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O princípio da separação dos poderes e o controle judicial do motivo do ato administrativo

O princípio da separação dos poderes e o controle judicial do motivo do ato administrativo

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Em que circunstâncias o Judiciário pode anular um ato administrativo? Existe algum espaço de mérito do gestor em que o juiz não pode se meter?

RESUMO

O presente trabalho propõe-se a verificar se há violação ao princípio da separação dos poderes quando o Poder Judiciário aprecia o motivo que ensejou a prática de um ato administrativo. É feita uma abordagem sobre o princípio da separação dos poderes e o controle judicial do ato administrativo, que correspondem a garantias constitucionais do Estado Democrático de Direito. Através de estudo baseado em textos legais, posicionamentos doutrinários e entendimentos jurisprudenciais, pôde-se concluir que o Judiciário, quando examina os motivos que impulsionaram a prática de um ato administrativo, não interfere indevidamente nas questões intrínsecas ao mérito administrativo e não viola o princípio da separação dos poderes. No entanto, o escopo do controle judicial não é verificar a correção do juízo de oportunidade e conveniência do administrador, mas analisar se tal opção foi legitimamente motivada e fundamentada conforme a finalidade prevista nas regras e princípios jurídicos aplicáveis à Administração Pública.

Palavras-chave: Administração Pública. Princípio da Separação dos Poderes. Princípios da Administração Pública. Atos Administrativos. Controle Judicial.

INTRODUÇÃO

O presente artigo, ao tratar sobre a possibilidade do controle judicial incidir sobre o motivo do ato administrativo, propõe-se a verificar se o Poder Judiciário, ao apreciar o motivo que ensejou a prática de determinadas condutas da Administração Pública, viola o princípio da separação dos poderes.

Será que o Judiciário, quando examina os motivos que impulsionaram a prática de um ato administrativo e a sua adequação aos princípios informadores da Administração Pública, interfere indevidamente nas questões intrínsecas ao mérito administrativo, que devem ser reservadas à apreciação exclusiva e subjetiva da Administração Pública, violando, dessa forma, o princípio da separação dos poderes?

Inicialmente, o trabalho faz um estudo sobre o princípio da separação dos poderes, traçando o seu panorama histórico e verificando as suas atuais implicações no ordenamento jurídico brasileiro.

Em seguida, é analisado o controle exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos administrativos, com uma abordagem a respeito do seu fundamento constitucional, dos seus efeitos e da sua possível incidência sobre o motivo do ato administrativo.

Por fim, são comentadas decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema, proferidas desde a década de 1990. Tais julgados, selecionadas através do método indutivo, demonstram a evolução da jurisprudência nacional nas últimas décadas, apontando para um entendimento acerca da viabilidade da incidência do controle judicial sobre o motivo do ato administrativo.


1. O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

Desde a antiguidade, os pensadores se ocupam em compreender as relações de poder presentes nas sociedades, revelando-se como um ponto comum a ideia de que a concentração do poder em uma só pessoa, ou em um só órgão, deve sempre ser evitada.

Como bem leciona Sahid Maluf (1995, p. 205):

Nos Estados monárquicos antigos, medievais, e até mesmo no começo da idade moderna, bem como nas primitivas repúblicas gregas e romanas, não havia, em regra, divisão funcional do poder de governo. Naquelas o monarca, e nestas as assembleias populares acumulavam as funções de legislar, executar as leis e julgar as controvérsias. Entretanto, já os filósofos antigos cogitaram a limitação do poder de governo. Platão, no Diálogo das leis, aplaudindo Licurgo por contrapor o poder da Assembleia dos Anciãos ao poder do Rei, doutrinou que “não se deve estabelecer jamais uma autoridade demasiado poderosa e sem freio nem paliativos”. E Aristóteles, em sua obra Política, chegou a esboçar a tríplice divisão do poder em “legislativo, executivo e administrativo”.

[...] Continuando as elucubrações dos filósofos gregos, John Locke tratou do assunto com relativa amplitude, aconselhando a divisão do poder em quatro funções. Além desse líder inglês, outros pensadores, notadamente Bodin e Swift, desenvolveram a velha tese em função das teorias racionalistas.

Entretanto, somente no século XVIII, este princípio, através da obra O Espírito das Leis, do teórico francês Montesquieu, veio a ser profundamente sistematizado em uma sólida doutrina, servindo, posteriormente, de dogma para os Estados liberais.

As ideias de Montesquieu foram de fundamental importância para que grandes entraves presentes nos Estados absolutistas fossem superados, porque as necessidades sociais, políticas e econômicas da época não mais se conciliavam à figura do monarca de poder supremo, que, por ser a própria expressão da soberania, também representava a personificação do Estado.

À medida que a economia capitalista ganhava força e se consolidava como um sistema, tornava-se evidente a inviabilidade de um modelo estatal fundado no poder incontestável do rei, cuja legitimação baseava-se em um “direito divino” de governar, que o eximia de qualquer espécie de responsabilidade pelos seus atos.

Na lição de Paulo Bonavides (2008, p. 146), a burguesia não podia mais conviver com o intervencionismo do Estado monárquico, já que a economia exigia mais liberdade para poder se expandir ao máximo. Assim, surge a necessidade em se aplicar uma teoria que preconizasse o término do poder autocrático dos reis, quebrando a ideia retrógrada de identificação entre Estado e monarca e possibilitando o surgimento de “um ordenamento político impessoal, mediante formas liberais de contenção da autoridade e as garantias jurídicas da iniciativa econômica”.

De acordo com essa teoria, o Estado deveria possuir três poderes – Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário – cada um deles responsável pelo desempenho de funções específicas:

Através do poder legislativo fazem-se leis para sempre ou para determinada época, bem como se aperfeiçoam ou ab-rogam as que se acham feitas.

Com o poder executivo, ocupa-se o príncipe ou magistrado (os termos são de Montesquieu) da paz e da guerra, envia e recebe embaixadores, estabelece a segurança e previne as invasões.

O terceiro poder – o judiciário – dá ao príncipe ou magistrado a faculdade de punir os crimes ou julgar os dissídios da ordem civil. (BONAVIDES, 2008, p. 149).

Outra ideia central da divisão de poderes proposta por Montesquieu (2004, p. 167) diz respeito à necessidade de um poder “frear” o outro, com vistas a evitar o abuso do poder:

Mas é uma experiência eterna que todo homem que tem poder é levado a abusar dele. Vai até encontrar os limites. Quem diria! A própria virtude precisa de limites.

Para que não possam abusar do poder, precisa que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder.

Assim, a teoria de Montesquieu adequava-se perfeitamente aos anseios de superação do absolutismo. Por isso, nas palavras de Pedro Lenza (2009, p. 337), serviu de “base estrutural para o desenvolvimento de diversos movimentos como as revoluções americana e francesa”.

Sob o argumento dos constitucionalistas norte-americanos de que concentrar em um só órgão de governo os três poderes equivaleria a uma tirania, a América do Norte passou a acolher, de maneira inaugural, a tese de Montesquieu. A primeira Constituição escrita a adotar este princípio foi a de Virgínia, no ano de 1776. Posteriormente, adotaram a tripartição dos poderes as Constituições de Massachussetts, Maryland, New Hampshire, e, em 1787, a Constituição Federal dos Estados Unidos (MALUF, 1995, p. 206).

Logo em seguida, segundo José Afonso da Silva (2006, p. 109), o princípio da separação dos poderes

[...] tornou-se, com a Revolução Francesa, um dogma Constitucional, a ponto de o artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 declarar que não teria constituição a sociedade que não assegurasse a separação de poderes, tal a compreensão de que ela constitui técnica de extrema relevância para a garantia dos Direitos do Homem, como ainda o é.

As Constituições francesas elaboradas no período pós-revolucionário também enalteceram o princípio da separação dos poderes. A Constituição de 5 do Frutidor do ano III (1795) estabelecia, em seu artigo 22: “Existe tão somente a garantia social quando assegurada pelo estabelecimento da divisão de poderes, pela fixação de seus poderes e pela responsabilidade dos funcionários públicos.” Por sua vez, o artigo 19 da Constituição de 4 de novembro de 1848 preceituava que “a separação de poderes é a primeira condição de um governo livre.” (BONAVIDES, 2008, p. 154).

Ao enfatizar a importância da separação dos poderes para a existência efetiva de um Estado Democrático de Direito, Dalmo de Abreu Dallari (2003, pp. 219-220) explica que a evolução desse princípio possibilitou o surgimento do sistema de freios e contrapesos, responsável por criar os mecanismos de controles recíprocos entre os poderes:

Segundo essa teoria os atos que o Estado pratica podem ser de duas espécies: ou são atos gerais ou são especiais. Os atos gerais, que só podem ser praticados pelo poder legislativo, constituem-se a emissão de regras gerais e abstratas, não se sabendo, no momento de serem emitidas, a quem elas irão atingir. Dessa forma, o poder legislativo, que só pratica atos gerais, não atua concretamente na vida social, não tendo meios para cometer abusos de poder nem para beneficiar ou prejudicar uma pessoa ou a um grupo em particular. Só depois de emitir a norma geral é que se abre a possibilidade de atuação do poder executivo, por meio de atos especiais. O executivo dispõe de meios concretos para agir, mas está igualmente impossibilitado de atuar discricionariamente, porque todos os seus atos estão limitados pelos atos gerais praticados pelo legislativo. E se houver exorbitância de qualquer dos poderes surge a ação fiscalizadora do poder judiciário, obrigando cada um a permanecer nos limites de sua respectiva esfera de competências.


2. O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

As Constituições brasileiras sempre se filiaram à separação funcional do poder. Com exceção da Carta Política do Império (outorgada por D. Pedro I em 1824) que, baseada na obra de Benjamin Constant, dividira o poder estatal em quatro[1], todas as Constituições defenderam a ideia de tripartição dos poderes.

A primeira Constituição brasileira republicana (1981) dizia, através do artigo 15: “São órgãos da soberania nacional o poder legislativo, o executivo e o judiciário, harmônicos e independentes” (BONAVIDES, 2008, p. 154).

A Constituição seguinte, promulgada em 16 de julho de 1934, manteve o princípio, estampando-o em seu artigo 30: “São órgãos da soberania nacional, dentro dos limites constitucionais, os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e coordenados entre si” (BONAVIDES, 2008, p. 154).

A Carta do “Estado Novo”, outorgada em 1937, manteve apenas do ponto de vista formal a tripartição dos poderes, já que o país vivia sob um regime fortemente autoritário, no qual o Congresso Nacional foi fechado e o Poder Judiciário amplamente dominado pelo Governo (LENZA, 2009, pp. 64-65).

Com a tarefa de redemocratizar o Brasil e afastá-lo de um modelo de Estado totalitário, em 18 de setembro de 1946, foi promulgada uma nova Constituição, que restabelecia a separação funcional do poder de maneira expressa. Contudo, com o golpe militar de 1964, a Constituição passou a existir apenas formalmente, cabendo aos Atos Institucionais e Complementares o governo do país (LENZA, 2009, pp. 67-71).

A Constituição seguinte na história brasileira foi outorgada[2] pelo regime ditatorial militar em 1967. Na Carta, era mantida, assim como em 1937, apenas formalmente a separação dos poderes, haja vista que, na prática, o Poder Executivo também exercia as competências do Legislativo e do Judiciário (LENZA, 2009, p. 71).

A nossa atual Constituição, promulgada em 5 de outubro de 1988, prevê em seu artigo 2º: “São Poderes das União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Para Uadi Lammêgo Bulos (2009, p. 419), o texto constitucional, ao estabelecer a separação dos poderes, adota

[...] um conceito que tem por base a ideia de limitação, baseada na fórmula básica de Montesquieu segundo a qual o poder deve frear o poder. Resultado: quaisquer tentativas no sentido de instaurar instâncias hegemônicas de poder padecerão do vício de inconstitucionalidade, pois o escopo do constituinte foi claro: neutralizar, no âmbito político-jurídico do Estado, qualquer possibilidade de dominação institucional por parte dos Poderes da República. O pórtico em análise funciona como parâmetro de observância indispensável à exegese das normas constitucionais, sendo uma das vigas-mestras da Constituição de 1988.

Também realizando a interpretação da referida passagem constitucional, Alexandre de Moraes (2007, p. 69) assevera que:

A Constituição Federal, visando principalmente, evitar o arbítrio e o desrespeito aos direitos fundamentais do homem, previu a existência dos Poderes do Estado (CF, arts 44 a 126), bem como da instituição do Ministério Público (CF, arts. 127 a 130), independentes e harmônicos entre si, repartindo entre eles as funções estatais para que bem pudessem exercê-las, bem como criando mecanismos de controles recíprocos, sempre como garantia da perpetuidade do Estado Democrático de Direito.

Todavia, os órgãos estatais também desempenham, subsidiariamente, funções atípicas, que não são próprias ao seu mister constitucional. "Assim, o Legislativo também administra e julga (CF, arts. 51, IV e 52, XIII); o Executivo julga e legisla (CF, arts. 62 e 68, § 2º) e o Judiciário legisla e administra (CF, art. 96, I, a e f)”. (BULOS, 2009, p. 4190).

Deve ser sempre observado que o poder soberano estatal é uno e indivisível. Isso significa que a separação dos poderes deve ser compreendida do ponto de vista formal e funcional, e não substancial. Ou seja: o poder, apesar de único em sua substância, tem o exercício das suas funções tripartido em órgãos distintos e formalmente separados. Dessa maneira, cada órgão, ao atuar dentro da sua respectiva esfera de competência, manifesta o poder soberano em sua totalidade.

Ademais, a independência do Executivo, Legislativo e Judiciário (estabelecida no artigo 2º da Constituição), não pode ser entendida de modo literal, haja vista a necessidade de atuarem de maneira harmônica e coordenada. A independência se refere ao imperativo de se organizarem e funcionarem de forma separada; porém, deverá sempre existir entrosamento e subordinação mútua, com o objetivo primordial de “compor os atos de manifestação da soberania nacional, mediante um sistema de freios e contrapesos, na expressão dos constitucionalistas norte-americanos, realizando o ideal de contenção do poder pelo poder” (MALUF, 1995, pp. 207-208).

Como bem pontua José Afonso da Silva (2006, p. 109), a visão atual da teoria da separação dos poderes se relaciona com as noções de colaboração e harmonia entre os poderes:

Hoje, o princípio não configura mais aquela rigidez de outrora. A ampliação das atividades do Estado contemporâneo impôs nova visão da teoria da separação de poderes e novas formas de relacionamento entre os órgãos legislativo e executivo e destes com o judiciário, tanto que atualmente se prefere falar em colaboração de poderes, que é característica do parlamentarismo, em que o governo depende da confiança do Parlamento (Câmara dos Deputados), enquanto, no presidencialismo, desenvolveram-se as técnicas da independência orgânica e harmonia dos poderes.

Destarte, mostra-se nítida a ideia de que a separação dos poderes deve ser interpretada de acordo com as atuais demandas da sociedade, que exigem dos órgãos estatais uma atuação baseada na mútua colaboração, para que o interesse público possa ser alcançado.

É nesse contexto que o controle judicial dos atos administrativos deve ser compreendido, pois o ordenamento jurídico brasileiro, com o objetivo de possibilitar a fiscalização das atividades desempenhadas pela Administração Pública, dispõe de instrumentos específicos de controle, que permitem ao Judiciário, quando provocado, apreciar os atos administrativos e, em casos de ilegalidade, invalidá-los.


3. O CONTROLE JUDICIAL DO MOTIVO DO ATO ADMINISTRATIVO

O controle judicial do ato administrativo representa, ao lado do princípio da legalidade, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, pois, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 711), não haveria razão para obrigar a Administração Pública a atuar conforme a lei e o direito, se a sua atuação não pudesse ser objeto de controle por um órgão imparcial, competente para apreciar e invalidar os atos administrativos ilícitos.

O artigo 5º da Constituição da República estabelece em seu inciso XXXV que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Esse dispositivo constitucional é o fundamento do princípio da inafastabilidade da jurisdição e do sistema da jurisdição una, adotado pela República Federativa do Brasil.

Dizer que no Brasil vigora a jurisdição una é o mesmo que afirmar que Judiciário detém o monopólio da atividade jurisdicional, ou seja: “do poder de apreciar, com força de coisa julgada, a lesão ou ameaça de lesão a direitos individuais e coletivos” (DI PIETRO, 2006, p. 711).

Para Celso Antônio Bandeira de Mello (2004, p. 110), a garantia individual expressa por meio do inciso XXXV do artigo 5º da Constituição, além de fundamentar o sistema da jurisdição una, representa, implicitamente, a previsão constitucional do princípio do controle judicial dos atos administrativos. Segundo o eminente autor:

No Direito brasileiro, ao contrário do que ocorre com na maioria dos países europeus continentais, há unidade de jurisdição. Isto é, nenhuma contenda sobre direitos pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, conforme o art. 5º, XXXV, da Constituição. Assim, não há órgãos jurisdicionais estranhos ao Poder Judiciário para decidir, com esta força específica, sobre as contendas entre Administração e administrados.

É ao Poder Judiciário, e só a ele que cabe resolver definitivamente sobre quaisquer litígios de direito. Detém, pois, a universalidade da jurisdição, quer no que respeita à legalidade ou à consonância das condutas públicas com atos normativos infralegais, quer no que atina à constitucionalidade delas. Neste mister, tanto anulará atos inválidos, como imporá à Administração os comportamentos a que esteja de direito obrigada, como proferirá e imporá condenações pecuniárias cabíveis.

Na lição de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2008, p. 661), o controle judicial, definido como “um meio de preservação de direitos individuais dos administrados”, é exercido sobre os atos administrativos praticados pelos três Poderes (Executivo, Legislativo, e Judiciário), busca verificar a legalidade dos atos e, em regra, acontece após a edição desses (a posteriori).

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 771), ao discorrer sobre os limites (ou o alcance) do referido controle, nos lembra que, além de relacionar-se à legalidade do ato, o controle judicial deve averiguar a moralidade – princípio constitucional expresso que informa a atividade administrativa:

O Poder Judiciário pode examinar os atos da Administração Pública, de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais ou bilaterais, vinculados ou discricionários, mas sempre sob o aspecto da legalidade e, agora, pela Constituição, também sob o aspecto da moralidade (arts. 5º, inciso LXXIII, e 37).

Em regra, o ato administrativo discricionário também é objeto de controle judicial. Contudo, o Poder Judiciário não poderá interferir em aspectos reservados à apreciação subjetiva da Administração Pública ligados ao mérito administrativo – compreendido como o campo de liberdade, delimitado em lei, que permite à Administração Pública, utilizando-se de critérios de conveniência, oportunidade, justiça e equidade, escolher, após valorações no seu âmbito interno, a melhor decisão a ser tomada em um caso concreto.

No entanto, ao apreciar o motivo do ato administrativo – pressuposto de fato que antecedeu a sua edição –, o Judiciário não invade o mérito, pois podem existir casos em que o Poder Público baseou a sua atuação em motivos falsos ou inexistentes, o que configura ilegalidade e deixa o ato passível de invalidação judicial (DI PIETRO, 2006, p. 711).

Hely Lopes Meirelles (2004, p. 201) também reconhece a possibilidade de exame, por parte do Judiciário, dos motivos que ensejaram a edição de determinado ato administrativo discricionário, sem que isso represente invasão do mérito administrativo. Este exame permite averiguar se a atuação administrativa se deu conforme o princípio da legalidade:

A ilegitimidade, como toda fraude à lei, vem quase sempre dissimulada sob as vestes da legalidade. Em tais casos, é preciso que a Administração ou o Judiciário desça ao exame dos motivos, disseque os fatos e vasculhe as provas que deram origem à prática do ato inquinado de nulidade. Não vai nessa atitude qualquer exame do mérito administrativo, porque não se aprecia a conveniência, a oportunidade ou a justiça do ato impugnado, mas unicamente sua conformação, formal e ideológica, com a lei em sentido amplo, isto é, com todos os preceitos normativos que condicionam a atividade pública.

Odete Medauar (2003, pp. 127-128), ao reconhecer a possibilidade da apreciação pelo Judiciário dos motivos que impulsionaram a Administração Pública a praticar determinado ato discricionário, salienta que:

A exigência de nexo entre o ato administrativo e seus antecedentes de fato, tornou o motivo um vínculo a mais no exercício do poder discricionário. Como decorrência, veio a possibilidade do controle jurisdicional dos antecedentes de fato e das justificativas jurídicas que levam à tomada da decisão em determinado sentido, ou seja, o controle do motivo. Um dos aspectos mais marcantes desse controle consiste na averiguação dos fatos; se num primeiro motivo não se admitia que o Judiciário pudesse apreciar fatos e provas relativos à atividade da Administração, firmou-se, depois, orientação no sentido da plena possibilidade de exame de fatos e provas.

No que se refere aos atos políticos ou de governo (como o indulto, a sanção, o veto e a iniciativa de leis delegadas), editados em obediência direta à Constituição pelo Poder Executivo, também podem ser submetidos ao controle judicial. A nossa atual Constituição proíbe que qualquer lesão ou ameaça a direito seja excluída da apreciação judicial. Dessa forma, se um ato político causar lesão, ou ameaçar direitos individuais ou coletivos poderá ser invalidado pelo Judiciário (DI PIETRO, 2006, p. 712).

Deve ser mencionado, todavia, que os atos normativos editados pelo Executivo (decretos regulamentares, regimentos, resoluções) só poderão ser invalidados pelo Judiciário através de ação direta de inconstitucionalidade. Em se tratando de ato normativo federal ou estadual, a competência julgadora será do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, a); no caso de ato normativo estadual ou municipal que viole a Constituição Estadual, caberá ao respectivo Tribunal de Justiça julgar (Constituição do Estado da Bahia, art. 123, I, d).

Fora a ação direta de inconstitucionalidade, existem outros mecanismos que permitem ao Judiciário examinar, nos casos concretos, a legalidade ou a constitucionalidade de lei ou ato administrativo normativo praticado pelo Executivo. Porém, o julgamento, em regra, somente produzirá efeitos entre as partes. Ademais, um ato normativo do Poder Público só poderá ser declarado inconstitucional pelo voto da maioria absoluta dos membros do tribunal ou dos membros do respectivo órgão especial (CF, art. 97).

Conforme o meio utilizado e o tipo de pedido, as consequências do controle judicial poderão variar. Dentre as consequências mais comuns, podem ser citadas: a) suspensão de atos ou atividades – quando a decisão do Judiciário impede a produção dos efeitos de algum ato administrativo, ou ordena a paralisação de alguma atividade da Administração Pública, até a decisão final da causa ou por tempo indeterminado (é o caso das liminares); b) anulação do ato administrativo – que produzirá efeitos retroativos à data da sua edição (ex tunc); c) imposição de fazer – quando a decisão definitiva contém uma ordem para a realização de algo (praticar determinada atividade material ou editar um ato administrativo); d) imposição de se abster de algo – quando a Administração Pública é condenada a não fazer determinada atividade; e) imposição de pagar – nos casos em que o Poder Público é obrigado a pagar, por exemplo, vencimentos e benefícios a servidores, ou devolver indébitos aos administrados; f) imposição de indenizar ou ressarcir – surge em decorrência de decisões judiciais que obrigam a Administração Pública a realizar a reparação de danos ou a indenização (MEDAUAR, 2003, pp. 428-429).


4. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

O Poder Judiciário brasileiro manteve, durante muito tempo, um posicionamento que se filiava à ideia de inadmissibilidade do controle dos atos discricionários, pois considerava impenetrável a discricionariedade do ato administrativo e, por isso, impraticável o controle.

Aos poucos, a jurisprudência nacional começou a mudar o seu posicionamento, passando a vislumbrar a possibilidade de se exercer o controle judicial nos elementos intrínsecos aos atos administrativos.

Nesse contexto, faz-se oportuno citar, inicialmente, o julgamento do Recurso Extraordinário nº 125556/PR[3], através do qual o Supremo Tribunal Federal, na década de 1990, decidiu pela ilegitimidade da verificação secreta da conduta pública e privada de um candidato, realizada em razão de um concurso público para provimento do cargo de delegado de polícia.

No ano de 1992, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 21923/MG[4], manifestou-se no sentido de que é licito ao Poder Judiciário examinar o ato administrativo sob o aspecto da moralidade e do desvio de poder, concluindo que a Constituição exige da Administração, “além de uma conduta legal, um comportamento ético”.

Em 1994, através do julgamento do Mandado de Segurança nº 3500/DF[5], o Superior Tribunal de Justiça, ao tratar da necessidade de motivação do ato administrativo, estabeleceu que, até mesmo os atos cujos motivos não foram explicitados podem ser objeto de controle judicial.

No julgamento do Recurso Extraordinário nº 192568/PI[6], o Supremo Tribunal Federal, no ano de 1996, manifestou-se pela necessidade de um motivo “socialmente aceitável” para justificar a prorrogação do prazo de validade de um concurso público para provimento do cargo de magistrado.

Em 1998, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Ordinário no Mandado de Segurança nº 9594/RS[7], posicionou-se no sentido de reconhecer que o mérito do ato administrativo é próprio do administrador e não deve ser substituído pelo Poder Judiciário, que poderá, contudo, analisar os fundamentos utilizados pela decisão administrativa para concluir se a opção do administrador possui respaldo jurídico.

No ano de 2002, o Supremo Tribunal Federal decidiu, através do julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2213/DF[8], sobre a possibilidade de as medidas provisórias, no que se refere aos pressupostos constitucionais de relevância e urgência, serem objeto de controle judicial, a fim de se evitar distorções no modelo político e manter a integridade do princípio constitucional da separação de poderes.

Em 2003, no julgamento do Recurso Especial nº 443310/RS[9], o Superior Tribunal de Justiça manifestou-se no sentido de que a Administração Pública deve sempre pautar as suas atividades nos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade.

Já no ano de 2004, ao julgar o Recurso Ordinário no Mandado de Segurança nº 24699/DF[10], o Supremo Tribunal Federal admitiu a possibilidade de controle judicial sobre atos administrativos que envolvam a aplicação de “conceitos jurídicos indeterminados”, em razão dos princípios que regem a Administração Pública.

Em 2013, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 628159/MA[11], entendeu que não viola o princípio da separação dos poderes a determinação, pelo Judiciário, para que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos reconhecidos pela Constituição como essenciais.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O princípio da separação dos poderes é, sobretudo, uma garantia da sociedade contra qualquer forma de concentração autocrática. Sua importância histórica é basilar, pois possibilitou o surgimento de um ordenamento político baseado na impessoalidade, no qual os agentes públicos são responsáveis pelos atos praticados na gestão da coisa pública.

Nos dias atuais, o princípio da separação dos poderes não é compreendido de maneira rígida. As variadas atividades desempenhadas pelo Poder Público exigem que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário estejam em constante articulação, colaborando um com o outro para harmonizar a vida social.

Para assegurar que Administração Pública aja sempre conforme a moralidade, a legalidade, a finalidade, a proporcionalidade e a razoabilidade – mandamentos indissociáveis da gestão pública –, a Constituição da República garante que a lei não excluirá da apreciação judicial lesão ou ameaça a direito.

Contudo, para que seja viável apreciar judicialmente as atividades praticadas pela Administração Pública, os motivos que precederam as suas escolhas devem ser conhecidos, analisados e examinados.

Somente após vasculhar os pressupostos de fato e de direito que impulsionaram a edição do ato, será possível julgar se há ajustamento formal e ideológico com a lei e afinamento com os princípios jurídicos.

Não raro, os abusos de poder e as arbitrariedades poderão ser praticados pela Administração Pública de maneira disfarçada, mediante desvio de poder, quando o agente público buscar um fim diferente do estabelecido pela lei, através da indicação de motivos falsos ou inexistentes. Nestes casos, para que o Poder Judiciário possa anular um ato viciado por ilegalidade, mostra-se necessário o exame dos motivos.

No entanto, o escopo do controle judicial não é verificar se o juízo de oportunidade e conveniência do administrador foi ou não correto, mas analisar os fundamentos da decisão para concluir se a opção foi legitimamente motivada e fundamentada em conformidade com a finalidade prevista nas regras e princípios jurídicos aplicáveis à Administração Pública.

 


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PESQUISA de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/>; Acesso em 22 set. 2017.

PESQUISA de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em 22 set. 2017.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.


Notas

[1] A Constituição do Império do Brasil dispunha em seu artigo 99 que: “os poderes políticos reconhecidos pela Constituição eram quatro: o poder legislativo, o poder moderador, o poder executivo e o poder judicial. O poder moderador era delegado de forma privativa ao Imperador, que, como “chefe supremo da Nação e seu primeiro representante”, velava, de maneira incessante, pela “manutenção, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos” (art. 98). A pessoa do Imperador era proclamada como sagrada e inviolável, o que o eximia de qualquer espécie de responsabilidade. (BONAVIDES, 2008, p. 156).

[2] Apesar de a Constituição de 1967 ter se instaurado de forma autoritária pelo Comando Militar da Revolução, alguns autores a entendem como “promulgada”, pois houve, formalmente, votação, aprovação e promulgação do texto. (LENZA, 2009, p. 71).

[3] CONSTITUCIONAL. CONCURSO PÚBLICO. JULGAMENTO SIGILOSO DA CONDUTA DO CANDIDATO. INCONSTITUCIONALIDADE. CF/67, ART. 153, PAR 4.. CF/88, ART. 5. XXXV. I. Exame e avaliação de candidato com base em critérios subjetivos, como, por exemplo, a verificação sigilosa sobre a conduta, pública e privada, do candidato, excluindo-o do concurso sem que sejam fornecidos os motivos. Ilegitimidade do ato, que atenta contra o princípio da inafastabilidade do conhecimento do Poder Judiciario de lesão ou ameaça a direito. E que, se a lesão e praticada com base em critérios subjetivos, ou em critérios não revelados, fica o Judiciario impossibilitado de prestar a tutela jurisdicional, porque não tera como verificar o acerto ou o desacerto de tais critérios. Por via obliqua, estaria sendo afastada da apreciação do Judiciario lesão a direito. (STF, RE 125556/PR, Tribunal Pleno, Rel. Ministro Carlos Velloso, julgado em 27/03/1992, DJ 15/05/1992, p. 6786)

[4] ADMINISTRATIVO - ATO ADMINISTRATIVO - MORALIDADE - EXAME PELO JUDICIARIO - ART. 37 DA CF - DESAPROPRIAÇÃO - ART. 20 DO DL 3365/41. E LICITO AO PODER JUDICIARIO EXAMINAR O ATO ADMINISTRATIVO, SOB O ASPECTO DA MORALIDADE E DO DESVIO DE PODER. COM O PRINCIPIO INSCRITO NO ART. 37, A CONSTITUIÇÃO FEDERAL COBRA DO ADMINISTRADOR, ALEM DE UMA CONDUTA LEGAL, COMPORTAMENTO ETICO. O ART. 20 DO DL N. 3365/41 PERMITE QUE, EM AÇÃO DIRETA O PODER JUDICIARIO EXAMINE"QUALQUER QUESTÃO"RELATIVA A DESAPROPRIAÇÃO. (STJ, REsp 21923/MG, 1ª Turma, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, julgado em 20/05/1992, DJ 13/10/1992, p. 17662)

[5] ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. AERONÁUTICA. CORPO FEMININO. LICENCIAMENTO" EX OFFICIO ". ATO IMPETRADO QUE SE LASTREIA EM PARECER DA COMISSÃO DE PROMOÇÕES DE GRADUADOS NÃO JUNTADO AOS AUTOS. INEXISTENCIA DE MOTIVAÇÃO POSSIBILITADORA DO JUDICIAL CONTROL. PRECEDENTES DO STJ. SEGURANÇA DEFERIDA. I - A IMPETRANTE, JA COM 8 ANOS DE ATIVIDADE MILITAR, REQUEREU SUA PERMANENCIA DEFINITIVA NA AERONÁUTICA. O IMPETRADO SEU PEDIDO, INVOCANDO PARECER DA COMISSÃO DE PROMOÇÕES E GRADUADOS, QUE TERIA SIDO CONTRARIO A SUA PRETENSÃO"EM FACE"DO (SEU) DESEMPENHO DEFICIENTE AO LONGO DA CARREIRA, NO ASPECTO APTIDÃO PROFISSIONAL II - O ATO ADMINISTRATIVO NUNCA E TOTALMENTE REVESTIDO DE PODER DISCRICIONARIO. SEMPRE EXISTE UM QUE VINCULANTE. CABIA AO IMPETRADO JUNTAR O PARECER DA CPG. OU, ENTÃO, MOTIVAR DIRETAMENTE SEU ATO. EM NÃO O FAZENDO, TAL DECISÃO REVESTIU-SE DE ARBITRARIEDADE. PRECEDENTES DO STJ. III - SEGURANÇA DEFERIDA. (STJ, MS 3500/DF, 3ª Seção, Rel. Ministro Adhemar Maciel, julgado em 17/11/1994, DJ 19/12/1994, p. 35230)

[6] CONCURSO PÚBLICO - EDITAL - PARÂMETROS - OBSERVAÇÃO. As cláusulas constantes do edital de concurso obrigam candidatos e Administração Pública. Na feliz dicção de Hely Lopes Meirelles, o edital é lei interna da concorrência. CONCURSO PÚBLICO - VAGAS - NOMEAÇÃO. O princípio da razoabilidade é conducente a presumir-se, como objeto do concurso, o preenchimento das vagas existentes. Exsurge configurador de desvio de poder, ato da Administração Pública que implique nomeação parcial de candidatos, indeferimento da prorrogação do prazo do concurso sem justificativa socialmente aceitável e publicação de novo edital com idêntica finalidade."Como o inciso IV (do artigo 37 da Constituição Federal) tem o objetivo manifesto de resguardar precedências na seqüência dos concursos, segue-se que a Administração não poderá, sem burlar o dispositivo e sem incorrer em desvio de poder, deixar escoar deliberadamente o período de validade de concurso anterior para nomear os aprovados em certames subseqüentes. Fora isto possível e o inciso IV tornar-se-ia letra morta, constituindo-se na mais rúptil das garantias"(Celso Antonio Bandeira de Mello," Regime Constitucional dos Servidores da Administração Direta e Indireta ", página 56). (STF, RE 192568/PI, 2ª Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 23/04/1996, DJ 13/09/1996, p. 33241)

[7] RMS - ADMINISTRATIVO - PDV - OPORTUNIDADE E CONVENIÊNCIA. - O mérito do ato administrativo, entendido como juízo de oportunidade e conveniência, é próprio do administrador. Vedado ao judiciário substituí-lo. Admissível, porém, analisar os fundamentos da decisão para concluir se a opção guarda respaldo jurídico. Dentre conclusões legalmente admissíveis, a administração escolhe a que melhor atenda o interesse público. Resta ao judiciário julgar a conformidade do ato com o direito. (STJ, RMS 9594/RS, 6ª Turma, Rel. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em 16/06/1998, DJ 17/08/1998, p. 93)

[8] E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - A QUESTÃO DO ABUSO PRESIDENCIAL NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS - POSSIBILIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL DOS PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS DA URGÊNCIA E DA RELEVÂNCIA (CF, ART. 62, CAPUT)- REFORMA AGRÁRIA - NECESSIDADE DE SUA IMPLEMENTAÇÃO - INVASÃO DE IMÓVEIS RURAIS PRIVADOS E DE PRÉDIOS PÚBLICOS - INADMISSIBILIDADE - ILICITUDE DO ESBULHO POSSESSÓRIO - LEGITIMIDADE DA REAÇÃO ESTATAL AOS ATOS DE VIOLAÇÃO POSSESSÓRIA - RECONHECIMENTO, EM JUÍZO DE DELIBAÇÃO, DA VALIDADE CONSTITUCIONAL DA MP Nº 2.027-38/2000, REEDITADA, PELA ÚLTIMA VEZ, COMO MP Nº 2.183-56/2001 - INOCORRÊNCIA DE NOVA HIPÓTESE DE INEXPROPRIABILIDADE DE IMÓVEIS RURAIS - MEDIDA PROVISÓRIA QUE SE DESTINA, TÃO-SOMENTE, A INIBIR PRÁTICAS DE TRANSGRESSÃO À AUTORIDADE DAS LEIS E À INTEGRIDADE DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INSUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADA QUANTO A UMA DAS NORMAS EM EXAME - INVIABILIDADE DA IMPUGNAÇÃO GENÉRICA - CONSEQÜENTE INCOGNOSCIBILIDADE PARCIAL DA AÇÃO DIRETA - PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR CONHECIDO EM PARTE E, NESSA PARTE, INDEFERIDO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL DOS PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS (URGÊNCIA E RELEVÂNCIA) QUE CONDICIONAM A EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS. - A edição de medidas provisórias, pelo Presidente da República, para legitimar-se juridicamente, depende, dentre outros requisitos, da estrita observância dos pressupostos constitucionais da urgência e da relevância (CF, art. 62,"caput"). - Os pressupostos da urgência e da relevância, embora conceitos jurídicos relativamente indeterminados e fluidos, mesmo expondo-se, inicialmente, à avaliação discricionária do Presidente da República, estão sujeitos, ainda que excepcionalmente, ao controle do Poder Judiciário, porque compõem a própria estrutura constitucional que disciplina as medidas provisórias, qualificando-se como requisitos legitimadores e juridicamente condicionantes do exercício, pelo Chefe do Poder Executivo, da competência normativa primária que lhe foi outorgada, extraordinariamente, pela Constituição da República. Doutrina. Precedentes. - A possibilidade de controle jurisdicional, mesmo sendo excepcional, apóia-se na necessidade de impedir que o Presidente da República, ao editar medidas provisórias, incida em excesso de poder ou em situação de manifesto abuso institucional, pois o sistema de limitação de poderes não permite que práticas governamentais abusivas venham a prevalecer sobre os postulados constitucionais que informam a concepção democrática de Poder e de Estado, especialmente naquelas hipóteses em que se registrar o exercício anômalo e arbitrário das funções estatais. UTILIZAÇÃO ABUSIVA DE MEDIDAS PROVISÓRIAS - INADMISSIBILIDADE - PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - COMPETÊNCIA EXTRAORDINÁRIA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. - A crescente apropriação institucional do poder de legislar, por parte dos sucessivos Presidentes da República, tem despertado graves preocupações de ordem jurídica, em razão do fato de a utilização excessiva das medidas provisórias causar profundas distorções que se projetam no plano das relações políticas entre os Poderes Executivo e Legislativo. - Nada pode justificar a utilização abusiva de medidas provisórias, sob pena de o Executivo - quando ausentes razões constitucionais de urgência, necessidade e relevância material -, investir-se, ilegitimamente, na mais relevante função institucional que pertence ao Congresso Nacional, vindo a converter-se, no âmbito da comunidade estatal, em instância hegemônica de poder, afetando, desse modo, com grave prejuízo para o regime das liberdades públicas e sérios reflexos sobre o sistema de"checks and balances", a relação de equilíbrio que necessariamente deve existir entre os Poderes da República. - Cabe, ao Poder Judiciário, no desempenho das funções que lhe são inerentes, impedir que o exercício compulsivo da competência extraordinária de editar medida provisória culmine por introduzir, no processo institucional brasileiro, em matéria legislativa, verdadeiro cesarismo governamental, provocando, assim, graves distorções no modelo político e gerando sérias disfunções comprometedoras da integridade do princípio constitucional da separação de poderes. - Configuração, na espécie, dos pressupostos constitucionais legitimadores das medidas provisórias ora impugnadas. Conseqüente reconhecimento da constitucionalidade formal dos atos presidenciais em questão. RELEVÂNCIA DA QUESTÃO FUNDIÁRIA - O CARÁTER RELATIVO DO DIREITO DE PROPRIEDADE - A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE - IMPORTÂNCIA DO PROCESSO DE REFORMA AGRÁRIA - NECESSIDADE DE NEUTRALIZAR O ESBULHO POSSESSÓRIO PRATICADO CONTRA BENS PÚBLICOS E CONTRA A PROPRIEDADE PRIVADA - A PRIMAZIA DAS LEIS E DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. - O direito de propriedade não se reveste de caráter absoluto, eis que, sobre ele, pesa grave hipoteca social, a significar que, descumprida a função social que lhe é inerente (CF, art. 5º, XXIII), legitimar-se-á a intervenção estatal na esfera dominial privada, observados, contudo, para esse efeito, os limites, as formas e os procedimentos fixados na própria Constituição da República. - O acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o aproveitamento racional e adequado do imóvel rural, a utilização apropriada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente constituem elementos de realização da função social da propriedade. A desapropriação, nesse contexto - enquanto sanção constitucional imponível ao descumprimento da função social da propriedade - reflete importante instrumento destinado a dar conseqüência aos compromissos assumidos pelo Estado na ordem econômica e social. - Incumbe, ao proprietário da terra, o dever jurídico- -social de cultivá-la e de explorá-la adequadamente, sob pena de incidir nas disposições constitucionais e legais que sancionam os senhores de imóveis ociosos, não cultivados e/ou improdutivos, pois só se tem por atendida a função social que condiciona o exercício do direito de propriedade, quando o titular do domínio cumprir a obrigação (1) de favorecer o bem-estar dos que na terra labutam; (2) de manter níveis satisfatórios de produtividade; (3) de assegurar a conservação dos recursos naturais; e (4) de observar as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que possuem o domínio e aqueles que cultivam a propriedade. O ESBULHO POSSESSÓRIO - MESMO TRATANDO-SE DE PROPRIEDADES ALEGADAMENTE IMPRODUTIVAS - CONSTITUI ATO REVESTIDO DE ILICITUDE JURÍDICA. - Revela-se contrária ao Direito, porque constitui atividade à margem da lei, sem qualquer vinculação ao sistema jurídico, a conduta daqueles que - particulares, movimentos ou organizações sociais - visam, pelo emprego arbitrário da força e pela ocupação ilícita de prédios públicos e de imóveis rurais, a constranger, de modo autoritário, o Poder Público a promover ações expropriatórias, para efeito de execução do programa de reforma agrária. - O processo de reforma agrária, em uma sociedade estruturada em bases democráticas, não pode ser implementado pelo uso arbitrário da força e pela prática de atos ilícitos de violação possessória, ainda que se cuide de imóveis alegadamente improdutivos, notadamente porque a Constituição da República - ao amparar o proprietário com a cláusula de garantia do direito de propriedade (CF, art. 5º, XXII)- proclama que"ninguém será privado (...) de seus bens, sem o devido processo legal"(art. 5º, LIV). - O respeito à lei e à autoridade da Constituição da República representa condição indispensável e necessária ao exercício da liberdade e à prática responsável da cidadania, nada podendo legitimar a ruptura da ordem jurídica, quer por atuação de movimentos sociais (qualquer que seja o perfil ideológico que ostentem), quer por iniciativa do Estado, ainda que se trate da efetivação da reforma agrária, pois, mesmo esta, depende, para viabilizar-se constitucionalmente, da necessária observância dos princípios e diretrizes que estruturam o ordenamento positivo nacional. - O esbulho possessório, além de qualificar-se como ilícito civil, também pode configurar situação revestida de tipicidade penal, caracterizando-se, desse modo, como ato criminoso (CP, art. 161, § 1º, II; Lei nº 4.947/66, art. 20). - Os atos configuradores de violação possessória, além de instaurarem situações impregnadas de inegável ilicitude civil e penal, traduzem hipóteses caracterizadoras de força maior, aptas, quando concretamente ocorrentes, a infirmar a própria eficácia da declaração expropriatória. Precedentes. O RESPEITO À LEI E A POSSIBILIDADE DE ACESSO À JURISDIÇÃO DO ESTADO (ATÉ MESMO PARA CONTESTAR A VALIDADE JURÍDICA DA PRÓPRIA LEI) CONSTITUEM VALORES ESSENCIAIS E NECESSÁRIOS À PRESERVAÇÃO DA ORDEM DEMOCRÁTICA. - A necessidade de respeito ao império da lei e a possibilidade de invocação da tutela jurisdicional do Estado - que constituem valores essenciais em uma sociedade democrática, estruturada sob a égide do princípio da liberdade - devem representar o sopro inspirador da harmonia social, além de significar um veto permanente a qualquer tipo de comportamento cuja motivação derive do intuito deliberado de praticar gestos inaceitáveis de violência e de ilicitude, como os atos de invasão da propriedade alheia e de desrespeito à autoridade das leis da República. RECONHECIMENTO, EM JUÍZO DE DELIBAÇÃO, DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA MP Nº 2.027-38/2000, REEDITADA, PELA ÚLTIMA VEZ, COMO MP Nº 2.183-56/2001. - Não é lícito ao Estado aceitar, passivamente, a imposição, por qualquer entidade ou movimento social organizado, de uma agenda político-social, quando caracterizada por práticas ilegítimas de invasão de propriedades rurais, em desafio inaceitável à integridade e à autoridade da ordem jurídica. - O Supremo Tribunal Federal não pode validar comportamentos ilícitos. Não deve chancelar, jurisdicionalmente, agressões inconstitucionais ao direito de propriedade e à posse de terceiros. Não pode considerar, nem deve reconhecer, por isso mesmo, invasões ilegais da propriedade alheia ou atos de esbulho possessório como instrumentos de legitimação da expropriação estatal de bens particulares, cuja submissão, a qualquer programa de reforma agrária, supõe, para regularmente efetivar-se, o estrito cumprimento das formas e dos requisitos previstos nas leis e na Constituição da República. - As prescrições constantes da MP 2.027-38/2000, reeditada, pela última vez, como MP nº 2.183-56/2001, precisamente porque têm por finalidade neutralizar abusos e atos de violação possessória, praticados contra proprietários de imóveis rurais, não se mostram eivadas de inconstitucionalidade (ao menos em juízo de estrita delibação), pois visam, em última análise, a resguardar a integridade de valores protegidos pela própria Constituição da República. O sistema constitucional não tolera a prática de atos, que, concretizadores de invasões fundiárias, culminam por gerar - considerada a própria ilicitude dessa conduta - grave situação de insegurança jurídica, de intranqüilidade social e de instabilidade da ordem pública. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE E DEVER PROCESSUAL DE FUNDAMENTAR A IMPUGNAÇÃO. - O Supremo Tribunal Federal, no desempenho de sua atividade jurisdicional, não está condicionado às razões de ordem jurídica invocadas como suporte da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pelo autor da ação direta. Tal circunstância, no entanto, não suprime, à parte, o dever processual de motivar o pedido e de identificar, na Constituição, em obséquio ao princípio da especificação das normas, os dispositivos alegadamente violados pelo ato normativo que pretende impugnar. Impõe-se, ao autor, no processo de controle concentrado de constitucionalidade, sob pena de não conhecimento (total ou parcial) da ação direta, indicar as normas de referência - que, inscritas na Constituição da República, revestem-se, por isso mesmo, de parametricidade -, em ordem a viabilizar a aferição da conformidade vertical dos atos normativos infraconstitucionais. Precedentes (RTJ 179/35-37, v.g.). (STF, ADI 2213 MC/DF, Tribunal Pleno, Rel. Ministro Celso de Melo, julgado em 04/04/2002, DJ 23/04/2004, p. 07)

[9] ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. IMPUGNAÇÃO DE MULTA. ART. 630, § 5º DA CLT. TRANSPORTE DOS FISCAIS DO TRABALHO. PASSE LIVRE. LINHA SELETIVA. DISCRICIONARIEDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. CONTROLE. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE DO ATO. 1. Ação ordinária ajuizada pela recorrente, em que impugnou a multa aplicada por violação ao art. 630, § 5º da CLT, porquanto, no seu entender, é obrigada a conceder a gratuidade legal apenas no tocante ao transporte comum, não se estendendo o referido benefício ao transporte seletivo, que conduz um número menor de passageiros, dispondo de comodidades como ar condicionado, televisão, som ambiente, que o serviço comum não possui, tendo acentuado, ainda, que os passageiros optantes pelo transporte seletivo, pagam uma tarifa maior em razão do diferencial do serviço prestado. 2. A atuação da Administração Pública, deve seguir os parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade, que censuram o ato administrativo que não guarde uma proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar. 3. A razoabilidade encontra ressonância na ajustabilidade da providência administrativa consoante o consenso social acerca do que é usual e sensato. Razoável é conceito que se infere a contrario sensu; vale dizer, escapa à razoabilidade" aquilo que não pode ser ". A proporcionalidade, como uma das facetas da razoabilidade revela que nem todos os meios justificam os fins. Os meios conducentes à consecução das finalidades, quando exorbitantes, superam a proporcionalidade, porquanto medidas imoderadas em confronto com o resultado almejado. 4. É excepcional a intervenção estatal no domínio econômico, máxime no sistema de livre iniciativa. Sob esse pálio, a intervenção há de se pautar pela razoabilidade, que in casu, recomenda que a concessão de passe livre aos fiscais do trabalho mantenha a finalidade de viabilizar o bom andamento do seu serviço à luz do princípio da menor onerosidade possível. Havendo linhas regulares, com o mesmo itinerário, não há razoabilidade em que os fiscais utilizem-se gratuitamente de um serviço prestado seletivamente. O fato de a lei conceder a esses servidores a possibilidade de deslocamento, não significa que deva ser no meio de transporte mais oneroso. 5. Recurso especial conhecido e improvido. (STJ, REsp 443310/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, 1ª Turma, julgado em 21/10/2003, DJ 03/11/2003, p. 249)

[10] EMENTA: RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMISSÃO. PODER DISCIPLINAR. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. ATO DE IMPROBIDADE. 1. Servidor do DNER demitido por ato de improbidade administrativa e por se valer do cargo para obter proveito pessoal de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, com base no art. 11, caput, e inciso I, da Lei n. 8.429/92 e art. 117, IX, da Lei n. 8.112/90. 2. A autoridade administrativa está autorizada a praticar atos discricionários apenas quando norma jurídica válida expressamente a ela atribuir essa livre atuação. Os atos administrativos que envolvem a aplicação de"conceitos indeterminados"estão sujeitos ao exame e controle do Poder Judiciário. O controle jurisdicional pode e deve incidir sobre os elementos do ato, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração. 3. Processo disciplinar, no qual se discutiu a ocorrência de desídia --- art. 117, inciso XVda Lei n. 8.112/90. Aplicação da penalidade, com fundamento em preceito diverso do indicado pela comissão de inquérito. A capitulação do ilícito administrativo não pode ser aberta a ponto de impossibilitar o direito de defesa. De outra parte, o motivo apresentado afigurou-se inválido em face das provas coligidas aos autos. 4. Ato de improbidade: a aplicação das penalidades previstas na Lei n. 8.429/92 não incumbe à Administração, eis que privativa do Poder Judiciário. Verificada a prática de atos de improbidade no âmbito administrativo, caberia representação ao Ministério Público para ajuizamento da competente ação, não a aplicação da pena de demissão. Recurso ordinário provido. (STF, RMS 24699/DF, 1ª Turma, Rel. Ministro Eros Grau, julgado em 30/11/2004, DJ 01/07/2005, p. 56)

[11] EMENTA DIREITO ADMINISTRATIVO. SEGURANÇA PÚBLICA. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. OFENSA NÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 04.11.2004. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF, RE 628159 AgR/MA, 1ª Turma, Rel. Ministra Rosa Weber, julgado em 25/03/2013, DJe-159, public. 15/08/2013)


Autor

  • João Daniel Correia de Oliveira

    Analista Judiciário, Área Judiciária. Especialização em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, PUC Minas (2022). Especialização em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Legale, FALEG (2021). Especialização em Direito Público Aplicado pelo Centro Universitário UNA em parceria com a Escola Brasileira de Direito, EBRADI (2019). Especialização em Direito Processual Civil pelo Instituto Damásio de Direito da Faculdade IBMEC São Paulo (2019). Especialização em Direito Civil pela Universidade Anhanguera - UNIDERP (2017). Graduação em Direito pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, UESB (2011).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, João Daniel Correia de. O princípio da separação dos poderes e o controle judicial do motivo do ato administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5354, 27 fev. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60852. Acesso em: 26 abr. 2024.