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Da tutela antecipada em sede recursal

Da tutela antecipada em sede recursal

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De nada valeria a antecipação da tutela se seus efeitos não valessem também na fase recursal. Para frustrá-la, bastaria a interposição de um recurso dotado de efeito suspensivo, orientada pelo intuito protelatório do réu.

INTRODUÇÃO.

            A tutela antecipada como instituto hábil a ser aplicado de modo amplo e genérico [01] foi contemplada pelo legislador pátrio como forma de proporcionar uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva, concretizando, assim, o princípio constitucional do amplo acesso à justiça, estampado no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal de 1988. Este é o entendimento consagrado na doutrina, como demonstram Luis Rodrigues WAMBIER, Eduardo TALAMINI e Flávio Renato Correia de ALMEIDA:

            Com a edição da Lei 8.952/94, que alterou a redação do art. 273 do CPC, foi introduzido no sistema processual brasileiro o instituto da tutela antecipatória, visando erradicar a ineficiência do processo diante da declarada e assumida morosidade do Poder Judiciário na solução dos conflitos. Antecipando os efeitos da sentença, afastou-se o problema da inefetividade jurisdicional. Seu escopo é a de tornar a prestação jurisdicional efetiva, sem, contudo, compatibilizá-la com o sentido de acautelamento. A necessidade dessa efetividade é a contrapartida que o Estado tem que dar à proibição da autotutela. [02]

            Almejou-se, ao se generalizar a incidência da tutela antecipada, obstar a chamada "vitória de Pirro", como bem salienta Teori Albino ZAVASKI:

            ...o dever imposto ao indivíduo de submeter-se obrigatoriamente à jurisdição estatal não pode representar um castigo. Pelo contrário, deve ter como contrapartida necessária o dever do Estado de garantir a utilidade da sentença, a aptidão dela de garantir, em caso de vitória, a efetiva e prática concretização da tutela (....).

            O direito fundamental à efetividade do processo – que se denomina também, genericamente, direito de acesso à justiça ou direito à ordem jurídica justa – compreende, em suma, não apenas o direito de provocar a atuação do Estado, mas também e principalmente o de obter, em prazo adequado, uma decisão justa e com potencial de atuar eficazmente no plano dos fatos. [03]

            Cândido DINAMARCO assevera que o "novo art. 273 do CPC, ao instituir de modo explícito e generalizado a antecipação dos efeitos da tutela pretendida, veio com o objetivo de ser uma arma poderosa contra os males corrosivos do tempo no processo." [04]

            No mesmo sentido, pontificou José Rogério CRUZ E TUCCI que:

            O regime do art. 273 generalizou a antecipação da tutela no âmbito do procedimento comum do processo de conhecimento. Havendo prova pré-constituída inequívoca, hábil a fornecer ao julgador alto grau de probabilidade, deve ser deferida: a) quando houver fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, desde que não haja perigo de irreversibilidade do provimento antecipatório; ou b) quando ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o inequívoco intuito protelatório do réu." [05]

            Na seqüência, para atender à demanda jurisdicional, a doutrina passou a pregar a antecipação da tutela em sede recursal e William Santos FERREIRA foi quem desenvolveu com bastante acuidade o tema, com cuja obra, denominada "Tutela antecipada no âmbito recursal", justificou a impossibilidade do instituto ficar "represado" na primeira instância e explicitou as controvérsias criadas em torno da questão.

            Evidente que de nada valeria todo o esforço legislativo, doutrinário e jurisprudencial engendrado para se arquitetar um instituto apto a antecipar a tutela almejada com a prestação jurisdicional, se seus efeitos não pudessem ser concretizados e sentidos também na fase recursal. Bastaria a interposição de um recurso dotado de efeito suspensivo, orientada pelo intuito protelatório do réu, para frustrar o gozo dos efeitos da tutela. Por tal razão especialíssima, acertadamente frisou William Santos FERREIRA que "a tutela antecipada não pode ser um instituto represado na primeira instância, mas que terá sua função marcante, até com maiores justificativas, no âmbito recursal". E tal assertiva justificou-se no reconhecimento de que a recorribilidade é uma extensão da ordinariedade, devendo ser criada uma forma de, pelo menos, afastar os efeitos danosos da protelação que oportuniza.

            Também resta justificada a inserção do instituto ao âmbito recursal, não obstante a ausência de previsão legal expressa, pelos princípios constitucionais processuais, como bem assevera Roberto ARMELIN:

            Inicialmente, até mesmo por sua posição geográfica, pode-se equivocadamente – interpretar o instituto da antecipação de tutela como concebido para projetar sua eficácia no âmbito do processamento, em primeiro grau de jurisdição, do processo de conhecimento, em que a tutela de urgência, antecipatória de efeitos da pretensão, era desconhecida.

            A questão, todavia, não se cinge à positivação e localização do instituto no Código de Processo Civil, senão que, encerrando princípio geral de Direito (devido processo legal, inafastabilidade do controle jurisdicional), demanda identificação de seu fundamento de eficácia e validade, para, posteriormente, perquerir-se eventual limitação à propagação de seus efeitos. [06] (sem grifo no original)

            O presente trabalho monográfico, levando em consideração as controvérsias existentes sobre a antecipação da tutela na sede recursal e sua insipiência, tem por objetivo estudá-la.

            Assim, buscar-se-á com o desenvolvimento da monografia ora projetada vislumbrar como se integra o instituto da tutela antecipada à sede recursal. E, para tanto, dividir-se-á o presente trabalho em três capítulos. O primeiro tratará do instituto da antecipação da tutela face à nova feição do direito processual civil, onde serão cotejados os meandros da atual prestação jurisdicional. No segundo capítulo, intitulado "Do instituto da antecipação de tutela", será estudada a configuração dada ao art. 273 do CPC, principal dispositivo que disciplina a antecipação da tutela no ordenamento brasileiro. Por derradeiro, vislumbrar-se-á a antecipação da tutela em sede recursal, oportunidade em que se buscará constatar como se integra o instituto à seara recursal e como funciona face a cada espécie recursal.


1DO INSTITUTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA FACE À NOVA FEIÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL.

            Antes de se adentrar ao tema propriamente dito: a antecipação de tutela na sede recursal, faz-se imprescindível vencer no presente trabalho monográfico duas etapas, a primeira relativa ao estudo da tutela jurisdicional de direitos e outro sobre a antecipação dessa tutela. Assim se procede tendo conhecimento de que um estudo científico deve bem localizar o seu objeto de estudo antes de desenvolvê-lo e principalmente para demonstrar que a criação de uma disciplina específica para a antecipação de tutela decorre de uma nova feição que vem sendo impressa ao direito processual civil.

            O primeiro aspecto acima mencionado serão abordado neste primeiro capítulo; o outro no capítulo seguinte.

            1.1DA TUTELA JURISDICIONAL DE DIREITOS.

            Na presente seção, abordar-se-á a questão relativa à nova feição da jurisdição e do direito processo civil, que vem ensejando a criação de tutelas diferenciadas com o objeto de melhor salvaguardar as diversas modalidades de direito material.

            1.1.1Do Caráter Instrumental do Direito Processual Civil.

            Inauguremos a presente seção, afirmando que o processo é instrumento da jurisdição e que o escopo desta é tutelar direitos, como diz CHIOVENDA, "dar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ele tem o direito de obter". [07]

            Nessa perspectiva, o processo é o meio pelo que irá provocar a jurisdição a fim de que esta, através de um provimento jurisdicional, proporcione ao jurisdicionado o "bem da vida" por ele pretendido ou a "tutela" do direito que afirma possuir.

            Dar o bem da vida ou proporcionar tutela ao direito afirmado é a prestação jurisdicional almejada pelas partes e para isso se esforça o moderno direito processual civil, não obstante seja incontestável que também há prestação jurisdicional quando o juiz declara não existir o direito afirmado pelo autor ou mesmo quando extingue o processo, sem julgamento do mérito, ante a adoção da teoria abstrata da ação [08], a qual prega que o direito de ação dissocia-se da constatação efetiva do direito material.

            Não obstante a concepção abstrata da ação no direito brasileiro, imprescindível é a preocupação do direito processual para com o direito material afirmado pelo autor, cuja eventual existência será declarada pela jurisdição. Procura-se visualizar o direito processual como um instrumento para a realização do direito material. Nesse sentido o ensinamento de Luiz Guilherme MARINONI: "Em uma perspectiva mais rente ao direito material, é possível equiparar a "tutela" a um "bem da vida", uma vez que o jurisdicionado procura o Poder Judiciário para obter um "bem da vida" ou a "tutela" do direito que afirma possuir." [09]

            A respeito da afirmação acima, diz-se que o direito processual passou por uma evolução ao longo dos tempos, saindo de uma posição em que pouco ou nada lhe importava o direito material em jogo na demanda para obter uma posição de instrumento para a realização dos direitos e/ou interesses em conflito. Hoje, incontestavelmente, a doutrina, a jurisprudência e a lei, assim como aqueles que as operam, preocupam-se intensamente com o papel manifestado pelo direito processual em relação ao direito material, e essa preocupação é quanto à efetividade do direito material ou, como diz Luiz Guilherme MARINONI:

            O que a questão de tutela jurisdicional dos direitos quer evidenciar é a necessidade de a prestação jurisdicional passar a ser pensada na perspectiva do consumidor dos serviços jurisdicionais; ou seja, a reabilitação do tema da tutela jurisdicional dos direitos revela uma preocupação com o resultado jurídico-substancial do processo, conduzindo a uma relativização do fenômeno direito-processo. [10]

            Entende-se que o processo é um meio para a realização do direito material não observado espontaneamente pelas partes, complementando o direito material Como diz Ovídio A. Baptista da SILVA:

            A supremacia do processo sobre o direito material, em última análise, a supremacia da forma sobre a substância, que foi a idéia fundamental a sustentar a autonomia do direito processual e seu lamentável afastamento do direito material, como se vê, acaba insinuando-se até nas concepções de juristas de vanguarda, preocupados com a efetiva modernização do processo e com sua indispensável aderência ao direito material. [11]

            A princípio, o processo era visto como mero apêndice do direito material, não contemplando qualquer autonomia de científica e sem considerações específicas, desvinculadas do direito material. Como revela Sérgio Cruz ARENHART, "Nessa ótica, evidentemente, a função do processo era voltada, de maneira específica, à proteção do direito subjetivo da parte; sua finalidade era dar proteção do direito subjetiva e nisso se resumia". [12]

            Posteriormente, desenvolve-se a fase da autonomia do direito processual. Nessa fase, a partir da consideração de que o direito processual tem princípios, condicionantes, institutos e métodos próprios, distintos daqueles adotados pelo direito material, o processo passa a ser entendido como algo diverso do direito material. Direito material e direito processual, nesta fase da autonomia científica, passam a ser concebidos como ciências independentes, sem qualquer vinculação. Luiz Rodrigues MARINONI bem revela o significado dessa fase da evolução (ou involução) do direito processual:

            A expressão "tutela jurisdicional dos direitos", como se sabe, foi afastada do cogito científico do Direito Processual quando se concluiu que "a tutela dos direitos" não deveria ser vista como o escopo da jurisdição. A partir deste momento até bem pouco tempo, falar em tutela jurisdicional poderia constituir um pecado quase que mortal para o processualista; tal fala poderia significar um compromisso com o imanentismo. [13]

            Por derradeiro, afirma-se a instrumentalidade do direito processual. Passa-se a conceber, nessa etapa de evolução, "que o processo não é mais do que uma ferramenta, e que, como tal, deve ser útil para desempenhar seu papel. A ferramenta inútil ou inadequada para certa tarefa não tem serventia e será descartada. Para manter a ferramenta, é necessário torná-la apta a desenvolver suas funções." [14]

            Concebido o caráter instrumental do direito processual, reconhece-se a necessidade de que se demonstre adequado a concretizar uma finalidade: a justiça, através da promoção do direito material cujo gozo se pretende através da demanda judicial. Essa é, pois, a conclusão obtida quanto ao papel que o processo civil deve desempenhar e que impulsiona outras mudanças de paradigma a serem vislumbradas nesse trabalho.

            Hoje, portanto, o direito processual é concebido como uma ciência autônoma, mas que é instrumental em relação ao direito material cuja concreção pretende o jurisdicionado, à medida que serve de "meio" para o patrocínio da tutela jurisdicional.

            Forma-se a convicção, a partir do princípio da instrumentalidade que imanta o moderno direito processual, que as formalidade processuais não podem prejudicar o direito material, que o processo visa realizar.

            Sobre a instrumentalidade, se manifesta Ovídio A. Baptista da Silva, nos seguintes termos: "A utilização de alguma coisa como instrumento pressupõe uma atividade humana orientada para um fim. O agente que se serve do instrumento pode usá-lo para finalidade muito diferente daquela para a qual ele foi criado". [15]

            Em atenção a essa observação de Ovídio Baptista, deve-se ressaltar que ao se falar em instrumentalidade do processo, deve-se ter em vista os fins a serem atingidos pelo processo que, no dizer de Sérgio Cruz ARENHART, se resumem na obtenção da justiça.

            Concebendo que o processo é instrumental, um meio para a realização do direito material, e que como tal deve patrocinar uma tutela jurisdicional adequada, hábil a patrocinar a justiça, a doutrina passa a se atentar para a necessidade de reformular o processo civil como um todo para efetivar uma tutela adequada. E partindo para essa reformulação, percebe que, por exemplo, a classificação trinária das sentenças e o procedimento ordinário clássico são insuficientes para patrociná-la, principalmente diante do surgimento de novos conflitos sociais, que trouxeram para o campo do processo novas e inusitadas demandas. Para que o processo civil possa atender as essas novas demandas, a doutrina passa a propor, dentre outras inovações, uma classificação quinária das sentenças, o abandono do processo clássico ordinário, a adoção de tutelas diferenciadas, hábeis a tutelar os novos direitos que surgem, a reformulação da disciplina do processo civil, proporcionando às partes o mais amplo contraditório, como propugna a Constituição Federal.

            Nessa fase instrumentalista, como ressalta Sérgio Cruz ARENHART, "O processualista se dá conta de que o processo não é mais do que uma ferramenta, e que, como tal, deve ser útil para desempenhar seu papel. A ferramenta inútil ou inadequada para certa tarefa não tem serventia e será descartada. Para manter a ferramenta, é necessário torná-la apta a desenvolver suas funções." [16]

            A idéia principal dessa fase, que atualmente passa a comandar a tutela jurisdicional, é que a forma não pode prejudicar o direito material cuja tutela deseja-se, mas que, além disso, compete ao direito processual criar formas diferenciadas para viabilizar a efetividade do direito material.

            Além de dotar o jurisdicionado de formas diferenciadas de tutela de seus direitos, o processo deve privilegiar a participação em contraditório. O princípio do contraditório vem previsto no art. 5º, LV, da CF/88 e preconiza que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes."

            Passa-se a conceber, nessa revolução do direito processual, que o processo deve garantir às partes a participação em contraditório. E essa participação em contraditório visa proporcionar-lhe paridade de tratamento. Sérgio ARENHART situa a participação em contraditório como um dos pressupostos para a concretização da tutela jurisdicional adequada. A respeito, ele diz:

            Se, para a proteção de um direito afirmado, necessita o Estado saber se ele realmente existe, então é imprescindível que o processo garanta aos sujeitos neles envolvidos amplas possibilidades de apresentar e demonstrar suas versões sobre os fatos que guarnecem o conflito de interesses, sob pena de inviabilizar a tutela do direito realmente merecedor de proteção. [17]

            Resta necessário, portanto, que as partes atuem em igualdade de condições no processo e isso se relaciona diretamente ao direito à prova. Afigura-se, assim, imprescindível que as partes veiculem suas alegações e produzam as provas que lhes cabem para possibilitar ao juiz a formação de seu convencimento, hábil à manifestação do provimento jurisdicional adequado.

            Em suma, as partes devem exaurir suas possibilidade de participação e interação no processo. O Estado, por sua vez, deve proporcionar às partes condições de acesso aos mecanismos públicos de proteção e de interferência na aplicação do poder estatal.

            1.1.2 Dos Novos Direitos e da Necessidade de Uma Tutela Jurisdicional Diferenciada.

            A sociedade atual, devido ao seu desenvolvimento, passa a conviver com novas modalidades de direitos, muitos dos quais ainda sem proteção adequada. No dizer de Sérgio Cruz ARENHART:

            ...a perspectiva de direito material, no plano da sociedade contemporâneo, apresenta duas significativas características: em primeiro lugar, a realidade moldou, de maneiro diferente, direitos clássicos, tradicionalmente manipulados pelo processo; em segundo lugar, a sociedade moderna faz surgir novos direitos, anteriormente impensáveis e próprios da comunidade hodierna. [18]

            O surgimento desses novos direitos, para exemplificar, os ligados à era da Internet, demandam uma nova e específica tutela. Por isso, busca-se estabelecer uma correspondência entre o direito e a tutela judicial e, para isso, é necessário que os operadores jurídicos conscientizem-se de que a tutela jurisdicional clássica não se presta à tutela dos direitos surgidos diante das contemporâneas contingências sociais. Por isso, muitas modificações fazem-se necessárias no plano do processo. O regime da prova, por exemplo, deve amoldar-se às possibilidades vislumbradas num dado caso de direito material. É preciso reconhecer que a mesma prova admitida nas lides clássicas não serve para as lides que ora surgem.

            Aventa-se também a necessidade do judiciário e do processo se organizarem para patrocinarem uma tutela efetiva aos chamados direitos de massa, coletivos.

            Ademais, fomenta-se a concepção de que o processo deve fortalecer o máximo possível as possibilidades de inibir lesões aos direitos e interesses, daí a importância da proposta de Sérgio Cruz ARENHART relativa à tutela inibitória, seja de direitos e interesses individuais, sejam de coletivos.

            Este mesmo autor revela que é imprescindível dar-se guarida à uma tutela jurisdicional do direito, para conferir efetividade do direito material postulado na inicial, mas que para lograr esse resultado faz-se necessário "a previsão de mecanismos adequados de proteção do interesse sustentado por quem requer a resposta jurisdicional do Estado". [19]

            Defende-se, assim, o comprometimento do processo com a distribuição da justiça, como bem retratado por CHIOVENDA:

            Verdadeiramente, o processo moderno não pode preocupar-se somente com a decisão final; não pode limitar sua função a preparar uma solução logicamente correta da lide; sendo que deve ter em conta a posição dos litigantes durante a causa, como cidadãos que invocam ambos a tutela do Estado. A justiça no processo não começa com a decisão; com o início mesmo da causa se abre um amplo campo à justiça distributiva. Tampouco as normas judiciais contemplam somente aos litigantes do caso concreto; as mesmas devem prover de modo que reforcem a confiança dos cidadãos na ação do Estado; não somente como juiz mas como poder. [20]

            O direito à tutela jurisdicional, como posto pelos doutrinadores contemporâneos, preconiza não só o direito de provocar a jurisdição, mas o direito a obter uma prestação jurisdicional que proporcione um procedimento, meios de defesa e provimento adequados à natureza do direito que se quer tutelar.

            Também de nada adianta promover a tutela jurisdicional se ela chegar tarde ao seu destinatário. Em razão disso, o ordenamento processual civil brasileiro também evoluiu no sentido de preconizar, de forma ampla e genérica, a antecipação da tutela, ao instituir a atual redação do art. 273 do Código de Processo Civil.

            Tradicionalmente, a ação e a sentença comportam uma classificação trinária. Elas eram classificadas em declaratórias, constitutivas e condenatórias. Essa classificação, todavia, em função de sua insuficiência, passou a ser quinária. Ovídio A. BAPTISTA DA SILVA foi um dos primeiros que se atentou para essa insuficiência e inovou nesse particular. A propósito diz:

            Com efeito, tendo os processualistas reduzido apenas a três as espécies de ações e sentenças – somente aquelas que operam exclusivamente no "mundo normativo", as declaratórias, constitutivas e condenatórias -, proclamam que estas eficácias são criações do direito processual, independentemente da natureza dos respectivos direitos litigiosos que lhes cabe instrumentalizar. Quer dizer, uma ação seria declaratória ou constitutiva, porque o legislador do processo assim o quer, não em razão da diversidade das respectivas pretensões de direito material de que elas provêm. [21]

            Como se percebe da passagem acima, o autor demonstra que a classificação das sentenças opera com base no direito material tutelado, as chamadas ações de direito material.

            Tendo em vista, portanto, a necessidade de outros tipos de sentenças para patrocinar efetiva tutela jurisdicional aos interesses garantidos pelo Estado, hoje a doutrina propõe uma classificação quinária das sentenças. Como observa Sérgio Cruz ARENHART:

            Quando se pensa em efetividade do processo, tem-se em vista exatamente esta reaproximação da atuação jurisdicional do Estado aos anseios do corpo social. Obviamente, este movimento não tem em mente unicamente atender aos desejos do jurisdicionado, no sentido de obter uma resposta mais adequada aos interesses que o Estado lhe garante; ao contrário, busca-se esta efetividade no intuito de atender, primeiramente aos fins do Estado, já que é condição para sua existência a sua utilidade, o que somente se obtém, no plano da jurisdição, com a adequada proteção aos interesses tutelados pelo direito objetivo estatal. [22]

            A classificação tradicional das sentenças é feita de acordo com o pedido veiculado no bojo da ação. É que este determina o tipo de ação que se trata, possibilitando constatar a natureza da tutela jurisdicional invocada, havendo, por isso, correspondência entre o tipo de ação com a sentença resultante. Havendo essa correspondência, costuma-se classificar as sentenças tal como as ações.

            Segundo a classificação usual que goza de plena aceitação na maioria da doutrina, as ações e as sentenças são declaratórias, constitutivas e condenatórias.

            As meramente declaratórias são aquelas em que o interesse do autor se limita à obtenção de uma declaração judicial acerca da existência ou inexistência de determinado relação jurídica ou a respeito da autenticidade ou da falsidade de um documento (art. 4º do CPC).

            As condenatórias são aquelas em que o autor visa uma condenação do réu ao cumprimento de uma obrigação.

            As constitutivas, por sua vez, visam constituir, modificar ou desconstituir uma relação jurídica.

            Vale frisar que o caráter constitutivo é inerente, também, às sentenças condenatórias e constitutivas. Como diz Luiz Rodrigues WAMBIER, "Todas as sentenças têm, como se sabe, um cunho declaratório. A declaração se impõe logicamente, antes de tudo, ao juiz". Assim, há sentenças em que o juiz, além de declarar, condena o réu a uma ação ou a uma omissão, e outras em que o juiz, além de declarar, ou constituir ou desconstituir uma situação jurídica." [23]

            A classificação que emerge hoje na doutrina pressupõe as ações e sentenças segundo sua eficácia preponderante. Essa classificação quinária alinha, ao lado das sentenças já mencionadas, a mandamental e a executiva lato sensu.

            As sentenças mandamentais emitem uma ordem que, se não for especificamente cumprida por aquele a quem se dirige, implica a incidência de sanções penais. Ex: a sentença proferida na ação de nunciação de obra nova, disciplinada pelo art. 938 do CPC.

            As executivas lato sensu, por sua vez, emanam uma provimento jurisdicional dotado de condenação, cujos efeitos práticos independem de posterior processo de execução. Como leciona Luiz Rodrigues WAMBIER, "Se a ação condenatória produz sentença que, se for de procedência, demandará novo processo, agora de execução, voltado à promoção de alterações no mundo dos fatos, a executiva lato sensu disso não necessita, estando sua sentença apta a produzir diretamente os efeitos de transformação no mundo empírico, sem necessidade do posterior processo de execução." [24]

            Conveniente notar que muito antes da doutrina falar em provimentos mandamentais e executivos lato sensu, o ordenamento jurídico brasileiro já os contemplava. Atualmente, a doutrina vem se atentando para essa nova classificação, tendo em vista a maior utilização desses provimentos e a necessidade de criar outros, o que corrobora para a efetivação de uma tutela jurisdicional adequada. Essa tutela jurisdicional adequada aponta para o anseio da sociedade em ver o processo migrar do mundo do dever-ser para o mundo do ser, com a realização de seus efeitos, da realização da pretensão do direito material.

            Ademais, também corroborando para a tutela jurisdicional adequada, fomenta-se a concepção de que o procedimento ordinário é insuficiente para a realização das pretensões de direito material. Sérgio Cruz ARENHART em passagem de sua tese de doutorado manifesta-se sobre o processo ordinário:

            Preocupada exclusivamente com o lógico interna do processo, a ciência processual afastou-se do direito material, enclausurando o objeto de sua análise, sem considerar mais aquilo que exigia (e necessitava) a realidade concreta do direito a ser protegido. Criou-se, assim, o processo padronizado (ordinarizado), plenário, a ser aplicado a toda e qualquer situação carente de proteção jurisdicionado. A cognição precede, naturalmente, a execução – já que não se pode conceber um juiz que realize o direito sem saber se ele efetivamente existe ou não – e não se outorga poderes ao magistrado no processo de conhecimento, já que ele poderia, com estes poderes interferir na realidade e, com isso, demonstrar a ausência de imparcialidade em seu julgamento. [25]

            Esse tipo de procedimento, ainda ensina o professor acima, divorciado do direito material, acabou por afastar a proteção estatal. Não sendo este procedimento adequado para tutelar os interesses do cidadão, eis que se mantinha distanciado do direito material, a doutrina começa a se atentar para o fato de que o processo é um mero instrumento da jurisdição e que, como tal, deve voltar-se à realidade concreta, desenvolver-se segundo as necessidades da situação específica. Diante disso, resta incontestável que novos tipos de tutelas devem ser concebidos, "próprios para cada espécie de pretensão de direito deduzida no processo" [26].

            Resta, assim, diante da manifesta insuficiência do procedimento ordinário clássico, urgente o desenvolvimento de novas formas de tutela.

            O grande problema do procedimento ordinário clássico constatado é que ele se divorciou da proteção que o Estado deveria fornecer ao direito material. Com isso, uma crise de efetividade do procedimento estava anunciada. Não se mostrava o procedimento clássico adequado para patrocinar a finalidade de jurisdição que, nas palavras de Barbosa MOREIRA remonta ao seguinte: "em toda a extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há de ser tal que assegure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento." [27]

            No dizer de Sérgio ARENHART, essas novas formas de tutela devem contemplar: a) um processo que proporcione meios de proteção adequados a permitir a garantia de todos os direitos assegurados pela ordem jurídica; b) instrumentos que viabilizem o acesso à justiça; c) o direito à prova; d) a efetividade do processo e a realização do seu provimento; e) a obtenção do melhor resultado possível com o menor esforço, através da simplificação dos procedimentos e da desburocratização da justiça. [28]

            Com base nesses princípios, o processo deixa de ser padronizado (ordinário), passando a contemplar formas de tutelas diferenciadas. A seguinte passagem da tese de Sérgio ARENHART bem demonstra a mudança de paradigma no campo do processo:

            No campo da efetividade do processo, destaca-se o movimento pela busca das tutelas jurisdicionais diferenciadas. Quer-se a construção de mecanismos de tutela adequados à realidade de cada direito material sustentado no processo. O processo, se é uma ferramenta a fazer atuar concretamente o direito material, deve estar apto a cumprir esta sua missão sempre que isto se mostre necessário. Deve, por isso mesmo, estar em harmonia com a realidade concreta e com o direito material, desenhado que é para atender a estas situações, sempre atento a eventuais mutações nesses planos e sempre aberto a receber novas informações e novas dimensões de possibilidade daqueles. [29]

            O rompimento com o dogma do processo ordinarizado contribuiu, decisivamente, para a adoção da antecipação da tutela, uma vez que esta pressupõe formas cognição sumária, o contraposto da cognição exauriente demandada pelo processo ordinarizado.

            1.1.3Do Modo Como se Efetiva a Tutela Jurisdicional dos Direitos.

            Necessário iniciar a presente seção, explicitando o significado de tutela, para, na seqüência, demonstrar-se como ela é disponibilizada ao jurisdicionado.

            Pois bem, tutela, na conceituação de Cândido Rangel DINAMARCO, "é o amparo que os juízes, no exercício da jurisdição, oferecem ao litigante que tiver razão (sempre Liebman), ou seja, é a concreta e efetiva oferta dos bens ou situações jurídicas que lhe favoreçam na realidade da vida. É, em outras palavras, a real satisfação de uma pretensão." [30]

            Todavia, é comum confundir-se "tutela" com "provimento". A grosso modo, diz-se que o provimento é o meio pelo qual se presta a tutela. Nesse sentido, o ensinamento de William Santos FERREIRA:

            Para nós, o provimento está relacionado ao reconhecimento de algo e à conseqüente tomada de providência, enquanto a tutela seria o efeito desta. A tutela é o fim (rectius: resultado), enquanto o provimento é o meio (rectius: instrumento); em outras palavras, a tutela é consubstanciada através de um provimento judicial. Diante disto, o provimento é também antecedente lógico da tutela jurisdicional. [31]

            Muito embora a tutela resulte do provimento nem sempre a existência de um provimento significa a obtenção automática da tutela, isto porque, como ressalta William Santos FERREIRA:

            "...nem todas as decisões (provimentos) são capazes de imediatamente resultar na tutela de um direito. Por exemplo, em um processo de conhecimento, cujo pedido do autor seja a condenação do réu no pagamento de uma quantia x, mesmo alcançado o momento em que haverá uma sentença que admitiu o pedido do autor, condenando o réu no pagamento de dita quantia, ainda assim esta, por si só, não é capaz de materializar no plano fático a satisfação do direito reconhecido tal qual almejado pelo autor. Até este momento a única coisa que se obteve foi uma posição jurídica, uma "tutela" muito tênue, imperceptível aos olhos do "consumidor da justiça", e não fática do direito do autor reconhecido no provimento judicial, surgindo por este motivo a necessidade da execução, momento no qual (espera-se) se materializará no plano fático o que foi determinado no provimento judicial. Por tal motivo é que Cândido Dinamarco acentua a coincidência da tutela aos efeitos do provimento (e não a este diretamente). [32]

            A tutela pode ser prestada ao final do processo, através de uma sentença, ou em seu curso, através de uma decisão interlocutória. Sentença e decisão interlocutória nada mais são do que provimentos jurisdicionais, à diferença de que aquela presta uma tutela final e esta uma tutela de forma antecipada. Luiz Guilherme MARINONI as denomina de técnicas para a adequada prestação das tutelas, como se infere da passagem abaixo transcrita:

            A sentença e a decisão interlocutória são apenas técnicas para a adequada prestação das tutelas. Por exemplo: a sentença mandamental, e não a sentença condenatória, constitui a técnica capaz de permitir a correta concessão da tutela inibitória. Em outras palavras, e ainda exemplificando, a sentença mandamental não pode ser confundida com a tutela inibitória, já que a primeira é uma técnica insculpida pelo legislador para viabilizar a prestação da tutela inibitória.

            Note-se que os procedimentos, as sentenças, os meios de execução e a possibilidade de antecipação são técnicas para a prestação da adequada tutela dos direitos. É nesta linha que é oportuna a distinção entre tutela é técnica para a sua concessão. [33]

            E as técnicas se diferenciam em razão da intensidade de cognição (conhecimento) reclamada pela tutela almejada. Com efeito, diz Luiz Guilherme MARINONI, que "A técnica da cognição permite a construção de procedimentos ajustados às reais necessidades de tutela. A cognição pode ser analisada em duas direções: no sentido horizontal, quando a cognição pode ser plena ou parcial; e no sentido vertical, em que a cognição pode ser exauriente, sumária e superficial." [34]

            A técnica de cognição parcial, como assevera Luiz Guilherme MARINONI, "privilegia os valores certeza e celeridade, possibilitando uma sentença com força de coisa julgada material em um tempo inferior àquele que seria necessário ao exame de toda a extensão da situação litigiosa" [35] e, para tanto, limita o conhecimento do juiz a certas questões, seja fixando o objeto litigioso, como ocorre, por exemplo, no caso dos embargos do executado, seja estabelecendo limites da defesa, como ocorre na busca e apreensão disciplinada pelo Decreto-Lei 911/69, na qual o réu só pode alegar em sua defesa o pagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações contratuais.

            A cognição plena, por sua vez, compreende toda a extensão da situação litigiosa.

            Também no plano da cognição vertical existem restrições. E tais restrições, as quais dão ensejo à uma cognição sumária, limitam a prestação jurisdicional a afirmar o provável.

            Os objetivos da tutela de cognição sumária, segundo Luiz Guilherme MARINONI são:

            a) assegurar a viabilidade da realização de um direito (tutela cautelar); b) realizar, em vista de uma situação de perigo, antecipadamente um direito (tutela antecipada fundada no art. 273, I, do CPC); c) realizar, em razão das peculiaridades de um determinado direito e em vista da demora do procedimento ordinário, antecipadamente um direito (liminares de determinados procedimentos especiais); d) realizar, quando o direito do autor surge como evidente e a defesa é exercida de modo abusivo, antecipadamente um direito (tutela antecipatória fundada no art. 273, II, do CPC. [36]

            Nos casos de cognição sumária, ao contrário daqueles em que se opera uma cognição exauriente, não se produz coisa julgada material, uma vez que as restrições impostas quanto à intensidade do conhecimento, não permite a busca da verdade e da certeza, pressupostos para a produção da coisa julgada material. O juiz, quando opera cognição sumária, limita-se a afirmar a "probabilidade" da existência do direito, afirmação esta que pode ser refutada diante da instrução probatória.

            A antecipação da tutela é fruto de cognição sumária quando sua concessão se funda na probabilidade de que o direito afirmado, mas ainda não provado, será demonstrado e declarado. [37] Por outro lado, quando a tutela antecipada é concedida após o encerramento da fase instrutória em razão do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; após a sentença, antes da subida da apelação ao tribunal e no caso de abuso do direito de recorrer, não restará amparada em cognição sumária, mas em cognição exauriente, porém, não definitiva.

            Feitas estas considerações sobre o novo perfil do direito processual civil e explicitado que a tutela antecipada participa do elenco das tutelas diferenciadas, resta, agora, abordar-se os contornos desse instituto, para, na seqüência adentrar-se ao tema proposto.


2 DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA TAL COMO PRECONIZADA PELA ART. 273 DO CPC.

            Almeja-se com o presente capítulo percorrer todos os meandros legais, doutrinários e jurisprudenciais da instituto da antecipação de tutela, para uma melhor concepção do instituto sob a ótica da instância recursal.

            2.1Da origem do instituto.

            O instituto da antecipação de tutela passou a ser reiteradamente utilizado no processo civil brasileiro com a redação dada pela Lei n.º 8.952/1994 ao art. 273 do Código de Processo Civil. Quer-se com isso afirmar que a antecipação de tutela já existia e já era utilizada antes mesmo do advento da citada lei. Inúmeros são os exemplos de dispositivos legais que, implícita ou expressamente, acolhiam a possibilidade de se antecipar os efeitos da decisão final, total ou parcialmente.

            Assim, por exemplo, na ação possessória (art. 928 e 929 do CPC); na ação de nunciação de obra nova (art. 937 do CPC); na ação de busca e apreensão de coisa vendida a crédito com reserva de domínio (art. 1.071 do CPC); na ação de embargos de terceiro (art. 1.051 do CPC); na ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente em garantia (Dec.-Lei 911/69, art. 3º, "f"); na ação de mandado de segurança (Lei 1.533/51, art. 7º, II); na ação de desapropriação (Dec.-Lei 3.365/41, art. 15); na ação popular (Lei 4.717/65, art. 5º, §4º; na ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 12; na tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer (Código de Defesa do Consumidor, art. 84, §3º; nas liminares previstas na Lei do Inquilinato (Lei n.º 8.245/91, art, 59, §1º)

            A redação dada ao art. 273 do CPC veio oficializar a existência da antecipação de tutela no direito brasileiro, ampliar a generalizar a aplicação do instituto e instaurar, doutrinariamente, a diferença entre a pretensão cautelar e a antecipatória.

            O art. 273 do CPC oficializou a existência do instituto sob comento, eis que somente a partir de sua nova redação é que os operadores jurídicos passaram a conceber um instituto próprio para antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da decisão final de mérito.

            No mais, o art. 273 do CPC estendeu a possibilidade de se antecipar os efeitos da tutela final de mérito a outras pretensões, não só àquelas hipóteses retro mencionadas, desde que satisfeitos os requisitos legais exigidos.

            Por fim, a nova redação do art. 273 do CPC estabeleceu, com nitidez, a diferença entre a pretensão cautelar e a antecipatória, desencadeando discussões no âmbito da doutrina e da jurisprudência. Quanto a isso, há de se dizer que, antes da nova redação do art. 273 do CPC, além daquelas hipóteses legais enumeradas de antecipação de tutela, a pretensão antecipatória era obtida sob às vestes da medida cautelar inominada compreendida pelo art. 798 do CPC. Como assevera William Santos FERREIRA, "nessas ações o que o autor buscava era o próprio bem da vida pretendido, e não apenas e tão-somente assegurar o resultado do processo de conhecimento ou do processo de execução", razão pela qual restou batizada de cautelar satisfativa". [38]

            Muito embora evidente que se estava, ao utilizar a previsão do art. 798 do CPC, suprindo uma falha do ordenamento, consistente em não prever a antecipação de tutela para todas as pretensões cuja a antecipação dos efeitos era possível, muitas foram as confusões geradas na comunidade jurídica. A diferença entre a tutela cautelar e a antecipatória não era facilmente compreendida, ensejando distorções no pleito de providências jurisdicionais de urgência, como bem retrata Cândido Rangel DINAMARCO:

            Por vezes a confusão que se faz entre a tutela antecipada e a tutela cautelar pode gerar conclusões equivocadas. Em julgado do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, entendeu-se que não seria cabível, em sede antecipatória, o cancelamento de protesto de duplicata já declarada paga, pois nada se acautelaria, uma vez que o protesto já havia ocorrido (AI 730.951, 10ª Câmara, j. 01.04.1997, Rel. Paulo Hanaka). No entanto, a ocorrência do protesto, se cumpridos os requisitos do artigo 273 confere total interesse ao postulante da medida, já que de nada adiantaria após anos obter o referido cancelamento, pois já estaria impossibilitado de atuar com instituições financeiras, cliente e tantas outras conseqüências advindas do protesto (este é o escopo da tutela antecipada). Em nossa atuação profissional já tivemos oportunidade de ajuizar a mesma ação e o juiz deferiu a tutela, mas de forma muito mais criativa: para desviar-se do perigo de irreversibilidade (já que havia um registro publico do protesto), determinou que não fosse mais sobre este informado qualquer apontamento, o que também deveria ser observado pelos bancos de dados (como Serasa, SPC etc). [39]

            Nesse sentido, também o escólio de Luiz Guilherme MARINONI:

            A reforma eliminou a necessidade do uso distorcido da "ação cautelar" para a obtenção da tutela antecipatória, possibilitando a correção dos equívocos que eram cometidos.... Em um dos artigos que escrevemos para justificar a introdução da tutela antecipatória no Código de Processo Civil deixamos bem clara a problemática da duplicação dos procedimentos para o mesmo fim: "a prática forense tem mostrado várias hipóteses em que processos rotulados de "cautelar" perdem qualquer sentido após a concessão da liminar. Isto quer significar que a prática, em vários casos, reduziu a importância do processo cautelar a uma liminar. A prática, com apoio da doutrina, aceita a tese de que a cautelar pode substituir o mandado de segurança, uma vez escoado o seu prazo decadencial. O que era direito líquido e certo transforma-se em fumus boni iuris. Porém, passada a fase propícia à concessão da liminar, por inexistir necessidade de elucidação de matéria de fato, o juiz está em condições de proferir sentença capaz de produzir coisa julgada material. Ou seja, a ação cautelar seria suficiente para a resolução definitiva do mérito. Contudo, a doutrina deixa claro que o lugar do julgamento do mérito é no chamado "processo principal", desnecessariamente instaurado quando percebido que o processo dito cautelar foi travestido para tornar viável a postulação da liminar. Nestes casos, realmente, a conclusão deveria ser a de que a "ação principal" é despicienda e a "ação cautelar" não é cautelar. Necessário é um procedimento de cognição exauriente em que seja possível a obtenção de uma tutela antecipatória. A doutrina transforma direito líquido e certo em fumus, mas não tem coragem para reconhecer que são completamente desnecessários dois procedimentos para tais casos. [40]

            Atualmente, passou-se a mais facilmente compreender que a tutela cautelar destina-se a assegurar a eficácia prática do processo de conhecimento ou de execução, uma vez declarada a procedência da pretensão, ao passo que a tutela antecipatória destina-se a antecipar os efeitos do provimento final de mérito, total ou parcialmente. Todavia, em prol do princípio da fungibilidade, a reforma procedida pela Lei n.º 10.444, de 07 de maio de 2002, inseriu no art. 273 o §7º, o qual veio a declarar que: "Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado."

            Para José Rogério Cruz & TUCCI, "A introdução do §7º vem mitigar a exegese estritamente formalista que se verifica na prática, em detrimento da urgência de determinadas situações. Jamais se aconselha que a forma sacrifique o direito do jurisdicionado." [41]

            Mesmo antes da reforma, porém, já se observava da jurisprudência uma atitude comprometida com a efetividade do direito material em detrimento da forma, como restou declarado, por exemplo, no acórdão unânime, proferido em julgamento de Agravo de Instrumento n.º 806.046-6, da 12ª Câmara Cível do 1º TACSP, relatado por José Roberto BEDAQUE, como se ressai da seguinte passagem:

            (...) A antecipação parcial dos efeitos da tutela se mostra possível no caso concreto (...) Tratando-se de tutela de urgência e provisória, possível a incidência da regra da fungibilidade, cabendo ao julgador adotar a solução mais adequada à preservação da utilidade do resultado final, desde que atendidos os limites objetivos da demanda (...).

            Quanto à aplicabilidade do dispositivo sob comento em sentido inverso, vale dizer, quando se requerer, sob às vestes de tutela cautelar, providência de natureza antecipatória, divide-se a doutrina. Alguns seguem à risca a regra legal, enfatizando ser impossível a fungibilidade em sentido contrário, e outros concedem à regra legal uma interpretação extensiva. Aceitando a fungibilidade também quando se pleiteia através de cautelar tutela antecipatória, manifesta-se Cândido Rangel DINAMARCO, in verbis:

            ... além de reconhecer a realidade da experiência do foro, constitui poderosa alavanca destinada a remover preconceitos, sendo certo que tal dispositivo deve ser interpretado "pelo que disse e pelo que não disse", uma vez que, também na hipótese inversa, na qual pleiteada medida cautelar, desde que presentes os respectivos requisitos, deverá ser deferida a tutela antecipatória cabível.... [42]

            2.2Do Conceito do Instituto.

            Inúmeros são os conceitos formulados para se definir o que é tutela antecipada. Para Nelson NERY JUNIOR, a tutela antecipada "é a tutela satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito". [43]

            Na opinião de Cândido Rangel DINAMARCO, ela antecipa os efeitos do provimento, efeitos esses que são a própria tutela que só no futuro seria obtida. [44]

            Pela doutrina de William Santos FERREIRA, a tutela antecipada "é a admissão de seu pedido mediato, e não do seu pedido imediato, já que este último só na sentença é que será apreciado". [45] [46]

            Para Luiz Guilherme MARINONI, a antecipação da tutela é uma técnica "que permite se dê tratamento diferenciado aos direitos evidentes e aos direitos que correm risco de lesão"; "produz o efeito que somente poderia ser produzido no final"; "...permite que sejam realizadas antecipadamente as conseqüências concretas da sentença de mérito", as quais "podem ser identificadas com os efeitos externos da sentença, ou seja, aqueles efeitos que operam fora do processo e no âmbito das relações de direito material". [47]

            2.3Das pretensões jurisdicionais propícias a terem seus efeitos antecipados.

            Nem todas as pretensões jurisdicionais podem ter seus efeitos antecipados, vez que o ordenamento jurídico não permite que determinadas conclusões restem efetivadas mediante cognição sumária, diante da irreversibilidade da providência jurisdicional.

            Este assunto tem a ver com os tipos de ações e sentenças, das quais já se falou no item I. Agora, partindo-se da classificação das ações e sentenças, analisar-se-á o instituto da tutela antecipada face a cada uma das modalidades de ações e sentenças.

            Preliminarmente, diga-se que predomina na doutrina o entendimento de que a antecipação só pode ocorrer em relação às tutelas prestadas pelas sentenças condenatórias, executiva lato sensu e mandamental, restando inviável em relação às sentenças declaratória e constitutiva.

            Como a antecipação da tutela em relação às ações condenatórias, mandamentais e executiva lato sensu não enseja maiores divergências na doutrina e na jurisprudência, comecemos por elas para, na seqüência, tratarmos do assunto sob a ótica das ações declaratórias e constitutivas.

            2.3.1 Da Antecipação da Tutela Buscada Pela Sentença Condenatória.

            Com relação à possibilidade de se antecipar os efeitos da sentença condenatória, não existem divergências na doutrina, a única discussão, referenciada por William Santos FERREIRA, diz respeito tão somente a saber-se se a execução dessa antecipação pode ocorrer nos próprios autos em que foi proferida ou se deve efetivar-se em autos apartados. Em tal caso, a doutrina majoritária, todavia, tem perfilhado o entendimento de que só deve ocorrer em procedimento autônomo quando houverem dificuldades para a execução da tutela antecipada, como sói ocorrer no caso de obrigações ilíquidas.

            No âmbito das ações condenatórias, ocorre a produção antecipada do efeito executivo da sentença, que equivale ao bem da vida almejado pelo autor (ao pedido mediato).

            Sobre a relação entre a antecipação e a sentença condenatória, manifesta-se Luiz Guilherme MARINONI, nos seguintes termos:

            Na realidade, como já foi dito no início deste item, não há propriamente antecipação dos efeitos da sentença, ou mesmo antecipação do efeito executivo, mas sim produção antecipada do efeito executivo para a realização imediata do direito. Esta realização antecipada por ser total ou parcial, e nesta hipótese fica ainda mais evidente que não é correto pensar em antecipação do efeito executivo, uma vez que não pode haver antecipação de parte de um efeito, mas apenas produção antecipada de um efeito para uma finalidade parcial. Nesta linha, se o que é antecipado é um bem da vida, antecipa-se a tutela, e não a sentença; como já foi explicado, a sentença é somente uma técnica para a prestação da tutela. [49] (sem grifo no original)

            2.3.2.Da Antecipação da Tutela Buscada Pelas Sentenças Mandamental e Executiva Lato Sensu.

            Como diz William Santos FERREIRA:

            ... se é admitida a tutela antecipada nas ações condenatórias, com muito mais razão deve-se admiti-la nas ações executivas lato sensu e nas ações mandamentais, pois, se a exigência de cumprimento da sentença prescinde de execução ex intervallo, ou seja, a execução se realiza nos próprios autos, em regra nada há que impeça a tutela antecipada nestes casos. [50]

            Quer o autor acima dizer que a sentença mandamental e executiva lato sensu, justamente por se afinarem com o espírito da efetividade, ao diminuírem o tempo necessário à obtenção do pedido mediato (o bem da vida desejado), permitem, com maior razão, a antecipação deste resultado.

            Com efeito, o art. 461 do CPC, preconiza, em seu § 3º, a possibilidade de que a tutela específica da obrigação seja concedida antecipadamente: "Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada."

            Ademais, os meios coercitivos cuja utilização é autorizada pelo art. 461, §5º, do CPC, para o cumprimento da obrigação de fazer ou não-fazer, por exemplo, a multa por tempo de atraso, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas etc, na lição de Athos Gusmão CARNEIRO, só contribuem para a antecipação da tutela. [51]

            Luiz Guilherme MARINONI, frisando que a sentença mandamental e a executiva lato sensu são técnicas para a prestação da tutela, demonstra ser possível ao juiz, utilizando-se dos instrumentos processuais disponíveis, conceder a tutela no final do procedimento ou em seu curso. [52]

            2.3.3.Da (Im)possibilidade de se Antecipar o Bem da Vida Almejado Pelas Sentenças Meramente Declaratórias e Constitutivas.

            No direito brasileiro ainda se encontra certa resistência no que concerne a se admitir a antecipação da tutela buscada pelas sentenças declaratórias e constitutivas, o que não ocorre, por exemplo, no direito italiano. Neste, como noticia Luiz Guilherme MARINONI, o novo art. 282 do Código de Processo Civil admite a execução provisória das sentenças declaratórias e constitutivas, como se infere da seguinte passagem de sua obra:

            O novo art. 282 afirma, simplesmente, que a sentença de primeiro grau é provisoriamente executiva entre as partes. O fato de o art. 282 admitir, em princípio, a produção imediata dos efeitos das sentenças constitutiva e declaratória, torna o direito italiano uma fonte muito rica, em termos de direito comparado, para a solução do problema da tutela antecipatória nas ações declaratória e constitutiva. [53]

            E mais:

            Durante os trabalhos preparatórios à reforma processual italiana, ficou clara a intenção do legislador em não limitar o art. 282 à execução imediata da sentença condenatória. A questão foi debatida no Senado italiano e a proposta do senado Acone, que restringia o art. 282 às sentenças de condenação, foi rejeitada sob o argumento – apresentado pelo senador Lipari – de que numerosas sentenças declaratórias ou constitutivas podem ser beneficiadas pela norma. [54]

            Não obstante a alteração legislativa, expõe o mesmo autor acima citado que a doutrina se encontra evidentemente dividida, parte admitindo a eficácia imediata das sentenças declaratória e constitutiva e outra não. Ressalva-se, no entanto, informa o autor, as sentenças condenatórias derivadas de pedido condenatório cumulado com constitutivo.

            No direito brasileiro, também se observa cisões na doutrina, todavia, não há dispositivo semelhante ao art. 282 do Código de Processo Civil italiano, dando azo à uma interpretação que acolha a antecipação da tutela almejada com as sentenças constitutiva e meramente declaratória.

            Aqueles que não admitem a antecipação da tutela meramente declaratória, partindo do pressuposto de que o pedido mediato (bem da vida almejado) e o imediato (decisão declaratória) se confundem, concluem que não se teria o que antecipar, vez que "estar-se-ia antecipando a decisão de mérito propriamente dita" [55].

            Contornando os impasses gerados por essa interpretação, outra ala da doutrina afirma que nos pedidos declaratórios com repercussões mandamentais ou executivas, a tutela pode ser antecipada, como, por exemplo, o caso da declaratória de paternidade que gera a repercussão prática relativa ao dever de prestar alimentos.

            William Santos FERREIRA refuta o posicionamento daqueles que defendem que atos como baixa de restrições constantes em bancos de dados cadastrais, como SPC e Serasa, são meros atos de execução imprópria da sentença, não se constituindo o deferimento dos mesmos, antes da sentença, antecipação da tutela, demonstrando, com isso, que a sentença declaratória nem sempre tem efeitos imediato. Com efeito, assevera:

            Em hipóteses como estas, sem dúvida a tutela não estará efetivada enquanto não verificados tais atos. Isto se deve à complexidade da vida moderna, em que tudo está de tal forma relacionado (e vinculado!) que qualquer alteração é capaz de atingir uma gama enorme de situações que dependam da premissa alterada. (...)

            Estas características deixam patente que a sentença por si só não é elemento suficiente para, de plano, afastar-se o cabimento da tutela antecipada, pois a certeza tem reflexos (rectius: efeitos) relevantíssimos no âmbito social. [56]

            Na seqüência, o autor acima conclui pela viabilidade em se antecipar o efeito da tutela meramente declaratória:

            E esta constatação é fundamental para poder se admitir a tutela antecipada nas ações meramente declaratórias, porque, como se demonstrou, os efeitos da sentença, embora prescindam de execução propriamente dita, extravasam os estreitos limites da mera declaração judicial solitariamente considerada, pois é por causa da sentença que se deverá corrigir no mundo uma série de situações que dependam da premissa alterada pela sentença.

            Logo, cumpridos os requisitos do artigo 273 do Código de Processo Civil, afigurar-se-á plenamente cabível a concessão da tutela antecipada em ações meramente declaratórias, pois serão antecipados os efeitos que só seriam verificados após a certeza jurídica exposta na sentença ("os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial"- caput do artigo 273). [57]

            Na crítica de José dos Santos BEDAQUE, aqueles não admitem a antecipação da tutela almejada através das sentenças meramente declaratórias no fundo não entendem que os atos que podem ser executados antecipadamente não implicam atribuição de certeza jurídica. [58]

            Humberto THEODORO JUNIOR compartilha o entendimento de que a antecipação de tutela não se aplica apenas às sentenças condenatórias, argumentando da seguinte forma:

            Isto, porém, não faz com que a antecipação de tutela seja um incidente só admissível na ação condenatória. Aqui se cogita de execução no sentido mais lato do termo, e não no específico de título executivo em sentido estrito. Qualquer sentença, mesmo as declaratórias e constitutivas, contém um preceito básico, que se dirige ao vencido e que se traduz na necessidade de não adotar um comportamento que seja contrário ao direito subjetivo reconhecido e declarado ou constituído em favor do vencedor. É a sujeição do réu a esse comportamento negativo ou omissivo em face do direito do autor que pode ser imposta por antecipação de tutela, não só nas ações condenatórias, como também nas meramente declaratórias e nas constitutivas. Reconhece-se, provisoriamente, o direito subjetivo do autor e impõe-se ao réu a proibição de não agir de maneira contrária, ou incompatível com a facultas agendi tutelada. [59]

            No que tange à antecipação da tutela promovida pelas sentenças constitutivas, ensina William Santos FERREIRA que existem dois óbices para a sua admissão, quais sejam: o fato de se objetivar com tais sentenças a alteração de uma relação jurídica, o que só poderia ocorrer no momento do proferimento da sentença e a circunstância de não ensejarem execução.

            Argumenta-se, para afastar, tais óbices, no sentido de que a antecipação não tem o condão de criar, modificar ou extinguir uma relação, mas de antecipar os efeitos destas alterações, já que aquelas medidas demandam cognição exauriente, a qual só é possível no momento em que o processo estiver maduro julgamento.

            Já o fato de a sentença constitutiva não demandar execução para surtir seus efeitos vem amparar a tese pela possibilidade de antecipação da tutela constitutiva, partindo-se do argumento segundo o qual: se a sentença condenatória pode ter a tutela a que dá origem antecipada, mesmo demandando execução, o que se dirá da constitutiva, que prescinde da execução diferida. [60]

            Feitas estas considerações, cabe, agora, analisar os pressupostos legais para a antecipação da tutela.

            2.4.Dos requisitos para a admissão da tutela antecipada.

            Pretende-se com a presente seção abordar rapidamente os contornos jurídicos da antecipação de tutela, tal como disciplinada pelo art. 273 do Código de Processo Civil, que apresenta hoje a seguinte redação:

            O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

            I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

            II – fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

            §1º. Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões de seu convencimento.

            §2º. Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

            §3º. A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4º e 5º, e 461-A.

            §4º. A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

            §5º. Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.

            §6º. A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.

            §7º. Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

            Fala a doutrina na existência de requisitos genéricos e outros específicos para o deferimento da antecipação da tutela. Todos aqueles e um destes devem estar presentes para a concessão da tutela.

            2.4.1.Dos Requisitos Genéricos.

            Tais requisitos são os seguintes: a) requerimento da parte; b) concessão total ou parcial dos efeitos do provimento final; c) prova inequívoca e verossimilhança da alegação; d) inexistência do risco da irreversibilidade.

            2.4.1.1 Do requerimento da parte.

            A concessão da antecipação da tutela, em observância ao princípio dispositivo [61], só pode ser deferida mediante requerimento da parte, em regra a autora e excepcionalmente a ré, nas ações de caráter dúplice, na reconvenção ou na oposição.

            Ressalte-se que o pedido pode ser feito inicialmente, no curso do processo, após a instrução probatória, quando o processo está prestes a ser sentenciado e na fase recursal. Nada obsta, também, que, sucessivamente, a um pedido de antecipação parcial da tutela, se deduza um pedido de antecipação total da tutela pretendida.

            2.4.1.2 Da concessão total ou parcial dos efeitos do provimento final

            Como já anunciado, também no pedido de antecipação de tutela deve o juiz ater-se ao princípio dispositivo, de forma que não lhe é lícito conceder mais (ultra petita), menos (infra petita) ou diversamente do que foi requerido (extra petita), devendo atender estritamente os termos do art. 128 e 460 do Código de Processo Civil [62]. Assim, por exemplo, se é requerida, a título de antecipação "parcial" da tutela, a retirada do nome do demandante do órgão de restrição ao crédito denominado Serasa, não poderá o MM. Juiz alargar o pedido, determinando também a exclusão ou a abstenção de inscrição em outros cadastros, como SCPC (Serviço Comercial de Proteção ao Crédito) e Sisbacen.

            Como o próprio nome diz, trata-se de antecipar a tutela, de modo que não é lícito ao juiz deferir algo impossível de ser prestado pela tutela final. Com destacado na Revista dos Tribunais 737/365, "A tutela antecipada consiste em um adiantamento da prestação jurisdicional, incidindo, sobre o próprio direito reclamado pela parte. O magistrado não pode, sob fundamento de aplicar o instituto, antecipar tutela que a própria sentença não outorgará porque estranha ao pedido formulado na ação, incidindo as regras dos arts. 128 e 460 do CPC."

            O atendimento ao pedido da parte pode ser total ou parcial. Em caso de antecipação parcial dos efeitos da tutela, mesmo que o magistrado se convença da possibilidade de antecipar integralmente a tutela, não poderá fazê-lo em respeito ao princípio dispositivo.

            2.4.1.3.Da prova inequívoca e da verossimilhança da alegação.

            Muita controvérsia já houve na doutrina e na jurisprudência no que concerne ao real significado da junção das expressões "prova inequívoca" e "verossimilhança da alegação". Para José Carlos Barbosa MOREIRA:

            Não se tem mostrado inteiramente pacífica, para dizer o menos, a convivência entre os dois pressupostos: o da "prova inequívoca" e o da "verossimilhança da alegação". Doutrina e jurisprudência enleiam-se em dificuldades quando tratam de explicar essa conjugação. Deixa certo a lei que, para a concessão do provimento antecipatório, basta a convicção de ser "verossímil" a alegação do requerente, isto é, não se exige a certeza de que ela seja veraz. Como entender, então, a referência a "prova inequívoca" – expressão que a primeira vista aponta no sentido da formação de convencimento certo? É sensível o desconforto que assalta os expositores do instituto e os julgadores que têm de aplicá-lo, quando se esforçam por juntar as duas pontas do fio. É igualmente sensível o artificialismo, para não dizer a precariedade, do nó com que costumam atá-las. [63]

            Pois bem, cabe salientar, preliminarmente, que, a fim de suprir a necessidade de prova para a antecipação de tutela, poderá o requerente se valer de prova documental, prova testemunhal ou pericial documentada, bem como postular a ouvida, imediata a informalmente, de testemunhas e a imediata inspeção judicial.

            Alguns, comparando a situação da antecipação da tutela com a da tutela cautelar, chegam a afirmar que a prova inequívoca seria um fumus boni iuris qualificado, como suscita Kazuo WATANABE: "O juízo fundado em prova inequívoca, uma prova que convença bastante, que não apresente dubiedade, é seguramente mais intenso que o juízo assentado em simples"fumaça", que somente permite a visualização de mera silhueta ou contorno sombreado de um direito." [64] [65]

            Outros concluíram que tais requisitos conduziriam o magistrado a um juízo de certeza quanto ao suporte fático e jurídico da tutela pleiteada, o que equivaleria, como bem diz o autor acima citado "a apagar, na substância, a diferença entre o provimento antecipatório e a sentença de procedência do pedido." [66] (sem grifo no original)

            Chegou-se a propor a aplicação dos requisitos em tela sob à ótica de um "juízo de probabilidade", refutando-se a mera verossimilhança, como o fez Cândido Rangel DINAMARCO: "... embora formalmente contraditórias, devem as duas locuções ser aproximadas, através do conceito de probabilidade, portador da maior segurança do que a mera verossimilhança". [67]

            Por vezes, se atribuiu à expressão "prova inequívoca" o sentido de prova bastante para convencer o órgão judicial da verossimilhança da alegação do requerente e neste contexto é que se insere a posição externada por José Carlos BARBOSA MOREIRA, quando diz que questão não gira em torno de se graduar a força persuasiva da prova, já que a inequívoca é aquela prova que só num sentido seja possível entender – independentemente, note-se, de sua maior ou menor força persuasiva. [68]

            Luiz Guilherme MARINONI afirma que "A denominada "prova inequívoca", capaz de convencer o juiz da "verossimilhança da alegação", somente pode ser entendida como a "prova suficiente" para o surgimento do verossímil [69], entendido como o não suficiente para a declaração da existência ou da inexistência do direito". [70] E, para obter esse juízo, deve o julgador considerar: "(i) o valor do bem jurídico ameaçado, (ii) a dificuldade do autor provar a sua alegação, (iii) a credibilidade, de acordo com as regras de experiência, da alegação e (iv) a própria urgência descrita." [71] (sem grifo no original)

            Elucidativo é o conceito que De Plácido e SILVA confere à verossimilhança: "No entanto, conforme é assente na jurisprudência, sendo a verossimilhança uma questão de fato, não se podem sobre ela estabelecer regras doutrinárias. Deve, portanto, ser deixada ao prudente arbítrio do juiz, que a resolverá segundo as circunstâncias que cercam cada caso, diante do exame das relações existente entre as provas feitas e os fatos que se pretendem provar." [72]

            Prova inequívoca não seria, portanto, aquela capaz de conferir ao magistrado "certeza", mas sim aquela que não gerasse dubiedades quando de sua apreciação para efeitos de concessão da antecipação de tutela. É claro que neste contexto a probabilidade é largamente utilizada, vez que o juízo que o magistrado realiza ao apreciar o pedido de antecipação de tutela ampara-se na probabilidade de que o direito alegado e demonstrado pela prova trazida aos autos até este momento e não em "certeza processual" [73], a qual só terá ou estará próximo no momento da prolação da decisão final. Aliás, nesse sentido é a intervenção feita por William Santos FERREIRA, in verbis: "Os argumentos e sua comprovação influenciam o magistrado a concluir não pela mera aparência (que se presta à tutela cautelar), mas pela probabilidade máxima, para o momento processual de sua decisão, que razão assiste ao postulante da tutela antecipada, repita-se para aquele momento processual e à luz das provas até então existentes." [74] Com efeito, a prova inequívoca é aquele "prova formalmente perfeita, cujo tempo para produção não é incompatível com a imediatidade em que a tutela deve ser concedida", como doutrina Luiz Guilherme MARINONI. [75]

            Esta conclusão, ademais, vem sendo acolhida pela jurisprudência, como se ressai de inúmeros julgados. Assim, em recente julgado do STJ, no qual se entendeu que o fato deve ser incontroverso [76]; em julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no qual restou assentado que a prova inequívoca "deve conduzir a um grau de convencimento tal qual, a seu respeito, não possa ser oposta qualquer dúvida razoável, ou seja, cuja autenticidade ou veracidade seja provável" [77].

            Luiz Guilherme MARINONI, dá sua contribuição, propondo que o critério da "probabilidade" seja combinado com a da "proporcionalidade",

            Assim, o posicionamento mais sensato de todos os aqui expostos conduz ao entendimento de que a prova inequívoca deve ratificar a alegação do postulante da antecipação de tutela, não sendo capaz, já que na tal pedido é precedido, nas mais das vezes, da instrução probatória, de conferir juízo de certeza "processual" [78], necessário para a decisão final. Pode-se dizer, assim, com esteio na doutrina de Luiz Guilherme MARINONI, que a prova inequívoca equivale à uma prova provisória que, não cercada pelas demais provas que serão produzidas durante o trâmite processual, ampara o pedido de antecipação de tutela, permitindo sua concessão.

            2.4.3.Dos Requisitos Específicos.

            Os requisitos específicos restarão observados no preenchimento de uma das seguintes hipóteses: a) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; b) abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

            2.3.2.1. Do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

            A expressão "fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação", na lição de Rosemiro Pereira LEAL, "comparece, no CPC (item I, art. 273), como requisito complementar (cumulativo-imperativo) das situações jurídicas de inequivocidade e verossimilhança, uma vez que se pode ler, no texto, o e (conjunção) e o ponto e vírgula antes do ou, o que, por claro, coloca o fundado receio como elemento inapartável (não alternativo) do juízo, lógico-antecipatório da tutela legal se com ele não concorre o do abuso do direito de defesa (item I, art. 273)." [79]

            Vislumbrada a função requisito em tela na antecipação de tutela, resta concluir a respeito de seu significado.

            Pois bem, colhendo-se os ensinamentos da doutrina chega-se a concluir que o presente requisito presta-se a resgatar a efetividade da prestação jurisdicional, posto que, como diz William Santos FERREIRA, "Se a antecipação não for concedida, diante da demora em se aguardar a sentença final ou até eventuais recursos com efeito suspensivo, poderá ocorrer um dano irreparável ou de difícil reparação, que afetará a própria prestabilidade do provimento definitivo". [80]

            Arruda ALVIM também se posiciona neste sentido: "A ratio do artigo 273, I, pode, sucintamente, expressar-se à luz do seguinte dilema: ou se antecipa a proteção à pretensão mesma (total ou parcialmente, na medida do que se tem por imprescindível à sobrevivência da pretensão), ou essa pretensão perece; ou, então, ocorrerá um dano que somente com a tutela antecipatória pode ser evitado." [81]

            No manejo do pedido de antecipação da tutela, de toda a sorte, deverá o requerente demonstrar o "dano" e o "fundado receio de sua ocorrência" objetivamente, não podendo entender o juiz que aquele decorre do mero receio subjetivo da parte, como ensina Humberto THEODORO JUNIOR: "pode-se ter como verossímil o receio de dano grave que concorra de fato objetivamente demonstrável e não de simples receio subjetivo da parte" (o grifo é nosso!). Acrescentaríamos que a verossimilhança das alegações atinentes ao receio de dano deve decorrer de fato objetivamente demonstrado (evidenciado ou indiciariamente mostrado) no procedimento." [82]

            2.3.2.1.Abuso do direito de defesa e o manifesto propósito protelatório do réu.

            A possibilidade de se deferir a antecipação de tutela fulcrada nestes requisitos tem como principal estímulo a convicção de que "o tempo do processo não pode ser um ônus somente do autor", e a circunstância, muito comum na rotina forense, de que o réu tende a protelar a prestação jurisdicional almejada pelo autor, por lhe parecer mais conveniente esperar a decisão desfavorável do que reconhecer o direito do postulante e adimplir as obrigações decorrentes desse reconhecimento, como bem assevera Luiz Guilherme MARINONI [83].

            Esta realidade, aliás, é que vem motivando a utilização da antecipação de tutela em sede recursal, como será mais adiante cotejado, eis que o recurso é um instrumento valioso para se protelar a prestação jurisdicional definitiva.

            Ambas as hipóteses – abuso do direito de defesa e manifesto propósito protelatório do réu, na opinião de Carreira ALVIM, estão albergadas pelo art. 273, II, do CPC. A segunda hipótese estaria encartada na primeira, como se o abuso do direito de defesa sempre insinuasse o propósito protelatório do réu. Tal opinião não é, contudo, avalizada pela doutrina dominante, sob a alegação de que, por vezes, observa-se o intuito protelatório sem se constatar o abuso do direito de defesa. Pode o réu manifestar o intuito de protelar o feito, mesmo sendo capaz de apresentar uma defesa plausível.

            E tal obrar do réu, revela também Luiz Guilherme MARINONI, é ainda mais maléfico quando o autor depende economicamente do bem da vida almejado pelo autor, acentuando a desigualdade entre as partes litigantes.

            2.4DO MOMENTO DA CONCESSÃO.

            A antecipação da tutela pode ser concedida em qualquer fase: no início do processo ou em seu curso, não só em primeiro grau de jurisdição, mas também na fase recursal.

            2.5.DA EXECUÇÃO.

            A execução da antecipação de tutela opera-se de forma provisória, segundo o que dispõe o art. 588 do CPC, o qual também foi recentemente reformado, passando a contemplar a seguinte redação:

            A execução é definitiva, quando fundada em sentença transitada em julgado ou em título extrajudicial, é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo.

            I – corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os prejuízos que o executado venha a sofrer;

            II – o levantamento de depósito em dinheiro, e a prática de atos que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependente de caução idônea, requerida e prestada nos próprios autos da execução;

            III – fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior;

            IV – eventuais prejuízos serão liquidados no mesmo processo;

            §1º. No caso do inciso III, se a sentença provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa parte ficará sem efeito a execução.

            §2º. A caução pode ser dispensada nos casos de crédito de natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo, quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade.

            Em regra, a execução da antecipação de tutela será efetivada nos próprios autos do processo de conhecimento em que esta foi deferida, constituindo-se uma execução lato sensu, sendo incabível o manejo dos embargos à execução, porque não instaurado um processo de execução para tanto. Somente na hipótese em que for concedida proximamente ou após a sentença, bem como em grau recursal, restará necessária a extração de carta de sentença.

            2.6.DA REVOGAÇÃO OU MODIFICAÇÃO.

            Segundo o §4º do art. 273 do CPC, a tutela antecipada poderá ser "revogada" ou "modificada" a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

            Todavia, tanto a revogação como a modificação demandam provocação da parte, não podendo o juiz, sem ser instado a tanto, alterar ou revogar a medida ulteriormente concedida, em razão da preclusão pro judicato, bem como alteração do quadro fático que possibilitou a concessão da tutela.

            Tal provocação pode se dar através do recurso de agravo de instrumento, quando os argumentos para se pleitear a revogação ou modificação forem relativos à visualização por parte do juiz dos fatos existentes no momento de sua concessão. Quando restar modificado o quadro fático que deu ensejo à concessão da tutela, a revogação ou modificação poderão ser pleiteadas independentemente de agravo de instrumento, isso também na hipótese de ser negada a concessão da tutela. A respeito dessas novas circunstâncias, doutrina Luiz Guilherme MARINONI:

            Este sistema binário, para bem funcionar, deve supor que os pressupostos para a revogação-modificação da tutela nada têm a ver com a matéria que pode ser posta no agravo. As razões que permitem a revogação ou a modificação da tutela, quando não interposto o agravo, são as "novas circunstâncias", vale dizer, são "outras razões", no sentido de "razões" que antes não podiam ter sido apresentadas.

            Não é somente a alteração da situação de fato objeto da lide que permite a modificação ou a revogação da tutela, mas também o surgimento, derivado do desenvolvimento do contraditório, de uma outra evidência sobre a situação de fato. É o caso da produção da prova que pode alterar a convicção do julgador acerca da situação fática. [84]

            Também é este o posicionamento de Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER: "quando não interposto o agravo, o juiz só pode revogar ou modificar a tutela com base em novas circunstâncias. Inclui-se no conceito de novas circunstâncias também a alteração substancial no quadro probatório". [85]

            O surgimento de situações novas também autoriza a concessão da tutela antecipada, cujo pedido anteriormente restou indeferido, demonstrando tais situações a presença dos requisitos autorizadores.

            A decisão concessiva ou negatória da antecipação de tutela também pode ser alterada, ensina William Santos FERREIRA, por ocasião do juízo de retratação:

            Complementando e justificando a linha de raciocínio empregada, pode-se também verificar que a apreciação do pedido de antecipação de tutela é passível de impugnação recursal, razão pela qual não teria cabimento, além do juízo de retratação (art. 529), permitir-se ao juiz mudar de opinião antes ou após o pronunciamento da instância superior, que poderá, revendo a decisão (efeito devolutivo), manter ou alterar a decisão de primeira instância impugnada (efeito substitutivo), sintonia que deve ser mantida, mesmo inexistindo impugnação recursal. Mesmo a decisão proferida pelo tribunal no julgamento do agravo de instrumento não impedirá que, na sentença, o juiz profira decisão diversa, o que corrobora a ressalva acima para não se confundirem decisões resultantes de cognição sumária com a sentença em que há cognição exauriente e, frise-se, definitiva. [86]

            Também se revoga a antecipação de tutela sobrevindo decisão com ela incompatível, vale dizer, sendo prolatada sentença de improcedência do pedido do autor, a tutela antecipatória insubsiste ante o fato de que a decisão final se ampara em cognição exauriente incompatível com a manutenção de decisão fulcrada em cognição sumária, mesmo que a sentença seja omissa com relação à antecipação de tutela.

            No mais, assevera William dos Santos FERREIRA [87] que, sendo a sentença de procedência do pedido do autor, a tutela antecipatória ulteriormente concedida permanece incólume, vez que o juízo baseado em cognição exauriente confirmou aquele obtido através de cognição sumária. E, mesmo que seja conferido efeito suspensivo a eventual recurso de apelação, a tutela antecipatória não será revogada.


3.DA TUTELA ANTECIPADA EM SEDE RECURSAL.

            Chega-se ao capítulo principal da presente monografia, no qual será cotejada a antecipação de tutela sob a ótica da instância recursal.

            Pretende-se, aqui: a) demonstrar as finalidades da aplicação do instituto da antecipação da tutela no âmbito recursal; b) enumerar as razões doutrinárias e jurisprudenciais que ressaltam a necessidade em se prover a antecipação de tutela também na sede recursal, bem como as fórmulas e interpretações que a autorizam; c) cotejar o procedimento a ser observado para se obter a antecipação da tutela na instância recursal; d) cotejar o comportamento da doutrina e da jurisprudência quanto à possibilidade de antecipação de tutela na sede recursal; e) vislumbrar a antecipação de tutela em face de cada espécie de recurso.

            Como quadro teórico base, valer-se-á principalmente da doutrina elaborada por William Santos FERREIRA, autor de obra específica sobre o tema (Tutela Antecipada no âmbito recursal), e por outros doutrinadores que, embora não com tanta amplitude, vez que trataram de aspectos pontuais da antecipação da tutela no âmbito recursal, como a questão relativa ao denominado "efeito ativo" do agravo de instrumento. Assim, será cotejada também a doutrina engendrada por Roberto ARMELIN, Teori Albino ZAVASKI, Eduardo TALAMINI, Cássio Scarpinella BUENO, Arruda ALVIM, Teresa ARRUDA ALVIM WAMBIER, Sérgio Sahione FADEL, José Miguel Garcia de MEDINA, Ovídio A. Baptista da SILVA, Eduardo CAMBI, entre outros referenciados na indicações bibliográficas.

            3.1. DA NECESSIDADE DE SE INTEGRAR O INSTITUTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA AO ÂMBITO RECURSAL.

            Evidente que de nada valeria todo o esforço legislativo, doutrinário e jurisprudencial engendrado para se arquitetar um instituto apto a antecipar a tutela almejada com a prestação jurisdicional, se seus efeitos não pudessem ser concretizados e sentidos também na fase recursal. Bastaria a interposição de um recurso dotado de efeito suspensivo, orientada pelo intuito protelatório do réu, para frustrar o gozo dos efeitos da tutela. Por tal razão especialíssima, acertadamente frisou William Santos FERREIRA que "a tutela antecipada não pode ser um instituto represado na primeira instância, mas que terá sua função marcante, até com maiores justificativas, no âmbito recursal". E tal assertiva justificou-se no reconhecimento de que a recorribilidade é uma extensão da ordinariedade, devendo ser criada uma forma de, pelo menos, afastar os efeitos danosos da protelação que oportuniza:

            Se a ordinariedade, enquanto tempo necessário para julgamento das causas que são submetidas à apreciação do Poder Judiciário, foi elemento motivador da criação da tutela antecipada de forma genérica em nosso sistema processual, não se pode esquecer que a recorribilidade é uma extensão da ordinariedade e que, se é imprescindível a sua existência, por outro lado é cristalino que, se é imprescindível a sua existência, por outro lado é cristalino que, ao lado do grande número de argumentos que lhe são favoráveis, encontra-se também um agravamento do fato tempo.... [88]

            Igualmente, se aplica ao presente contexto a famosa afirmação de Luiz Guilherme MARINONI, segundo a qual o tempo do processo não pode ser um ônus do autor. Evidentemente que hoje o tempo do processo é ampliado pela recorribilidade das decisões, recorribilidade esta, em grande parte dos casos, desencadeada pelo propósito protelatório do réu.

            Roberto ARMELIN, a respeito, enfatiza:

            Inicialmente, até mesmo por sua posição geográfica, pode-se equivocadamente – interpretar o instituto da antecipação de tutela como concebido para projetar sua eficácia no âmbito do processamento, em primeiro grau de jurisdição, do processo de conhecimento, em que a tutela de urgência, antecipatória de efeitos da pretensão, era desconhecida.

            A questão, todavia, não se cinge à positivação e localização do instituto no Código de Processo Civil, senão que, encerrando princípio geral de Direito (devido processo legal, inafastabilidade do controle jurisdicional), demanda identificação de seu fundamento de eficácia e validade, para, posteriormente, perquerir-se eventual limitação à propagação de seus efeitos. [89] (sem grifo no original)

            Ademais, é preciso considerar que o art. 273 do CPC não estabeleceu momento ou momentos para o pedido de antecipação de tutela, autorizando-se afirmar que pode ser deduzido a qualquer momento. A propósito, este é o posicionamento externado por Fernando César ZENI:

            Inicialmente devemos ressaltar que o autor, via de regra, pleiteia a antecipação de tutela como liminar na própria petição inicial, o que não o impede, no entanto, de requerer a medida a qualquer tempo no processo, pois não há uma oportunidade certa e única imposta com força preclusiva pela lei. [90]

            Voltando-se para a efetividade da prestação jurisdicional, o Código de Processo Civil, sistema orgânico que é, foi sendo dotado, ao longo de sua saga, e especialmente com as reformas mais recentes, de inúmeros dispositivos, cuja intenção é justamente viabilizar o gozo, o quanto antes, da tutela jurisdicional deferida por cognição sumária ou exauriente, assim, por exemplo, a restrição das hipóteses de concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação, possibilitando-se a execução provisória da tutela deferida pela sentença [91], a possibilidade de o relator conferir efeito suspensivo à decisão agravada ou conceder a tutela jurisdicional negada pela decisão agravada, o denominado "efeito ativo" do agravo de instrumento.

            Não há de se estranhar a alusão à cognição exauriente, uma vez que a integração do instituto da antecipação de tutela no âmbito recursal, por vezes, terá o condão de proporcionar meios para se usufruir a tutela prestada por uma sentença ou por um acórdão, cuja decisão neles inserta restou fulcrada na mais ampla produção e exame de provas, mas cujos efeitos ainda não se fizeram sentir. No âmbito recursal, pois, antecipação de tutela nem sempre será sinônimo de cognição sumária, como se ressai das palavras de William Santos FERREIRA, como segue:

            ...a tutela antecipada tem cabimento:

            a) quando não existe o provimento definitivo (sentença ou acórdão) ou;

            b) quando, embora já exista o provimento definitivo, este ainda não gera efeitos.

            Estas circunstâncias ocorrem no âmbito recursal.

            Já abordamos este assunto quando procuramos demonstrar a diferença entre provimento e tutela efetiva (itens 3.1 e 3.3), e vem a calhar a lição de Cândido Rangel Dinamarco: "Inexiste tutela jurisdicional enquanto o comando enunciado na sentença permanecer nó na sentença e não se fizer sentir de modo eficaz na realidade prática da vida dos litigantes". Neste sentido também assevera Ovídio A. Baptista da Silva: "Satisfazer o direito, para nós, é realizá-lo no plano das relações humanas. É fazer com que o núcleo de seu conceito passe a ter existência efetiva no plano da realidade social. Este resultado nada tem a ver com o prévio reconhecimento judicial de sua existência eventualmente proclamada por uma sentença". [92] (sem grifos no original)

            Uma das atitudes do legislador processualista para alcançar o mister da efetividade foi, sem dúvida, a restrição ao manejo das ações autônomas de impugnação (mandado de segurança, medida cautelar), também denominadas pela doutrina e pela jurisprudência de sucedâneos recursais, dada a habilidade com que satisfazem as finalidades buscadas pelos recursos. Obstando a adoção dos sucedâneos recursais, o sistema privilegiou a busca pela solução das questões dentro do mesmo processo na qual elas se originaram, evitando, assim, o tumulto processual.

            E esse mérito, afirma Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER, deve-se à inserção no sistema do art. 273 do CPC:

            Ainda que a nosso ver esta hipótese não venha a ser comum, não vemos óbice a que se possa conceder a tutela antecipada no tribunal, tendo em vista seus pressupostos e sua finalidade. O advento do art. 273 muito provavelmente acabará com o uso das cautelares com função satisfativa, que não lhe é própria. A reforma visou, entre outras coisas, revitalizar o principal e matar o sucedâneo: é o que deve ocorrer com o uso inadequado do mandado de segurança, para dar efeito suspensivo ao recurso, em face dos dizeres do atual art. 558, caput, do CPC.. As cautelares satisfativas consistiam na solução criativa e inortodoxa dos advogados e dos tribunais, para tapar um buraco, que o sistema não tem mais. [93] (sem grifos no original)

            Hoje, pode-se afirmar que o sistema processual brasileiro está arquitetado de forma a se proporcionar ao jurisdicionado o gozo da tutela deferida, afastando, principalmente, a nociva atitude protelatória do réu. Mais do que isso, a doutrina e a jurisprudência também evoluíram, ao extraírem dos dispositivos insertos no codex essa mais valia, oportunizando a concretização do tripé: ordem jurídica justa, efetividade e instrumentalidade.

            Tendo em vista que o sistema recursal está dotado de meios para oportunizar o gozo da tutela jurisdicional de forma rápida e efetiva, não tornando a oportunidade de recorrer um impasse e em outros casos tornando o recurso um meio de obter a tutela de modo antecipado, vislumbrar-se-á quais são estes meios e como atuam, cotejando a questão da antecipação de tutela em face de cada espécie recursal, o que se propõe na seqüência do presente trabalho monográfico.

            3.2Da antecipação de tutela através do recurso de agravo de instrumento.

            Dúvida não há de que os operadores jurídicos sempre buscaram obter meios de se antecipar os efeitos da tutela jurisdicional almejada.

            Noticia a doutrina que, num passado não muito distante, a recorribilidade das decisões liminares era restrita. No Código de Processo Civil de 1939, as liminares possessórias e liminares em mandado de segurança eram irrecorríveis. Na seqüência, com o Código de 1973, passou-se a se admitir a recorribilidade genérica das decisões interlocutórias através do recurso de agravo de instrumento, desprovido, em regra, todavia, de efeito suspensivo, o que compelia o operador jurídico a se utilizar do mandado de segurança ou da ação cautelar para obtê-lo.

            Essa prática reiterada contribuiu para convencer a jurisprudência, como informa William Santos FERREIRA, de que:

            ...o agravo de instrumento, solitariamente considerado, não era meio hábil a expurgar os danos irreparáveis ou de difícil reparação advindos da decisão impugnada, motivo pelo qual a adoção do mandado de segurança apresentava-se como complementação ao recurso interposto e meio, portanto, hábil a expurgar o referido perigo. [94]

            Por isso, passou-se a admitir a concessão do efeito suspensivo, mas tão somente nas taxativas hipóteses (numerus clausus) preconizadas pela antiga redação do art. 558 do CPC [95].

            Em nítido aperfeiçoamento, o art. 558 do CPC foi reformado pela Lei n.º 9.139, de 30 de novembro de 1995, passando a ter a seguinte redação:

            O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara.

            Parágrafo único: Aplicar-se-á o disposto neste artigo às hipóteses do art. 520. (sem grifo no original)

            Possibilitando a concessão do efeito suspensivo nos casos dos quais pudesse resultar lesão grave e de difícil reparação, o agravo de instrumento passou a proporcionar a antecipação da tutela, entendimento este que ficou expresso na decisão abaixo citada:

            Em sua nova sistemática, o recurso de agravo, que será dirigido diretamente ao Tribunal (art. 524 do CPC), enseja que o relator, "a requerimento do agravante" e desde que seja "relevante a fundamentação", suspenda o cumprimento da decisão agravada, entre outros, nos "casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação" (CPC, art. 558). O desiderato do legislador foi, indubitavelmente, o de conferir ao relator a faculdade de antecipar os efeitos do futuro e provável juízo de provimento do agravo e, com isso, assegurar a utilidade dessa decisão, que estaria comprometida sem uma providência oposta à que decorre da decisão agravada.

            A finalidade da norma, e não a estrita literalidade do dispositivo, é que deve presidir a interpretação do art. 558 do CPC. Nesse pressuposto, impõe-se concluir que o relator do agravo poderá, sendo relevantes os fundamentos e havendo perigo de dano, determinar as providências consistentes na antecipação do futuro e provável juízo de provimento do recurso, para o efeito de suspender o cumprimento do ato agravado, ou, sendo ele omissivo ou indeferitório, para adiantar a tutela por ele negada.

            Assim, mesmo em caso de urgência, é o agravo de instrumento, e não a via autônoma da ação do mandado de segurança, o meio processual adequado para controlar decisão judicial que indefere pedido de antecipação da tutela. [96] (sem grifos no original)

            Ampliada a concessão do efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento também para outros casos dos quais pudesse resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, instaurou-se ampla discussão na doutrina, ante a freqüente utilização do mandado de segurança para atacar as decisões pelas quais o relator concedia efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento, levando-se a indagar se tais decisões não resultariam da discricionariedade judicial, esta entendida como a faculdade que se concede ao agente público de, em determinado caso concreto, escolher, segundo os critérios subjetivos de conveniência e oportunidade [97], qual a opção, das legalmente aceitar, deve seguir e, em sendo assim, se seria possível impugná-las por meio do mandado de segurança.

            A doutrina se dividiu. Uns reconheciam no dispositivo processual supra mencionado a outorga de poder discricionário ao relator, passando este a ser dotado de faculdade para conceder o referido efeito, após cotejar a existência dos pressupostos retro mencionados no caso apreciado, outros entendiam que o julgador teria o dever de suspender os efeitos da decisão agravada.

            Posicionando-se pela existência de uma "faculdade", posicionaram-se: a) Humberto THEODORO JUNIOR: "Sempre, pois, que o relator se deparar com demonstrado risco de dano grave e de difícil reparação e com recurso dotado de relevante fundamentação, terá o dever e não a faculdade de suspender os efeitos da decisão recorrida, se a parte requerer a medida autorizada pelo art. 558 do CPC." [98]; b) Alcides Mendonça LIMA: "Não é um direito assegurado ao vencido recorrente, porquanto ao juiz se outorga a faculdade de deliberar se é, ou não, possível, sustar a execução da ordem." [99]; William Santos FERREIRA: "Como se vê, trata-se de uma técnica utilizada pelo legislador para acompanhar a intensa mobilidade das sociedades de nossos dias (...). Exemplo dessa preocupação legislativa encontramos no caput do art. 558 do Código de Processo Civil, que (...), em complementação optou por também trazer conceitos vagos: "... e em casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação...".

            Aceitando a tese de que a concessão do efeito suspensivo constituía-se em um dever do relator e direito do agravante, manifestaram-se: a) Carlos Silveira NORONHA: o legislador teria acertado em submeter à vontade do agravante a suspensão da execução do ato judicial gravoso. [100]; b) Kazuo WATANABE: "Se presentes os pressupostos legais, a antecipação da tutela é um direito, e não medida dependente de discricionariedade do juiz." [101]; c) Athos Gusmão CARNEIRO: "Em suma, não se cuida de faculdade do juiz, ou de poder discricionário, mas de um direito subjetivo processual que a parte poderá exigir da justiça". [102]

            Eduardo TALAMINI, procurando verificar a existência de discricionariedade e seu grau no âmbito das tutelas de urgência, concluiu que:

            a) com relação à definição concreta dos conceitos jurídicos indeterminados previstos nos dispositivos legais que disciplinam a tutela de urgência ("prova inequívoca", "fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação", "verossimilhança da alegação", "abuso do direito de defesa", entre outros), não há discricionariedade, eis que "A atividade de concreta determinação do "conceito vago" envolve certa "liberdade" do julgador, a qual será exercida levando-se em conta as "máximas da experiência", os valores reinantes na comunidade e assim por diante. Mas, nela, não há nenhuma discricionariedade." [103];

            b) sobre o estabelecimento de aparente facultatividade de atuação nas expressões "o juiz poderá", "a tutela antecipada poderá ser revogada", entre outras, concluiu também não autorizarem o emprego da discricionariedade, dizendo que: "... o agente público, no exercício de função pública, jamais possui simples "faculdade" (...). Todo o "poder" que se lhe confere tem em vista uma finalidade maior, o interesse público. Assim, quando a lei dá ao juiz determinado poder, igualmente o incumbe do dever de desempenhar esse poder adequadamente." [104]

            Por fim, uma última hipótese: c) quanto à atuação do magistrado quando lhe é disponibilizada uma pluralidade de medidas destinadas à efetivação da tutela urgente, concluiu que cabe ao juiz, dentro de certos limites, "adotar a(s) providência(s) mais apta(s) à adequada e integral efetivação da tutela deferida". [105]

            Sobre o efeito suspensivo do agravo de instrumento, Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER concluiu que "Só se pode então dizer que conceder efeito suspensivo ao agravo, com base no art. 558 do Código de Processo Civil é ato de natureza discricionária, exclusivamente se este termo for usado em sentido impróprio", vale dizer, como sinônimo de possibilidade de concessão conforme o prudente arbítrio do julgador. [106]

            Assim entendendo-se, não há óbice para a impetração de mandado de segurança face as decisões que indeferem a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento.

            O sistema legislativo evoluiu mais um pouco. Hoje, o art. 527, III, do CPC, admite expressamente, por força da redação dada pela Lei n.º 10.352, de 26 de dezembro de 2001, além da concessão de efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento (fazendo remissão ao rol exemplificativo do art. 558 do CPC), o deferimento, em antecipação de tutela, total ou parcial, da pretensão recursal ou, em outras palavras, da providência negada em primeira instância, in verbis:

            Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinente, o relator:

            (...)

            III – poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso, ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão. (sem grifo no original)

            A possibilidade de concessão, por intermédio da decisão do relator no agravo de instrumento, da antecipação de tutela negada em primeira instância, não é novidade instaurada diante da reforma do art. 527, III, do CPC. Antes da criação legislativa, precisamente com a edição da Lei n.º 9.139/95, formulou-se interpretação doutrinária posicionando-se por tal possibilidade.

            Essa interpretação partiu, aliás, de elogiável crítica à Lei n.º 9.139/95, que instituiu nova disciplina para o recurso de agravo, diante da convicção de que o agravo de instrumento, através do efeito suspensivo tão somente, não poria fim ao indiscriminado manejo do mandado de segurança [107], como sucedâneo recursal, eis que ficariam carentes de tutela aquelas situações em que o pedido de antecipação restasse negado, como ressaltou Eduardo TALAMINI, quem preconizou a adoção do "efeito ativo":

            Assim, de duas uma: (a) ou se interpretava teleologicamente o art. 558 do CPC que estava para ser implantado – entendendo-se que ele autorizaria não só a suspensão "do cumprimento da decisão" agravada (como diz literalmente o preceito), mas também a própria concessão antecipada da providência negada pelo órgão a quo e que se busca através do recurso; (b) ou, para esses casos (que tendem a ser cada vez em maior número, sobretudo após a realista adoção generalizada da tutela de urgência em nosso sistema), continuaria sendo usado o mandado de segurança.

            Concluíamos ponderando que a mesma ratio que se punha para a admissão da suspensão do cumprimento da decisão agravada servia para autorizar a concessão antecipada, no próprio agravo, da providência ativa que a decisão agravada negou: a garantia do resultado do recurso.

            Assim defendíamos o cabimento do efeito "ativo". [108]

            No mais, procurou o autor acima citado justificar a concessão do efeito ativo ao agravo de instrumento como forma de evitar danos:

            Mas – notávamos – não é apenas a concessão de efeito suspensivo (propriamente dito) que se presta a garantir o resultado do recurso – e, no mais das vezes, indiretamente, do processo como um todo. Há casos em que a decisão impugnada deixou de conceder uma providência (ativa) pleiteada pelo recorrente. Em certas situações, há urgência na obtenção de tal providência. O simples futuro provimento do recurso contra sua denegação poderia vir a ser inútil – vez que já concretizado o dano que se pretendia evitar. É precisamente o que se dá em relação às decisões que indeferem tutelas de urgências (antecipação, cautelares, liminares em mandados de segurança ou em outras ações especiais). [109] (sem grifos no original)

            Outros doutrinadores defendem também a concessão do chamado "efeito ativo", amparados, todavia, no art. 273 do CPC. Dizem eles que o relator estaria autorizado a antecipar a tutela almejada através do agravo com fulcro neste dispositivo. Porém, conforme dicção do autor acima citado, o apelo ao art. 273 do CPC serviria, tão somente, para reforçar o discurso em prol do "efeito ativo", vez que nem todas as providências antecipadas pelo relator seriam genuinamente antecipatórias da tutela, esta enquanto o bem da vida (objeto mediato) pretendido pelo jurisdicionado. Este o posicionamento, por exemplo, de Vicente GRECO [110], para quem, embora o mandado de segurança não deva ser afastado, é possível requerer, com base no art. 273 do CPC, a antecipação da tutela relativamente à pretensão definitiva do recurso.

            Tereza Arruda Alvim WAMBIER convenceu-se sobre a possibilidade de conceder-se o chamado "efeito ativo" ao agravo de instrumento, visualizando com esta possibilidade o fim do apelo ao mandado de segurança. A esse respeito, assevera:

            Hoje pensamos que, nesta hipótese, em vez de se fazer diretamente uso do mandado de segurança, o correto é considerar-se que o próprio relator possa conceder efeito "ativo" ao agravo, adiantando o "provável" julgamento do recurso, enquanto este está tramitando (e se diz provável, porque a parte deve demonstrar aparência de bom direito) não com base no art. 558, caput, que é regra excepcional, mas com base no art. 273, I, do CPC, do mesmo modo deve ocorrer com relação à apelação. [111]

            Roberto ARMELIN também se posicionou favoravelmente à concessão do "efeito ativo", nos seguintes termos:

            Todavia, nos casos em que a decisão agravada é negativa, ou seja, deixa de produzir, na esfera jurídica material das partes, o imprescindível efeito de evitar o advento dos danos irreparáveis ou de difícil reparação, a inovação consistente na possibilidade de concessão do efeito suspensivo à decisão agravada, na nova disciplina do agravo, é totalmente inócua e incapaz de impedir a concreta ocorrência dos aludidos danos.

            Remanesce, destarte, em sede de segundo grau de jurisdição, lacuna no sistema processual que sujeita o jurisdicional, em princípio, à sorte da eficácia da decisão interlocutória negativa de sua pretensão. (...)

            Resta-nos admitir a antecipação, total ou parcial, da tutela postulada no recurso de agravo, que seria inteiramente apta a impedir a efetivação dos aludidos prejuízos de difícil ou impossível reparação. [112]

            Por sua vez, Humberto THEODORO JUNIOR vislumbra que a tutela de urgência necessita ser efetiva ao máximo, não podendo restar impotente diante das situações em que a providência jurisdicional almejada pela parte seja negada, sendo válida, para tanto, a concessão do "efeito ativo":

            A tutela preventiva em segundo grau, durante o trâmite do agravo, é normalmente exercida pelo relator, por meio do expediente da suspensão da decisão impugnada (CPC, art. 558).

            Essa providência, todavia, mostra-se impotente para evitar o dano da decisão abusiva, quando o seu teor é negativo. De nada vale, com efeito, para o agravante obter a suspensão, por exemplo, de uma decisão que lhe indeferiu uma liminar qualquer. A situação de risco de dano continuaria a mesma.

            Em semelhante conjuntura, cabe ao relator, dentro dos poderes de antecipação de tutela, que se exercitam em qualquer fase do processo e em qualquer grau de jurisdição, tomar, provisoriamente, a decisão que, for compatível com a solução final do agravo. Desde, é lógico, que este esteja apoiado em relevante fundamentação e ocorra o efeito perigo de dano grave e de difícil reparação, caso tenha que se aguardar o julgamento do recurso, como exige o art. 273 do CPC. [113]

            William Santos FERREIRA assevera que tal providência recebeu da doutrina o nome de efeito suspensivo ativo do agravo de instrumento e operacionalizou o manejo do recurso em face de uma decisão que deixou de conceder um proteção jurisdicional pleiteada pelo recorrente e isso com o intuito de proporcionar que eventual resultado favorável do recurso possa ser concretizado. De sua obra, colhe-se: "O remédio a ser utilizado quando denegada em primeira instância a tutela antecipada é a interposição do agravo de instrumento, com pedido expresso de concessão pelo relator da antecipação dos efeitos da tutela recursal, ou, de forma mais singela, a concessão pelo relator da tutela antecipada denegada pelo juízo a quo." [114]

            Houve também doutrina contrária à interpretação engendrada por Eduardo Talamini, relativa à possibilidade do "efeito ativo" fulcrada no art. 558 do CPC. José Rogério CRUZ E TUCCI, por exemplo, entendeu que a preconizada providência ativa por parte do relator contrariaria "o sistema processual vigente", vez que o art. 527, II, apenas autorizaria a suspensão da eficácia da decisão agravada, concluindo que "... a ação de MS continuará sendo o remédio adequado para atacar ato proveniente de autoridade judicial, desde que concorrentes os pressupostos legais." [115]

            Barbosa MOREIRA concorda com a providência aqui cotejada, mas, todavia, prefere contemplá-la sob a denominação "antecipação da tutela recursal". A propósito, sua posição parafraseada por William Santos FERREIRA:

            Como bem ressalta Barbosa Moreira, evidentemente não se trata de "suspender" a decisão agravada, eis que suspender o que foi negado nada representa – o que o agravante pretende é substituir uma negação por uma afirmação. Talvez em razão disto é que vem sendo utilizada a equivocada terminologia "efeito ativo" – equivocada, porque estar-se-ia dizendo que suspender os efeitos de uma decisão seria um "efeito passivo", o que evidentemente não guarda qualquer sintonia, pois tanto a interposição do recurso quanto a decisão do relator, inclusive suspendendo os efeitos da decisão impugnada são situações processualmente ativas; e, quanto ao "efeito em si", como se verá, a concessão da tutela antecipada (o batizado "efeito ativo") é decorrência do efeito devolutivo, daí preferirmos a denominação antecipação da tutela recursal. A relação existente entre os dois – efeito suspensivo e "efeito ativo" -, que justifica a possibilidade do segundo, é o tratamento desigual decorrente da posição que sustenta o cabimento tão-somente do efeito suspensivo. [116]

            A jurisprudência também mostrou-se favorável à concessão do "efeito ativo", como forma de se oportunizar uma tutela de urgência plena. Nossos tribunais tiveram oportunidade de examinar a questão, havendo reiteradas decisões a favor da possibilidade de concessão de efeito ativo (ou antecipação de tutela recursal), inclusive do STJ: "Ainda que a decisão interlocutória seja de conteúdo negativo, a via adequada para impugná-la é o recurso de AI, ao qual pode ser conferido o denominado ´´efeito suspensivo ativo". [117]

            Dos tribunais ordinários são colacionados os arrestos abaixo:

            CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – SUPRESSÃO DE VANTAGENS – REDUÇÃO DE PROVENTOS – LIMINAR – AGRAVO DE INSTRUMENTO -EFEITO SUSPENSIVO ATIVO – 1. Supressão de vantagens incorporadas aos proventos do agravante. Sobrestamento do ato administrativo que determinou os descontos para ressarcimento ao erário. Indeferimento da liminar no mandado de segurança. 2. Atribuição de efeito suspensivo ativo ao agravo de instrumento interposto. 3 -redução do valor dos proventos viola o princípio da irredutibilidade dos vencimentos bem como do direito adquirido. A idade avançada do agravante, com mais de 84 (oitenta e quatro) anos, justifica a urgência da medida concedida. 4. Presentes os requisitos do art. 7°, II, da Lei n° 1533/51, que autorizam o deferimento da liminar em mandado de segurança, e os pressupostos do art. 558, do CPC, impõe-se a atribuição de efeito suspensivo ativo ao agravo, mantendo-se a decisão impugnada. 5. Agravo regimental improvido. [118] (sem grifos no original)

            AGRAVO DE INSTRUMENTO – MANDADO DE SEGURANÇA – EFEITO SUSPENSIVO ATIVO – CONCESSÃO DE LIMINAR – EXISTÊNCIA DO FUMUS BONI JURIS E PERICULUM IN MORA – POSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO – Verificada a existência do fumus boni juris e do periculum in mora, o agravo de instrumento se mostra adequado para reformar a decisão monocrática que deixou de conceder a liminar em mandado de segurança, nos moldes delineados no artigo 7º, inciso II, da Lei nº 1.533/51. [119] (sem grifo no original)

            AGRAVO DE INSTRUMENTO – PEDIDO DE EFEITO ATIVO À DECISÃO QUE INDEFERIU LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA – PARCELAMENTO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO – Lei Estadual nº 11.117/99 que alterou a redação do art. 24 da Lei Estadual nº 10.789/98. Estabelecimento de novo prazo para solicitação do benefício. Interpretação teleológica. Presentes o fumus boni juris e o periculum in mora. Liminar concedida. Recurso provido. [120] (sem grifos no original)

            Demonstra-se, assim, que uma das formas preconizadas pelo sistema recursal brasileiro para se obter a antecipação da tutela jurisdicional, obstando-se os efeitos de uma decisão com ela incompatível ou proporcionando o seu gozo, após seu pedido ter sido negado em primeira instância, é o manejo do recurso de agravo de instrumento, especialmente diante da circunstância de tais providências serem autorizadas pela pessoa do relator, antecipadamente à análise da questão pelo colegiado, afastando-se os efeitos perniciosos do decurso do tempo.

            3.3. DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA NA SENTENÇA E SUA IMPUGNAÇÃO.

            Muitas são as controvérsias que pairam em torno da antecipação da tutela, a sentença e sua impugnação. A primeira delas que será aqui tratada diz respeito à possibilidade de antecipação da tutela no bojo da sentença.

            Além desta questão, cotejar-se-á a relativa à impugnação da antecipação deferida na sentença e a forma mais viável para sua impugnação, os efeitos atribuídos ao recurso que a impugna, a questão inerente à subsistência da antecipação concedida na sentença ou antes de sua prolação, sendo por esta confirmada ou não.

            3.3.1.Da Concessão da Antecipação da Tutela no Bojo da Sentença.

            A controvérsia inerente ao presente tópico parte do pressuposto de que a antecipação pode ser concedida no início do processo ou em seu curso, nunca na sentença, sob o argumento de que a finalidade do instituto disciplinado no art. 273 do CPC seria antecipar a tutela que o autor busca na petição inicial e que será obtida na sentença, se procedente sua pretensão. Para essa corrente, não se justifica a concessão da antecipação de tutela na sentença, pois neste momento não mais está antecipando a tutela, mas a concedendo definitivamente. Tal corrente doutrinária também se embasa na expressão "final julgamento" constante do §5º do art. 273, do CPC, entendendo-a como obstativa da aplicação da antecipação de tutela no âmbito recursal.

            Outras discussões giram em torno de se saber se a antecipação de tutela concedida na sentença tem natureza jurídica de decisão final ou interlocutória, para o fim de se determinar qual será o recurso hábil a impugná-la, bem como se tal recurso tem o condão de suspender a antecipação concedida.

            Esta questão será tratada na seqüência.

3.3.2.Do efeito suspensivo do recurso de apelação e da execução provisória da tutela deferida na sentença.

            A doutrina dominante manifesta-se no sentido de não haver óbice à concessão da antecipação dos efeitos da tutela na sentença, desde que estejam presentes os requisitos exigidos pelo art. 273 do CPC.

            A antecipação da tutela através do recurso de apelação é questão que atrai maiores controvérsias. Como diz Eduardo TALAMINI, "Há, por fim, ainda outro grupo de questões que têm sido objeto de intensa disputa. Dizem respeito às relações entre a antecipação da tutela e o efeito suspensivo da apelação". [121]

            A questão, singelamente considerada, gira, tal como no agravo de instrumento, em torno dos efeitos do recurso.

            A apelação é dotada ex lege de efeito devolutivo e suspensivo, pois, segundo dicção do art. 515 do CPC, "... devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada" (tantum devolutum quantum appellatum), e, por força do art. 520 do CPC, "... será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo." Todavia, este mesmo dispositivo excepciona algumas hipóteses, taxativamente enumeradas, hábeis a, acaso configuradas na demanda, impedirem a atribuição do efeito suspensivo ao recurso de apelação, in verbis:

            Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que:

            I – homologar a divisão ou a demarcação;

            II – condenar à prestação de alimentos;

            III – julgar a liquidação de sentença;

            IV – decidir o processo cautelar;

            V – rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los improcedentes;

            VI – julgar procedente o pedido de instituição de arbitragem;

            VII – confirmar a antecipação dos efeitos da tutela.

            A conseqüência de se inibir o efeito suspensivo da apelação é autorizar, desde logo, a execução provisória, como se ressai do art. 521 do CPC: "Recebida a apelação em ambos os efeitos, o juiz não poderá inovar no processo; recebida só no efeito devolutivo, o apelado poderá promover, desde logo, a execução provisória da sentença, extraindo a respectiva carta." (sem grifos no original)

            O teor deste dispositivo, aliás, é confirmando pelo art. 587, inserto no Livro do Processo de Execução, quando declara que a execução da sentença é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo.

            Para não deixar de tecer comentários sobre a execução provisória da sentença, diga-se que o dispositivo que a disciplina, o art. 588, bem como o 522, acima referido, foram consideravelmente reformados pela Lei n.º 10.444, de 07.05.2002.

            O art. 520 passou a contemplar mais uma hipótese: a confirmação da antecipação dos efeitos da tutela. Situação esta que será analisada na seqüência com mais acuidade.

            E a reforma promovida no art. 588, por sua vez, teve o condão de acelerar e tornar mais concreta a satisfação do direito reconhecido no pronunciamento judicial, ao autorizar o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, uma vez prestada caução idônea, requerida e prestada nos próprios autos da execução (inc. II), salvo nos casos de crédito de natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo ou quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade (§2º.).

            Diante do exposto até aqui, pode-se dizer, a priori, que, para a hipótese de sentença de procedência, o fato de se desprover eventual recurso de apelação do efeito suspensivo defere ao autor uma antecipação de tutela, à medida que o autoriza a promover a execução provisória da sentença, passando a gozar, imediatamente, ainda mais com a reforma do art. 588 do CPC, dos efeitos da tutela.

            No mais, explicita-se que, para uma cognição integral da questão, faz-se necessário cotejar as seguintes questões, as quais serão tratadas em itens apartados: a) a antecipação da tutela diante da sentença de improcedência e da extinção do processo, sem julgamento do mérito; b) a antecipação da tutela confirmada pela sentença; d) a antecipação da tutela concedida pela sentença; d) a antecipação da tutela pleiteada após a sentença e antes da remessa da apelação ao tribunal; e) a antecipação da tutela pleiteada já no tribunal.

            3.3.2.Da Antecipação da Tutela Diante da Sentença de Improcedência e da Extinção do Processo, Sem Julgamento do Mérito.

            Duas são as hipóteses em que, por incompatibilidade lógica, o provimento que antecipou a tutela não subsiste ante o advento da sentença: quando esta extingue o processo, sem julgamento do mérito, ou quando esta declara a improcedência do pedido do autor, ainda que não se manifeste expressamente sobre a antecipação. E isso porque, como ensina Eduardo TALAMINI, "... a mantença da antecipação, que pressupõe juízo de plausibilidade favorável ao beneficiário da medida, e a sentença que lhe foi desfavorável, que descarta necessariamente tal plausibilidade. Daí ser até mesmo supérflua a expressa menção à revogação da medida urgente, na sentença de improcedência." [122]

            Tal posicionamento, todavia, não deixou de ser contestado por outros doutrinadores. Luiz Guilherme MARINONI, por exemplo, defendeu a possibilidade de se manter a antecipação de tutela emitida antes da sentença de improcedência, nos seguintes termos: "... se é justo impedir o autor de executar a sentença – que declarou seu direito – para se preservar a esfera jurídica do réu, não há razão para não se reputar justa a manutenção da tutela inibitória antecipada – no caso em que a sentença declarou inexistente o direito que foi suposto na tutela sumária – quando se teme que o autor possa ter seu direito violado" [123]. No mais, referido autor fulcrou a defesa pela manutenção da tutela antecipada mesmo em face de sentença de improcedência na questão da demora do processo, assinalando:

            A tutela antecipatória não deve ser tão excepcional quanto imaginam alguns, já que a demora do processo, principal responsável pela crise da justiça civil, não só excepcionalmente põe em risco os direitos. Exigir uma evidência que torne impossível a antecipação da tutela é uma opção distante da realidade da justiça civil; uma opção cômoda mas não séria. Afinal, o juiz ciente da sua responsabilidade sabe que pouca coisa pode ser mais injusta do que uma vitória processual que signifique uma derrota no plano da realidade social. Aliás, não custa lembrar o alerto de Piero Pajardi, em testemunho de jurista e de Presidente da Corte de Apelação de Milão: de garantismo se morre! [124]

            Referido autor teve como paradigma a lição engendrada por Ovídio Baptista da SILVA, para quem:

            ... não se leva em consideração a circunstância de que a revogação prematura do provimento liminar, ou mesmo da medida cautelar concedida em sentença final cautelar, deixará o direito litigioso sem qualquer proteção assegurativa (sic) durante a tramitação dos recursos, em muitos casos extremamente demorada, de tal modo que a reformada sentença, nos graus superiores de jurisdição, poderia deparar-se com uma situação de prejuízo irremediável ao direito somente agora reconhecido em grau de recurso. Para que situações desta espécie sejam evitadas, recomenda-se que o magistrado – sensível às circunstâncias especiais do caso concreto – disponha, em sua sentença contrária à parte que obtivera a provisional, que esta medida liminar, não obstante a natureza do julgamento posterior divergente, conserve-se eficaz até o trânsito em julgado da sentença a ser proferida no juízo do recurso. Esta parece ser a tendência contemporânea da doutrina italiana (...)". [125] (sem grifo no original)

            Eduardo TALAMINI não duvida da possibilidade de realmente ocorrer o risco de o provimento recursal, que venha a acolher a pretensão do autor, reste ineficaz ante a ausência de antecipação. Todavia, prega que tal questão há de ser dirimida pelo tribunal competente para o julgamento da apelação, desde que haja requerimento do recorrido pela concessão da tutela antecipada. [126]

            José Roberto dos Santos BEDAQUE defende ser necessário que o juiz, no momento da sentença, casse os efeitos da antecipação de tutela. E assim se posiciona porque faz analogia com o caso da sentença que julga conjuntamente a demanda principal e a cautelar, cuja apelação em relação a esta não é dotada de efeito suspensivo, por força do art. 520, IV, do CPC:

            ... como a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional tem natureza cautelar, a solução pode ser a mesma, ou seja, o efeito suspensivo da apelação contra a sentença de rejeição da tutela principal, em cujo processo tenha havido a antecipação dos efeitos dessa mesma tutela, não alcança esse provimento, que perde eficácia de imediato. Deverá o juiz, portanto, julgar improcedente o pedido principal e cassar os efeitos antecipados. Neste aspecto, estará decidindo sobre a pretensão antecipatória, revogando-a. Tal capítulo da sentença versa apenas a tutela antecipada, cuja natureza é cautelar, aplicando-se, portanto, o disposto no art. 520, IV, do Código de Processo Civil. [127]

            3.3.4Da tutela antecipada confirmada e concedida pela sentença diante da impugnação.

            Como se viu retro, o art. 520 do CPC foi reformado, passando a atribuir efeito suspensivo também ao recurso de apelação interposto face a sentença que tenha confirmado a antecipada de tutela.

            Antes dessa reforma, o ordenamento brasileiro carregava consigo a incoerência de inviabilizar a atribuição de efeito suspensivo à apelação interposta face a sentença que confirmava a antecipação de tutela, mesmo autorizando a execução imediata desta (art. 273, §3º, do CPC).

            Neste sentido, pronunciou-se José Rogério CRUZ e TUCCI: "Na verdade, a incoerência do sistema já havia sido assinalada mais de uma vez por Athos Gusmão Carneiro, ao preconizar que o provimento liminar, lastreado em mero juízo de verossimilhança, poderia ser executado, enquanto a sentença, respaldada em juízo de certeza, ficava com sua eficácia contida por força da interposição da apelação!" [128]

            Na mesma esteira, a lição de José Roberto BEDAQUE: "... o ato decisório escudado em mero juízo de verossimilhança, que pressupõe atividade de cognição superficial, tenha a força de gerar efeitos imediatos, enquanto a sentença, resultante de cognição exauriente, tenha seus efeitos suspensos até quando do julgamento da apelação." [129]

            A doutrina, todavia, não se quedou inerte face a esta incoerência legislativa, como se vê das citações acima. Propugnou que a decisão antecipatória da tutela concedida antes da sentença seria eficaz de per si, não podendo ser atingida por eventual recurso de apelação recebido no duplo efeito, isto é, não deixaria de ser eficaz pela interposição do recurso.

            Deste modo posicionaram-se, entre outros, Eduardo TALAMINI, Arruda ALVIM, José Roberto dos Santos BEDAQUE, Cássio Scarpinella BUENO.

            Luiz Guilherme MARINONI pregou que a tutela antecipatória é eficaz de per si, refutando a alegação de que a mesma poderia ser simplesmente substituída pela sentença:

            A tutela sumária que produz antecipadamente o efeito executivo que é próprio da sentença condenatória, abrindo oportunidade para a antecipação da realização do direito, não pode ser simplesmente substituída pela sentença condenatória trânsita em julgado. Quando ocorre o trânsito em julgado da sentença antes da plena realização do direito, a sentença de cognição exauriente e definitiva empresta carga declaratória à decisão proferida com base em cognição sumária, transformando a tutela antecipada em tutela final. A "execução" prossegue como definitiva não porque pode levar à realização do direito, mas sim porque o direito em que se funda já foi declarado com força de coisa julgada material. [130] (sem grifos no original)

            José Roberto dos Santos BEDAQUE foi outro doutrinador que se manifestou contrário à influência do provimento que concedeu a antecipação da tutela pelo efeito suspensivo atribuído ao recurso de apelação, como parafraseado por William Santos FERREIRA: "embora não exista previsão expressa no artigo 520 do Código de Processo Civil, o efeito suspensivo não incide sobre a antecipação concedida, já que, se assim não se entender, restariam completamente frustrados os objetivos do novo instituto, e é justamente para este objetivo que o juiz concede a antecipação." [131]

            A jurisprudência também se manifestou concordância com a interpretação dada pela doutrina. Em acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, restou assentado que: "O processo nunca mais existirá para embaraçar o direito material das partes, porque a antecipação da tutela é uma arma contra a nocividade do efeito suspensivo...". [132] (sem grifo no original)

            No mais, William Santos FERREIRA, o sistematizador da tutela antecipada no âmbito recursal, arrolou sete fundamentos que militam em prol da eficácia da antecipação da tutela concedida ou confirmada na sentença: 1º fundamento) "a sistemática da tutela antecipada não permite a incidência do efeito suspensivo sobre ela, conforme a literalidade genérica do artigo 520 poderia induzir"; 2º fundamento) a concessão da tutela antecipada é concedida especificadamente na sentença por saber o juiz que, se apenas proferir sentença, os efeitos daquela não se farão mais sentir; 3º fundamento) não se pode impedir a concessão da tutela antecipada na sentença amparado na expressão "até final julgamento", constante do art. 273, §5º, do CPC, uma vez que tal expressão é empregado como solução final e definitiva do conflito; 4º fundamento) o conhecimento que o juiz tem na fase de prolação da sentença autorizam ainda mais a concessão da antecipação da tutela, a qual se justifica em razão da provável impugnação recursal; 5º fundamento) o art. 520, VII, do CPC afasta implicitamente o efeito suspensivo em relação à antecipação de tutela concedida na sentença; 6º fundamento) a decisão que concede a antecipação da tutela é eficaz imediatamente e não encerra o litígio; "mesmo obtido o bem da vida almejado (portanto eficácia imediata!), o processo precisa continuar. Se não tivesse eficácia imediata, não haveria razão para a ressalva, uma vez que, se o autor não consegue o que almeja, é claro que continuará na sua busca"; 7º fundamento) o recurso que deve atacar a sentença que concede a antecipação da tutela é a sentença diante da "decisão de conteúdo mais abrangente". [133]

            Araken de ASSIS, porém, criticou a prática predominante nos tribunais, consistente em deferir a tutela antecipada um pouco antes da sentença, asseverando que "antecipar o juiz pouco antes da sentença, nas condições anteriores, em ato apenas formalmente autônomo, é reprovável burla à lei". [134]

            No mesmo sentido, exortou sua discordância, Antônio Cláudio da Costa MACHADO: "Atente-se para o fato de que o encerramento da audiência de instrução, seguida da apresentação de memoriais, é obstáculo à outorga de tutela antecipada, porque o juiz já está em condições de prover tutela definitiva. Além do mais, a decisão antecipatória que se conceda na sentença é inexeqüível de imediato, se o réu interpuser apelação com efeito suspensivo (art. 520, intio)". [135]

            Roberto ARMELIM entendeu que não seria possível a antecipação da tutela, em grau recursal, com amparo no art. 273, I, do CPC, mas, tão-somente, com fulcro no art. 273, II, do CPC, ante a ausência de ressalva ao efeito suspensivo no caso em tela:

            Já no que pertine à apelação, fenômeno diverso deve ser analisado, especialmente porque esse recurso é dotado, por expressa disposição legal, de efeito suspensivo como regra, enumerando-se as poucas hipóteses de exceção no art. 520 do Estatuto Processual.

            Dessa forma, e até que não se altere a redação do referido art. 520, como pretende a d. Comissão Revisora do CPC, a interposição do recurso de apelação tem o condão de imediatamente evitar a hipótese prevista no inc. I do art. 273 do Estatuto Processual, de sorte que não vislumbramos a necessidade de antecipação de tutela em sede de apelação com lastro no aludido inc. I do artigo 273. [136] (sem grifo no original)

            No mais, a doutrina consentânea ao argumento de que a antecipação da tutela é eficaz de per si, não podendo seus efeitos serem obstados por eventual recurso de apelação dotado de efeito suspensivo, defende, no mais, que, em razão dessa cisão, a antecipação confirmada na sentença não se confundiria com esta, podendo ser atacada mediante agravo de instrumento, sem perigo de ofensa ao princípio de unirrecorribilidade ou da unicidade recursal, o qual estabelece que, como ensina Nelson NERY JUNIOR, "para cada ato judicial recorrível há um único recurso previsto pelo ordenamento, sendo vedada a interposição simultânea ou cumulativa de mais outro visando a impugnação do mesmo ato judicial." [137]

            Com efeito, propugnou Eduardo TALAMINI:

            Alguma dúvida pode haver apenas na definição do recurso de que se deverá valer o réu para tentar suspender a tutela antecipada. Duas soluções são imagináveis: 1ª) o réu teria de pedir ao relator da apelação, como incidente deste recurso, a suspensão da antecipação da tutela (a premissa teórica é a de que a antecipação integraria materialmente a sentença e só não seria abrangida pelo automático efeito suspensivo da apelação por uma imposição lógica); 2ª) o réu teria de interpor agravo de instrumento e nele requerer efeito suspensivo (a premissa teórica é a de que a decisão concessiva da antecipação não se confundiria com a sentença, embora inserida no mesmo documento).

            Do ponto de vista teórico, parece mais adequada a segunda orientação. Em termos práticos, ela também é especialmente satisfatória para eliminar qualquer impasse quando se pretender sustar a eficácia da tutela antecipada antes que a apelação suba ao tribunal (obviamente, não se aplica aqui a regra do art. 523, §4º - o que se dirige aos casos em que do provimento a ser impugnado não resultem danos imediatos à parte). Fora desse caso, no entanto, a segunda solução implica a complicação prática da duplicação de recursos. É razoável aplicar, nesse tema, a diretriz da "fungibilidade". [138]

            Hoje, a reforma promovida pela Lei n.º 10.444/01 atendeu aos reclamos da doutrina, como se observa, aliás, da exposição de motivos do projeto de lei que deu origem à mesma:

            ... respeitáveis objeções conduziram à manutenção, como regra geral, da sistemática do duplo efeito, de longa tradição, pelo menos no estágio atual das reformas no Código e enquanto não se dispõe de estatísticas precisas a respeito do número percentual de apelações que são total ou parcialmente providas. Além disso, busca-se inclusive, evitar um previsível acúmulo, em segunda instância, de pedidos cautelares tendentes à concessão do efeito suspensivo à apelação. [139]

            A questão, pois, está pacificada, podendo-se afirmar, como diz José Rogério CRUZ E TUCCI, que "a eficácia que foi previamente antecipada continuará realizando o direito mesmo após a interposição do recurso de apelação." [140]

            Já no que concerne à tutela antecipada concedida na sentença, em decorrência da reforma do art. 520, do CPC, retro mencionada, a doutrina, vem atribuindo uma interpretação extensiva aludido ao seu inciso VII, entendendo que a apelação deve ser recebida somente no efeito devolutivo também na hipótese em que a antecipação de tutela for concedida na sentença, e não apenas na hipótese que é por esta confirmada. José Roberto BEDAQUE é um dos que perfilha deste entendimento, como se observa da passagem abaixo:

            ... embora a situação não esteja prevista no art. 520 do CPC, evidentemente deve ser incluída entre aquelas em que inexiste esse efeito. Se assim não se entender, restariam completamente frustrados os objetivos do novo instituto. Aliás, a antecipação concedida na própria sentença tem como conseqüência exatamente retirar o efeito suspensivo da apelação. No que se refere aos efeitos antecipados, o julgamento é imediatamente eficaz, ainda que suscetível de apelação. Por isso mesmo inexiste qualquer incompatibilidade entre a possibilidade de a antecipação acarretar a produção de efeitos antes mesmo do julgamento final e a não produção de efeitos da sentença sujeita à apelação. [141]

            Ovídio A. Baptista da SILVA, todavia, refuta o entendimento acima. Ele entende que a natureza jurídica das decisões liminares que antecipam os efeitos da tutela da futura sentença de mérito não é de mera decisão interlocutória, porque o juiz vai além de um mero exame de questões incidentais e, se antecipados os efeitos, na própria sentença, o recurso seria apelação, tão-somente. [142]

            Luiz Guilherme MARINONI propõe que os efeitos da tutela não sejam antecipados na sentença, mas através de decisão interlocutória, no momento em que é proferida a sentença, pois, do contrário, retirar-se-ia a possibilidade de o réu ter o direito ao recurso adequado, tendo em vista o posicionamento de alguns tribunais em situações semelhantes. [143]

            Paulo Afonso Brum VAZ sustenta a tese de que o juiz deveria antecipar os efeitos da tutela em decisão em separado, mesmo que seja deferido simultaneamente à prolação de sentença, para evitar problemas no campo dos recursos e porque as decisões têm naturezas diversas, uma proferida com fundamento no juízo de probabilidade e a outra fundada num juízo de certeza. Não sendo este o caso, ou seja, estando a antecipação dos efeitos, no corpo da sentença, entende que a solução seria dois recursos, um contra a parte que antecipou os efeitos da tutela (AI) e outro, contra o provimento definitivo (apelação). Sustenta que essa situação não feriria os princípios da singularidade e da indivisibilidade das decisões, pois, na verdade, desde o nascedouro, os conteúdos são de naturezas diversas, constituindo-se dois provimentos, ainda que proferidos simultaneamente. Quando o juiz concede a antecipação dos efeitos da tutela no corpo da sentença, na verdade está proferindo simultaneamente duas decisões, que se distinguem pelo conteúdo, embora se exteriorizem sob a forma de sentença.

            Teori Albino ZAVASCKI entende que seria correto conceder efeito tão somente o efeito devolutivo à apelação, no que se refere à impugnação da antecipação da tutela. Para conferir seu entendimento, traz-se à baila a ementa de acórdão de um Agravo de Instrumento julgador pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

            APELO RECEBIDO NO DUPLO EFEITO – TUTELA ANTECIPADA – CAUTELAR – 1. No que respeita à parte da sentença que julgou a cautelar, deve ser o apelo recebido apenas no efeito devolutivo, face ao que dispõe o inciso IV do art. 520 do CPC. 2. No que tange à parte da sentença que apreciou a tutela antecipada, que se constitui na antecipação do mérito, permitindo a execução, também deve ser o recurso de apelação recebido apenas no efeito devolutivo. 3. Agravo provido." [144]

            3.5.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA ATRAVÉS DO RECURSO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

            Pouco há de se falar relativamente à antecipação da tutela no âmbito do recurso de embargos de declaração.

            Preliminarmente, diga-se que, freqüentemente, tal recurso é manejado apenas para protelar o feito. Tal circunstância, aliás, compeliu o legislador, através da reforma empreendida pela Lei n.º 8.950, de 13.12.1994, a prever a aplicação de multa para o recorrente, como restou inserto no parágrafo único do art. 538 do CPC, in verbis: "Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração dos embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo."

            Essa notícia serve para justificar, até, a possibilidade de antecipação da tutela no âmbito do recurso em tela. Não obstante isso, a antecipação da tutela poderá ser requerida pelo autor, quando do julgamento de embargos de declaração opostos pelo réu, com fulcro em ambas as hipóteses do art. 273: na constatação da urgência, bem como do manifesto propósito protelatório do réu ou do abuso do direito de defesa.

            No que concerne à apreciação do pedido de antecipação da tutela, existem divergências. William Santos FERREIRA entende que, "Como o julgamento dos embargos pode demorar, nada há que impeça que o pedido de tutela antecipada seja apreciado pelo relator, que será o mesmo do acórdão embargado." [145] Ressalva este autor que a decisão provisória do relator será revista pelo colegiado.

            Sob outro prisma, Araken de ASSIS e Calmom de PASSOS entendem que a competência para a concessão da antecipação da tutela é do colegiado. [146]

            Ainda com relação aos embargos de declaração, a doutrina lança alerta no que concerne aos eventuais efeitos infringentes dos embargos de declaração. E, nesse sentido, o ensinamento de William Santos FERREIRA: "Aqui o cuidado do relator deverá ser redobrado, eis que deverá avaliar se o pedido do embargante (réu) poderá ter sucesso, hipótese em que a tutela antecipada será indeferida. Imagine-se o caso em que uma das matérias da apelação tenha sido a ocorrência da prescrição, não apreciada pelo acórdão; neste caso, se admitida, os embargos de declaração serão conhecidos e providos para o fim de dar provimento à apelação, julgando-se a ação improcedente nos termos do art. 269, IV." [147]

            3.6.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E OS EMBARGOS INFRINGENTES.

            William Santos FERREIRA remonta a duas hipóteses nas quais seria viável o pedido de antecipação da tutela na fase de interposição e julgamento dos embargos infringentes.

            A primeira das hipóteses seria aquela em que o embargante, que é autor da ação, teve negado provimento a sua apelação por maioria de votos, hipótese em que restaria cabível a antecipação da tutela ante a probabilidade se serem acolhidos os argumentos constantes do voto vencido.

            O exemplo dado por William Santos FERREIRA, todavia, merece reparos e não basta mais a ilustrar a incidência da antecipação da tutela por meio do recurso de embargos infringentes, ante à reforma promovida pela Lei n.º 10.352, de 26.12.2001 no art. 530 do CPC, pela qual o mesmo passou a admitir a interposição de embargos infringentes somente "quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória".

            No exemplo dado por William Santos FERREIRA, segundo a nova configuração do recurso sob comento, não haveria mais possibilidade de sua interposição e, por conseqüência, a dedução do pedido de antecipação da tutela.

            De toda a forma, supondo que fosse juridicamente possível ainda a hipótese acima, os fundamentos para a concessão da tutela antecipada deveriam estar agregados à extensão do voto vencido. Em outras palavras, quis o autor dizer que aqueles requisitos devem restar contemplados pela tese veiculada no voto vencido. Assim, exemplifica:

            ... se o autor na inicial apresentou duas causas de pedir, e o voto vencido no julgamento da apelação apenas admitiu uma delas, os embargos infringentes não poderão superar esta causa de pedir, o que significa dizer que os requisitos específicos do caput do artigo 273 só a esta causa de pedir poderão se referir. Se este espectro for superado, a apreciação deve restringi-lo ao âmbito da divergência. Mas não se confundam os motivos do voto vencido, que poderão até ser outros para admissão dos embargos infringentes, com a apreciação da causa de pedir, já que só a admitida pelo voto vencido poderá ser reapreciada. Neste caso haverá uma coincidência entre a tutela antecipada e a antecipação da tutela recursal. [148]

            Outra situação vislumbrada por William Santos FERREIRA é aquela em que o embargante é o réu, sendo que o autor da ação teve, em sede recursal, julgado procedente o seu pedido por maioria de votos.

            Esta hipótese, por outro lado, é admissível de acordo com a nova redação do art. 530 do CPC, eis que houve reforma da decisão de mérito, em grau de apelação.

            O efeito em que é recebido o recuso de apelação é extensível ao embargos infringentes, de forma que o problema criado no caso em tela, quanto ao gozo da tutela, é precisamente o eventual efeito suspensivo da apelação. Daí a correção do autor em defender que:

            Aqui também, ante a ausência de efeitos, é cabível em tese a tutela antecipada (justamente para antecipar os efeitos ainda não gerado). Mas deverá o julgador, para antecipar a tutela, verificar se os embargos infringentes interpostos pelo réu têm grandes chances de prosperar; se tiverem, desaparecerá, para a tutela antecipada (pedido do autor), a verossimilhança da alegação e a prova inequívoca, do que decorrerá o indeferimento do pedido; caso contrário, a tutela antecipada deverá ser deferida. [149]

            Arruda ALVIM, citado pelo doutrinador retro mencionado, faz considerações sobre a hipótese em que a antecipação da tutela for concedida na sentença, quando a apelação e eventuais embargos infringentes não poderão ter efeito suspensivo, o que traz as seguintes implicações:

            O que poderá ocorrer é que, pelo teor do voto vencido, a turma julgadora entenda que é o caso de modificar ou revogar a tutela antecipada se, no entendimento não circunscrito ao voto, senão que, no entendimento majoritário da turma julgadora, esta vier a entender não estarem, ou não mais estarem, presentes os pressupostos viabilizadores da concessão. Diferentemente, se há reforma da decisão em que se concedera a tutela antecipada, será efeito natural desse decisão a reversão ao estado anterior. [150]

            No mais, sobre a apreciação do pedido de antecipação de tutela, William Santos FERREIRA defende que deve ser feita ser feita monocraticamente: pelo relator do acórdão embargado ou pelo novo relator sorteado, priorizando a análise por aquele em caso de urgência, o qual deverá submeter sua decisão à reapreciação do novo relator.

            3.6.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E OS RECURSOS ESPECIAL E EXTRAORDINÁRIO.

            Cabe, por fim, indagar como se comporta a antecipação da tutela diante dos recursos especial e extraordinário.

            Em relação a tais recursos, dada a circunstância de serem recebidos tão-somente no efeito devolutivo (art. 542, §2º, do CPC), era comum a utilização da medida cautelar (como sucedâneo recursal), para que restasse obtido o efeito suspensivo. Em casos de urgência, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal a admitiam para tanto, inclusive com menção expressa em seus regimentos internos (art. 21, IV e V, do RISTF e arts. 34, V e VI, e 288 do RISTJ).

            Tal ação era utilizada de modo disciplicente, desconsiderando-se os seus reais pressupostos (periculum in mora e fumus boni iuris) e, nas mais das vezes, nem sequer subsumindo-se tais pressupostos à uma situação fática que permitisse suspender os efeitos da decisão recorrida. Não obstante isso, essa prática era acolhida pela doutrina e pela jurisprudência, eis que se constituiu numa forma de se oportunizar tutela às situações de urgência.

            Para o deferimento da cautelar, os tribunais sempre exigiam a admissão, pelo tribunal a quo, do recurso interposto, como ressaltado no julgado abaixo: "Presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, defere-se, em caráter excepcional, a medida cautelar para sustar-se a execução provisória do despejo até o julgamento do recurso especial já admitido." [151]

            E as razões para tal posicionamento são as seguintes: a) ao julgar a apelação, o tribunal põe fim a sua função jurisdicional, não mais tendo competência para proferir decisões no mesmo processo, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos do art. 463 do CPC (corrigir inexatidões materiais ou retificar erro da cálculo ou sanar omissões, obscuridades e contradições por meio de embargos de declaração) e o juízo de admissibilidade dos recursos extraordinários pelo presidente do tribunal; b) antes da admissão do recurso a decisão que, em tese, admitisse a cautelar, limitaria-se a declará-la, não autorizando, assim, que surtisse seus efeitos; c) a atribuição de efeito suspensivo a recurso inadmitido implicaria supressão de instância.

            Para William Santos FERREIRA tais razões não procedem, admitindo que "a mera interposição do recurso já franqueia o ajuizamento da medida cautelar no tribunal "ad quem", e qualquer interpretação em contrário colide com o dispositivo, pois, se assim fosse, o dispositivo diria "conhecido o recurso...", e não há esta previsão! [152]

            A doutrina entendia que tal exigência era por demais exigente, ofensiva ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, passando que o indeferimento do recurso não obstaria a concessão da tutela cautelar.

            Também defendendo essa tese, William Santos FERREIRA asseverou: "Caso o recurso não supere o juízo de admissibilidade, se a parte interpuser agravo de instrumento desta decisão denegatória nada impedirá o deferimento da tutela cautelar, já que a decisão ainda não se encontrará preclusa e ainda estará sujeita à apreciação pelo órgão ad quem." [153]

            Parte minoritária da jurisprudência, na seqüência, começou a mudar de orientação e admitir que "Verificados o perigo de lesão irreversível e a aparência de bom direito, é irrelevante a circunstância de o recurso especial ainda não ter sido interposto ou estar à espera do juízo de admissibilidade." [154]

            Em razão da posição majoritária, que não admitia o manejo da cautelar para obter o efeito suspensivo quando ainda não admitido o recurso especial ou extraordinário, passou-se a pregar que o mandado de segurança seria, então, o remédio adequado para obter o efeito suspensivo quando ainda não admitido o recurso especial e/ou extraordinário, como defendido por Teori Albino ZAVASKI.

            Todavia, pontificava William dos Santos FERREIRA que tal impugnação só iria favorecer o réu:

            A decisão impugnada, de conteúdo ativo, terá seus efeitos suspensos, via medida cautelar. Com isso, não haverá a possibilidade de execução, inclusive sendo possível este efeito suspensivo (através de medida cautelar) nos casos de deferimento de tutela antecipada que foi impugnada por recurso especial, como já foi admitido recentemente no Superior Tribunal de Justiça.

            Contudo, nos casos em que a decisão proferida no tribunal a quo tiver conteúdo negativo, evidentemente, a suspensão dos efeitos desta não afastará a ocorrência de dano grave de incerta reparação, do que decorre o risco de ineficácia do futuro julgamento dos recursos extraordinário ou especial, a não ser que a decisão de primeira instância tenha sido concessiva, pois aí o "efeito suspensivo" mantém incólume a decisão concessiva da tutela antecipada. [155]

            Na ânsia de encontrar um meio para obter a tutela do direito do autor, não faltaram propostas para superar o empecilho acima mencionado. Barbosa MOREIRA propôs uma aplicação analógica da interpretação que realiza para permitir a concessão da tutela cautelar antes da citação do réu e diz "Se lá [na tutela cautelar] é possível, aqui [na tutela antecipada] também deve ser, porque, em certa medida, os dois tipos de providências visam não ao mesmo fim, mas a fins análogos: permitir a realização da boa justiça, de tal maneira que ela seja praticamente eficaz, e não apenas teoricamente eficaz." [156]

            Teori Albino ZAVASKI, por sua vez, propôs:

            Assim, em nome da ‘proteção de direito suscetível de grave dano de incerta reparação’ ou ‘para garantir a eficácia da ulterior decisão da causa’, ou, ainda, ‘em atenção aos princípios da instrumentalidade e da efetividade do processo’, pode o tribunal não apenas conceder medida para dar efeito suspensivo ao recurso especial ou extraordinário, mas também, se necessário, antecipar, provisoriamente, os efeitos da tutela recursal, sempre que tal antecipação seja indispensável à salvaguarda da própria utilidade do futuro julgamento. De nada adiantaria ter a Constituição assegurado à parte o direito de acesso ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, se não lhe assegurasse, também nos casos focados, que o provimento do seu recurso extraordinário ou especial trará resultados efetivos. (...)

            Negar medida que garanta virtual utilidade do futuro julgamento é, na prática, o mesmo que negar o próprio direito de recorrer. [157]

            Dessa forma, preconiza William Santos FERREIRA, seria disponibilizado ao jurisdicionado a antecipação da tutela recursal, pois uma vez concedida a liminar cautelar, retirará os efeitos decorrentes da decisão impugnada.

            Como em todas as hipóteses de pedido de antecipação de tutela, caberá ao requerente demonstrar, além dos requisitos previstos no art. 273 do CPC, a probabilidade de cabimento e sucesso do recurso interposto, aduzindo que: "É claro que se em análise prévia o julgador não vislumbrar sequer possibilidade de conhecimento do recurso interposto, não concederá a tutela antecipada. Lembre-se que, sem apreciação do mérito do recurso, nada se alterará; logo, não estarão cumpridos os requisitos do caput do art. 273." [158]

            O grande argumento de William Santos FERREIRA em prol da antecipação da tutela em sede recursal merece ser aqui reprisado: quanto mais se afunila a possibilidade de recorrer, mais viabilizada resta a antecipação diante do reconhecimento, por sucessivos juízos, da pretensão.

            Outro grande argumento em prol da antecipação da tutela para que reste concedido o efeito suspensivo aos recursos extremos é externado por Athos Gusmão CARNEIRO e parte do histórico, retro mencionado, da utilização da cautelar inominada para a obtenção da tutela antecipada (dizia-se satisfativa). Diz o mesmo, parafraseado por William Santos FERREIRA que: "Até em atenção ao princípio constitucional da igualdade, deve-se admitir, em tese, quando presentes os requisitos autorizadores, a antecipação da tutela, tal qual se admite a concessão de efeito suspensivo em caráter excepcional, quando interposto recurso extraordinário e/ou especial". [159]

            Ademais, a jurisprudência, amparada neste argumento, já obstou o efeito suspensivo de recurso especial, como se vê abaixo:

            Tutela jurisdicional antecipada (direito de transmissão dos jogos da Copa de 1998) – Recurso especial – Efeito suspensivo – Medida cautelar. 1. A concessão de efeito suspensivo é de caráter excepcional. 2. Ambas as tutelas pressupõem prejuízo iminente e concreto (periculum in mora). 3. Caso em que não se justifica seja suspensa a decisão de antecipação. 4. Pedido de liminar indeferido. Extinção do processo. [160]

            Assim, vê-se que, em prol da tutela jurisdicional ampla e efetiva dos direitos, coroada pela Constituição Federal de 1988 e demonstrada inequivocamente pelas reformas mais recentes, percebe-se que o espírito que deve predominar é aquele consentâneo à concessão da tutela almejada, quando existentes pressupostos para tanto, de forma que deve ser admitida a concessão do efeito suspensivo aos recursos extraordinários, por intermédio dos sucedâneos recursais, excluindo-se, todavia, os óbices relacionados neste item.


CONCLUSÃO

            Chega-se ao fim da presente monografia com a convicção de que uma prestação jurisdicional célere, justa e efetiva não pode prescindir de técnicas de tutela aptas a anteciparem os efeitos da tutela pretendida pelo autor, oportunizando-lhe o gozo da mesma, quando presentes no caso concreto, além da verossimilhança da alegação e da prova inequívoca (pressupostos genéricos), um dos pressupostos específicos consagrados pelo art. 273 do CPC: o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

            E, mais do que isso, essa técnica hábil a antecipar os efeitos do provimento final de mérito não pode restar circunscrita tão-somente à primeira instância, sob pena de nada valer todo o esforço legislativo, doutrinário e jurisprudencial que a engendrou.

            Pois bem, uma vez consagrada a viabilidade da integração da antecipação da tutela antecipada, resta explicitar aqui as conclusões mais significativas relativas à essa integração. Para melhor visualização, dispõem-se as conclusões inerentes ao instituto da antecipação da tutela na sede recursal apartadamente e de acordo com a seqüência em que se desenvolveu a pesquisa. Seguem as conclusões:

            I-para a obtenção da antecipação da tutela na sede recursal, além dos requisitos genéricos e específicos contemplados pelo art. 273 do CPC, será necessário o convencimento do julgador quanto à probabilidade de sucesso do recurso interposto;

            II-a circunstância de o pedido do autor ter sido submetido ao crivo de vários julgadores e obtido resposta positiva assinala a probabilidade de referida decisão restar definitiva, corroborando a viabilidade em serem antecipados os efeitos do provimento final de mérito na sede recursal;

            III-a antecipação da tutela no âmbito recursal constitui-se em ferramenta hábil a superar os efeitos perniciosos do decurso de tempo sem o amparo judicial, seja por questões inerentes à dificuldade da conclusão judicial ou pelo abuso do réu quanto ao seu direito de defesa ou o seu manifesto propósito protelatório. Tais são hábeis a fundamentar o pedido de antecipação na seara recursal;

            IV-o art. 273 do CPC não contém elementos hábeis a inibir a antecipação da tutela na sede recursal, muito pelo contrário está em consonância com os princípios constitucionais processuais que militam em prol de uma prestação jurisdicional efetiva;

            V-a doutrina em prol do "efeito ativo" do agravo de instrumento, que se originou de crítica à inadequada técnica legislativa inserta no art. 558 do CPC, limitada a autorizar a concessão de efeito suspensivo, incapaz de proteger todas as situações carente de tutela, ensejou a reforma do art. 527, III, do CPC, que passou a autorizar a antecipação, total ou parcial, da pretensão recursal;

            VI-que merece amparo a doutrina, desenvolvida antes da inserção do inc. VII ao art. 520 do CPC, o qual previu que o recurso de apelação será recebido somente no efeito devolutivo quando a sentença confirmar a antecipação da tutela, segundo a qual a antecipação de tutela não fica sujeita ao efeito suspensivo do recurso de apelação, vez que, conforme sua disciplina legislativa é dotada de eficácia imediata. Assim sendo, pode ser atacada mediante recurso de agravo de instrumento;

            VII-que a ausência do efeito suspensivo à apelação interposta em face da sentença que reconheceu a pretensão do autor é uma forma de se proporcionar a antecipação da tutela, vez que autoriza a execução provisória do julgado, instituto que, com as recentes reformas, teve seus limites ampliados consideravelmente;

            VIII-ao art. 520, VII, do CPC, deve ser atribuída interpretação ampliativa, permitindo-se que a apelação seja recebida somente no efeito devolutivo também quando a sentença vergastada tenha concedido a antecipação da tutela;

            IX- que, por incompatibilidade lógica, em regra, não se pode deferir a antecipação da tutela em grau recursal, quando o pedido do autor não for acolhido em primeira instância revogando-se a antecipação ou quando for afastado diante da extinção do processo, sem julgamento do mérito;

            X-que a antecipação deve ser concedida também na fase de processamento dos recursos de embargos de declaração e embargos infringentes, sempre se demonstrando neste último que os requisitos que permitem a antecipação estão compreendidos pelos limites do voto vencido;

            XI-deve ser admitida a concessão do efeito suspensivo aos recursos extraordinário ou especial, enquanto não realizada reforma legislativa que permite tal obrar expressamente, por intermédio dos sucedâneos recursais, esforçando-se para excluir os óbices formais interpostos por parte da doutrina e da jurisprudência para tanto.

            Por fim, deixa-se como mensagem a esperança de que a lei, a doutrina e a jurisprudência evoluam sucessivamente de forma a, cada vez mais, propiciarem instrumentos para que a antecipação da tutela na sede recursal concretize-se de forma mais freqüente e se torne uma regra na foro, dissuadindo o réu a abusar do seu direito de defesa ou a protelar incansavelmente o trâmite do processo.


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Notas

            01 Isto porque, antes do advento do art. 273 do CPC, a antecipação de tutela era contemplada por alguns procedimentos e leis especiais, a saber: a) ação possessória – arts. 928 e 929 do CPC; b) ação de nunciação de obra nova – art. 937 do CPC; c) ação de busca e apreensão de coisa vendida a crédito com reserva de domínio – art. 1071 do CPC; d) ação de embargos de terceiro – art. 1051 do CPC; e) ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente em garantia – Dec. Lei 911/69, art. 3º; f) ação de mandado de segurança – Lei 1.533/51, art. 7º, II; g) ação de desapropriação – Dec. Lei 3.665/41, art. 15; h) ação popular – Lei 4.717/65, art. 5º, §4º; i) ação civil pública – Lei 7.347/85, art. 12; j) tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer – Código de Defesa do Consumidor, art. 84, §3º; l) ações locatícias – Lei 8.245/91, art. 59, §1º.

            02 WAMBIER, L. R.; ALMEIDA, F. R. C. de; TALAMINI, E. Curso avançado de processo civil. São Paulo; Revista dos Tribunais, 2000, p. 346.

            03 ZAVASKI, T. A. Antecipação da tutela e colisão de direito fundamentais. Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p.29.

            04 DINAMARCO, C. A reforma do Código de Processo Civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 138.

            05 CRUZ E TUCCI, J. R. Lineamentos da nova reforma do CPC. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 105.

            06 ARMELIN, R. Notas sobre a antecipação da tutela em segundo grau de jurisdição. In: WAMBIER, T. A. A. (Coord). Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 43.

            07 CHIOVENDA apud Luiz Guilherme MARINONI, A antecipação da tutela. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 30.

            08 Pela teoria abstrata da ação, o direito de ação dissocia-se da constatação efetiva do direito material. Em outras palavras, não se exige, para se afirmar como existente o direito de ação, a prolatação de uma sentença favorável àquele que exerceu o direito de ação. Tal concepção é bem retratada pela seguinte análise de Couture: "O que o demandado poderá negar-lhe é seu direito de obter uma sentença favorável, mas nunca seu direito de comparecer ante o tribunal".

            09 Esta teoria foi defendida por Alfredo Rocco, Carnelutti e Couture.

            À teoria abstrata da ação contrapõe-se a teoria concreta da ação ou também denominada teoria civilista (clássica, civilística ou imanentista), para a qual o processo funciona como um apêndice do direito civil (rectius = direito material), é subordinado a este, restando inconcebível imaginá-lo desvencilhado do direito material. Foi defendida por Savigny, Matirollo e Vinnius. Esta concepção começou a ser revista no último quarto do século XIX. Adolf Wach e Windscheid e Muther elaboram argumentos contra esta teoria.

            10 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 31.

            11 Ibid, p. 30.

            12 SILVA, O. B. da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica. 2. ed. rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 180.

            13 ARENHART, S. C. Tutela Inibitória Coletiva. Curitiba, 2002, 463 f. Tese (Doutorado em Direito) – Pós Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná, p. 7.

            14 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 30.

            15 ARENHART, op. cit., p. 14.

            16 SILVA, O. A. B. da. Curso de Processo Civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 49-50.

            17 ARENHART, op. cit., p. 14.

            18 ARENHART, op. cit, p. 15.

            19 ARENHART, op. cit, p. 25.

            20 Ibid, p. 32.

            21 CHIOVENDA apud Sérgio Cruz ARENHART, op. cit. p. 31.

            22 SILVA, O. A. B. da. Jurisdição e Execução na tradição romano-canônica, p. 179.

            23 ARENHART, op. cit, p. 5.

            24 WAMBIER, L. R. Et al, Curso Avançado de Processo Civil, p. 613.

            25 Ibid, p. 142.

            26 ARENHART, op. cit, p. 11.

            27 Ibid., p. 14.

            28 BARBOSA MOREIRA, J. C. A Antecipação da tutela: algumas questões controvertidas. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, vol. 6, n.º 13, p. 1-7, set/out 2001, p. 03.

            29 ARENHART, op. cit., p. 15.

            30 Ibid., p. 17.

            31 DINAMARCO, op. cit., p. 139.

            32 FERREIRA, W. S. Tutela Antecipada no Âmbito Recursal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 53.

            33 Ibid., p. 54.

            34 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 31.

            35 Ibid., p. 35.

            36 FERREIRA, op. cit., p. 111.

            37 MARINONI apud William Santos FERREIRA, op. cit., p. 112.

            38 MARINONI, A Antecipação da tutela, p. 170.

            39 CRUZ e TUCCI, op. cit., p. 43.

            40 DINAMARCO, op. cit., p. 91-92.

            41 NERY JUNIOR, N. Atualidades sobre o processo civil: a reforma do CPC brasileiro de dezembro de 1994. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 51.

            42 DINAMARCO, op. cit., p. 88.

            43 FERREIRA, op. cit., p. 132.

            44 O objeto imediato do pedido é a providência jurisdicional solicitada, por exemplo, a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos materiais, enquanto o objeto mediato do pedido é o bem da vida que o autor pretende conseguir por meio da condenação, qual seja: a quantia pecuniária fixada para reparar os danos materiais sofridos.

            45 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 45-46.

            46 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 47-48.

            47 Id.

            48 Ibid., p. 32.

            49 MARINONI, A Antecipação da Tutela, p. 34.

            50 FERREIRA, op. cit., p. 133.

            51 CARNEIRO, A. G. Da antecipação de tutela no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 42-43.

            52 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 69-70.

            53 Ibid., p. 50.

            54 Id.

            55 FERREIRA, op. cit., p. 89.

            56 Ibid., p. 90-91.

            57 FERREIRA, op. cit., p. 93.

            58 BEDAQUE, J. dos S.. Considerações sobre a antecipação da tutela jurisdicional. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 231.

            59 THEODORO JUNIOR, H. Tutela Antecipada. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 189.

            60 Ada Pellegrini GRINOVER, Cândido DINAMARCO e Araújo CINTRA dizem que "A sentença constitutiva não necessita de execução diferida, porque provida de executividade própria e imediata (execução, em sentido genérico). (GRINOVER, A. P.; CINTRA, A. C. de A.; DINAMARCO, C. R. Teoria Geral do Processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 316-317).

            61 O princípio dispositivo prega a correspondência da prestação jurisdicional aquilo que é pedido pelo jurisdicionado.

            62 Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.

            Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

            Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica.

            63 WATANABE, K. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (art. 273 e 461 do CPC). Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 33-34.

            64 Assim restou consignado em inúmeras decisões, por exemplo: "Agravo de instrumento – Pedido de tutela antecipada – Pressupostos para a concessão. No exame do pedido de tutela antecipada, o juiz não averiguará vestígios de bom direito e perigo na demora, o que seria próprio em medida cautelar; será, mais do que isso, a constatação quase certa do bom direito, a verossimilhança deste..." (DISTRITO FEDERAL, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n.º 609596DF, 2ª Turma Cível, Rel. Des. Getúlio Moraes Oliveira, j. 18.11.1996, v.u., DJDF de 12.03.1997, Seção 3, p. 3.744); "Percebe-se, pois, que, ao contrário do que ocorre nas medidas cautelares, aqui não basta o fumus boni juris, exigindo-se alguma coisa mais, ou seja, aquela verossimilhança amparada na prova inequívoca, a que se refere o texto processual, aquela probabilidade do direito alegado". (SÃO PAULO, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n.º 775.271-4, 8ª Câmara, Rel. Juiz Franklin Nogueira, j. 01.01.1998, v.u., Bol. AASP 2.077/751-j).

            65 DINAMARCO, op. cit., p. 143.

            66BARBOSA MOREIRA, Antecipação da tutela: algumas questões controvertidas, p. 2.

            67 BARBOSA MOREIRA, Antecipação da tutela: algumas questões controvertidas, p. 3.

            68 "Verossímil", conforme o Vocabulário Jurídico De Plácido e Silva, significa "plausível". A verossimilhança, por conseqüência, "resulta das circunstâncias que apontam certo fato, ou certa coisa, como possível, ou como real, mesmo que não se tenham deles provas diretas". (SILVA, De P. e S. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 482).

            69 MARINONI, A Antecipação de Tutela, p. 212.

            70 Ibid., p. 213.

            71 SILVA, De. P. e S. Vocabulário Jurídico, p. 482.

            72 Essa certeza é meramente processual, vale dizer, a indicada pelas provas produzidas nos autos de processo, como propugna Gerhard Walter e Carlo Furno.

            73 FERREIRA, op. cit., p. 146.

            74 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 213.

            75 BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 172077/RS. Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro. Julgado em. 18.08.1998. Publicado no Diário de Justiça da União de 21.08.1998, p. 238.

            76 DISTRITO FEDERAL, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n.º 1998020005794. Rel. Des. Vasquez Cruxên. Julgado em 01.06.1998. Publicado no Diário de Justiça do Distrito Federal em 12.08.1998, seção 3, p. 65.

            77 Necessário aplicar considerar o já dito na nota 70.

            78 BARBOSA MOREIRA, Antecipação da tutela: algumas questões controvertidas, p. 4

            79 LEAL, R. P. Antecipação de tutela – Fundado receio de dano irreparável na antecipação de tutela no processo civil. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre/RS; v. 55; n. 6; Jul/Ago 2000, p. 8.

            80 FERREIRA, op. cit., p. 168.

            81 ARRUDA ALVIM NETTO, J. M. de. Tutela antecipatória: algumas noções, contrastes e coincidências em relação às medidas cautelares satisfativas. Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 95.

            82 Humberto THEODORO JUNIOR apud LEAL, R. P. Antecipação de tutela – Fundado receio de dano irreparável na antecipação de tutela no processo civil, p. 9.

            83 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 69.

            84 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 218.

            85 WAMBIER, T. A. A. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 546-547.

            86 FERREIRA, op. cit., p. 183.

            87 FERREIRA, op. cit., p. 184.

            88 FERREIRA, op. cit., p. 219.

            89 ARMELIN, op. cit., p. 43.

            90 ZENI, F. C. Deferimento do pedido de tutela antecipatória na sentença. Revista de Processo, São Paulo; v. 24; n. 94; abr/jun 1999, p. 6.

            91 FERREIRA, op. cit., p. 223.

            92 Eis a antiga redação do art. 558 do CPC: "O agravante poderá requerer ao relator, nos casos de prisão de depositário infiel, a adjudicação, remição de bens ou de levantamento de dinheiro sem a prestação de caução idônea, que suspenda a execução da medida até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara.

            Parágrafo único: Igual competência tem o juiz da causa enquanto o agravo não tiver subido.

            93 Trata-se de ementa lavrada no acórdão lavrado em julgamento ao Mandado de Segurança n.º 96.04.31418-1, cujo trâmite se deu perante a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sendo relatado pelo Juiz Teori Albino Zavaski, em 20.06.1996. (ANTUNES, M. T. Mandado de Segurança para concessão do "efeito ativo" do agravo. Revista de Processo, São Paulo; v. 95; p. 244-251; jul/set1999, p. 247.

            94 Com efeito, aduz Luiz Guilherme MARINONI que "Um sistema que não admite a execução de sentença na pendência do recurso causa dano ao autor, ao passo que o sistema que a admite pode causar prejuízo ao réu. Note-se, porém, que não admitir a execução imediata da sentença, é o mesmo que dizer que o autor pode ser prejudicado e que o réu sequer pode ser exposto a riscos". (A Antecipação da Tutela, p. 198).

            95 O juízo de "oportunidade" e "conveniência", entendido como próprio do administrador público não poderia ser elocubrado pelo judiciário, aí a razão pela qual se questiona a impetração de mandado de segurança em face de ato ou decisão discricionários.

            96 FERREIRA, op. cit., p. 314.

            97 THEODORO JUNIOR apud Tereza Arruda Alvim WAMBIER, Os agravos no CPC brasileiro, p. 245.

            98 WAMBIER, T. A. A. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória, p. 539.

            99 LIMA apud Teresa Arruda Alvim WAMBIER, Os agravos no CPC brasileiro. 3 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 294.

            100 NORONHA apud Tereza Arruda Alvim WAMBIER, Os agravos no CPC brasileiro, p. 239-241.

            101 WATANABE, K. Tutela Antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (arts. 273 e 461 do CPC). Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 34.

            102 CARNEIRO, A. G. Da antecipação de tutela no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 16-17.

            103 TALAMINI, E. Recorribilidade das decisões sobre tutela de urgência. In: NERY JÚNIOR, N.; WAMBIER, T. A. A. (Coord). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outras formas de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 272.

            104 Ibid., p. 274.

            105 A utilização do Mandado de Segurança com via autônoma de impugnação (sucedâneo recursal), hábil a suprir eventuais lacunas da lei, no caso em tela, eventuais lacunas ou proibições quanto à recorribilidade das decisões, foi severamente criticada pela doutrina pátria. Isto porque, como bem afirma William dos Santos FERREIRA, "As ações autônomas não só são mais tumultuárias em relação à marcha processual, como também geram um trabalho muito maior do Poder Judiciário. (op. cit., p. 218).

            106 WAMBIER, T. A. A. Os Agravos no CPC brasileiro, p. 264

            107 Ibid., p. 275.

            108 TALAMINI, op. cit., p. 284.

            109 Id.

            110 ARMELIN, op. cit., p. 307.

            111 ARMELIN, op. cit., p. 431-454.

            112 WAMBIER, T. A. A. Os Agravos no CPC brasileiro, p. 267-268..

            113 FERREIRA, op. cit., p. 259.

            114 FERREIRA, op. cit., p. 262.

            115 CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 143.

            116 BRASÍLIA, Supremo Tribunal Federal. 2.ª T. Recurso em Mandado de Segurança n.º 8.516-RS, Rel. Min. Adhemar Maciel, j. 4.8.97, negaram provimento, v.u., DJU 8.9.97, p. 42.435.

            117 Ibid., p. 310.

            118 Tribunal Regional Federal 2ª Região. AGA. 2001.02.01.009990-6 – RJ – 3ª T. – Rel. Juiz Francisco Pizzolante – DJU 21.08.2001.

            119 MATO GROSSO, Tribunal de Justiça. RAI 14.247 – Tangará da Serra – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Orlando de Almeida Perri – J. 07.11.2001.

            120 SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n.º 00.004992-1 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. João Martins – J. 23.11.2000.

            121 TALAMINI, op. cit., p. 291.

            122 MARINONI, L. G. Tutela inibitória. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 162-163.

            123 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 221.

            124 SILVA, O. A. B. da. Curso de Processo Civil. 3. ed., v. 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 124.

            125 BEDAQUE, J. R. dos S. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). São Paulo: Malheiros, 2000, p. 388.

            126 CRUZ E TUCCI, Lineamentos da nova reforma do CPC, p. 105-106.

            127 BEDAQUE, Considerações sobre a antecipação da tutela jurisdicional. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela, p. 234.

            128 MARINONI, A antecipação da tutela, p. 221.

            129 FERREIRA, op. cit., p. 303.

            130 RT 755/257.

            131 FERREIRA, op. cit., p. 304.

            132 ASSIS, A. de. Antecipação de tutela. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 29.

            133 MACHADO apud William Santos FERREIRA, op. cit., p. 301.

            134 ARMELIN, op. cit., p. 452.

            135 TALAMINI, op. cit., p. 292.

            136 NERY JUNIOR, N. Princípios fundamentais – Teoria geral dos recursos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 90.

            137 TALAMINI, op. cit., p. 292.

            138 TALAMINI, op. cit., p. 295.

            139 Ibid., p. 107.

            140 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Agravo de Instrumento n.º 98.04.01.011256-2/PR. 4ª Turma. Relatora Juíza Marga Barth Tessler – DJU 17.06.1998.

            141 CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 106.

            142 FERREIRA, op. cit., p. 316.

            143 BEDAQUE, op. cit., p. 234.

            144 Id.

            145 Ovídio Baptista da SILVA apud William Santos FERREIRA, op. cit., p. 313.

            146 Ibid., p. 317.

            147 MARINONI apud William Santos FERREIRA, op. cit., p. 314.

            148 Ibid., p. 319.

            Essa distinção explica-se pela seguinte passagem da obra de William Santos Ferreira:

            Como já ressaltamos, quando tratamos do efeito devolutivo dos recursos, duas situações são muito distintas:a tutela antecipada tal qual literalmente prevista no artigo 273 do Código de Processo Civil e a tutela recursal antecipada, para fim eminentemente diferenciador, denominaremos de antecipação da tutela recursal.

            Para melhor ilustrar esta diferença, exemplifica-se: no caso de um pedido de tutela antecipada indeferida na primeira instância, o autor da ação interpõe agravo de instrumento e o mérito deste recurso justamente versará sobre a admissibilidade ou não deste pedido de tutela antecipada, dando ou não o órgão ad quem provimento ao recurso (se positivo o juízo de admissibilidade). Até aqui estamos falando da tutela antecipada preconizada no artigo 273 e da devolutividade do recurso. Caso seja dado provimento ao recurso, o que haverá é o deferimento da tutela antecipada não admitida na primeira instância, do que decorre o que

            Nos casos de urgência, de que trataremos com mais vagar adiante, será imprestável ao recorrente a postulação do efeito suspensivo previsto no artigo 558 do Código de Processo Civil, sendo imperiosa a urgente apreciação do pedido de concessão da tutela antecipada: como não se poderá aguardar o julgamento do mérito do recurso, dever-se-á, por interpretação teleológica do artigo 558 e sistemática, admitir que o relator, se houver pedido expresso do agravante, aprecie e eventualmente defira, provisória e antecipadamente, o que só pelo órgão colegiado no futuro provavelmente será deferido. Com isto, temos a antecipação da tutela recursal, pois o órgão colegiado ainda não julgou o recurso, e, concomitantemente e em decorrência disto, há o deferimento da tutela antecipada, objeto da impugnação recursal. (op. podemos denominar de tutela recursal. cit., p. 239).

            149 FERREIRA, op. cit., p. 320.

            150 Ibid., p. 321.

            151 Ibid., p. 328.

            152 RT 700/173-175.

            153 RT 732/118.

            154 FERREIRA, op. cit., p. 333.

            155 FERREIRA, op. cit., p. 330.

            156 BARBOSA MOREIRA, A antecipação da tutela jurisdicional na reforma do Código de Processo Civil, p. 207.

            157 ZAVASKI, op. cit., p. 134-135.

            158 FERREIRA, op. cit., p. 338.

            159 CARNEIRO, A. G. Da antecipação de tutela no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 67-68.

            160 BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça. MC 1325/SP. Relator Min. Nilson Naves. Dj. 16.11.1998, p. 85.


Autor

  • Adriana Estigara

    Adriana Estigara

    Doutora pela PUC/SP Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada e Consultora na área do Direito Tributário, e Direito do Terceiro Setor, integrante do Lewis & Associados. Professora junto à Universidade Positivo nas graduação e na pós graduação junto às disciplinas de Direito Tributário.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTIGARA, Adriana. Da tutela antecipada em sede recursal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 786, 28 ago. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7202. Acesso em: 26 abr. 2024.