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As diferenças entre vício e defeito do produto, a responsabilidade sobre sua ocorrência e a garantia do consumidor

As diferenças entre vício e defeito do produto, a responsabilidade sobre sua ocorrência e a garantia do consumidor

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A presente monografia trata da diferença entre o vício e defeito do produto, a responsabilidade pela sua ocorrência, bem como a garantia do consumidor sendo baseada no Código de Defesa do consumidor, lei que normatiza e ampara as relações de consumo.

INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por finalidade pesquisar as diferenças entre o vício e o defeito do produto, a responsabilidade sobre sua ocorrência e a garantia do consumidor. Para tanto pesquisamos a história do direito do consumidor, os princípios constitucionais norteadores, abordando o conceito da relação de consumo e seus elementos fundamentais, a diferença entre vício e defeito e a responsabilidade por sua ocorrência, assim como o direito de garantia. 

Para desenvolvermos o tema começamos no primeiro capítulo com o estudo da história da relação de consumo e do direito do consumidor a qual há registros desde o período da antiguidade, uma vez que a exploração do comércio é comum desde os primórdios da humanidade, com registros referentes ao direito do consumidor no Código de Hamurabi, conhecida como uma das leis mais antigas do mundo, a qual previa a responsabilidade pela ocorrência de defeito de produtos e serviços.

Percebemos que com o passar do tempo e com a evolução da sociedade, houve um momento em que se fez necessária a criação de uma lei para normatizar a relação de consumo, norma esta que teve origem nos Estados Unidos da América.

Naquele país a figura que representa a evolução do direito do consumidor é o ex-presidente americano John F. Kennedy, o qual veio a demostrar perante o Congresso nacional, em 1962, a importância de assegurar ao consumidor seus direito.

No Brasil a proteção ao consumidor somente veio a ser normatizada na década de 90 pela lei n° 8.078/90 o então Código de defesa do consumidor o qual é a base da presente monografia. 

Mais adiante no mesmo capítulo estudamos os princípios norteadores que deverão ser respeitados nas relações de consumo, tais como a dignidade da pessoa humana, a liberdade, a igualdade, e a proteção à vida, saúde e segurança.

No segundo capítulo abordamos conceitos de relação de consumo, de consumidor, fornecedor e produto segundo o entendimento de diversos autores, sendo de suma importância, pois para melhor entendimento do tema é necessário o estudo destes tópicos.

Neste capítulo vemos a pessoa do consumidor como pessoa física e pessoa jurídica, entendimento este que varia de acordo com alguns autores, porém prevalece o entendimento da corrente majoritária que o consumidor pode ser toda pessoa física ou jurídica desde que o bem seja adquirido para consumo final, não sendo utilizado como bem de capital, a qual deverá ser aplicada outras medidas para a solução do conflito.

Posteriormente adentramos no tema principal discorrendo sobre o vício e defeito do produto, suas modalidades e sua diferenciação, pois é muito comum ver no dia a dia que os consumidores desconhecem tais termos e suas diferenças acarretando em erros que podem ser prejudiciais.

Outro aspecto de primordial importância apresentado nesta monografia é a quem deve ser atribuída a responsabilidade quando constatado o vício ou o fato do produto, que é outro engano comum entre os consumidores, uma vez que o defeito do produto, por causar danos aos bens jurídicos do consumidor, deve ser tratado de forma mais cautelosa, elegendo quem é o responsável pela restituição dos danos sofridos.

Por fim o último capítulo aborda a garantia do consumidor que se divide em garantia legal e garantia contratual apontando o conceito legal de ambas e também o entendimento dos autores sobre a sua eficácia, prazos de reclamação e aplicação.

A escolha do tema na área do direito do consumidor, mais especificamente o assunto sobre o vício e defeito do produto, se justifica devido à minha experiência profissional na área, bem como que esse trabalho poderá contribuir para uma visão mais abrangente e crítica a respeito de tal assunto, uma vez que é comum ver a falta de informação dos consumidores frente a tal situação.

Para realização de tal monografia nos amparamos em diversos posicionamentos de autores especialistas na área de direito do consumidor e responsabilidade civil, desta forma trazendo conceitos e interpretações diversas sobre o tema.

Sendo assim a presente monografia busca trazer conhecimento ao público que busca informações referente aos seus direitos ante uma relação de consumo para que não seja prejudicado pela falta de conhecimento.


CAPÍTULO I  -  HISTÓRICO DO DIREITO DO CONSUMIDOR E OS PRINCÍPIOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO

Para melhor desenvolver sobre o tema proposto, é necessário, preliminarmente, apresentar as noções gerais referentes ao histórico do Direito do consumidor, bem como os princípios norteadores da relação de consumo.

Desde o período da antiguidade há relatos de exploração do comércio por diversos povos, tais como os egípcios, os hebreus, etc.

Conforme Filomeno (2003) há registros de que já no antigo “Código de Hamurabi” haviam regras que visavam a proteção do consumidor na relação de consumo. Um exemplo disso está previsto na Lei n° 233 que estipulava que o arquiteto que construísse uma casa seria responsável pela reparação de deficiências estruturais que a mesma viesse a apresentar, em caso de desabamento com vítimas fatais, o empreiteiro, além de ter que reparar o dano, era condenado à morte caso a vítima fosse o chefe da família, caso morresse outro parente, a pena recairia sobre o familiar equivalente do empreiteiro.

Já na Índia, em meados do século XIII a.C., o Código de Manu estipulava multas e punições para aqueles que adulterassem o produto, ou seja, entrega de produto inferior ao acordado entre as partes.

Na Grécia antiga a preocupação com a defesa do consumidor não era diferente. Agentes eram nomeados para exercer a fiscalização nos mercados e na cidade, com a finalidade de monitorar as vendas verificando se o produto oferecido no mercado não era adulterado, tanto em sua mistura quanto em seu peso. Também fiscalizavam se os preços dos produtos eram correspondentes ao valor das matérias primas utilizadas na sua confecção.

A Europa medieval, mais especificamente na França e Espanha, também previam penas para aqueles que adulterassem de alguma forma o produto colocado no mercado, principalmente produtos alimentícios.

No Brasil há registros desde a época colonial, por volta do século XVII, de fixação de multa para os comerciantes que vendessem seus produtos acima dos valores tabelados. Estes eram condenados à prisão na pior cela e também eram condenados a nunca mais exercer a atividade de vendas.

Nos Estados Unidos da América, em 1891 foi fundada a “National Consumers League” com a finalidade de representar os consumidores em questões de problemas com o mercado de vendas e compras.

Porém o marco inicial para a existência do direito do consumidor se deu no dia 15 de março de 1962 com uma carta do presidente John F. Kennedy, então presidente dos Estados Unidos da América, que foi enviada ao Congresso Nacional norte americano. Nessa carta o presidente falava que todos eram consumidores, porém consumidor é o único polo não eficazmente organizado na economia, afetando e sendo afetado diariamente. Com esta carta o presidente demonstrou a importância de legislar e de se garantir os direitos básicos do consumidor.

Em 1974, doze anos após o marco inicial, surgiu no Rio de Janeiro, o CONDECON que é o conselho de defesa do consumidor, que foi o primeiro movimento social organizado existente no Brasil.

Em 1976 surge em Curitiba a ADOC, que é a associação de defesa e orientação do consumidor, a Associação de Proteção ao Consumidor em Porto Alegre e, finalmente, em São Paulo, através do decreto nº 7890/76, surge o PROCON que é um sistema de proteção ao consumidor, órgãos estes essenciais.

Com o surgimento da Constituição Federal de 1988, mais precisamente no artigo 5º, inciso XXXII, os direitos do consumidor são decretados como direitos fundamentais essenciais à dignidade da pessoa humana. No artigo 170, V da Constituição Federal o direito do consumidor é estabelecido como princípio para a ordem econômica, sendo assim foi estipulado no artigo 48 da ADCT um prazo de 120 dias para a elaboração de uma lei de proteção ao consumidor, porém a mesma só veio a ser criada no dia 11 de setembro de 1990, sendo chamada de Código de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor é uma norma federal com status de norma constitucional, tendo base na Constituição Federal de 1988 e por essa razão se aplica a Lei 8.078/90 em detrimento de algumas legislações inclusive leis essas específicas, pois o Código de Defesa do Consumidor possui características que lhe permitem a garantia desses direitos.

Antes do surgimento do Código de Defesa do Consumidor era aplicado às relações de consumo o Código Civil vigente na época, lei que entrou em vigor em 1917 no século XX, para solucionar os conflitos que surgiam, porém esta forma de solução foi equivocada.

Ocorre que estes equívocos influenciaram na formação jurídica dos consumidores, gerando interpretações errôneas e até mesmo causando dificuldade na interpretação da atual legislação da relação de consumo.

Nos dias atuais, no que tange a relação consumerista tem de ser observados os princípios constitucionais estabelecidos nos artigos 5º e 170 da Constituição Federal de 1988 e os artigos 4º e 6º do Código de Defesa do Consumidor a seguir expostos, uma vez que eles são a base estrutural da política consumerista e disciplinam os direitos dos consumidores em conjunto com a ordem econômica.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; “.

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - defesa do consumidor; “.

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo;

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo. ”

“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) Vigência

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

IX - (Vetado) ;

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Parágrafo único. (Vide Lei nº 13.146, de 2015). ”

Dentre os diversos princípios constitucionais, também não podemos deixar de citar, como norteadores da relação de consumo os princípios: da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da igualdade e da proteção à vida, saúde e segurança, os quais serão brevemente apresentados.

A dignidade da pessoa humana diz respeito ao tratamento do consumidor, o qual jamais poderá ser tratado de forma indigna. Como princípio amparador este possui um valor moral e espiritual relativo à pessoa, ou seja, todos os humanos são dotados de tal preceito.

O filósofo Immanuel Kant (2004, pg.65) formulou a clássica defesa de que as pessoas deveriam ser tratadas com um fim em si mesmas, e não como um meio estabelecendo assim o princípio: 

“No reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende dignidade." 

A respeito da liberdade do consumidor e do fornecedor, o autor Rizzato Nunes (2011) se posiciona de forma que a liberdade do consumidor é decorrente da ação livre, ou seja, a possibilidade de agir no meio social e o Estado tem o dever de assegurar a liberdade da sociedade, podendo intervir na produção ou distribuição de bens ou serviços. Já a liberdade do fornecedor se refere à livre iniciativa, ou seja, o direito de escolher em qual setor do mercado empreender desde que respeitadas às regras do Código de Defesa do Consumidor.

Outro princípio de extrema importância é o da igualdade, o qual é assegurado pela Constituição Federal que estabelece:

Art. 5º "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”.

Tal princípio já fora interpretado pelo filósofo Aristóteles (apud Nunes, 2011, pg.72) que entendia que o igual deveria ser tratado de forma igual e o desigual, na medida de sua desigualdade.

Portanto, não podemos esquecer que deve-se levar em consideração a hipossuficiência do consumidor, para que a relação de consumo seja balanceada. A hipossuficiência do consumidor, conforme entendimento do professor Flávio Tartuce, deve ser analisada de caso a caso pelo aplicador no sentido de que este reconheça a desigualdade técnica ou informacional ante uma situação em que haja desconhecimento. Deste modo o consumidor é considerado vulnerável, mas nem sempre será hipossuficiente, pois pode ou não possuir meios de obtenção de prova. Sendo assim a vulnerabilidade do consumidor é presumida em razão da desproporção econômica na relação de consumo, ou seja, é a parte mais fraca que carece de cuidados especiais e neste caso por força da desigualdade que o vulnerável é protegido.

O Artigo 5º da Constituição Federal de 1988 estabelece ainda, como cláusula pétrea o direito à vida, saúde e segurança, motivo pelo qual esta foi a primeira preocupação dos legisladores ao redigir o Código de Defesa do Consumidor. Posto isso o fornecedor ou o produtor é obrigado tomar medidas preventivas na relação de consumo para que a vida digna do consumidor seja priorizada, bem como sua saúde e segurança sejam garantidas.

Desta forma, ante os fatos históricos fica evidente a necessidade de uma legislação que normatizasse a relação de consumo para que os consumidores tivessem uma vida digna, não sendo assim prejudicados pelos produtores e fornecedores devido à sua vulnerabilidade e desigualdade. Tais princípios acima expostos são norteadores, porém existem diversos princípios garantidos constitucionalmente que também devem ser analisados diante de uma relação de consumo.


CAPÍTULO II - CONCEITOS

Este capítulo tem por finalidade apresentar os conceitos que dizem respeito à relação de consumo, a pessoa do consumidor, fornecedor, bem como o produto. Tal explanação é de suma importância para que haja o correto entendimento do tema vindo a erradicar possíveis dúvidas.

2.1 CONCEITO DE RELAÇÃO DE CONSUMO 

Segundo o posicionamento de João Batista de Almeida (2007) entende-se que consumo é parte inerente ao cotidiano do ser humano. Todos são consumidores, seja pela necessidade ou apenas pelo desejo pessoal, não dependendo de classe social ou faixa de renda.

A relação de consumo é uma relação bilateral existente entre o consumidor em um lado do polo e o fornecedor ou fabricante, produtor importador configurando o outro polo o qual fornece um bem ou presta um serviço.

Há uma relação jurídica que vincula o sujeito ativo e o sujeito passivo da relação, seja ela por lei ou por efeito de um contrato, a qual o sujeito ativo exige do sujeito passivo a obrigação de entrega de um bem ou a prestação de um serviço, se comprometendo a de alguma forma pagar pelo serviço ou pelo bem. Do outro lado o sujeito passivo se compromete à entrega do bem ou prestação do serviço, exigindo uma contraprestação do sujeito ativo.

É obrigatório o preenchimento do polo ativo e polo passivo para que seja caracterizada a relação de consumo a qual será tutelada pela lei nº 8.078/90 o Código de Defesa do Consumidor.

2.2 CONCEITO DE CONSUMIDOR

O conceito legal de consumidor encontra-se previsto no Art. 2º do CDC que estabelece:

“Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.“ 

Filomeno (2003) considera como consumidor, sob o ponto de vista econômico, todo individuo que se faz destinatário da produção de bens, seja ele ou não adquirente, e seja ou não, a seu turno, também produtor de outros bens.

Já José Maria Othon Sidou (apud Filomeno; 2003,pg.34) se posiciona da seguinte forma:

“Definem os léxicos como consumidor quem compra para gastar em uso próprio. Respeitada a concisão vocabular, o direito exige aplicação mais precisa. Consumidor é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que contrata para sua utilização, a aquisição de mercadoria ou a prestação de serviço, independentemente do modo de manifestação da vontade; isto é, sem forma especial salvo quando a lei expressamente a exigir. Em regra imemorial recolhida do art. 1.583 do Código Napoleônico e universalmente aceita, a transação existe por si; é um contrato consensual, concluído e perfeito, desde que as partes acordem sobre coisa e preço.” 

Bulgarelli (1983, pg.44) conceitua consumidor como:

“aquele que se encontra numa situação de usar ou consumir, estabelecendo-se, por isso, uma relação atual ou potencial, fática sem dúvida, porém a que se deve dar uma valorização jurídica, a fim de protegê-lo, quer evitando quer reparando os danos sofridos.” 

Segundo o conceito de Fábio Konder Comparato (1988, pg.37) entende-se por consumidor “aquele que desfruta de controle sobre os bens de produção, e por seguinte, devem se submeter ao poder dos titulares destes.” 

O art. 2º do CDC cita como consumido o destinatário final que utiliza do bem ou do serviço. Há dois posicionamentos referentes a esse conceito, uma teoria maximalista e uma finalista.

A teoria maximalista entende que o consumidor é aquele que adquire o produto para uso independente de destinação econômica sendo esta uma teoria abrangente, podendo o consumidor, pessoa física ou jurídica, usar tanto o produto como um bem pessoal quanto para desdobramentos de atividade produtiva.

Por outro lado a teoria finalista entende que o consumidor é aquele que adquire o produto para seu uso pessoal, sem que tal produto seja utilizado para finalidades produtivas, encerrando o ciclo econômico na pessoa do adquirente. Desta forma os bens são de consumo e não de capital.

O entendimento majoritário que prevalece nos dias de hoje é a teoria finalista, pois na pessoa do consumidor final é demonstrada a vulnerabilidade do mesmo conforme o estipulado no artigo 4º do CDC, devendo o artigo 2º da mesma lei ser interpretado de forma restrita.

2.3 CONCEITO DE FORNECEDOR

Ao contrário do conceito de consumidor, o legislador simplificou o entendimento de fornecedor, bastando à leitura da legislação prevista no art.3º do CDC que estipula o seguinte:

“Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.

Conforme o entendimento de João Batista de Almeida (2007), o fornecedor não é apenas aquele que produz ou fabrica o bem, mas também que coloca o produto no mercado comercial, exercendo a atividade de importação, exportação, distribuição e vendas no mercado comercial. Desta forma entende-se que pode ser considerado como fornecedor o fabricante do produto, o intermediário ou o comerciante.

Na visão de Rizzato Nunes (2011), é considerado como fornecedor tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica. A pessoa física na figura do profissional liberal também é considerada como fornecedor, respondendo pelos produtos que coloca no mercado. Toda pessoa jurídica também pode ser consumidora e fornecedora em razão da lei.

O Código de Defesa do Consumidor estipula dois requisitos para que o fornecedor seja caracterizado, são eles a habitualidade e onerosidade.

No que diz respeito à habitualidade, o fornecedor deve exercer sua atividade rotineiramente no mercado comercial. Já a onerosidade é o outro requisito cumulativo, ou seja, além de exercer habitualmente a atividade, o fornecedor deverá receber pelo produto ou pelo serviço prestado onde as duas partes tem obrigações recíprocas. Sendo assim, se a parte oferece o produto no mercado ou presta o serviço de forma gratuita, esta não é considerada como fornecedora, sendo tais atos entendidos como meros favores.

O CDC ainda estipula, em alguns casos, a pessoa jurídica de direito público como fornecedora. Deve ser analisado o bem ou o serviço prestado pela mesma, uma vez que serviços pagos mediante tributo não são analisados pelo CDC, mas sim pelo Código Tributário Nacional.

2.4 CONCEITO DE PRODUTO

O CDC define o conceito de produto no § 1º do art. 3º a seguir exposto:

“Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.”

No art. 79 do Código Civil está previsto que é bem imóvel o solo e o que lhe incorporar seja natural ou artificialmente; o art. 82 do CC prevê o bem móvel como aquele que são suscetíveis de movimento próprio ou por força alheia desde que não haja alteração da substância ou de sua destinação econômico-social.

Rizzatto Nunes (2011) conceitua bens materiais, como aqueles produtos que são tangíveis, por exemplo, um livro; já os imateriais são os bens intangíveis, tais como energia elétrica.

Têm-se ainda os produtos duráveis, são eles produtos que não se extinguem com o uso, ou seja, seu processo de desgaste é demorado; por outro lado o produto não durável é aquele que se acaba com o uso, como é o caso de alimentos, bebidas, etc. Deve sempre ser levado em consideração a vida útil estimada do produto, e seus desgastes naturais para que assim não se confunda com vício do mesmo, pois não há previsão legal para proteção contra desgaste, salvo quando o fabricante assume um prazo de funcionamento do produto.


CAPÍTULO III - DO VÍCIO E DEFEITO DO PRODUTO

A Lei nº 8078/90, conhecida como Código de Defesa do Consumidor gerou uma confusão ao estabelecer o termo ‘‘defeito’’ e ‘‘vício’’ previstos nos artigos 12 a 14 e 18 a 20 respectivamente. A princípio se faz necessário o entendimento do termo ‘‘vício’’ para que depois seja entendido o termo ‘‘defeito’’ como será demonstrado a seguir.

3.1 CONCEITO DE VÍCIO

O vício do produto é tratado pelos artigos 18 a 20 do Código de Defesa do consumidor que estabelecem o seguinte:

‘‘Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor.

§ 3º O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1º deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1° deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste artigo.

§ 5° No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor.

§ 6° São impróprios ao uso e consumo:

I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;

II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam. ’’

‘‘Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - o abatimento proporcional do preço;

II - complementação do peso ou medida;

III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios;

IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.

§ 1° Aplica-se a este artigo o disposto no § 4° do artigo anterior.

§ 2° O fornecedor imediato será responsável quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais. ’’

‘‘Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.

§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade. ’’

Conforme a Lei nº 8078/90 o autor Rizzatto Nunes (2011, pg.225) se posiciona da Seguinte forma:

‘‘São consideradas vícios as características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária. ’’ 

O autor Bruno Miragem (2008, pg.309) entende que:

“Vício do produto ou do serviço abrange o efeito decorrente da violação aos deveres de qualidade, quantidade ou informação, impedindo com isso, que o produto ou serviço atenda aos fins que legitimamente dele se esperam”. 

Sendo assim se entende por vício nada mais que um problema de menor impacto, ou seja, que não cause lesões ao consumidor, que se mantém no produto ou no serviço. Podendo tal problema tornar o produto impróprio ou inadequado ao consumo.

O artigo 441 do Código Civil prevê o vício e o defeito, porém em tal lei não há a distinção dos dois conceitos, portanto o CDC estabeleceu a diferenciação de ambos para fins de tratamento legal em possíveis conflitos de entendimento.

O vício do produto se divide em quatro modalidades, são elas o vício aparente, oculto, de qualidade e quantidade.

3.1.1 VÍCIO APARENTE

Como o próprio nome diz o vício aparente do produto é aquele de fácil constatação, ou seja, sua identificação pode ser feita imediatamente no recebimento do produto quando se verifica que o mesmo não está de acordo com as funcionalidades a que é destinado.

Tal vício está estipulado no art. 26 do CDC:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.

Conforme o inciso II do presente artigo, o consumidor ao constatar o vício, terá o prazo decadencial de noventa dias para reclamar o problema de um produto durável, sendo este prazo de garantia legal do produto, o qual não se confunde com garantia contratual. No caso, tratando-se de um produto não durável, o inciso I estabelece um prazo decadencial de trinta dias para que o consumidor reclame o problema ante o fornecedor.

3.1.2 VÍCIO OCULTO

O vício oculto é aquele cuja constatação não se dá imediatamente no momento da aquisição do produto, vindo a aparecer somente durante a sua utilização. Tal produto pode parecer que não possui nenhum defeito, mas pode se alterar de acordo com a sua utilização.

A previsão do vício oculto se dá no art. 26, parágrafo terceiro que preve que  ‘‘Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito. ’’

Sendo assim, com a análise do respectivo artigo, é de se chegar à conclusão de que o prazo decadencial passa a contar a partir da constatação do vício no produto. 

Posiciona-se o autor Rizzatto Nunes (2008, pg.377) a respeito do vício oculto:

‘‘o vício será considerado oculto quando simultaneamente:

não puder ser verificado no mero exame do produto ou serviço;

ainda não estiver provocando a impropriedade ou inadequação ou diminuição do valor do produto ou serviço.’’ 

O vício redibitório tem previsão legal no art. 441 do Código Civil, porém há uma diferenciação entre o vício redibitório e o vício oculto o qual Código de Defesa do Consumidor trata de forma mais específica prevendo prazos para a reclamação, e quem se responsabiliza pelo fato reforçando a responsabilidade do fornecedor, desta forma ampliando o meio de solução dos conflitos oriundos de uma relação de consumo.

3.1.3 VÍCIO DE QUALIDADE

O vício de qualidade diz respeito aos produtos que são considerados impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, ou seja, se um produto está deteriorado, não exerce corretamente a atividade que deveria, ou possui algum tipo de dano aparente que por consequência lhe diminui o valor.

Tal modalidade de vício está previsto no art. 18 do CDC o qual dispõe o seguinte:

‘‘Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor.

§ 3º O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1º deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1° deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste artigo.

§ 5° No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor.

§ 6° São impróprios ao uso e consumo:

I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;

II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam. ’’

Pode ainda haver um desacordo com a descrição do produto em seu recipiente, embalagem, rótulo, mensagem publicitária, sua apresentação bem como na oferta e informação em geral.

Segundo os exemplos do autor Rizzatto Nunes (2011), tem-se como exemplo de vício de qualidade o produto que está fora do prazo de validade, o que o torna improprio para o consumo; Uma geladeira que não congela alimentos é inadequada ao uso que se destina; um automóvel que está com a porta amassada o torna passível de diminuição de seu valor no mercado; e por fim um produto que não possua forma de utilização ou condições de acondicionamento configura o desacordo com as informações em geral.

O presente artigo prevê nos incisos do parágrafo primeiro as hipóteses de solução do vício de qualidade apresentando ao consumidor as hipóteses de troca do produto por outro em perfeitas condições de uso; a restituição da quantia paga bem como o abatimento no valor do produto para que não haja prejuízo ao consumidor.

3.1.4 VÍCIO DE QUANTIDADE

São aqueles produtos em que há divergência entre o seu conteúdo real e o que é descrito pelo seu fornecedor em sua embalagem, rótulo ou mensagem publicitária. Como por exemplo, um iogurte o qual consta na embalagem conter um litro, porém seu conteúdo real é de 800 mililitros. Desta forma fica evidente que tal disparidade causa prejuízo ao consumidor sem que seja alterada a qualidade do produto.

O vício de quantidade tem previsão legal estipulada no artigo 19 do CDC conforme a seguir demonstrado:

‘‘Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - o abatimento proporcional do preço;

II - complementação do peso ou medida;

III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios;

IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.

§ 1° Aplica-se a este artigo o disposto no § 4° do artigo anterior.

§ 2° O fornecedor imediato será responsável quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais. ’’

Desta forma, o artigo 19 prevê a proteção ao consumidor em casos de este se deparar com um vicio de quantidade do produto, podendo alternativamente optar pelo pagamento proporcional do produto, substituição por outro produto sem tal vício, a complementação de sua quantidade, caso seja possível, ou até mesmo a devolução da quantia paga pelo produto.

Ante tais conceitos e exemplos expostos, no que tange o vício do produto, o CDC ampara o consumidor para que este seja capaz de compreender as modalidades de vício seja ele aparente ou oculto, de qualidade ou quantidade, desta forma podendo exigir seus direitos diante de um problema em sua relação de consumo.

Como visto anteriormente o defeito pressupõe o vício, porém é necessário, preliminarmente, a conceituação de vício para que posteriormente seja entendido o conceito de defeito, uma vez que não há defeito sem vício conforme será demonstrado nos tópicos a seguir.

3.2 CONCEITO DE DEFEITO

O defeito tem sua previsão legal nos artigos 12, 13 e 14 do CDC conforme redação a seguir demonstrada:

‘‘Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;

III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. ’’

O defeito pressupõe o vício e conforme o entendimento do autor Rizzatto Nunes, pode haver o vício do produto ou serviço sem que haja defeito, porém não há defeito sem o vício. Explicando, o vício é uma característica imanente do produto ou serviço.

Ou seja, nas palavras de Rizzatto Nunes (2011, pg.226) o defeito é:

‘‘O defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento, o não funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago – já que o produto ou serviço não cumpriram o fim ao qual se destinavam. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e/ou moral e/ou estético e/ou à imagem do consumidor. ‘’

Baseado em tal conceito, é possível concluir que o defeito possui ligação direta com o vício, o qual atinge somente o produto ou o serviço. Por outro lado o defeito no que tange os danos causados é mais assolador atingindo não apenas o produto, mas também o consumidor em seus bem jurídicos de forma mais abrangente, ou seja, sua moral, bens materiais, sua estética e imagem.

Conforme o entendimento de Roberto Basilone Leite (2002, pg.139) defeito é conceituado como: ‘‘São as imperfeições de natureza grave, capazes de causar dano à saúde ou à segurança do consumidor’’. 

No caso de incidência de defeito do produto, o consumidor detém a viabilidade de pleitear indenização compatível com danos morais ou materiais sofridos, porém há de se demonstrar o nexo de causalidade entre o defeito e os danos causados.

Desta forma podemos concluir que para que se configure o defeito é necessária a incidência do vício, por outro lado a constatação do vício nem sempre decorrerá de um defeito.

3.3 DIFERENÇA DE VÍCIO E DEFEITO DO PRODUTO

Após conceituar vício e defeito já é possível ver a distinção entre os termos utilizados pelo Código de Defesa do Consumidor, porém dúvidas ainda podem surgir. Sendo assim o exemplo a seguir fará com que tenhamos certeza do que houve no momento da constatação do problema.

Suponhamos que dois amigos comprem duas motocicletas idênticas na mesma loja. O primeiro consumidor sai com o produto da concessionária, anda por alguns quarteirões e vem a perceber que o freio da motocicleta não está funcionando. Neste momento ele reduz as marchas e consegue parar a mesma sem problemas. O segundo consumidor também sai da concessionária faz o mesmo caminho e se depara com o sinal fechado, momento este em que aciona o freio da motocicleta o qual não está funcionando, fazendo-o avançar o sinal e colidir contra a lateral de um veículo que passava pelo cruzamento causando um dano a si próprio e também a outrem.

Vejamos que no primeiro caso, o consumidor conseguiu parar a motocicleta sem problemas, portanto trata-se da constatação de um vício do produto. Já no segundo caso, o consumidor não conseguiu parar a motocicleta vindo a colidir contra um veículo que passava no momento. Nesta hipótese trata-se de um defeito do produto visto que o vício no sistema de freio veio a causar um dano ao consumidor, seja ele material ou moral.

Cumpre destacar que o vício do produto é o que lhe torna impróprio ou inadequado ao consumo, podendo ser vício aparente ou oculto, de qualidade ou quantidade, vícios estes que jamais irão causar algum tipo de lesão ao consumidor. Logo o vício que causa dano é entendido como defeito. Tais danos podem atingir o patrimônio jurídico mais amplo do consumidor, bem como dano ao patrimônio de terceiro, seja ele dano à imagem, estético, moral ou material.

Neste sentido temos o posicionamento de Sergio Cavalieri Filho (2008, pg.241) que se posiciona da seguinte forma ante a diferença entre vicio e defeito: 

“ambos decorrem de um defeito do produto ou do serviço, só que no fato do produto ou do serviço é tão grave que provoca um acidente que atinge o consumidor, causando-lhe dano material ou moral. O defeito compromete a segurança do produto ou serviço. Vício, por sua vez, é defeito menos grave, circunscrito ao produto ou serviço em si; um defeito que lhe é inerente ou intrínseco, que apenas causa o seu mau funcionamento ou não-funcionamento” 

É comum no dia a dia vermos a utilização dos termos vício e defeito de forma errônea, sem que haja distinção entre elas. Entretanto o emprego destes conceitos pode causar inconveniências ao consumidor visto que os prazos e responsabilização pelos problemas que o produto vier a apresentar são diferentes em cada caso, matéria esta que será abordada no capítulo a seguir.


CAPÍTULO IV - DA RESPONSABILIDADE

O presente capítulo tem por finalidade o esclarecimento de impasses a respeito de sobre quem recairá a responsabilidade pelo vício ou defeito do produto, uma vez que esta questão possui grande repercussão no mercado consumerista.

Conforme Paulo de Tarso (2007), a responsabilidade civil passou a ser tratada de forma especial a partir da segunda metade do século XX, quando a produção e a demanda de produtos eram em grande escala e por este motivo o volume de danos ocasionados por defeitos aos consumidores eram muito comum. Desta forma buscou-se normatizar a relação de consumo, principalmente a responsabilidade civil pelos acidentes de consumo.

Os acidentes de consumo se proliferavam de maneiras diversificadas tais como acidentes de trânsitos acarretados por defeitos de fabricação do veículo, alimentos contaminados, etc.

Os juristas membros do Mercado Comum Europeu, ao constatar que os acidentes causados pelos defeitos dos produtos estavam se tornando comuns, passaram a debater sobre a responsabilidade civil dos fabricantes e produtores, e se esta seria objetiva ou subjetiva. Após conferencias tais países decidiram seguir as regras e jurisprudências adotadas pelo sistema judicial norte-americano.

O marco inicial para a primeira decisão sobre o acidente de consumo ocorreu nos Estados Unidos, caso este conhecido como MacPherson v. Buick Motor Co., o qual foi julgado em 1916 pela Suprema Corte de Nova York.

MacPherson foi um americano que comprou um veículo da marca Buick, e após um ano de uso do veículo, veio a se envolver em um acidente causado por um defeito de fabricação do mesmo. Ante a corte, a fabricante alegou não ser a responsável direta pelo ocorrido, pois teria obrigações apenas com a revendedora e não com o consumidor. Após análise do caso o juiz se manifestou de forma que atribuiu a responsabilidade direta ao fabricante, sendo reconhecido que este tem o dever de diligência ante o consumidor.

Tal decisão teve grande repercussão, pois constituía o dever de diligência ao fabricante que produzisse produtos potencialmente perigosos ao consumidor. Desta forma diversos países passaram a adotar tal jurisprudência para aplicação interna.

No ano de 1985, o Conselho da Comunidade Européia, através da diretiva nº 85/374/CEE, passou a normatizar a responsabilidade civil por danos causados por defeitos do produto, definindo regras a ser adotadas nestes casos.

O acolhimento da responsabilidade civil por acidentes de consumo ocorreu na legislação brasileira apenas no inicio da década de noventa, sendo antes normatizada pelo Código Civil vigente na época. A então diretiva do Conselho da Comunidade Européia foi de grande influência na lei nº 8.078/90, o nosso Código de Defesa do Consumidor.

O Código Civil brasileiro prevê a responsabilidade civil em seus artigos a seguir expostos:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

A responsabilidade civil nada mais é que o dever de indenizar e tal dever surge com a presença de alguns pressupostos que são a ação ou omissão, dolo ou culpa do agente, nexo causal e o resultado danoso. 

Rui Stoco (apud Sansaverino 2007, pg.114) explica responsabilidade civil como:

“A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana”. 

Nas palavras Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, (apud Diniz, 2011, pg.50) responsabilidade civil é conceituada como:

‘‘A aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal’’. 

Serpa Lopes (apud Diniz, 2011, pg.50) se posiciona da seguinte maneira:

‘‘ A responsabilidade é a obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de uma outra circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva’’

Ante tais posicionamentos e conforme o Código Civil brasileiro entende-se que deve ser responsabilizado aquele que causar dano a outrem, observado alguns requisitos. Entretanto a presente monografia se baseia no Código de Defesa do Consumidor, o qual trata a responsabilidade pelo fato e pelo vício de forma diferente e mais específica, prevendo quem dos agentes da relação de consumo será o responsável pelo produto.

O artigo 6º, inciso VI do CDC, prevê como direito básico do consumidor a prevenção e reparação de danos causados ao patrimônio jurídico do mesmo, ou seja, a lei busca que seja garantido ao consumidor a reparação de danos oriundos da relação de consumo.

4.1 RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO

O artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor elenca quem se responsabilizará pelo fato do produto:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Conforme se observa no caput de tal artigo, o mesmo atribui a responsabilidade pelo defeito do produto ao fabricante, ao produtor, ao construtor, seja ele nacional ou estrangeiro, e ao importador. Desta forma se limita a escolha do consumidor quanto a quem ele irá se dirigir como responsável pelo defeito do produto, contrário do que será analisado no próximo tópico referente à responsabilidade pelo vício do produto.

Na responsabilidade objetiva não há o que se falar em dolo ou culpa do agente nem elemento subjetivo, basta apenas que haja uma ação do agente e esta venha a ocasionar um dano e havendo um nexo causal entre a conduta e o resultado, o fornecedor se responsabilizará.

Há de ser analisada a solidariedade a qual se faz prevista no artigo 7º, parágrafo único do CDC:

Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.

Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.

Quando a lei elege o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador, esta está indicando apenas o responsável direto, porém os produtores indiretos, que são aqueles que participam de alguma forma na produção de um produto, não poderão ser deixados de fora, os quais responderão solidariamente na medida de sua participação.

Temos ainda previsto no § 3° do artigo 12 do CDC as hipóteses excludentes de responsabilidade pelo fato do produto, ou seja, se comprovado que o agente não colocou o produto no mercado e caso o tenha colocado e o defeito inexiste, ou a culpa pelo fato do produto tenha sido ocasionada por culpa exclusiva do consumidor, se extinguirá a responsabilidade do fornecedor. Há de se observar que o ônus das provas será exclusivamente do fornecedor quanto às excludentes de sua responsabilidade.

Quanto à responsabilidade pelo defeito do produto Miragem (2008, pg.358) se posiciona da seguinte forma:

‘‘A responsabilidade civil pelo fato do produto e do serviço consiste no efeito de imputação ao fornecedor de uma responsabilidade em razão dos danos causados devido a defeito na concepção ou fornecimento de produto ou de serviço, que se determina o dever de indenizar pela violação do dever de segurança inerente ao mercado de consumo. ’’ (Bruno Miragem; Curso de Direito do Consumidor, 2ª Edição, revista atualizada e ampliada, Editora Revista dos Tribunais, 2008; p g. 358.)

O CDC prevê em seu artigo 13 a responsabilidade subsidiária do comerciante pelo fato do produto segundo sua redação:

‘‘Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;

III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso. ’’

Nestes termos, quando o fabricante, o construtor, o produtor ou importador não puderem ser identificados, quem se responsabilizará pelo defeito do produto será o comerciante, ou seja, ele é responsável subsidiário. Responderá também pela forma a qual o produto é preservado em suas dependências, tendo o dever de conservar o mesmo para que quando seja comercializado, este esteja em perfeitas condições de consumo.

Sendo assim, João Batista de Almeida (2001, pg.84) entende que em regra o fornecedor é o responsável pelo fato do produto, uma vez que o mesmo distribuiu o produto no mercado consumerista, tendo obrigação de arcar com a responsabilidade sobre o risco que o produto em mercado oferece ao consumidor e desta forma expõe o seguinte:

‘‘O dever de não causar prejuízo a outrem, corresponde ao dever especial de não colocar no mercado de consumo produtos e serviços que possam acarretar riscos à saúde e segurança dos consumidores, a não observância do dever de segurança, surge a responsabilidade pelo do fornecedor pelo fato do produto e do serviço, tendo como consequência o dever de indenizar os consumidores e as vítimas do acidente de consumo causado em razão dos defeitos apresentados no produto ou no serviço. ’’ 

4.2 RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO

No que diz respeito à responsabilidade pelo vício do produto o artigo 18 do CDC estabelece que:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Tal artigo prevê a responsabilidade pelo vício de qualidade ou quantidade do produto afirmando que os fornecedores vão responder objetiva e solidariamente pelos vícios que tornem o produto impróprio ou inadequado ao consumo a que se destina.

Rizzatto Nunes (2011) interpreta o respectivo artigo de maneira que se faz entender que o fornecedor engloba todos os agentes descritos no artigo 12 do CDC, sendo assim o artigo 18 da mesma lei elege como responsáveis de forma direta todos esses agentes, podendo o consumidor, acionar qualquer um dos envolvidos para que seu problema seja solucionado.

Desta forma entende-se que se um produto apresentar um vício, o consumidor poderá acionar um dos agentes fornecedores, à sua escolha, para que sane o problema. Já no caso de defeito do produto, por este causar dano ao patrimônio jurídico do consumidor, o mesmo deverá acionar o responsável pelo produto, seja ele o fabricante, o produtor, construtor ou importador. 

A partir do momento da constatação do vício ou defeito do produto e quem será responsável pelo mesmo, haverá a contagem dos prazos para que o conflito seja solucionado, prazos esses que variam de acordo com o contrato entre as partes e com o produto comercializado, assunto este que será abordado no próximo capítulo desta monografia.


CAPÍTULO V - DA GARANTIA DO CONSUMIDOR

O presente capítulo tem por objetivo expor os prazos estipulados pela lei nº 8.078/90 referentes à garantia legal, garantia contratual e os prazos para reclamação sobre o vício ou defeito do produto.

O artigo 26 do CDC faz previsão aos prazos decadenciais para a reclamação do vício do produto:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.

Desta forma é possível verificar que há prazos diferenciados dependendo da durabilidade do produto ou serviço e se o vício é aparente ou oculto. Vejamos no inciso primeiro que os produtos não duráveis, tais como alimentos, e têm prazo decadencial de 30 dias. Já no inciso segundo os produtos duráveis, tais como eletrodomésticos, tem prazo prescricional de 90 dias, sendo estes prazos decadenciais são contados a partir do momento da entrega efetiva do bem.

O § 3° relata que em se tratando de vício oculto o prazo decadencial para a reclamação será contado a partir do momento em que ficar evidenciado o problema, uma vez que o vício oculto somente será constatado com a utilização do produto.

A respeito do prazo sobre o fato do produto, este está disposto no artigo 27 do CDC:

Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Com a simples leitura do presente artigo é possível notar a diferença entre o prazo pelo vício e pelo fato do produto. O prazo deste ao contrário do vício, é prescricional.

A prescrição acarreta na perda do direito à pretensão em razão do decorrer do tempo, por outro lado a decadência é a perda de um direito que não foi exercido no prazo estipulado, ou seja, é a perda do direito em si devido ao decurso do tempo.

Sobre a garantia do produto Rizzato Nunes (2011, pg. 419) entende que:

‘‘A garantia é de adequação, o que significa qualidade para o atingimento do fim a que se destina o produto ou o serviço, segurança, para não causar danos ao consumidor, durabilidade e desempenho. ’’

5.1 PRAZO DE GARANTIA LEGAL

Sobre a garantia legal do produto temos previsão no art. 24 do CDC que dispõe: 

‘‘Art. 24. A garantia legal de adequação do produto ou serviço independe de termo expresso, vedada a exoneração contratual do fornecedor. ’’

O presente artigo deve ser interpretado de maneira combinada com o artigo 26 do CDC já mencionado acima, devendo ser observado se o produto é durável ou não durável e seus prazos para reclamação, sendo a garantia legal implícita a todo e qualquer produto; obrigatória; irrecusável, pois é decorrente de lei e também irrenunciável.

Na ocorrência do vício do produto, temos previsão no §1° e §2° do artigo 18 do CDC do prazo para que o vício seja sanado conforme a seguir demonstrado:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor

§ 3º O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1º deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

O §1° prevê que ao receber do consumidor o produto que apresentou vício, o responsável pelo mesmo terá um prazo de trinta dias para solucionar o problema, podendo este prazo, conforme o §2°, ser prorrogado por até cento e oitenta dias e não podendo ser inferior a sete dias. 

Nas hipóteses do §3° do referido artigo faz previsão, que no caso do vício não ser sanado no prazo estipulado, o consumidor poderá optar pela troca do produto, restituição do valor pago ou, se for o caso, o abatimento proporcional do preço

5.2 GARANTIA CONTRATUAL

A garantia contratual encontra-se fundamentada no artigo 50 do Código de Defesa do consumidor o qual estabelece:

Art. 50. A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito.

Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.

Rizzatto Nunes (2011) entende que a garantia contratual é complementar à legal, não obrigatória sendo de mera faculdade do fornecedor, o qual busca conquistar o consumidor oferecendo um tempo maior de garantia.

Caso o fornecedor do produto optar por oferecer a garantia, esta deve ser mediante um termo, por escrito, devidamente preenchido e padronizado e deverá também ser interpretada de forma que favoreça o consumidor e não o fornecedor, vindo a contar seu prazo inicial a partir do momento em que se encerrar a garantia legal. Em tal termo também deverá conter todas as hipóteses de cobertura da garanta e os procedimentos a serem adotados pelo consumidor

Nas palavras de Rizzatto Nunes: (2011, pg.430)

Existem duas maneiras de se definir o sentido de “complementar”

a) complementar tem o sentido de “aquilo que excede o prazo de garantia contratual”

b) complementar significa que se “soma o prazo de garantia ao prazo contratual”.

Desta forma, há entendimentos diversos que entendem que a garantia complementar não é necessária, pois já há a garantia legal. Por outro lado há o entendimento que quando o fornecedor dá garantia complementar esta será adicionada à garantia legal.

O Código Civil também menciona prazo de garantia nos seus artigos 445 e 446 da seguinte maneira:

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.

§ 1o Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis.

§ 2o Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos serão os estabelecidos em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais, aplicando-se o disposto no parágrafo antecedente se não houver regras disciplinando a matéria.

Art. 446. Não correrão os prazos do artigo antecedente na constância de cláusula de garantia; mas o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu descobrimento, sob pena de decadência.

Tais artigos também fazem entendimento de que o prazo de garantia legal não contará enquanto estiver valendo a garantia contratual. Desta forma o Superior Tribunal de Justiça adota o posicionamento de que os prazos de garantia não correm simultaneamente, iniciando-se o decadencial findo o prazo da garantia contratual.

Atualmente a garantia estendida, que não deixa de ser uma garantia contratual, têm se tornado cada vez mais comum no mercado consumerista, sendo oferecida pelos lojistas aos consumidores como forma de garantir sua segurança.

Nas palavras de Leonardo Roscoe Bessa (Apud Benjamin, 2014, pg.241) sobre a garantia estendia entende que:

‘‘Não se vê qualquer vantagem em adquirir a garantia estendida (que normalmente é oferecida por meio de contrato de seguro de garantia estendida). Se a contagem do prazo para reclamar dos vícios do produto for realizada corretamente – considerando o critério da vida útil –, o CDC já oferece proteção adequada e suficiente aos interesses do consumidor. É incorreto, inclusive, falar-se em extensão de garantia.’’

  Sendo assim fica evidente que a lei n° 8.078/90 preza pelo consumidor de diversas formas, garantindo seus direitos, segurança, bem-estar, saúde, informação e principalmente a qualidade de vida. Tal lei foi criada devido ao processo de industrialização que causou o crescimento dos mercados acarretando grandes mudanças na vida das pessoas, sendo necessária a tutela dos mais frágeis ante os enormes fornecedores que compõem o mercado consumerista.


REFERÊNCIAS

Almeida, João Batista de, Manual de direito do consumidor / João Batista de Almeida, 2. Edição revista e atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2007.

Benjamin, Antônio Herman V., Manual de direito do consumidor / Antônio Herman V. Benjamin, Claudia Lima Marques, Leonardo Roscoe Bessa, 6. Edição, revista e atualizada, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2014.

Bulgarelli, Waldirio, Tutela do consumidor na jurisprudência e “de lege ferenda”, Revista de Direito Mercantil, ano 22, nova série, jan./mar. 1983.

Código Civil, Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002

Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8.078 de 11 de setembro de 1990.

Comparato, Fábio Konder, A proteção do consumidor: importante capítulo do direito econômico, in Defesa do consumidor – textos básicos, 2ª edição, Brasília: CNDC/MJ, 1988.

Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988.

Diniz, Maria Helena, Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 25. Edição, São Paulo, Editora Saraiva 2011.

Filho, Sergio Cavalieri, Programa de Direito do Consumidor, Editora Atlas, 2008.

Filomeno, José Geraldo Brito, Manual de direitos do consumidor / José Geraldo de Brito Filomeno, 6. Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2003.

KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafisica dos Costumes e outros Escritos. Tradução Leopoldo Holzbach. São Paulo: Martin Claret, 2004.

Leite, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. São Paulo. Editora LTr. 2002.

MIRAGEM, Bruno. Direito do Consumidor: Fundamentos dos direitos do consumidor; Direito material e processual do consumidor; Proteção administrativa do consumidor; direito penal do consumidor, São Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2008.

Nunes, Luiz Antonio Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor / Rizzatto Nunes, 6. Edição revisada e atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2011.

Nunes, Luiz Antonio Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor / Luiz Antonio Rizzatto Nunes, 3. Edição revisada e atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2008.

Sansaverino, Paulo de Tarso Vieira, Responsabilidade civil no código do consumidor e a defesa do fornecedor - 2. Edição revisada. e atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2007



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