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Estudo comparado sobre a Emenda Constitucional nº 45/2004

Estudo comparado sobre a Emenda Constitucional nº 45/2004

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Índice:1.Introdução; 2.Novo princípio aplicado aos processos judiciais e administrativos; 3.Eficácia dos tratados internacionais sobre direitos humanos; 4.Submissão à jurisdição de Tribunal Penal Internacional; 5.Ação interventiva no caso de recusa à execução de lei federal; 6.Novo órgão do Poder Judiciário; 7.Ingresso na Magistratura e no Ministério Público; 8.Promoção dos Magistrados; 9.Vitaliciedade dos Magistrados; 10.Residência do Magistrado e do Membro do Ministério Público; 11.Remoção, Aposentadoria e Disponibilidade do Magistrado; 12.Remoção ou Permuta a Pedido dos Magistrados; 13.Publicidade dos atos Judiciais; 14.Órgão Especial do Tribunal; 15.Fim das Férias Forenses; 16.Delegação das atividades de mero expediente; 17.Distribuição imediata de processos; 18. "Quarentena" do ex-magistrado e do ex-membro do Ministério Público; 19.Destinação das custas e emolumentos; 20.Proposta Orçamentária, 20.1.Elaboração da Proposta pelo Poder Judiciário; 20.2.Elaboração da Proposta pelo Ministério Público; 20.3.Elaboração da Proposta pela Defensoria Pública Estadual; 21.Mudança na Competência do STJ e STF; 22.Ação Declaratória de Constitucionalidade e Declaratória de Inconstitucionalidade (ADIN e ADECON); 23.Aprovação da Escolha de novo membro para Composição do STJ; 24.Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam); 25.Conselho da Justiça Federal; 26.Justiça Itinerante; 27.Funcionamento Descentralizado dos Tribunais; 28.Federalização dos Crimes que Violam Gravemente os Direitos Humanos; 29.Tribunal Superior do Trabalho; 30.Justiça do Trabalho; 31.Competência da Justiça do Trabalho; 32.Dissídio Coletivo; 33.Composição dos Tribunais Regionais do Trabalho; 34.Justiça Militar Estadual; 35.Justiça Agrária; 36.Inamovibilidade do membro do Ministério Público;37.Súmula Vinculante;38.Notas;39.Bibliografia


1.Introdução:

A intenção na elaboração do presente material é dar ao operador do direito uma noção do que foi alterado em nossa Constituição Federal em virtude dessa nova Emenda Constitucional, de nº 45/04.

A presente Emenda Constitucional teve origem com a apresentação de um Projeto de Emenda Constitucional (PEC de nº 96/92) pela Câmara dos Deputados em 1992. Ao passar pelo Senado Federal passou a ter o nº 29/2000.

Cabe frisar que o projeto inicial foi dividido, sendo que parte dele se tornou a Emenda 45/04 e outra parte, que tem o nº 29A/2000, aprovada em dois turnos pelo Senado, teve que retornar à Câmara dos Deputados para nova apreciação em função do princípio do bicameralismo. Esta PEC 29A/2000 está na Câmara dos Deputados para apreciação sob o nº 358/2005

No material abaixo se evitou comentar o novo projeto para não trazer problemas àqueles que poderão usar o texto para estudar para concursos.


2.Novo Princípio Aplicado aos Processos Judiciais e Administrativos:

Foi acrescentado um novo inciso no art. 5º. Este novo inciso, de número LXXVIII, institui um novo princípio aplicado no âmbito dos processos judiciais e dos processos administrativos, que é o Princípio da razoável duração do processo. Além desse princípio, o mesmo inciso assegura meios que garantam a celeridade da tramitação do processo. Contudo, não menciona qual é o tempo considerado razoável, nem quais os meios a serem utilizados no caso de descumprimento do prazo considerado razoável.

Conforme o próprio parágrafo 1º deste artigo, tal norma tem aplicação imediata, mas dependerá de outras normas para garantir a eficácia prática deste inciso. Interessante discutir quais seriam as ferramentas processuais passíveis de serem utilizadas quando da demora excessiva da duração de um processo.

Independentemente da ferramenta a ser utilizada, o certo é que na situação atual, em que os magistrados estão sobrecarregados de processos, o requerimento por um julgamento rápido não irá ter muita eficácia se não vier acompanhada de reformas processuais que realmente visem à economia processual.

É certo que houve uma evolução por parte do Constituinte Derivado ao instituir mais essa cláusula pétrea, defendendo o que já foi estabelecido no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, pois de nada adianta garantir acesso ao Poder Judiciário para apreciar lesão ou ameaça a direito se não há uma garantia de quando essa ameaça será apreciada. O Poder Judiciário deve ser um órgão atuante na aplicação na norma aos casos concretos que lhes são submetidos. De nada adianta garantir o acesso ao Poder Judiciário sem garantir um acesso digno, na qual este Poder deverá dar a resposta à lide que lhe foi submetida num prazo razoável.

É preciso, contudo, dar a este Poder ferramentas para que ele possa trabalhar de maneira adequada, dando ao povo a solução num prazo razoável. Cabe frisar que o Poder Judiciário apenas aplica a lei ao caso concreto, e que as leis são editadas pelo Poder Legislativo. Havendo problemas que dificultam a rápida tramitação processual, caberá também ao Poder Judiciário indicar ao Legislativo propostas para alteração legislativa com fulcro no rápido desenvolvimento processual.

Nesta Emenda já encontramos uma grande mudança, que é a criação da Súmula Vinculante, o que já beneficiará os usuários da Justiça, posto que há diversas lides levadas ao STF e ao STJ apenas no intuito de obstar o direito da parte contrária, causando, com isso, um abarrotamento de processos nos tribunais superiores.

É certo, contudo, que esta é apenas uma medida para agilizar o encerramento de um processo. No entanto, como mencionado, outras serão necessárias para que os processos sejam julgados num prazo menor, função que já foi atribuída ao Congresso Nacional, conforme se verifica pela leitura do art. 7º desta Emenda:

Art. 7º. O Congresso Nacional instalará, imediatamente após a promulgação desta Emenda Constitucional, comissão especial mista, destinada a elaborar, em cento e oitenta dias, os projetos de lei necessários à regulamentação da matéria nela tratada, bem como promover alterações na legislação federal objetivando tornar mais amplo o acesso à Justiça e mais célere a prestação jurisdicional.


3.Eficácia dos Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos:

Antes da entrada em vigor desta Emenda, o Supremo Tribunal Federal já havia se posicionado sobre a hierarquia dos tratados em relação ao Direito Interno, sendo dada a posição de que os tratados internacionais têm eficácia de lei ordinária, não podendo tratar de norma referente à lei complementar, nem ser contrária à esta ou à norma Constitucional. Um dos fundamentos da decisão do Pretório Excelso é que o art. 49, inciso I, da CF/88 dispõe ser da competência do Congresso a aprovação de tratados internacionais que tragam encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. A disposição de tal artigo, em conjunto com o art. 47, que estipula serem tomadas as deliberações por maioria simples (maioria dos presentes de cada casa, desde que presentes a maioria absoluta dos membros da respectiva casa), nos demonstra que a aprovação de um tratado é feita pela mesma quantidade de membros exigida para a aprovação de uma lei ordinária. A Professora Flávia Piovesan é uma das doutrinadoras que se posicionou contra a decisão do STF, justificando que o art. 5º, § 2º, da Constituição Federal estabelece que os direitos e garantias expressos na Constituição "não excluem outros decorrentes de acordos ou tratados internacionais", e que, as normas e garantias fundamentais têm aplicação imediata (art. 5º, §1º, da CF/88).

Com a entrada em vigor desta Emenda acabou a polêmica sobre a hierarquia dos tratados internacionais sobre direitos humanos em face da Constituição, posto que a partir desta, todos os tratados aprovados pelo Congresso Nacional por três quintos dos membros de cada uma das casas legislativas, em dois turnos de votação, serão equivalentes às emendas constitucionais, conforme anteriormente defendido pela profª. Flávia Piovesan, ou seja, terão eficácia de norma constitucional, e de acordo com o § 1º da Constituição Federal, terão aplicação imediata, não dependendo de nenhuma outra lei ou decreto para entrar em vigor ou ter validade.

Apenas para relembrar, o processo de entrada em vigor dos tratados internacionais não mudará, ou seja, haverá a negociação, a assinatura pelo Presidente da República, a aprovação pelo Congresso Nacional da matéria a ele submetida (por três quintos dos membros de cada casa em dois turnos de votação – matéria sobre Direitos Humanos para que tenha hierarquia constitucional - ou maioria simples nos demais casos), ratificação do Tratado pelo Presidente da República, não havendo a necessidade de publicação de Decreto Presidencial para que o mesmo entre em vigor nos casos de tratados sobre Direitos Humanos (conforme art. 5º, § 1º) e havendo necessidade de publicação de decreto presidencial para dar eficácia ao tratado nos demais casos.


4.Submissão à Jurisdição de Tribunal Penal Internacional:

O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, assinado em 17/07/1998, do qual o Brasil é signatário, conforme Decreto Legislativo 112/2002, entrou em vigor para o nosso país a partir de 01/07/2002.

A nossa Constituição, até então, era omissa quanto à submissão à jurisdição de Tribunal Penal Internacional. Agora, com a Emenda, foi acrescentado o § 4º do art. 5º da Constituição Federal, descrevendo que "o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão".

O Tribunal Penal Internacional tem sede em Haia e competência para julgar os crimes mais graves que afetam a comunidade internacional. Nestes termos, tem competência para julgar os seguintes crimes, conforme disposto no art. 5º do Estatuto de Roma:

- Crime de genocídio;

- Crimes contra a humanidade;

- Crimes de guerra;

Para melhor compreensão do tema recomenda-se a leitura dos artigos 5º ao 8º do Estatuto de Roma.


5.Ação Interventiva no caso de recusa à execução de lei federal:

A Constituição Federal estipula em seu art. 36, inciso III, quem são as pessoas que poderão dar provimento para que seja decretada a intervenção federal por não atendimento aos princípios constitucionais sensíveis, dispostos no art. 34, inciso VII. A decretação nestes casos não muda. Continuará a depender de provimento do STF, de representação do Procurador-Geral da República. O que muda é que além dos casos previstos no inciso VII do art. 34, a decretação de intervenção nos casos de recusa a execução de lei federal passará a depender de provimento do STF (e não do STJ como era antes), de representação do Procurador-Geral da República.

Importante ressaltar que o inciso VI do art. 34 já garantia a intervenção federal no caso de recusa por parte dos Estados e Distrito Federal em cumprir ordem ou decisão judicial, bem como para prover a execução de lei federal. A diferença é que a decretação da intervenção dependia de provimento do STJ, de representação do Procurador-Geral da República.


6.Novo órgão do Poder Judiciário:

São órgãos do Poder Judiciário, além dos anteriormente dispostos no art. 92 da CF/88 (Supremo Tribunal Federal; Superior Tribunal de Justiça; Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; Tribunais e Juízes do Trabalho; Tribunais e Juízes Eleitorais; Tribunais e Juízes Militares; Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios), o Conselho Nacional de Justiça, órgão criado por essa Emenda.

O Conselho Nacional de Justiça, assim como os Tribunais Superiores e o Supremo Tribunal Federal, terá sede em Brasília, mas diferentemente destes, não terá jurisdição em todo território nacional, como expressamente disposto em relação aos Tribunais Superiores e Supremo Tribunal Federal.

Cabe aqui relembrar o conceito de jurisdição. Jurisdição é a função dada ao Poder Judiciário para que este, por meio de seus magistrados, substitua as partes na solução dos conflitos de interesses qualificado pela pretensão resistida, aplicando o direito abstrato ao caso concreto que lhe foi submetido. O Conselho Nacional de Justiça é um órgão criado com outra finalidade. Não foi criado para ser um órgão julgador como o são os Tribunais e Juízes.


7.Ingresso na Magistratura e no Ministério Público:

O ingresso na carreira da Magistratura pode ser feito por três diferentes formas:

- Por indicação do Presidente da República após aprovação por maioria absoluta do Senado Federal para o cargo de Ministro do STF;

- Por meio do quinto constitucional, garantindo-se aos integrantes do Ministério Público e advogados o ingresso nos Tribunais, desde que respeitadas as exigências constitucionais (conforme art. 94). Frise-se que o ingresso no STJ deve ser feito na forma do art. 104, parágrafo único, incisos I e II.

- Por meio de concurso público, de provas e títulos, no cargo de juiz substituto.

Apenas aquele que entra no cargo de juiz substituto por meio de concurso público não tem a vitaliciedade adquirida desde a posse. Todos os outros que ingressam diretamente nos Tribunais já adquirem a vitaliciedade desde a posse.

Para que seja possível o ingresso de uma pessoa no cargo de juiz substituto, mais um requisito deve ser atendido: Três anos de atividade jurídica. Este mesmo requisito é aplicado à carreira do Ministério Público.

Muitos Concursos para ingresso na carreira da Magistratura já exigiam experiências mínimas (que normalmente era de dois anos, a exemplo dos concursos para magistratura do estado de São Paulo e Federal da 3ª Região, realizados em 2004) para que o candidato aprovado em concurso possa ingressar na Magistratura. Agora se padroniza um prazo de experiência mínima, exigido pela Constituição Federal, o que acabará com qualquer discussão sobre a Constitucionalidade ou não da experiência que era requerida até então.

Resta, no entanto, saber se o prazo ali descrito deve ser contato até a data da inscrição, ou até a da posse do candidato. Entendo que, pela redação do dispositivo, o prazo deve ser contado até a data da posse e não até a data da inscrição em concurso, pois se exige o prazo mínimo de três anos para ingresso e não para inscrição. Qualquer disposição em contrário poderá ser passível de mandado de segurança por parte do concursando, haja vista que o ingresso ocorrerá após a posse.

É bom lembrar que a Constituição Federal não mencionou a exigência de um determinado prazo e sim de um prazo mínimo. Com isto, num futuro próximo, poder-se-á vislumbrar editais de concursos exigindo prazos de experiência superiores aos 3 anos, questão que trará de volta a discussão sobre a Constitucionalidade ou não dessa exigência adicional.

Outra questão que talvez será regulamentada é o que vem a ser atividade jurídica. O delegado de polícia exerce atividade jurídica? Entendo que sim. Mas e o investigador? O escrivão? O Oficial de Justiça? O Oficial do Ministério Público? O Técnico Judiciário? São funções que de certa forma estão ligadas com a atividade jurídica. Importante lembrar que muitas funções são incompatíveis com a prática da advocacia, o que poderá dificultar o acesso à magistratura e ao Ministério Público destes servidores caso suas funções não sejam consideradas como prática jurídica.

E no caso do advogado? Bastará ter a carteira da Ordem e a anuidade paga para atender à atividade jurídica requerida? Ou precisará ter um número mínimo de processos por ano para que seja considerada essa atividade? Caso seja requerido número mínimo de processos, como ficará a situação daquele que foi contratado como um consultor jurídico, ou daquele que presta serviço com consultor? E o estagiário, que possui carteira da OAB? Poderá ter o tempo de estágio computado como experiência? Todas essas questões e muitas outras só serão respondidas com o tempo, ou por meio de regulamentação, ou por meio da exigência feita pelos editais e possíveis decisões sobre mandados de segurança impetrados por aqueles que entendam ter uma função considerada como jurídica.


8.Promoção dos Magistrados:

Na promoção dos magistrados, que deve ser feita de entrância inferior para entrância superior, devem ser levados em consideração o disposto nas alíneas do inciso II do art. 93. A novidade é a aferição do merecimento medida por meio do desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza.

Anteriormente dispunha a Constituição que a aferição era feita por meio de critérios de presteza e segurança, sem mencionar se esses critérios eram objetivos ou subjetivos. Agora, houve a supressão do critério de segurança no exercício da jurisdição como meio para aferição da promoção.

Deve-se ter cuidado com estes critérios objetivos de produtividade, pois a função jurisdicional exercida pelos magistrados deve ser de qualidade ímpar. Tais critérios objetivos deverão ser cautelosamente discutidos para que não transformem o magistrado num mero sentenciador, o que definitivamente ele não é, posto que é o representante do Estado, designado por este para substituir as partes na solução dos conflitos. Sua função é e deverá continuar sendo exercida com qualidade e com segurança jurídica, apesar da supressão desta no critério de avaliação.

Na recusa de promoção por antigüidade, que deve ser feita por voto de dois terços dos membros do tribunal, acrescenta-se à Constituição Federal que esta recusa deve ser fundamentada e garante-se expressamente ao magistrado que teve sua promoção recusada o direito à ampla defesa.

Acrescentou-se um caso em que o juiz não terá direito à promoção, que está disposto no art. 93, II, "e", que assim dispõe: "não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão".

Não se menciona por quanto tempo este magistrado não terá direito à promoção. Supondo que um juiz acabou por retardar o andamento de um processo por culpa e por este motivo não foi promovido. Ele continuará não tendo direito à promoção independentemente do tempo transcorrido? Mesmo que ele atue de forma exemplar no decorrer deste tempo, ele ainda poderá ser penalizado por aquele fato? Entendo que não. Espero que tal explicação seja dada pela nova Lei Orgânica da Magistratura, de iniciativa do STF.

Conforme art. 129, § 4º, aplicam-se ao Ministério Público, no que forem cabíveis, as disposições acima, previstas no art. 93.


9.Vitaliciedade dos Magistrados:

Nota: Lembre-se que o tema aqui tratado refere-se apenas àqueles que ingressam na Magistratura por meio de concurso público de provas e títulos, pois aqueles que ingressam na carreira diretamente nos tribunais já adquirem a vitaliciedade desde o exercício efetivo após a posse.

Será etapa obrigatória do processo de vitaliciedade a participação em curso oficial ou reconhecido por escola nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados, sendo que esta participação e aproveitamento também serão utilizados como critério de aferição para a promoção dos magistrados.

O prazo para aquisição da vitaliciedade ainda continua sendo de dois anos, porém note que a alteração deste prazo é tema do Projeto de Emenda que tramita no Congresso.


10.Residência do Magistrado e do Membro do Ministério Público:

O magistrado e o membro do parquet deveriam residir apenas na respectiva comarca. Com a Emenda 45/04, eles continuam obrigados a residir na respectiva Comarca, porém poderá obter autorização do tribunal para que possa residir em outra comarca. Note, porém, que há leis que determinam a residência apenas na comarca.


11.Remoção, Aposentadoria e Disponibilidade do Magistrado:

O ato de remoção, aposentadoria ou disponibilidade do Magistrado dependia de decisão de dois terços do membro do respectivo tribunal. Atualmente dependerá de voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça.

Surge aqui uma das atividades do Conselho Nacional de Justiça, que poderá promover a remoção do magistrado, aposentá-lo ou pô-lo em disponibilidade, sendo assegurado ao magistrado o direito à ampla defesa.


12.Remoção ou Permuta a Pedido dos Magistrados:

A remoção (que é o deslocamento a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede, conforme se extrai do art. 36 da Lei 8.666/90) ou permuta de comarca de igual entrância deverá atender, no que for compatível, os mesmos requisitos para a promoção disposta nas alíneas "a", "b", "c", e "e" do inciso II do art. 93.


13.Publicidade dos atos Judiciais:

A publicidade dos atos judiciais é um dos princípios assegurados pela Constituição Federal. Tal princípio só sofrerá limitação nos casos em que o interesse público o exigir e nos casos de preservação da intimidade das partes, conforme disposto no art. 155 do Código de Processo Civil. A Constituição Federal inova no fato de que passa a assegurar o direito à intimidade, desde que esse direito não afronte outro direito maior, qual seja, o interesse público.

Aqui a Constituição coloca dois princípios em confronto, estabelecendo que, caso ocorra o conflito entre o direito à intimidade e o interesse público à informação, este último deverá prevalecer.

Poderão surgir questionamentos sobre a inconstitucionalidade do dispositivo sob o argumento de que haverá violação ao direito de intimidade, o que se refuta pelo motivo de que a previsão constitucional anterior previa a limitação "se o interesse público o exigir" apenas. Ademais, diante do confronto de dois direitos constitucionais, deverá prevalecer o de maior valor, que no caso seria o interesse público à informação.

Além da alteração em relação à publicidade dos atos judiciais em comento, a Constituição Federal ainda assegura a publicidade das decisões administrativas dos tribunais, conforme alteração do inciso X do art. 93.


14.Órgão Especial do Tribunal:

Estabelece-se agora qual a forma de provimento das vagas do órgão especial do Tribunal, que poderá ser criado nos tribunais em que haja mais de vinte e cinco membros. Este órgão poderá ser criado, sendo suas vagas preenchidas da seguinte forma:

- Metade pelo critério de antigüidade;

- Metade por eleição do Tribunal Pleno.

Além disso, houve uma correção no texto anterior quanto à atribuição desse Órgão Especial. O texto anterior previa que o órgão poderia ser criado "para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais da competência do tribunal pleno". No atual texto as atribuições deste órgão serão delegadas pelo Tribunal pleno.


15.Fim das Férias Forenses:

A atividade jurisdicional passa a ser ininterrupta, não podendo haver férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau.

Para assegurar a atividade ininterrupta, a Constituição ainda estabelece que, mesmo nos dias em que não houver expediente forense normal, deverá haver juízes em plantão permanente.

Como a Emenda Constitucional foi publicada em 31/12/2004, gerando efeitos imediatos a partir de sua publicação, os fóruns e cartórios deveriam estar abertos para atendimento desde aquela data, devendo ser encerrado o recesso. A exemplo disto o Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio do Conselho Superior da Magistratura, publicou comunicado de nº 01/2005, informando que não mais subsistiu o feriado forense de 02 a 31 de janeiro, conforme texto extraído deste comunicado: "... Comunica, mais, que os Ofícios de Justiça deverão observar, a partir de janeiro de 2005 (inclusive), a disciplina ordinária de funcionamento e de atendimento a advogados, estagiários e público em geral (Provimento CSM n° 888/2004), sem prejuízo da suspensão dos prazos imposta pelo Provimento CSM n° 896/2004 para o período de 2 a 31/1/2005 e respeitada a irreversível redução do quadro funcional decorrente de prévia e já aprovada escala de férias dos servidores para referido período.

(DOE Just., 4/1/2005, Caderno 1, Parte I, p. 1)


16.Delegação das atividades de mero expediente:

A nova Lei Orgânica da Magistratura deverá disciplinar ainda a delegação para servidores de atos administrativos e das atividades de mero expediente sem caráter decisório. A norma constante do inciso XIV do art. 93 tem eficácia limitada, dependendo de lei para ter seus efeitos esperados.


17.Distribuição imediata de processos:

Os processos deverão ser distribuídos imediatamente em todos os graus de jurisdição. No Ministério Público a distribuição também deverá ser imediata


18."Quarentena" do ex-magistrado e do ex-membro do Ministério Público:

A Constituição possui dois novos incisos que estabelecem vedações ao magistrado, visando à imparcialidade de seus atos no exercício da jurisdição:

A primeira delas é a vedação de receber auxílios ou contribuições, ressalvadas as exceções previstas em lei, que se estende ao membro do Ministério Público, conforme art. 128, § 5º, "f". Tal vedação já existe na Lei 8.112/1990, que agora passa a ser vedação constitucional para o Magistrado.

Outra vedação criada é a de que o ex-magistrado e o ex-membro do Ministério Público serão proibidos de exercer a advocacia no juízo ou tribunal em que atuavam por um período mínimo de três anos do afastamento por aposentadoria ou exoneração.

Interessante lembrar que essa quarentena especificou os casos em que essas pessoas serão proibidas de exercer a atividade advocatícia (aposentadoria ou exoneração). O Constituinte não mencionou os casos de demissão, nem de remoção. Imagine a seguinte situação: Um magistrado que atuou vários anos em uma determinada comarca "A" e pediu remoção para outra, "B", na qual atuou por menos de um ano e se aposentou. Pergunta: Esse magistrado estaria proibido de exercer a advocacia por um período mínimo de três anos na comarca "B" apenas, ou nas comarcas "A" e "B"?

Pelo teor da criação do dispositivo, entendo que o mesmo visa evitar que o ex-integrante aproveite-se da situação e status que possuía. Portanto, seguindo os motivos da criação do dispositivo, o ex-integrante estaria proibido de exercer a atividade jurisdicional em ambas comarcas pelo prazo de três anos desde o momento em que ele deixou de exercer a função em cada uma delas, mesmo não constando do dispositivo a remoção como causa para a quarentena. Numa interpretação restrita ao texto do dispositivo entenderíamos que o magistrado só seria proibido de exercer a função jurisdicional na última comarca (comarca B), posto que na comarca anterior (comarca A), ele se afastou por remoção.

É certo que só teremos a pacificação desta dúvida com a aplicação deste dispositivo ao caso concreto pelos tribunais.


19.Destinação das custas e emolumentos:

As custas e emolumentos devem ser aplicados única e exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades judiciais, tendo em vista inclusive o caráter destas custas, que são taxas e que em virtude disto não deveriam ser utilizadas para custear nada além dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça.


20.Proposta Orçamentária:

20.1.Elaboração da Proposta pelo Poder Judiciário:

O Poder Judiciário é um dos Poderes da República. É independente e autônomo. Para garantir a autonomia é que há a previsão de elaboração de propostas orçamentárias pelo próprio Poder Judiciário. Tal proposta, entretanto, deve ser estabelecida dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Isto faz com que o Poder Judiciário participe da formação de seu orçamento, entrando num terreno que envolve decisões políticas.

As novas mudanças trazidas pela EC45/04 são:

Os órgãos encarregados da elaboração das propostas orçamentárias devem encaminhar as propostas dentro do prazo estabelecido pela LDO. Caso isto não ocorra, o Poder Executivo considerará os valores aprovados na lei orçamentária vigente, com os ajustes feitos conforme limites estipulados pela LDO.

Se a proposta for encaminhada em desacordo com os limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes definido pela LDO, caberá ao Poder Executivo proceder aos ajustes necessários para fins de consolidação da proposta orçamentária anual.

Durante o exercício, não poderá haver despesas ou assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na LDO. Esta é a regra. A exceção admitida é se essas despesas ou assunção de dívidas forem previamente autorizadas, por meio de abertura de créditos suplementares ou especiais.

Cabe aqui dar uma rápida explicação do processo de formação e aprovação da Lei Orçamentária Anual no âmbito da União (LOA): Esta lei é de iniciativa do Poder Executivo.

O referido projeto será apreciado pelas duas Casas do Congresso Nacional, sendo submetido à Comissão Mista permanente, a qual emitirá parecer sobre o projeto, e será votado pelo plenário das duas Casas do Congresso Nacional.

20.2.Elaboração da Proposta pelo Ministério Público:

Semelhante ao que ocorre no Poder Judiciário, o Ministério Público, por ser um órgão institucional, autônomo e independente, chegando até a ser considerado por alguns como quarto Poder, apesar de não sê-lo, tem competência para elaborar sua própria proposta orçamentária, devendo encaminhá-la dentro do prazo estabelecido pela LDO. Caso isto não ocorra, o Poder Executivo considerará os valores aprovados na lei orçamentária vigente, com os ajustes feitos conforme limites estipulados pela LDO.

Se a proposta for encaminhada em desacordo com os limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes definido pela LDO, caberá ao Poder Executivo proceder aos ajustes necessários para fins de consolidação da proposta orçamentária anual.

Durante o exercício, não poderá haver despesas ou assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na LDO. Esta é a regra. A exceção admitida é se essas despesas ou assunção de dívidas forem previamente autorizadas, por meio de abertura de créditos suplementares ou especiais.

20.3.Elaboração da Proposta pela Defensoria Pública Estadual:

As Defensorias Públicas Estaduais passam a ter assegurado autonomia funcional, administrativa e a iniciativa de suas propostas orçamentárias, obedecidas a LDO e subordinadas ao art. 99, § 2º.


21.Mudança na Competência do STJ e STF:

O STJ passou a ser o Tribunal competente para a homologação de sentenças estrangeiras e para a concessão de "exequatur" às cartas rogatórias. Tal disposição derroga tacitamente a alínea "e" do art. 15 da Lei de Introdução a Código Civil. Onde se lê Supremo Tribunal Federal, deverá ser lido Superior Tribunal de Justiça, de acordo com a nova norma constitucional.

Note que a extradição continua sendo de competência do STF.

Cabe agora ao STF julgar em recurso extraordinário as causas quando a decisão recorrida julgar válida lei local contestada em face de lei federal. Essa competência era do STJ, que analisava a questão que lhe era apresentada por meio de recurso especial.

O STJ continua com competência pra apreciar por meio de recurso especial as causas quando:

"a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal".

Lembre-se ainda que houve uma mudança de competência para o ingresso com a Ação de Intervenção no caso de recusa de execução de lei federal (vide item 5 supra).


22.Ação Declaratória de Constitucionalidade e Declaratória de Inconstitucionalidade (ADIN e ADECON):

Antes da entrada da presente Emenda havia competências distintas para o ingresso da Ação Direta de Inconstitucionalidade (prevista nos incisos do caput do art. 103) e para a ação declaratória de constitucionalidade (prevista no § 4º do art. 103, que foi revogado). Agora, as mesmas pessoas e órgãos competentes para ingressar com a ADIN podem ingressar com a ADECON.

As decisões do STF proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade passam a produzir efeito contra todos e poder vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública Direta e Indireta das três esferas (federal, estadual, municipal – acrescente-se ainda, embora não mencionado a esfera distrital). As decisões proferidas nas ações declaratórias já produziam eficácia contra todos e poder vinculante.

Cabe destacar que a doutrina e os tribunais já mencionavam que a decisão tirada de uma ação direta de inconstitucionalidade já gerava eficácia erga omnes1.

Quanto ao poder vinculante, cabe lembrar as sábias palavras de José Afonso da Silva:

"O efeito vinculante relativamente à função jurisdicional dos demais órgãos do Poder Judiciário, portanto, já decorreria da própria afirmativa da eficácia contra todos, mas, assim mesmo, o texto quis ser expresso para alcançar também os atos normativos desses órgãos que eventualmente tenham sido objeto de uma decisão em ação declaratória de constitucionalidade 2" ou direta de inconstitucionalidade.

Lembra ainda o ilustre mestre que a expressão "relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário" inclui o próprio STF. "Logo o STF não poderá conhecer de processo em que se pretenda algo contrário à sua declaração, nem mesmo em ação rescisória, incabível na espécie 3". Trata-se de coisa julgada material. Tal decisão, entretanto, não passa a produzir efeitos sobre o Poder Legislativo, pois o mesmo poderá por meio de promulgação de nova lei ou de emenda trazer matéria anteriormente declarada como inconstitucional ao ordenamento jurídico. Cite-se como exemplo a declaração de inconstitucionalidade de uma lei ordinária por tratar de assunto exclusivo de lei complementar. O Legislativo poderá aprovar uma lei complementar tratando daquela matéria, não ficando jungido à decisão do STF.


23.Aprovação da Escolha de novo membro para Composição do STJ:

O ato complexo para a escolha de novo membro ao STJ passa a depender de aprovação de maioria absoluta do Senado Federal, assim como já ocorria com a escolha de novo membro do STF.

A forma da composição da escolha dos membros continua a mesma: 1/3 dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça, 1/3 dentre membros dos Tribunais Regionais Federais e 1/3 entre partes iguais entre membros do Ministério Público (Federal, Estadual e Distrital) e Advogados.


24.Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam):

A Enfam funcionará junto ao STJ, que terá, entre outras incumbências, a de regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira.

A Ministra Eliana Calmon foi designada para coordenar o grupo de trabalho que elaborará projeto de resolução que disporá sobre a organização e funcionamento da Enfam. Visa-se com isto a uniformização de critérios em todos os tribunais da Federação sobre a maneira de ingresso, vitaliciamento e promoção de magistrados.

No caso da Justiça do Trabalho, funcionará junto ao TST a Escola Nacional Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho.


25.Conselho da Justiça Federal:

Órgão que já era existente e que funciona junto ao STJ, que tem por função a supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal de primeiro e segundo graus. Este órgão central passa a ter, na ótica constitucional, poderes correicionais, com decisões de caráter vinculante.

Já em relação à Justiça do Trabalho houve a inclusão do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer funções semelhantes à função do Conselho da Justiça Federal.


26.Justiça Itinerante:

Os Tribunais Regionais Federais, Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais do Trabalho "instalarão a Justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários".


27.Funcionamento Descentralizado dos Tribunais:

Os Tribunais Regionais Federais, Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais do Trabalho poderão funcionar de forma descentralizada, constituindo câmaras regionais. Tal medida visa assegurar maior acesso a todas as fases do processo.


28.Federalização dos Crimes que Violam Gravemente os Direitos Humanos:

Quando ocorrer hipótese de grave violação dos direitos humanos, o Procurador Geral da República poderá suscitar, em qualquer fase do inquérito ou processo, perante o STJ, incidente de deslocamento de competência da a Justiça Federal.

Tal medida tem a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações assumidas pelo Estado Brasileiro em tratados internacionais sobre direitos humanos, conforme se extrai do texto constitucional. Contudo, no meu parecer é um pouco indigesta a forma como foi definida a finalidade desta mudança, pois dá a entender que se o caso fosse julgado pela justiça estadual o resultado poderia não atender as obrigações assumidas em tratados. Lembre-se que os tratados ratificados pelo Estado Brasileiro têm força cogente, devendo ser por todos respeitados. Vejo que a intenção do Constituinte Derivado foi abrir caminho para que, em casos de grandes repercussões, a União, por meio do Procurador Geral da República, possa tomar a frente do assunto, visando facilitar o acesso à informação sobre cada passo processual para contra-argumentar possíveis questionamentos levantados pela sociedade internacional.


29.Tribunal Superior do Trabalho:

A Constituição Federal, em sua redação original, previa que o Tribunal Superior do Trabalho era composto por 27 (vinte e sete) Ministros, sendo 17 (dezessete) togados e vitalícios e 10 (dez) classistas e temporários. Com a Emenda Constitucional 24/99 que extinguiu as atividades dos juízes classistas, alterou a constituição do TST, estabelecendo que o mesmo passaria a ser composto por 17 (dezessete) ministros, mantendo-se os classistas até o final de seus mandatos.

Com a nova Emenda, volta-se a ter constitucionalmente a quantidade de 27 (vinte e sete) ministros, alterando-se a forma de composição deste tribunal, que passará a ser a seguinte:

- 1/5 dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no art. 94;

- Os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.


30.Justiça do Trabalho:

Foi abolida do texto constitucional a redação que mencionava a necessidade de haver um Tribunal Regional do Trabalho em cada estado. Sabe-se que há 24 Tribunais Regionais do Trabalho, havendo regiões em que há um Tribunal para dois estados, como é o caso de Amazonas e Roraima (11ª Região).

O texto menciona ainda que nos locais onde não houver Varas do Trabalho, caberá ao juiz de direito estadual julgar a questão, sendo o recurso dirigido para o TRT da respectiva região, o que já estava previsto.


31.Competência da Justiça do Trabalho:

Um dos pontos de maior polêmica nesta reforma constitucional foi a alteração na competência da Justiça do Trabalho.

Estatui o art. 114 e incisos a competência da Justiça do Trabalho, sendo esta competente para julgar e processar:

I-as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

Este inciso está sendo objeto de muitas críticas, pois intenciona transferir para a Justiça do Trabalho a toda e qualquer ação oriunda da relação do trabalho, inclusive as relações estatutárias. Por este motivo, em 25/01/2005 a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 3.395, sendo concedida medida cautelar com efeito ex tunc, para dar interpretação conforme a Constituição Federal, "suspendendo, ad referendum, toda e qualquer interpretação dada ao inc. I do art. 114 da Constituição federal... que inclua, na competência da justiça do trabalho,... apreciação de causas que sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo".

A mesma interpretação dada pela liminar concedida pelo STF deve ser aplicada nos demais incisos, excluindo da Justiça do Trabalho qualquer causa que envolva o Poder Público e seus servidores contratados sob o regime estatutário:

II-as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III-as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV-os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V-os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI-as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII-as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII-a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX-outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei

Outra questão levantada a partir desta alteração refere-se à competência para processar e julgar as causas relativas a acidentes do trabalho. Esta questão foi levantada nos diversos Tribunais do país e ainda suscita muita divergência.

Diante da hipótese de transferência dos processos de uma justiça à outra, muitos cartórios estão relacionando todos os processos sobre ações acidentárias para encaminhar à justiça do trabalho.

Recentemente (em 09/03/2005), o STF decidiu em recurso extraordinário (RE 438639) que a justiça comum é a competente para processar e julgar ações sobre indenização de acidente do trabalho.

Cabe ressaltar que a Constituição Federal é clara, em seu art. 109, inciso I, dispondo que nas questões sobre acidentes de trabalho envolvendo a Administração Direta ou Indireta a competência não é da Justiça Federal, sendo por via residual matéria da Justiça Estadual.

Conforme bem ressaltou o Sr. Ministro Cezar Peluso, as ações acidentárias propostas contra o INSS são da competência da justiça estadual, conforme explicado acima, "se nós atribuirmos à Justiça do Trabalho a ação de indenização baseada no Direito comum, mas oriunda do mesmo fato histórico, temos uma possibilidade grave de contradição", pois nesta hipótese a Justiça do Trabalho julgaria a ação com base no direito comum e a justiça estadual julgaria a ação em face da autarquia federal decorrente do mesmo fato, o que seria muito perigoso, trazendo insegurança jurídica, face à possível contradição que surgiria diante da aplicação da lei ao caso decorrente do mesmo fato. Tal insegurança poderia ser evitada caso um dos processos ficasse suspenso, aguardando decisão do outro, porém deve-se refutar esta hipótese.


32.Dissídio Coletivo:

Antes da EC 45/04, caso as partes (patronal e trabalhadora) não chegassem a um consenso na negociação coletiva de trabalho ou rejeitassem à arbitragem, era facultado aos respectivos sindicatos (patronal ou dos trabalhadores) ajuizar dissídio coletivo. A Constituição não limitava o campo de matéria a ser apreciada por meio do dissídio coletivo. Poderiam ser discutidos quaisquer assuntos referentes a relações do trabalho (demissões, correções salariais, entre outras). Pelo texto atual, caso não haja acordo ou as partes neguem a apreciação da causa pelo juízo arbitral, as partes devem, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica.

Esta alteração já foi objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN 3.392) impetrada pela Confederação Nacional das Profissões Liberais, com o objetivo de afastar a necessidade do "comum acordo" como condição para a propositura de dissídio coletivo. Imagine que não havendo consenso entre patrões e empregados os empregados optem por realizar greve. Haveria realmente a necessidade de comum acordo para ingressar com o dissídio coletivo? Numa primeira análise entenderia que não, pois caso isso fosse necessário e o Sindicato se negasse a "de comum acordo" ajuizar dissídio a empresa correria o risco de falir diante da intransigência.

No que concerne ao ajuizamento de ações econômicas, também entenderia num primeiro momento que não poderíamos limitar a questão à recuperação do poder de compra dos salários dos trabalhadores. Dever-se-ia abranger outras questões objeto de discussão entre patrões e empregados. Imagine que uma grande empresa demita arbitrariamente uma grande quantidade de empregados e o sindicato dos trabalhadores tente ingressar com dissídio junto ao TRT.

O fato é que há a tendência, não só no nosso país como em outras grandes nações, de que o Estado deve se afastar dessa relação de direito do trabalho coletivo. Deve-se esquecer que o empregado não tem proteção e que a empresa pode "esmagá-lo". Os empregados organizados e amparados por um Sindicato têm tanta força quanto a empresa. Ambos têm condições de sentarem-se à mesa de negociação e discutirem toda e qualquer questão que aflija o direito de cada uma das partes. Isto funciona num ambiente em que há empresas e sindicatos fortes e preparados.

É certo que se tivéssemos sindicatos fortes em todas as categorias não seria necessário que o TRT conhecesse dessas outras questões. Se houvesse sindicatos e empresas fortes e preparadas não haveria sequer a necessidade de dissídio coletivo, pois ambos estariam preparados para sentar à mesa e negociar as questões que os afligissem, chegando-se sempre a um bom termo.

O único problema é que a grande maioria dos sindicatos do nosso país não tem estrutura suficiente para defender os direitos dos trabalhadores, assim como muitas empresas não conseguem e não querem enxergar que devem trabalhar ao lado do sindicado dos trabalhadores e não contra. Apesar de terem aparentemente interesses contrapostos, ambos têm preocupações comuns. O Sindicato quer que a empresa produza, venda, exporte e amplie seus negócios, pois se isto não acontecer quem sofrerá serão os trabalhadores. Essa questão ainda levará algum tempo para que empresas e sindicatos estejam realmente preparados para a tendência das relações do trabalho.

Talvez com o projeto de reforma sindical possa haver mudanças significativas que preparem essas partes para sentarem-se à mesa e negociarem. Nossa legislação sindical está tão ultrapassada que não atende os direitos dos trabalhadores.

Para se ter uma idéia do que estamos falando, há sindicatos, federações e confederações de empresas e de trabalhadores. Sabemos e vemos a atuação de federações e confederações das empresas, a exemplo da FIESP e CNI, que atuam fortemente junto ao Poder Público defendendo os interesses de sua categoria. Do outro lado, porém, não se houve falar da atuação das Federações e Confederações de Empregados. Houve-se falar de atuação de Centrais Sindicais, a exemplo da CUT, Força Sindical e CGT, porém estas centrais não são reconhecidas pela legislação, exemplo disso é a possibilidade de uma confederação sindical interpor ADIN, porém as entidades que normalmente se vêem defendendo os interesses dos empregados são as centrais sindicais, que não têm aquela legitimidade.


33.Composição dos Tribunais Regionais do Trabalho:

São compostos por sete membros nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de 30 e menos de 65 anos de idade, sendo um quinto dentre advogados e membros do MPT com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, observado o disposto no art. 94. As demais vagas serão preenchidas mediante promoção de juízes do trabalho por antigüidade e merecimento, alternadamente.


34.Justiça Militar Estadual:

A Justiça Militar, que era composta por Conselho de Justiça no primeiro grau deve ser composta agora pelo Conselho de Justiça e por um Juiz de Direito. Poderá haver Tribunal de Justiça Militar onde o efetivo militar (policiais militares e bombeiros militares e não apenas policiais militares como estava disposto anteriormente) seja superior a vinte mil integrantes.

A Justiça Militar é a competente para processar e julgar os crimes militares definidos em lei e ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil.

O juiz de direito da justiça militar processará e julgará, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares.

Nos demais crimes, o processamento e julgamento da ação será feita pelo Conselho de Justiça, presidido pelo juiz de direito.


35.Justiça Agrária:

Caberá ao Tribunal de Justiça propor a criação de Varas especialização para dirimir conflitos agrários.


36.Inamovibilidade do membro do Ministério Público:

A regra é a inamovibilidade (não remoção de ofício) do membro do Ministério Público. A exceção poderá ocorrer mediante decisão do órgão colegiado do Ministério Público pelo voto da maioria absoluta de seus membros, e não pelo voto de 2/3 como antes era exigido.

Note que conforme art. 130, § 2º, III, o membro do Ministério Público poderá ser colocado em disponibilidade, aposentado ou removido por decisão do Conselho Nacional do Ministério Público, que ainda poderá aplicar sanções disciplinares, assegurada a ampla defesa.


37.Súmula Vinculante:

O STF poderá, de ofício ou por provocação, depois de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula vinculante. A aprovação deverá ser feita por decisão de dois terços de seus membros.

As súmulas aprovadas terão eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública Direta e Indireta, podendo o STF proceder à sua revisão ou cancelamento na forma estabelecida em lei.

As mesmas pessoas ou órgãos que podem ingressar com ação direta de inconstitucionalidade poderão propor ação de aprovação, revisão ou cancelamento de súmula.

As decisões dos juízes ou tribunais que contrariarem a súmula vinculante serão passíveis de RECLAMAÇÃO perante o STF que, se julgar procedente a ação, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial.

Cabe apenas lembrar que as súmulas anteriores à EC 45/04 não têm caráter vinculante e que para terem deverão ser aprovadas por decisão de dois terços de seus membros, conforme art. 8º da Emenda.

Para muitos essa novidade não foi bem vista, pois consideram que não cabe ao Poder Judiciário legislar, para outros haverá uma limitação ao direito de recorrer das decisões que lhes são contrárias. Outros ainda mencionam a limitação à liberdade de criação dos juízes. Como um instinto, o ser humano dificilmente concorda com decisões que são contrárias aos seus interesses, mormente quando se trata de questões patrimoniais ou personalíssimas, pois quando se perde uma causa, o primeiro impulso que vem é o de recorrer.

Muitos que são contra a súmula vinculante deveriam parar para apreciar a quantidade de decisões semelhantes que hodiernamente são proferidas pelos tribunais superiores. Conforme se tira dos princípios do direito, para situações iguais, de fato e de direito, devem ser aplicadas a mesma decisão.

É certo que, a princípio, muita discussão haverá sobre o tema, o que será pacificado com o tempo e com o conhecimento correto desta ferramenta que tem o foco de desafogar parte do Judiciário. Como já mencionado, apenas esta medida não será suficiente para conquistarmos uma decisão justa num prazo razoável, mas é muito bem vinda e em boa hora.


38.Notas:

1.Conforme pronunciamento do Sr. Ministro Moreira Alves: "A ação declaratória de constitucionalidade, como a ação direta de inconstitucionalidade, insere-se no sistema concentrado de constitucionalidade das normas, em que o Supremo Tribunal Federal aprecia a controvérsia em tese, declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, com eficácia erga omnes" (Bastos, Celso Ribeiro – Curso de Direito Constitucional, 19ª ed. p. 408).

2.Da Silva, José Afonso – Curso de Direito Constitucional Positivo, 23ª ed. p. 60.

3.Da Silva, José Afonso ob.citada.


39.Bibliografia:

BASTOS, Celso Ribeiro – Curso de Direito Constitucional, 19ª ed;

MORAES, Alexandre – Constituição do Brasil Interpretada, 2ª ed;

PIOVESAN, Flávia – Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, 2000;

SILVA, José Afonso – Curso de Direito Constitucional Positivo, 23ª ed.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRARI NETO, Luiz Antonio. Estudo comparado sobre a Emenda Constitucional nº 45/2004. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 670, 6 maio 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6681. Acesso em: 7 maio 2024.