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Para o quê deve atentar a vital fiscalização dos conselhos municipais de saúde.

Para o quê deve atentar a vital fiscalização dos conselhos municipais de saúde.

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1-     Apresentação 

Depois do emprego, a saúde tem sido a maior demanda dos brasileiros, que, em grande maioria (70%), utilizam a rede pública do SUS – Sistema Único de Saúde. 

E o desemprego tem feito com que as pessoas cancelem planos privados de assistência médica, voltando a demandar a saúde pública, gerenciada em razoável parte, pelos governos municipais, aqui destacada a ênfase descentralizadora da Constituição, quer dizer, as ações de saúde têm direção única em cada esfera de governo (art. 198, I). 

Além disso, a Lei Maior quer a saúde um direito universal e igualitário, sendo isso prestação obrigatória do Poder Público (art. 196), mas, de outra parte, sabido e consabido que, nas unidades públicas, os pacientes sofrem, por vários dias, em macas instaladas nos corredores; faltam médicos, material de enfermagem e medicamentos; é enorme, e às vezes letal, o tempo para se conseguir consultas, exames e, sobretudo, cirurgias. 

De seu lado, a legislação tem no controle social um fundamental instrumento para a efetividade das políticas de saúde. 

Não por acaso, o conselho de saúde é um dos dois colegiados que compõem o SUS; veja-se o que diz a Lei n.º 8.142, de 1990: 

Art. 1° O Sistema Único de Saúde (SUS), de que trata a Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas:

I - a Conferência de Saúde; e

II - o Conselho de Saúde. 

Em 2007, o Ministério da Saúde realizou pesquisa, nisso constatando que todos os municípios brasileiros possuem conselhos de saúde, o que agrega 87 mil conselheiros. Afinal, para se habilitar a qualquer uma das formas de gestão e, receber os dinheiros SUS, o município deve comprovar plena operação do conselho de saúde (art. 22, I, da Lei Complementar nº 141, de 2012). 

A despeito de suas várias e muitas deficiências, o conselho de saúde, se comparado a colegiados congêneres, tem se revelado mais ativo e articulado; afinal, lida com a vida humana, tornando-se, após a Constituição de 1988, obrigatório espaço de proposição e controle de políticas estatais. Mais efetivo, portanto, que os conselhos do Fundeb, criança e adolescente, alimentação escolar, assistência social, idoso, entre outros. 

Tendo em vista a crescente descentralização das políticas públicas de saúde, as importantes atribuições concedidas pela legislação, a proximidade e o conhecimento das ações municipais de saúde, a impossibilidade de que lhe soneguem documentos ou visita aos locais de atendimento, ante tais razões o conselho municipal de saúde tem papel fundamental no desenvolvimento das respectivas políticas públicas, faltando-lhe contudo treinamento mais prático sobre os procedimentos a serem efetivados na ação concreta. 

Feitas essas considerações preliminares, de assinalar que este artigo mostrará, de forma objetiva e simplificada, como se dá o financiamento da saúde municipal, oferecendo, como ponto fundamental, roteiro prático para o conselho municipal de saúde fiscalizar a operação do setor, bem como a adequada aplicação do dinheiro público.  


2-     O conselho municipal de saúde 

Instituído por lei local, o Conselho Municipal de Saúde tem representação paritária, quer dizer, a sociedade faz-se representar de modo equivalente aos prestadores de serviço e trabalhadores do setor. Prova disso é a composição determinada na Resolução nº 333, de 2003, do Conselho Nacional de Saúde: 

§  50% dos cargos para os usuários dos serviços de saúde (representantes de entidades e movimentos sociais que demandam o SUS);

§  25% dos cargos para os trabalhadores da saúde (representantes de entidades de profissionais da saúde);

§  25% dos cargos para os prestadores de serviços (Prefeitura e entidades privadas com atividades na saúde do município). 

Naquela contraparte social (50%), o conselheiro faz a essencial ligação entre o Conselho e o grupo que representa na comunidade, trazendo questões talvez desconhecidas dos governos municipais. 

Nenhum conselheiro será remunerado. O Ministério da Saúde sugere mandato de dois anos, não coincidente, sempre que possível, com o do Prefeito. 

Em síntese, os conselhos municipais detêm os seguintes encargos: 

a)     Participar da formulação do programa anual de saúde;

b)     Fiscalizar a execução dessa programação, quer no tocante ao adequado financiamento, quer quanto à eficiência operacional;

c)      Aprovar as propostas orçamentárias do setor, não apenas a que figura na lei orçamentária anual, mas, de igual modo, às que comparecem no plano plurianual (PPA) e na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) [1];

d)     Aprovar, mediante parecer conclusivo, o relatório anual de gestão da saúde local, encaminhado pela Prefeitura até o dia 30 de março;

e)     Avaliar a conveniência e a realização dos contratos e convênios assinados pelo Município;

f)       Acompanhar e controlar a atuação do setor privado conveniado;

g)     Encaminhar denúncias aos vereadores, ao controle interno do Município e ao respectivo tribunal de contas;

h)     Receber informação do Ministério da Saúde sobre descumprimento da legislação, sobretudo a da Lei 141, de 2012.

i)       Organizar a conferência municipal de saúde [2] 

Não bastasse isso, o conselho municipal, a cada quadrimestre, avalia a gestão local de saúde, com base em relatório que informa as receitas aplicadas, as eventuais auditorias em andamento, bem como a oferta de serviços em confronto com os específicos indicadores SUS. 

A propósito, sobredito relatório é depois apresentado na Câmara dos Vereadores, mediante audiências públicas realizadas em maio, setembro e fevereiro. O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) exige que o Conselho lhe envie as respectivas atas e pareceres. 

E o Conselho Nacional de Saúde determina que os conselheiros se reúnam, ao menos, uma vez por mês, em eventos abertos ao público. 

Considerando que, entre todas as despesas, a de pessoal é que mais pesa na saúde pública, o TCESP requer que o conselho municipal ateste as folhas de pagamento do setor; isso para inibir a inclusão de funcionários em desvio de função (ex: médicos que atuam no gabinete do prefeito). 

De ressaltar que um fortalecido conselho municipal de saúde poderia auxiliar as prefeituras na redução das elevadas despesas de judicialização, oriundas das hoje habituais ordens da Justiça para a Administração custear medicamentos ou dispendiosos tratamentos médicos a cidadãos que interpõem pedidos judiciais. Com base na experiência sobre a realidade local da saúde pública, os conselheiros participariam de comitê que reunisse o secretário municipal de saúde, o juiz e o promotor, com a finalidade de estabelecer prioridades e limites naquelas custosas demandas judiciais. 


3-     O financiamento da saúde municipal 

Tal qual já se fazia, desde 1934, com o ensino público, a Emenda Constitucional n.º 29, de 2000, atrelou parte da receita de impostos, próprios e transferidos, para a Saúde, assegurando efetiva participação orçamentária de Estados e Municípios no Sistema Único de Saúde – SUS (art. 198, § 1º). 

Nesse rumo, os municípios ficaram obrigados a aplicar, anualmente e a partir de 2004, 15% da receita de impostos ou fundo de impostos, seja a arrecadação própria, seja a transferida pela União e Estado. 

Doze anos depois, em 2012, a Presidência da República sanciona, com 15 vetos, instrumento regulatório, solicitado naquela Emenda 29. 

Eis a Lei Complementar nº 141, que dispõe sobre o financiamento do setor, estabelecendo o que é e o que não é despesa típica da saúde, bem assim os critérios de repasse entre governos, a transparência, o controle e a prestação de contas. 

E tal diploma reiterou aquele percentual mínimo da Emenda 29; os tais 15% de impostos que as prefeituras devem reverter, todo ano, para a área em questão. Antes dele, aquele mínimo incidia somente nos impostos literalmente enunciados na Constituição (art. 198, § 2º, II e III). Desta feita, ampliou-se a base de financiamento, adicionando-se receitas de compensação financeira e de fundos amparados em impostos, além da dívida ativa e os juros e as multas decorrentes de tributos pagos em atraso. 

Assim, confere-se à Saúde elasticidade de financiamento assemelhada à da Educação, setor que, como se sabe, vincula fração da “receita resultante de impostos” (art. 212 da CF). 

Vai daí que o piso da saúde passou a abranger os recursos compensatórios da Lei Kandir (Lei nº 87, de 1996), bem como o 1% de FPM recebido, adicionalmente, em julho e dezembro (art. 159, I, “d” da CF) e os ocasionais auxílios federais pela queda no repasse do Fundo de Participação dos Municípios - FPM. 

De mais a mais, o novo ordenamento resolve a controvérsia alusiva à parcela retida pelo Fundo da Educação Básica, o Fundeb (20%); a polêmica se dava porque, no padrão nacional dos balanços públicos, os impostos vinculados àquele Fundo [3] são reduzidos, em 20%, por uma conta redutora, subtrativa, diminutiva. 

Então, a partir da Lei 141 não resta mais dúvida: 20% do Fundeb compõem, sim, o valor sobre o qual se calcula o financiamento mínimo da saúde, mesmo que parte daquele percentual não adentre, de fato, os cofres municipais, conquanto perdido para outro Estado ou Município, com maior rede própria de educação básica [4]

Bem confirmando esse entendimento, assim diz a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), no Manual de Demonstrativos Fiscais (7ª edição): 

“Não poderá ser deduzida da base de cálculo das receitas, para fins de apuração dos percentuais de aplicação em ASPS (ações e serviços públicos de saúde), quaisquer parcelas de impostos ou transferências constitucionais vinculadas a fundos ou despesas, aí se incluindo a receita vinculada ao Fundo de Combate à Pobreza ou ao FUNDEB”. 

Em que pese a importância da tal Lei 141, incorreu ela num vacilo: a possibilidade da despesa não processada já contar no financiamento mínimo (os 15% anuais), desde que conte ela com lastro financeiro. É assim porque, ainda não processado, o gasto é somente um documento formal, que ainda não significou, de fato, bens e serviços para a saúde. Tanto é verdade que, em contabilidade pública, essa dispêndio sequer integra o balanço patrimonial, além do que o tal suporte financeiro não é garantia segura, pois facilmente transferido para outra conta bancária; com um simples toque de computador. 

Além dos 15% de impostos, próprios e transferidos, a saúde conta com recursos adicionais, as chamadas fontes suplementares; eis as obrigatórias e periódicas transferências SUS, os repasses voluntários da União e do Estado, os rendimentos das contas do fundo municipal de saúde, as multas da vigilância sanitária, entre outras que devem ser integralmente aplicadas em ações da área em debate (100%). 

Os repasses SUS nada têm de voluntários; são, por força de lei, compulsórios, obrigatórios. De fato, essas transferências não podem ser retidas pela União, a menos que o governo local indisponha de conselho e fundo de saúde (art. 22, da sobredita Lei 141). 

E, a partir de 2018, os recursos SUS não mais estão amarrados, de forma rigorosa, aos programas da saúde, mas a custeio e a investimento, o que facilita, sobremaneira, a gestão financeira, lembrando que, antes, sobrava dinheiro em algumas ações, faltando em outras. 

Apesar dessa flexibilização financeira, a aplicação continua submetida ao plano municipal de saúde, nele previsto as ações que acontecerão nos programas SUS: Atenção Básica; Atenção de Média e Alta Complexidade; Vigilância em Saúde; Saúde da Família; Agentes Comunitários; Assistência Farmacêutica – Básica; Assistência Farmacêutica – Excepcional. 

Muito embora o Ministério da Saúde, mediante o SIOPS, e os Tribunais de Contas disponham de fórmulas para cálculo eletrônico do piso constitucional, não é demais saber que a apuração, em síntese, se dá como segue: 

Despesas empenhadas, liquidadas e pagas à conta das subfunções da Função 10 – Saúde.

R$

(+) Despesas empenhadas e não liquidadas com suporte financeiro nas contas do fundo municipal de saúde.

R$

(+) Cancelamento ou prescrição de Restos a Pagar da Saúde (despesas empenhadas em anos anteriores).

R$

(-) Receitas adicionais da Saúde (*)

 

 

(/) receita de impostos (próprios e recebidos por transferência) MAIS dívida ativa de impostos MAIS Retenção para o Fundeb MAIS compensação financeira da Lei Kandir MAIS 1% adicional de FPM (julho e dezembro).

R$

(=) percentual de aplicação em ações e serviços de saúde (no mínimo, 15% da receita de impostos).

%

(*) repasses do SUS; transferências voluntárias da União e do Estado; rendimentos das contas bancárias do fundo municipal de saúde; multas da vigilância sanitária. 

3.1- O braço financeiro do Conselho Municipal de Saúde  

Para a Lei 141/2012, o fundo municipal de saúde é a unidade orçamentária que movimenta todos os dinheiros da saúde local (art. 14).

Segundo a 7ª edição do Manual de Demonstrativos Fiscais, da Secretaria do Tesouro Nacional (STN): 

“Ressalta-se que os fundos de saúde necessitam ser cadastrados no CNPJ na condição de matriz. Essa exigência não lhes altera a natureza, ou seja, não lhes confere personalidade jurídica, restando claro que fundo não é sujeito de direitos, não contrata, não se obriga, não titulariza obrigações jurídicas, conforme estabelece o Parecer PGFN/CAF/N.º 1396/2011. Por essa razão, os fundos de saúde não praticam atos de gestão ou quaisquer outros que demandem personalidade jurídica própria, como firmar contratos administrativos ou a contratar pessoal, por exemplo, e não detêm a propriedade dos recursos que por ele tramitam, sendo o patrimônio afetado ao fundo para a realização dos seus objetivos. No entanto, os fundos de saúde necessitam demonstrar a disponibilidade de caixa e a vinculação de recursos, bem como elaborar demonstrações contábeis segregadas, visando atender às regras restabelecidas no parágrafo único do art. 8º e nos incisos I e III do art. 50 da Lei Complementar nº 101/2001”. 

Sobre aquele mecanismo orçamentário-financeiro, o chamado fundo especial, não é demais lembrar que está regulado na Lei 4.320, de 1964, e, também, na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Em suma, fundo especial: 

Ø     É sempre instituído por lei, de exclusiva iniciativa do Poder Executivo;

Ø É financiado por receitas especificadas naquela lei; daí sua autonomia financeira;

Ø     É vinculado estritamente às atividades para as quais foi instituído;

Ø Findo o exercício financeiro, eventuais sobras monetárias continuam pertencendo ao fundo, ou seja, não serão recolhidas ao Caixa Central do Município;

Ø     Dispõe de orçamento próprio, denominado plano aplicação;

Ø     Conta com normas especiais de controle e prestação de contas. 


4-     A eficiência operacional da saúde municipal 

Em boa parte dos casos, o Município aplica muito mais que o piso constitucional de 15%, mas a saúde local apresenta-se precária. De fato, são pouquíssimas as prefeituras que têm contas reprovadas por falta de atingimento daquele percentual mínimo. 

De outro lado, estudos acadêmicos têm concluído que, na educação e na saúde, vários municípios realizam eficiente atendimento, apesar de gastarem menos que outras localidades. Dito de outra maneira, fazem “mais com menos”. 

Assim, para aferir a efetividade das políticas municipais de saúde, é preciso recorrer a indicadores consagrados como o item saúde do Índice de Desenvolvimento Humano-Município (Idh-M), além dos produzidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), notadamente o essencial Índice de Desempenho SUS, o Idsus, que afere nada menos que 27 (vinte e sete) aspectos da área em questão, seja quanto ao acesso da população, seja quanto à efetividade das ações desenvolvidas. 

E a qualidade da saúde é também verificada pelo nível de atuação dos conselhos de saúde, o que pressupõe um eficiente e contínuo treinamento dos conselheiros. 

Fundamental que o conselheiro saiba dos problemas de saúde da população, da quantidade de atendimentos realizados, das especialidades oferecidas, das carências materiais e humanas, do tempo de ocupação dos leitos hospitalares, da procura em municípios vizinhos com melhor qualidade de atendimento. 


5-     A primeira função fiscalizatória do Conselho Municipal de Saúde – a eficiência operacional da saúde municipal (estudos e visitas nos locais de atendimento) 

De início, o Conselho deveria estudar a evolução do Município nos sobreditos indicadores da saúde. 

Depois, verificar se estão sendo, de fato, cumpridas as metas físicas estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias – LDO, seja no que diz respeito à construção de instalações, seja quanto ao prometido número de atendimentos. 

Em seguida, é absolutamente fundamental que os conselheiros visitem as unidades de atendimento, quer as unidades básicas (UBS), as de pronto de atendimento (UPAs) e os hospitais. O produto dessas inspeções será anotado em relatório. 

Para tal missão, de lembrar que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) vem realizando auditorias-surpresa em unidades de atendimento médico, nisso detectando várias falhas na gestão da saúde municipal, que serão levadas ao relatório que aprecia a gestão anual do Prefeito. 

Nessa marcha e aproveitando roteiro metodológico daquela Corte de Contas, os conselheiros de saúde poderiam ser valer dos seguintes quesitos em suas visitas às UBS, UPAs e hospitais: 

§  Qual o tempo de espera para atendimento do paciente, após entrada na unidade de saúde? (obs.: TCESP obteve uma média de 65 minutos);

§  Dentre as especialidades médicas oferecidas, há médicos para atender a todas elas?

§  Existe atendimento diferenciado para os casos com suspeita de dengue, chikungunya e febre amarela?

§  A Prefeitura realiza pesquisa de satisfação com usuários? Qual o resultado nela aferido?

§  Há controle de frequência de todos os funcionários, inclusive dos médicos? De que forma (manual? ponto eletrônico? digital?)?

§  São boas as condições da sala de espera (cadeiras, ar condicionado, ventilador, iluminação etc.)?

§  Há agendamento prévio das consultas?

§  Existe atendimento preferencial para idosos e portadores de deficiências físicas?

§  Em média quanto tempo leva o médico para atender o paciente? (obs.: o TCESP encontrou média de 36 minutos)

§  A jornada de trabalho dos médicos, enfermeiros e demais funcionários está afixada em local visível da UBS, UPA ou hospital?

§  Sempre há médico no plantão noturno?

§  Nas UBS, UPAs e hospitais existe equipamentos em desuso (Raio X, mamógrafo, tomógrafo, entre outras máquinas)?

§  Os resíduos infectantes são separados do restante dos resíduos hospitalares?

§  A coleta de lixo hospitalar é terceirizada? 

E, ainda aproveitando a metodologia do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP), os conselheiros de saúde deveriam inspecionar o almoxarifado de medicamentos (farmácia municipal), valendo-se dos seguintes quesitos:

a)                      A farmácia sempre conta com a presença de um farmacêutico responsável?

b)                     O local de armazenamento possui controle de temperatura e umidade, luz de emergência e fonte alternativa de energia?

c)                      A farmácia dispõe de alvará da vigilância sanitária e auto de vistoria do Corpo de Bombeiros?

d)                     De forma incorreta, os medicamentos estão encostados na parede ou no solo, além de sofrer incidência da luz solar?

e)                      Há regular controle de vencimento dos medicamentos?

f)                       A farmácia trabalha sob o conceito de estoque mínimo (de segurança)?

g)                      Os medicamentos de uso controlado são guardados em armário de acesso absolutamente restrito?

h)                     As guias de retirada bem identificam o paciente beneficiado?

i)                       A relação atualizada de medicamentos é disponibilizada aos médicos da rede pública municipal?

j)                        A contagem de estoque coincidiu com o saldo anotado nas fichas de controle?


6-     A segunda função fiscalizatória - a correta disponibilização das receitas pertencentes ao setor.

Quanto à disponibilização de receitas do setor, os conselheiros de saúde devem observar o que segue: 

·         Ao menos 15% da receita de impostos (próprios e transferidos) e mais as receitas adicionais (SUS, rendimentos financeiros etc.) foram todas depositadas nas contas do fundo municipal de saúde?

·         Nesse conjunto de receitas, estão inclusos 15% da retenção Fundeb e do adicional de FPM (1%), recebido em julho de dezembro?

·         Paga mediante a oferta de bens (dação em pagamento de veículos, terrenos etc.), 15% da dívida ativa de impostos foi entregue àquele fundo de saúde?


7-     Segunda função fiscalizatória do Conselho Municipal de Saúde – a correta aplicação das receitas pertencentes à saúde. 

7.1 – A gestão da despesa da saúde: 

Aqui, os conselheiros de saúde poderiam atuar se orientando pelos seguintes quesitos, anotando falhas no respectivo relatório: 

§  Os recursos foram todos movimentados pelo fundo municipal de saúde?

§  O titular da Saúde (Secretário, Diretor ou Coordenador) assinou as notas de empenho e ordens de pagamento (mesmo que em conjunto com o Prefeito)?

§  A despesa não liquidada conta com disponibilidade nas contas bancárias do fundo municipal de saúde?

§  Referente ao cancelamento de Restos a Pagar da saúde (despesas de anos anteriores), o valor foi aplicado em complemento ao piso de financiamento (os 15% de impostos)?

§  Beneficiando entidades de saúde do terceiro setor (Santas Casas, OS, OSCIPs etc.), o repasse financeiro foi autorizado por lei específica? A Prefeitura designou gestor para monitorar a aplicação do recurso? O site da ONG e do Município bem transparece o andamento da parceria? O Controle Interno da Prefeitura atestou a eficiência operacional e a prestação de contas da ONG?

§  A Prefeitura atendeu às recomendações de melhoria de gestão financeira, feitas pelas instâncias de controle (do próprio Conselho, do Controle Interno, do Tribunal de Contas)?

§  O recebimento de bens e serviços é atestado por servidor especialmente designado pelo responsável do órgão municipal da Saúde (Secretário, Diretor ou Coordenador)? 

7.2 – A impugnação das despesas impróprias à Saúde 

Tendo em mira que a Saúde é setor dispendioso, pode parecer desnecessário verificar se o Município aplicou, de fato, os 15%. Contudo, há de se ponderar que, além desse valor mínimo, devem também ser aplicados, com rigor e exatidão, os alentados repasses do Sistema Único de Saúde (SUS). 

No exame da despesa do setor, os conselhos podem analisar, por amostragem, os relatórios apresentados, periodicamente, na página eletrônica do Município e, no caso de suspeitas e dúvidas, solicitar exame do correspondente processo de despesa ou, ao menos, requerer que o Controle Interno assim o faça, aqui lembrando que, por força legal, a prefeitura não pode sonegar ao conselho documentos financeiros e operacionais e, também, que sobredito controle internalizado tem autonomia em face de previsão constitucional (art. 74). 

E na verificação da despesa, deveriam ser impugnados gastos que, por força da Lei 141/2012, não são típicos, estrito senso, das ações e serviços de saúde. São eles: 

-  Despesas não liquidadas, desprovidas de suporte monetário;

-   Pagamento de aposentadorias e pensões de servidores oriundos da Saúde;

-  Pessoal em atividade desviada da área em questão (ex.: médicos com funções administrativas no Gabinete do Prefeito; motoristas que não estão sob exclusiva disposição da Secretaria de Saúde);

-  Assistência à saúde que não atende ao princípio do acesso universal (ex.: plano de assistência médica e odontológica para servidores públicos, os ditos planos fechados);

-  Merenda escolar e outros programas de alimentação, ainda que executados em unidades do SUS, excetuando-se a recuperação de deficiências nutricionais;

- Saneamento básico, à exceção do realizado em pequenas comunidades e do manejo ambiental alusivo a controle de vetores de doenças;

-  Limpeza urbana e remoção de resíduos (transporte; transbordo; tratamento e destino final do lixo doméstico e de logradouros públicos);

-  Preservação e correção do meio ambiente;

Ações de assistência social (ex.: Programa Leve Leite);

-   Obras de infraestrutura, ainda que beneficiem a rede de saúde (ex.: asfaltamento e iluminação em frente a hospitais e postos de saúde).

-   Programa Academia de Saúde;

-   Programa Farmácia Popular (os preços cobrados, mesmo que de custo, contrariam a gratuidade exigida na Lei 141/2012);

-  Despesas com precatórios judiciais e decisões administrativas relativas à remuneração do pessoal da Saúde (pois a competência do gasto provém de anos anteriores);

-  Despesas com o Pasep- Programa de Formação do Patrimônio do Servidor (conforme a Secretaria do Tesouro Nacional, o Pasep não é gasto de pessoal, mas uma espécie de tributo municipal).

-  Compra de glebas ou terrenos para futura construção de unidades de saúde (a menos que haja lei vinculando o uso da terra à edificação de uma UBS, UPA ou hospital);

-  Aquisições globais de bens e serviços que também servem a vários outros setores da Administração (ex.: combustíveis, material de escritório, peças de reposição da frota); para evitar tal glosa, servidor da Saúde deve atestar, expressamente, a cota da Saúde.

-  Subvenção a instituições assistenciais.


Notas

[1] Aliás, antes de a Prefeitura encaminhar à Câmara o projeto de lei de diretrizes orçamentárias (LDO), o Conselho Municipal de Saúde precisa aprovar a programação anual do Plano de Saúde (art. 36, § 2º, da Lei 141, de 2012).

[2] Segundo a Lei 8142, de 1990, tal conferência será realizada, a cada quatro anos, para avaliar a saúde municipal, apresentando propostas que culminarão no plano municipal de saúde (art. 1º, § 1º). E, depois, os repasses do Sistema Único de Saúde (SUS) se baseiam unicamente naquele plano. 

[3] Fundo de Participação de Estados e Municípios (FPE-FPM), ICMS, IPI/Exportação, IPVA, ITCMD e ITR.

[4] “Art. 29. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios excluir da base de cálculo das receitas de que trata esta Lei Complementar quaisquer parcelas de impostos ou transferências constitucionais vinculadas a fundos ou despesas, por ocasião da apuração do percentual ou montante mínimo a ser aplicado em ações e serviços públicos de saúde”.


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