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Considerações sobre a prisão do “senhor ex-presidente", Luiz Inácio Lula da Silva

Considerações sobre a prisão do “senhor ex-presidente", Luiz Inácio Lula da Silva

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A PRISÃO DE LULA ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA SE IMPÔS!

DESNECESSARIAMENTE, PARA RECONHECÊ-LA LEGAL INVOCOU-SE JURISPRUDÊNCIA DO STF QUE MODIFICOU JURISPRUDÊNCIA DELE PRÓPRIO QUE, ANTERIORMENTE, CONSIDERAVA, CONVENIENTEMENTE, ESSE TIPO DE PRISÃO ILEGAL.

PRISÕES QUE TAIS ENCONTRAM AGASALHO NA CONSTITUIÇÃO E NA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRAS.

De há muito vem ocupando as manchetes da imprensa e redes sociais nacional a hoje consumada prisão do “senhor ex-presidente” da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Sabe-se sobejamente – o que nos permite não entrarmos em maiores detalhes – que decorreu isso por ter sido ele, inicialmente, processado e, a final, condenado pelo juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba a uma pena privativa de liberdade de nove (9) anos e seis (6) meses, pelo cometimento dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tal triplex de Guarujá.  Como era de se esperar, irresignado com o quanto decidido pelo juízo “a quo”, interpôs apelação perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, tendo sido o feito distribuído e apreciado pela 8ª Turma do Tribunal.

 Indubitavelmente, não esperava o recorrente surpresa alguma ao quanto seria decidido pelo “ad quem”, já que ingressara no Supremo Tribunal Federal com pedido de habeas corpus preventivo visando obstar a decretação de sua prisão em seguida ao julgamento da recurso e, no seu entendimento, tal decreto só poderia ser efetivado após esgotadas todas as vias recursais inseridas no ordenamento jurídico brasileiro. Mas enganou-se; o Colegiado encontrou imperfeição no decisum de primeiro grau, mas não quanto à condenação, e sim quanto à dosimetria da pena: à unanimidade foi-lhe cominada a pena de doze (12) anos e um (1) mês, tendo sido, pois, majorada a pena imposta pelo juízo de primeira instância. Tornou-se, pois, a sentença exequível.

Também, seu ânimo não se abalou com os indeferimentos aos demais apelos, em distintas instâncias, por si interpostos, pois suas fichas estavam apostadas mesmo no STF. ‘Lá tudo se torna mais fácil’, como certa vez - época em que era presidente do STF o Ministro Gilmar Mendes, dissera Daniel Dantas. Lembram dele? Era, na oportunidade, dono do Banco Opportunity, Estava encrencado até o pescoço, mas graças ao STF, em especial ao Ministro Gilmar Mendes, deu no que deu.

Interessante, pois, era obstar a exequibilidade da sentença privativa de liberdade que foi imposta ao condenado, à espera da apreciação do supremo remédio requerido, o que habilmente conseguiram seus patronos.

O foco principal era o habeas corpus no STF; lá, onde deixou transparecer Daniel Dantas, está instalado um laboratório experimental do pensamento de Antoine Lavoisier: Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Lá no STF, onde, para atender conveniências, tudo se transforma. Já foi pior, marcantemente pior na época em que foi seu presidente o Ministro Gilmar Mendes – 2008/2010. Um tirano à frente da mais Alta Corte de Justiça do País. Indispunha-se contra tudo e contra todos, o que era, e continua sendo, sua marca registrada. Ao assumir a Presidência da Casa piorou. A todo custo queria fazer imperar suas elucubrações psicóticas. Ainda hoje, não mais presidente, ofende os pares que não comungam com suas criações. Muito se insinua que decorrentes de interesses escusos. Ele deixou e deixa lugar para tais presunções. Em 2009, quando presidente da Corte, manteve (não sabemos se ainda mantém algum), antieticamente, no quadro de docentes do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público) –, escola privada que oferece cursos de graduação e pós-graduação, do qual é sócio, vários de seus pares no Supremo Tribunal Federal. O que se imaginar queria ele com isso?

Depois de muitas discussões no seio do STF, a contragosto da Ministra-Juíza-Presidenta da Egrégia Corte, o habeas corpus preventivo interposto pelo ex-presidente foi - atropelando dezenas de outros pleitos similares, incluído em pauta.

Pela lógica o julgamento do habeas corpus ocorreria antes da decisão dos embargos declaratórios opostos contra a decisão do TRF4. E era o que esperavam os defensores do paciente, pois convictos de que o STF reconheceria a procedência do seu pedido, só admitindo sua prisão após esgotadas todas as vias recursais sem êxito. Mas, como visto, isso não ocorreu.

Na sessão de julgamento foi apreciado apenas o juízo de admissibilidade. E nessa apreciação, por sete (7) votos a quatro (4), decidiu-se pelo conhecimento da ação. Por motivos que não nos cabe conjecturar, a sessão foi suspensa e designada a data de 04 de abril do corrente ano para a sua continuação e decisão sobre o mérito da medida protetiva requerida.

Propusemo-nos fazer uma superficial – pois entendemos não ser necessário um mergulho profundo para chegarmos ao entendimento que aqui iremos externar – análise do problema que, atualmente, injustificadamente, toma conta do cenário nacional. Mas, preliminarmente, dizemos que para isso estamos passando por um significativo desconforto. Isso porque estamos sendo forçados a fazer, mais uma vez, severas críticas a um poder que, diante de sua magnitude intelectual (é o que se presume), não deveria dar margem a que pessoas de mediano conhecimento jurídico, como nós, ousassem fazê-lo.

É por reconhecermos não só que a controvérsia estabelecida no pedido de habeas corpus preventivo do “senhor ex-presidente” é descabida e, muito principalmente, porque a matéria será objeto de duas (2) ADC’s a serem brevemente apreciadas pelo STF, e que, ao que tudo indica, estabelecer-se-á a mesma injustificada controvérsia que, seja qual for o resultado, pelo andar da carruagem, poderá – Deus queira que não - causar consequências indesejáveis para a nação brasileira, que topamos o desafio a nós por nós proposto.


DO CONHECIMENTO DO HABEAS CORPUS

O que teve o Supremo Tribunal Federal no dia 22 de março deste ano diante de si? Respondemos: um pedido de habeas corpus preventivo em que o paciente busca proteção ao seu direito de ir e vir, fundamentando essa sua vindicação na probabilidade, ou melhor, na certeza da confirmação do decisum de primeiro grau, o que, por consequência, autorizaria, como realmente autorizou, a execução da sentença condenatória a si imposta, o que se concretizou com a decretação de sua prisão; e não poderia ser diferente.

Que esperar um cidadão que foi devidamente processado e criminalmente condenado em juízo singular por cometimento de crime, o qual lhe impôs pena privativa de liberdade em sentença exequível, pois já ratificada pela imediata superior instância? Outra coisa não é senão a execução do decisum. Mas o senhor “ex-presidente” entendia, e ainda entende, que deve o magistrado prolator da sentença sobre o mandamento sentencial sentar e aguardar os deslindes dos recursos cabíveis que ele houver por bem interpor, para, só aí, se o mandamento não for alcançado pela prescrição, decretar a sua prisão; ou, se for o caso, decretá-la “in memoriam”.

O inciso LXVIII do art. 5º da Constituição Federal estabelece:

“conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.

O art. 647 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, está assim redigido: 

“Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.”

O art. 648 desse mesmo diploma prescreve: 

“A coação considerar-se-á ilegal:

         I - quando não houver justa causa;

         II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

         III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;

         IV - quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;

        V - quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza;

         VI - quando o processo for manifestamente nulo;

         VII - quando extinta a punibilidade”.        

          Sem sombra de qualquer dúvida o pedido de proteção formulado pelo autor-paciente era inepto, pois sua causa de pedir não encontra guarida - como se depreende do quanto acima transcrito - na lei adjetiva penal pátria e muito menos na nossa Lei Maior.

         Em questão preliminar, o relator Juiz-Ministro Luiz Edson Fachin, diante da evidência de que a situação do paciente-impetrante não preenchia os requisitos estabelecidos no art. 5º, inciso LVIII, da Constituição Federal, já que não se percebeu até agora que tenha ele sofrido qualquer tipo de violência no seu direito de ir e vir e, tampouco, nenhuma coação tipificada nos incisos do art. 647 do Código de Processo Penal, defendeu que o Habeas Corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não deveria ser conhecido pela Corte, o que obrigou a Ministra-Juíza-Presidenta a submeter a questão a votação do pleno.

Os guardiães da Constituição

O que se viu? Acreditem! Sete Juízes-Ministros, em pleno plenário, trocarem suas togas fino trato por suas enxovalhadas, e com cheiro de mofo, roupas de centuriões; armarem-se com espadas – com unhas e dentes já se encontravam - e, em defesa da Constituição, em especial ao sacrossanto direito de ir vir do “senhor ex-presidente”,  avançarem contra o entendimento do Ministro-Juiz relator - que contava com outros três pares, também desarmados e vestidos com togas, o que os deixou assemelhados a indefesos gladiadores – golpeando-o de todo modo. Imaginem! Teve centurião que chegou a guindar o direito de ir e vir do “senhor ex-presidente” a um pódio tão só abaixo do direito à vida. Vejam só! Um direito de ir e vir que o paciente frequentemente usa, sorvendo ou não goles de cachaça, para “esculhambar” as instituições brasileiras, em especial o próprio Poder Judiciário; um direito que em momento algum lhe foi tolhido, mesmo quando fez por merecer.

Engraçado? Não!, não! Espantoso! Deprimente!  “Nunca na história deste País” se viu o Supremo Tribunal Federal mostrar sua sanha bélica em defesa da nossa Carta Magna (no caso, o sagrado direito de ir e vir do “senhor ex-presidente”). Nem mesmo quando a ofensa do inimigo se dirigiu contra prerrogativa constitucional de sua exclusividade. Pelo contrário, já houve caso em que, após vencer a última batalha e, consequentemente, a guerra, depôs suas armas e rendeu-se ao inimigo. Isso vimos quando - ainda em vigor a Lei nº 6.815/80 - a Itália, em processo extradicional,  reclamou o criminoso italiano foragido Cesare Battisti. Processo extradicional!, essencialmente judicial e de competência exclusiva do STF. Repetimos aqui o que dissemos oportunamente no artigo Extradição - LEI 6.815/80 (A quem compete conceder a extradição?): Não conseguimos tirar de nossa mente a imagem de nove (9) juízes-ministros do STF (a composição plena no julgamento – dois (2) não participaram), trajando suas vistosas togas pretas, ajoelhados e curvados diante do Presidente da República e, a nove (9) mãos, entregando-lhe o acórdão e dizendo-lhe: ‘Senhor Presidente, nós concluímos que a súplica da Itália está revestida das formalidades legais, que seu pleito tem procedência e, assim, decidimos pela concessão da extradição. Mas, como o Senhor é o “Todo Poderoso”, a decisão de entregar o paciente-reclamado à Itália fica ao bel-prazer de Vossa Excelência’.

Nessa ocasião, o STF, antes guardião, transformou-se em algoz da Constituição; co-partícipe de um crime de responsabilidade que a seguir cometeu o Presidente da República. A Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, que define os crimes de responsabilidade, no seu art. 4º, prescreve: São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra: 

I - A existência da União;...; e, no seu art. 5º define: 

São crimes de responsabilidade contra a existência política da União: ...;

11) violar tratados legitimamente feitos com nações estrangeiras.

Humilhante! Pergunta-se: quem era o Presidente da República Federativa do Brasil à época? Responde-se: o “senhor ex-presidente”, paciente do habeas corpus ora em apreço.

Também não vimos essa beligerância do STF, em defesa da Constituição Federal, em

face de tantos outros crimes de responsabilidade cometidos pelo senhor Luiz Inácio Lula da Silva quando em exercício da Presidência da República. Governos marcados por bravatas várias; jactâncias que levaram o povo brasileiro a crer que o Brasil se tornara uma potência econômica ao ponto de, sem sacrifício dos nacionais, socorrer financeiramente países cujos líderes - a maioria ditadores, opressores de seus governados - gozavam de sua - e de seus asseclas, simpatia, tais como Cuba, Bolívia, Argentina, Venezuela, ..., e muitos outros do continente africano. Propalava aos quatro ventos que o País tinha se visto livre de uma dívida externa centenária, que a Previdência Social estava saneada e que dispunha até de dinheiro para emprestar ao FMI. Mas, sabe-se, nossa realidade era bem diferente; carecíamos – e ainda carecemos, de necessidades mil.

Já no seu primeiro mandato o senhor Luíz Inácio Lula da Silva cometeu crime de responsabilidade que indignou a nação brasileira. Um crime de lesa pátria, que, pela sua repercussão global, não há como se admitir tenha passado desapercebido pelo “guardião” da nossa Constituição. Consumado foi esse crime em 2006, último ano do seu primeiro mandato. No início desse mesmo ano tomou posse na presidência da Bolívia o senhor Evo Morales, que em maio promoveu a invasão das instalações da Petrobrás naquele país e, incontinenti, declarou expropriados os bens da estatal brasileira. Que fez o Presidente da República Federativa do Brasil diante de tal afronta? Nada! Passivamente assistiu a tudo. Que fez o “guardião da nossa Constituição em face dessa inércia do Presidente da República? Absolutamente nada!  

O inciso VII do art. 4º do retro citado diploma legal diz que são crimes de responsabilidade do Presidente da República atos que atentem contra

“A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos”; ... E no seu art. 11, nº 5, caracteriza esse crime:

“negligenciar a arrecadação das rendas, impostos e taxas, bem como a conservação do patrimônio nacional” (grifo nosso).

Vale a pena aqui ressaltar alguns dispositivos da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992 (Lei da improbidade administrativa).

Art. 1° “Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei”.

Art. 10. “Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: ...;

X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público”;... (grifo nosso).

 Art. 12.  “Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: ...; ...;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco ano; ...”

Esse crime foi de uma gravidade ímpar, um crime sórdido contra os brasileiros e, o mais grave, premeditado: o senhor Luíz Inácio Lula da Silva, posteriormente, confessou que o senhor Evo Morales antes de assumir o governo boliviano lhe comunicara que iria proceder da forma como procedeu e que, na mesma oportunidade – como se a Petrobrás fosse de sua exclusiva propriedade, deu o aval, para a expropriação.

Vamos abreviar e dar só mais um exemplo da fragilidade dos centuriões encarregados da guarda da Constituição Federal quando teve pela frente o prepotente senhor Luiz Inácio Lula da Silva. Em 2009 - por morte do centurião Carlos Alberto Menezes Direito, também por ele indicado em 2007, indicação essa por ninguém censurada; pelo contrário, aplaudida por muitos, pois de reconhecidos méritos - o “senhor ex-presidente” nomeou para recompor a guarda o inexpressivo causídico, ex-advogado do Partido dos Trabalhadores, José Antônio Dias Toffoli, notoriamente desprovido de notável saber jurídico, mas de uma fidelidade canina de fazer inveja a qualquer “rottweiler”, contrariando, assim, o quanto disposto no art.101 da nossa Carta Magna, que no seu art. 101 assim dispõe:

O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada” (grifo nosso).

Viu-se, pois, a Constituição Federal ser violentada pelo “senhor ex-presidente” por diversas vezes, sem que seu guardião, o STF, ou pelo menos um dos seus centuriões, movesse uma só palha - suas espadas nem pensar - em defesa de sua integridade. Viu-se à época uma Constituição órfã. Só se pode depreender que nossa Corte Suprema (?) o teme; um temor reverencial, que pensávamos se dever ao tão só fato de sua investidura no cargo de Presidente da República, pensamento esse que agora se desfez.

Pergunta-se: em que momento o paciente ora em foco sofreu ou se viu ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder? Nenhum! Durante todo esse tempo o “senhor ex-presidente” não sofreu qualquer restrição ao seu direito de ir e vir, nem legal e muito menos ilegal. Abusou até da liberdade a que tem direito. Em suas carreatas quando não instigou a violência em caso de vir a ser preso, deixou de repreender seus aficionados quando dessa forma se comportaram. A simples designação de audiência de instrução de seu processo foi motivo para que seu partido convocasse até estrangeiros para aderirem aos protestos contra seu indiciamento.

Se teve alguém ameaçado nesse contexto foi o juiz instrutor do feito. Em uma das assentadas para instrução do processo, o Brasil assistiu seu, do “senhor ex-presidente”, desplante ao fazer uma ameaça velada ao juiz, nos seguintes termos: “Tiverem sinais de que eu serei absolvido, prepare-se porque os ataques ao senhor vai (sic) ser muito mais fortes...”.  Por isso não foi sequer admoestado pelo magistrado. Dir-se-á: uma tolerância plenamente justificada: ele é ignorante. Não! Ele foi Chefe do Estado brasileiro por duas vezes. Se não sabia, nesse período, certamente, aprendeu que às instituições deve, acima de tudo, respeito; e mais, sabe o peso que tem suas palavras para os seus simpatizantes. Não soou só como uma explícita incitação à violência contra o juiz; extrai-se de sua expressão - falada e fisionômica - uma verdadeira determinação, uma ordem, para execução. Não conseguimos diferençar o que dissera ele do que dizem os chefes de facções criminosas aos seus subordinados quando querem a eliminação de um elemento da organização por traição. Não!, não estamos sendo levianos. Ainda hoje pairam dúvidas sobre as mortes de Toninho do PT e Celso Daniel.

Vale registrar que a ameaça foi para o caso de ele, o “senhor ex-presidente”, vir a ser absolvido. O  seu pleito para a concessão de habeas corpus e decretada foi sua prisão. O que há por vir? O Ministro Edson Fachin já experimenta ameaças. Após o julgamento, o prédio em que a Ministra-Juiza Carmen Lúcia tem um imóvel foi pichado. Decretada a prisão, a senadora Gleisi  Hoffmann, mulher sabidamente instruída, com escolaridade de nível superior, tomou as dores do condenado e o defendeu – ao estilo guardiões da Constituição (armada de espada, unhas e dentes) -, como se fosse ele seu marido, filho, ou pessoa de estreitíssima relação de intimidade, chegando à inimaginável extravagância ao enviar, através de vídeo aqui editado e gravado, mensagem à TV Al Jazeera, do Qatar, conclamando “o mundo árabe” a engrossar a fileira dos que reclamam a soltura do Lula.

Nós, nordestinos, de há muito, diante de pessoas, antes humildes, que se tornam arrogantes costumamos recorrer a uma velha máxima, qual seja: “Quem nunca comeu melado quando come se lambuza”. Ele, como sindicalista, já não era boa coisa. Consciente de que se tornara um carisma perante a classe trabalhadora, transformou-se em prepotente. Feito Presidente da República, só não foi visto como mudado, para pior – prepotente, intransigente -, aos olhos daqueles que cegamente o admiram.

Pois é, dessa forma se comportou perante um juiz federal. Faltou com o devido respeito para com a representante do Ministério Público Federal, a quem naquela mesma sessão de audiência, volta e meia, a chamava de “querida”, pelo que, aí sim, foi chamado pelo condutor da instrução a comportar-se de maneira conveniente. E mais, numa audiência em que deveria tão somente se limitar a dar respostas às indagações do juiz, quis fazer do ambiente um palanque para discurso político. E nem por isso sem sofreu uma ríspida e merecida reprimenda. Sabia ele, é claro, que aquele ato jurídico estava sendo transmitido em tempo real pela mídia e que seus “companheiros” estavam acompanhando a transmissão. Comportou-se soberbamente para fazer ver aos seus “fanáticos” que ele ainda “é o cara”.  Todos, sem exceção, lhe devem obediência e por isso os trata da forma que bem lhe aprouver; humilha-os se bem entender fazê-lo. Nem por esses excessos - comportamental e na sua liberdade de expressão falada - sofreu violência ou coação, legal ou ilegal. 

Que fez o juiz? É de se admirar! Foi de uma condescendência paternalista. Ali, naquele momento em que foi ameaçado, estava autorizado pela lei a dar voz de prisão ao “senhor ex-presidente”; mas não o fez. E não só por tolerância, mas muito mais por sagacidade. Simplesmente, prometeu ao “senhor ex-presidente” que ele seria julgado nos termos da lei. Mas assim também não o fez; fez por menos. Prolatou a sentença condenatória, sem, contudo, decretar a prisão do condenado. Poderia, sim, decretar a prisão. Na instrução do feito o réu, hoje condenado, mostrou-se perigoso. Mas, mais uma vez, não o fez por astúcia. O réu até então não tinha – como não tem até agora, qualquer motivo que pudesse dar sustentabilidade ao seu fantasioso pedido de habeas corpus. A decretação da prisão num daqueles momentos poderia, eventualmente, dar a motivação para fundamentar a pretensão em novo pedido ou, quem sabe, num aditamento (?) ao pedido de proteção em curso, sob a alegação de que a prisão decretada era ilegal, por inexistir justa causa para tanto e, também, por não ter o juiz nem mesmo esperado o pronunciamento do “ad quem” sobre o acerto ou não do decisum, inobservando, assim, um princípio que vem sendo aqui adotado de há muito, qual seja, o princípio do duplo grau de jurisdição, princípio esse adotado pela maioria dos povos e que foi recepcionado pela jurisprudência penal pátria e que consiste em só se decretar a prisão após decisão da instância imediatamente superior, ou seja, após o réu não lograr êxito em face de eventual interposição de recurso de apelação.

Verdade é que, em 2009, o STF, socorrendo-se de parte do pensamento de Antoine Lavoisier (no STF, a depender do freguês, tudo se transforma), firmou entendimento de que para a decretação da prisão se exige o trânsito em julgado da sentença condenatória, ou seja, após esgotadas todas as vias recursais.. Repararam? 2009. Naquele ano começaram a aparecer as estrelas do ‘”MENSALÃO”. Coincidência ou não, presidia a Corte Suprema o Ministro Gilmar Ferreira Mendes. Mas em 2016 essa jurisprudência foi superada.

Portanto, no mínimo, o juiz prolator da sentença que condenou o “senhor ex-presidente”, não decretando sua prisão, agiu com a prudência recomendada. Quem sabe não tenha sido o réu orientado a provocar o juiz com o propósito de obter a justificativa que lhe faltava, e falta.

O resultado da peleja entre os centuriões não poderia ser outro: os defensores da legalidade sucumbiram. Mas era só uma batalha; outra, logo em seguida, estava por vir – a apreciação do mérito do fantasioso habeas corpus. Mas não veio logo em seguida. O Juiz-Ministro Marco Aurélio Mello, atendendo apelo de seu ego, se antecipou e disse que não participaria da continuação da sessão, pois estava de viagem marcada para o Rio de Janeiro, onde receberia um título honorífico (poderia se fazer representar). Sua ausência não obstaria o prosseguimento da sessão, mas, não se sabe se para ganhar fôlego e traçar novas estratégias ou mesmo pelo desfalque de um bravo guerreiro (ele, o vaidoso magistrado, que também acha que o direito de ir e vir do “senhor ex-presidente” só é menos valioso do que o direito à vida), foi, pela falange majoritária, sugerida e acatada – apesar de haver norma regimental estabelecendo que os habeas corpus devem ser julgados em sessão única, o que foi salientado pelo Juiz-Ministro relator - a suspensão da sessão, para o que a Juíza-Ministra Presidenta do STF, de logo, designou o dia 04 de abril para a continuação da sessão. justificando sua  determinação em face de esgotamento físico dos Magistrados-Ministros,

Falamos atrás em novas estratégias; não foi gratuitamente. Veio-nos essa possibilidade ao lembrarmos que ele, o Juiz-Ministro Gilmar Mendes, já acionou seu cérebro – a parte responsável por suas elucubrações psicóticas - e acenou para a possibilidade de se criar um novo instituto, qual seja, o habeas corpus seletivo, o qual seria aplicado caso a caso – a depender do freguês impetrante. Reforça esta nossa conjectura suas últimas declarações, em Portugal: “Ter um ex-presidente da República, um 'asset' [ativo] como o Lula, condenado, é muito negativo para o Brasil”; ''Se alguém torce para prisão de A, precisa lembrar que depois vêm B e C''. Que preocupação a dele! Aliamo-nos a essa expectativa do Juiz-Ministro Gilmar e acrescentamos: D, F e “G”. Sincera, honesta e ansiosamente torcemos para que as prisões de corruptos e corruptores alcancem todo o alfabeto – de A a Z -, sem qualquer exceção.

Graças a ele, o ministro-juiz Gilmar Ferreira Mendes, temos hoje o promíscuo quadro político que temos. Dizemos isto porque se no julgamento do recurso extraordinário nº 633.703, interposto por Leonídio Henrique Correa Bouças, candidato a deputado estadual pelo Estado de Minas Gerais nas eleições de 2010, que teve seu registro de candidatura negado em razão de condenação por improbidade administrativa, no qual se discutia a sua inelegibilidade - alguns de seus pares não seguissem o seu voto, embasado num fantasioso e fraudulento relatório, um verdadeiro enchimento de linguiça que, temos certeza, sobre ele não se debruçaram os ministros que o seguiram, sem qualquer dúvida a aquarela política do Brasil seria, a partir de então, outra. Nesse recurso se concluiu pela não aplicação da Lei da Ficha Limpa às eleições de 2010. Sobre o assunto discorremos no artigo intitulado “Lei Complementar nº 135/2010 ("Lei da Ficha Limpa") não deve ser aplicada às eleições realizadas em 2010”.

Mas ele é demais! Sim!, sim!, ele, Sua Excelência o Ministro-Juiz Gilmar Ferreira Mendes.  Agora, recentemente, em agosto do ano passado, assumiu a paternidade do primeiro habeas corpus contra a prisão após pronunciamento da segunda instância, contrariando, assim, jurisprudência do Colegiado do qual faz parte, que houve por bem em 2016 corrigir o erro cometido em 2009, erro para o qual muito contribuiu o retro mencionado magistrado -, quando, consubstanciou entendimento segundo o qual a execução da sentença se dá após o julgamento em segundo grau de jurisdição. Por incrível que possa parecer, o “doutor sabe tudo” não reivindicou para si os elogios que porventura venha a receber a sua infeliz fundamentação para a concessão (monocrática) da proteção vindicada. Segundo ele seguiu o posicionamento do jurisconsulto Ministro-Juiz Dias Toffoli. Não perderemos nosso tempo comentando as asneiras do renomado jurista, Quem somos nós? 

Neste passo vale registrar que o patrono do paciente impetrante do habeas corpus por ele deferido foi o doutor João Paulo Cunha, ex-deputado federal de inesquecível memória, pois teve marcante participação no mensalão, tendo sido condenado a cumprimento de pena privativa de liberdade por cometimento de crime de corrupção passiva. Pergunta-se: como estará o Zé Dirceu sabendo que a OAB lhe deferiu inscrição?

Ainda hoje muita gente é tomada de surpresa ao tomar conhecimento das censuráveis criações do intelecto do Juiz-Ministro Gilmar Ferreira Mendes. Nós, felizmente, não passamos por esse estado de espírito, pois tivemos a sorte de, no dia 08 de maio de 2002, ler na “Folha de São Paulo” o artigo intitulado “Degradação do Judiciário”, de autoria do professor Dalmo de Abreu Dallari, em que ele, do alto de sua integridade moral e intelectual, criticava a indicação – pelo ex-presidente FHC - do advogado Gilmar Ferreira Mendes para ocupar uma das cadeiras do Supremo Tribunal Federal. Eis um trecho da peça: “(...) O presidente da República, com afoiteza e imprudência muito estranhas, encaminhou ao Senado uma indicação para membro do Supremo Tribunal Federal, que pode ser considerada verdadeira declaração de guerra do Poder Executivo Federal ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil e a toda a comunidade jurídica. Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional”.

Motivos mil já deu o ministro-juiz para que se pleiteasse o seu afastamento da Corte Suprema de Justiça do País. No Senado Federal se avolumam pedidos nesse sentido, mas só se avolumam. Agora, por estes dias,  o causídico Modesto Carvalhosa protocolou pedido de impeachment contra ele. Mas, como os outros, vai dar em nada. O presidente do Senado Federal é o senhor Eunício Oliveira, que também tem telhado de vidro.  Reparem, o doutor Carvalhosa foi patrono do Daniel Dantas naquele imbróglio em que o Ministro-Juiz Gilmar Mendes de tudo fez de ilegal ou, no mínimo, de antiético, para tirar o pescoço do endinheirado  da guilhotina. Esse fato em nada depõe contra o ilustrado advogado; pelo contrário, tão só, agora, demonstra que ele não teve influência nos malfeitos do ministro naquele episódio; que o empenho do ministro foi em face do que representava o banqueiro para ele, ministro.

Agora, sinceramente, vemos poucas possibilidades de ele impor aos demais pares o que lhe vem na cabeça. Ele, hoje, não é mais “o cara” do STF; encontra altivas e substanciais resistências de alguns de seus pares.

Voltemos ao HC do “senhor ex-presidente”. Diante do adiamento da sessão, o causídico defensor do paciente, vislumbrando a possibilidade de prisão do seu cliente, já que o julgamento dos embargos declaratórios opostos no STJ estava marcado para o dia 26 de março, diligentemente, requereu medida liminar visando impedir uma eventual prisão antes da decisão sobre a medida protetiva requerida, no que foi - apesar de uma votação apertada, atendido pela Corte, o que reconhecemos como de justiça, pois não poderia seu representado arcar com eventual ônus decorrente de fato para o qual não concorreu. O mal maior já havia ocorrido, qual seja, a decisão de conhecer do impertinente e inepto pedido..


O MÉRITO

Como determinado pela Juíza-Ministra-Presidenta do STF, no dia 04 de abril foi instalada a sessão de prosseguimento do julgamento do habeas corpos, para na mesma se decidir sobre o “pano de fundo”, ou seja, o mérito do “supremo remédio” perseguido pelo “senhor ex-presidente”.

Foi posta à apreciação da mais Alta Corte de Justiça do País vindicação do “senhor ex-presidente” da República no sentido de que, caso viesse o Tribunal Regional Federal da 4ª Região a confirmar a sentença condenatória privativa de liberdade contra si prolatada pelo juízo da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, o decreto de prisão só pudesse ser exarado e, por fim, cumprido o mandamento sentencial quando esgotadas todas as garantias recursais a ele asseguradas pela lei, e, portanto, transitada em julgado a sentença. Vislumbrou que a esperada decretação de sua prisão seria maculada por ilegalidades: por infringir nossa Carta Magna, a legislação processual penal e o princípio da presunção de inocência           

 Invocou em seu favor o quanto estabelecido no inciso LVII do art. 5ª da Constituição Federal, que assim está redigido:

 “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; ...”.

Com amparo também no retro transcrito inciso buscou socorro no princípio da presunção de inocência.

Reforçou esse lastro invocando o inciso LXI do mesmo art. 5º da Carta Magna, que assim prescreve:

   “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei...;” e, também, se socorreu do art. 283 do Código de Processo Penal, ao qual a Lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011, deu a seguinte redação.

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.


DA LEGALIDADE DA PRISÃO

É parte principal deste nosso desafio tentar demonstrar, da forma mais cristalina possível, que, contra convenientes divergências de alguns ministros-juízes, o Supremo Tribunal Federal decidiu, acertadamente, denegar o apelo contido no habeas corpus ora em foco, retirando, assim, o óbice à execução da sentença proferida pelo juízo original, o  que faremos a seguir, pedindo sinceras desculpas aos eventuais leitores por inserirmos alguns trechos antes mencionados, mas que entendemos ser de utilidade didática.

Como sobejamente sabido, o Supremo Tribunal Federal conheceu o inepto habeas corpus preventivo impetrado pelo “senhor ex-presidente, mas, por fim, denegou a concessão do benefício nele pleiteado, qual seja, permitir que o réu se mantivesse solto até que esgotados todos recursos que estão ao seu alcance para ver-se isento da pena  a si imputada pelo cometimento dos crimes a si atribuídos.

Decidiu, assim, que é prevalente o entendimento fixado no STF em 2016 de que a prisão do condenado após o pronunciamento do juízo “ad quem”, confirmando a sentença condenatória, não fere o princípio da presunção de inocência e, tampouco, a Constituição Federal e a legislação processual penal pátrias.

Infelizmente, os vencedores, defensores dessa tese, pouco ou quase nada se empenharam em demonstrar o acerto de seus convencimentos, assentando-os na Constituição Federal e na nossa legislação processual penal. Grande parte se limitou a dizer que suas convicções não poderiam contrariar o quanto sacramentado na discussão a respeito do assunto em 2016, e que vem sendo posto em prática pelo STF em casos que tais; que essa jurisprudência é recente e que não pode ser mudada diante de caso singular. Teve julgador que admitiu ter convencimento particular em contrário, mas pelo “espírito de colegialidade” adotava o entendimento consagrado pela maioria de seus pares em 2016.

Depreendeu-se, em suma, que, mudada tão brevemente a jurisprudência atual, o Supremo Tribunal Federal transmitiria ao jurisdicionado uma sensação de insegurança jurídica; correria o risco de ser visto (mais do que já é) como um camaleão, ou seja, muda de cor conforme as circunstâncias que se lhe apresentam; que lá, no STF, tudo se transforma e se decide ao gosto do freguês. Não tiveram a coragem de admitir que a jurisprudência anterior, firmada com relação ao mesmo assunto em 2009, só se efetivou por conveniência, ou, quem sabe, até por conivência com os fatos criminosos imperantes naquele período.

A sessão do STF em que se decidiu sobre o habeas corpus do “senhor ex-presidente” foi transmitida em tempo real pela TV Justiça. Talvez, a sonegação daquele fato tenha contribuído para que grande parte da sociedade brasileira ainda esteja em dúvida quando a legalidade da decretação da prisão do senhor Luiz Inácio Lula da Silva.

Vamos à análise da fundamentação do pleito do “senhor ex-presidente”.


O INCISO LVII DO ART. 5º DA CF:

“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; ...”.

Nota-se que nos dois citados incisos, LVII e LXI, do art. 5º da Carta Constitucional são empregados vocábulos diferentes para situações diferentes. Frise-se, para situações diferentes!: “ninguém será considerado culpado ...; e, “ninguém será preso ...” (grifos nosso). Ressaltamos: CULPADO e PRESO. Nunca tivemos notícia de que os termos sejam sinônimos. Só por conveniência assim se pode considerá-los. Se porventura fossem sinônimos não haveria razão alguma para o legislador constituinte usá-los em dispositivos distintos. Vamos mais além, não haveria razão para se incluir o inciso LVII no art. 5º.  Insistimos, só se justifica essa separação por terem as palavras significados diferentes.

De uma interpretação literal e isenta de deturpação só se pode depreender que o inciso LVII da C.F. veda é que o sentenciado seja, de logo, quando da prolação da sentença, considerado culpado, só podendo assim ser considerado após o trânsito em julgado da sentença que o condenou.

Sabe-se, nosso Código de Processo Penal data de 1941. Estava, pois, em vigor quando da promulgação da Constituição de 1988. E o seu art. 393 assim dispunha:

“São efeitos da sentença condenatória recorrível:

  I - ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;

II - ser o nome do réu lançado no rol dos culpados” (grifo nosso).

Tardiamente, onze (11) anos depois, o legislador ordinário, dando mostra de que não procede com a acuidade que o povo dele espera, percebeu que o quanto estabelecido no art. 393 do CPP era visivelmente incompatível com o espírito da nossa nova Carta Magna. Uma     Constituição havida como “A Constituição Cidadã” que o Brasil jamais teve não poderia agasalhar o quanto consubstanciado naquele dispositivo, pois se traduzia numa substancial injustiça. Com a edição da Lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011, também foi revogado o nefasto dispositivo. Nefasto: 1º, porque determinava, imperativamente, não permitindo qualquer flexibilização, que o juiz ao prolatar uma sentença condenatória por cometimento de crime inafiançável, embora “recorrível”, decretasse a imediata prisão ou a conservação do réu na prisão; recorrer livre só se o crime fosse afiançável e o réu prestasse a fiança arbitrada; e, 2º, porque, também da mesma forma, impunha ao juiz o dever de determinar a inclusão do nome do condenado, por cometimento de crime afiançável ou não, no “rol dos culpados”,

Aos que não o alcançaram, rol dos culpados era o nome que se dava a um livrão (grande e grosso), à semelhança daqueles em que outrora se faziam assentamentos de nascimentos, óbitos e casamentos (em lugares longínquos deste país continental, o livrão ainda se faz presente, mas com seus dias contados).  O lançamento do nome do condenado no livrão correspondia ao registro de nascimento de um delinquente. E quantos tiveram seu nome nele lançados e mais tarde provaram ser inocentes. Nele se baseava a também famigerada ”folha corrida”, da qual muitos dependiam para conseguir um emprego. O lançamento do nome do condenado no rol dos culpados sem comprovação indubitável de sua culpa em muito contribuiu para a exclusão social de muitos. Mas, como muitos pensam, nem a Constituição nem a Lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011, o extinguiram. Ele ainda existe, mas disfarçado, adotando nova nomenclatura; ele é necessário à administração da justiça; presta-se, por exemplo, para se verificar a reincidência criminal do indivíduo. Mas os nomes dos condenados não são mais lançados no livrão, e sim em arquivo eletrônico, e só quando esgotados todos os recursos disponíveis para se verem livres das culpas a eles imputadas.

Presunção de inocência

Abraçou-se o “senhor ex-presidente” também ao retro comentado inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal para invocar em seu favor o princípio da presunção de inocência. Com isso também entende que só após o trânsito em julgado da sentença poderia ser havido como culpado e aí, sim, autorizada estaria a decretação de sua prisão.

Nós, modestamente, entendemos que também não assiste razão ao mesmo. O princípio da presunção de inocência deve ser observado, de início, no juízo “a quo”, onde são apresentados e devem ser apreciados os fatos e provas levados pelas partes. Havendo dúvidas sobre fatos e provas, essas dúvidas ao réu devem aproveitar. Levadas que sejam à apreciação do “ad quem” os fatos e provas, sob a alegação de que foram mal aferidos ou sequer apreciados pelo juízo original, e persistindo as dúvidas, também ao réu devem continuar beneficiando. Nessa instância esgotam-se as possibilidades de discussões sobre fatos e provas, donde a presunção de inocência se rende à presunção de culpa: o princípio do “in dúbio pro réu” dá lugar ao princípio do “in dúbio pro sociedade”.

Não é justo que o indivíduo tenha seu direito à liberdade tolhido por decisão única; que não lhe seja dada uma oportunidade de demonstrar o desacerto da decisão proferida no juízo original. Por isso, é-lhe concedido o benefício da presunção de inocência, que prevalece até que, em grau de recurso, no juízo “ad quem”, seja afastada essa presunção. Também não é justo que a sociedade tenha que conviver “sobressaltada” com indivíduos sobre os quais pairem suspeitas de cometimento de delitos. É por isso que, não conseguindo o condenado demonstrar sua inocência na segunda oportunidade em que lhe é dada para fazê-lo, a presunção de inocência que até então o favorecia dá lugar à presunção de culpa em favor da sociedade.

Os crimes imputados ao paciente impetrante foram apreciados pelo juízo da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, onde teve a si assegurado amplo direito de defesa. À vista de fatos e provas, convenceu-se aquele juízo da procedência da acusação e o condenou ao cumprimento de pena privativa de liberdade, sem, contudo, decretar sua prisão. O julgado foi submetido à apreciação da instância imediatamente superior, onde, repetimos, a imperfeição que encontrou no decisum foi respeitante à dosimetria da pena. Só depois de exaurida a possibilidade de interposição de recurso perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região foi, pelo juízo “a quo”,  decretada sua prisão.

Diante do que aqui expusemos, esperamos ter demonstrado a improcedência das alegações do “senhor ex-presidente” de que a decretação de sua prisão, antes de esgotados todos os recursos a si disponíveis na legislação brasileira e, consequentemente, antes de transitada em julgado a sentença a si imposta, fere ao quanto disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal e o princípio da presunção de inocência.

Vamos à análise do quanto mais se valeu o paciente.           


O INCISO LXI DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL:   

“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;...”

Depreende-se desse dispositivo que ninguém será preso – provisória, preventiva ou definitivamente (conclusivamente) - senão em flagrante delito, ou seja, quando o autor é, in loco, apanhado cometendo o crime ou, decorrido razoável lapso de tempo, capturado após, o cometimento da infração, ou por determinação de toda e qualquer ordem, escrita e fundamentada, de autoridade judiciária competente, podendo essa ordem está inserida num comando sentencial ou até mesmo em simples despacho; e, que o legislador constituinte excluiu dessa proibição os casos de transgressão militar ou crime propriamente militar.


O ART. 283 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL:

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva” (grifos nossos).

Esse dispositivo foi introduzido no Código de Processo Penal pela Lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011. E, de relance, parece que o legislador ordinário ao assim fazê-lo só transferiu a vontade expressa pelo legislador constituinte no inciso LXI do art. 5º da CF para esse dispositivo. Mas só parece! O desnecessário detalhismo na sua redação o afastou do quanto contido no retro citado dispositivo constitucional, dando margem a interpretação conveniente a quem porventura queira nele se amparar para ver a si reconhecido direito que não tem.

Carece, pois, esse dispositivo de uma análise detalhada à altura do que foi nele esmiuçado, para que cheguemos a uma inequívoca conclusão do seu verdadeiro conteúdo e do que com ele se pretendeu, e pretende.

 É tradicional na legislação penal brasileira o entendimento de que o cumprimento da pena privativa de liberdade tenha início deste que exarada a sentença condenatória nesse sentido. E isso está consubstanciado no nosso Código de Processo Penal vigente. A partir de certo momento, atendendo tendência que prosperava em vários povos, a jurisprudência nacional se consolidou no sentido de que a execução da sentença condenatória só se efetive após ter sido concedida ao réu uma segunda chance para provar sua inocência. Mas, até hoje, não está descartada a execução sem que se observe esse procedimento; a nossa lei adjetiva penal assim autoriza.

A Constituição de 1988, ora vigente - embora cambaleante em virtude de tantos vilipêndios -, por ter sido concebida com o propósito de ser a Constituição cidadã, é de razoável clareza até para os mais incultos. Enseja poucas brechas para que o Supremo Tribunal Federal seja chamado a interpretá-la. Os que usam desse expediente, a maior das vezes, o fazem por conveniência, no que, não raro, são atendidos pela Suprema Corte.

O inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal é de indiscutível clareza. Mas, por conveniência, muitos se fizeram cegos para isso não perceberem.  Vimos isso em 2009, ano em que eclodiu o escândalo do mensalão, quando interessados buscaram o STF para ver por ele sacramentada a invencionice de que a execução de sentença condenatória só poderia efetivar-se quando transpostos todos os recursos que estão à disposição do réu para ver declarada sua inocência, isto é, após o trânsito em julgado da sentença. Para isso se socorreram do quando disposto naquele inciso, que, passo atrás, presumimos ter demonstrado não ter a conotação que lhe emprestaram e ainda emprestam aqueles que veem sobre si a sombra do encarceramento antes de a pena ser alcançada pela prescrição ou que, quando determinado o seu cumprimento, já sejam dignos de deixá-la de cumpri-la por piedade, por compaixão do órgão competente (razões humanitárias), ou mesmo por já não mais se encontrarem neste plano de existência. Que fez o Colendo Supremo Tribunal Federal para atender aos reclamos dos tementes? Respondemos: ativou seu laboratório experimental do pensamento de Antoine Lavoisier e, com pedaços do inciso LVII do art. 5º da CF, transformou a infundada alegação deles em jurisprudência.

Em 2009 vigorava o art. 387 do Código de Processo Penal (Livro I, Título XII – DA SENTENÇA), que estabelecia:

“O juiz, ao proferir sentença condenatória: ...”

“Parágrafo único: “O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.(grifos nossos).

Esse parágrafo foi adicionado pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008.

Vê-se, portanto, que a justiça penal brasileira em 2008 admitia - como sempre admitiu -, em plena consonância com o inciso LXI da CF, a execução da pena antes mesmo da interposição de apelação perante o “ad quem” (decidirá sobre a manutenção da prisão, sem prejuízo da apelação que vier a ser interposta). Ora, se o juiz decidirá sobre a manutenção da prisão é porque o réu se encontrava preso. Perdoem-nos: os destinatários da ênfase não são vocês, caros eventuais leitores.

Portanto, não havia razão alguma para o STF se pronunciar como se pronunciou quando chamado a analisar, sob a ótica do inciso LVII da CF, a legalidade e constitucionalidade da decretação de prisão antes de a sentença condenatória transitar em julgado, isto é, antes de exauridos todos os recursos disponíveis ao réu para se ver havido como inocente, pois a admissibilidade desse procedimento se depreendia do conteúdo do parágrafo único do art. 387 retro transcrito.

Naquela oportunidade o Supremo Tribunal Federal, ultrapassando sua competência e usurpando prerrogativa do Legislativo, legislou. Dizemos legislou, pois a partir de 2009 a “jurisprudência” por si consolidada passou a ser fundamento jurídico para atender às súplicas dos condenados ao cumprimento de prisão privativa de liberdade, para se verem autorizados a não cumpri-la antes do trânsito em julgado da sentença condenatória conclusiva.

Por tudo quanto expusemos, autorizados estamos a concluir que a edição do art. 283, que a Lei nº 12.403/2011 diz ter dado nova redação ao antigo art. 283 – o que não é verdade, pois o conteúdo de um não tem nada a ver com o do outro; o antigo dispunha: “A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio”, disposição essa que a mesma Lei nº 12.403/2011, transferiu,“ipsis litteris”, para o § 2º do criado art. 283 – foi uma contrapartida do Legislativo (dos congressistas sobre os quais recaem inúmeras denúncias, de todo gênero)  ao STF, por acolher seus inconsistentes argumentos - que mais cedo ou mais tarde hão de assim ser reconhecidos -, dando-lhe respaldo para contra-argumentar procedentes inconformações  contra sua fixada e malfadada jurisprudência.

O pecaminoso art. 283 incluído pelo legislador ordinário com a edição da Lei nº 12.403/2011, no seu caput, exterioriza uma desastrada, escandalosa e tendenciosa meticulosidade.  Confrontemos os dois dispositivos.


 O INCISO LXI DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: 

“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;...”

Diz o inciso que ninguém será preso senão:

  1. em flagrante delito ou
  2. por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária.

O ART. 283 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL:

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva” (grifos nossos).

Subentende-se do artigo que ninguém será preso senão:

  1. em flagrante delito;
  2. por ordem escrita e fundamentada da autoridade competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado; e,
  3. no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Observa-se facilmente que o legislador ordinário, maliciosamente, dá ao art. 283 uma redação que o afasta do conteúdo do inciso constitucional. Assim é que só à ordem emanada de autoridade judiciária competente, em sentença condenatória transitada em julgado, dá o poder para decretar a prisão, quando o dispositivo constitucional não reconhece essa exclusividade. O art. 283 do CPP, assim, não reconhece, sem qualquer razão, tal efeito à sentença condenatória conclusiva.

A pressa é inimiga da perfeição. Dissemos linhas atrás, ao comentarmos o inciso LVII do art. 5º da CF, que o art. 393 do CPP fora revogado pela mesma Lei nº 12.403/2011. Ocorre que esse artigo versava sobre os efeitos da sentença condenatória recorrível e, com sua revogação, imperativo era se editar um substitutivo que contemplasse os efeitos da sentença condenatória recorrível, é claro, sem a parte censurável e motivadora da sua revogação. E isso não tardou. Verificou-se que o CPP também se encontrava omisso quanto à detração, por ter o réu cumprido parte da pena privativa de liberdade em virtude de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação. Em razão disso, foi editada a Lei nº 12.736, de 30 de novembro de 2012, para acrescer ao art. 387 dois parágrafos para suprirem tais omissões. O parágrafo 1º, que nos interessa no momento, reza:

“O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta (grifos nossos).

Um tiro no próprio pé do malicioso legislador ordinário. Tudo quanto pretendeu ele com a tendenciosa redação de que fez uso no art. 283 do CPP -  não bastasse conflitar com o preceito constitucional constante do inciso LXI do art. 5º da CF - cai por terra diante do que dispõe esse parágrafo. Ora, se o juiz decidirá sobre a manutenção da prisão ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva, mais evidente não se pode conceber que a prisão privativa de liberdade pode ser decretada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória; até mesmo antes de que faça uso o condenado de recurso de apelação ao “ad quem”.

Acreditamos que até aqui está suficientemente demonstrado que não se pode ter como ilegal, e muito menos inconstitucional. o decreto de prisão privativa de liberdade alicerçado em comando sentencial, prolatado por quem de direito, escrito e devidamente fundamentado. “Melhor do que isso só dois disso”. E pior, para aqueles que insistem em não reconhecer a legalidade e constitucionalidade desse procedimento, “tem dois disso”. Senão vejamos.

O art. 669, que se agasalha no Livro IV (Da Execução), Título I (Disposições Gerais), do Código de Processo Penal, assim preceitua:

“Só depois de passar em julgado, será exequível a sentença, salvo:

        I - quando condenatória, para o efeito de sujeitar o réu a prisão, ainda no caso de crime afiançável, enquanto não for prestada a fiança; ...” (grifo nosso).

        No art. 674 do nosso CPP, residente também no Livro IV, Título II (Da Execução das Penas em Espécie), Capítulo I (Das Penas Privativas de Liberdade), assim está consignado:

        “Transitando em julgado a sentença que impuser pena privativa de liberdade, se o réu já estiver preso, ou vier a ser preso, o juiz ordenará a expedição de carta de guia para o cumprimento da pena (grifo nosso).

         Desnecessário comentar esses dispositivos, pois claros de doer os olhos.

         Felizmente, em 2016 a tendenciosa jurisprudência firmada no STF em 2009, por força, também, de conveniência, cedeu lugar ao legítimo entendimento de que para a decretação de prisão privativa de liberdade não se faz necessário o trânsito em julgado da sentença condenatória. Dizemos por conveniência pelo fato de a discussão sobre a amoralidade  daquele entendimento até então prevalente ter ocorrido pela pressão do clamor popular, em face da exposição pela operação “Lava Jato” do mar de corrupção em que o Brasil estava e está mergulhado.  Não se deu ênfase à sua inconstitucionalidade e ilegalidade.  Mas aqui tentamos - modestamente e da forma mais didática ao nosso limitado alcance encontrada, demonstrar que, concluindo da forma como concluiu o Supremo Tribunal Federal, mesmo que involuntariamente, observou os comandos contidos na Constituição Federal da República Federativa do Brasil e na legislação processual penal pátria.           


CONCLUSÃO           

Diante do quanto aqui expusemos, esperamos que, convincentemente, tenhamos demonstrado que a prisão do “senhor ex-presidente” se impôs; e, que a jurisprudência ora reinante no STF, respeitante ao início do cumprimento da pena, por ser legal e acima de tudo constitucional, deve se manter incólume. Uma nova reviravolta na jurisprudência assentada a partir de 2016, atendendo (pasmem!) inexplicáveis súplicas de ministros-juízes do próprio STF - mais veementes do que as dos mais diretamente interessados – além de implicar em acatamento de vindicação ilegal e inconstitucional, transparecerá ao jurisdicionado brasileiro uma inconcebível tibieza do Supremo Tribunal Federal no exercício do múnus que lhe compete; e, também facultará ao jurisdicionado o direito de considerá-lo um laboratório experimental do pensamento de Antoine Lavoisier, onde tudo se transforma ao gosto do freguês ou um camaleão, que muda de cor de conformidade com as convenientes circunstâncias que se lhe apresentam.


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