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A institucionalização dos “ismos” na política brasileira

A institucionalização dos “ismos” na política brasileira

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O presente estudo objetiva retratar a realidade da política brasileira com foco especifico na atuação do que neste trabalho é nomeado de “ismos”, destacando-se as práticas desenvolvidas do coronelismo, clientelismo, mandonismo, paternalismo dentre outros.

RESUMO: O presente estudo objetiva retratar a realidade da política brasileira com foco especifico na atuação do que neste trabalho é nomeado de “ismos”, destacando-se as práticas desenvolvidas do coronelismo, clientelismo, mandonismo, paternalismo dentre outros. Trazendo-se conceitos e propondo-se alternativas a modificação destes meios de atuação política no Brasil, demonstrando-se que trata-se de uma questão cultural e a necessidade da atuação conjunta dos governantes e sociedade para a modificação destes mecanismos e evolução da política brasileira.

PALAVRAS CHAVE: Política. Coronelismo. Clientelismo. Cidadania. Brasil


INTRODUÇÃO

A formação do Estado não pode ser dissociada da gestação de um grupo responsável pela organização e pelo exercício do espaço político (WEBER. 1982, apud, REIS, 2007). Esta afirmação retrata a realidade brasileira que tem em seus entes federados sem exceções o protagonismo de grupos concentradores de poder e gestores não apenas da máquina pública, mas de todos os recursos a ela inerentes, sejam estes financeiros como também físicos e laborativas, propagando até hoje a institucionalização do coronelismo, sendo este atualmente existente com outras nomenclaturas, mas com características similares, que serão desenvolvidas no transcorrer deste trabalho.

Importante mencionar neste sentido os conceitos trazidos pelo Professor Vitor Nunes Leal, que de forma simples e direta caracteriza a figura do coronel perante a realidade dos municípios do Brasil, segundo o autor concebemos o “coronelismo” como resultado da superposição de formas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social inadequada (LEAL, 2012, p. 23).

Destaca-se que a presença intrínseca dos “ismos” na política é concebida como uma transição política capitalista. Diversamente da corrente dominante na sociologia política brasileira define o clientelismo eleitoral como prática pré-capitalista (“pré-moderna”), pensamos que deve ser incluído no conjunto das práticas ideológicas capitalistas (FARIAS, 1999, p. 8). A instauração dos diversos tipos de política clientelista no Brasil remontam as relações desde o Brasil Colônia, mas foram intensificadas, criando especificidades e características próprias após a consolidação e advento da política capitalista.

Nesta perspectiva questiona-se se este tipo de ação política durante anos moldada de diversas formas, mas sempre com o objetivo principal de gerenciamento indevido da máquina pública seria forte o suficiente para atravessar gerações, segundo dispõe Paulo Delgado este tipo de poder e dominação, é um sistema que se constrói para durar, superior as pessoas que imaginavam dirigi-lo. Um estrutura, sua engenharia e recursos de preservação do poder que contrariam a ideia de mudança contínua do filosofo grego Heráclito (NUNES, 2010, p. 13).

Em uma análise simples da realidade brasileira é perceptível a utilização da política como profissão, como mecanismo de gestão financeira da máquina pública não em função dos cidadãos, mas em beneficio particular dos que se encontram em cargos públicos. Não há a preocupação com a cidadania, com a criação de políticas efetivas que garantam aos eleitores os direitos mínimos de subsistência, a cidadania passou a ser vista não mais como um direito e sim como um privilégio daqueles que governam.

A preocupação de perpetuar este privilégio do poder é o que faz os chefes políticos utilizar a máquina pública para uma nítida troca de favores, para realização de um jogo político de especulação, criando o que podemos determinar como uma rede organizada de utilização dos recursos públicos, em busca ainda da estabilidade, governabilidade e popularidade que segundo Paulo Delgado são subprodutos dos encaixes nos mundos imutáveis do clientelismo, corporativismo e burocratismo nacionais (NUNES, 2010, p. 13).

A influência econômica, como acima mencionada pouco varia na forma de execução dos procedimentos da política coronelista, clientelista, paternalista, o que podemos considerar é a modificação da atuação dos praticantes destes “ismos”, ou seja, evolui a sociedade e surgem o que Maria A de Andrade define como neocoronel, segundo a autora o neocoronel é um misto de moderno empresário e de coronel. Como empresário modernizou-se ou soube fazer uso dos instrumentos creditícios e financeiros oferecidos pelo governo. Conservou porém velhos traços do antigo coronel no que se refere às suas práticas políticas (ANDRADE, pp. 16-17 apud FARIAS, 1999, p. 7).

Ressalta-se a preocupação de autores para que não haja a criação de dois polos, entre a política nacional e a política local, defende Farias que as mesmas se interpenetram, complementam-se segundo afirma a atuação política em termos municipais e estaduais está associada em grau variável (segundo os estágios de desenvolvimento socioeconômico no plano nacional, bem como a intervenção na esfera federal tem repercussão variáveis) na política dos estados e municípios (FARIAS, 1999, p. 8).

Nesta perspectiva objetiva-se trazer com este trabalho em um primeiro momento uma breve exposição acerca das características do coronelismo proposto pelo professor Vitor Nunes Leal, realizando-se uma verificação de suas ações no Brasil, trazendo a visão de autores que defendem a queda deste sistema, e verificando-se a possível substituição do mesmo pelas práticas clientelistas, citando uma análise comparativa do que Edson Nunes define como as diferentes gramáticas do Brasil.

Em momento posterior propõe-se uma análise conceitual e de atuação dos diversos “ismos” institucionalizados na política brasileira, demonstrando-se as suas esferas de atuação e as influências geradas na sociedade, com uma verificação do seu alcance na percepção do conceito de cidadania, sugerindo-se possíveis alternativas à estas práticas.

Objetiva-se trazer uma reflexão acerca destas estruturas, propondo-se que haja em verdade uma reflexão por parte da sociedade como um todo, para que possa verificar que estas práticas não apenas realizadas pelos gestores do poder, mas principalmente pelos considerados cidadãos comuns, pelos eleitores, que são neste estudo considerados os destinatários, e falsos beneficiários desta política. Ressaltando-se a assertiva de José Murilo ao afirmar que a ausência de uma população educada tem sido sempre um dos principais obstáculos à construção da cidadania civil e política (CARVALHO, 2011, p. 11).

 Verificando-se tais conceitos em estudos já realizados sobre o assunto, em pesquisas anteriormente publicadas que demonstrem a atuação dos “ismos” no Brasil, alinhados a uma verificação doutrinaria sobre os diversos conceitos.


O INICIO DOS “ISMOS” COM A INSTAURAÇÃO DO CORONELISMO NO BRASIL.

Destaca-se que o Brasil da primeira metade do século XX passaria por mudanças em sua arena política e as pressões populares ganhariam corpo, como nos mostra Francisco Welffort, em sua obra O populismo na política brasileira (1978 apud RIBEIRO):

“Se a pressão popular sobre as estruturas do Estado pode ser apenas sentida pelas minorias dominantes na etapa anterior a 1930; na etapa posterior, ela se tornará rapidamente um dos elementos centrais do processo político, pelo menos no sentido de que as formas de aquisição ou de preservação do poder estarão cada vez mais impregnadas da presença popular” (WEFFORT, 1978, p. 67 apud RIBEIRO).

Após a atuação política de 1930 iniciou-se uma longa caminhada em busca da democratização do Brasil, sofrendo a população vários períodos difíceis de transição, dentre estes períodos militares que geraram em verdade uma guerra interna no país, mas que contribuíram para o fortalecimento da população que culminou na Constituição de 1988. Ocorre que, esta não estava desintoxicada do desenvolvimento da política anteriormente vivenciada no Brasil, criou-se muitas expectativas na aplicação e estruturação de um conceito verdadeiro de cidadania que em verdade não se concretizou, neste sentido afirma José Murilo que:

Destaca-se que após o esforço da reconstrução, melhor dito, de construção da democracia no Brasil, ganhou ímpeto após o fim da ditadura militar, em 1985. Uma das marcas desse esforço é a voga que assumiu a palavra cidadania. Políticos, jornalistas, intelectuais, líderes sindicais, dirigentes de associações, simples cidadãos, todos a adotaram. A cidadania, literalmente, caiu na boca do povo. Mais ainda, ela substituiu o próprio povo na retorica política. Não se diz mais “o povo quer isto ou aquilo”, diz-se “a cidadania quer”. Cidadania virou gente. No auge do entusiasmo cívico, chamamos a Constituição de 1988 de constituição cidadã. Havia ingenuidade no entusiasmo. Havia a crença de que a democratização das instituições traria rapidamente a felicidade nacional. Pensava-se que o fato de termos reconquistado o direito de eleger nosso prefeitos, os governadores e presidente da república seria garantia de liberdade, de participação, de segurança, de desenvolvimento, de emprego, de justiça social (CARVALHO, 2011, p. 7).

Esta realidade contribuiu diretamente para a configuração do que afirma Edson de Oliveira Nunes pelo uso e institucionalização do “jeitinho”, para o autor: os brasileiros enaltecem o jeitinho (isto é, uma acomodação privada e pessoal de suas demandas) e a autoridade pessoal como mecanismos cotidianos para regular relações sociais e relações com instituições formais (NUNES, 2010, p. 52).

Esta realidade é perfeitamente associada ao desenvolvimento da prática coronelista, objeto desta primeira parte do estudo, prática detalhadamente estudada na obra Coronelismo, Enxada e Voto, implantada em todos os municípios do Brasil e condição necessária para o conhecimento da vida política do interior do país (LEAL, 2012, p. 23). Nesta perspectiva ressalta-se a afirmação de Vitor Leal, segundo o autor o coronelismo:

Não é, pois, mera sobrevivência do poder privado, cuja hipertrofia constituiu fenômeno típico de nossa história colonial. É antes uma forma peculiar de manifestação do poder privado, ou seja, uma adaptação em virtude da qual os resíduos do nosso antigo e exorbitante poder privado têm conseguido coexistir com um regime político de extensa base representativa. Por isso mesmo, o “coronelismo” é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras.  (LEAL,2012, 23).

Ressalta o citado autor que alinhada ao coronelismo há o desenvolvimento de práticas paternalistas com a predominância de trocas de favores pessoais que partem desde arranjar empregos públicos até outros pedidos de menores proporções, mas que também envolvem diretamente a máquina administrativa, segundo o autor:

É neste capítulo que se manifesta o paternalismo, com a sua recíproca: negar pão e água ao adversário. Para favorecer os amigos, o chefe local resvala muitas vezes para a zona confusa que medeia entre o legal e o ilícito, ou penetra em cheio no domínio da delinquência, mas a solidariedade partidária passa sobre todos os pecados uma esponja regeneradora. A definitiva reabilitação virá com a vitória eleitoral, porque, em política, no seu critério, “só há uma vergonha: perder”. Por isso mesmo, o filhotismo tanto contribui para desorganizar a administração municipal. (LEAL,2012, p. 32)

O desenvolvimento do coronelismo no Brasil na perspectiva exposta por Victor Nunes, tem a base de atuação nos municípios, entretanto, vinculam-se diretamente aos governos estaduais e federais, havendo uma relação de interdependência entre os entes políticos como garantia das práticas paternalistas e de troca de favores. Afirma Reis neste sentido que:

O bem e o mal, que os chefes locais estão em condições de fazer aos seus jurisdicionados, não poderiam assumir as proporções habituais sem o apoio da situação política estadual para uma e outra coisa. Em primeiro lugar, grande cópia de favores pessoais depende fundamentalmente, quando não exclusivamente, das autoridades estaduais. Com o chefe local — quando amigo — é que se entende o governo do Estado em tudo quanto respeite aos interesses do município. Os próprios funcionários estaduais, que servem no lugar, são escolhidos por sua indicação. Professoras primárias, coletor, funcionários da coletoria, serventuários da justiça, promotor público, inspetores do ensino primário, servidores da saúde pública etc., para tantos cargos a indicação ou aprovação do chefe local costuma ser de praxe. Mesmo quando o governo estadual tem candidatos próprios, evita nomeá-los, desde que venha isso a representar quebra de prestígio do chefe político do município. Se algum funcionário estadual entra em choque com este, a maneira mais conveniente de solver o impasse é removê-lo, às vezes com melhoria de situação, se for necessário. A influência do chefe local nas nomeações atinge os próprios cargos federais, como coletor, agente do correio, inspetor de ensino secundário e comercial etc. e os cargos das autarquias (cujos quadros de pessoal têm sido muito ampliados), porque também é praxe do governo da União, em sua política de compromisso com a situação estadual, aceitar indicações e pedidos dos chefes políticos nos Estados (REIS, 2007, p. 13 E 14).

Necessário se faz verificar não apenas as características de atuação do coronelismo na sociedade brasileira, nem definir apenas se há uma concentração predominante em municípios, estado ou no entre federal, é pertinente verificar-se o porquê de sua atuação, quais as primeiras motivações que permitiram o ingresso dessa pratica na sociedade brasileira[1]. Nesta perspectiva deve-se lembrar que a exploração, o jogo de poder é antes de tudo visto como cultural no Brasil, a sua forma de colonização retrata o início de uma civilização viciada na perpetuação da política, do poder e gananciosa pela movimentação de recursos financeiros, que estruturaram o país em benefício do que possuíam melhores condições monetárias surgindo os grandes latifúndios e com eles a prática dos primeiros coronéis, neste sentido:

No entanto, a razão primeira do coronelismo é o fator geográfico, que vai estar intrinsecamente ligado à formação das grandes propriedades. A formação complexa e individualista da nossa expansão territorial se faz através de núcleos isolados Portugueses nobres, comerciantes ricos e militares a serviço da Coroa, etc, recebem sesmarias, formando os primeiros núcleos independentes e iniciando, por razões várias, um processo que prossegue no Império e República Enquanto os latifúndios se estendem, praticamente não existe a ação do Estado; a ausência do poder público facilita a presença do poder privado, que se arroga no direito de todos os atributos "legais". A formação dispersa torna o problema do mandonismo um processo nacional. Desde a Colônia os grandes proprietários de terra vêm dominando de fato, e tornando- se os homens bons (ricos), que compõem as câmaras municipais. Os barões e coronéis representam simples continuidade do sistema anterior, havendo, no entanto, maior amplitude de representação legal. É que a partir da Independência e, principalmente, do federalismo da Primeira República, acentuam-se os predomínios locais, uma vez que são os representantes das oligarquias latifundiárias que dominam o legislativo e executivo. A partir do Império, o mandonismo local é denominado indistintamente de coronelismo (maior parte do Brasil), caudilhismo (Rio Grande do Sul), chefismo (vale do São Francisco), etc. A regionalização de nomes mostra a expansão e unidade do problema, que se traduz também em fatores extrínsecos comuns. Como diz um publicista uruguaio, "caudilho quer dizer força própria, autoridade própria e, portanto, autonomia"(CARONE, 1971)

No desenvolvimento do coronelismo no Brasil predomina a atuação de grupos políticos que concentram-se em si todas as lideranças políticas pois não há propriamente partidos, são siglas fantasmas dilaceradas internamente entre caciques e aspirantes, e um dos aspectos decisivos da balança continuará sendo a questão da mediação com o governo federal, este o ponto em torno do qual os líderes vão se mover. (REIS, 2007, p. 14)

Os conceitos e meios de atuação até o momento expostos retratam bem a realidade brasileira coronelista, comandada no início por famílias influentes, detentoras de grandes extensões de terras, que utilizava-se da influência social alinhada ao manejo desenfreado da máquina administrativa para manter-se no poder por tantos anos, gerando uma dependência da sociedade local a suas ações. Houveram transformações como suscitadas no início desta explanação em que alinhada a evolução da sociedade brasileira, houve consequentemente a evolução também dos tipos de coronéis, que passaram a não ser latifundiários apenas, mas agora empresários ocupantes de status elevados no jogo político brasileiro.

Necessário se faz destacar as visões de alguns autores acerca desta questão ao afirmarem que além do fortalecimento do coronel havia em verdade a consagração do Estado que não bastava ser o detentor da máquina pública, necessitava ser ainda o gestor das relações entre os eleitores, sendo em verdade o controlador de suas vontades, afirma José Murilo que o coronelismo era fruto de alteração na relação de forças entre os proprietários rurais e o governo e significava o fortalecimento do poder do Estado antes que o predomínio do coronel (CARVALHO, 1997). Poder do Estado que permanecia fortalecido a nível federal, estadual e municipal, havendo o estabelecimento denominada por Alves de uma rede de compromissos.[2]

Nessa vertente o eleitor vincula-se ao coronel não apenas para fins laborais, mas ainda de forma mais intrínseca, embrionária com a vinculação moral de suas ações, os eleitores sentem-se compelidos a agirem conforme os mandos dos coronéis como forma de agrada-los, acreditando que conseguirão o respeito de seus mandatários, havia a obrigação moral[3] do eleitor para com o político, constituída por mediações diversas (ALVES, 2003). Neste sentido menciona-se o conceito e o marco temporal da existência do coronelismos para Francisco Farias, segundo o mesmo:

O voto coronelício define-se pela manifestação de fidelidade pessoal do eleitor a um chefe político - o coronel. Como tal, o voto não redutível nem às formas de coerção física, nem a mecanismo da troca mercantil. Ao contrário, esse tipo de legitimidade do ato eleitoral, como uma obrigação moral se concretiza fundamentalmente na doação pura e simples do voto ao candidato do coronel. Como mostram os trabalhos mais abalizados sobre o coronelismo, a condição sócio-economica da prática coronelista é a existência, no campo, de uma estrutura pré-capitalista, em que as relações de produção se expressam como relações de dominação e dependência pessoal. A relação pessoal de dominação e dependência, presente em estruturas econômicas pré-capitalistas como a “parceria” ou o “arrendamento’, implica a apropriação do sobretrabalho sob a forma extra-econômica de uma contraprestação pessoal do trabalhador ao proprietário pela cessão do uso da terra (FARIAS, 1999, p. 11)

A dependência pessoal gerada no coronelismo e acima suscitada não se destina apenas ao chefe da família, ao patriarca responsável, mas a toda a estrutura familiar, a subordinação é transcendental passada desde a infância até a velhice, não havendo nenhuma escolha nessa escala, ou seja, você já nasce subordinado e morre em subordinação, o que demonstra a patologia, se pode-se assim denominar do coronelismo na vida em sociedade[4].

Destaca-se que esta vinculação pessoal, esta dependência não poderia ser justificada pelo uso da força bruta ou da violência entre coronéis e subordinados, esta era utilizada apenas como meio corretivo o que Farias denomina de infidelidade eleitoral, mas a base de toda a estrutura coronelista é a dependência pessoal[5].

Diante das transformações sofridas pela estrutura coronelista houve o que podemos chamar de aperfeiçoamento deste, havendo a queda de seus sistema em 1930 e segundo afirma José Murilo com a implantação do Estado Novo houve a concretização desta queda[6]. Havendo a ascensão do voto de clientela, definido por Francisco Farias como:

O voto de clientela define-se como uma relação de barganha em torno de vantagens materiais entre o eleitor e o agente político denominado de cabo eleitoral. Esse é uma espécie de líder local que cuida dos interesses de seus representados, principalmente junto as “autoridades públicas”, fazendo as vezes de, como caracterizou Paul Singer, um “advogado administrativo” da sua comunidade (uma vila, uma favela, um quadro associativo de um clube recreativo etc). Controlando em geral, uma centena ou uma dezena de votos, o cabo eleitoral os vende ao “político de clientela”, que não passa de um cabo eleitoral suficientemente poderoso” (FARIAS, 1999, p.18).

Trazendo alguns aspectos conceituais acerca do clientelismo que serão melhores estudados na segunda parte deste estudo, se faz pertinente ressaltar que não deve-se reduzir o clientelismo a simplesmente “benefícios públicos em troca de votos”, mas observar as mediações entre os políticos e os seus eleitores e entre políticos locais e os políticos estaduais ou federais, que implicam a mercantilização das relações políticas. São relações amplas entre os atores envolvidos que geram obrigações morais em que o voto é apenas uma consequência (ALVES, 2003).

O Clientelismo tem o seu auge ainda com a retomada dos direitos democráticos no pós-ditadura (início dos anos 80) que não exclui o desenvolvimento de dispositivos de cooptação política que servem como contrabalanço à crescente participação política dos setores populares, e à sua relativa, mas significativa, autonomia em face do Estado e partidos políticos. (LENARDÃO, 1999)

Destaca-se que muitos autores afirmam e a vivência prática confirma que no clientelismo não há um preconceito para atuação preferencialmente em um único ente federado, pelo contrário defende-se que a instauração do federalismo propiciou o fortalecimento desta prática, generalizando a sua forma de atuação seja a nível municipal, estadual ou federal, alguns com mais ou menos intensidade, mas todos com a presença desta forma de cooptação política, destacando-se o que afirma Elsio Lenardão:

Assim compreendido, pode-se observar a presença do clientelismo desde a esfera da política federal, com a troca de favores entre o presidente da república e os congressistas através do fisiologismo (liberação de recursos à parte do orçamento votado, distribuição de cargos, etc), passando pelos governadores que repetem tais práticas em relação às assembleias estaduais e que tratam diferenciadamente os prefeitos “aliados” dos que não o são. Não menos comum é o clientelismo praticado por membros dos legislativos, na manutenção de clientelas eleitorais, sustentadas com recursos públicos. Chega-se também às práticas de elites políticas municipais que usam do clientelismo para garantir sua sobrevida eleitoral e o mando político, onde são práticas corriqueiras o empreguismo, o uso eleitoreiro de programas e recursos estatais – como tíquete-leite, cestas básicas- e a cooptação de lideranças populares, atraindo-se com benesses, privilégios, apadrinhamento, etc” (...) por seu lado o clientelismo no Brasil foi sempre um corolário da forma singular de colocar-se a relação entre o poder público e o poder privado, mais exatamente à confusão entre os espaços e os interesses próprios dessas duas esferas de poder. De fato, o clientelismo serviu como um mecanismo articulador de certa confusão, não distinção, entre o espaço público e o espaço privado, comprometendo até a instalação de alguns pressupostos básico do Estado democrático-liberal no Brasil o exercício “livre” do voto, a mediação política exercida por partidos políticos, a existência de espaço institucionais de representação, organizados a partir de relações políticas despersonalizadas, etc (LENARDÃO, 1999).

Diante de toda esta mudança estrutural entre os dois polos denominado de coronelismo e clientelismo[7] faz-se pertinente demonstrar de forma simples um quadro comparativo criado por Francisco Farias que elucida os pontos de convergência e de divergência entre estas duas estruturas

CORONELISMO

CLIENTELISMO

Voto de cabresto: votar no “coronel” e nos candidatos apoiados por ele.

Há aqui uma fidelidade ao coronel que implica a vinculação das escolhas nos vários níveis da eleição.

Currais eleitorais. Caráter não concorrencial nas eleições. Predomínio da opção eleitoral do coronel.

Local de votação: zona urbana. Trabalhadores (eleitores) dependiam da condução, da roupa, da alimentação oferecida pelos coronéis nos dias de eleição. As eleições como festas. E ainda havia o ‘bico de pena’ = fraudes eleitorais.

Políticas Sociais.

Municípios pobres e dependentes. O coronel trazia recursos e fazia obras.

Uma associação entre os feitos públicos como obras do coronel.

Prefeituras pouco técnicas. Os empregos eram indicados pelo coronel (filhotismo).

Favoritismo. Recursos estatais eram propriedades da facção governante, dos coronéis.

Voto livre: os eleitores podem desvincular o voto no candidato a Prefeito das opções partidárias desse candidato em outros níveis da eleição. Este voto se traduz, na maioria dos casos, no voto de barganha, que assume uma forma sofisticada por meio do associativismo (associações locais dominadas por cabos eleitorais).

Multiplicidade de Partidos. Pluralismo concorrencial, exigindo recursos financeiros dos Partidos e candidatos no convencimento dos eleitores

Local de votação: vários locais. Maior ação de cabos eleitorais. Locais de votação espalhados por todas as localidades do Brasil.

Constituição de 1988. Municípios mais autônomos, mais ricos. A Prefeitura realiza as obras para garantir o apoio de seus eleitores.

Prefeituras mais técnicas. Concurso público; obras feitas pela administração da Prefeitura.

Crescimento dos partidos de esquerda. Cabos eleitorais identificados com a política comunitária. A esquerda fiscalizando as obras da Prefeitura.

Fonte: (FARIAS 2000, passim apud ALVES, 2003)

Os dois “ismos” acima citados abriram caminho para a propagação de novas formas de cooptação política na sociedade brasileira com algumas diferenças e semelhanças que serão abaixo pormenorizadas na segunda parte deste estudo.


 CONCEITUAÇÃO DOS “ISMOS” E A INFLUÊNCIA NA POLITICA BRASILEIRA

Edson Nunes define que o Brasil possui quatro principais gramáticas sendo estas: clientelismo, corporativismo, insulamento burocrático e universalismo de procedimentos (NUNES, 2010, PAG, 39), gramáticas estas explanadas pelo autor como procedimentos adotados no Brasil como padrões de cooptação política, extremamente difundidos de forma geral em toda a sociedade.  Nesta parte do estudo verificar-se-á alguns conceitos acerca dos “ismos” instaurados na política brasileira. Ressalta-se ainda a diferenciação proposta por Jose Murilo que suscita a importância da conscientização das disparidades vivenciadas entre Coronelismo e clientelismos, segundo o autor:

Outro conceito confundido com o de coronelismo é o de clientelismo. Muito usado, sobretudo por autores estrangeiros escrevendo sobre o Brasil, desde o trabalho pioneiro de Benno Galjart (1964; 1965), o conceito de clientelismo foi sempre empregado de maneira frouxa. De modo geral, indica um tipo de relação entre atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto. Este é um dos sentidos em que o conceito é usado na literatura internacional (Kaufman, 1977). Clientelismo seria um atributo variável de sistemas políticos macro e podem conter maior ou menor dose de clientelismo nas relações entre atores políticos. Não há dúvida de que o coronelismo, no sentido sistêmico aqui proposto, envolve relações de troca de natureza clientelística. Mas, de novo, ele não pode ser identificado ao clientelismo, que é um fenômeno muito mais amplo. Clientelismo assemelha-se, na amplitude de seu uso, ao conceito de mandonismo. Ele é o mandonismo visto do ponto de vista bilateral. Seu conteúdo também varia ao longo do tempo, de acordo com os recursos controlados pelos atores políticos, em nosso caso pelos mandões e pelo governo (CARVALHO, 1997).

As políticas clientelistas ingressaram na sociedade brasileira segundo Edson Nunes através da instauração do capitalismo, segundo o autor há esta dominação por meio do que denomina domínio público[8], que segundo afirma consiste no espaço abstrato onde as contradições entre a lógica da produção capitalista e as demandas da sociedade são reconciliadas (NUNES, 2010, p. 41). Este mesmo autor ressalta que a política capitalista proporcionou a modificação de padrões e relações sociais e políticas no interior dos Estados-nação (NUNES, 1997, p.  42).

A ideia de introdução da política capitalista como forma de intensificação dos “ismos” na política brasileira é pertinente com a conceituação apresentada por Edson Nunes trazidos na obra de Alessandro Alves ao aduzir que:

O clientelismo é um sistema de controle do fluxo de recursos materiais e de intermediações de interesses, no qual não há número fixo ou organizado de unidades constitutivas. As unidades constitutivas do clientelismo são agrupamentos, pirâmides ou redes baseados em relações pessoais que repousam em troca generalizada. As unidades clientelistas disputam frequentemente o controle do fluxo de recursos dentro de um determinado território. A participação em redes clientelistas não está codificada em nenhum tipo de regulamento formal; os arranjos hierárquicos no interior das redes estão baseados em consentimento individual e não gozam de respaldo jurídico. Ao contrário do corporativismo, que é baseado em códigos formais legalizados e semi-universais, o clientelismo se baseia numa gramática de relações entre indivíduos, que é informal, não legalmente compulsória e não-legalizada (NUNES, 1999, p. 40-41, apud ALVES, 2003).

Diante desta perspectiva econômica estavam criadas as condições para o desenvolvimento de políticas clientelistas e paternalistas, as quais não almejavam na verdade a criação de melhorias “reais” e substanciais à população, mas sim um conjunto de políticas até certo ponto benéfico, mas que não passava de um mecanismo para que determinadas elites se mantivessem no poder, uma vez que nem mesmo era considerada a elaboração de instrumentos para que a participação popular na política fosse promovida, intensificando-se as desigualdades entre os cidadãos e sendo esta desigualdade a base e o mecanismo de continuidade dos “ismos” no Brasil.

Somando-se ao grupo dos “ismos” que marcaram os primórdios da formação da sociedade brasileira, dentre estes destacam-se o patriarcalismo, coronelismo, mandonismo, clientelismo, além do populismo e paternalismo.

Vitor Leal define que a outra face do filhotismo é o mandonismo, que se manifesta na perseguição aos adversários: “para os amigos pão, para os inimigos pau’. As relações do chefe local com seu adversário raramente são cordiais. O normal é a hostilidade. Além disso, como é obvio, sistemática recusa de favores, que os adversários, em regra geral, se sentiriam humilhados de pedir (LEAL, 1997, PAG 32.) O mesmo autor ainda retrata sua visão acerca do Coronelismo, a proposta deste capitulo é apresentar os mais diversos conceitos, objetivando a verificação de que os “ismos” no Brasil, por mais que se apresentem em diferentes nomenclaturas retratam uma mesma realidade de manipulação da máquina pública e da política em benefício de poucos, em benefício de parlamentares e chefes de governo que objetivam apenas engrandecer o seu patrimônio particular e não o patrimônio da sociedade que os elegeu, neste sentido apresenta-se o coronelismo para Vitor Leal:

Victor Nunes Leal descreve o “coronelismo” da seguinte forma: “O ‘coronelismo’ é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terra. Não é possível, pois, compreender o fenômeno sem referência à nossa estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das manifestações de poder privado ainda tão visíveis no interior do Brasil” (LEAL, 1997, p. 40 apud ALVES, 2003)

Nesta perspectiva José Murilo destaca ainda diferença entre os conceitos de coronelismo[9], mandonismo[10] e clientelismo, até o momento retratados, para o autor:

Temos, assim, três conceitos relacionados, mas não sinônimos, guardando cada um sua especificidade, além de representarem curvas diferentes de evolução. O coronelismo retrata-se com uma curva tipo sino: surge, atinge o apogeu e cai num período de tempo relativamente curto. O mandonismo segue uma curva sempre descendente. O clientelismo apresenta uma curva ascendente com oscilações e uma virada para baixo nos últimos anos (CARVALHO, 1997).

Nessa concepção, o coronelismo é um sistema político, uma complexa rede de relações que vai desde o coronel até o presidente da República, envolvendo compromissos recíprocos. (CARVALHO, 1997), ou seja, os “inimigos” políticos são discriminados em todo o período da gestão de seu opositor, negando melhorias em suas ruas, transferindo ou demitindo funcionários de “grupos contrários” etc. Enfim, características encontradas em muitos municípios atuais (ALVES, 2003).

Edson Nunes destaca como atua o clientelismo na política brasileira, afirmando que há em verdade a existência de uma rede que promove o que denomina de corretagem política, desempenhada através da utilização dos recursos materiais do Estado, segundo dispõe o autor:

O clientelismos repousa num conjunto de redes personalistas que se estendem aos partidos políticos, burocracias e diques. Estas redes envolvem uma pirâmide e relações que atravessam a sociedade de alto a baixo. As elites políticas nacionais contam com uma complexa rede de corretagem política que vai dos altos escalões até as localidades. Os recursos materiais do Estado desempenham um papel crucial na operação do sistema; os partidos políticos – isto é, aqueles que apoiam o governo – têm acesso a inúmeros privilégios através do aparelho de Estado. Esses privilégios vão desde a criação de empregos até a distribuição de outros fatores, como pavimentação de estradas, construção de escolas, nomeação de chefes e serviços de agências, tais como o distrito escolar e o serviço de saúde local. Os privilégios incluem ainda a criação de símbolos de prestígio para os principais “corretores” dessa rede, favorecendo-os com acesso privilegiado aos centros de poder (NUNES, 2010, PAG 53).

As instituições brasileiras ficaram altamente impregnadas por esse processo de troca de favores, a tal ponto que poucos procedimentos burocráticos acontecem sem uma “mãozinha”. Portanto a burocracia apoia a operação do clientelismo e suplementa o sistema partidário (NUNES, 2010, PAG 53). A institucionalização dos “ismos” no Brasil passou a ser vista como a regra no desenvolvimento das atividades burocráticas, a sociedade passou a não considerar a troca de favores como meio de corrupção, visão deturbada e condizente apenas com a busca de interesses pessoais, haja vista que a partir do momento que se utiliza a troca de favores como mecanismo de obtenção de privilégios junto ao Estado está automaticamente contribuindo para o fortalecimento deste tipo de política no Brasil e em consequência contribuindo com o fortalecimento dos meios de corrupção que desencadearam a crise política atual, seja este clientelismo privado[11] ou estatal[12], ambos contribuem para os prejuízos sofridos pela política brasileira.

Ressalta-se que consoante disposto no transcorrer deste estudo, a institucionalização dos “ismos” no Brasil, transita entre todos os entes federados seja a nível Federal, Estadual e Municipal, há o que doutrinadores chamam de uma supervalorização do poder do Estado, destacando-se o Poder Executivo e a visão paternalista da população com o mesmo, segundo dispõe José Murilo acerca desta questão:

Uma consequência importante é a excessiva valorização do Poder Executivo. Se os direitos sociais foram implantados em períodos ditatoriais, em que o legislativo ou estava fechado ou era apenas decorativo, cria-se a imagem, para o grosso da população, da centralidade do Executivo. O governo aparece como o ramo mais importante do poder, aquele do qual vale a pena aproximar-se. A fascinação com o Executivo forte está sempre presente, e foi ela sem dúvida uma das razões da vistoria do presidencialismo sobre o parlamentarismo, no plebiscito de 1993. Essa orientação para o Executivo reforça longa tradição portuguesa, ou ibérica, patrimonialismo. O Estado é sempre visto como todo-poderoso, na pior hipótese como repressor e cobrador de impostos; na melhor, como um distribuidor paternalista de empregos e favores. A ação política nessa visão é sobretudo orientada para a negociação direta com o governo, sem passar pela mediação da representação (CARVALHO, 2011, p. 221)

Doutrinadores destacam algumas alternativas a ação do Clientelismo, propondo a criação de meios de formalização dos procedimentos para que possibilitem efetivamente a proteção das instituições da troca excessiva de favores e da prática constantes dos “ismos” no Brasil, segundo afirma Edson Nunes:

O universalismo de procedimentos e o insulamento burocrático são muitas vezes percebidos como formas apropriadas de contrabalançar o clientelismo. O universalismo de procedimentos, baseados nas normas de impersonalismo, direitos iguais perante a Lei e checks and balances, poderia refrear e desafiar os favores pessoais. De outro lado o insulamento burocrático, é percebido como uma estratégia para contornar o clientelismo através da criação de ilhas de racionalidade e de especialização técnica (NUNES, 2010, PAG 54)..

Além das alternativas acima suscitadas Edson Nunes destaca ainda a formalização do corporativismo, segundo o autor este reflete uma busca de racionalidade e de organização que desafia a natureza informal do clientelismo (NUNES, 2010, PAG 57).

Pertinente ressaltar que a busca de alternativas para se ultrapassar a cultura dos “ismos” na política brasileira deve ser observada e sugerida com cautela, a simples especialização intelectual dos políticos e cidadãos que se vinculam a máquina pública não é o suficiente para supressão deste tipo de prática, pelo contrário se levada ao extremo pode gerar uma maior ruptura nas instituições brasileiras, há a necessidade de formulação de mecanismos que atendem exclusivamente a Lei como ponto de unificação para as participações e utilização da máquina pública de forma consciente e condizente com as propostas trazidas pela Constituição Federal.

Havendo de forma imediata a quebra do vínculo embrionário e patológico com as políticas de obtenção de proveitos pessoais através da máquina administrativa. As conceituações levantadas de forma simples e direta demonstram que estas práticas ainda são muito atuantes na política brasileira e apenas com a instauração de uma consciência cultural há a possibilidade de evolução social.


CONCLUSÃO

O Clientelismo, coronelismo, filhotismo, paternalismo e tantos outros “ismos” desenvolvidos na cultura brasileira, não são nada além da instauração pelos políticos de mecanismos de manutenção da periodicidade e continuidade de mandatos parlamentares, na busca constante da legitimidade através do voto, falseando a verdadeira proposta de um processo democrático[13].

São práticas externamente enraizadas na cultura política que segundo afirma Rodrigo Motta, é entendida como conjunto de valores, tradições, práticas e representações políticas partilhado por determinado grupo humano, que expressa identidade coletiva e fornece leituras comuns do passado, assim como fornece inspiração para projetos políticos relacionados ao futuro (MOTTA, 2009, p. 28).

É bem provável que o correto seja considera-lo como um dos aspectos que compõem a vida política brasileira, um continum, e não um adendo a ela (LENARDÃO, 1999). O desenvolvimento dos meios de cooptação política no Brasil é algo hoje cultural, ou seja, tanto os governantes como os governados acostumaram-se ao desenvolvimento desta prática e não conseguem mais desvencilha-la da política brasileira[14].

O governo estadual garante, para baixo, o poder do coronel sobre seus dependentes e seus rivais, sobretudo cedendo-lhe o controle dos cargos públicos, desde o delegado de polícia até a professora primária (CARVALHO, 1997), esta vivência coronelista mesmo que tenha evoluído com outras nomenclaturas ainda é constante não apenas em nível estadual, mas em todas as esferas do poder, seja este federal ou municipal. Há uma intensa vinculação entre os eleitos e a distribuição de cargos públicos, observa-se ainda intensamente a nível municipal que mais da metade da população “sobrevive” do funcionalismo público, não há em sua grande maioria a procura por outras formas de manter-se, mas sim a formação de acordos para apoio entre os eleitores e os eleitos, que já negociam a distribuição de toda a máquina municipal antes mesmo de serem os detentores de sua gestão, na atual conjuntura é plenamente possível se falar de curral eleitoral no Brasil[15].

O Brasil vivencia uma intensa crise política principalmente a nível federal, crise esta que se observada bem de perto trás os traços da grande influência dos “ismos” na construção de apoios para aprovação de projetos e planos de contas do governo[16], com a quebra destes acordos há a desestruturação de todo o arcabouço político vigente e a substituição imediata do mesmo, pela formação de uma nova rede.

 O parlamentar fica vinculado a necessidade de “costurar” alianças, que em geral são benéficas apenas para os integrantes desta Rede, que não apoiam os projetos apresentados não por buscar benefícios a seus eleitores,  quem lhes deu o poder para figurar neste cargo, pelo contrário, há uma preocupação individual e no máximo estendida a uma obrigação de seguir o que determina o partido político, que perdeu totalmente a ideologia de atuação, o objetivo hoje é a formação de uma maior quantidade possível de alianças que tragam retorno financeiro imediato e intensa troca de favores, mas não a criação de políticas públicas efetivas que confiram a denominação cidadania[17] aos brasileiros.

Certo é que a formulação de um conceito de cidadania que atenda todas as necessidades dos brasileiros é de difícil configuração, mas não impossível, sendo necessário que os protagonistas da sociedade brasileira, que esclareça-se são os brasileiros e não os parlamentares, tenham a formação de uma visão do que desejam deixar de herança, se seria a continuidade de uma sociedade viciada em “ismos” ou a formação de uma sociedade desenvolvida que seja capitalista, mas que também seja justa e atuante na busca constante pela criação de política públicas.

Defende-se as alterações na política brasileira, oportunizando verdadeiramente a construção de um “novo Brasil” um país em que a lei será a mesma para todos e não divergente para situações e pessoas particulares, em que todos os municípios terão voz e vez, usufruindo e contribuindo de forma equânime para o desenvolvimento do governo estadual e federal, que passará em direção contrária ao conceito de coronelismo a não beneficiar através de técnicas paternalistas apenas os seus eleitores diretos dos parlamentares que concentram-se em si a gestão do governo.

Ainda é muito cedo para tecer certezas e afirmações sobre uma data de fim do coronelismo, paternalismo, clientelismo, corporativismo e todos os demais “ismos” no Brasil a atual crise política e as muitas manifestações desfavoráveis a ela no Brasil não são suficientes para demonstrar a certeza do fim de uma era política formada por alianças familiares e políticas, os vícios intrínsecos a este tipo de sistema podem demorar anos para se diluírem em novas práticas e perspectivas, é necessário que o povo brasileiro mantenha-se firme no desejo de mudança, no desejo de renovação sem perder de vista a aplicação da lei, do direito como aliado da política e não como submisso a esta, é necessário a formulação de uma nova cultura, uma cultura desvinculada do “eu” e preocupada com o “todo”, apena desta forma o Brasil livrar-se-á definitivamente dos “ismos” que sugam a cidadania de todos os brasileiros.


REFERÊNCIAS

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RIBEIRO, Paulo Silvino. "Os “ismos” da política nacional: populismo e paternalismo"; Brasil Escola. Disponível em <http://brasilescola.uol.com.br/sociologia/os-ismos-politica-nacional-populismo-paternalismo.htm>. Acesso em 15 de agosto de 2016.


Notas

[1] Na visão de Leal, ele surge na confluência de um fato político com uma conjuntura econômica. O fato político é o federalismo implantado pela República em substituição ao centralismo imperial. O federalismo criou um novo ator político com amplos poderes, o governador de estado. O antigo presidente de Província, durante o Império, era um homem de confiança do Ministério, não tinha poder próprio, podia a qualquer momento ser removido, não tinha condições de construir suas bases de poder na Província à qual era, muitas vezes, alheio. No máximo, podia preparar sua própria eleição para deputado ou para senador (CARVALHO, 1997).

[2] Da mesma forma, estabelecemos a rede de compromissos que se forma entre o poder local e os poderes estadual e federal. Adiantamos que esse compromisso dá-se por meio da “transferência de votos” por parte dos políticos locais para os políticos “graúdos” e do apoio que estes oferecem aos chefes políticos locais. Aqui, é importante frisar, como Marcos Otávio Bezerra (1999, p. 17), que, ao estudar esse compromisso entre parlamentares estaduais e federais com políticos locais, é fundamental analisar a dimensão sociológica dessas trocas, isto é, examinar “as mediações necessárias para que os benefícios sejam concedidos e os votos obtidos”. Na República Velha brasileira, esse era o “compromisso coronelista” (ALVES, 2003).

[3] A mais importante delas é a de Maria Isaura Pereira de Queiroz (1997), que associa o coronel à sua capacidade de barganha eleitoral: “a exigência de um coronel para que seus apaniguados votem em determinado candidato – imposição muitas vezes sem apelo – tem como contrapartida o dever moral que o coronel assume de auxiliar e defender quem lhe deu o voto” (idem, p. 163). A barganha eleitoral é parte integrante das práticas de mando do coronel. O voto é um “bem de troca” para a autora. Queiroz fundamenta ainda a estrutura coronelística na posse de bens de fortuna, isto é, não é necessariamente a terra que faz um coronel, mas principalmente sua riqueza, que poderá favorecer e “granjear clientela” (ALVES, 2003).

[4] Duas características importantes dessa definição: a dimensão econômica, da propriedade da terra, e a dimensão ideológica, a dependência e a fidelidade dos trabalhadores da terra ao coronel. A manipulação eleitoral que detém o coronel provém de sua base social que são as relações de dominação e dependência pessoal, devido a laços fundados na propriedade da terra, em uma base pré-capitalista em que o voto ainda não é objeto comercial, e não da barganha eleitoral, como afirmava Maria Isaura Pereira de Queiroz. Para Saes, no coronelismo não se compra o voto, ele é cedido ao coronel graças à situação de fidelidade em que se encontra inserido o “eleitor (ALVES, 2003).

[5] No coronelismo, a reprodução a dependência pessoal à qual estão submetidos os trabalhadores exige que a violência exercida pelo proprietário da terra corrobore os termos daquela. Exemplo de violência praticada nos limites ideológicos da dependência pessoal é a punição de infidelidade comercial (venda do produto fora do “barracão” do proprietário (FARIAS, 1999, PAG 15).

[6] Ele morreu simbolicamente quando se deu a prisão dos grandes coronéis baianos, em 1930. Foi definitivamente enterrado em 1937, em seguida à implantação do Estado Novo e à derrubada de Flores da Cunha, o último dos grandes caudilhos gaúchos. O próprio Leal é incoerente ao sugerir um renascimento do coronelismo embutido na tentativa dos presidentes militares de estabelecer contato direto entre o governo federal e os municípios, passando por cima dos governadores (Leal, 1980:14). A nova situação nada tinha a ver com a que descreveu em sua obra clássica (CARVALHO, 1997).

[7] Farias ressaltava os aspectos dessa mudança política e as “razões da ascensão do clientelismo” e da queda do coronelismo. Isso se deu principalmente devido às seguintes razões: a transformação da estrutura agrária regional; a substituição da grande propriedade agrária pré-capitalista (absorvedora de um enorme contingente de trabalhadores dependentes do dono da terra) pelas formas de propriedade capitalista, mais moderna, com menos trabalhadores; a modernização dos latifúndios; os projetos governamentais de apoio à pequena produção, como a agricultura familiar, projetos de empréstimo de dinheiro a pequenos agricultores diretamente do governo federal e não por intermédio de um “coronel”; a urbanização em contraposição ao espaço rural (característico do coronelismo); a liberdade do mercado de trabalho (em oposição à sujeição pré-capitalista do campo); as políticas comunitárias e clientelismo estatal, definido como “a modalidade de clientelismo na qual os ‘políticos de profissão’ distribuem recursos ‘públicos’ e favores ligados às instituições governamentais, em troca de sustento eleitoral” (Caciagli apud FARIAS, 2000, p. 59). “Políticos de profissão” destinam recursos diretamente a comunidades e líderes comunitários em troca do voto e não mais a “coronéis” (ALVES, 2003).

[8] Sufrágio e cidadania são os equivalentes políticos do mercado econômico. Já foi dito que a cidadania constitui a principal revolução da nossa era. O “domínio público”, onde indivíduos funcionam como eleitores, como cheques anda balances do poder do Estado, como cidadãos, tem sido visto como uma consequência de funcionamento do mercado econômico livre (NUNES, 2010, PAG,41).

[9] Ao aprofundar a literatura sobre o assunto, deparamo-nos com a variação do uso e do sentido do conceito de “coronelismo” ao longo da história brasileira. Muitos autores consideram extinto tal fenômeno, enquanto outros buscam associá-lo às modernas estruturas de dominação no Brasil. Sabemos que o clientelismo é uma estrutura que atravessa a história brasileira (NUNES, 1999); portanto, é tão antiga quanto o “coronelismo”, ou mais. Porém, são práticas políticas distintas: a primeira refere-se ao poder de mando de um chefe político em uma determinada localidade e sua barganha com o governo estadual e federal; a segunda é uma estrutura que envolve um tipo de relação entre atores políticos que trocam benefícios por apoio político e votos (CARVALHO, 1997, apud ALVES, 2003).

[10] O mandonismo não é um sistema, é uma característica da política tradicional. Existe desde o início da colonização e sobrevive ainda hoje em regiões isoladas. A tendência é que desapareça completamente à medida que os direitos civis e políticos alcancem todos os cidadãos. A história do mandonismo confunde-se com a história da formação da cidadania (CARVALHO, 1997).

[11]  O clientelismo pode assumir duas variantes: a privada e a estatal. O Clientelismo privado, forma da troca de benefícios particulares pelo voto, deu origem à “máquina eleitoral”, que “pode ser caracterizada como uma organização eleitoral ligada quase exclusivamente a sua clientela por interesses materiais particulares e especializada na organização e distribuição de vantagens”. Os velhos partidos das “oligarquias” se abrem a uma rede de adeptos – os cabos eleitorais- mobilizados na caça de votos. Se no partido de esquerda há o risco de o sistema de incentivos seletivos (salários, prestígio, oportunidades profissionais), que move o aparelho, sobrepor-se aos ideias coletivos e programáticos, nas maquinas eleitorais isso é a regra. Nessa variante do clientelismo, o partido é o mais independente dos recursos governamentais (FARIAS, 1999, p. 23).

[12] Já o clientelismo estatal define-se como a modalidade de clientelismo na qual os “políticos de profissão” distribuem recursos “publico” e favores ligados às instituições governamentais, em troca de sustento eleitoral. Os cabos eleitorais tendem a dirigir-se a comunidades inteiras, e menos a pessoas privadas: “O clientelismo passa a ter um caráter grupal e impessoal, visto que é mediado pela alocação de benefícios (aparentemente) públicos, o que implica um mínimo e racionalidade administrativa (FARIAS, 1999, p. 24)

[13] O que observamos, e isso será melhor argumentado posteriormente, é que as características contidas nesse sistema coronelista continuam a existir, isto é: os currais eleitorais, a fidelidade ao “coronel” em época de eleição e a vinculação das escolhas eleitorais nos vários níveis da eleição (estadual e federal); o “coronel” que apoia os candidatos governistas nos níveis estadual e federal continua dando-lhes votos em troca de recursos; permanece o medo das pessoas em “desrespeitar o chefe”; o “coronel” ainda é visto como o único que pode trazer recursos ao município; mantêm-se prefeituras pouco técnicas, com o empreguismo e favoritismo, contra o concurso público e a burocracia etc. (LEAL, 1997, cap. 1 apud (ALVES, 2003).

[14] Há uma relação de dependência dos votantes para com o político local, construída ao longo de toda a sua carreira política. Parece que se institui uma obrigação subjetiva de lealdade, da mesma forma como o “coronel” tinha para com os seus agregados no tempo da Primeira República, provinda de questões materiais: favores de toda ordem, empreguismo etc. e também de fatores como compadrio, amizade, parentesco (ALVES, 2003).

[15] A relação de clientelismo faz com que muitos eleitores tornem-se fiéis aos chefes políticos municipais. Essa fidelidade faz do líder político local um chefe supremo do município. Por sua vez, esses líderes locais conseguem vincular essa lealdade às suas opções políticas estaduais e federais, transferindo, assim, uma porcentagem significativa de votos a esses políticos. Esse é um esquema de poder local que lembra a relação de “coronelismo” da República Velha brasileira (ALVES, 2003).

[16] O importante em todo o debate não é discutir se existiu ou se existe dominação. Ninguém nega isto. O problema é detectar a natureza da dominação. Faz enorme diferença se ela procede de um movimento centrado na dinâmica do conflito de classes gerado na sociedade de mercado que surgiu da transformação do feudalismo na moderna sociedade industrial, via contratualismo, representação de interesses, partidos políticos, liberalismo político; ou se ela se funda na expansão lenta do poder do Estado que aos poucos penetra na sociedade e engloba as classes via patrimonialismo, clientelismo, coronelismo, populismo, corporativismo. É esta diferença que faz com que o Brasil e a América Latina não sejam os Estados Unidos ou a Europa, que sejam o Outro Ocidente, na feliz expressão de José G. Merquior (CARVALHO, 1997).

[17] Isto quer dizer que a cidadania inclui várias dimensões e que algumas podem estar presentes sem as outras. Uma cidadania plena, que combine liberdade, participação e igualdade para todos, é um ideal desenvolvido no ocidente e talvez inatingível. Mas ele tem servido de parâmetro para o julgamento da qualidade da cidadania em cada pais e em cada momento histórico (CARVALHO, 2011, p. 9).



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