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Acesso à justiça no Brasil

Acesso à justiça no Brasil

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Principais aspectos relacionados aos institutos que compõem o sistema de acesso à Justiça.

INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como tema o Acesso à Justiça no Brasil. A legislação brasileira referente ao acesso à justiça é considerada, por muitos, uma das mais avançadas do mundo, visto que é composta por uma série de institutos que proporcionam, formalmente, uma assistência jurídica integral aos hipossuficientes, principalmente após a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que trouxe em seu bojo uma infinidade de garantias referentes ao tema.

Por outro lado, esta mesma legislação, considerada avançada em muitos aspectos, macula falhas de eficácia formal e material, que chega, em certos pontos, a representar uma negação do direito constitucional de Acesso à Justiça.

Dentre os aspectos deficientes do sistema de Acesso à Justiça, temos um retrato problemático das Defensorias Públicas Estaduais, que, embora tenham recebido melhoras, não estão presentes em todas as comarcas, impossibilitando o acesso ao judiciário àqueles que não podem arcar com os altos custos de um patrono particular.

Este acesso, nos casos de inexistência de núcleos das Defensorias Públicas em uma Comarca, é feito por meio da nomeação de um advogado a ser pago pelo Estado, no futuro, sendo que, na prática, demora-se muito tempo para o pagamento dos honorários ser efetuado, sendo valorados em pequena monta, tornado estas nomeações desinteressantes e fazendo que os advogados rejeitem as causas para as quais são nomeados.

Outra importante ferramenta de Acesso à Justiça advém da Novo Código de Processo Civil, que regula, a partir do artigo 98, a concessão de assistência judiciária aos hipossuficientes. Esta lei, em seu artigo 99, § 3º, prevê que a mera alegação de estado de hipossuficiência seria suficiente para a presunção do estado de pobreza, o que, em muitos casos, acaba por possibilitar a concessão do direito a quem não precisa.

Essa interpretação abstrata do direito à justiça gratuita acaba por negar o acesso à justiça àqueles que realmente necessitam do benefício.

Mais uma nuance do tema está na lei 9.099/95, que cria os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que traz, dentre suas normas processuais, a desnecessidade de assistência por advogado em causas cíveis que não ultrapassem o valor de vinte salários-mínimos, tornando mais cômodo o acesso daqueles que desejam ter seus litígios resolvidos e não tem condições de ter acesso a um advogado, público ou particular.

Porém, o que parece inicialmente um avanço, traz uma série de problemas, visto que aquele que deseja que sua demanda seja apreciada pelo judiciário, respeitando o critério do valor da causa, deve procurar a secretaria do Juizado Especial, narrando o fato e pedindo o que presume ser de direito, mesmo não tendo o conhecimento técnico necessário para tal.

Desta feita, uma série de problemas é gerada, sendo requerido pela parte, em muitos casos, o que não é de direito e deixando de lado muitos pedidos válidos, sendo que esta situação pode ficar insustentável em fase de instrução probatória, já que a parte não assistida não consegue sozinha, estruturar suas ações para atingir o resultado desejado, caracterizando, por falta de ampla defesa, uma negação do Acesso à Justiça.

Na Justiça do Trabalho, onde também existe o instituto do Jus Postulante, a parte, sem o assistência de um advogado, pode fazer sua reclamação diretamente na Vara do Trabalho, o que dará início a um procedimento trabalhista.

Apesar da hipossuficiência da parte, o conjunto de normas materiais e processuais que compõe este ramo do Judiciário têm cunho especialmente protecionista ao trabalhador e a própria atuação dos Juízes do Trabalho corroboram esta proteção, e que, evidentemente, compensa a disparidade de armas entre o empregador, normalmente assistido por advogado, e o trabalhador hipossuficiente desassistido.

Este trabalho trona-se relevante na medida em que a análise dos aspectos de Acesso à Justiça no Brasil pode ajudar na forma de interpretação dos institutos que concedem a justiça gratuita, bem como alertar da necessidade de advogados, públicos ou privados, para o patrocínio de quaisquer demandas, independentemente de valor da causa, visto que estes têm capacidade técnica para condução de uma ação.

Portanto, o objetivo principal deste trabalho é o estudo dos institutos que compõe a estrutura de acesso à justiça pátria, sendo necessário analisar a eficácia material de cada instituto e demonstrar porque estes foram criados.

Para que o trabalho possa atingir seu objetivo maior existem algumas peculiaridades hipotéticas levantadas e que, futuramente com a conclusão desta pesquisa serão respondidas, quais sejam:

1.O acesso à Justiça, por meio da assistência judiciária, tem eficácia material?

2.O modo como as normas de assistência judiciária são aplicadas representam uma afronta à Constituição?

3.As Defensorias Públicas estaduais conseguem cumprir o seu papel Constitucional?

4.Os hipossuficientes conseguem efetivar o seu direito de Acesso à Justiça?

Para tanto, utilizar-se-á o método analítico, por meio do qual inicialmente se analisará a aplicação de normas infraconstitucionais concernentes ao tema, só então, compará-la com a garantia constitucional do acesso à justiça, Ampla Defesa e Contraditório.

Por ser pesquisa teórica, aplicar-se-á a pesquisa bibliográfica, revisando a literatura pertinente, periódicos e teses, em meio eletrônico ou físico.

Este trabalho será estruturado em quatro capítulos. O primeiro levanta as bases constitucionais dos institutos que compõe os mecanismos de acesso à justiça, bem como cita as normas infraconstitucionais que os instituem.

O segundo trará um panorama geral a respeito da Defensoria Pública Estadual e as normas que a estruturam.

O terceiro demonstrará o instituto da justiça gratuita e a forma como ser feito o requerimento, documentos necessários e causas que podem causar a negação.

Por derradeiro, o quarto capítulo trará uma explanação sobre o Jus Postulandi nos Juizados Especiais e Justiça do Trabalho, quando as partes, sem patrocínio de um advogado podem demandar até um certo grau de jurisdição.


ACESSO À JUSTIÇA NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E NO ORDENAMENTO INFRACONSTITUCIONAL.

O presente capítulo visa a analisar a positivação constitucional dos institutos brasileiros de acesso à justiça, quais sejam, Justiça Gratuita, Defensoria Pública, Juizados Especiais e Jus Postulandi.

A Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, inciso LXXIV trata como dever do Estado a prestação da assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

Desta forma, o Estado Brasileiro, incluiu no bojo do Título que trata dos direitos e garantias fundamentais, o direito de acesso à justiça aos hipossuficientes, garantindo, de forma integral, a prestação do acesso à justiça.

Este artigo, analisado em consonância com o princípio da inafastabilidade da jurisdição, positivado constitucionalmente no artigo 5º, inciso XXXV, garante, de forma plena, acesso à justiça a todos que dela necessitarem, visto que são deveres do Estado, ao mesmo tempo, analisar todos os fatos que representem lesão ou ameaça ao direito, através do judiciário, e prestar assistência jurídica integral a todos que não possam arcar com as volumosas custas judiciais.

Igualmente, de forma constitucional, o artigo 98 do Constituição da República Federativa do Brasil contém norma que prevê a criação dos Juizados Especiais, que deverão ser criados pela União, Distrito Federal, Territórios e Estados.

Ocorre que, por se tratar as normas constitucionais acima mencionadas, normas de eficácia contida, há de existir no ordenamento jurídico leis que regulamentem a assistência jurídica integral.

Para fins de diminuir a amplitude do tema, será analisada neste Trabalho de Conclusão de Curso a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, portanto a Lei objeto deste estudo será a Lei Complementar 65 de 2003 do Estado de Minas Gerais, Lei esta que organiza e estrutura a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais.

Quanto aos mecanismos de Justiça Gratuita, serão analisadas as Leis 13.105 de 16 de março de 2015, novo Código de Processo Civil que trouxe em seu bojo normas para concessão da justiça gratuita e a Lei 1060 de 5 de fevereiro de 1950, a que não foi totalmente revogada pelo Novo Código de Processo Civil.

Já no que se refere aos juizados especiais, estes órgãos estão disciplinados pela Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995


DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL

DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL

Dentre os institutos que compõe o sistema de Acesso à Justiça pátrio, um dos mais importantes é a Defensoria Pública Estadual, visto que, por poder propor ações e realizar defesas no âmbito da justiça estadual, engloba a maior parte das possíveis ações.

Sua previsão inicial, na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, é do artigo 5º, inciso LXXIV, que garante aos que comprovarem insuficiência de recurso, assistência jurídica integral, prestada pelo Estado, sendo que tal dever decorre do próprio princípio da Dignidade Humana, como fundamento da República Federativa do Brasil1.

No artigo 134, da mesma Carta Magna, o texto constitucional define a Defensoria Pública como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados.

No mesmo artigo, em seu parágrafo segundo, a Constituição garante às Defensorias Públicas estaduais autonomia funcional e administrativa, bem como iniciativa própria da proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos por Lei.

DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA

A Defensoria Pública, como instituto constitucionalmente criado em função do dever do Estado de prestar assistência jurídica integral, tem em seu funcionamento, uma série de princípios que norteiam o seu funcionamento, quais sejam, Isonomia, Contraditório e Ampla Defesa.

PRINCÍPIO DA ISONOMIA

O princípio da Isonomia, sinônimo de igualdade, tem suas raízes na Revolução Francesa, no artigo 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que dizia “os homens nascem e permanecem iguais em direitos”.

Sua positivação constitucional encontra-se no caput do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, in verbis: “todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se ao brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

A igualdade de todos de invocar o poder judiciário, sem distinção de qualquer natureza trata-se de um direito natural, preexistente à Lei, inerente ao Ser Humano.

Desta feita, necessária se faz a distinção entre igualdade formal e material. Igualdade material é exatamente a busca por critérios que substancialmente alcancem o objetivo de solucionar as diferenças existentes (de sexo, raça, condições econômicas, de cultura, de lugar etc.).2

Portanto, necessária se faz a busca de práticas que passam igualar o acesso de todos ao judiciário, para garantia dos direitos, sendo que o cumprimento do disposto no caput do artigo 5º da Lei Maior caracteriza a igualdade material.

Rui Barbosa, em sua consagrada Oração aos Moços assim demonstra a norma de igualdade material:

A regra de igualdade não consiste senão em quinhões desigualando os desiguais na medida em que se desigualam. Nessa desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira igualdade.3

Nesta medida é que se justificam algumas normas processuais vantajosas inerentes à defensoria pública, como, por exemplo, o prazo em dobro dado às Defensorias Públicas.

PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

O princípio do Contraditório está previsto no inciso LV do artigo 5º da Constituição, sendo que em uma perspectiva tradicional é entendido tão somente como um direito de bilateralidade da audiência, possibilitando às partes a informação e possibilidade de reação.

Ocorre que esta visão ultrapassada não mais pode ser aplicada em um paradigma moderno de processo, visto que o Contraditório deve abranger, além da bilateralidade do processo, a simétrica paridade de armas, sendo, desta forma, percebido como uma garantia de influência e não surpresa.

Já o princípio da Ampla Defesa, igualmente previsto no inciso LV do artigo 5º da Lei Maior, assegura primeiramente uma garantia de defesa técnica ou de um direito fundamental ao advogado, conforme artigo 133 da Constituição, ao assegurar que todo cidadão tem direito a contar com a assistência de sujeitos capazes a demandar junto ao poder judiciário, capacidade esta, não meramente postulatória, mas plena e articular os meios processuais adequadamente, de modo que, posso o assistido obter o melhor resultado possível no processo.4

Portanto, a Defensoria Pública, norteada pelos princípios acima descritos, atua de forma a garantir os meios processuais adequados àqueles que não têm condições econômicas de custear os honorários de um expert em legislação, tendo, devido o caráter advocatício da carreira, a competência necessária para conduzir qualquer processo.

​​DOS PRINCÍPIOS INSTITUCIONAIS

Conforme o artigo 3º da Lei 80 de 1994, os princípios institucionais da Defensoria Pública, chamados assim porque estes regem a atuação da Instituição, são a Unidade, Indivisibilidade e Independência Funcional.5

O primeiro, Princípio da Unidade, também conhecido como Unicidade, traz a tona o fato de a Defensoria Pública corresponder a um todo orgânico, sob uma mesma direção, mesmos fundamentos e mesmas finalidades. Desta forma, os integrantes da carreira de Defensor Público podem substituírem-se uns aos outros, sem, no entanto, importar que aqueles que substituíram estejam vinculados às práticas anteriores, visto que podem realizar procedimentos distintos daqueles efetuados pelo Defensor Público que atuou inicialmente. Importante frisar que este princípio é válido apenas para cada Defensoria Pública separadamente, inexistindo unidade estre as Defensorias Públicas de estados diferentes.6

O segundo, Princípio da Indivisibilidade, também conhecido como Impessoalidade decorre do princípio anterior, visto que a Defensoria, sendo um órgão orgânico, é indivisível.7

O terceiro e último, princípio da independência Funcional significa que a Defensoria é dotada de autonomia diante dos demais órgãos estatais, estando, desta forma, imune a qualquer interferência política que afete a sua atuação.8


DAS GARANTIAS E PRERROGATIVAS INSTITUCIONAIS

DAS GARANTIAS

Dentre as garantias inerentes aos integrantes da carreira da Defensoria Pública, estão incluídas a inamovibilidade, a independência funcional, a irredutibilidade dos vencimentos e a estabilidade.

A inamovibilidade significa que o Defensor Público não pode ser removido do seu órgão de atuação contra a sua vontade. Nem mesmo quando diz respeito à remoção compulsória prevista no artigo 50, §º, III da Lei 80/94, visto que está remoção é inconstitucional, dado o fato da Constituição não prever nenhuma exceção ao dar esta garantia aos Defensores Públicos.

A garantia da independência funcional decorre do princípio de mesmo nome e estabelece a não vinculação da Defensoria Pública a qualquer outro órgão do poder Judiciário, Executivo ou Legislativo.

Outra garantia, cujo nome é auto explicativo, é a da irredutibilidade dos vencimentos, que trás a tona a proibição da diminuição dos salários dos Defensores Públicos. Importante destacar que as reduções tributárias, previdenciárias e as decorrentes de decisão judicial não violam tal garantia.

Por fim, a estabilidade é garantida após três anos de efetivo exercício do cargo, ou seja, após o estágio probatório, os Defensores Públicos só poderão ser demitidos após o devido processo administrativo.

DAS PRERROGATIVAS

Dada a natureza do serviço prestado pelas Defensorias Públicas, há certas prerrogativas definidas pelos artigos 44 e 128 da Lei Complementar 80/94, sendo elas a Contagem em dobro de todos os prazos processuais, sendo que a base principiológica desta prerrogativa está na leitura material do princípio da igualdade, tratando desiguais com desigualdade.9

Outra importante prerrogativa é a intimação pessoal, que garante à Defensoria Pública a capacidade de exercer de forma mais eficiente a função prevista no artigo 134 da Constituição Federal.

Por último, os Defensores Públicos, para prestar a assistência jurídica, não necessita de mandato, como os advogados particulares. Isto pelo fato de que a natureza jurídica da representação do assistido decorre da Lei e da investidura do agente no cargo, e não da outorga de mandato.


DIREITOS, ATRIBUIÇÕES, DEVERES, IMPEDIMENTOS, INCOMPATIBILIDADES E SUSPEIÇÕES.

DOS DIREITOS

Os Defensores têm direitos às férias, conforme artigo 40 da Lei complementar 80/94, por 60 dias, sendo que durante este período é considerado em efetivo exercício.

A Defensoria Pública é organizada em cargos de carreira, sendo que são providos na classe inicial, mediante concurso de provas e títulos e promovidos segundo critérios de antiguidade e merecimento.

Importante destacar que os defensores públicos não tem a obrigação de propor todas as ações que a parte que lhe procura entende ter direito.

DAS ATRIBUIÇÕES

As funções institucionais da Defensoria Pública estão previstas no artigo 4º da Lei Complementar 80/94, sendo que estas se dividem em típicas e atípicas. As primeiras relacionam-se com a própria prestação de assistência judiciária integral e gratuita aos hipossuficientes e segunda é aquela que não possui relação com a condição do assistido, como o caso de curadoria especial, curadoria ao vínculo, proteção do idoso, fiscalização das delegacias e defesa em ação penal.

Na esfera penal, a atuação da Defensoria Pública está relacionada a assegurar a ampla defesa e o contraditório, salientando-se que nos casos em que o patrono particular renunciou ao mandato, deve-se, antes da nomeação de um defensor público, realizar a intimação do acusado para constituir novo advogado, visto que a possibilidade de escolha do patrono é decorrência do princípio da ampla defesa.10

DOS DEVERES

Os deveres estão previstos nos artigos 45 e 129 da Lei Complementar 80/94 e são eles: I) residir na localidade onde exercem suas funções; II)desempenhar, com zelo e presteza, os serviços a seu cargo; III) representar ao Defensor Público-Geral sobre as irregularidades de que tiver ciência, em razão do cargo; IV) prestar informações aos órgãos de administração superior da Defensoria Pública, quando solicitadas; V) atender ao expediente forense e participar dos atos judiciais, quando for obrigatória sua presença; VI) declarar-se suspeito ou impedido, nos termos da Lei; VII) interpor os recursos cabíveis para qualquer instância ou Tribunal e promover a revisão criminal, sempre que encontra fundamentos na lei, jurisprudência ou prova dos autos, remetendo cópia à Corregedoria-Geral.

Dentre os deveres supracitados, destaca-se o dever do Defensor Público de residir na localidade onde exerce suas funções, sendo que este dever não se aplica em casos de substituição.

DAS PROIBIÇÕES

As proibições relativas à atuação do Defensor Público estão prevista nos artigos 46 e 130 da Lei Complementar 80/94 e são elas: I) exercer a advocacia fora das atribuições institucionais; II) requere, advogar, ou praticar em Juízo ou fora dele, atos que de qualquer forma colidam com as funções inerentes ao seu cargo, ou com os preceitos éticos de sua profissão; III) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais, em razão de suas atribuições; IV) exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, exceto como cotista ou acionista; V) exercer atividade politicopartidária, enquanto atuar junto à justiça eleitoral.

A principal proibição relacionada à atuação dos Defensores Públicos é a proibição do exercício da advocacia privada cumulativamente à advocacia pública.

Há uma discussão relacionada ao direito adquirido daqueles Defensores que já estavam na carreira antes da Lei Complementar 80/94, visto que antes desta não havia qualquer impedimento.

Para Silvio Roberto Melo de Moraes, tal vedação é absoluta porque decorre da necessidade de dedicação exclusiva ao múnus público.11

Independentemente desta ressalva, aqueles que adentraram a carreira após a entrada em vigor da aludida Lei Complementar, não tem nenhum argumento para opor esta proibição.

DOS IMPEDIMENTOS

A Lei Complementar da Defensoria Pública prevê os impedimentos nos artigos 47 e 131 e são eles: I) Exercer sua funções em processo ou procedimento em que seja parte ou, de qualquer forma, interessado; II) Exercer sua funções em processo ou procedimento em que haja atuado como representante da parte, perito, Juiz, membro do Ministério Público, Autoridade Policial, Escrivão de Polícia, Auxiliar de Justiça ou prestado depoimento como testemunha; III) Exercer sua funções em processo ou procedimento em que for interessado cônjuge ou companheiro, parente consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral, até o terceiro grau; IV) Exercer sua funções em processo ou procedimento no qual haja postulado como advogado de qualquer das pessoas mencionadas no inciso anterior; V) Exercer sua funções em processo ou procedimento em que qualquer das pessoas mencionadas no inciso III funcione ou haja funcionado com Magistrado, membro do Ministério Público, Autoridade Policial, Escrivão de Polícia ou Auxiliar de Justiça; VI) Exercer sua funções em processo ou procedimento em que houver dado a parte contrária parecer verbal ou escrito sobre o objeto da demanda.

Igualmente impedidos, estão os membros da Defensoria Pública a participar de comissão, banca de concurso, ou de qualquer decisão, quando o julgamento ou votação disser respeito a seu cônjuge ou companheiro, ou a parente consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral, até o terceiro grau.

Aplicam-se, também, por analogia, as causas de impedimento e suspeição previstas no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal.12

DA RESPONSABILIDADE FUNCIONAL E DAS SANÇÕES DISCIPLINARES

A atividade dos membros da Defensoria Pública dos Estados está, conforme artigo 133 da Lei Complementar da Defensoria, sujeita à: I) correição ordinária, realizada anualmente pelo Corregedor-Geral e por seus auxiliares, para verificar a regularidade e eficiência dos serviços e; II) correição extraordinária, realizada pelo Corregedor-Geral e por seus auxiliares para verificar a regularidade e eficiência dos serviços.

Diferentemente dos demais servidores, os Defensores Públicos não se submetem ao procedimento administrativo disciplinar comum, possuindo regime jurídico próprio.

A violação dos deveres funcionais e vedações previstas em Lei acarreta uma das sanções disciplinares prevista no §1º do artigo 50 da Lei Complementar 80/94, quais sejam: I) advertência; II) suspensão por até noventa dias; III) remoção compulsória; IV) demissão; V) cassação da aposentadoria. A sanção aplicada é determinada conforme a gravidade da violação de acordo com os parágrafos 2º ao 7º do artigo supracitado.

Quanto à remoção compulsória, prevista no mesmo artigo, esta é considerada inconstitucional, visto que o Constituinte, ao conceder a inamovibilidade como garantia dos Defensores Públicos, não previu qualquer exceção para tal.

No caso da cassação da aposentadoria, a Lei em questão, não deixa claro qual a hipótese de aplicação. Desta forma, alguns doutrinadores entendem por bem aplicar, por analogia, o procedimento da Lei 8.112, que prevê a cassação da aposentadoria por falta praticada quando o servidor estava em atividade. Ocorre que, visto que a analogia estaria sendo utilizada para prejudicar o indiciado em Procedimento Administrativo Disciplinar, o que é vedado pelas normas de Direito Penal, esta sanção não pode ser aplicada.

DA CURADORIA ESPECIAL

A Curadoria Especial trata-se de função atípica da Defensoria Pública e está prevista no artigo 4º, inciso VI da Lei Complementar da Defensoria Pública. Decorre, principalmente, da necessidade de efetivar-se o contraditório nos processos em que o réu é citado por edital, visto que, por muitas vezes não tem acesso aos editais e não por isso não contrata um advogado para promover sua defesa.

O direito de um curador é o mesmo de um advogado comum, podendo pedir requerer tudo o que requereria se advogado do processo fosse. Em razão do curador exercer um MUNUS PÚBLICO, não fica, assim, preso à matérias de direito, podendo inclusive, pedir perícia e arrolar testemunhas.

Apesar de não conhecer os fatos narrados na inicial, isso não impede o curador de contestá-los, visto que a própria inicial traz os fatos que devem ser contestados.

A intervenção do curador especial elide os efeitos da revelia, impedindo o julgamento antecipado da lide, havendo possibilidade de julgamento antecipado unicamente quando a matéria for exclusivamente de direito.

Com relação à nomeação de curador especial ao réu preso pelo fato de que sua liberdade cerceada prejudica o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, inclusive pela dificuldade de contato com seu advogado, ela prevalece, independentemente da outorga de mandato a advogado.

Ao Defensor Público nomeado como curador especial são asseguradas todas as prerrogativas inerentes à função, inclusive aquela relativa ao prazo em dobro e à intimação pessoal.


ESTRUTURA DA DEFENSORIA PÚBLICA E OUTROS ASPECTOS GERAIS

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA SUPLETIVA

Nos casos em que não houver núcleo da Defensoria Pública na comarca onde a demanda deverá ser proposta, o Juiz deve oficiar a Ordem dos Advogados do Brasil para que indique um advogado para o patrocínio da causa.13

ORGANIZAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA

Os órgãos da Defensoria Pública são divididos em três grupos, quais sejam, Órgãos de administração superior, que desenvolvem as atividades-meio da instituição, dentre eles: Defensoria Pública Geral, Subdefensoria Pública Geral, Conselho Superior da Defensoria Pública; Órgãos de atuação, que desenvolvem as atividades-fim da instituição, representados pelos Núcleos da Defensoria Pública e; Órgãos de execução, que são os próprios defensores públicos em si, agentes políticos que executam as funções institucionais. 14


3 A GRATUIDADE DE JUSTIÇA

O instituto da gratuidade de justiça, assim como a assistência judiciária, analisada no capítulo anterior, devem ser encarados como espécies do gênero assistência jurídica. A justiça gratuita no entanto, seria a isenção das custas e despesas judiciais e extrajudiciais relativas aos atos processuais. Assim, pode-se dizer que ela englobaria todas as custas processuais, bem como, as despesas provenientes do processo15.

Neste sentido, Rogério Nunes de Oliveira define a gratuidade de justiça a seguinte forma:

[...] justiça gratuita seria a isenção total, parcial ou diferida, do pagamento das despesas necessárias à realização de um direito subjetivo ou de uma faculdade jurídica, tanto no plano judicial quanto no extrajudicial, conferida a pessoa carente de recursos econômico-financeiros16.

Para Ana Carla Ferreira Bueno de Moraes, citando Augusto Tavares Rosa Marcacini, a justiça gratuita seria a “a gratuidade de todas as custas e despesas, judiciais ou não, relativas a atos necessários ao desenvolvimento do processo e à defesa dos direitos do beneficiário17”.

Vale destacar que, conforme se pode extrair da definição transcrita acima, a justiça gratuita é ampla, vez que a isenção de gastos referir-se-á não só aos atos judiciais provenientes de um processo em que o beneficiário tenha sido parte, mas também, a atos extrajudiciais que tenham relação a esta ação judicial18. Assim, como forma de exemplificar, pode-se citar uma ação de usucapião que reconhece o direito de propriedade a um cidadão que lhe teve concedida a gratuidade de justiça. Neste caso, o mandado de averbação que será encaminhado ao competente Cartório de Registro de Imóveis para que proceda o devido registro do novo proprietário, deverá expressamente constar que o mesmo possuía os benefícios da justiça gratuita, que fará com que esta averbação seja isenta de taxas.

Outrossim, a gratuidade de justiça é matéria de ordem processual. Desta forma, sua concessão dependerá da prova da deficiência econômica do peticionário.

Cumpre destacar que a gratuidade de justiça só poderá ser concedida com a comprovação de que requisitante realmente não possui condições financeiras para suportar os custos que o processo lhe trará. Sendo assim, por força do art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal, tal comprovação deverá ser realizada perante o Juiz da causa19.

Entretanto, a grande a maioria da doutrina pátria, defende que o referido dispositivo constitucional precisa ser interpretado de acordo com o art. 4º da Lei 1.060 de 1950. Senão vejamos: “A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo...”

Neste cenário, basta que o interessado ofereça uma declaração sobre sua hipossuficiência que fará jus ao benefício.

Outro ponto interessante a ser analisado aqui é que a Lei nº 1.060 de 1950 usa o termo “benefício da justiça gratuita”, expressão essa que foi também utilizada pelo Código de Processo Civil de 1939, que foi revogado pelo diploma processual de 1973. No Código de 1939 havia o capítulo específico chamado “Do benefício da justiça gratuita”. Daí, do uso da expressão benefício é salutar a análise das palavras de Cleber Francisco Alves20:

Essa terminologia não é a que melhor se ajusta à realidade. Com efeito, parece inequívoco que é dever-função do Estado, inerente à sua própria existência, a garantia da paz social, evitando-se que impere na vida em sociedade a “lei do mais forte” que seria fonte de ignominiosa injustiça e resultaria em total decadência dos padrões civilizatórios que são aspiração comum da natureza humana. Esse dever-função costuma ser denominado de “função protetiva do Estado”. Por isso, tratando-se de dever estatal, seu adimplemento não se configura um mero “benefício”, mas um verdadeiro “direito subjetivo público” de que é titular o cidadão. (grifo nosso).

Desta forma, segundo as palavras do jurista, a gratuidade de justiça não seria de fato um benefício, mas sim um “direito subjetivo público” do qual faz jus todo e qualquer cidadão.

3.1 Gratuidade de justiça x assistência judiciária gratuita

Para melhor explicar a diferença entre esses dois institutos jurídicos, destaca-se as palavras de Pontes de Miranda:

Assistência judiciária e benefício da assistência gratuita não são a mesma coisa. O benefício da justiça gratuita é o direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que promete a prestação jurisdicional.

É instituto de direito pré-processual. A assistência judiciária é a organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. É um instituto de direito administrativo21.

Na mesma linha de raciocínio, José Cretella Junior, ratificando a natureza administrativa do instituto da assistência jurídica gratuita, preceitua:

Instituto de direito pré-processual, a assistência judiciária é a organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. O instituto é mais do direito administrativo do que do direito judiciário civil, ou penal22.

Percebe-se que ambos os juristas valem-se da terminologia “assistência judiciária”. Tal fato se dá em razão de que até a vigência da atual Carta Magna, apenas se falava em assistência judiciária, que tão-somente englobava a prestação de um procurador habilitado nas ações judiciais em que esse se fizesse necessário.

Nesta celeuma José Carlos Barbosa Moreira, ressalta a alteração efetivada pela Constituição da República de 1988:

A mudança do adjetivo qualificador da “assistência”, reforçada pelo acréscimo “integral”, importa notável aplicação do universo que se quer cobrir. Os necessitados fazem jus agora à dispensa de pagamentos e à prestação de serviços não apenas na esfera judicial, mas em todo o campo dos atos jurídicos. Incluem-se também na franquia: a instauração e movimentação de processos administrativos, perante quaisquer órgãos públicos, em todos os níveis; os atos notariais e quaisquer outros de natureza jurídica, praticados extrajudicialmente; a prestação de serviços de consultoria, ou seja, de informação e aconselhamento em assuntos jurídicos.

[...] O assunto decerto merece, primeiro a nossa atenção; em seguida, a nossa reflexão; depois – “last but not least” o nosso esforço para fazer transbordar do papel para a vida a bela promessa constitucional23.

Cumpre destacar também, no tocante à diferença entre os institutos, que os entes que possuem a competência para concedê-los também são diversos.

A gratuidade de justiça será deferida pelo juiz da causa, dependendo da demonstração pelo interessado da sua hipossuficiência. Já a assistência jurídica gratuita será concedida pela Defensoria Pública àquele que demonstrar sua carência econômica para a contratação de um procurador habilitado24.

Por fim, mister mencionar, que ainda que seja uma minoria na doutrina, há ainda autores que defendem ser a assistência jurídica e a gratuidade da justiça sinônimos.

Vejamos também o seguinte julgado emanado em nosso Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

Ementa: 1. Locação. Despejo por falta de pagamento. Beneficiário da justiça gratuita. Purgação da mora. Prazo em dobro. Lei 1.060/50, art. 5., parag. 5. 2. Isenção de custas. Cabimento. 1. A parte amparada pela assistência judiciária tem direito ao prazo em dobro para os atos processuais, inclusive para purga da mora. 2. Estando a parte ao abrigo da assistência judiciária, as despesas processuais e honorários advocatícios não se incluem no montante a ser atendido para purgação da mora, ressalvando-se a sua exigência em havendo futura modificação patrimonial. 3. Recurso conhecido e provido” (STJ, 5ª T., REsp 129465/SP, rel. Min. Edson Vidigal, j. 3.2.1998, DJ 25.2.1998, p. 100, v.u.)

Percebamos como o acórdão passa a impressão que ambos institutos são sinônimos. No entanto, não é esse o entendimento da maioria da doutrina.

Por fim, vale a menção que ainda há quem sustente, que a assistência jurídica é gênero de que são espécies a orientação jurídica, a assistência judiciária e a gratuidade de justiça25.

3.2 O momento processual adequado e como requerer

Cumpre destacar que em nosso Novo Diploma Processual, já vigente desde 2016, o art. 99, diante de alguma discussão a respeito do tema, se preocupou em colocar panos quentes nessa questão, vez que o dispositivo se cuidou em definir o momento em que o interessado deva requerer o benefício da justiça gratuita, senão vejamos: “Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso”.

Assim, fica evidente que o interessado pode realizar tanto no pedido na exordial como na defesa. Além disso, também há a possibilidade de se requerer na petição para ingresso de terceiro no processo e até mesmo só em fase recursal.

Mas atentamos para o §1º: “Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso”.

Assim, não há preclusão temporal para o pedido seja feito pela parte interessada. No entanto, o processo seguirá normalmente se essa solicitação for já em seu curso.

Seguindo agora para o §2º do referido dispositivo.

§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

Desta forma, o novo diploma estabelece que o magistrado deverá deferir o pedido, só agindo de forma diferente se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para que o benefício seja concedido.

Nas palavras de Nehemias Domingos de Melo publicadas no artigo científico denominado, “Da gratuidade da justiça no Novo CPC e o papel do judiciário”.

Mesmo havendo elementos que possam indicar certa capacidade financeira do requerente, ainda assim, o magistrado não poderá pura e simplesmente indeferir o pedido. Deverá antes determinar que o requerente comprove nos autos o preenchimento dos requisitos exigidos, para só depois disso se manifestar. Quer dizer, o juiz não poderá negar o benefício ao seu livre arbítrio26.

No § 3º porsebe-se que a lei dará presunção juris tantum de veracidade às declarações de pobreza realizadas pessoas físicas ou naturais. Senão vejamos: “Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural”.

Neste sentido, destaca-se, mais uma vez, as palavras de Nehemias Domingos de Melo:

[...] basta o indivíduo declarar que carece de recursos para enfrentar a demanda judicial que essa alegação será suficiente para a concessão do benefício, tendo em vista que sua declaração goza de presunção de veracidade (NCPC, art. 99, § 3° c/c art. 374, IV). Isso não impede que a parte contrária possa fazer a prova no sentido oposto, isto é, oferecendo impugnação instruída com os elementos hábeis ao convencimento do juiz da causa. Oferecida a impugnação, caberá ao juiz analisar e decidir27.

A contrário senso, há que se dizer que, no tocante às pessoas jurídicas e aos entes despersonalizados, a princípio, e sob pena de indeferimento, estes deverão fazer prova da incapacidade financeira para arcar com as custas do processo.

3.3 A contratação de patrono particular e o benefício da gratuidade de justiça

Não é motivo para a negativa da concessão do benefício a contratação de advogado particular. No entanto, mesmo diante dessa situação, é importante salientarmos a previsão que o Novo Código de Processo Civil trouxe em seu art. 99, §4º, in verbis:“A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça”.

Assim, mesmo que a parte esteja patrocinada por causídico contratado por ela, não haverá quando impedimento ou motivo para que o benefício seja indeferido.

Nesta celeuma opina Nehemias Domingos de Melo:

Só quem milita nos fóruns da vida para saber avaliar a importância dessa previsão. Acredito que muitos magistrados vão ficar frustrados com isso, tendo em vista que não mais poderão utilizar esse falso argumento para dizer que a parte tem condições de arcar com os custos do processo, pois se assim não fosse, estaria assistido pela Defensoria Pública28.

Como forma de exemplificar tal hipótese, trazemos à tona fragmento de voto proferido pelo Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Sr. Palma Bisson, quando de decisão de Agravo de Instrumento interposto contra decisão monocrática que negou a concessão a rogativa de gratuidade de justiça.

Em síntese: o agravante, que residia em COHAB em bairro de classe média baixa da cidade de Marília (SP), era menor, filho de um marceneiro que falecera em um atropelamento. O mesmo, representado pela genitora, ajuizou a demanda patrocinado por advogado particular, onde requeria pensão mensal e vitalícia de um salário mínimo e indenização por dano moral. O juiz monocrático negou o pedido de justiça gratuita sob o fundamento de que o peticionário não comprovou a hipossuficiência, além de ter contratado advogado.

Assim, por meio de fragmento extraído do voto do Ilustre Desembargador temos:

[...] faz jus aos benefícios da gratuidade de Justiça menino filho de marceneiro morto depois de atropelado na volta a pé do trabalho e que habitava castelo só de nome na periferia, sinais de evidente pobreza reforçado pelo fato de estar pedindo aquele pensão de comer, de apenas um salário mínimo, assim demonstrando, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, que o que nela tem de sobra é a fome não saciada dos pobres - a circunstância de estar a parte pobre contando com defensor particular, longe de constituir um sinal de riqueza capaz de abalar os de evidente pobreza, antes revela um gesto de pureza do causídico; ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo? Quiçá no livro grosso dos preconceitos [...]29.

No tocante a esse cenário, há ainda que se dizer que, nas hipóteses em que o advogado particular da parte vencedora da demanda, que seja beneficiária da gratuidade de justiça, não estiver satisfeito com o valor arbitrado a título de honorários advocatícios pelo juiz da causa, poderá ele, interpor recurso somente com o intuito de ver majorado este valor. No entanto, neste caso, o patrono deverá solicitar a gratuidade de justiça em seu favor. Tal pedido deverá ser devidamente comprovado nos autos. Em caso de negado o pedido, o recorrente deverá arcar com o devido preparo.

Cumpre destacar que, nos casos em que o pedido for feito em recurso, não há necessidade de que o preparo seja recolhido de plano. O que poderá acontecer é que, em caso de indeferimento do pedido, o relator fixe prazo para que o preparo seja efetivado pela parte.

Outra nuance a ser considera no aspecto da gratuidade de justiça, é que este é um direito personalíssimo. Sendo assim, por via de consequência o benefício não será estendido a um sucessor ou mesmo um litisconsorte que esteja demandando conjuntamente ao beneficiário. Deverão os mesmos também fazer jus à justiça gratuita desde que requisitem e comprovem as condições legais.

3.4 Possibilidade de impugnação pela parte contrária

Todas as vezes que o benefício da gratuidade de justiça for concedido a uma das partes do processo, poderá a parte contrária, em respeito ao contraditório processual, impugnar a decisão.

Tal possibilidade deverá ser concretizada como preliminar na peça contestatória, mas também há a permissibilidade de ser levantada na réplica, como também em sede de contrarrazões de algum recurso.

Neste sentido ainda Nehemias Domingos de Melo ressalta a disciplina da segunda parte do caput do art. 100 do NCPC disciplina: “[...] nos casos de pedido for superveniente ou formulado por terceiro, deverá ser impugnado por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso”30.

Vale ainda lembrar que pela análise do parágrafo único do art. 100, do novo Diploma Processual Civil, percebemos que na hipótese de o benefício ser revogado, a parte deverá arcar com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, se agiu de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa.

3.5 Recurso contra decisão que revoga ou indefere a gratuidade de justiça

Diz a inteligência do caput art. 101 do Novo Código de Processo Civil: “Contra a decisão que indeferir a gratuidade ou a que acolher pedido de sua revogação caberá agravo de instrumento, exceto quando a questão for resolvida na sentença, contra a qual caberá apelação”.

O § 1º ainda salienta que na hipótese de interposição do eventual recurso, “o recorrente estará dispensado do recolhimento de custas até decisão do relator sobre a questão, preliminarmente ao julgamento do recurso”.

Continua o § 2º determinando que caso seja confirmada a denegação ou a revogação da gratuidade, deverá o relator ou o órgão colegiado determinar ao agravante o recolhimento das custas processuais, assinalando ainda, prazo de 5 (cinco) dias para que o faça, sob pena de não conhecimento do recurso.

Por derradeiro, no caput do art. 102, o legislador do nosso Novo Diploma Processual, ao finalizar o tópico concernente ao benefício da justiça gratuita, à gratuidade de justiça, fez registrar que com o trânsito em julgado da decisão que revoga ou denega o benefício, a parte deverá efetuar o recolhimento de todas as despesas de cujo adiantamento foi dispensado, inclusive as relativas ao recurso interposto, se houver, no prazo fixado pelo juiz, sem prejuízo de aplicação das sanções previstas em lei.

Por fim, o parágrafo único deste último dispositivo ressalta que se a parte não efetuar o recolhimento no prazo assinalado, o processo será extinto sem resolução de mérito, tratando-se do autor. Nos demais casos, não poderá ser deferida a realização de nenhum ato ou diligência requerida pela parte enquanto não efetuado o depósito.

3.6 Debate acerca da comprovação da hipossuficiência:

O fato de que a declaração pessoal de hipossuficiência já ser meio hábil para a concessão do benefício da justiça gratuita, por ato contínuo, fez com que alguns excessos fossem cometidos. Vejamos as palavras Paulo Maximilian Schonblum31.

[...] se por um lado, a Lei 1.060/50 havia realizado um verdadeiro avanço no plano social do Estado Democrático de Direito, tornando efetivo o acesso à Justiça para os mais necessitados, por outro, a concessão da gratuidade de forma imoderada também fez surgir uma verdadeira “caçada às indenizações” pois, sem custos e sem riscos, brasileiros de pouco caráter e ambição desmedida passaram a aventurar-se ajuizando Ações contra tudo e todos (sempre se valendo da propalada gratuidade) na busca de um punhado de dinheiro a troco de nada.

Nesta esteira, a impugnação à gratuidade que não era rotina, passou a ser corriqueira, e foi aí que entendimentos divergentes acerca da comprovabilidade da hipossuficiência surgiram. Alguns juízes aceitavam a simples declaração como meio apto, outros, enxergavam a hipótese de se instaurar uma averiguação para verificar se a parte requisitante teria direito a gratuidade de justiça.

Entretanto, após uma discussão em nossos tribunais, solidificou-se o juízo, de que a afirmação de que faz menção o artigo 4º da Lei 1.060/50 institui presunção iuris tantum, sendo assim, admite provas em contrário.

Neste cenário, o TJRJ editou o Enunciado 39, que causou grande discussão pelos operadores do Direito. Prenunciava o dispositivo:

É facultado ao Juiz exigir que a parte comprove a insuficiência de recursos, para obter concessão do benefício da gratuidade de justiça (art. 5º, inciso LXXIV, da CF), visto que a afirmação de pobreza goza apenas de presunção relativa de veracidade.

Daí, mesmo que que se tenha admitido a possibilidade de – após a declaração de hipossuficiência – se comprovar a desnecessidade de utilização da prerrogativa, nunca houve consenso quanto à melhor forma para se aferir a real situação do interessado no benefício.

Ficou comum, sobretudo no contexto dos juízos fluminenses, a determinação judicial para que o interessado comprovasse sua situação econômica através da última declaração do Imposto de Renda. Mas alguns juízes mais rigorosos determinavam ordenam a juntada aos autos de outras provas, como extratos de conta corrente, faturas de cartões de crédito etc.

No entender de Paulo Maximilian Schonblum tal medida é a mais prudente. Em seu artigo, “A gratuidade de justiça que transforma o Poder Judiciário em “Porta da Esperança”, ele discorre:

Entende-se que, para evitar controvérsias, a comprovação da necessidade deve ser a mais ampla possível, reduzindo-se, com isso, a utilização do benefício a aqueles que efetivamente necessitem, pois, como parece não ser observado por alguns, não se trata de possibilitar à parte alguma economia para manutenção de padrão de vida e sim de garantir o acesso à Justiça dos que realmente não possuem meios para tanto.32

Desta forma, o autor enxerga que há um grande descomedimento dos pedidos e concessões do benefício da justiça gratuita. Litigantes que visivelmente não fazem jus à gratuidade à requisitam e, somente pela declaração que acostam, a tem concedido. Casos que o próprio objeto da demanda já seria uma prova da situação financeira do requerente, como por exemplo, um morador de apartamento de grande valor venal, que discutem nulidades de cláusulas em seu contrato de financiamento imobiliário.

No entanto, dito essas nuanças, que embora sejam verídicas, é preciso dizer que o entendimento majoritário é o de que a simples declaração de hipossuficiência seja capaz de fazer com o benefício seja concedido à parte solicitante. No entanto, como já explicitado, tal circunstância pode ser combatida pela parte contrária, que deverá demonstrar a situação econômica favorável a quem foi dado o benefício da gratuidade de justiça.


4 OS JUIZADOS ESPECIAIS E O JUS POSTULANDI

Os Juizados Especiais, assim como os institutos anteriormente analisados, compõe o sistema pátrio de Acesso à Justiça, consistindo em tribunais especiais cujo objetivo é diminuir a burocracia, tornando a solução de determinadas demandas, mais simples por assim dizer, mais céleres, cumprindo, em um aspecto formal, o Princípio de Acesso à Justiça.

Estes Juizados foram criados pela Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995, no contexto de dar uma resposta à população que tem demandas, porém não desejam ingressar no sistema de justiça comum, visto que desejam procedimentos rápidos, informais, baratos e efetivos.

Um dos meios inseridos pelo legislador para atingir tal objetivo, foi a inserção da propositura de ações sem a necessária assistência de um advogado, assim como já ocorria na Justiça do Trabalho.

Desta forma, neste capítulo, analisaremos o sistema de os princípios que norteiam a Lei 9099/95, qual seja, a que regulamenta os juizados especiais, bem como a eficácia destes Juizados para concretização do necessário Acesso à Justiça aos cidadãos.

Far-se-á necessária também a análise do Jus Postulandi, tanto na Justiça do Trabalho quanto nos Juizados especiais, e de que forma, este princípio contribui ou não para o Acesso à Justiça.

4.1 OS PRINCÍPIOS NORTEADORES DOS JUIZADOS ESPECIAIS

O artigo 2º da Lei 9.099/95, traz em seu bojo, os princípios gerais sobre os quais deverá repousar o procedimento dos Juizados Especiais. Assim determina o dispositivo: O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”

Importante destacar que o legislador, ao utilizar o termo critério, o legislador não teve a intenção de tirar a natureza principiológica do artigo, como demonstra Ricardo Cunha Chimendi.

O art. 2 da lei nº 9.099 explicita princípios que norteiam o Sistema dos Juizados Especiais Cíveis, os quais convergem na viabilização do amplo acesso ao Judiciário e na busca da conciliação entre as partes sem violação das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa33.

Apesar de estarem positivados no artigo segundo da Lei em análise, é importante destacar que estes princípios não se sobrepõe aos princípios Constitucionais do Processo, decorrentes do Devido Processo Legal, como a ampla defesa, a simétrica paridade de armas e o contraditório, devendo, em caso de colisão, serem preferidos os princípios constitucionais, que não regem apenas os processosespeciais, mas todos os procedimentos judiciais e administrativos.

4.1.1 PRINCÍPIO DA ORALIDADE

Com a publicação da Lei dos Juizados Especiais, e 1995, o princípio da oralidade, já positivado constitucionalmente, ganhou força, principalmente por ter sido apresentado com norteador geral dos processos inseridos no contexto desta Lei.

Como decorrência direta do princípio da oralidade no processo especial, podemos destacar o princípio da imediatidade, que preceitua que a colheita de provas seja feita de forma direta em contato com as partes, o da irrecorribilidade das decisões interlocutórias que facilita diretamente o bom andamento processual, o da identidade física do juiz, que preconiza que o juiz que precedeu a colheita de provas seja o mesmo a prolatar a sentença, participando, pessoalmente, de todos os atos do processo.

Desta forma demonstra Paulo Lúcio Nogueira: “Nos Juizados Especiais esse princípio deve ter uma aplicação mais efetiva. Instalada a audiência, deve ser a causa solucionada sem adiamento, pois assim poderá haver realmente a tão desejada Justiça Célere”34

Portanto, nota-se que o legislador, ao inserir este princípio como norteador dos Processos Especiais, preferiu a forma falada, com os atos realizados, se possível, em audiência. Entretanto, a documentação dos atos é imprescindível, não havendo exclusão da forma escrita, e sim, preferência pela forma oral.

O artigo 36 da Lei 9099/95 diz o seguinte: “A prova oral não será reduzida a escrito, devendo a sentença referir, no essencial, os informes trazidos nos depoimentos”, porém esta norma deve ser relativizada, vista a importância da documentação e dado o fato de nem sempre ser possível coletar todas as provas e sentenciar na mesma oportunidade temporal.

Em conclusão, o magistrado deve preferir a oralidade à forma escrita, porém, não pode, dado as próprias características dos processos, negar a atermação dos depoimentos e demais provas concernentes ao processo.

4.1.2 PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE E DA INFORMALIDADE

Estes princípios trazem a tona uma das principais características da Justiça Especial, características estas materializadas pelos fatos dos Juizados Especiais serem desburocratizados, priorizando apenas os atos essenciais ao processo e descartando os demais.

José Roberto Parizatto, em seu Manual de Prática do Juizado Especial, doutrina o seguinte:

A informalidade não pode consistir em ausência, mais sim em liberdade de forma. Isso significa que o ato processual poderá se realizar por qualquer modo plausível, desde que a forma escolhida se mostre apta para atingir a finalidade colimada à sua prática35.

Nota-se que a inserção destes princípios em um mesmo contexto é perfeitamente justificável pois, apesar de não serem sinônimos, o sentido de ambos é complementar. Como demonstração da presença destes princípios no ordenamento do Juizado Especial temos: O pedido deverá ser formulado de maneira simples e em linguagem acessível (artigo 14, § 1º), as testemunhas comparecerão sem necessidade de intimação (artigo 34), entre outros.

Importante destacar que há um mínimo de formalidade exigido para que os atos sejam realizados, homenageando a própria segurança jurídica.

4.1.3 PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL E DA CELERIDADE

O princípio da economia processual consiste na ampliação dos resultados com o mínimo possível de atividade processual. Cita-se como exemplo da aplicação deste princípio a realização de toda instrução e julgamento na mesma audiência.

No Juizado Especial, o precedimento adotado reduz o número de atos e providências necessários sendo que o juiz da causa poderá excluir atos, provas ou testemunhas se considerá-los meramente protelatórios36.

A celeridade processual é uma consequência natural de todos os princípios explicitados anteriormente, visto que, o processo, para ser mais célere, deve ter seus atos aproveitados ao máximo, para que não haja necessidade de repeti-los. Da mesma forma, simplificar e desburocratizar o processo, pode ter como resultado a maior agilidade na satisfação da demanda, bem como a oralização dos procedimentos torna, devido à imediatidade do método, o procedimento mais rápido.

Neste sentido explica, Felippe Borring Rocha: “A celeridade, por seu turno, mira a esfera procedimental, estabelecendo que os atos processuais devam produzir os seus resultados no menor espaço de tempo possível.”37

4.2 PECULIARIDADES DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E JUS POSTULANDI

Segundo o jurista Felipe Borring Rocha, o Juizado Especial Cível pode ser conceituado da seguinte forma:

[...] conjunto ou sistema de órgãos judiciais, de matriz constitucional, estruturados para promover a conciliação de diferentes causas, e também a conciliação, o processo, o julgamento, o reexame e a execução das causas cíveis de menor complexidade e de pequeno valor, através de regras e procedimentos especiais previstos na lei 9.099/95.38

O critério quantitativoutilizado pela Lei 9099/95 para determinar as causas de menor complexidade, que serão objeto de processamento e julgamento dos Juizados Especiais, é, basicamente, o valor, que deve ser de, no máximo 40 (quarenta) vezes o salário-mínimo, conforme dispõe o inciso primeiro do artigo terceiro da Lei em análise.

Quanto ao critério qualitativo, óbvio seria se as causas cuja complexidade técnica fosse muito elevada fossem propostas na Justiça Comum, o que nem sempre ocorre, visto que há a possibilidade de causas, cujo valor seja até 20 (vinte) vezes o salário-mínimo sejam propostas diretamente no balcão do juizado, sem a presença de um advogado, pela própria parte, que normalmente, não tem conhecimento técnico algum para analisar a complexidade processual de uma causa.

Esta possibilidade, de apreciação da causa está prevista no artigo 9º da Lei em análise e compreende o instituto do Jus Postulandi, que compõe uma das críticas centrais do presente trabalho.

O advogado é indispensável à administração da justiça, como diz o artigo o artigo 133 da Constituição da República Federativa do Brasil, e indispensável porque é o único profissional capaz de analisar os diplomas legais de forma técnica, impedindo que seu cliente seja lesado por falta de conhecimento dos caminhos processuais que deve seguir.

Normalmente, uma pessoa comum, desabituada da práxis jurídica, não tem a menor noção de nada do que ocorre no processo. Ao chegar aos fóruns, não sabem sequer onde devem sentar, muito menos quais decisões tomar em relação ao processo.

O Procedimento adotado é o da atermação, que consiste no recebimento, por um serventuário, do pedido de solução de problema daquela pessoa que necessita que sua demanda seja pacificada. Após a redução a termo deste pedido, é marcada, de início, uma audiência de conciliação.

O que vemos na prática são serventuários despreparado para receber as demandas, causando ausência de pedidos de direito, confusão e ao final, a parte necessita de um advogado.

Como o processo já está em andamento, normalmente, é nomeado um advogado dativo ou defensor público, para, dali em diante, assistir a parte. Neste momento esbarramos novamente na falta de advogados dativos dispostos a assumir demandas e na ausência de núcleos da Defensoria Pública Estadual em muitas comarcas.

Por final, este procedimento, que deveria ser um facilitador de Acesso à Justiça, acaba por diminuir o instituto que homenageava.

Desta forma explicita Humberto Teodoro Júnior:

"Não se confunde a capacidade processual, que é a aptidão para ser parte, com a capacidade de postulação, que vem a ser a aptidão para realizar os atos do processo de maneira eficaz. A capacidade de postulação em nosso sistema processual compete exclusivamente aos advogados, de modo que é obrigatória a representação da parte em juízo por advogado legalmente habilitado (art. 36). Trata-se de um pressuposto processual, cuja inobservância conduz à nulidade do processo"39

Desta forma, há de se considerar que, ao optar pelo critério do Jus Postulandi, a parte autora corre um risco demasiadamente maior ao praticar atos que apenas um expert em leis, devidamente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, poderia praticar com a devida segurança.

Da mesma forma ocorre na Justiça do Trabalho, onde a parte pode, diretamente na secretaria da Vara do Trabalho, propor sua Reclamação Trabalhista, e inobstante a proteção adicional que a parte trabalhadora tem nesta modalidade de Justiça, da mesma forma, sofre as consequências de não ter alguém para auxiliá-lo, bem como realizar os pedidos.

O artigo 791 da Consolidação das Leis do Trabalho diz o seguinte:

“ Art. 791 - Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.”

Desta forma, nota-se que o legislador, no âmbito da justiça do Trabalho, também instituiu o instituto do Jus Postulandi, sendo a assistência por advogado opcional, como preconiza os parágrafos primeiro e segundo do artigo supra citado.

Porém, há um limite quando a abrangência deste instituto, que é definido pela súmula 425 do Tribunal Superior do Trabalho, qual seja, o Jus Postulandi, “limita-se às varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação recisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.”

Desta forma, na Justiça do Trabalho, fica claro que não são todos os tipos de ação que podem ter seu início pelo Jus Postulandi bem como o grau de jurisdição máximo alcançado por este instituto e o do Tribunal Regional do Trabalho.


5. CONCLUSÃO

Diante dos estudos realizados, verifica-se que os institutos concernentes ao Acesso à Justiça no Brasil têm grandes falhas, que acabam por atrapalhar a eficácia deste acesso.

A falta, ainda sistemática, de concursos públicas que cubram a deficiência no quadro de Defensores Públicos Estaduais, bem como a ausência, por parte do estado, de uma maneira efetiva para pagamento dos advogados dativos, trazem à tona uma realidade de desassistência em alguns casos.

Muitos dos problemas citados neste trabalho seriam evitados se a Defensoria Pública Estadual tivesse a estrutura necessária para cumprir seu papel institucional, o que infelizmente não se revela realidade.

O instituto da Justiça Gratuita é banalizado pelo excesso de pedidos não necessários, gerando, para o Estado, maiores custos na manutenção dos benefícios de Justiça Gratuita.

Os Juizados Especiais, ao permitirem que a parte seja autora ou ré, sem a presença de um advogado, revela limitações ao direito de Acesso à Justiça.

Desta forma, podemos verificar que o problema não é a inexistência de institutos que promovam o Acesso à Justiça, mas a falta do tratamento adequado em determinadas situações.


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Notas

1 PIMENTA, Marilia Gonçalves. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. In: ALVES, Cleber Francisco; PIMENTA, Marilia Gonçalves. Acesso à Justiça em preto e branco: Retratos institucionais da Defensoria Pública. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. P. 87-134.

2 Ibidem.

3 Rui Barbosa. Oração aos Moços. Rio de Janeiro, ed. 1932, p.40.

4 NUNES, Dierle; CÂMARA, Bernardo Ribeiro; SOARES, Carlos Henrique. Processo Civil para OAB. 1. Ed. Salvador: Jus Podivm, 2010. 447 p.

5 PIMENTA, Marilia Gonçalves. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. In: ALVES, Cleber Francisco; PIMENTA, Marilia Gonçalves. Acesso à Justiça em preto e branco: Retratos institucionais da Defensoria Pública. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. P. 87-134.

6 Ibidem.

7 Ibidem.

8 Ibidem.

9 Ibidem.

10 Ibidem.

11 Ibidem.

12 Ibidem

13 Ibidem

14 Ibidem

1.115LOPES, Hálisson Rodrigo, SILVA, Elson Campos da. Diferença entre gratuidade judiciária ou justiça gratuita e assistência jurídica gratuita. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10152&n_ link=revista_artigos_leitura> Acesso em: 01 fev. 2016.

16 OLIVEIRA, Rogério Nunes de. Assistência jurídica gratuita. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 101.

17 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa apud DE MORAES, Ana Carla Ferreira Bueno. A assistência jurídica e a gratuidade da justiça – Da necessária concessão da justiça gratuita nas demandas patrocinadas pela defensoria pública. Disponível em: <https://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/20963/Ana_Carvalho_Ferreira _Bueno_de_Moraes.pdf> Acesso em 01 fev. 2016.

18 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O direito à assistência jurídica: Evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 58.

19 CAHALI, Yussef Said.Mini Códigos. Constituição Federal, Código Civil e Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.778.

20 ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos! Assistência jurídica gratuita nos Estados Unidos, na França e no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 265-266

21 MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967: com a Emenda n. I, de 1669. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971. p. 383

22 JUNIOR, José Cretella. Comentários à Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 819.

23 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O direito à assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 59 e 62.

24 CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica gratuita, assistência judiciária e gratuidade judiciária. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002,p. 120.

25 OLIVEIRA, Rogério Nunes de. Assistência jurídica gratuita. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 74.

26 MELO, Nehemias Domingos de. Da gratuidade da justiça no Novo CPC e o papel do judiciário. [2015] Disponível em: <http://pauloabreu14.jusbrasil.com.br/artigos/244912627/da-gratuidade-da-justica-no-novo-cpc-e-o-papel-do-judiciario> Acesso em: 27 fev. 2016.

27 MELO, Nehemias Domingos de. Op. Cit.

28 Idem, ibidem.

29 TJSP, AI n° 0084039-57.2005.8.26.0000, Comarca de Marília, Rel. Des. Palma Bisson. j 19/01/06

30 MELO, Nehemias Domingos de. Op. Cit.

31 SCHONBLUM, Paulo Maximiliam. A gratuidade de justiça que transforma o Poder Judiciário em porta da esperança. São Paulo: Revista Focus, 2007, p. 2.

32 SCHONBLUM, Paulo Maximiliam, p. 3.

33 CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e prática dos juizados especiais cíveis. São Paulo: Saraiva, 2012. p.34.

34 NOGUEIRA, Paulo Lucio. Juizados especiais cíveis e criminais, São Paulo: Saraiva, 1996. p.28

35 PARIZATTO, João Roberto. Manual de prática do juizado especial. São Paulo: Edipa, 2009. p.39.

36 FUX, Luiz. Manual dos Juizados Especiais. Rio de Janeiro: Destaque, 1998. p.29.

37 ROCHA, Felippe Boring. Juizados especiais cíveis: Aspectos Polêmicos da lei nº 9.099, de 26/09/1995. Rio de Janeiro: Lumem Juris Editora 2009. p.15.

38 ROCHA, Felippe Borring.p.3.

39 JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil – volume I. 41 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004



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