moralidade com o princípio da eficiência.

Como análise subsidiária que soma-se ao nosso entendimento, nos casos em que a moralidade como cooperação restar ferida pela atuação do agente público, o elemento subjetivo, a intenção inicial dele, não deveria ser inteiramente ignorado sob pena de se confundir um problema de gestão pública que pode ser resolvido na esfera disciplinar, com um caso grave de violação à moralidade-probidade. É certo que o exame da honestidade para a identificação da intenção, nem sempre é simples. 

Importante frisar Pressões políticas em consequência das demandas da sociedade, juntamente com as dificuldades de empregabilidade dos que não possuem estabilidade, e a busca de maior renda para muitos servidores públicos, requerem uma análise minimamente cautelosa dos motivos do agente público e do contexto em que o seu ato é praticado.

Erros de gestão e atos de improbidade não se confundem. E não parece-nos adequado aplicar punição igual ao gestor público que erra, como qualquer outro profissional no exercício do seu ofício, e o gestor que conscientemente afronta a moralidade administrativa, para adquirir vantagem individual para si ou para outrem.

Pelo menos, a nova redação da lei de improbidade administrativa, em seu art.12, confere a possibilidade de aplicação isolada das sanções, afastando os riscos de injustiça, e estimulando a aplicação da lei mesmo aos casos em que a violação da moralidade seja mínima.

E é nesse sentido que faz parte do nosso estudo, demonstrar a importância desse agir cooperativamente para o resultado econômico e eficiente da gestão, encontrando realmente a proposta mais vantajosa.

O vetor do princípio da moralidade, moralidade-cooperação, tratado neste tópico é de importante contribuição para a construção da nossa reflexão acerca da economicidade com base no princípio da eficiência, à medida em que sob nosso entendimento, ele possui papel determinante na eficiência ao mover a pesada engrenagem da máquina pública. Afastamos do nosso trabalho, maiores delongas sobre os outros dois vetores – probidade e razoabilidade – com o intuito de darmos ênfase ao que nos propusemos abordar.

Reforça essa nossa abordagem sobre o princípio da moralidade em questão, o que diz Di Pietro (pag.358):

“O princípio da moralidade exige da administração não apenas o comportamento lícito, mas também consoante com a moral, os bons costumes, as regras da boa administração, os princípios de justiça e equidade..”.

Parece restar pacificado esse entendimento abrangente sobre o princípio da moralidade, que não se restringe apenas a probidade administrativa. Em Licitações e Contratos – Orientações e Jurisprudência TCU (2010, p.29), encontramos:

“Princípio da Moralidade e da Probidade Administrativa – A conduta dos licitantes e dos agentes públicos tem de ser, além de lícita, compatível com a moral, a ética, os bons costumes e as regras da boa administração”.


4  INSTRUMENTOS NECESSÁRIOS PARA A REALIZAÇÃO DO PREGÃO

4.1  Características e sua importância  

O Termo de Referência, instrumento que precede a licitação por pregão, e tem o papel de dar o norte, a orientação; e sendo mais abrangente, de dar todo o subsídio para a confecção do Edital, que de acordo Hely Lopes Meirelles (2013, pág.314) é a lei interna da licitação que vincula inteiramente a administração e os proponentes (art.41, L8666/93). O edital, também presente no pregão, é a formalização de uma necessidade da Administração Pública. É o instrumento pelo qual a administração leva ao conhecimento público a abertura da licitação. Dele depende todo o processo licitatório que objetiva a satisfação de um interesse público. E por seu turno o Termo de Referência acompanha a licitação em todas as suas fases, desde a construção do Edital a feitura do contrato administrativo, documento hábil para convalidar o procedimento licitatório.

Como Marçal JUSTEN FILHO comenta:

 “O edital do pregão apresenta natureza jurídica, deverá preencher requisitos e produz efeitos idênticos aos pertinentes às demais modalidades licitatórias disciplinadas na Lei 8666”.

Veremos logo adiante os requisitos do Edital.

E assim se refere o artigo 3º, inciso II da Lei 10.520/02: “a definição do objeto deverá ser precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem a competição.”

Parece-nos evidente que sempre esteve na intenção do legislador, a referência ao TR - Termo de Referência, mesmo que ainda no momento da delimitação ao âmbito da União. O mesmo está previsto no Decreto Nº3.555/2000 que aprova o regulamento para a modalidade pregão, para a aquisição de bens e serviços comuns, em seu art.8º, como veremos no próximo tópico que especifica o TR.

É o que diz ainda o art.2º do Decreto Federal 7.174 2010:

“Aquisição de bens ou serviços de informática devem ser precedidas de projeto básico ou termo de referência”.

4.2  Fases do pregão

Como as demais modalidade licitatórias, o Pregão é um procedimento que compreende vários atos da administração e dos licitantes, sendo dividido em fases, classificadas em fase interna (ou fase preparatória como está definida no art.3º da Lei do Pregão - 10.520/2002), que antecede a abertura do procedimento ao público, e fase externa, a partir de quando aplica-se o princípio da publicidade, iniciando-se com publicação do Edital de convocação.

Comenta Marçal JUSTEN FILHO:

“A fase prévia ou interna à licitação envolve o cumprimento de formalidades essenciais e indispensáveis ao êxito do certame e à obtenção de contrato adequado e satisfatório”.

As normas que orientam a fase interna ou preparatória estão dispostas no artº 3 da Lei do pregão, e exigem basicamente: a justificativa da necessidade de contratação, a definição do objeto a ser contratado no certame, exigências de habilitação, critérios de aceitação das propostas, sanções por inadimplemento e cláusulas do contrato e fixação de prazo para o fornecimento. É ainda nessa fase que o pregoeiro e sua equipe de apoio são designados.

Quanto a fase externa, regulada em 23 incisos do artº4 da mesma Lei (10.520/02), temos: a publicação do edital no Diário Oficial da União com oito dias úteis de antecedência da apresentação das propostas; o julgamento e classificação das propostas em sessão pública na qual são entregues os envelopes contendo indicação do objeto e do preço ofertado, procedendo-se à imediata abertura para a verificação da sua conformidade com o instrumento convocatório. Essa fase apresenta uma peculiaridade, por combinar propostas escritas com lances verbais ou por meio eletrônico (internet) para o caso de pregão eletrônico; segue-se com a habilitação do licitante vencedor, que ocorrerá após a classificação das propostas. A mesma processa-se após a abertura do envelope contendo a documentação do licitante vencedor, que precisará estar em conformidade com o Edital; continua com adjudicação do objeto ao licitante vencedor, que será realizada imediatamente após a decisão dos recursos, se houver; e culmina com a homologação do procedimento pela autoridade competente e posterior convocação do licitante vencedor para a assinatura do contrato.

A peculiaridade que vemos no pregão é a inversão das fases de classificação e habilitação.

4.3  Instrumento convocatório – Termo de referência e o Edital

Um dos importantes princípios que conduz a licitação é o princípio de vinculação ao Instrumento Convocatório. Princípio essencial, cuja inobservância enseja a nulidade do procedimento. Com previsão no art.3º da lei 8666/93, ainda tem seu sentido explicitado no artigo 41, que assim prescreve: “a Administração não pode descumprir as normas e condições do Edital, ao qual se acha estritamente vinculadas”.

Edital é o documento hábil para a administração pública abrir e divulgar a sua licitação. Dar conhecimento ao público interessado, fixando os requisitos para a participação, define o objeto e as condições básicas do contrato a ser celebrado, convidando todos os interessados a oferecerem as suas propostas.

Para Justen Filho, Marçal:

“O edital deverá conter as regras fundamentais acerca do procedimento e regras específicas deverão ser editadas devido a especialidade do pregão. O conteúdo do Edital será adequado à natureza do procedimento e à padronização do objeto. Isso funciona como uma espécie de advertência para os responsáveis pela tarefa de elaborar o ato convocatório. A prática do aproveitamento de editais anteriores será desaconselhável, pois a natureza do pregão é diferente de todas as outras, por isso a necessidade de um edital específico com a definição clara e precisa do objeto”.

Sobre o edital, Marçal JUSTEN FILHO comenta ainda que

“A Administração deve diagnosticar suas necessidades e verificar a disponibilidade no mercado de bens adequados para contratação. Incumbe definir padrões mínimos de qualidade, com precisa descrição dos objetos que serão licitados.”

Sintetiza Di Pietro (p.389) que o Edital é o ato pelo qual a administração faz uma oferta de contrato a todos os interessados que cumpram as exigências nele estabelecidos.

É costumeiro encontrarmos na doutrina, a definição de que o Edital é a lei interna da licitação. Para Di Pietro (2010, p.389-390), é preferível dizer que o Edital é a lei interna da licitação e do contrato administrativo, pois o que nele contiver deve ser rigorosamente cumprido sob pena de nulidade; trata-se pois da aplicação do princípio da vinculação ao instrumento convocatório, previsto no art.3º da Lei 8.666/93.

No pregão o instrumento que precede o Edital e acompanha todo o processo, é o TR – Termo de Referência. E o mesmo tem previsão legal no Decreto Nº 3.555/2000 em seu art.8º, transcrito abaixo:

Art. 8º  A fase preparatória do pregão observará as seguintes regras:

I - a definição do objeto deverá ser precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem ou frustrem a competição ou a realização do fornecimento, devendo estar refletida no termo de referência;

II - o termo de referência é o documento que deverá conter elementos capazes de propiciar a avaliação do custo pela Administração, diante de orçamento detalhado, considerando os preços praticados no mercado, a definição dos métodos, a estratégia de suprimento e o prazo de execução do contrato;

Ainda em sede de Orientações e Jurisprudências do TCU/SENADO FEDERAL (2010, p,78-79):

“Em licitações realizadas na modalidade pregão, é obrigatória a elaboração do termo de referência, que deve dispor sobre todas as condições gerais de execução do contrato”. “

“O mesmo tem função similar à do projeto básico para outras modalidades de licitação, porém de forma mais simples, em razão da natureza comum que deve revestir o objeto a ser contratado por pregão”.

O TR em regra, será elaborado pelo setor requisitante do objeto da licitação, em conjunto com a área de compras, e aprovado por quem autorizou a realização do procedimento licitatório.

Autoridade competente que conforme o inc.III do § 2º do art.1º da Lei 9.784/99 é o servidor ou agente público dotado de poder de decisão.

Em suma, o instrumento convocatório do pregão é o Edital, que virá precedido pelo TR – Termo de referência. Documento este elaborado pela área demandante do órgão governamental que requer a aquisição do objeto contratado através da licitação.


5  DA PROPOSTA MAIS VANTAJOSA

5.1  Características

É incontestável que nas relações negociais em geral, os contratantes, buscam a melhor proposta. Na Administração pública não deveria ser diferente. Todavia, enquanto aos particulares essa escolha é totalmente facultativa, pois dispõe livremente dos seus recursos, mesmo se disso resultar um mau negócio, o mesmo não se verifica com entidades governamentais, que estão adstritas à legislação. Portanto, ressalvados alguns casos, sendo obrigadas a realização da Licitação, em busca da proposta mais vantajosa.

Na empresa privada, a eficiência é instrumento fundamental para a obtenção do lucro, algo que é perseguido o tempo inteiro e que sem dúvida, é legítimo. Na Administração Pública, temos outros valores. A axiologia é outra, como veremos no próximo tópico.

Com o intuito de atingir proposta mais vantajosa, há uma necessidade ampla de conseguir os maiores resultados possíveis com os meios disponíveis. Ou ainda, noutro sentido, a ação a favor do oposto do “desperdício”.

5.2  Para a administração pública

A questão da proposta mais vantajosa para a administração pública, especialmente na licitação, com dispositivo legal previsto no art.3º da Lei 8666/93, traz consigo implicitamente que não se trata apenas de menor preço, mas também e especialmente a qualidade do bem ou do serviço prestado. O que atender de melhor modo ao interesse público pelo menor custo possível.

Quando dissemos logo acima que na administração pública buscam-se outros valores, que não o lucro, deduzimos que a axiologia é outra. O lucro não é valor justificador das funções públicas. Ao Estado incumbe promover o bem-estar comum, a dignidade da pessoa humana, a harmonia social, como se pode extrair do preâmbulo¹ da nossa carta magna vigente. (Thiago Marrara p.340).

A proposta mais vantajosa, especialmente para a Administração pública, ganha mais força e o sentido de dever, pois responde a princípios públicos como o da legalidade, que regula qualquer possibilidade de discricionariedade ampliada, o da supremacia do interesse público, e entre outros.

Doutrinariamente, vantagem tem como substrato a adequação e satisfação do interesse coletivo por via de execução contratual. A maior vantagem possível é auferida pela conjugação de dois aspectos inter-relacionados. Um dos ângulos relaciona-se com a prestação a ser executada por parte da Administração; o outro vincula-se à prestação a cargo do particular. E a maior vantagem apresenta-se quando a Administração assumir o dever de realizar a prestação menos onerosa e o particular se obrigar a realizar a melhor e mais completa prestação. Fica configurada portanto, uma relação custo-benefício. A maior vantagem corresponde à situação de menor custo e maior benefício para a Administração, com vistas à satisfação dos interesses mais desejados dos seus administrados.

(Marçal, Comentários a 8.666, p.61).

O Estado tem recursos limitados para o seu custeio e de suas atividades, bem como a realização de investimentos. E passa a ser dever do Estado a melhor contratação da proposta mais vantajosa sob o ponto de vista da economicidade.

É de se observar que a proposta mais vantajosa para a administração pública não é a que visa uma relação de custo imediato menor. Mas sim a de um melhor custo-benefício que satisfaça preponderantemente o interesse público, atendendo a sociedade na atividade primária do estado.

5.3 Um análise auxiliar: Crescimento populacional

Para a construção da nossa ideia, trouxemos uma análise auxiliar, um fator que certamente contribui para encurralar o estado no que diz respeito ao provimento dos serviços públicos essenciais, cujos recursos já são escassos: o crescimento populacional. E quanto mais o estado se agiganta com sua população, aumentam os riscos de deficiência nos controle, e de desperdício.

 O crescimento populacional, conforme faremos uma breve exposição logo mais abaixo, e as intermináveis desigualdades sociais que saltam aos nossos olhos, tendo permanente exposição nos meios de comunicação, passam a requerer um esforço hercúleo, cada vez mais complexo por parte do estado, para prover o atendimento das demandas e necessidades sociais da coletividade, com a prestação de serviços de qualidade básicos para uma vida digna. Partindo desta premissa, todo desperdício ocorrido com o dinheiro público – e aqui não trataremos de outras mazelas que o corrói, como a corrupção desenfreada que assola o país, por assim está delimitado esse nosso estudo – baseado na ineficiência administrativa, afeta de tal modo a economicidade dos gastos, ampliando assim as dificuldades desse estado social, fazendo com que em simples raciocínio matemático, haja maior escassez de recursos para fazer face aos investimentos mínimos necessários ao bom atendimento dos seus administrados.

Em um corte transversal no objeto do nosso estudo, chamamos a atenção para os fortes desequilíbrios regionais e sociais que marcam a sociedade brasileira.

O crescimento populacional pode tanto criar possibilidades demográficas que potencializem o crescimento da economia e do bem-estar social da população, quanto ampliar as graves desigualdades sociais num país. Até aqui, no caso do Brasil, ainda estamos longe de ver a redução significativa das desigualdades sociais.

              Em razão do constante aumento populacional ocorrido no Brasil, principalmente a partir da década de 1960, intensificando-se nas últimas décadas, o país ocupa hoje a quinta posição dos países mais populosos do planeta, ficando atrás apenas da China, Índia, Estados Unidos e Indonésia. De acordo com dados do Censo Demográfico de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira atingiu a marca de 190.755.799 habitantes.              Nos últimos 50 anos houve uma explosão demográfica no território brasileiro. O país teve um aumento de aproximadamente 130 milhões de pessoas. No curto período de 1991 a 2005, a população brasileira teve um crescimento próximo a 38 milhões de indivíduos. No entanto, acompanhando uma tendência mundial, o crescimento demográfico brasileiro vem sofrendo reduções nos últimos anos. A população continuará aumentando, porém as porcentagens de crescimento estão despencando.              Conforme estimativas ainda do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2050, a população brasileira será de aproximadamente 259,8 milhões de pessoas. Constatação complicadora para o provimento de serviços essenciais à população.

              Apesar dessa queda nos percentuais de crescimento, a população brasileira não irá reduzir rapidamente, pois a expectativa de vida está aumentando, em virtude do desenvolvimento de novas tecnologias medicinais, além de cuidados e preocupação com a saúde, o que não ocorria com tanta frequência nas décadas anteriores. Ocorrerá, sim, o envelhecimento da população. Isso tenderá a nos levar ao aumento das desigualdades sociais. Inferimos daí outra necessidade de perseguir a economicidade dos gastos públicos, combater o desperdício dos recursos, para poder proporcionar ao poder público a ampliação das condições de atender a sociedade.

5.4 Persecução do combate ao desperdício

Tal persecução terá papel fundamental para evitar um desperdício incalculável, que caso não buscada obstinadamente pelos gestores, servidores públicos e órgãos de controle, respingará sempre na qualidade da prestação de serviço à sociedade, sendo extremamente prejudicial ao interesse público.

Os mecanismos que precisam ser utilizados no combate ao desperdício são o treinamento e aperfeiçoamento dos servidores envolvidos na elaboração dos instrumentos convocatórios, na qualificação para a análise das amostras e recebimento do objeto contratado, com a máxima efetividade possível dos órgãos de fiscalização e controle.

Nem sempre é simples a visualização desse desperdício. Em diversos casos, se as amostras não forem bem avaliadas antes de serem aprovadas, torna a questão mais problemática ainda. Outro problema, consiste na conferência pelos órgãos públicos dos bens ou serviços quando da sua recepção. Seja pelo volume adquirido, seja pela falta de qualificação técnica do servidor que confere e atesta o recebimento.

Perceptível é a dificuldade que os órgãos de controle possuem em dar cabo na fiscalização de muitos processos licitatórios, pois torna-se humanamente impossível, apesar do seu bom ou razoável aparelhamento, e dos recursos  tecnológicos atualmente existentes. As cortes de contas em nosso país, em geral, precisam focar em processos de maior vulto. Torna-se em regra prioridade, pelo grau de sua expressividade econômica.

Apesar dessas dificuldades, as Cortes de Contas, demonstram, especialmente nos dias atuais, a preocupação em realizar um trabalho preventivo visando dar orientação no combater ao desperdício. Em recente entrevista² concedida ao Jornal Diário de Pernambuco, a Presidente atual do TCE PE declarou que tem investido na construção de uma política de prevenções. E que para pôr em prática tal política, vem apostando em levantamentos, auditorias e capacitações, além de uma série de visitas a várias cidades do estado de Pernambuco. Ela afirma ainda que obteve o apoio da Ministra Carmen Lúcia, atual presidente do TSE, coibindo os atos de improbidade e cassando prefeitos.

Segundo a Presidente do TCE PE nesta entrevista:

“Antes íamos cobrar pelo prejuízo causado, o gestor não pagava, colocávamos na Dívida Ativa e o retorno disso era irrisório. E já fazendo a fiscalização com base na prevenção, você tem condições de tirar qualquer gordura e qualquer problema no momento, antes que se gere o prejuízo. A economia é bem maior”.

Ela diz ainda que “as irregularidades são combatidas antes de serem efetivadas”. E, sob nosso entendimento, realmente devem, precisam ser. É o que torna o trabalho das Cortes de Constas ainda mais eficaz.

Ela tem aberto as portas da Escola de Contas do Tribunal para que prefeitos mandem sua assessoria e servidores efetivos (por entender que um conhecimento preservado vai ficar) para serem treinados.

A afirmativa da Conselheira Presidente do TCE PE corrobora com a nossa preocupação de trabalhar no combate ao desperdício como mecanismo eficiente que reduza o impacto negativo sobre a contratação econômica.

É alvo de preocupação constante também no TCU, que tem editado livros de orientações e jurisprudências em conjunto com o Senado Federal, para que seja utilizada cada vez mais amplamente pelos gestores públicos e demais segmentos interessados, servindo de instrumento efetivo para evitar, além da ocorrência de irregularidades  e desvios, contribuir para o combate ao desperdício de recursos do erário (TCU/SENADO FEDERAL, pág. de apresentação do livro).


6  DA PROPOSTA MAIS VANTAJOSA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO PREGÃO: O OLHAR SOBRE A ECONOMICIDADE

Existe um dever de a Administração adotar a escolha mais eficiente para a exploração dos recursos econômicos de sua titularidade. Portanto e como regra, a licitação visa a obter a solução contratual economicamente mais vantajosa para a administração. (Marçal, Comentários a 8.666, p.61).

Parece ponto pacificado que a legislação vem expressa que a licitação em geral destina-se a escolher a proposta mais vantajosa para a administração pública, art.3º da Lei 8.666/93, que possui aplicação subsidiária sobre a Lei 10.520/02 do Pregão. Em outro diploma legal, o Decreto 3.555/2000, inicialmente que aprovava o regulamento do pregão para a União, também em seu artigo 3º prescrevia que esta modalidade de licitação destinava-se a garantir, por meio de disputa justa entre os interessados, a compra mais econômica, segura e eficiente.

Há classificação doutrinária sobre o interesse público primário e o interesse secundário, este último ligado aos interesses meramente das pessoas estatais.

Bandeira de Mello (p.98) discorre com desenvoltura sobre essa distinção:

“A administração pública, adstrita que está a lei, obriga-se ao cumprimento de certas finalidades, sendo necessário objetiva-las para colimar os interesses de outrem: o da coletividade”.

“Onde há função, pelo contrário, não há autonomia de vontade, nem a liberdade em que se expressa, nem a autodeterminação da vontade a ser buscada, nem a procura por interesses próprios, pessoais. A função pública possui uma vontade previamente estabelecida. Há submissão da vontade ao escopo pré-traçado na Constituição ou na Lei, e há o dever de atingimento de um interesse alheio, que é o interesse público; vale dizer, da coletividade como um todo (interesse primário), e não da entidade governamental em si mesmo considerada (interesse secundário)”.

Sob nosso entendimento, o presente trabalho busca analisar uma fragilidade que pode estar subjacente em diversos momentos da contratação pública, especialmente quando o processo licitatório se dá através de pregão, visto que em virtude de serem o menor preço, e o critério de objeto comum, fortes componentes dessa modalidade de certame, leva a dispensar um maior rigor de análise técnica desse mesmo objeto.

É Importante frisar: dispensar um maior rigor na análise do objeto no caso do pregão, sob a ótica da celeridade, não significa dispensar a análise do objeto. E é em virtude do menor rigor na análise do objeto, associado à estrutura organizacional deficiente, que em muitos casos a economicidade restará afetada.

Importante lembrar que na prática cotidiana,  no  levantamento   empírico,   as

pressões políticas em consequência das constantes demandas da sociedade, juntamente com as dificuldades de empregabilidade dos que não possuem estabilidade, e a busca de maior renda para muitos servidores públicos, requerem uma análise minimamente cautelosa dos motivos do agente público e do contexto em que o seu ato é praticado.

Preocupa-nos essa estrutura organizacional existente nos órgãos de governo de todos os níveis, pois os mesmos carecem de condições adequadas e de pessoal devidamente treinados para um maior zelo em todo o processo de aquisição.

Essa fragilidade inicia-se e já fica exposta no ponto de partida de todo o procedimento: o termo de referência e consequentemente o edital, que possuem a incumbência de definir de forma clara e precisa o objeto da licitação, com os padrões mínimos de qualidade, devendo-se buscar um método de exclusão cada vez maior de atos inadequados, ineficientes, criando a cultura para os mais diversos entes públicos, para que o resultado desse esforço, somado, traga uma ampliação das riquezas disponíveis no país.

Como já citamos na introdução deste trabalho, os problemas de estrutura organizacional de diversos órgãos governamentais, podem comprometer alguns passos do procedimento licitatório e da contratação como um todo, exatamente na sua eficiência, que visa tornar a proposta mais vantajosa, com economicidade.

E é o que desejamos com este trabalho trazer à baila. Um alerta a deficiência que ocorre na administração pública quanto à especificação bem feita e conduzida na elaboração do Termo de Referência que desemboca nas definições do edital, a análise das amostras e o efetivo recebimento do objeto contratado. O que chamamos a atenção é a adequada funcionalidade das várias etapas, que prime pela economicidade.

6.1  Do instrumento convocatório ao recebimento do bem adquirido

          Nesse tópico, já em fase final do nosso trabalho, e para contextualizar o que pretendemos mostrar, vamos apenas demonstrar o de forma simplificada o caminho percorrido no pregão com vistas a contratação pública:

  1. Surge a necessidade de algum setor do órgão licitante demandar a aquisição do objeto a ser contratado;
  2. O setor começa o seu caminho para a confecção do Termo de Referência, ao qual já nos referimos. Fazemos nossa primeira observação crítica: nem sempre há o zelo necessário, nem a preparação técnica para a definição do objeto. Um outro problema é a dificuldade do dimensionamento de quantidade;
  3. Surge o procedimento de publicação e posteriormente execução do pregão, já explanado no tópico FASES DO PREGÃO. Outra análise crítica: o pregoeiro e sua equipe de apoio estará sempre preparada tecnicamente para fazer a análise do objeto a ser contratado com as especificações no instrumento convocatório. E ainda precisando atender o princípio da celeridade do procedimento;
  4. A análise das amostras. Mais uma dificuldade em muitos casos sobre a falta de especialização técnica para realiza-la;
  5. Ultrapassadas essas fase, vem o momento do recebimento do objeto contratado. Dificuldades muitas vezes se apresentam como o grande volume entregue pelo fornecedor, ocorrendo falhas na conferência, em virtude desse volume. Pode ocorrer a mesma dificuldade em quadro técnico especializado também para a análise nesse momento, por se tratar em muitos casos já de outra equipe. E ainda nos deparamos com o fato de que o setor do órgão que demandou o objeto, na urgência e no afã de saciar sua necessidade momentânea, concordar o recebimento até de marca diferente da contratada, sem que seja avaliada corretamente, se é a mesma mais vantajosa.

Não afirmamos que equipes de pregoeiros, de apoio, e servidores em geral que fazem parte de todo esse caminho não estejam devidamente qualificados. Mas as experiências demonstram que em muitos casos isso não ocorre.

Nas orientações e jurisprudências do TCU (2010, P.34):

“Função de Pregoeiro deverá ser exercida por servidor que detenha qualificação profissional e perfil adequados para referido fim”

  E complementa:

“A equipe de apoio do pregoeiro deve ser integrada, na maioria, por servidores ocupantes de cargos públicos ou emprego da Administração Pública, de preferência do quadro permanente do órgão ou entidade que promover a licitação. Deve possuir conhecimento técnico sobre o objeto licitado, de modo a prestar assistência necessária ao pregoeiro”. (grifo nosso).

Na esteira do entendimento doutrinário de Joel de Menezes Niebuhr (2012, p.473), no que tange às amostras dos produtos dos licitantes, a análise da compatibilidade do objeto com as especificações no instrumento convocatório, a Administração, com frequência, reputa conveniente exigir.

Registre-se, por oportuno, que a exigência de apresentação de amostras não foi prevista diretamente nem pela Lei 8.666/93, nem pela Lei 10.520/02. No entanto a exigência de amostras encontra seu fundamento legal no inciso IV do art.43 da Lei 8.666/93, combinado com o§ 3º do mesmo artigo. De todo modo, a Administração deve agir com bom senso e parcimônia ao exigir amostra, pois nem sempre é conveniente ou mesmo necessário.

Ao tempo em que Niebuhr informa que a análise da amostra não é algo subjetivo, pois no instrumento convocatório estão descritos todos os critérios para a sua aprovação, no universo prático algumas dificuldades se apresentam; o eminente jurista destaca acertadamente que a Administração deve dispor de quadro técnico especializado para essa análise e aprovação. Ocorre que na prática isso nem sempre acontece, e é um dos pontos que podemos ver frustrada a economicidade.

O objetivo no pregão deve se voltar para a aquisição de bens, cujo padrão de qualidade possa ser aferido com relativa facilidade pelo pregoeiro, para que o mesmo viabilize, sem necessitar de investigações técnicas sofisticadas, a aceitabilidade da proposta.

Destarte, torna-se imprescindível que o pregoeiro ao examinar o objeto licitável, verifique a adequação do mesmo ao conceito de bem ou serviço comum, acima explicitado, para a partir daí optar pelo modalidade pregão.

Estão configuradas algumas preocupações, recomendações e determinações das Cortes de Contas, especialmente o Tribunal de Contas da União, sobre o cumprimento da vinculação ao instrumento convocatório, com a adequada e precisa descrição do objeto. Outro ponto relevante a ser tratado é o dimensionamento necessário e adequado do ponto de ressuprimento de materiais a serem adquiridos.

Jurisprudência TCU

  Edital – vinculação ao instrumento convocatório

TCU determinou: “que cuide para que nas contratações decorrentes de licitação seja sempre observado o princípio da vinculação ao instrumento convocatório previsto no art.3º da Lei 8.666/93, de forma que não haja divergências entre cláusulas deste e do contrato firmado, e que em todos os contratos seja incluída a cláusula de que trata o inciso XI do art.55 da mesma lei”.

Fonte: TCU. Processo nº TC-004.594/2005-3. Acordão nº 15/2005 – 1ª Câmara.

   Compra – adequado dimensionamento

   TCU recomendou: “[...] oriente os Serviços integrantes da sua estrutura administrativo-operacional para que todo pedido de aquisição seja processado somente após a verificação da quantidade do insumo solicitado (ou de similar que possa atender as necessidades dos usuários) ainda porventura existente no almoxarifado;

9.18.3. Providencie modificações no sistema informatizado de controle de almoxarifado de maneira que esse calcule o ponto de ressuprimento de insumos, apontando a necessidade de uma nova aquisição.

9.18.4. Exija dos serviços integrantes da sua estrutura administrativo-operacional que as quantidades solicitadas em seus pedidos de aquisição de insumos sejam justificadas por estudos consistentes que levem em conta o consumo médio mensal das unidades usuárias, calculado a partir de documentos que comprovem a efetiva utilização daqueles insumos. 9.18.5. Supervisione e controle a distribuição racional dos materiais e medicamentos requisitados pelos serviços, promovendo os cortes necessários nos pedidos de fornecimento das unidades usuárias, em função do consumo médio apurado em série histórica anterior que tenha servido de suporte para a projeção de estoque vigente [...]”.

Fonte: TCU. Processo nº TC-015.633/2003-5. Acordão nº 576/2004 – 2ª Câmara.

Jurisprudência TCU

   Fiscalização – antes do início do contrato

   TCU recomenda: 1.6.64. Somente dê início à execução de contratos quando implantadas estruturas de fiscalização e supervisão técnica e administrativa que assegurem a boa e regular aplicação dos recursos públicos, assim como o alcance das metas e objetivos estabelecidos no instrumento contratual

Fonte: TCU. Processo TC-024.395/2007-3. Acordão nº 6371/2009 – 1ª Câmara.

  Recebimento – atesto – só se fiscalizar

TCU determinou: “[...] abster-se de atestar serviços ou executar contratos sem que haja condições plenas de fiscalização da unidade responsável pela execução[...].”

Fonte: TCU. Processo nº TC-015.875/2003-6. Acordão nº 219/2004 – Plenário.

6.2   O olhar reflexivo sobre a economicidade à luz da eficiência

Faremos duas breves citações sobre a expressão economicidade:

De Antônio Roque Citadini – Conselheiro do TCE SP:

“Antes de encaminhar a solicitação de contratação, deve ser conduzida análise da economicidade, que é a verificação da capacidade da contratação em resolver problemas e necessidades reais do contratante”.

Para o Dicionário InFormal SP (link na bibliografia), Economicidade É:

“Operacionalidade ao mínimo custo possível. Administração correta dos bens, boa distribuição do tempo, economia de trabalho, tempo e dinheiro, etc, redução dos gastos num orçamento”.

“É a administração prática e sistemática das operações de uma entidade, projeto ou empresa pública, assegurando custos operacionais mínimos ao realizar as funções que lhe são atribuídas”.

A eficiência tão bem explicitada por Niebhur, Jorge de Menezes (p.42), nos remete a nossa análise do tema desse tópico. O respeitado jurista ensina:

“A eficiência em licitação pública gira em torno de três aspectos fundamentais: preço, qualidade e celeridade. Do princípio da eficiência, mais abrangente, decorrem outros princípios, entre os quais o do justo preço, da seletividade e da celeridade. O do justo preço demanda que a administração não assuma compromissos com preços fora de mercado, especialmente elevados; o da seletividade requer cuidados com a seleção da proposta contratada, relacionando-se diretamente com a qualidade do objeto contratado; o da celeridade significa dizer o tempo que deve-se levar para a conclusão do procedimento licitatório, devendo ser o mais breve possível”.

Segundo ainda o renomado autor:

“A observância de todos eles, em conjunto, releva a tão almejada eficiência”.

A economicidade exige que o estado desembolse o mínimo e obtenha o máximo e o melhor. (Marçal, Comentários a 8.666, p.61,62).

A ideia de economicidade à luz da eficiência (economicidade abrange a qualidade ou caráter daquilo que é econômico, ou que consome pouco ou menos em relação aos serviços prestados), que trouxemos para o nosso enfoque, envolve atos dos principais atores envolvidos no processo de contratação pública, exigindo a máxima eficiência possível, ou ainda, noutro sentido, a ação a favor do oposto do “desperdício”.

Um grande entrave que se apresenta latente na vida prática, é a falta de adequada estrutura organizacional em diversos órgãos governamentais, que torna falho, precário o processo de confecção do instrumento convocatório da licitação, análise das amostras apresentadas pelo contratado, bem como o recebimento e a conferência do bem adquirido através dos processos licitatórios.

E o conflito entre maior segurança legal e celeridade dos procedimentos; entre previsões legais, como vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo, vedação a cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo das licitações, e as dificuldades estruturais da prática cotidiana, pode estar afetando a economicidade nos gastos públicos e deixando a concretização do princípio da eficiência comprometida. Há um limite muito tênue a ser analisado.

O que desejamos aqui foi trazer à baila um alerta a deficiência que ocorre na prática da administração pública quanto à especificação bem feita e conduzida na elaboração do Termo de Referência que precede as definições do edital, focando na definição dos padrões mínimos de qualidade e definições corretas claras e precisas, para a contratação adequada, que prime pela economicidade.

Entendemos refletir sobre a economicidade dos gastos públicos sob à ótica de um princípio constitucional de extrema relevância. E fomos buscar em especializada doutrina, algo que corrobora com tudo que perpassa pela nossa cadeia lógica de raciocínio para a construção desse trabalho. Ou seja, a economicidade como princípio, extraído da eficiência na gestão pública, consubstanciada num princípio reconhecido amplamente pela nossa doutrina, advindo do princípio dos publicistas italianos: o princípio da boa administração:

"O fato é que o princípio da eficiência não parece ser mais do que uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito Italiano: o princípio da boa administração. Nesse sentido, o ideal de eficiência, como elemento da boa administração, representa a formalização jurídica de um interesse público geral definido politicamente e que é retroalimentado pela existência de uma estrutura pública organizacional”.

“O princípio da eficiência consubstancia a exigência de que os gestores da coisa pública não economizem esforços no desempenho dos seus encargos, de modo a otimizar o emprego dos recursos que a sociedade destina para a satisfação das suas múltiplas necessidades; numa palavra, que pratiquem a “boa administração”, de que falam os publicistas italianos”. (G.M., p.884).

“Certamente um dos aspectos mais salientes do princípio da eficiência é a busca da economicidade na Administração, exigida pelo art.70 da CF88, ao estabelecer a fiscalização do seu cumprimento “.


7  CONCLUSÃO 

Partindo de uma reflexão acerca do aperfeiçoamento-treinamento, zelo técnico e comprometimento-metas dos servidores públicos que efetivam as demandas, definem e descrevem a qualidade do objeto, dimensiona as quantidades para as aquisições, procede a análise das amostras e têm por função fiscalizar o recebimento dos materiais adquiridos. Sem excluir de tal apreciação, obviamente, a atuação da autoridade competente que homologa o julgamento das propostas, uma vez adjudicadas pelo pregoeiro.

Há uma necessidade urgente e amplíssima, conforme já dissemos, de se conseguir em nossa gestão pública os maiores resultados possíveis com os meios disponíveis. A ideia de economicidade à luz da eficiência (economicidade abrange a qualidade ou caráter daquilo que é econômico, ou que consome pouco ou menos em relação aos serviços prestados), que trouxemos para o nosso enfoque, envolve atos dos principais atores envolvidos no processo de contratação pública, exigindo a máxima eficiência possível, ou ainda, noutro sentido, a ação a favor do oposto do “desperdício”.

Essa grande dificuldade latente na realidade dos órgãos públicos, com sua falta de adequada estrutura organizacional, comprometendo a economicidade das aquisições públicas, em virtude da ineficiência é algo que clama por um novo paradigma de gestão pública, e que envolve os muitos atores da cena pública.

A discussão sobre a Administração Pública, do prisma constitucional, certamente importa a análise das entidades e órgãos que dão vida à prática administrativo-constitucional brasileira, bem como dos principais problemas por ela enfrentados na condução das atividades estatais de caráter administrativo.

Para além dos nossos órgãos de fiscalização e controle, a exemplo do Ministério Público e Tribunais de Contas, cumpre aos nossos governantes, em todos os níveis da República Federativa do Brasil, servir e atender ao interesse público. Cumpre também a todos os servidores públicos entender o que seja o vetor do princípio da moralidade como cooperação, e assim todos, conjuntamente ampliarem a preocupação com mecanismos cada vez mais eficazes e exigentes na condução de diversas fases das licitações e contratações públicas, aqui abordadas, visando a economicidade à luz do princípio constitucional da eficiência.

Passamos a defender que além das Corte de Contas, os órgãos licitantes precisarão contar com as pessoas devidamente qualificadas (critério objetivo), e especialmente com base no vetor da moralidade-cooperação explanado no tópico 3.3 acima, com elevado grau de compromisso (critério subjetivo), tornando-se especialistas nos assuntos licitatórios que possam trazer os maiores benefícios ao erário público.

A aceitação dessa concepção de moralidade torna inevitável ao se cotejar o princípio da moralidade com o princípio da eficiência.

A busca incessante da vantajosidade sob uma dimensão econômica deve conduzir a uma avaliação da questão sob o prisma da eficiência. Trata-se de determinar a proposta que assegurará o aproveitamento racionalmente mais satisfatório dos bens econômicos do Estado.

Como já dissemos neste trabalho, no tópico que trata do princípio da eficiência, a Administração pública, adstrita que é a estrita legalidade, necessita ser eficiente, pois ela é a gestora de bens que pertencem a todos. A existência de atos que caracterizem a sua ineficiência, são, como ditos por Emerson Gabardo, patologia do sistema.

A vantajosidade sob uma dimensão econômica conduz a uma avaliação da questão sob o prisma da eficiência. Trata-se de determinar a proposta que assegurará o aproveitamento racionalmente mais satisfatório dos bens econômicos do Estado.

Sabemos que em nosso país ainda há um longo caminho a percorrer para atingirmos patamares de eficiência pública desejável. E é o que deve ser percorrido.


8  REFERÊNCIAS

Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 39ª ed. São Paulo: Malheiros, 2013.

Gasparini, Diógenes. Direito Administrativo, 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.              

Mello, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 28ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

MARRARA, Thiago (Org.). Princípios de Direito Administrativo, São Paulo: Atlas, 2012.

Niebuhr, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo, 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.

Miranda, Henrique Savonitti. Licitações e Contratos Administrativos: Lei Nº 8.666/1993, 2ª ed. Brasília: Alumnus, 2012.

JUSTEN FILHO, Marçal. Pregão (Comentários à Legislação do Pregão Comum e Eletrônico, 6ª.Ed. São Paulo: Dialética, 2013.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 15ª.Ed. São Paulo: Dialética, 2012.

JACOBY Fernandes, Jorge Ulisses. Sistema de Registro de Preços e Pregão Presencial e Eletrônico, 4ª.Ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2011.

JACOBY Fernandes, Jorge Ulisses. Vade-Mécum de Licitações e Contratos, 5ª.Ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2011.

Mendes, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional, 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. (Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco).

Da Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

Tavares, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, 6ª ed. São Paulo: Saraiva,2008.

Pinto, Djalma. Direito Eleitoral – Improbidade Administrativa e Responsabilidade Fiscal, 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

Tribunal de Contas da União / Senado Federal. Licitações & Contratos – Orientações e Jurisprudência do TCU, 4ª ed. – Revista, atualizada e ampliada, Brasília, 2010.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:

_____. Lei 8.666, de 21 de junho de 1993. Institui normas para licitações e contratos da Administração Pública.

______. Lei 10.520, de 17 de julho de 2002. Institui modalidade de licitação denominada Pregão.

______. Lei 8.429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos por improbidade administrativa.

_____. Lei 9.472, de 16 de julho de 1997. Lei Geral de Telecomunicações criadora da ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações).

_____. Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

CITADINI, Antônio Roque. A Economicidade nos gastos públicos, 1989. Disponível em: <http://www.citadini.com.br/artigos/oesp8904.htm > Acesso em 05 out. 2013.

RUY, Fernando Estevam Bravin. Conflitos entre princípios e regras. Jus Navigandi, Teresina, Publicado em 12/2008. Elaborado em 12/2007. Disponível em:

http://jus.com.br/artigos/12034/conflitos-entre-principios-e-regras. Acesso em: 02/11/2013.

Dicionário InFormal SP: http://www.dicionarioinformal.com.br/economicidade/

Instituições pesquisadas:

Secretaria de Educação do Estado de PE

Secretaria de Educação da Cidade do Recife

Secretaria de Saúde do Estado de PE.


Notas

¹Preâmbulo, na língua e literatura jurídicas, lê-se em Peter Häberle, por exemplo, que essas palavras, que inauguram os textos das constituições, longe de serem fórmulas vazias, funcionam como importantes “pontes no tempo”, seja para evocar ou esconjurar o passado, a depender das circunstâncias históricas de cada processo constituinte; seja para falar ao presente, ocasionalmente orientando desejos; seja, enfim, para contemplar tanto o presente quanto o futuro e, com relação a este, ademais, para antecipar, quanto possível, o encontro de um povo com esse almejado porvir. (Livro de Gilmar Mendes p.29).

² (Entrevista ao Jornal Diário de Pernambuco, 21/10/13, pág.A3).


Autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.