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A legalidade dos requisitos de segurança em instalações e serviços em eletricidade (NR 10 e normas técnicas correlatas)

A importancia do diálogo entre empresas e órgãos fiscalizadores

A legalidade dos requisitos de segurança em instalações e serviços em eletricidade (NR 10 e normas técnicas correlatas). A importancia do diálogo entre empresas e órgãos fiscalizadores

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As NRs (dentre elas, a NR 10) tem eficácia jurídica e, por isso, são de observância obrigatória pelas empresas, as quais tem no Termo de Ajustamento de Conduto (TAC) um instrumento capaz de conciliar a proteção ao trabalho humano e a higidez empresarial.

 “Ensinar a amar a vida, não desistir de lutar, renascer da derrota, renunciar às palavras e pensamentos negativos. Acreditar nos valores humanos e ser otimista.

Aprendi que mais vale tentar do que recuar... Antes acreditar que duvidar, o que vale na vida não é o ponto de partida e sim a nossa caminhada”.

Cora Coralina

RESUMO:A Norma Regulamentadora 10 (NR 10), que tem como tema a segurança em instalações e serviços em eletricidade, é uma das NRs instituídas pelo Ministério do Trabalho em Emprego, cuja aplicação objetiva a proteção do meio ambiente de trabalho equilibrado, um direito com status de direito humano fundamental. Contudo, sua aplicação revela-se problemática para os destinatários dessa Norma que configuram empresas implantadas antes do advento da NR 10, tendo em conta a complexidade da implementação de determinados requisitos dessa Norma. Essa situação, combinada ao fato de tratar-se de norma editada por órgão da Administração Pública e não pelo Legislativo, faz com que frequentemente o empresariado leigo questione a constitucionalidade da NR 10 (e das demais normas técnicas por ela referidas), arguindo sobre a força legal e o poder vinculante dessa norma. Em suma, a NR 10 é mera recomendação de boa prática, ficando sua aplicação sujeita à discricionariedade do destinatário, ou tem ela força de lei, obrigando seu destinatário à fiel observância das determinações nela inseridas? Este estudo se propõe a demonstrar que a NR 10 (e as demais NRs), por decorrerem do poder regulamentar conferido à Administração Pública por delegação normativa do legislador trabalhista, num fenômeno conhecido como deslegalização, é constitucional, e tem eficácia jurídica equivalente às das leis ordinárias, o que a torna de observância obrigatória pelo empregador. As NRs integram um rol de instrumentos que congrega as convenções da OIT, normas previstas na CLT, outras normas legais, além da própria Constituição da República, e que juntos definem o arcabouço normativo destinado à tutela do meio ambiente de trabalho. A função social da empresa revela-se o princípio harmonizador entre a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa. Vislumbra-se o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) como o instrumento de maior eficácia para conciliar esses princípios, provendo agilidade e efetividade à NR 10 por aplica-la de forma consensual, com base na união de vontades do empresário e do agente público.

Palavras chaves: Normas regulamentadoras. NR 10. Poder regulamentar. Deslegalização. Função social da empresa. Termo de ajustamento de conduta. TAC.

SUMÁRIO:INTRODUÇÃO.1 O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO COMO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL: A FUNÇÃO SOCIAL DO TRABALHO E A NECESSIDADE DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SAUDÁVEL.2 FONTES DO DIREITO DO TRABALHO: FORMAS (NORMAS) DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO.2.1 CONSTITUIÇÃO.2.2 CONVENÇÕES DA OIT.2.3 NORMAS PREVISTAS NA CLT..2.4 NORMAS REGULAMENTADORAS (NRs)..2.5 OUTRAS NORMAS LEGAIS..3 A NATUREZA JURÍDICA DAS NRs: A CONSTITUCIONALIDADE DA NR 10 E OS ASPECTOS RELEVANTES DESSA NR..3.1 A NATUREZA JURÍDICA DAS NRs E O FENÔMENO DA DESLEGALIZAÇÃO..3.2 COMENTÁRIOS À NR 10.4 A IMPORTÂNCIA DO DIÁLOGO ENTRE EMPRESAS E ÓRGÃOS FISCALIZADORES: A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA..4.1 TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC)..5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.REFERÊNCIAS..


INTRODUÇÃO

De acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL[1]), em 2014 foram registrados 55 óbitos decorrentes de acidentes de trabalho com trabalhadores de concessionárias ou permissionárias do setor de energia elétrica (ANEEL, 2015). Se contabilizados os acidentes com terceiros envolvendo a rede elétrica (por isso, não necessariamente considerados como acidentes de trabalho), o número de óbitos salta para espantosos 330 casos (ANEEL, 2015).

Essas estatísticas evidenciam os altos riscos inerentes às atividades com eletricidade e a importância de se estabelecerem procedimentos e medidas protetivas para tutelar a saúde e segurança dos trabalhadores que atuam nesse setor.

A tutela à saúde e segurança do trabalhador tem matiz constitucional; com efeito, o art. 7º da CR/88, ao tratar dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, estabelece em seu inciso XXII que a redução dos riscos envolvidos na atividade laboral é um desses direitos, redução essa que será implementada através de normas de saúde, higiene e segurança (BRASIL, 1988).

Nesse preceito constitucional o Capítulo V do Título II da CLT encontra respaldo para disciplinar uma vasta gama de aspectos relacionados à segurança e medicina do trabalho. E ainda atribui competência complementar ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para estabelecer normas específicas que considerem as características próprias de cada atividades ou ramo de trabalho (BRASIL, 1943).

Foi com base nessa competência complementar que o MTE instituiu as chamadas Normas Regulamentadoras (NRs), entre as quais a NR 10 (Segurança em instalações e serviços em eletricidade).

Os desdobramentos dos requisitos trazidos pela NR 10 se refletem na implantação de diversos procedimentos e ações que objetivam reduzir e controlar os riscos elétricos. É possível distinguir dois tipos de iniciativas, a saber: (a) aquelas relacionadas a metodologia/prática operacional a ser observada para o desenvolvimento das atividades; e (b) as relacionadas com as características e configuração/estrutura da própria instalação elétrica para a qual tais atividades serão executadas.

No primeiro grupo tem-se a realização de treinamentos para capacitação de profissionais e sua posterior habilitação/autorização; fornecimento de EPIs especiais; definição de rotinas e práticas operacionais; elaboração de plano de emergência para situações críticas; organização de documentação técnica (sempre atualizada) indicando a situação da instalação elétrica, dentre outras.

O segundo grupo de iniciativas envolve aspectos construtivos das edificações (subestações) que abrigam os sistemas elétricos e especificações técnicas dos equipamentos que configuram estes sistemas; as subestações devem contemplar distâncias mínimas entre os equipamentos para permitir a execução de atividades com segurança, propiciando rotas de fuga adequadas em caso de emergência, tudo devidamente sinalizado para orientação dos trabalhadores que ali atuam; os equipamentos (painéis e quadros elétricos), por sua vez, devem ser dotados de uma série de recursos e dispositivos que ofereçam segurança aos trabalhadores, permitindo que manobras de desligamento e religamento de circuitos sejam executadas sem riscos, e dotados de sistemas de proteção que atuem automaticamente em situações de emergência.

O atendimento aos requisitos estabelecidos pela NR 10 para as instalações surgidas a partir de sua publicação é praticamente uma decorrência natural do processo de concepção, devendo os estudos de viabilidade e projetos de engenharia desses novos empreendimentos contemplar as diretrizes ali definidas, bem como nas referidas normas técnicas.

Contudo, uma abordagem mais detida se faz necessária quando o caso em concreto envolve grandes instalações industriais em operação a longo tempo, concebidas e implantadas sob a égide de requisitos e normas técnicas anteriores. Adequar tais instalações aos novos requisitos da NR 10 não é tarefa simples, que além de invariavelmente envolver investimentos vultosos, demanda prazos que dificilmente se coadunariam com os exíguos prazos determinados a partir da data de publicação da NR 10 (todos já expirados!). Em determinados casos, a adequação revela-se até mesmo tecnicamente inviável.

Empreendimentos implantados em data contemporânea à publicação/revisão da NR 10 e cuja observância lhe seja aplicável, em geral com relativa tranquilidade, são colocados em produção com suas instalações e procedimentos já atendendo as exigências dessa NR, uma vez que tais requisitos são facilmente incorporados aos projetos de engenharia, e os sistemas são adquiridos e implantados em conformidade com o que determina essa NR. Ou seja, o empreendimento já “nasce” em conformidade com a Norma, com ações, investimentos e prazos para tal dentro de parâmetros gerenciáveis e devidamente contemplados no plano de implantação do empreendimento.

O que ocorre, contudo, é que esse cenário muda radicalmente quando a questão envolve a adequação de um empreendimento industrial já há muito em produção, ou seja, implantado em passado remoto em relação à publicação da NR 10 à qual a adequação lhe é exigível; em muitos casos, a tarefa de adequação se revela uma missão extremamente penosa e que envolve investimentos e prazos elásticos, estes últimos quase sempre incompatíveis com os prazos estabelecidos na Norma para a adequação das empresas. Não raro, a adequação de algumas das instalações existentes exige a ampliação das dimensões físicas de suas subestações, situação muitas vezes difícil de equacionar tendo em conta o intrincado e congestionadíssimo “lay out” dessas plantas industriais que não dispõem de espaço físico nas subestações e seus arredores.

Esse tipo de situação acaba por ensejar dúvidas por parte de empresários e profissionais da área técnica que, leigos nas questões jurídicas envolvidas, questionam sobre a efetiva obrigatoriedade de que instalações antigas, em produção há longo tempo, se adequem a NR 10 que foi concebida posteriormente, sendo assim submetidas a processos de “revitalização” para se ajustarem à nova Norma, e que impactam a produção da instalação durante o período de adequação, com consumo de orçamentos expressivos.

A argumentação quase sempre recorrente é de que “Afinal, quando foi implantada e iniciou suas operações, a instalação atendia a todas as legislações e normas exigíveis à época!!!”. Em outra via, questionam se tal NR e as normas técnicas que elas referenciam (notadamente, as normas da ABNT) tem força de lei a lhes exigir a fiel observância, sob risco de serem aplicadas sanções legais nas diversas esferas jurídicas decorrentes do seu descumprimento (ou que potencializem sua responsabilidade em caso de acidentes de trabalho ocorridos em instalações ainda não adequadas à NR 10).

Nesse contexto, mostra-se relevante estabelecer as bases da força legal da NR 10 e das normas técnicas da ABNT, e discutir a possibilidade de se estabelecer critérios para a adequação das diversas instalações às exigências dessa NR, tanto em relação aos prazos definidos para o atendimento à essas exigências, bem como através da consideração, no caso concreto, da efetiva necessidade do atendimento integral ao escopo da NR (neste último caso, definindo ações alternativas que possam produzir efeitos da mesma ordem, porém com menor impacto para a estrutura produtiva).

A abordagem dessa questão deve passar pela discussão acerca da obrigatoriedade de observância da NR 10, perquirindo sobre sua força jurídico-normativa para vincular seus destinatários, tendo em conta tratar-se de norma emanada pelo Poder Executivo (MTE); essa investigação deve estender-se às normas técnicas da ABNT, com o objetivo de igualmente discutir sua força legal e vinculante. Assumindo a hipótese de que a NR 10 e as normas da ABNT tem força de lei, o olhar se voltará para a possibilidade de se firmar um termo de ajustamento de conduta (TAC) com a autoridade trabalhista competente, em face da complexidade de adequação de instalações implantadas antes do advento da NR 10.

Na medida em que se viabilizem mecanismos de adequação à NR 10, com o objetivo imediato de dar efetividade ao cumprimento dessa Norma, empreende-se de fato verdadeira ação de proteção para um meio ambiente do trabalho equilibrado, de extrema importância e interesse social, uma vez que os danos decorrentes dos acidentes de trabalho não penalizam somente a pessoa do acidentado e seus próximos, mas a sociedade como um todo.

Num primeiro lançar de olhos, como hipóteses que nortearão o desenvolvimento deste estudo, tem-se que:

a)    Um meio ambiente do trabalho equilibrado deve propiciar condições saudáveis e seguras para que o trabalhador desenvolva suas atividades laborais, livres de riscos que ameacem sua saúde e sua vida, e que lhe assegure bem estar e qualidade de vida;

b)    No considerável arcabouço normativo que configura o sistema protetivo para um meio ambiente do trabalho equilibrado, as NRs constituem importante ferramenta, alinhadas com o preceito estampado no art. 200, da CLT;

c)    Constata-se que as NRs são reconhecidas como autênticas normas jurídicas, dotadas de força vinculante (ou seja, estão longe de ser meras proposições programáticas). De fato, partindo da evidência inarredável de que as espécies normativas previstas no art. 59, CR/88 (os chamados dispositivos legais tradicionais), por sua natureza jurídica comum, possuem eficácia normativa e eficácia jurídica (logo, dotadas de força vinculante), e tendo em conta que as NRs têm natureza jurídica idêntica, o raciocínio dedutivo conduz à conclusão de que as NRs são igualmente dotadas de força vinculante (ou seja, são autênticas normas jurídicas, e, nessa condição, podem por si só, fundamentar decisões judiciais);

d)    Verifica-se a relevância da criação de um canal de diálogo entre os órgãos fiscalizadores do MTE e as empresas o qual, guiado pela razoabilidade e proporcionalidade, permita estabelecer uma relação de compromisso entre aspectos tão sensíveis para a sociedade (a saúde e vida do trabalhador e a oferta de empregos);

e)    A argumentação que defende a criação do canal de diálogo acima referido não esconde uma motivação de cunho meramente utilitarista, focada na maximização de lucros em detrimento da saúde e vida do trabalhador; ao contrário, é crescente no meio empresarial a consciência acerca da importância de um meio ambiente do trabalho equilibrado.

A proposta deste trabalho é abordar essa situação, partindo da constatação da natureza jurídica e força legal da NR 10 e procurando respostas para a seguinte questão: que mecanismos podem ser desenvolvidos pelos órgãos de fiscalização do trabalho e pelas empresas de modo a viabilizar a adequação à NR 10 das instalações industriais implantadas em época anterior à sua publicação?

Nessa linha, o primeiro capítulo busca apresentar o meio ambiente do trabalho como um direito humano fundamental, e na esteira dessa abordagem discute a importância social da tutela do meio ambiente do trabalho, contextualizando a relevância da necessidade de um meio ambiente do trabalho saudável na persecução da função social do trabalho.

O segundo capítulo tem por objetivo situar as NRs (entre as quais obviamente se insere a NR 10) como ferramentas para a proteção do meio ambiente do trabalho, abordando as diversas fontes do direito do trabalho para destacar as formas (normas) e mecanismos protetivos do meio ambiente do trabalho já contempladas no ordenamento jurídico.

O terceiro capítulo apresenta uma incursão pela “competência complementar” atribuída ao MTE para instituir as NRs, perquirindo inicialmente sobre a natureza jurídica das mesmas, para num segundo passo, centrando foco na NR 10, identificar a força legal desta NR bem como das normas técnicas da ABNT (e de outras organizações) referenciadas por ela. A visita aos principais aspectos da NR 10 complementa o capítulo, possibilitando uma visão geral da sua extensão e complexidade.

O quarto capítulo inicia ressaltando a importância do princípio constitucional da função social da empresa como ferramenta para a promoção do bem estar coletivo e justiça social. Sopesando esse princípio com o direito fundamental ao meio ambiente do trabalho equilibrado, é abordada a importância de estabelecer um canal de diálogo eficaz entre os órgãos de fiscalização do MTE e as empresas, para o desenvolvimento de mecanismos para a adequação à NR 10. A última seção do capítulo se ocupa da análise da aplicabilidade dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade como balizadores do processo de busca desses mecanismos que permitam a adequação à NR 10 das instalações industriais anteriores à sua publicação, abordando-se especificamente os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs).

Em seu quinto e último capítulo, o estudo traz considerações finais relacionadas à temática central deste trabalho, em face da inarredável necessidade de conciliar os princípios da iniciativa privada e da valorização do trabalho humano com as garantias imprescindíveis para a obtenção de um meio ambiente do trabalho equilibrado.

Busca-se, assim, lançar luz sobre a questão em torno da obrigatoriedade da observância das NRs e, principalmente, destacar a importância dos TACs como ferramenta para promoção da efetividade das normas protetivas do meio ambiente do trabalho (em particular, da NR 10), trazendo elementos que demonstrem que, na sistemática adotada na sua implementação e operacionalização (com ampla participação e acompanhamento dos órgãos fiscalizadores), ao invés de ferir, essa ferramenta privilegia e fortalece o equilíbrio do meio ambiente do trabalho, razão pela qual não há que se lhe atribuir a pecha de veículo de procrastinação de obrigações em favor da classe empresarial. É instituto que, na sua essência, privilegia a sociedade como um todo.


1 O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO COMO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL: A FUNÇÃO SOCIAL DO TRABALHO E A NECESSIDADE DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SAUDÁVEL

Na abordagem que este estudo pretende desenvolver, a Norma Regulamentadora 10 (NR 10) é apresentada como ferramenta importante para a proteção da saúde e vida do profissional que trabalha com eletricidade. Juntamente com as demais Normas Regulamentadoras (NRs), e aliadas a diversos dispositivos legais, constituem o arcabouço jurídico que visa a proteção de um meio ambiente do trabalho equilibrado.

A lei que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.936/81), apresenta no inciso I de seu art. 3º[2] o conceito da expressão meio ambiente, exarado pelo legislador ambiental da seguinte forma: “[...] conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (BRASIL, 1981, grifo nosso).

A referência cotidiana à essa expressão invariavelmente remete o senso comum a elementos como água, ar, solo, os quais, entretanto, estão relacionados a uma das dimensões desse conceito. Como pode ser inferido a partir da definição legal, o meio ambiente contempla não somente os elementos referidos, mas alcança também outros tais como edificações, locais de trabalho e até a cultura de um povo (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 376).

De fato, conforme definido por Fiorillo (2012, p. 81-82), o meio ambiente do trabalho constitui

[...] o local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais relacionadas à sua saúde, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que ostentem (homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos etc).

Trata-se de um conceito abrangente, que não fica restrito pura e simplesmente ao estabelecimento de trabalho em si, mas engloba tudo o quanto tem relação com a prestação da atividade laboral, indo desde as edificações, instalações elétricas e equipamentos de proteção individual (EPIs), passando pelas condições ambientais a que se encontra submetido o trabalhador (iluminação, temperatura, salubridade e periculosidade), e alcançando as medidas de prevenção ao desgaste e proteção do trabalhador (como jornadas de trabalho, intervalos, férias, dentre outros) (NASCIMENTO, 2011, p. 846). O meio ambiente do trabalho abrange assim toda a imensa gama de fatores com possibilidade de interferir na saúde física e psíquica, na segurança e no bem estar do trabalhador (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 376).

Na classificação mais acolhida pelos tribunais, o meio ambiente pode ser dividido em quatro dimensões ou aspectos significativos: (i) meio ambiente natural, também comumente designado como meio ambiente físico, é o que de pronto é remetido pelo senso comum posto abranger os elementos da natureza (atmosfera, biosfera, águas, solo, subsolo, fauna, flora etc); (ii) meio ambiente artificial, que compreende todo o espaço edificado, seja ele urbano ou rural, constituindo um aspecto que busca referir “todos os espaços habitáveis” (sua natureza tem relação com o conceito de território); (iii) meio ambiente cultural, composto pelo patrimônio cultural brasileiro conforme previsto no art. 216[3] da CR/88; e, por fim, já caracterizado acima, o (iv) meio ambiente do trabalho (FIORILLO, 2012, p. 77-81).

Essa abrangência do conceito jurídico da expressão meio ambiente alcançando os locais de trabalho não deve causar espanto. E a razão para tal decorre de um elemento basilar da organização da sociedade brasileira e do Estado Democrático de Direito inaugurado a partir da CR/88 (conforme arts. 1º, III, e 3º, IV)[4], os quais estão centrados na dignidade da pessoa humana (EBERT, 2012, p. 1334).

De fato, em face de tal “centralidade”, decorre que

o conceito de meio ambiente assumido pelo ordenamento jurídico pátrio no art. 225, caput, da Carta Magna e no art. 3º da Lei n. 6.938/81 compreende a totalidade dos elementos materiais e imateriais que circundam os seres humanos e são essenciais para a manutenção de sua integridade física, bem como de sua qualidade de vida (EBERT, 2012, p. 1334).

Numa outra via, lembrando que a tutela da vida saudável é o objeto maior do direito ambiental (FIORILLO, 2012, p. 77), implica dizer que a Política Nacional de Meio Ambiente, por todo o seu arcabouço jurídico que a amolda, tem como centro o ser humano, e, assim,

[...] todas as ações implementadas nos espaços públicos e privados, artificiais e naturais, materiais e imateriais, deverão primar pela manutenção do equilíbrio necessário à integridade física e psíquica dos indivíduos, sem que nenhum outro interesse de qualquer natureza justifique o contrário (EBERT, 2012, p. 1334).

Essa amplitude do conceito jurídico de meio ambiente e a constatação de sua relação visceral com a dignidade humana dão fundamento a uma premissa insofismável: é inegável que o conteúdo desse conceito comporta também os locais de trabalho, onde se dispendem consideráveis parcelas de tempo na execução das atividades laborais (EBERT, 2012, p. 1334). Negar essa premissa seria o mesmo que admitir que a condição de trabalhador enseja para o indivíduo um demérito, uma condição de desvalor se confrontada com as demais condições de exercício da cidadania que a Politíca Nacional de Meio Ambiente busca proteger; em obras palavras, negar que os locais de trabalho integram o âmbito do meio ambiente equivaleria a afirmar que, na condição de trabalhador, o indíviduo “[...] teria um valor social menor do que aquele conferido à generalidade dos cidadãos em outros aspectos de sua vida pública ou privada [...]” (EBERT, 2012, p. 1334), configurando uma condição absolutamente esdrúxula.

Não estando os locais de trabalho contemplados no âmbito de incidência do conceito de meio ambiente, a base principiológica deste conceito não os alcançaria, e assim a tutela à qualidade de vida dos trabalhadores estaria obstada, numa verdadeira afronta ao que busca toda a legislação trabalhista (EBERT, 2012, p. 1334).

Fica patente que a inclusão dos locais de trabalho no campo de incidência do conceito jurídico de meio ambiente, estendendo a eles os efeitos dos seus princípios norteadores, é fundamental para impedir o comprometimento da integridade física e da própria vida dos trabalhadores (EBERT, 2012, p. 1334-1335).

Por essa razão, não devem restar dúvidas de que a Constituição da República, ao assegurar um “meio ambiente ecologicamente equilibrado” (na expressa dicção do caput do seu art. 225[5]), está tutelando igualmente o meio ambiente do trabalho, posto estar este inserido no meio ambiente como um todo, do qual constitui um dos seus quatro aspectos significativos (juntamente com os aspectos natural, artificial e cultural) (GARCIA, 2009, p. 57-58).

A essência dessa tutela constitucional centra-se na redução de riscos como forma de propiciar a manutenção de um ambiente ecologicamente equilibrado; por essa razão, a tutela ao meio ambiente do trabalho equilibrado tem natureza de direito fundamental (FAVA, 2009, p.104).

De fato, uma série de direitos trabalhistas que versam sobre segurança e medicina do trabalho (com destaque para o art. 7º, XXII[6]) estão encartados no capítulo da Constituição da República que traz os direitos sociais; tal capítulo, por sua vez, integra o Título II da Carta Magna que trata dos direitos e garantias fundamentais. Ora, o cerne axiológico dos direitos fundamentais é a dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da CR/88 (GARCIA, 2009, p. 56). Ou seja, existe um inexorável liame entre o meio ambiente do trabalho, a segurança e medicina do trabalho, e os direitos fundamentais (GARCIA, 2009, p. 56). Por essa razão, o meio ambiente do trabalho configura verdadeiro direito humano fundamental, tido como um direito fundamental de 3ª geração, e cujo núcleo essencial é a qualidade de vida do trabalhador; é um direito difuso, uma vez que assiste a toda a coletividade, e seus titulares, ainda que indeterminados, tem um comum a circunstância de serem parte em uma relação de trabalho (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 377).

Assim também é o pensar de Melo (2008, p. 29) para quem o

Direito ambiental do trabalho constitui direito difuso fundamental inerente às normas sanitárias e de saúde do trabalhador (art. 196 da CF/1988), que, por isso, merece a proteção dos Poderes Públicos e da sociedade organizada, conforme estabelece o art. 225 da CF/1988. É difusa a sua natureza, ainda, porque as consequências decorrentes da sua degradação, como, por exemplo, os acidentes de trabalho, embora com repercussão imediata no campo individual, atingem, finalmente, toda a sociedade, que paga a conta final.

Ter uma vida digna é um direito que decorre de imediato do princípio da dignidade da pessoa humana, um direito que assiste a todo ser humano; vida digna também se traduz como qualidade de vida, e assim, ter uma vida digna é ter também qualidade de vida. O direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado assegura ao trabalhador uma vida saudável, numa outra volta, qualidade de vida. Reside aí o ponto de toque desse direito com a dignidade da pessoa humana, e que faz dele um direito fundamental tal como o expressivo rol dos demais direitos fundamentais constitucionais, todos eles axiologicamente permeados pelo princípio da dignidade da pessoa humana (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 378).

A aura de direito fundamental faz com que o direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado tenha também eficácia erga omnes, o que significa dizer que ele vincula os particulares nas relações que estes estabelecem entre si, como forma de assegurar que as liberdades de cada um sejam respeitadas pelos demais; nessa linha, ao tutelar a vida saudável do trabalhador, o meio ambiente do trabalho equilibrado exige que seja “[...] evitado todo e qualquer ato advindo de terceiros que venha a ser humilhante ou que de alguma maneira degrade a sua existência” (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 378).

O trabalhador tem sua qualidade de vida degradada sempre que, preocupado exclusivamente em maximizar seus lucros, o empregador não atenta para aquele que de fato lhe proporciona ganhos e ganhos de produtividade, uma vez que nessas circunstâncias são comuns as cobranças desmedidas de resultados que se apoiam em metas irreais ou de extrema complexidade (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 378-379).

Na lúcida abordagem de Rolemberg e Silva (2012, p. 379),

A despeito da concorrência empresarial, em mercado globalizado, o trabalhador deve ter garantido o direito à segurança e bem-estar no exercício da relação laboral. É certo que os direitos laborais não se restringem a aspectos pecuniários – a exemplo de salário, férias, horas extras, FGTS – alcançando também uma qualidade de vida digna no ambiente laboral.

[...] é comum observar no ambiente laboral a inobservância do direito a um meio ambiente fisicamente adequado, bem como de estratégias importantes para que se evitem doenças laborais.

O lucro e os recordes de produção não podem ser dar à custa do desrespeito ao direito do trabalhador à segurança e à saúde, à uma vida digna; a preocupação primeira do empregador deve ser a de “[...] assegurar que os trabalhadores se desenvolvam em um ambiente moral e rodeados da segurança e higiene próprias das condições e dignidade de que se revestem” (NASCIMENTO, 2005, p. 429).

Antes mesmo de pensar no aumento de sua lucratividade, o empregador tem obrigação de observar as normas de segurança e saúde do trabalhador, não podendo lhe causar nenhum dano; pois o valor do homem, o bem da vida, da integridade física e psíquica, é muito superior à simples produção material de bens em uma empresa. (ROLEMBERG; SILVA, 2012, p. 380).

A reforçar a importância de se proteger o meio ambiente do trabalho equilibrado há ainda a constatação de que o valor social do trabalho constitui-se num dos pilares do Estado Democrático de Direito, conforme estabelece o art. 1º, IV, da CR/88, e consagrado pelo caput do seu art. 170 como um dos fundamentos da ordem econômica (FAVA, 2009, p. 104).


2 FONTES DO DIREITO DO TRABALHO: FORMAS (NORMAS) DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO

Os parágrafos que se seguem buscam apresentar de maneira sucinta a estrutura normativa identificada no ordenamento jurídico brasileiro relacionada à segurança e saúde do trabalhador e à tutela do meio ambiente de trabalho (OLIVEIRA, 2007, p. 108).

É possível constatar que as NRs constituem apenas um dentre diversos outros instrumentos normativos direcionados para assegurar um meio ambiente do trabalho saudável; esse arcabouço normativo é de extrema importância para “[...] aferir se houve ou não violação de alguma das normas preventivas minuciosamente detalhadas na regulamentação do Ministério do Trabalho”, fornecendo subsídios para determinar a responsabilidade do empregador nos casos de acidentes do trabalho ou no desenvolvimento de doenças ocupacionais, bem como para determinar a efetividade do cumprimento do dever geral de cautela que lhe é exigível no caso concreto (OLIVEIRA, 2007, p. 108).

Por oportuno, numa perspectiva evolutiva, cumpre destacar que o foco inicial do binômio trabalho-saúde centrou-se na

[...] segurança do trabalhador, para afastar a agressão mais visível dos acidentes do trabalho; posteriormente, preocupou-se, também, com a medicina do trabalho para curar as doenças ocupacionais; em seguida, ampliou-se a pesquisa para a higiene industrial, visando a prevenir as doenças e garantir a saúde; mais tarde, o questionamento passou para a saúde do trabalhador, na busca do bem-estar físico, mental e social. Atualmente, em sintonia com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, expressamente adotado pela Constituição de 1988, pretende-se avançar além da saúde do trabalhador: busca-se a integração do trabalhador com o homem, o ser humano dignificado e satisfeito com a sua atividade, que tem vida dentro e fora do ambiente de trabalho, que pretende, enfim, qualidade de vida (OLIVEIRA, 2007, p. 110).

A seguir, faz-se uma abordagem das normas positivadas para proteção da saúde do trabalhador, disseminadas pelas diversas fontes do direito do trabalho.

2.1 CONSTITUIÇÃO

De plano, destaque-se que conforme consagrado em seu art. 1º, entre os fundamentos da CR/88 estão a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Do desdobramento desses fundamentos ao longo do texto constitucional chega-se aos arts. 170 (que preceitua que a ordem econômica deve estar ancorada na valorização do trabalho e na livre iniciativa), e 193 (que estabelece o primado do trabalho como base para a ordem social). É importante também não esquecer que tais comandos constitucionais, bem como todo o restante arcabouço normativo da CR/88 buscam concretizar, como um dos objetivos fundamentais da República Brasileira, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I) (OLIVEIRA, 2007, p. 111).

A saúde como um direito de todos e dever do Estado vem estampada como princípio constitucional no art. 196; transposto para a seara do Direito do Trabalho, e interpretado sistematicamente a luz de toda a base principiológica constitucional, significa que “[...] a saúde é direito do trabalhador e dever do empregador” (OLIVEIRA, 2007, p. 111). Corroborando esse entendimento, vem o art. 7º, XXII da CR/88 à garantir a “[...] redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (BRASIL, 1988), este um dos direitos sociais encartados no rol de direitos e garantias fundamentais da Constituição.

Conforme análise muito pertinente de Oliveira (2007, p. 111, grifo do autor),

A segurança visa à integridade física do trabalhador e a higiene tem por objetivo o controle dos agentes do ambiente de trabalho para a manutenção da saúde no seu amplo sentido. Pela primeira vez, o texto da Constituição menciona “normas de saúde”, e, por isso, não pode ser relegada a segundo plano a amplitude do conceito de saúde, que abrange o bem-estar físico, mental e social. A conclusão que se impõe é que o empregador tem obrigação de promover a redução de todos os fatores (físicos, químicos, biológicos, fisiológicos, estressantes, psíquicos etc.) que afetam a saúde do empregado no ambiente de trabalho.

Da interpretação desse princípio da redução dos riscos, impera o entendimento de que o uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) deve ser a última alternativa a ser abraçada pelo empregador, quando todos os demais meios conhecidos para extinguir o risco já tenham sido implementados, contudo, sem sucesso (OLIVEIRA, 2007, p. 111).

É importante atentar ainda para o preceito insculpido no § 2º do art. 5º, da CR/88, a saber “§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (BRASIL, 1988), o qual abre as portas para que sejam recepcionados no ordenamento pátrio um repertório de outros direitos e garantias que, albergados na mesma base principiológica que permeia o texto constitucional, tutelem o meio ambiente do trabalho; não restam dúvidas que entre tais diplomas encontram-se as convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ratificadas pelo Brasil (OLIVEIRA, 2007, p. 111).

Por fim, esse rol de princípios fundamentais aqui pontuados e “[...] entalhados no alto da hierarquia constitucional devem estar no ponto de partida de qualquer análise a respeito das normas de proteção à vida e à saúde dos trabalhadores” (OLIVEIRA, 2007, p. 111).

2.2 CONVENÇÕES DA OIT

A OIT tem como uma de suas vertentes a “[...] uniformização internacional do Direito do Trabalho [...]”, buscando estimular a “[...] evolução harmônica das normas de proteção ao trabalhador [...]”, para o que produziu ‘[...] diversas convenções relacionadas com a segurança, a saúde e o meio ambiente do trabalho [...]”, e ratificadas pelo Brasil (OLIVEIRA, 2007, p. 112).

Conforme anteriormente disposto, após ratificadas as convenções da OIT são incorporadas ao ordenamento jurídico; desse processo, novos dispositivos legais podem ser criados, assim como podem ser alterados ou revogados outras normas vigentes;

a aplicação de tais convenções é fiscalizada pela OIT, “[...] devendo o Estado-Membro remeter relatórios anuais e comunicações periódicas para acompanhamento” (OLIVEIRA, 2007, p. 112).

Apenas para citar alguns exemplos, questões de saúde, segurança e meio ambiente do trabalho, incluindo a indicação das respectivas medidas preventivas a serem adotadas pelo empregador, são o objeto das convenções nº 115 (proteção contra radiações ionizantes), nº 136 (proteção contra os riscos de intoxicação pelo benzeno), nª 139 (prevenção e controle de riscos profissionais causados por substâncias ou agentes cancerígenos), nº 162 (utilização do amianto com segurança), nº 170 (segurança no trabalho com produtos químicos), nº 171 (trabalho noturno), dentre outras, todas elas ratificadas pelo Brasil (OLIVEIRA, 2007, p. 113).

Outras três convenções se notabilizam em função de sua abrangência e importância, a saber, a Convenção nº 148 (contaminação do ar, ruído e vibrações), a Convenção nº 155 (segurança e saúde dos trabalhadores), e a Convenção nº 161 (serviços de saúde do trabalho) (OLIVEIRA, 2007, p. 113). Destaque-se, por oportuno, a Convenção nº 155, a qual pelo seu teor, atribui ao Estado-Membro dela signatário

[...] importantes compromissos perante a comunidade internacional, pois deverá instituir e reexaminar periodicamente uma política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e do meio ambiente de trabalho. [...] seja pela via legal ou regulamentar, deverão ser adotadas as medidas necessárias para tornar efetivas as normas de proteção à segurança e saúde dos trabalhadores (OLIVEIRA, 2007, p. 113).

Além de propiciarem a criação, no ordenamento jurídico brasileiro, de inúmeras normas trabalhistas de relevância inquestionável, as convenções da OIT operam como fundamento da legalidade de uma vasta gama de regulamentos editados pelo Ministério do Trabalho e Emprego que tratam de saúde, segurança e meio ambiente do trabalho (OLIVEIRA, 2007, p. 114).

2.3 NORMAS PREVISTAS NA CLT

Conforme assevera Oliveira (2007, p. 115), “As normas que tratam da proteção à segurança e à saúde do trabalhador estão dispersas em diversos diplomas legais, abrangendo vários ramos do Direito, sem uma consolidação adequada, o que dificulta o seu conhecimento, consulta, aplicação e efetividade”.

Entre as leis ordinárias, é na CLT que se encontrará a principal fonte de tais normas, mais precisamente em seu Capítulo V (Da Segurança e da Medicina do Trabalho), Título II, abarcando os artigos 154 à 201. Na segunda reformulação desse capítulo, ocorrida por força da Lei nº 6.514/77, empregou-se a técnica legislativa de “[...] delegar competência normativa ao Ministério do Trabalho não só para regulamentar, mas também para complementar as normas do capítulo [...]”, condição essa expressamente indicada no caput do art. 200[7] desse capítulo;  (OLIVEIRA, 2007, p. 115).

O mesmo Capítulo V alberga uma série de outros artigos que, ao contrário da delegação genérica do art. 200, contém delegações específicas conferindo ao MTE competência para elaboração de normas técnicas que regulamentem ou complementem as matérias disciplinas por tais artigos; são exemplos dessas delegações normativas os artigos 155, 162, 163, 168, 169, 174, 175, 178, 179, 182, 186, 187, 188, 190, 192, 193, 194, 195, 196 e 198 (OLIVEIRA, 2007, p. 116).

Oliveira (2007, p. 117) destaca com razão um outro artigo do Capítulo V; trata-se do art. 157[8], que na precisa síntese desse autor estipula em seus incisos I e II que cabe ao empregador

[...] tomar a iniciativa de criar uma cultura prevencionista, especialmente porque detém o poder diretivo e disciplinar, podendo até mesmo dispensar por justa causa o empregado que resiste ao cumprimento de suas determinações no campo de segurança e saúde no trabalho (art. 158).

A partir da competência que lhe foi atribuída pela delegação normativa supracitada, o MTE publicou a Portaria nº 3.214/78 através da qual foram instituídas as NRs que detalham as normas básicas do Capítulo V da CLT; de acordo com o ponto de vista de Oliveira (2007, p. 117), aquela portaria do MTE “[...] representa na prática a consolidação das normas de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores no Brasil”.

2.4 NORMAS REGULAMENTADORAS (NRs)

As NRs constituem uma sistematização das normas preventivas de saúde e segurança do trabalho, operada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que, legitimado pela delegação normativa do legislador trabalhista, as instituiu através da Portaria nº 3.214/78 (OLIVEIRA, 2007, p. 123).

Na elaboração dessa regulamentação, o MTE utilizou uma metodologia de segregação dos temas, editando normas individualizadas para cada assunto específico de interesse; tal estratégia propiciou maior flexibilidade e dinamismo ao processo de revisão das NRs, o qual pode se dar em função da necessidade conjuntural; é o que sustenta Gonçalves (2006, p. 31) quando afirma que

em decorrência da acelerada revolução tecnológica que tem desencadeado profundas mudanças na relação trabalho-capital, as normas regulamentadoras da proteção jurídica à segurança e saúde no trabalho encontram-se em contínuo processo de atualização e modernização, objetivando a melhoria das condições ambientais do trabalho, afinal de contas, é missão institucional do Estado velar pela saúde e integridade física de sua força produtiva.

O conjunto de NRs conta atualmente com 36 normas; seu atual procedimento de elaboração baseia-se num sistema tripartite e paritário, formado por representantes dos empregados, dos empregadores e do próprio governo, condição que conferiu mais legitimidade e maior aceitação social às NRs assim elaboradas (OLIVEIRA, 2007, p. 124-125).

Repita-se, como já destacado em outra seção deste estudo, que as NRs produzidas pelo MTE possuem eficácia jurídica de lei ordinária, e conforme também já sinalizado anteriormente, fiel ao estipulado pelo art. 157, I, da CLT, cabe ao empregador desenvolver as medidas necessárias para a sua implementação (OLIVEIRA, 2007, p. 125).

Em função de sua especificidade, algumas NRs são aplicáveis somente à determinadas atividades/categorias profissionais; mas há também aquelas que pelo seu espectro abrangente, são aplicáveis a todo o universo de empregadores independentemente da atividade desenvolvida (OLIVEIRA, 2007, p. 125).

No procedimento de análise de acidente de trabalho ou de doença ocupacional, uma das iniciativas a ser desenvolvida é a pesquisa para

[...] verificar se a empresa cumpria corretamente as normas regulamentadoras da Portaria n. 3.214/78. Uma vez constatado qualquer descumprimento e que esse comportamento foi a causa do acidente, o empregador arcará com as indenizações pertinentes porque ficará caracterizada a culpa contra a legalidade (OLIVEIRA, 2007, p. 125, grifo nosso).

2.5 OUTRAS NORMAS LEGAIS

Em consulta à legislação ordinária, o olhar atento será capaz de identificar dispositivos legais dispersos nos mais variados ramos do Direito e leis extravagantes voltados para a tutela da vida, saúde e segurança do trabalhador ou que buscam assegurar um meio ambiente do trabalho saudável (OLIVEIRA, 2007, p. 127).

Um desses diplomas é a chamada Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90); o art. 2º[9] desse dispositivo reafirma a saúde como um direito fundamental do ser humano, mas esclarece que o dever do Estado como principal agente do pleno exercício desse direito não afasta o dever, dentre outros, das empresas, numa indiscutível referência à responsabilidade do empregador pela promoção da saúde do trabalhador (OLIVEIRA, 2007, p. 127). A lei também é clara quando expressamente determina que as ações do Sistema Único de Saúde (SUS) devem contemplar também a saúde do trabalhador (art. 6º, I, c), e que ao SUS compete também colaborar “[...] na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho” (art. 6º, V) (BRASIL, 1990b).

A Lei Orgânica da Saúde traz ainda importante contribuição para a tutela da saúde e do meio ambiente do trabalho saudável, ao estabelecer, no § 3º do art. 6º, o conjunto de ações no âmbito do SUS para a promoção da saúde do trabalhador (OLIVEIRA, 2007, p. 127), e que segue aqui transcrito:

§ 3º Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei, um conjunto de atividades que se destina, através das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho, abrangendo:

I - assistência ao trabalhador vítima de acidentes de trabalho ou portador de doença profissional e do trabalho;

II - participação, no âmbito de competência do Sistema Único de Saúde (SUS), em estudos, pesquisas, avaliação e controle dos riscos e agravos potenciais à saúde existentes no processo de trabalho;

III - participação, no âmbito de competência do Sistema Único de Saúde (SUS), da normatização, fiscalização e controle das condições de produção, extração, armazenamento, transporte, distribuição e manuseio de substâncias, de produtos, de máquinas e de equipamentos que apresentam riscos à saúde do trabalhador;

IV - avaliação do impacto que as tecnologias provocam à saúde;

V - informação ao trabalhador e à sua respectiva entidade sindical e às empresas sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho, bem como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde, de admissão, periódicos e de demissão, respeitados os preceitos da ética profissional;

VI - participação na normatização, fiscalização e controle dos serviços de saúde do trabalhador nas instituições e empresas públicas e privadas;

VII - revisão periódica da listagem oficial de doenças originadas no processo de trabalho, tendo na sua elaboração a colaboração das entidades sindicais; e

VIII - a garantia ao sindicato dos trabalhadores de requerer ao órgão competente a interdição de máquina, de setor de serviço ou de todo ambiente de trabalho, quando houver exposição a risco iminente para a vida ou saúde dos trabalhadores (BRASIL, 1990b).

Outro dispositivo legal que merece menção é a Lei nº 8.213/91 (“dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social”). O caput do seu art. 19 traz a definição de acidente de trabalho; o § 1º desse artigo preceitua que “[...] a empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador”. E o seu § 3º expressamente determina que “[...] é dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular” (BRASIL, 1991).

É extensa a lista das leis ordinárias que trazem dispositivos orientados à proteção da vida e saúde do trabalhador, e à tutela do meio ambiente do trabalho; numa breve relação exemplificativa, apenas para citar algumas dessas normas: (a) Lei nº 5.280/67 que “[...] proíbe a entrada no país de máquinas e maquinismos sem os dispositivos de proteção e segurança do trabalho exigidos pela CLT”; (b) Lei nº 5.889/73 que “[...] estatui as normas reguladoras do trabalho rural”; (c) Lei nº 6.938/81 que “[...] dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente”; (d) Lei nº 7.802/89 que “[...] dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins”; (e) Lei nº 9.605/98 que “[...] dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente”; (f) Lei nº 9.719/98 que “[...] dispõe sobre normas e condições gerais de proteção ao trabalho portuário”; (g) Lei nº 10.803/2003 que estabelece penas e indica hipóteses que configuram “[...] trabalhos em condições análogas à de escravo” (OLIVEIRA, 2007, p. 128).


3 A NATUREZA JURÍDICA DAS NRs: A CONSTITUCIONALIDADE DA NR 10 E OS ASPECTOS RELEVANTES DESSA NR

3.1 A NATUREZA JURÍDICA DAS NRs E O FENÔMENO DA DESLEGALIZAÇÃO

Apresentando uma vasta gama de requisitos que abrangem procedimentos de trabalho, documentação técnica das instalações elétricas, treinamento e capacitação técnica de profissionais, e características construtivas de subestações e equipamentos, a NR 10 está longe de ser uma mera recomendação técnica cujo atendimento esteja condicionado a discricionariedade dos destinatários dessa norma; ela tem verdadeira força vinculante, o que equivale a dizer que possui força legal para constranger seus destinatários ao seu cumprimento.

Com efeito, dentre os diversos diplomas legais que albergam normas de proteção à segurança e saúde do trabalhador, merece destaque a CLT, esta uma lei ordinária, em seu Capítulo V do Título II, que abrange os arts. 154 a 201. Na técnica legislativa empregada na última reformulação feita nesse capítulo (por intermédio da Lei nº 6.514, de 22 de Dezembro de 1977), o legislador limitou-se a enunciar os preceitos básicos, optando por “[...] delegar competência normativa ao Ministério do Trabalho não só para regulamentar, mas também para complementar as normas do capítulo [...]”, condição essa inequivocamente estampada no caput do art. 200, citado anteriormente (OLIVEIRA, 2006b, p. 1434).

Essa delegação normativa genérica prevista no art. 200 da CLT concedeu poderes ao MTE para inovar no mundo jurídico através da criação de normas que, ao detalhar aquelas normas inseridas no Capítulo V do Título II da própria CLT, promovem a prevenção de acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais. A bem dizer, aquele artigo da legislação ordinária trabalhista foi o marco legal que permitiu ao MTE, por intermédio da Portaria nº 3.214/78, aprovar e instituir as Normas Regulamentadoras (OLIVEIRA, 2006b, p. 1435).

Longe de representar um caso isolado ou atípico, essa delegação normativa tem sido amplamente adotada mundo afora, notadamente para regulamentar matérias de natureza técnica, que requerem conhecimentos especializados, como é o caso das normas de segurança e saúde do trabalhador; isso porque as vicissitudes do processo legislativo não se coadunam com a agilidade requerida por muitas demandas atuais, que exigem soluções imediatas (OLIVEIRA, 2006b, p. 1442).

Observa-se assim que a teoria clássica da separação dos Poderes vem se amoldando em face de tais necessidades urgentes, notadamente aquelas de natureza técnica ou cientifica, condição que se reflete na ampliação das atividades estatais e na flexibilização do princípio da legalidade[10], o qual vedava a delegação normativa (OLIVEIRA, 2006b, p. 1435-1436).

Contudo, essa ampliação da competência regulamentar do Poder Executivo não se faz sem limites; ela subordina-se à competência legislativa, de modo que “[...] o regulamento não pode contrariar qualquer previsão legal, sob pena de ficar caracterizada a ilegalidade da norma regulamentar” (OLIVEIRA, 2006b, p. 1436). Assim, verifica-se que

A lei traça o núcleo do mandamento, as ideias básicas e delega competência a um órgão do Poder Executivo para completar e disciplinar os preceitos normativos, o que tem sido chamado doutrinariamente de discricionariedade técnica, deslegalização, competência normativa secundária ou delegação normativa. Naturalmente, o regulamento, mesmo inovando na ordem jurídica, não poderá afastar-se das razões objetivas da delegação recebida, nem contrariar qualquer preceito expresso ou implícito contido na lei delegante (OLIVEIRA, 2006b, p. 1437, grifo do autor).

Como resultado, depara-se com inúmeras ocorrências no ordenamento jurídico brasileiro que evidenciam essa “[...] ampliação da competência normativa da Administração Pública, delegada expressamente pelo próprio Poder Legislativo, mormente em razão do avanço da ciência e da complexidade técnica da vida moderna” (OLI-VEIRA, 2006b, p. 1437).

Tal fenômeno é uma clara manifestação do poder regulamentar (também designado como poder normativo por alguns autores) da Administração Pública, uma das prerrogativas atribuídas aos agentes administrativos e que possibilita ao Estado desempenhar suas precípuas funções e a consecução dos seus objetivos constitucionais (CARVALHO FILHO, 2014, p. 51).

O poder regulamentar “[...] é a prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57). A essência desse poder advém da necessidade da Administração de prover efetividade à leis editadas pelo Legislativo mas que não podem ser prontamente aplicadas por constituírem cláusula geral ou por seu conteúdo genérico ou impreciso; para tanto, utiliza-se de mecanismos de complementação para leis dessa natureza, garantindo-lhes a aplicabilidade (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57).

Importante ressaltar que a prerrogativa destina-se unicamente à complementação de lei, sendo defeso à Administração alterar a essência da lei que se busca complementar com o processo de regulamentação. Se assim agir, caracterizado estará o abuso do poder regulamentar, posto ter sido violada a competência do Legislativo, atentando-se contra o Princípio da Separação de Poderes (expresso no art. 2º da CR/88). Na ocorrência de tal situação, os atos normativos que ultrapassem as fronteiras do poder de regulamentação poderão ser sustados pelo Congresso Nacional, conforme inteligência do art. 49, V, CR/88 (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57).

O uso da prerrogativa do poder regulamentar pela Administração configura inequívoco exercício de função normativa, tendo em conta que resulta na edição de “[...] normas de caráter geral e com grau de abstração e impessoalidade, malgrado tenham elas fundamento de validade na lei” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57).

Como ensina Carvalho Filho, “[...] a função normativa é gênero no qual se situa a função legislativa, o que significa que o Estado pode exercer aquela sem que tenha necessariamente que executar esta última. É na função normativa geral que se insere o poder regulamentar” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57, grifos do autor). Destaque-se ainda, por oportuno, que o poder regulamentar tem natureza derivada (ou secundária), uma vez que “[...] somente é exercido à luz de lei preexistente” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 57).

Em que pesem as restrições decorrentes da separação de poderes, que impedem o legislador de delegar por completo seu poder legiferante à Administração (CARVALHO FILHO, 2014, p. 59), observa-se modernamente o fenômeno da deslegalização (ou deslegificação) segundo o qual “[...] a competência para regular certas matérias se transfere da lei [...] para outras fontes normativas por autorização do próprio legislador: a normatização sai do domínio da lei [...] para o domínio de ato regulamentar” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 59).

A ideia central da deslegalização consiste na atribuição de competência à órgãos da Administração Púbica para a produção normativa em disciplina afim do órgão delegado, para a qual este possui indiscutível especialização; não tendo o legislador conhecimento e domínio na profundidade necessária para regulamentar a disciplina, ele atribui essa tarefa ao administrador público para que a desempenhe em caráter complementar (CARVALHO FILHO, 2006, p. 56).

[...] incapaz de criar a regulamentação sobre algumas matérias de alta complexidade técnica, o próprio Legislativo delega ao órgão ou à pessoa administrativa a função específica de instituí-la, valendo-se dos especialistas e técnicos que melhor podem dispor sobre tais assuntos. (CARVALHO FILHO, 2014, p. 59).

Importante ressaltar que a delegação legislativa supramencionada não significa liberdade absoluta para a produção normativa da pessoa administrativa; a delegação é limitada: o legislador fixa os preceitos básicos do regramento, “[...] transferindo tão somente a competência para a regulamentação técnica mediante parâmetros previamente enunciados na lei. [...] Daí poder afirmar-se que a delegação só pode conter a discricionariedade técnica” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 59).

Não há que se falar em substituição da lei pela norma editada pela Administração Pública com base na delegação do legislador; a norma assim editada apenas complementa e regulamenta a lei. Em outras palavras, como já afirmado anteriormente, a ação do órgão administrativo não é ilimitada, ficando adstrita aos limites e padrões fixados pela lei; cumpre ao Legislativo estabelecer esses limites que deverão ser observados para a legítima produção do ato de regulamentação (CARVALHO FILHO, 2006, p. 56).

Deve-se aqui fazer uma ressalva: observados os limites impostos pela lei, a atividade normativa da Administração Pública não fica necessariamente restrita à formulação de meras cláusulas de conteúdo organizacional; nesse processo de complementação, a norma assim editada pode dar origem a normas técnicas não contempladas pela lei, “[...] proporcionando, em consequência, inovação no ordenamento jurídico” (CARVALHO FILHO, 2014, p. 59). Nesse sentido, é esclarecedora a cátedra de Carvalho Filho (2014, p. 59, grifos do autor) ao afirmar que

O poder regulamentar é subjacente à lei e pressupõe a existência desta.

[...]

Por essa razão, ao poder regulamentar não cabe contrariar a lei (contra legem), pena de sofrer invalidação. Seu exercício somente pode dar-se secundum legem, ou seja, em conformidade com o conteúdo da lei e nos limites que esta impuser. Decorre daí que não podem os atos formalizadores criar direitos e obrigações [...].

É legítima, porém, a fixação de obrigações subsidiárias (ou derivadas) – diversas das obrigações pimárias (ou originárias) contidas na lei – [...]. Constitui, no entanto, requisito de validade de tais obrigações sua necessária adequação às obrigações legais.

Os críticos da deslegalização alegam ser ela inconstitucional por caracterizar uma delegação legislativa inominada; isso porque o ato de regulação, por ser infralegal, não teria o condão de alterar o procedimento legislativo (CARVALHO FILHO, 2006, p. 57). Esse entendimento, contudo, não pode prosperar; conforme assevera Carvalho Filho (2006, p. 57),

A deslegalização não implica qualquer delegação legislativa no sentido de o Poder Legislativo transferir a função legiferante a órgão de natureza diversa. O que o Legislativo faz é conferir a órgão administrativo [...] o poder de minudenciar a norma da lei, a complementá-la, enfim, permitindo sua execução. A admitir-se aquela extensão de sentido, ter-se-ia fatalmente que inadmitir qualquer tipo de regulamento, o que seria inviável ante a previsão constitucional do poder regulamentar (art. 84, IV, da CF). [grifo do autor].

Somente em caso de deslegalização genérica, aquela onde o âmbito material do poder regulamentar não fica delimitado de forma precisa e expressa, é que o princípio constitucional da reserva legal estaria vulnerabilizado, posto estar-se diante de caso de delegação do próprio poder legiferante. A legitimidade da deslegalização reside na sua especificidade e “[...] na oferta de maior densidade regulamentadora [...]” relativamente à disciplina a ser regulamentada (CARVALHO FILHO, 2006, p. 57-58).

A tutela à saúde e segurança do trabalhador tem matiz constitucional; com efeito, o art. 7º da CR/88, ao tratar dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, estabelece em seu inciso XXII que um desses direitos consiste na “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (BRASIL, 1988).

Ancorados nesse preceito constitucional, dispositivos abrigados pela CLT expressamente atribuem competência ao MTE para a produção de normas que busquem tutelar a segurança e saúde do trabalhador; insculpidos em seu Capítulo V, que trata da segurança e da medicina do trabalho, tais dispositivos são exemplos inequívocos da delegação de poder regulamentar do legislador trabalhista para o MTE (um órgão da Administração Pública), nos exatos moldes do anteriormente exposto; senão vejamos:

Art. 155 - Incumbe ao órgão de âmbito nacional competente em matéria de segurança e medicina do trabalho:

I - estabelecer, nos limites de sua competência, normas sobre a aplicação dos preceitos deste Capítulo, especialmente os referidos no art. 200 [...] (BRASIL, 1943).

Art. 179 - O Ministério do Trabalho disporá sobre as condições de segurança e as medidas especiais a serem observadas relativamente a instalações elétricas, em qualquer das fases de produção, transmissão, distribuição ou consumo de energia (BRASIL, 1943).

Art . 200 - Cabe ao Ministério do Trabalho estabelecer disposições complementares às normas de que trata este Capítulo, tendo em vista as peculiaridades de cada atividade ou setor de trabalho [...] (BRASIL, 1943).

A sintonia desses dispositivos com o supracitado preceito constitucional é patente, de modo que não há como negar que a CR/88 recepcionou a Portaria nº 3.214/78 do MTE, bem como as Normas Regulamentadoras (NRs) que dela se originaram (DALLEGRAVE NETO, 2010, p. 119).

No preciso entender de DALLEGRAVE NETO (2010, p. 119),

Não se duvide da força normativa dessas NRs pelo simples fato de elas serem Portarias do MTE e, portanto, meros atos regulamentares do Poder Executivo. De uma adequada interpretação do sistema jurídico, verifica-se que tanto a lei (art. 200 da CLT) quanto a Constituição Federal (art. 7º, XXII) inspiram, referendam e impulsionam as aludidas NRs, conferindo-lhes indubitável e autêntica normatividade [grifo nosso].

Numa abordagem mais pragmática, citem-se as demandas trabalhistas com pedidos de enquadramento de insalubridade e periculosidade, para os quais a Justiça do Trabalho vem, desde remota data, acertadamente aplicando as Normas Regulamentadoras (nos termos da NR 15 e NR 16). São casos evidentes da plena aplicabilidade das NRs, não havendo registro de episódio bem sucedido de alegação de ilegalidade ou de ausência de força normativa em relação às mesmas (DALLEGRAVE NETO, 2010, p. 120). Registre-se ainda que esse mesmo entendimento é esposado pelo próprio STF que, ao editar a Súmula nº 194 (“É competente o Ministro do Trabalho para a especificação das atividades insalubres”), pacificou essa questão.

Também na jurisprudência dos tribunais pátrios, a questão da constitucionalidade das NRs já se encontra absolutamente sedimentada; apenas para citar um exemplo, veja-se a ementa a seguir, na qual as NRs são reconhecidas como referências normativas cujo descumprimento por parte do empregador pode configurar a chamada culpa acidentária:

Indenização por dano acidentário. Culpa. Configuração. A Constituição assegura aos trabalhadores a “redução dos riscos inerentes ao trabalho por normas de saúde, higiene e segurança” (art. 7º, XXII). As Normas Regulamentares traçam as medidas mínimas de proteção individuais e coletivas que devem ser observadas pelo empregador para, quando menos, atenuar os riscos aos quais se expõem para que se atinjam os fins colimados pela empresa. Sendo assim, se as normas são descumpridas, revela-se a culpa em potencial que se qualifica quando o dano físico é revelado, como no caso presente. De tal modo, por força da regra do artigo 159 do Código Civil, deve o empregador reparar o dano sofrido pelo empregado, ao qual culposamente deu causa. (TRT - 2ª Reg. - 20010153017/01 - 8ª T. - Ac. 20020279960 - Rev. Maria Luíza Freitas -DJSP 14/05/02). (DALLEGRAVE NETO, 2010, p. 120, grifo do autor).

Igualmente significativo é o que estabelece o art. 154 da CLT, inserido nas Disposições Gerais do já citado Capítulo que trata da segurança e medicina do trabalho; segundo a inteligência desse artigo, ainda que tenham observado os regramentos contemplados ao longo do Capítulo, as empresas não ficam desobrigadas do cumprimento de outras disposições que versem sobre segurança e medicina do trabalho (DALLEGRAVE NETO, 2010, p. 120, grifo nosso). Assim, ao analisar os desdobramentos de tal artigo, Dallegrave Neto (2010, p. 120) afirma que

Como se vê, a sua abrangência é ampla e atinge qualquer tipo de norma cujo conteúdo verse sobre segurança e saúde. Logo, cabe ao empregador obedecer toda e qualquer norma a respeito, seja ela prevista em lei, tratados internacionais, instrumento normativo da categoria ou portarias ministeriais.

Na abordagem que faz sobre a força vinculante das Normas Regulamentadoras, esse autor é preciso ao corroborar a natureza jurídica das NRs, não deixando dúvidas quanto à sua constitucionalidade e concluindo que

As Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego (MET) [sic] que dispõem sobre medidas complementares no campo da prevenção de doenças e acidentes do trabalho cumprem expressa delegação normativa estampada em lei federal (art. 200, I, da CLT), além de efetivarem direito fundamental previsto no art. 7º, XXII, da Constituição Federal. Logo, as NRs contêm densidade legal e vinculante para todas “as empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos de administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos poderes legislativo e judiciário, que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho CLT” (DALLEGRAVE NETO, 2010, p. 123).

Prevalece portanto o entendimento de que a Portaria nº 3.214/78 do MTE e as próprias Normas Regulamentadoras por ela aprovadas, têm eficácia jurídica equivalente às das leis ordinárias, o que as torna de observância obrigatória pelo empregador que deverá empreender todas as ações necessárias para o seu adequado cumprimento (OLIVERIA, 2006, p. 1439, grifo nosso).

À corroborar o entendimento acima está a constatação, evidenciada por farta jurisprudência dos tribunais trabalhistas, de que as NRs são frequentemente utilizadas como fundamento para a caracterização da chamada culpa contra a legalidade. A culpa contra a legalidade é um dos primeiros aspectos pesquisados na investigação que se segue à ocorrência de acidente de trabalho ou ao diagnóstico de doença ocupacional, quando se busca identificar eventual culpa por parte do empregador; nesse momento, a investigação busca verificar se o empregador violou alguma norma legal ou regulamentar cujo cumprimento lhe era obrigatório. Constatada a violação e o nexo causal com o acidente ocorrido, decorre a

[...] presunção de culpa pelo acidente do trabalho ocorrido, porquanto o dever de conduta do empregador é inquestionável, em razão do comando expresso da legislação. O descumprimento da conduta legal prescrita já é a confirmação de sua negligência, a ilicitude objetiva ou culpa contra a legalidade (OLIVEIRA, 2006a, p. 150).

As sentenças dos tribunais trabalhistas nas mais variadas instâncias têm penalizado os empregadores para os quais restou comprovado o descumprimento das prescrições daquelas NRs relacionadas à atividade empresarial desenvolvida. Em boa parte dos casos, a condenação decorre da comprovação da culpa in elegendo, ou seja, quando se evidencia descumprimento das prescrições das NRs por parte de gerentes ou prepostos do empregador, sendo este penalizado pela “[...] má escolha que se fez da pessoa a quem se confiou uma tarefa diretiva”; em outros tantos casos, a condenação vem pela existência da culpa in vigilando, em função da comprovada negligência da obrigação de cuidar para que as prescrições das NRs fossem cumpridas, e, por fim, por culpa in omittendo do empregador, quando tem-se patente a “[...] omissão ou indiferença patronal”. Registre-se ainda que ganharam considerável relevância as sentenças com fundamento na responsabilidade objetiva do empregador, prevista no art. 933 do Código Civil de 2002 (OLIVEIRA, 2006a, p. 158-159).

3.2 COMENTÁRIOS À NR 10

Com base nesse amparo legal, o MTE publicou a Portaria GM nº 3.214, de 08 de Junho de 1978 através da qual foram aprovadas e instituídas as Normas Regulamentadoras (NR), dentre elas a NR 10 (Instalações e Serviços de Eletricidade); esta foi posteriormente reformulada pela Portaria GM n.º 598, de 07 de dezembro de 2004, passando então a ser referida como “Segurança em instalações e serviços em eletricidade”.

A Norma Regulamentadora NR 10 nasceu assim com a vocação para estabelecer

[...] os requisitos e condições mínimas objetivando a implementação de medidas de controle e sistemas preventivos, de forma a garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores que, direta ou indiretamente, interajam em instalações elétricas e serviços com eletricidade (BRASIL, 2004).

Exatamente como estampado em seu primeiro tópico, 10.1.1, da seção “Objetivo e Campo de Aplicação” dessa norma.

A análise sistemática do tópico 1.1 da NR 1 (norma regulamentadora do MTE que traz disposições gerais que alcançam todas as demais normas regulamentadoras) e do tópico 10.1.2 da NR 10, indica como destinatários da NR 10 todos os entes (empresas públicas e privadas, e qualquer estabelecimento, com fins lucrativos ou não, que admita trabalhadores como empregados) que desenvolvam alguma atividade envolvendo instalações elétricas, ou que seja executada nas suas proximidades (BRASIL, 2004, 2009).

Destaque-se que não é relevante se a atividade desenvolvida nas condições indicadas (instalações elétricas ou suas imediações) é entendida como atividade-fim ou atividade-meio do ente considerado; se tais atividades se inserem nas fases de geração, transmissão, distribuição e consumo de energia elétrica, e estão associadas a processos produtivos de construção, montagem, operação, manutenção, e, inclusive, projeto de engenharia das instalações elétricas, a NR 10 deverá ser aplicada.

3.2.1 Estrutura da NR 10

Busca-se aqui realizar um sobrevoo no conteúdo da NR 10, o qual não pretende ser sistemático e tão pouco profundo ou exaustivo, uma vez que tal fugiria aos objetivos deste trabalho. A intenção aqui é de ressaltar os aspectos relevantes da Norma que guardam relação direta com a abordagem central do presente estudo, os quais fornecerão subsídios para um melhor entendimento dessa abordagem.

Conforme a redação que lhe foi dada pela Portaria GM nº 598/2004, a NR é constituída por 14 capítulos, a saber:

10.1 - Objetivo e Campo de Aplicação

10.2 - Medidas de Controle

10.3 - Segurança em Projetos

10.4 - Segurança na Construção, Montagem, Operação e Manutenção

10.5 - Segurança em Instalações Elétricas Desenergizadas

10.6 - Segurança em Instalações Elétricas Energizadas

10.7 - Trabalhos Envolvendo Alta Tensão (AT)

10.8 - Habilitação, Qualificação, Capacitação e Autorização dos Trabalhadores

10.9 - Proteção Contra Incêndio e Explosão

10.10 - Sinalização de Segurança

10.11 - Procedimentos de Trabalho

10.12 - Situação de Emergência

10.13 - Responsabilidades

10.14 - Disposições Finais

A Norma é complementada por duas seções adicionais, uma com glossário de termos e expressões técnicas referidos ao longo do texto, e outra com anexos.

O capítulo 10.1 (Objetivo e Campo de Aplicação) aborda as finalidades que a Norma almeja, delimitando o universo de trabalhadores cuja saúde e segurança ela busca tutelar. Fica claro que tal universo não se restringe apenas aos trabalhadores diretamente envolvidos nas intervenções no sistema elétrico, ou seja, aqueles que desenvolvem “[...] ações físicas com interferência direta ou indireta em serviços ou instalações elétricas” (PEREIRA; SOUSA, 2010, p. 11), a saber, eletricistas, montadores, instaladores, técnicos etc; a tutela da NR 10 alcança também os “[...] trabalhadores indiretos, sujeitos à reação, irregularidades ou ausência de medidas de controle e sistemas de prevenção, usuários de equipamentos e sistemas elétricos e outras pessoas não advertidas” (PEREIRA; SOUSA, 2010, p. 12)..

Outro aspecto relevante ainda com relação ao capítulo 10.1 diz respeito a extensão da aplicabilidade da NR 10, pela qual ficam sujeitas a sua regulamentação

[...] todas as atividades desde a produção ou geração até o consumo final da energia elétrica, abrangendo as etapas do projeto (planejamento, levantamentos, medições...), construção (preparação, montagens e instalações), reformas (atualizações, modificações e ampliações), operação (supervisão, controles, ação e acompanhamentos), manutenção (diagnóstico, reparação, substituição de partes e peças, testes) incluindo, ainda, os trabalhos (tarefas ou atividades) realizados nas proximidades de instalações elétricas e serviços com eletricidade. (PEREIRA; SOUSA, 2010, p. 12).

O capítulo 10.1 termina evocando as normas técnicas oficiais (entenda-se, normas da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas) como o sustentáculo sobre o qual se apoia a aplicabilidade da NR 10. Graças a essa verdadeira “delegação de competência”, o foco das regulamentações da Norma fica praticamente restrito ao estabelecimento de princípios gerais de segurança ou complementares às próprias normas técnicas; a estas, incumbe definir as prescrições específicas atinentes às instalações elétricas (CUNHA, 2010, p. 3).

Por esse mecanismo um expressivo contingente de normas técnicas da ABNT, que versam sobre instalações elétricas e serviços em eletricidade, é guindado ao mesmo patamar normativo da própria NR 10. Assim, atividades laborais relacionadas a instalações elétricas ou a serviços em eletricidade “[...] devem atender, obrigatoriamente, a especificações e requisitos fixados nas normas técnicas aplicáveis [...]” (PEREIRA; SOUSA, 2010, p. 12, grifo nosso).

Entre os destinatários da NR 10, os desdobramentos dos requisitos trazidos por essa Norma se refletem na implantação de diversos procedimentos e ações que objetivam reduzir e controlar os riscos elétricos. É possível distinguir dois tipos de iniciativas, a saber: (a) aquelas relacionadas a metodologia/prática operacional a ser observada para o desenvolvimento das atividades, ou, como genericamente se refere a Norma, dos serviços em eletricidade; e (b) as relacionadas com as características e configuração/estrutura da própria instalação elétrica para a qual tais serviços referidos na alínea (a) serão desenvolvidos.

No primeiro grupo de iniciativas tem-se a realização de treinamentos para capacitação de profissionais e sua posterior habilitação/autorização; fornecimento de EPIs especiais; definição de rotinas e práticas operacionais; elaboração de plano de emergência para situações críticas; organização de documentação técnica (sempre atualizada) indicando a situação da instalação elétrica, dentre outras. Exatamente neste grupo se concentra a maior parte das prescrições e dos procedimentos trazidos pela NR 10, e que abrangem: (i) medidas de controle, que abordam a obrigatoriedade de adoção de medidas preventivas de controle de riscos (abrangendo proteção coletiva, proteção individual, procedimentos de trabalho etc), baseadas em técnicas de análise de riscos, de forma a garantir a segurança e saúde dos trabalhadores (capítulo 10.2); (ii) segurança em instalações elétricas desenergizadas (capítulo 10.5); (iii) segurança em instalações elétricas energizadas (capítulo 10.6); (iv) trabalhos envolvendo alta tensão (capítulo 10.7); (v) habilitação, qualificação, capacitação e autorização dos trabalhadores (capítulo 10.8); (vi) procedimentos de trabalho (capítulo 10.11); e (vii) situação de emergência (CUNHA, 2010, p. 3).

O segundo grupo de iniciativas envolve aspectos construtivos das edificações (subestações elétricas) que abrigam os sistemas elétricos, e especificações técnicas dos equipamentos que configuram estes sistemas; as subestações devem contemplar distâncias mínimas entre os equipamentos para permitir a execução de atividades com segurança, propiciando rotas de fuga adequadas em caso de emergência, tudo devidamente sinalizado para orientação dos trabalhadores que ali atuam; os equipamentos (painéis e quadros elétricos), por sua vez, devem ser dotados de uma série de recursos e dispositivos que ofereçam segurança aos trabalhadores, permitindo que manobras de desligamento e religamento de circuitos sejam executadas sem riscos, e dotados de sistemas de proteção que atuem automaticamente em situações de emergência. Para este grupo, as regulamentações da NR 10 são encontradas nos capítulos 10.3 (segurança em projetos), 10.4 (segurança na construção, montagem, operação e manutenção), 10.9 (proteção contra incêndio e explosão) e 10.10 (sinalização de segurança) (CUNHA, 2010, p. 3).

Conforme já assinalado anteriormente, a inteligência da parte final do tópico 10.1.2 da NR 10 estipula a obrigatoriedade da observância das “[...] normas técnicas oficiais estabelecidas pelos órgãos competentes [...]” (BRASIL, 2004), fazendo prevalecer o entendimento de que tais normas técnicas constituem o critério técnico para a garantia de segurança em instalações elétricas. Especialmente para aquele segundo grupo de iniciativas é que tal regulamentação produz seus efeitos mais impactantes quando se considera a aplicação da Norma para instalações elétricas mais antigas.


4 A IMPORTÂNCIA DO DIÁLOGO ENTRE EMPRESAS E ÓRGÃOS FISCALIZADORES: A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA

Ainda que dotada de eficácia normativa e eficácia jurídica, é preciso conceber formas que busquem assegurar a efetividade prática da NR 10, notadamente em face de plantas industriais em operação implantadas em épocas anteriores à edição dessa Norma, onde o processo de adequação revela-se complexo e demandando grande esforço de planejamento para compatibilizar a preponderante necessidade de proteger a saúde e vida dos trabalhadores e a estabilidade operacional das empresas (em última análise, a perpetuação dos imprescindíveis postos de trabalho).

É mister destacar que a Constituição da República, ao assegurar o direito a propriedade, conforme inteligência do art. 5º, XXII[11], vincula o exercício desse direito à consecução da sua função social, vinculação essa expressa logo a seguir no inciso XXIII desse mesmo artigo[12] (SOUZA, 2006, p. 9).

Mais a frente, no art. 170, CR/88, volta a se observar essa relação umbilical entre o direito a propriedade (inciso II) e a utilização da propriedade em prol de sua função social (inciso III); estando o referido art. 170 inserido no capítulo constitucional que estabelece os princípios gerais da atividade econômica, deste inciso III decorre o que a doutrina designa como o princípio da função social da empresa (SOUZA, 2006, p. 9). Importante observar que o caput desse mesmo art. 170 coloca a livre iniciativa como um dos fundamentos da ordem econômica brasileira, a qual a propriedade privada (inciso II já referido acima) como um de seus princípios a tutelar (SOUZA, 2006, p. 9).

Ou seja,

o grande desafio é conciliar estes dois pontos, que à primeira vista, parecem ser antagônicos: de um lado, a função social da propriedade, e de outro lado, a livre iniciativa e a propriedade privada. Assegurar a propriedade privada significa assegurar ao proprietário a livre utilização de seus bens, mas atrelar a propriedade e a livre iniciativa à função social, significa que a iniciativa privada deve agir e utilizar seus bens com destinação voltada à sociedade, ou seja, respeitando os bens públicos e gerando frutos como emprego, renda, bens e serviços para o grupo social humano (SOUZA, 2006, p. 9).

Assim, se determinada empresa, sob a égide do direito constitucionalmente assegurado de exercício da liberdade de iniciativa, desenvolve atividades com o único fim de alcançar seus interesses, colocados sempre acima do interesse público (aqui inserida a proteção ao meio ambiente de trabalho equilibrado), não há como falar em atendimento à função social da empresa, uma vez que não se constata aqui a utilização da propriedade privada para promoção do bem comum da sociedade (SOU-ZA, 2006, p. 9).

É indiscutível que a atividade econômica produtiva exerce papel relevante na conjuntura da ordem econômica e financeira do país, como elemento gerador de riqueza e prosperidade; contudo, é fundamental que exista um “[...] equilíbrio entre a atividade econômica e o bem estar, a vida daqueles que dependem desta atividade como meio de subsistência própria ou de sua família” (SOUZA, 2006, p. 11).

Não é por acaso que o art. 1º, IV e o art. 170, caput, ambos da CR/88, ao apresentarem a livre iniciativa, respectivamente, como fundamento da República do Brasil, e como princípio fundante da ordem econômica nacional, o fazem sempre em conjunto com a valorização do trabalho humano, como forma de destacar a importância de ambos no atingimento da valorização deste último (SOUZA, 2006, p. 10).

Os princípios que informam a Política Nacional de Meio Ambiente se aplicam plenamente a todas as dimensões do meio ambiente, já que este configura um conceito unitário que abarca a totalidade dos elementos imprescindíveis para a promoção da dignidade da pessoa humana; assim, também o meio ambiente do trabalho, como uma dessas dimensões, bebe nas águas daquela base principiológica (EBERT, 2012, p. 1335). Uma consequência imediata dessa constatação é que aspectos associados ao poder diretivo do empregador, que versam sobre a organização dos locais de trabalho, o lay out dos equipamentos, a gestão de recursos humanos etc, e que são típica expressão da autonomia privada e da livre iniciativa, devem necessariamente se balizar nos princípios insculpidos na CR/88 e na Lei nº 6.938/81 que estabeleceu aquela Política Nacional de Meio Ambiente (EBERT, 2012, p. 1335).

Ungido com a aura de direito fundamental, o meio ambiente do trabalho equilibrado tem a eficácia vertical própria dos direitos fundamentais em função da gênese destes direitos plasmados para proteger o cidadão contra a intervenção do Estado; mas possui também eficácia horizontal através da qual vincula diretamente os particulares, equivale dizer os “[...] empregadores e responsáveis pela organização dos locais de trabalho” (EBERT, 2012, p. 1335). Em função dessa eficácia horizontal,

tem-se que o sentido e o alcance da expressão [meio ambiente do trabalho equilibrado], bem como o grau de condicionamento por ela imposto à “autonomia privada” e à “livre iniciativa” dependerão da concordância prática entre os dispositivos constitucionais correspondentes (EBERT, 2012, p. 1335).

Ou seja, por força da concordância prática o intérprete da Constituição fica submetido ao dever de compatibilizar as normas constitucionais, ponderando-as e sopesando-as ao avaliar o caso concreto, “[...] evitando-se a amplificação ou a redução desmesurada de um ou outro dispositivo, em comprometimento ao todo constitucional”, considerando estarem tais normas imiscuídas na mesma ordem axiológica constitucional (EBERT, 2012, p. 1335).

O raciocínio engendrado nos parágrafos acima conduz à percepção de que o significado em abstrato a se atribuir à expressão “meio ambiente do trabalho” será construído a partir da “[...] análise sistêmica dos arts. 225, 7º, XXII, e 170 [...]” da CR/88 (EBERT, 2012, p. 1335).

Essa afirmativa fica clara quando se observa os escopos albergados por esses artigos, respectivamente: (a) o art. 225 e seu inciso V asseguram a todos o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, cabendo ao poder público promover o controle das “[...] técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente [...]” (BRASIL, 1988); (b) o art. 7º, XXII busca a melhoria da condição social dos trabalhadores, assegurando-lhes o direito à “[...] redução dos riscos inerentes ao trabalho [...]” (BRASIL, 1988); e (c) o art. 170, com os incisos III e VI, afirma o fim precípuo da ordem econômica de assegurar a todos existência digna, colocando a valorização do trabalho humano como um dos seus fundamentos, e condicionando “[...] o livre exercício das atividades privadas à ‘função social da propriedade’ [...] e à ‘defesa do meio ambiente’ [...]” (EBERT, 2012, p. 1335, grifos do autor).

A conjugação dos aspectos acima elencados leva à indubitável constatação de que

[...] a tutela constitucional do meio ambiente do trabalho aponta para a necessidade de que os particulares, no exercício de sua livre iniciativa, estejam vinculados ao dever de envidar esforços contínuos no sentido de reduzir os riscos laborais e de que o Poder Público, nas esferas legislativa, executiva e judiciária, exerçam efetivo controle preventivo e repressivo em torno dos processos produtivos que possam oferecer riscos à vida e à integridade física dos obreiros (EBERT, 2012, p. 1335).

Tendo em conta a linha de conduta sinalizada acima, e que decorre da interpretação sistemática dos referidos preceitos constitucionais que tutelam o meio ambiente do trabalho, serão as peculiaridades do caso concreto que determinarão se tais preceitos deverão preponderar ou então se ficarão submetidos quando tomados em face dos postulados da livre iniciativa e da autonomia privada (estes, também preceitos constitucionais de igual calibre) (EBERT, 2012, p.1335).

Ou, dito com mais propriedade,

[...] são as próprias situações fáticas ocorridas na realidade, com suas peculiaridades, que ensejarão a aplicação em concreto do conceito de “meio ambiente do trabalho” na forma tutelada pelos arts. 7º, XXII, 170 e 225 da Constituição Federal ou, em sentido contrário, dos postulados da “autonomia privada”, da “propriedade” e da “livre iniciativa”, igualmente assegurados pela Carta Magna (arts. 5º, caput, 170 caput, II e parágrafo único) (EBERT, 2012, p. 1335, grifos do autor).

Assim, em face de todo o ideário construído ao longo desta seção para coadunar o direito à saúde e segurança e à vida digna do trabalhador com os postulados da autonomia privada e da livre iniciativa, dois pontos devem ficar assentados: em primeiro lugar, o meio ambiente do trabalho é, efetivamente, alvo de tutela constitucional; e em segundo lugar, agentes públicos e iniciativa privada encontram nos arts. 7º, XXII, 170 e 225 da CR/88, tomados em conjunto, uma linha de conduta claríssima indicada a partir daquela tutela constitucional (EBERT, 2012, p. 1335).

Por fim , não há mal algum que, em sua atuação, a empresa vise o lucro, afinal essa é a pedra angular da atividade empresária; contudo, juntamente com a busca do lucro, deve também honrar com suas obrigações e responsabilidades sociais (NONES, 2002, p. 116).

Conforme destaca Nones (2002, p. 116),

[...] as ações decorrentes da função social não podem ser confundidas com filantropia, com mero modismo, com marketing ou com propaganda. Ao contrário, esses deveres e responsabilidades sociais decorrentes dessa função são vistos aqui como uma verdadeira obrigação social, que vai além do âmbito interno da sociedade empresária. Isso tudo, sem confundir o seu papel com o das instituições de caridade. Nesse passo, as ações sociais decorrentes da função social não podem resultar em prejuízo às empresas, nem podem ser com ele confundidas.

Na esteira de tudo o que acima se expõe acerca da atividade empresária e da função social da empresa, e na contraposição entre a tutela da livre iniciativa e a proteção do trabalho e do meio ambiente (ambos assegurados constitucionalmente), constata-se que

[...] os princípios que inicialmente parecem ser antagônicos, contrapondo-se em duas posições: de um lado, a função social da propriedade, e de outro lado, a proteção à propriedade privada e a livre iniciativa podem perfeitamente ser conjugados e interpretados de forma sistemática de modo a ficarem perfeitamente conciliados e juntos assegurarem a proteção ao meio ambiente do trabalho (SOUZA, 2006, p. 11).

Assim, amplia-se o conceito de empresa para além do tradicional entendimento que a designa como a “[...] atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens e serviços” (NONES, 2002, p. 129). A missão das empresas não deve restringir-se a obtenção de altos índices de lucratividade (NONES, 2002, p. 128); na busca pelo lucro, as empresas devem pautar sua atuação pelo estrito atendimento à sua função social, e que tem nas ações para a proteção do meio ambiente do trabalho equilibrado uma de suas mais sensíveis vertentes, uma vez que na sua essência cuidam da preservação da saúde e vida do trabalhador, seu bem maior.

Verifica-se assim a relevância da criação de um canal de diálogo entre os órgãos fiscalizadores do MTE e as empresas o qual, guiado pela razoabilidade e proporcionalidade, permita estabelecer uma relação de compromisso entre aspectos tão sensíveis para a sociedade (a saúde e vida do trabalhador e a oferta de empregos). Essa relação de compromisso é o tema que será abordado na seção a seguir.

4.1 TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC)

O Termo de Compromisso de Ajustamento de Contuda (ou simplesmente, Termo de Ajustamento de Conduta – TAC) fez sua estréia no ordenamento jurídico brasileiro a bordo do art. 211 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº 8.069/90) (CAMBI; LIMA, 2011, p. 123).

Cerca de dois meses após a promulgação desse Estatuto, por força do art. 113 do Código de Defesa do Consumidor (CDC – Lei nº 8.078/90), foi acrescentado ao art. 5º da Lei da Ação Civil Pública (LACP – Lei nº 7.347/85) o § 6º (CAMBI; LIMA, 2011, p. 123), o qual textualmente estabelece: “Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante combinações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial" (BRASIL, 1990).

Notoriamente vislumbrado como um dos principais instrumentos à disposição dos órgãos fiscalizadores para a defesa do meio ambiente de trabalho, o TAC constitui

[...] método alternativo extrajudicial de solução de conflito, firmado nos autos do inquérito civil ou do procedimento administrativo, em que o infrator assume perante o agente público o compromisso de ajustar sua conduta às exigências legais, sob pena de multa caso seja descumprido (BORBA, 2012, p. 1302).

Instaurado inquérito civil ou mesmo procedimento administrativo investigatório, o TAC surge como alternativa ao ajuizamento de ação civil pública, no qual o inquirido assume compromisso de desenvolver ações comissivas ou omissivas que buscam adequar sua atuação aos ditames da legislação vigente, sob pena de incorrer em multa aplicada pelo órgão fiscalizador (MELO, 2001, p. 103).

Os negócios jurídicos relacionados a direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (como é o caso do direito ao meio ambiente do trabalho saudável) encontram no TAC uma ferramenta capaz de lhes prover maior agilidade e efetividade; havendo a concordância dos interessados em relação à solução extrajudicial propiciada pelo TAC, fica a princípio afastada a ação judicial de conhecimento (ação civil pública) que seria instaurada para proteção daqueles direitos de alta relevância e interesse sociedade (MELO, 2001, p. 102). Como assevera MELO (2001, p. 103-104),

A ação civil correspondente, fica como remédio último, pois, por mais rápida que seja a sua tramitação, o resultado, além de duvidoso, será mais demorado, considerando-se que o Poder Judiciário trabalhista, a exemplo dos demais ramos do Judiciário, é lento e caro. [...] Daí, a inestimável importância do ajuste de conduta extrajudicial, pelo qual se obtém a solução imediata e consensual da questão.

O exame da natureza jurídica do TAC mostra-se uma tarefa turbulenta, uma vez que doutrinariamente a questão não está pacificada; ato jurídico, ato de feição híbrida (caráter contratual e transacional), ato administrativo negocial, contrato administrativo, compromisso de transação, acordo substitutivo, apenas para citar alguns exemplos, são posicionamentos esposados por alguns autores, o que faz concluir que o TAC constitui um instituto jurídico complexo, condição essa que deve ser compreendida à luz dos “[...] diversos ângulos pelos quais o instrumento [TAC] e sua utilidade podem ser vislumbrados. Com efeito, a depender do específico interesse supraindividual objeto do compromisso, uma ou outra definição será mais correta” (CAMBI; LIMA, 2011, p. 125-126).

Em que pese a evidente controvérsia doutrinária sobre a natureza jurídica do TAC, em linhas gerais prevalece como entendimento mais aceito aquele que o conceitua como um negócio jurídico bilateral híbrido, uma vez que se fundamenta em princípios de direito público e de direito privado, decorre do encontro de vontades do particular e do agente público, livres de coação de parte a parte (BORBA, 2012, p. 1305); além disso, possui “[...] conteúdos declaratório e constitutivo e eficácia de título executivo extrajudicial, que tem por finalidade prevenir ou solucionar consensualmente conflitos de interesses transindividuais” (CAMBI; LIMA, 2011, p. 127).

Conforme já sinalizado acima, o TAC é consensual e tem caráter híbrido que decorre do fato de ser esse instrumento informado tanto por princípios de direito público como também de direito privado, tais como, da solidariedade, autonomia privada, livre-iniciativa, boa-fé, proporcionalidade, moralidade e eficiência (BORBA, 2012, p. 1302).

Do direito privado das obrigações, o princípio da solidariedade tem caráter social na medida em que busca garantir a existência digna de forma indistinta, bem como a “[...] manutenção do equilíbrio do sistema jurídico” (BORBA, 2012, p. 1302). Conforme sustenta Nery (2010, p. 47), firmar TAC em observância a esse princípio é “[...] vislumbrar e viabilizar, efetivamente, o desenvolvimento econômico, cultural e social das partes celebrantes”.

Oriundo do direito civil, o princípio da autonomia privada fundamenta a celebração de negócios jurídicos e instituição de normas jurídicas, não importando que estas sejam de caráter particular, e não se confunde com autonomia de vontade (esta remete a aspectos de natureza subjetiva da vontade do indivíduo e de sua declaração); e essência desse princípio é, assim, o “[...] poder de criar normas jurídicas que tem como única expressão, portanto, o negócio jurídico” (NERY, 2010, p. 49-51).

Não se trata, contudo, de um poder absoluto; assim é que esse princípio da autonomia privada encontra limites no inafastável vínculo obrigacional, que exige proporção de prestações. Na cátedra de Nery (2010, p. 51-52),

[...] não basta para a dogmática jurídica afirmar que o sujeito quis e quis livremente algo; é necessário que no contexto daquilo que quis livremente haja ocasião para que ele possa ter o direito de se compelido a dar, fazer o não fazer algo nos limites daquilo que era razoável spor como consequência natural de seu querer.

Em resumo, observados os limites impostos pela lei para o negócio jurídico, o TAC deve reverenciar a garantia fundamental da autonomia privada (BORBA, 2012, p. 1302).

Outro princípio de matiz constitucional, o princípio da livre-iniciativa evoca a liberdade para trabalhar e para o exercício de atividade econômica, e que encontra expressão no direito de empreender e de gerir livremente o empreendimento criado (nas dimensões da liberdade de investimento, de exercício, de organização, de contratação e para concorrer) (NERY, 2010, p. 55). Tal como a autonomia privada, a livre-iniciativa também não configura garantia absoluta; esse princípio necessariamente fica adstrito aos limites da lei como forma de impedir que prevaleça a vontade dos agentes envolvidos na celebração do TAC (BORBA, 2012, p. 1303).

Também do direito privado, outro princípio que informa o TAC é o da boa-fé, considerado na sua dimensão objetiva e sua atual expressão de dever de lealdade. Com previsão legal, estampada nos arts. 113 e 422 do Código Civil, a boa-fé objetiva impõe aos contratantes o dever de lealdade em todas as fases contratuais (BORBA, 2012, p. 1303). Assim, a boa-fé busca pautar a conduta dos sujeitos na relação obrigacional, impondo a eles o poder-dever de agir de forma honesta, proba e leal (NERY, 2010, p. 72). Decorre daí que o

[...] termo de ajustamento de conduta deve observar a boa-fé objetiva durante todo o processo de negociação, pois a boa-fé se estende da fase pré-contratual à pós-contratual, criando direitos e deveres entre as partes, tais como o de informar, o de sigilo e o de proteção (NERY, 2010, p. 77).

Do direito público, tem-se o princípio da legalidade, este também um princípio constitucional estampado no inciso II do art. 5º (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (BRASIL, 1988)). Em face de tal princípio, a discricionariedade da Administração Pública fica vinculada aos limites da lei, o que equivale a dizer que nos negócios jurídicos realizados com o particular, não pode aquela impor a este obrigações ou deveres, ou exigir-lhe um agir, ou mesmo submetê-lo a proibição, sem que para tanto exista expressa autorização legal (BORBA, 2012, p. 1303). Assim, “[...] o agente público legitimado, quando da celebração do ajustamento, deve pautar sua conduta dentro dos limites legais e da boa-fé, agindo com lealdade e probidade em face do particular” (BORBA, 2012, p. 1303).

Outros dois princípios do direito público a informar o TAC, e que guardam entre si relação umbilical, são os princípios da eficiência e da proporcionalidade. Com base no primeiro princípio, a atuação da Administração Pública deve ser pautada pela eficiência, o que significa que tal atuação deve atingir sua finalidade de forma otimizada, com o mínimo consumo de tempo e de recursos, “[...] primando pela satisfação e pela utilidade dos seus atos” (NERY, 2010, p. 93).

O célebre doutrinador CARVALHO FILHO (2014, p. 31) sintetiza a essência desse princípio ao afirmar que “O núcleo do princípio é a procura de produtividade e economicidade e, o que é mais importante, a exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro público, o que impõe a execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento funcional”.

O princípio da eficiência fica ainda mais potencializado em face do conflito com o princípio da proporcionalidade; de fato, com base nas dimensões adequação e necessidade deste princípio, o atingimento das finalidades legais almejadas com os negócios jurídicos realizados pela Administração Pública exige que seja adotado meio adequado (no sentido de se mostrar indubitavelmente apto à consecução daquelas finalidades), e na precisa e necessária proporção (no sentido de se apresentar corretamente dimensionado, não desnecessariamente oneroso). Ou seja, o TAC firmado deve representar a solução mais eficiente e menos onerosa possível para a satisfação dos interesses e finalidades legais que o motivaram (NERY, 2010, p. 95).

A questão é sintetizada de forma precisa pela professora Joselita Borba, quando afirma que

[...] o termo de ajustamento de conduta deve ser celebrado com eficiência para que a finalidade objetivada pela lei seja alcançada. O atuar do agente público, portanto, há de se direcionar para o alcance do interesse coletivo com satisfação e utilidade, Isso porque, o que se busca é a justa medida da lei, a proporcionalidade, vedado qualquer excesso na exigência do bem comum (BORBA, 2012, p. 1303).

Do ponto de vista formal, o TAC configura um negócio jurídico solene, devendo ser reduzido a termo (forma escrita), registrando-se todos os itens pactuados entre as partes (CAMBI; LIMA, 2011, p. 18). Parte desse conteúdo tem natureza declaratória, onde se declara e reconhece a previsão legal no ordenamento de deveres atribuídos ao sujeito passivo (compromissário); a outra parte tem natureza constitutiva, na qual são definidas de forma concreta as “[...] obrigações principais e acessórias necessárias para satisfazer aqueles deveres [...]”, bem como as “[...] condições e limites estabelecidos para a atuação administrativa [...]” (CAMBI; LIMA, 2011, p. 129, grifo dos autores).

Assim, na redação do TAC é imprescindível que se faça a descrição detalhada e objetiva do compromissário, e das obrigações principais e acessórias avençadas, com informações relativas ao tempo e forma de cumprimento das mesmas, órgãos fiscalizadores e os correspondentes critérios de fiscalização, estudos e projetos eventualmente necessários (CAMBI; LIMA, 2011, p. 128).

Importante destacar que em função de sua natureza de negócio jurídico bilateral (conforme anteriormente apresentado), uma das características do TAC é o fato de que o mesmo decorre da união de vontades do particular e do agente público; contudo, ainda que este último possua liberdade transacional limitada, pode o mesmo lançar mão dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para negociar, condição que lhe confere autonomia suficiente para a definição de concessões mútuas (BORBA, 2012, p. 1305). Por essa via,

a transação pode atingir não só questões secundárias, como prazo para implementação de medidas, cumprimento de cronograma de ações, técnicas a serem adotadas na reparação da lesão, lugar da reparação, só para exemplificar, mas também aspectos centrais e relevantes, como alcance da norma (interpretação da norma baseada no livre convencimento motivado), sua aplicabilidade ao caso concreto (incidência), forma de exigibilidade (programas e planos de ação), entre outros. [...] Ou seja, o próprio sistema jurídico oferece meios para maior autonomia na negociação, visando a melhor solução para evitar dano maior ou reparar a lesão a bem coletivo. Transigir, portanto, não significa agir contra ou além da lei ou desprezar direitos coletivos, mas buscar sua máxima efetividade (BORBA, 2012, p. 1305).

Dentre as obrigações principais atribuídas ao compromissário é possível constar prestações de fazer, não fazer ou dar (CAMBI; LIMA, 2011, p. 129); é possível portanto pactuar obrigação com vistas “[...] à reparação do dano, à adequação da conduta às exigências legais ou normativas e, ainda, à compensação e/ou à indenização pelos danos que não possam ser recuperados”, tal como previsto pelo art. 14 da Resolução nº 23/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público (BRASIL, 2007).

Já com relação às obrigações acessórias, prevalece o entendimento de que as mesmas tem natureza de astreintes, e assim configuram verdadeira “[...] coação de caráter econômico para influir no ânimo do devedor, a fim de que cumpra a obrigação [principal]” (CAMBI; LIMA, 2011, p. 130). Por fim, destaca Nery (2010, p. 199) que “[...] é possível ajustar cominações de natureza não pecuniária, como a suspensão de atividade, a obrigação de refazer a situação anterior à violação, a imposição de advertências etc”.

A partir das características essenciais do TAC brevemente apresentadas nos parágrafos anteriores, é possível vislumbrar vantagens práticas na utilização desse instrumento para a proteção dos direitos fundamentais sociais, constatando-se também sua eficácia em face do tradicional modelo de judicialização dos direitos (CAMBI; LIMA, 2011, p.131).

Com efeito, identificam-se dois modelos ou posturas na atuação dos órgãos públicos fiscalizadores responsáveis pela proteção daqueles direitos, designadas como demandista e resolutiva. A postura ainda predominante, a demandista, caracteriza-se pela judicialização dos direitos, via Poder Judiciário para o qual é transferida a incumbência de equacionar os problemas sociais; a luz da realidade posta, não restam dúvidas de que tal postura apresenta uma eficácia sofrível (CAMBI; LIMA, 2011, p.132).

Já a postura resolutiva é caracterizada pela atuação extrajurisdicional, quando os órgãos fiscalizadores tem a oportunidade de atuar ativa e eficazmente para a conciliação e pacificação dos conflitos sociais; nesta postura é que está inserido o TAC, que em essência representa “[...] a substituição do enfrentamento e da litigância pela via do diálogo, da negociação e do consenso” (CAMBI; LIMA, 2011, p.132, grifo dos autores).

Em relação ao modelo de judicialização, o TAC apresenta indiscutíveis vantagens na proteção dos direitos fundamentais sócias; naquilo que é pertinente ao objeto de estudo deste trabalho, as principais vantagens identificadas podem ser classificadas em três categorias, a saber: eficácia preventiva; otimização dos meios; e resultados (CAMBI; LIMA, 2011, p.132).

Quanto à eficácia preventiva, o TAC revela-se uma importante ferramenta de tutela jurídica preventiva, uma vez que permite ampliar os limites da discussão para além da conduta ilícita central que motivou a negociação; dessa forma, seu escopo pode ser aumentado para abranger e ajustar outros comportamentos do compromissário, e não somente o que motivou a sua celebração. Além disso, o TAC também “[...] permite que, em acréscimo à correção da conduta constatada como indevida, sejam adotados mecanismos eficazes na repressão ou prevenção de ações ou omissões futuras” (CAMBI; LIMA, 2011, p.135).

Confrontado com o modelo de judicialização, é evidente a maior concretude da eficácia preventiva do TAC, uma vez que naquele modelo “[...] a tutela preventiva dos direitos fundamentais é mitigada [...], sujeita a morosidade da prestação jurisdicional e a previsão de mecanismos de impugnação, que tornam incerta a concretização constitucional” (CAMBI; LIMA, 2011, p.135).

No que diz respeito à otimização dos meios, já há muito se discute a situação da justiça brasileira, onde a combinação de problemas estruturais (carência de recursos humanos e materiais; mecanismos de gestão inadequados; volume excessivo de processos aguardando julgamento) com uma legislação processual que favorece a “eternização” das demandas judiciais, contribui “[...] decisivamente para a morosidade da tutela judicial e o seu inevitável descrédito perante grande parcela da sociedade” (CAMBI; LIMA, 2011, p.135).

Por seu turno, o TAC constitui uma solução mais rápida e efetiva para a tutela dos direitos fundamentais sociais, ao aliar a motivação apriorística do compromissário para o cumprimento espontâneo da obrigação por ele assumida, com a imputação de sanções (multas) em caso do seu descumprimento, as quais são exigíveis de imediato (ao contrário do que se verifica na ação civil pública, onde as astreintes aplicadas liminarmente, mesmo devidas deste a data do inadimplemento, somente se tornam exigíveis com o trânsito em julgado da sentença condenatória do demandado) (CAMBI; LIMA, 2011, p.135).

Além disso, os custos incorridos nos procedimentos para a celebração do TAC são menores que aqueles que se contabilizam no modelo de judicialização (para acionar o Poder Judiciário); e ainda assim, aqueles custos poderão ser ressarcidos pelo compromissário, que a eles deu causa com sua conduta ilegal, inserindo no TAC cláusula nesse sentido (CAMBI; LIMA, 2011, p.136).

Em suma, constata-se que “[...] quanto à otimização dos meios, o instituto [TAC] é mais célere e econômico que a opção jurisdicional, bem como tende a oferecer mais garantias ao cumprimento das obrigações assumidas” (CAMBI; LIMA, 2011, p.136).

Em relação aos resultados possíveis, o TAC igualmente sobrepuja o modelo de judicialização, para o que contribui seu caráter consensual em que estão presentes os pressupostos da união de vontades e a voluntária aquiescência para as obrigações estabelecidas (CAMBI; LIMA, 2011, p.136).

O TAC tem a seu favor aspectos que referendam a seu emprego para obtenção de melhores resultados na tutela de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, a saber:

(a) grande complexidade das questões envolvidas, relacionadas a conhecimentos extrajurídicos e muito específicos, e que, por isso, seriam tratadas com muita dificuldade na via judicial [...];

(b) dificuldade de se visualizar com clareza a forma de corrigir a lesão transindividual ou a existência de discricionariedade nessa identificação;

(c) presença de vários sujeitos, muitos deles possíveis demandados, com interesses conflitantes e de difícil coordenação em um processo judicial [...]; e

(d) dificuldade de garantir o correto cumprimento da lei ou da decisão judicial, em virtude da ausência de mecanismos eficazes de fiscalização ou sanção, que podem ser acordados no compromisso (CAMBI; LIMA, 2011, p.137).

Contra o modelo de judicialização pende a evidência de serem os processos coletivos ainda mais morosos, fruto da pouca intimidade do Poder Judiciário em lidar com ações desse tipo e que tenham direitos fundamentais sociais como pano de fundo (CAMBI; LIMA, 2011, p.136).

Por seu turno, verificado o inadimplemento das obrigações avençadas no TAC, a sua execução pode ter início imediato, uma vez que o mesmo tem eficácia de título executivo extrajudicial; mais ainda, se o TAC celebrado for levado à homologação judicial, então sua eficácia passa a ser a de título executivo judicial, o que, em caso de inadimplemento, autorizará o cumprimento de sentença (CAMBI; LIMA, 2011, p.137).

Muito pertinente é a síntese de Abelha, Fiorillo e Nery (apud, MELO, 2001, p. 104) ao afirmarem que o TAC “[...] como o próprio nome sugere, é um meio de efetivação da tutela dos direitos coletivos, à medida que evita o ingresso em juízo (e, portanto, todos os reveses que isso possa significar à tutela efetiva) para que se consiga o ajuste de conduta [...]”. Nessa via,

[...] esse novo instrumento de defesa da sociedade propicia a busca e implementação do diálogo social, que na esfera trabalhista é bem vindo no momento em que passa o nosso sistema de relações de trabalho por transformações que requerem, como estrutura de sustentação, o desenvolvimento da negociação coletiva como instrumento democrático na relação capital e trabalho (MELO, 2001, p. 104).

Como oportunamente destacam CAMBI e LIMA (2011, p. 138),

[...] a prevenção e a resolução de controvérsias, por meio do compromisso de ajustamento de conduta, trazem um plus democrático. A concretização dos direitos fundamentais sociais não se dá pela imposição da decisão judicial, mas decorre do diálogo e do mútuo entendimento.

Os bons resultados colhidos com o emprego do TAC levaram o legislador a consolidar a sua execução direta no âmbito da Justiça do Trabalho; para tanto, através da Lei nº 9.958/2000, foi alterada a redação do art. 876 da CLT, que expressamente passou a reconhecer a natureza de título executivo do TAC, in verbis

Art. 876 - As decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia serão executada pela forma estabelecida neste Capítulo (BRASIL, 1943).

Consolida-se assim o TAC como instrumento para “[...] buscar o cumprimento da lei, de forma espontânea, simples, barata e rápida, sem custo para o Estado, além de contribuir para o desafogo do moroso Judiciário” (MELO, 2001, p. 104).

Contudo, o almejado cumprimento da lei deve se dar na sua justa medida, operando-se o princípio da proporcionalidade para a construção do bem comum. Sendo negócio jurídico bilateral conforme já referido anteriormente, o TAC pressupõe união de vontades (numa palavra, transação), que para o agente público se reflete em liberdade negocial (embora não ampla) a qual conduz à formação do seu convencimento “[...] a partir de um juízo de ponderação e equilíbrio devidamente fundamentados [...]”, para o ajuste da conduta (BORBA, 2012, p. 1305, grifo nosso).

É fundamental, portanto, cuidar para que o TAC não resulte de encontro de vontades viciado, no qual não estejam presentes os necessários elementos que condicionam sua existência, validade e eficácia; observados vícios graves na sua celebração, ou patente excesso ou desrespeito aos princípios que lhe são próprios, ou ainda imposição de condição “[...] extremamente gravosa, em que a própria sobrevivência da empresa fique ameaçada”, o TAC assim celebrado deve ser anulado (BORBA, 2012, p. 1305-1306, grifo nosso).

Guiadas pela proporcionalidade e razoabilidade, as tratativas para alcançar o TAC devem evitar cláusulas impossíveis ou de extrema dificuldade de negociação; a tutela de direitos fundamentais sociais almejada que se busca com esse instrumento requer a ponderação de interesses igualmente caros para a sociedade, como a preservação de postos de trabalho, do recolhimento de tributos e contribuições e da sobrevivência da própria empresa (BORBA, 2012, p. 1306).

Em suma, na seara da justiça laboral, o esforço maior reside em fazer do TAC um

[...] instrumento de efetividade dos direitos dos trabalhadores e da ordem jurídica trabalhista, sem que tal compromisso, por si, configure elemento de retrocesso social, colocando o acusado fora do mercado ou determinando fechamento de postos de trabalho (BORBA, 2012, p. 1307).


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ainda que se constatem expressivos avanços num passado recente em relação às políticas para a preservação de um meio ambiente do trabalho equilibrado, não é possível afirmar que tais avanços tenham produzido efeitos positivos em proporção semelhante para os indicadores de acidentes de trabalho, os quais ainda evidenciam um quadro para a segurança e saúde do trabalhador muito aquém do meramente aceitável.

Assegurar um meio ambiente do trabalho equilibrado requer condutas positivas de todos: de empregadores e do Poder Público, porque é obrigação que a eles reclama, e de trabalhadores, porque embora seja um direito que lhes assiste, é igualmente uma obrigação o fiel cumprimento das determinações patronais que visem a promoção da saúde e segurança no ambiente laboral.

A proteção ao meio ambiente do trabalho equilibrado guarda relação direta com a proteção à vida digna, além de também fomentar o desenvolvimento social e o econômico (este último como decorrência da redução dos gastos com os infortúnios dos acidentes e doenças do trabalho), promovendo ainda o crescimento da atividade econômica guindada pelo trabalho salubre (não restam dúvidas de que trabalhadores com qualidade de vida produzem mais e melhor).

É certo, contudo, que a persecução de um ambiente de trabalho equilibrado não pode ser feita tomando o princípio da valorização do trabalho humano de forma absoluta, olvidando-se dos pressupostos da livre iniciativa e da autonomia privada, todos eles de matiz constitucional; tais elementos devem ser ponderados de forma conjunta e sistemática, buscando harmonizá-los através de avaliação que definirá, no caso concreto, os pressupostos que deverão preponderar. Trata-se de manter o equilíbrio sempre delicado entre esses pressupostos constitucionais, de modo que

[...] ainda que o fim maior da empresa continue sendo a obtenção do lucro, suas ações passam a ser norteadas por uma função social que se deve harmonizar com os demais princípios regentes da ordem econômica, norteando, assim, a atividade empresarial segundo os preceitos da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho humano (MOTA, 2013, f. 142).

O trabalho desempenha papel preponderante no processo de geração de lucro para a atividade empresarial, e, na qualidade de direito fundamental, é um dos pilares da ordem econômica, ao lado do princípio da livre iniciativa, na expressa dicção do art. 170 da CR/88. Por sua vez, o objetivo hegemônico da ordem econômica é o desenvolvimento socioeconômico, o qual deve ser um instrumento para levar à dignidade da pessoa humana (MOTA, 2013, f. 11).

Nesse diapasão a empresa no Estado Democrático de Direito inaugurado no Brasil a partir da Constituição de 1988 deve ser o resultado de “[...] um exercício legítimo da livre iniciativa cujas ações produzem reflexos diretos e indiretos perante todo o ambiente com que se relaciona, de forma mais direta com o trabalho, com o mercado de consumo, com a tecnologia e com a natureza” (MOTA, 2013, f. 11-12).

Assim, em contraposição com o modelo de empresa anterior que imperava de modo absoluto, a atividade empresarial pós-Constituição de 1988 “[...] passou a ser submetida a uma análise crítica, conclamando-se a observância de um dever de praticar suas ações em consonância com sua função socioambiental” (MOTA, 2013, f. 12).

Nesse sentido, é precisa a síntese de Mota (2013, f. 12) ao afirmar que

[...] a empresa detentora de poder sobre os bens de produção mostra-se, também, como atividade dotada de um dever para com a coletividade, uma vez que o seu funcionamento, por si só, não se sustenta como argumento plausível o bastante que venha demonstrar o cumprimento de sua função social.

O elo entre a atividade empresarial e o desenvolvimento econômico fortaleceu-se de tal forma que não se pode pensar mais em sua dissociabilidade. No entanto, ao se interpretar a função social da empresa como um princípio que está inserido na Constituição da República de 1988 verifica-se sua relação direta com os demais princípios que direcionam a ordem econômica. Com efeito, suas ações devem [sic] também passam a ter o dever de assegurar a promoção da dignidade da pessoa humana com vistas à prática da justiça social.

Com base no que vai acima exposto, no cumprimento de sua função social a empresa possui diversos poderes-deveres a orientar sua conduta no âmbito das relações de trabalho; a geração e manutenção de postos de trabalho constitui-se um dos principais desses poderes-deveres, uma vez que é pela oferta de oportunidades de trabalho que é possível ao trabalhador “[...] garantir o sustento próprio e o de sua família, proporcionando-lhe uma melhor condição perante o meio social e um desenvolvimento econômico no âmbito de sua participação” (MOTA, 2013, f. 70-71).

Outro importante poder-dever da empresa no exercício de sua função social consiste no pagamento de salário justo ao trabalhador; com efeito, o estrito pagamento de piso salarial mínimo com o objetivo de minimizar a massa salarial e maximizar os lucros da empresa é estratégia que restringe  “[...] o poder de crescimento socioeconômico do empregado [...] precarizando por vias indiretas o valor social do trabalho” (MOTA, 2013, f. 75). O pagamento de salário justo é, portanto “[...] condição imprescindível para a valorização do trabalho humano, promoção de sua dignidade e redução das desigualdades sociais” (MOTA, 2013, f. 75).

Destaca-se ainda um outro poder-dever relevante da empresa no cumprimento de sua função social, o qual guarda uma relação direta com o tema central deste estudo; refere-se ao poder-dever da empresa em fazer “[...] investimentos na melhoria de seu processo produtivo, com vistas à redução dos riscos inerentes ao trabalho, e, por conseguinte, objetivando preservar a saúde e segurança do trabalhador, conforme disposto no artigo 7º, inciso XXII, da CF/88” (MOTA, 2013, f. 76). É precisamente isso que devem fazer aquelas empresas instaladas antes do advento da NR 10, para adequar suas instalações elétricas às determinações dessa NR.

Em todo caso, a empresa estará sempre obrigada a “[...] eliminar ou reduzir os efeitos maléficos ocasionados à vida e a saúde do trabalhador”, atentando para o que dispõe o art. 157 da CLT, o qual estabelece “[...] os deveres que a empresa possui no que concerne à preservação da saúde e segurança de seus empregados” (MOTA, 2013, f. 77).

Conforme já exaustivamente reiterado ao longo deste trabalho, o livre exercício da atividade econômica é um direito assegurado constitucionalmente e um dos fundamentos da ordem econômica. A fruição desse direito deve observar a função social da empresa, cuja extensão e conteúdo são ditados pela base principiológica elencada pelo art. 170 da CR/88; decorre daí que a atividade econômica deve ser exercida respeitando-se os preceitos da livre concorrência, da defesa do consumidor, da defesa do meio ambiente, contribuindo para a redução das desigualdades regionais e sociais e para a busca do pleno emprego (MOTA, 2013, f. 142).

Usando novamente as palavras de Mota (2013, f. 77-78) para concluir a abordagem,

[...] não se coaduna com a função social da empresa a produção de riqueza de um lado e, de outro, o alijamento da saúde e segurança do trabalhador, ferindo diretamente a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho como princípios da República, de suas ordens econômica e social.

Portanto, [...] a empresa estará cumprindo com sua função social no âmbito das relações de trabalho quando exercitar o seu poder-dever com vistas à geração e manutenção de empregos, primando pela saúde e segurança do trabalhador, contribuindo para a redução da desigualdade social, cujo corolário é a valorização do trabalho humano.

O tom repetitivo destes parágrafos finais é proposital; busca-se aqui sedimentar o liame que deve existir entre a necessidade de proteção ao meio ambiente do trabalho equilibrado (um dos afluentes que desagua na valorização do trabalho humano) e a necessidade de se criarem as condições para a sobrevivência e perpetuação da atividade empresarial (e que deflui do princípio da livre iniciativa). Uma não deve sobrepujar a outra, devendo as mesmas coexistirem harmonicamente, uma vez que parte da essência de cada uma reside na observância e respeito à outra, numa dinâmica que se assemelha (mantidas as devidas proporções) ao sistema de freios e contrapesos concebido por Montesquieu em sua Teoria da Divisão de Poderes; aqui, nas relações estabelecidas no ambiente de trabalho entre empresa e empregado, os efeitos de um tal sistema são os decorrentes da função social da empresa, como “[...] princípio que busca o desejável equilíbrio entre os pilares da livre iniciativa e da valorização do trabalho humano” (MOTA, 2013, f. 143).

Assim é que, não pode o empresário/empregador, na busca por maior desempenho e lucratividade de sua atividade, descuidar da saúde e segurança dos trabalhadores que lhe proporcionam tais ganhos, relegando a um segundo plano a preocupação em assegurar um meio ambiente do trabalho equilibrado, e, em decorrência, a persecução de uma vida digna para seus empregados. Quando procede dessa forma, esquece-se o empregador de que o lucro e produtividade de seu negócio dependem fundamentalmente da saúde, da segurança, da higidez, numa palavra, do bem estar de seus colaboradores. Deve haver por parte do empresário o comprometimento sincero e o tratamento prioritário para com as iniciativas e investimentos que se destinem a assegurar a qualidade de vida do trabalhador no ambiente de trabalho.

Na outra via, os instrumentos utilizados para assegurar um meio ambiente do trabalho equilibrado (sejam eles por intermédio do Poder Público, na forma de leis, normas e regulamentos etc, ou decorrentes de conquistas da classe trabalhadora em acordos e/ou convenções coletivas) devem trazer em si a preocupação com a capacidade e viabilidade da empresa para implementar as ações por eles definidas; prazos irreais, parâmetros ou índices operacionais inatingíveis, medidas de implantação extremamente complexa e/ou que alterem radicalmente o processo produtivo da empresa, soluções com tecnologias ainda não consolidadas e/ou de eficácia duvidosa etc, podem impactar a estabilidade lato sensu da empresa, comprometendo a sua capacidade e continuidade operacional.

Deve haver bom senso na formulação daqueles instrumentos; em outra volta, devem eles ser concebidos à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, evitando-se rigores desnecessários e exigências descabidas que deponham contra a sua efetividade, transformando-os em letra morta, que acabam se prestando apenas para aplicação de sanções às empresas e que em nada contribuem para o atingimento do objetivo maior, o de valorizar o trabalho humano propiciando aos trabalhadores uma vida digna através da proteção do meio ambiente de trabalho equilibrado.

A adoção de instrumentos que contemplem determinações fora do razoável ou desproporcionais coloca em risco a sobrevivência/perpetuação da empresa, e, em última análise, acaba por contribuir para o fechamento de postos de trabalho o que se constitui em “[...] porta aberta para a marginalização do homem, para a precarização das condições sociais e para a retração do desenvolvimento econômico” (MOTA, 2013, f. 71). Em outras palavras, depõe contra a busca do pleno emprego do inciso VIII do mutireferenciado art. 170 da CR/88, representando verdadeira afronta à valorização do trabalho humano, e afastando o trabalhador do ideal de uma vida digna.

Dentre os instrumentos disponíveis para tutela do meio ambiente do trabalho, merecem destaque as Normas Regulamentadoras (NRs), uma vez que, instituídas a partir da Portaria nº 3.214/78, constituem o maior e mais abrangente conjunto de normas sobre segurança e saúde do trabalhador do ordenamento jurídico brasileiro. Dentre elas, a NR 10, que tem como tema a “Segurança em instalações e serviços em eletricidade”, merece atenção especial quando direcionada para instalações industriais implantadas antes do advento dessa NR. Adequar tais instalações aos requisitos da NR 10 não é tarefa simples; em muitos casos, além de envolver investimentos vultosos as ações necessárias para essa adequação demandam prazos que dificilmente se coadunariam com os exíguos prazos determinados pela NR, e podem ainda se revestir de tamanha complexidade a ponto de fazer com que a tarefa de adequação se revele uma missão extremamente penosa e, em alguns casos, inviável tecnicamente.

Assim sendo, vislumbra-se como imperativo que órgãos fiscalizadores e empresas se aproximem na busca de soluções que garantam a efetividade da NR 10 para casos de instalações anteriores à Norma como descritos acima. O diálogo entre fiscalização e empresários, entabulado à luz das égides da razoabilidade e da proporcionalidade, deve levar à concepção de instrumento que, por um lado, assegure a proteção do meio ambiente do trabalho equilibrado, e, por outro, não comprometa o equilíbrio da atividade empresarial, permitindo a sua continuidade e perpetuação.

Vislumbra-se também ser o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) esse instrumento que mais eficazmente se revela capaz de conciliar a valorização do trabalho humano com o princípio da livre iniciativa, provendo agilidade e efetividade à NR 10 na medida em que busca viabilizar o atendimento aos requisitos dessa Norma de forma consensual, com base na união de vontades do empresário e do fiscal público, que decorre do diálogo e do mútuo entendimento dessas partes (CAMBI; LIMA, 2011, p.138).

O TAC é uma ferramenta que permite implementar as determinações da NR 10 através de procedimento extrajudicial, com maior eficácia preventiva, sem custo para o Estado, com maior celeridade que o correspondente processo judicial, e propiciando maiores proveitos do que aqueles que podem ser alcançados por uma sentença prolatada em um tal processo (CAMBI; LIMA, 2011, p.133-137).

Para finalizar, reiterando novamente o papel da função social da empresa como o fiel na balança que busca harmonizar e manter o equilíbrio entre a livre iniciativa e a valorização do trabalho humano como pilares da ordem econômica (MOTA, 2013, f. 143), comunga-se do mesmo entendimento desse autor que, com muita propriedade e lucidez, afirma que

A consagração do trabalho como direito fundamental no Estado Democrático de Direito evidencia o seu papel na promoção da dignidade da pessoa humana e na construção de uma sociedade desenvolvida e mais justa, corroborando sua razão de encontrar-se inserido entre os direitos e garantias fundamentais.

Entretanto, em que pese seu prestígio constitucional, a constante luta da classe trabalhadora por melhores condições de trabalho tem evidenciado a relação conflituosa entre o capital e o trabalho, o que enseja a uma maior reflexão sobre o papel da empresa nas relações de trabalho, provocando uma investigação sobre a efetividade da função social da empresa através de ações que resultem na valorização do trabalho humano (MOTA, 2013, f. 13).

É mister encaminhar essa investigação da função social da empresa indicada pelo citado autor, como condição que permitirá corrigir rumos e trilhar o longo caminho que leva a uma sociedade mais fraterna, mais igual, mais justa. Afinal, conforme as sabias palavras de Cora Coralina no início deste trabalho, “Antes acreditar que duvidar, o que vale na vida não é o ponto de partida e sim a nossa caminhada”.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Autarquia em regime especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), é uma agência reguladora criada pela Lei 9.427 de 26 de Dezembro de 1996. Tem como atribuições: regular e fiscalizar a geração, a transmissão, a distribuição e a comercialização da energia elétrica, atendendo reclamações de agentes e consumidores com equilíbrio entre as partes e em beneficio da sociedade; mediar os conflitos de interesses entre os agentes do setor elétrico e entre estes e os consumidores; conceder, permitir e autorizar instalações e serviços de energia; garantir tarifas justas; zelar pela qualidade do serviço; exigir investimentos; estimular a competição entre os operadores e assegurar a universalização dos serviços (ANEEL, 2015).

[2] Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas (BRASIL, 1981).

[3] Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico (BRASIL, 1988).

[4] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III - a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 1988).

  Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

[...]

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).

[5] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988, grifo nosso).

[6] Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (BRASIL, 1988).

[7] Art . 200 - Cabe ao Ministério do Trabalho estabelecer disposições complementares às normas de que trata este Capítulo, tendo em vista as peculiaridades de cada atividade ou setor de trabalho (BRASIL, 1943).

[8] Art. 157 - Cabe às empresas:

I - cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;

II - instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; (BRASIL, 1943).

[9] Art. 2º - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

[...]

§ 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade. (BRASIL, 1990b).

[10] O princípio da legalidade está previsto no art. 5º, inciso II, da CR/88, o qual expressamente estabe-lece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (BRASIL, 1988).

[11] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXII - é garantido o direito de propriedade; (BRASIL, 1988).

[12] XXIII - a propriedade atenderá a sua função social (BRASIL, 1988).


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