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Terras públicas

Terras públicas

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Síntese: O texto aborda as terras públicas e o regime jurídico da propriedade pública, bem como as formas de exercício da propriedade e da posse de imóveis pelo Estado.

Sumário: 1-Introdução. 2- Considerações acerca do Direito de Propriedade. 3- O Domínio Público. 4- Os Bens públicos. 5- Classificação dos Bens Públicos. 6- do Regime Jurídico dos Bens Públicos.5.1- Bens de Uso comum. 6.2- Bens de uso especial. 5.3- Bens Dominicias. 6.1- Imprescritibilidade. 6.2- Impenhrorabilidade. 6.3- Inalienabilidade. 6.4- Não Oneração. 7-Afetação e Desafetação. 8- Aplicação dos Institutos Civis.9- Permissão, Autorização, Cessão e Concessão. 10- Da formação do Patrimônio Público. 11- Da Terras Públicas in espécie. 11.1- Terrenos de Marinha. 11.2- Terrenos Reservados. 11. 3- Ilhas. 11.4- Terras Indígenas. 11.5- Terras Devolutas. 11.6- faixa de Fronteira. 12- Conclusão. 13- Bibliografia.


1- Introdução

            A moderna doutrina elenca como elementos componentes do Estado um povo, um governo soberano e um território. A noção de um espaço físico onde se desenvolvem as atividades do Estado é logicamente necessária [01]. Por outro lado, o Estado Moderno dirige-se a consecução do bem comum. Para tanto, tem que alocar uma série de recursos humanos e materiais, sendo-lhe imanente, nesta conjuntura, o exercício da propriedade sobre bens destinados ao atingimento de seus objetivos.

            A noção de propriedade, de construção, sobretudo, privada, não repele exerça o Estado o direito de propriedade, que toma, todavia, as feições peculiares concernentes ao exercício do poder público, adaptando-se aos princípios retores que gerem a ação da Administração.

            Dentre as diversas espécies de bens, ganham importância ímpar no mundo atual os imóveis, que, ressalte-se, sempre alçaram, haja vista suas características, proeminência dentre os bens passíveis de apropriação. Daí surge a noção de terras públicas como imóveis sobre os quais o Estado exerce domínio. Este o nosso tema: as terras públicas e sua configuração jurídica.

            Antes, contudo, lancemos algumas premissas.


2- Considerações acerca do Direito de Propriedade

            A concepção que hoje temos da propriedade percorreu um caminho tão longo e turbulento como o percorreu a própria humanidade e suas instituições. Não podia ser diferente, já que a propriedade é um fenômeno essencialmente humano e toma contornos conforme as circunstâncias sociais, econômicas, políticas e, sobretudo, jurídicas. Por incrível que possa parecer, essa noção de propriedade que nos é tão cara, tão natural, como uma potestade excludente sobre um determinado bem enquanto fenômeno primordialmente individual, não é originária. A propriedade é, no seu início, um fenômeno coletivo, reflexo da estruturação familiar da sociedade. Em noção rudimentar, repele o indivíduo e prestigia a gens, o grupo como titular da propriedade, restando a cada qual senão a disponibilidade de uns poucos objetos pessoais [02].

            O longo processo evolutivo do direito de propriedade reverteu o quadro e espelha a afirmação do indivíduo enquanto tal. Chegou a propriedade na Roma Antiga ao reverso, ou seja, fórmula maior e estampilha da potestade individual. Caindo em decadência o Império Romano no século V, vai florescer novamente seu direito por volta do século XII, com a Glosa fusionando-o ao Direito comum do medievo. Mas com o Iluminismo, retomam-se os valores do Direito Romano, penetrando naquele que é, sem dúvida, um dos grandes monumentos jurídicos da história: o Code de Napoleòn.

            Inaugurador do período das grandes codificações do século XIX, a influência do Código Napoleônico se fez sentir em todo o mundo ocidental, inspirado no modelo romano–canônico. Ocorre que, dado o momento histórico em que surgiu, o Diploma Civil Francês [03] refletiu uma concepção absoluta de propriedade que, com o transcorrer deste século, começou a ceder, ante a pressão de valores sociais que se fizeram conhecer nos ordenamentos jurídicos.

            Com efeito, restou dos ruinosos movimentos socialistas que se iniciaram em meados do século passado, desembocaram a Revolução Russa e tiveram seu previsível fim recentemente, o mérito de terem apontado algumas questões cruciais do modelo Liberal Iluminista de Estado, na medida em que fizeram ver que não basta a garantia formal da igualdade, sendo necessária uma ação efetiva do Estado na redução das desigualdades e na produção de condições concretas capazes de garantir o desenvolvimento e a dignidade de todo o conjunto da sociedade.

            Surgiu, então, a concepção do Estado Democrático Social, agasalhando um modelo político–jurídico permeável aos valores sociais [04] que se irradiam por todo o ordenamento jurídico como princípios informativos e mesmo objetivos do Estado.

            Durante este século vimos a expansão da influência desses valores encampados primeiramente na Constituição Mexicana (1917) e na Constituição da Weimar (Alemanha, 1919). A Carta Política de 1988 seguiu esse modelo e deixou-se permear por valores sociais de um tal modo que se lhe pode dizer uma Constituição Social.. No que diz respeito à propriedade, especial atenção demanda o art. 5º, inc XXIII, que acolheu a função social da propriedade, que já fora princípio geral no Código Civil italiano de 1942.

            Não que antes não se houvesse de respeitar o limite da utilização em cotejo com o direito alheio [05], mas como diz Caio Mario da Silva Pereira: "Mais do que antes, o direito moderno, que concebe a noção jurídica da propriedade como essencialmente relativa, assegura ao dominus o exercício dos seus direitos em subordinação aos interesses coletivos [06]".

            Se outrora a propriedade direito absoluto já se limitava, tanto mais agora quando se vislumbra um conteúdo social no seu uso. Assim sendo, a concepção moderna, longe de ser um exemplo de potestade absoluta, é um direito limitado no interesse da coletividade, ou seja, é relativa. Assim, o magistério de Carvalho Santos já apontava [07].


3- O Domínio Público

            Conforme pudemos verificar, a concepção do direito de propriedade passa por uma reformulação na qual se visa atribuir-lhe um conteúdo axiológico e publicista, em certa monta derrogatório da disciplina individualista que lhe imprimiu o período das grandes codificações do século XIX. No entanto, se nos interessa uma espécie do gênero direito de propriedade, qual seja, aquele exercida pelo Estado. Mas a referência a atual compleição do direito de propriedade não é inútil, porque ele se irradia igualmente ao exercício do direito de propriedade sobre os bens pelo Estado, embora seja certo que neste exercício já esteja presente ontologicamente um conteúdo publicístico in re ipsa, porque a finalidade maior do Estado Contemporâneo, de feição social democrática, é o atingimento de bem comum como escopo magno.

            Conforme nos lembra Hely Lopes Meirelles [08] o conceito de domínio público não está indene a controvérsias, não carreando unanimidade na doutrina. Segundo o administrativista, o conceito tem dois desdobramentos, um político, referente ao domínio iminente, e um jurídico, referente ao domínio patrimonial. Passa a definir o domínio iminente como "o poder político pelo qual o Estado submete à sua vontade todas as coisas de seu território" [09], mas frisa que se trata de exercício da soberania interna e não de um direito de propriedade, de tal sorte que alcança não só os bens pertencentes às entidades públicas, mas também os bens privados [10].

            Já o domínio patrimonial é definido como "direito de propriedade, mas de direito de propriedade pública, sujeito a um regime administrativo especial" [11].Tomada esta última definição, tem-se por oportuna a advertência de Cretella Júnior segundo o qual "a expressão domínio público apresenta extensão menor do que a expressão bem público. Há bens públicos que ultrapassam a área do domínio público, enquadrando-se em campo regido por princípios do direito comum" [12]. Também Maria Sylvia Zanella Di Petro refere-se à distinção vigente no direito italiano, sendo "demaio" (domínio público) próprio dos bens de uso comum do povo, e bem patrimoniais, que se subdividem em bens de patrimônio disponível e indisponível. [13]

            Como se pode observar, ao domínio público se contrapõe o domínio privado [14]. O domínio público implica uma disciplina exorbitante e derrogatória do direito privado dando ensanchas à constituição de um regime jurídico de direito público que mais adiante será explicitado


4- Os Bens Públicos.

            A formação do patrimônio público é extremamente heterogênea. Isto decorre da extrema variedade das demandas operacionais da Administração, que a cada dia aumentam, mormente quando temos um modelo de Estado Social. Também verificamos uma dificuldade de conceituação de bens públicos, haja vista uma praxe de utilização ancestral e sinonímica que por vezes baralha os conceitos. [15]

            Mas nem por isso a doutrina refogue a uma definição. Hely Lopes Meirelles afirma que "bens públicos, em sentido amplo, são todas as coisas, corpóreas ou incorpóreas, imóveis ou móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas, fundacionais e paraestatais" [16]. Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que "bens públicos são todos os bens que pertencem às pessoas jurídicas de direito público, isto é, União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações de direito público (estas últimas, aliás, não passam de autarquias designadas pela base estrutural que possuem), bem como os que, embora não pertencentes a tais, estejam afetados à prestação de um serviço público. O conjunto de tais bens forma o ´´domínio público´´, que inclui tanto bens imóveis, como móveis" [17]. José Cretella Júior define os bens públicos como "coisas materiais ou imateriais, assim como prestações pertencentes às pessoas jurídicas públicas, que objetivam fins públicos e que se submetem a regime de direito público, derrogatório e exorbitante do direito comum" [18].

            Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, quatro noções atrelam-se ao conceito de bens públicos:"1- conjunto de bens móveis ou imóveis; 2- a idéia de pertinência à Administração (Diríamos melhor ´´Estado´´), que afasta a tese de que o poder público não exerce sobre os bens públicos o direito de propriedade. 3- A afetação ao uso coletivo ou ao uso da Administração, que representa um traço distintivo entre bens dessa categoria e os dominicais; aliás, esse traço revela a maior abrangência do vocábulo ´´bem´´ no direito público, em relação ao direito privado; neste, interessam as coisas suscetíveis de avaliação econômica e que possam ser objeto de posse ou propriedade exclusiva pelo homem; no direito administrativo, os bens têm sentido mais amplo, porque abrangem não apenas a coisas que podem ser objeto de posse e propriedade exclusivas, mas também aquelas que são destinadas ao uso coletivo ou ao uso do próprio poder público; 4- regime jurídico de direito público, derrogatório e exorbitante do direito comum, não se aplicando a essas modalidades de bens os institutos regidos pelo direito privado"

            Razão, contudo, assiste a Pontes de Miranda ao afirmar que, antes de tudo, o sistema jurídico em análise é o fator determinante para a qualificação do que sejam bens públicos. Nesta ordem de idéias, pertinente se mostra a invocação dos dispositivos legais do jus positivum referentes à matéria em apreço. Em primeiro plano surge o texto constitucional, mais especificamente os artigos 20, I a XI e §§ 1º e 2º, 26, I a IV e ADCT, art. 16, § 3º):

            "Art. 20. São bens da União:

            I- os que atualmente lhe pertencem os que lhe vierem a ser atribuídos;

            II- as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e á preservação ambiental, definidas em lei;

            III- os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;

            IV- as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países, as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, II;

            V- os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;

            VI- o mar territorial;

            VII- os terrenos de marinha e seus acrescidos;

            VIII- os potenciais de energia hidráulica;

            IX- os recursos minerais, inclusive os do subsolo;

            X- as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;

            XI- as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios;

            § 1º- É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais do respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.

            § 2º- A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para a defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei.".

            "Art. 26-Incluem-se entre os bens dos Estados:

            I- as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósitos ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União;

            II- as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros;

            III- as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; IV- as terra devolutas não compreendidas entre as da União.

            ADCT

            "Art. 16- Até que se efetive o disposto no artigo 32, § 2, da Constituição, caberá ao Presidente da República, com a aprovação do Senado Federal, indicar o Governador e o Vice Governador do Distrito Federal:

            § 3º- Incluem-se entre os bens do Distrito Federal aqueles que lhe vierem a ser atribuídos pela União na forma da lei".

            No Código Civil revogado, a disciplina dos bens públicos está nos artigos 65 usque 68 No novo Código Civil, a matéria consta dos artigos 98 a 103.

            Podemos concluir que há em relação aos bens públicos um verdadeiro exercício do direito de propriedade por parte do Estado, em qualquer de suas esferas administrativas, ou seja, União, Estados, Municípios e suas autarquias e fundações submetidas ao regime jurídico de direito público. A noção de quais sejam os bens alçados a esta categoria carece de análise em cada ordenamento jurídico, não se podendo caracterizar, a priori, prescindindo-se da legislação, um bem como público ou como privado. No entanto, uma vez procedida a sua qualificação como bem público é certa sua submissão a um regime próprio, que sem desnaturar o exercício de um direito de propriedade, imprime uma marca diferenciadora caracterizada pela publicização inerente à "res públicae", caracterizando o regime jurídico dos bens públicos.


5- Classificação dos Bens Públicos.

            A classificação dos bens públicos segue a linha traçada pelo Código Civil. Como visto nos dispositivos retrocitados, não se pode vislumbrar grande dificuldade na sua classificação, uma vez que as disposições de lei foram suficientemente claras, não obstante a objetividade e singeleza com que referiram ao tema. Valhamo-nos das vozes da doutrina na caracterização das três categorias de bens.

            5.1- Bens de uso comum

            Dentro da proposta de acrescermos às definições do Código Civil as considerações da doutrina, façamos a invocação do mestres. Na definição de Di Pietro, bens de uso comum são aqueles que "por determinação legal ou por sua própria natureza, podem ser utilizados por todos em igualdade de condições, sem necessidade de consentimento individualizado por parte da Administração" [19]. Cretella Júnior aduz que "bem de uso é todo imóvel ou móvel sobre o qual o povo, o público, anonimamente, coletivamente, exerce direitos de uso e gozo, como por exemplo, o exercido sobre as estradas, os rios, as costas do mar" [20]. Hely Lopoes Meirelles os define afirmando que bens de uso comum são aqueles que "como exemplifica a própria lei, são os mares, praias, rios, estradas, ruas e praças. Enfim, todos os locais abertos à utilização pública adquirem este caráter de comunidade, de uso coletivo, de fruição própria do povo". [21]. Como se pode observar, a marcante característica dos bens de uso comum reside na possibilidade de sua utilização por quisquis de populo, independentemente de autorização especial, estando sua fruição ao alcance de todos desde que respeitado o direito dos demais.

            5.2- Bens de uso especial

            Segundo o mesmo Hely Lopes Meirelles, estes são "os que se destinam especialmente à execução dos serviços públicos e, por isso mesmo, são considerados instrumentos desses serviços; não integram propriamente a Administração, mas constituem o aparelhemento administrativo, tais como os edifícios das repartições públicas, os terrenos aplicados aos serviços públicos, os veículos da Administração, os matadouros, os mercados e outras serventias que o Estado põe à disposição do público, mas com destinação especial. Tais bens, como têm uma finalidade pública permanente, são também chamados de bens patrimoniais" [22].

            No escólio de Cretella Júnior, bens de uso especial "são os imóveis, edifícios e terrenos aplicados a serviço de repartições ou de estabelecimento público, bem como os imóveis e material, indispensáveis para o funcionamento de tais serviços, tais como os veículos do Estado, matadouros, mercados". Segundo ele, "os bens de que se utiliza, instrumentalmente, a Administração, excluindo os administrados, são porções do território, construções ou terrenos, assim como o aparelhamento necessário para que o serviço público se concretize, o mobiliário, estático ou dinâmico, situado nas porções de terreno ou nos edifícios; não integram, por excelência, a Administração, mas servem, instrumentalmente, para a consecução dos serviços públicos, funcionando como causa material, meio para que o Estado atinja seus fins. Se há uso especial ou privativo, o usuário não é o particular, as a pessoa jurídica pública (União, Estados e Municípios) à qual se acha afetado o bem" [23]. Para Celso Antônio Bandeira de Mello são "os afetados a um serviço os estabelecimento público, como as repartições públicas, isto é, locais onde se realiza a atividade pública ou onde está á disposição dos administrados um serviço, como teatros, universidades, museus e outros abertos à visitação pública" [24]. Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro "são todas as coisas, móveis e imóveis, corpóreas ou incorpóreas, utilizadas pela Administração Pública para a realização de sua s atividades e consecução de seus fins" [25].

            Como se vê, ditos bens não perdem o caráter de públicos, porque são de propriedade do Estado, no entanto, sua utilização não é conferida a qualquer do povo, pois estão afetos a uma destinação específica relacionada a um serviço ou atividade de cunho público.

            Por fim cabe ressaltar que a expressão bens de uso especial não grassa acolhida unânime entre a doutrina, preferindo alguns a denominação bens do patrimônio indisponível [26].

            5.3- Bens Dominicais

            Conforme a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, estes são "os próprios do Estado como objeto de direito real, não aplicados nem ao uso comum, nem ao uso especial, tais os terrenos ou terras em geral, sobre os quais tem senhoria, à moda de qualquer proprietário, ou que, do mesmo modo, lhe assistam em conta de direito pessoal" [27].Hely Lopes Meirelles preconiza que "são aqueles que, embora integrando o dominio público como os demais, deles diferem pela possibilidade sempre presente de serem utilizados em qualquer fim ou, mesmo, alienados pela Administração, se assim o desejar. Daí por que recebem também a denominação de bens patrimoniais disponíveis ou de bens do patrimônio fiscal. Tais bens integram o patrimônio do Estado como objeto de direito pessoal ou real, isto é, sobre eles a Administração exerce ´´poderes de propriedade, segundo os preceitos de direitos constitucional e administrativo´´, na autorizada expressão de Clóvis Beviláqua" [28]. Maria Sylvia Zanella Di Pietro os define afirmando que "os bens do domínio privado do Estado, chamados de bens dominicais pelo Código Civil, e bens do patrimônio disponível pelo Código de Contabilidade Pública, são definidos legalmente como ´´os que constituem o patrimônio da União, dos Estados ou Municípios, como objeto de direito pessoal ou real de cada uma dessas entidades" [29].

            Para Cretella Júnior "o vocábulo dominical é legítimo e bem formado atributo, designando, em nossa lingua, o tipo de coisa ou bem que pertence ao dominus, senhor ou proprietário. O bem dominical é igualmente conhecido pelos nomes de bem disponível, bem do patrimônio disponível, bem patrimonial disponível, bem do patrimônio fiscal, bem patrimonial do estado e bem do domínio privado do Estado. As expressões ´´bem dominical´´, bem patrimonial do Estado´´ ou ´´bem do patrimônio disponível ´´ servem para designar a parcela de bens pertencente ao Estado, em sua qualidade de proprietário. Ao lado dos bens do patrimônio indispensável, os bens do patrimônio disponível ou dominicais constituem os bens do domínio privado do Estado; os primeiros, afetos aos serviços públicos, não se alienam, enquanto durar a afetação, os outros, não afetados aos serviços públicos, são suscetíveis de serem alienados, mediante a forma que a lei especial autorizar" [30].

            Como se pode ver, no caso dos bens dominicais a relação jurídica existente é semelhante a de direito privado, pois o Estado dispõe do bem por direito pessoal ou real da mesma forma que o particular, o que, contudo, não implica a derrogação dos princípios a que está adstrita a Administração Pública no trato da res públicae como em todas as suas atividades. Mas por certo, a rigidez a que se submete a sua utilização não é tão extremada quanto as demais categorias.


6- Do regime Jurídico dos Bens Públicos

            Os bens públicos sujeitam-se a uma disciplina especial, haja vista a titularidade da propriedade e sua destinação. Esta disciplina especial constitui o denominado "regime jurídico dos bens públicos" que passaremos a explicitar. Desde já podemos adiantar que nas atividades relacionadas aos bens públicos sobressai a mesma limitação a que está submetida a Administração Pública no que concerne aos fins a que se destina, ou mais especificamente ao escopo magno do bem comum.

            Desta situação deflui a aplicação imediata dos princípios do Direito Administrativo, mais de perto os princípios da legalidade, publicidade, finalidade e indisponibilidade. Trataremos deles mais adiante. Por ora tratemos dos princípios específicos da disciplina dos bens públicos que são a imprescritibilidade, a impenhorabilidade, inalienabilidade e a impossibilidade de oneração.

            6.1- Imprescritibilidade:

            Os bens públicos constituem em substância res extracomercium [31]. Contra eles não pode correr prescrição aquisitiva. Não obstante, grassou longa polêmica acerca da possibilidade de usucapião sobre terras públicas. Após a vigência do Código Civil revogado, e seguindo o assento da corrente predominante na jurispudência, vieram o Decreto 22.785 de 31-5-1933, o Decreto- lei n 710, de 17-09-1938, e o Decreto-lei 9.760, de 5-09-1946, proibindo o usucapião sobre imóveis públicos, além da súmula nº 340 do Supremo Tribunal Federal [32]

            As Constituições de 1937 e 1946 permitiam a usucapião através do chamado usucapião pro labore [33]. A Constituição de 1967 permitiu se viabilizasse, via legislação infraconstitucional, o estabelecimento de condições para legitimação de posse e de preferência para aquisição, o que sobreveio pela lei 6.383/76 [34]. Após, com o advento da Lei 6.969, de 10/12/1981, voltou-se a contemplar a possibilidade de um usucapião pro labore. A nova Constituição proíbe peremptoriamente o usucapião nos artigos 183, § 3º, e 191, parágrafo único [35]. Igualmente o novo Código Civil é peremptório em vedar o usucapião de bens públicos (artigo 102).

            6.2- Impenhorabilidade

            A penhora constitui procedimento prévio à alienação. Sendo inalienáveis, a priori, os bens públicos não se sujeitam à penhora. Da mesma forma, o artigo 100 da Constituição de 1988 prevê a disciplina de precatórios para o pagamento das obrigações por parte da Administração Pública, afastando, por conseguinte, a possibilidade de hasta pública sobre bens do Estado [36].

            6.3- Inalienabilidade

            Os bens de uso comum e especial são inalienáveis a teor do artigo 67 do CC [37] revogado e 100 do novo CC. Mas como ressalva Celso Antônio Bandeira de Mello, a própria existência do princípio da legalidade já seria um óbice considerável a que se pudesse alvitrar a alienabilidade os bens públicos. A impenhorabilidade, à luz da inalienabilidade, já se torna superfetação porque o que é inalienável é, por natureza, impenhorável.

            6.4- Não oneração

            São indenes, também, os bens públicos a onerações, não se podendo sobre eles constituir penhor, hipoteca ou anticrese. Esta é a tese defendida por Meirelles, a nosso ver com acerto, fundamentado na sua impenhorabilidade e inalienabilidade [38]. Realmente, ditas onerações perderiam sentido frente a impossibilidade de alienação do bem, tornando-se vazias de conteúdo.


7- Afetação e Desafetação

            A inalienabilidade os bens não é, todavia, absoluta, posto que podem ser afetados ou desafetados, mudando de categoria e tornando-se alienáveis [39]. Uma vez desafetados, os bens públicos de uso comum ou especial passam a ser bens dominicais e passíveis de alienação. Mas os princípios da legalidade e da indisponibilidade da coisa pública, somados ao princípios da publicidade, da igualdade dos administrados frente à Administração e da moralidade, impõe limitações concernentes à forma pela qual se processam as alienações de bens públicos.

            O princípio da legalidade, expressamente contemplado na Constituição Federal, artigo 37, limita atuação da Administração à rigorosa observância da legalidade estrita de modo que à Administração não é dado fazer o que a lei permite, mas sim o que ela determina e tão somente isto. Na definição da doutrina, o princípio toma matizes diferenciados mas convergentes. Hely Lopes Meirelles ao tratar da legalidade, aduz: " A legalidade, como princípio da administração(CF art 37, caput), significa que o administrador público esta, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e à exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar sob pena de praticar ato inválido e expor-se às responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. A eficácia de toda a atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei. Na Administração pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa ´´ pode fazer assim´´; para o administrador público significa ´´deve fazer assim´´(...).Tais poderes, conferidos à Administração Pública para serem utilizados em benefício da coletividade, não podem ser renunciados ou descumpridos pelo administrador sem ofensa ao bem comum, que é o supremo e único objetivo de toda a ação administrativa" [40].

            Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que: Este é o princípio capital para a configuração do regime jurídico-administrativo. Justifica-se, pois, que seja tratado - como o será- com alguma extensão e detença. Com efeito, enquanto o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos, o da legalidade é especificamente do Estado de Direito, é justamente aquele que o qualifica e lhe dá a identidade própria. Por isso mesmo é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, já eu o Direito Administrativo( pelo menos aquilo que como tal se concebe) nasce com o Estado de Direito: é uma conseqüência dele. É o fruto da submissão do estado á lei. É, em suma: a consagração da idéia de que a Administração pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei. Para avaliar corretamente o princípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o fato de que ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto -o administrativo- a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo- que é o colégio representativo de todas as tendências(inclusive minoritária) do corpo social- garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral. O princípio da legalidade contrapõe-se portanto, e visceralmente, a quaisquer tendências de exacerbação personalista dos governantes. Opõe-se a todas as formas de poder autoritário, desde o absolutista, contra o qual irrompeu, até as manifestações caudilhescas ou messiânicas típicas dos países subdesenvolvido. O princípio da legalidade é o antídoto natural do poder monocrático ou oligárquico, pois tem como raiz a idéia de soberania popular, de exaltação a cidadania. Nesta última consagra a radical subversão do anterior esquema de poder assentado na relação soberano-súdito.(....). Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração ás leis. Esta deve tão somente obedecê-las, cumpri-las e pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes. Obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativ, pois esta é a posição que lhes compete no Direito brasileiro" [41]. José Cretella Júnior opina que: " Aplicado à Administração o princípio da legalidade expressa a regra segundo a qual A administração neste ponto, não está a regime diferente a que se subordinam os particulares.(...). É o grande princípio que domina a atividade do Estado- o da submissão à legalidade lato sensu- sentido em que é tomado hoje, na linha tradicional da antiga formulação do Estado legal ou Estado de Direito." [42].

            No escólio de Diogenes Gasparini: "Qualquer ação estatal, sem o correspondente calço legal ou que exceda ao âmbito demarcado pela lei, é anti-jurídica e expõe à anulação. Seu campo de ação, como se vê, é bem menor que o particular. De fato, este pode fazer o que a lei autoriza e tudo o que alei não proíbe; aquele só pode fazer o que a lei autoriza e, ainda assim, quando e como autoriza. Vale dizer, se a lei nada dispuser, não pode a Administração Pública agir, salvo situações excepcionais...A esse princípio também se submete o agente público. Com efeito, o agente da administração pública está preso à lei e qualquer desvio de suas imposições pode nulificar o ato e tornar seu autor responsável, conforme o caso, disciplinar, cível e criminalmente" [43].

            Maria Sylvia Zanella Di Pietro traz à colação a seguinte definição: "Segundo o princípio da legalidade, a administração só pode fazer o que a lei permite....Em decorrência disso, a Administração não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto ela depende de lei" [44]

            Também a moralidade pública constitui um pressuposto de qualquer ato jurídico, e ela só estará presente mediante a observância de um a série de circunstâncias denotadoras de licitude e honestidade, entroncando-se com princípios da moral comum e da ética [45]. O princípio da publicidade tem um entroncamento com outros princípios pois é a publicidade que permite aferir-se a observância dos outros princípios, como a igualdade e a moralidade administrativas. Meirelles nos lembra que a publicidade não é elemento formativo do ato, mas sim requisito de eficácia e moralidade.

            Segundo o administrativista, "em princípio, todo ato administrativo deve ser publicado, por que é a Administração que o realiza, só se admitindo sigilo nos caos de segurança nacional, investigações policiais ou interesses superiores da administração a ser preservado em processo previamente declarado sigiloso nos termos de decreto federal 79.099 de 6.1.77" [46].Na feliz observação de Bandeira de Mello "consagra-se nisto o dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos. Não pode haver em um Estado Democrático, no qual o poder reside no povo art. 1, § único, da Constituição), ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida" [47]

            A igualdade dos administrados perante a administração é outro princípio presente, corolário, aliás, do princípio da isonomia, consagrado no artigo 5º caput, e inciso 1, da CF/88, e se traduz no princípio da impessoalidade. Não pode a Administração, no seu atuar, estabelecer discriminações ilegais e indevidas a favor de quem quer que seja, e isto vale para todos os seus atos. Ressalta Di Pietro que o principio pode tomar duas conotações. Afirma a autora que "no primeiro sentido, o princípio estaria relacionado com a finalidade pública que deve nortear toda atividade administrativa. Significa que a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que tem de nortear o seu comportamento" [48].

            A aplicação enfeixada destes princípios implica a submissão das alienações de bens públicos a uma disciplina legal rígida, carecendo a alienação de bens imóveis de autorização legislativa e obediência de qualquer alienação aos ditames da oferta pública. A afetação, ao revés implica tornar inalienável o bem na medida em que ingressa em categoria de bens não sujeitos a alienação [49]. Entram em voga os artigos 17, 19, 22 e 23 da lei 8.666/93 [50] no caso de alienação.


8- Aplicação dos Institutos Civis.

            Alguns institutos do direito civil aplicam-se, mutatis mutandis, aos bens públicos. Tal aplicação fica limitada aos bens dominicais, haja vista o fato de que os bens de uso comum ou especial só podem ser utilizados privadamente através de autorização, concessão e permissão, objeto do tópico seguinte. São aplicáveis os institutos da locação, do aforamento ou anfiteuse, do arrendamento, do comodato e o direito real de uso. A locação está prevista no decreto nº 9.760/46, apresentando normas derrogatórias do direito civil que o especializam. Os contratos destinar-se-ão a locação de bens para a) residência de autoridades federais ou de outros servidores da União, no interesse do serviço público; b) para residência de servidor da União, em caráter voluntário; c) por quaisquer interessados [51].

            Mesmo ante a expressa previsão legal, o instituto sofre mordaz crítica de Hely Lopes Meirelles para quem "a locação é contrato típico de direito Privado, onde as partes devem manter equivalência de situações nos direitos e obrigações que reciprocamente assumirem. Por isso se conceitua a locação como contrato bilateral perfeito, oneroso, comutativo e concensual. Ora, no Direito Administrativo jamais se poderá traspassar o uso e gozo do bem público com as características da locação civil, porque implicaria renúncia de poderes irrenunciáveis da Administração, para que ela viesse a se colocar em igualdade com o particular, como é da essência desse contrato no campo do Direito Privado. O só fato de uma lei administrativa, primando pela falta de técnica, referir-se erroneamente a um instituto civil não é o bastante para implantá-lo em nosso direito público" [52].

            A concessão de direito real de uso está prevista no Decreto-lei nº 271/67. Trata-se de um contrato pelo qual a Administração transfere, como direito real resolúvel, o uso remunerado ou gratuito de terreno público ou do espaço aéreo que o recobre para que seja utilizado com fins específicos por tempo certo ou por prazo indeterminado [53]. Como lembra Hely Lopes Meirelles, "a concessão de uso, como direito real, é transferível por ato inter vivos ou por cessão legítima ou testamentária, a título gratuito ou remunerado, como os demais direitos reais sobre coisas alheias, com a só diferença de que o imóvel reverterá à Administração concedente se o concessionário ou seus sucessores não lhe derem o uso prometido ou desviarem de sua finalidade contratual". [54]

            O aforamento ou anfiteuse é instituto previsto nos artigos 678 a 694 do CC revogado, e para os bens da União, no Decreto-lei 9.760/46, caracterizando-se pela cissão do domínio útil da nua propriedade [55]. O instituto não foi consagrado no novo CC.O arrendamento está previsto no Decreto 30.625/58. A cessão em comodato pela Lei 8.647/65, regulamentada pelo Decreto 47.241/66 [56].


9- Permissão, Autorização, Cessão e Concessão.

            Estes institutos aplicam-se aos bens de uso comum e especial. A autorização é definida como o ato unilateral, discricionário e precário, pelo qual a Administração consente na prática de determinada atividade individual incidente sobre um bem público, não tendo forma nem requisitos especiais para sua efetivação, pois que se presta a atividades transitórias para a Administração [57].

            Di Pietro elenca as características da autorização: a) reveste-se de maior precariedade [58] do que a permissão e a concessão; b) é outorgada, no mais das vezes em caráter transitório; c) confere menores poderes e garantias ao usuário; d) dispensa licitação e autorização legislativa; e) não cria para o usuário um dever de utilização, mas simples faculdade. [59] Segundo a mesma autora, as autorizações podem ser simples ou qualificadas, estas últimas ocorrendo quando ocorre a fixação de prazo, o que faz com que se gere uma certa estabilidade na medida em que a Administração obriga-se a respeitar o prazo da autorização [60]. Mas é de ser lembrado que a possibilidade de dispensa de licitação, que surge pelo caráter precário da autorização, não torna a autorização um ato administrativo indene ao controle de sua legalidade pelos meios ordinários.

            A permissão de uso é o ato negocial, unilateral, discricionário e precário, através do qual a Administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público [61], podendo ser com ou sem condições, gratuita ou remunerada, por tempo certo ou indeterminado, atingindo qualquer espécie de bem [62]. Podemos classificá-las em permissão de primeiro e de segundo grau, consoante se proceda a utilização com empresa ou não, entendida empresa como a utilização de instalações onerosas que se aprofundem no solo ou que aparelhem a parte do domínio ocupado para melhor aproveitamento do local [63].

            A concessão é o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública faculta ao particular a utilização privativa de bem público para que a exerça conforme sua destinação. [64] Na definição de Hely Lopes Meirelles, a concessão "é o contrato administrativo pelo qual o Poder Público atribui a utilização exclusiva de um bem de seu domínio a particular, para que o explore segundo sua destinação específica" [65], podendo ser ou não remunerada ou gratuita, mas sempre precedida de autorização legal.

            Da sua natureza contratual deflui uma estabilidade e uma proeminência do interesse público que a torna incedível sem prévia autorização. Da mesma forma, como contrato administrativo, pode ter suas cláusulas alteradas mediante composição dos danos [66]. Haja vista esta sua caraterística, presta-se preferencialmente à atividades públicas de maior envergadura.

            Temos ainda a cessão de uso, que é a transferência gratuita da posse de um bem público de uma entidade ou órgão para outro, a fim de que o cessionário o utilize nas condições estabelecidas no respectivo termo, por tempo certo ou indeterminado [67], sendo um ato de colaboração entre repartições públicas. Para Di Pietro, tratar-se-ia de uma espécie do gênero concessão [68]. Invocando a legislação, mais precisamente os artigos 125 e 126 da lei 9.760/46 e Decreto-lei 178/ 67, a autora ressalva que a cessão será sempre por tempo determinado, discrepando da posição antes referida.


10- Da Formação do Patrimônio Público

            Os bens de propriedade do Estado são adquiridos por formas próprias do direito público e por formas comuns do direito privado. Pode o Estado, por exemplo, aceitar doações e é também sucessor dos bens vagos. O recebimento de doações, contudo carece de autorização legislativa a teor do artigo 19 da Constituição, se feitas com encargo. Os bens de heranças vagas passarão ao patrimônio do Estado, Município ou União conforme se situem em seus territórios. [69] Quanto à compra, como visto linhas atrás, está a Administração jungida à observância da Lei de Licitações (8.666/94).

            No caso dos imóveis, é mais comum a utilização do mecanismo da desapropriação, previsto na lei 3.365/41. Vale lembrar que os bens imóveis de uso especial e dominicais carecem de registro ao passo que os bens de uso público comum não


11- Das Terras Públicas in especie.

            Trataremos mais de perto das terras públicas. Em linha de princípio, todos as terras públicas pertenciam à Coroa Portuguesa e sua transferência aos particulares deu-se de forma paulatina através das denominadas sesmarias e datas. [70] Somente com a Lei Imperial 601, de 18/09/1850, surge algo mais consistente em termos legislativos, tendo sido tal legislação regulamentada pelo Decreto Imperial de 30/11/1854. [71] A Constituição de 1891 tratou das terras devolutas atribuindo-as ao Estados, reservando à União somente aquelas que fossem necessárias à defesa nacional (art. 64) [72]. Na atual Constituição, a matéria vem disciplinada nos dispositivos retrocitados.

            Encontramos disciplina acerca das terras públicas ainda em diversas outras leis como v.g. o Estatuto da Terra. Vejamos as espécies sob as quais surgem as terras públicas.

            11.1-Terrenos de Marinha

            Os terrenos de marinha compreendem aqueles localizados até 15 braças craveiras (33 metros), para dentro da terra, contadas a partir do ponto em que chega a preamar médio [73] e pertencem à União. Ditas áreas necessitam de autorização para sua utilização caso não estejam compreendidas em áreas urbanizadas, quando, então, tem sua regulamentação afeita às municipalidades. Além dos terrenos de marinha, encontram-se sujeitos às mesmas disposições os terrenos acrescidos, ou seja, aqueles formados a partir da aluvião ou da avulsão.

            11.2-Terrenos Reservados

            Terrenos reservados são as faixas de terras particulares, marginais dos rios, lagos e canais públicos, na largura de quinze metros, onerados com a servidão de trânsito, instituída pelo artigo 39 da Lei Imperial 1.507 de 1867 e revigorada pelos art. 11, 12 e 14 do Decreto Federal 24. 643/34 (Código de Águas) [74]. No artigo 39 da lei 1.507 constava: "fica reservada para a servidão pública nas margens dos rios navegáveis e de que se fazem os navegáveis, fora do alcance das marés, salvas as concessões legítimas feitas até a data da publicação da presente lei, a zona de sete braças contadas do ponto médio das enchentes ordinárias para o interior e o Governo autorizado para concedê-las em lotes razoáveis na forma das disposições sobre os terrenos da marinha". Já o Decreto nº 4.105 dispunha no art. 1º, § 2º, que os terrenos reservados para servidão pública incluiriam todos os terrenos situados às margens dos rios navegáveis e dos que se fazem os navegáveis, como todos os que, banhados pelas águas dos ditos rios, fora do alcance das mares, vão até a distância de sete braças craveiras (15,4 metros) para a parte da terra, contadas desde o ponto médio das enchentes ordinárias.

            Semelhante disciplina consta do Código de Águas anterior á recente Lei de Águas. Grassa controvérsia acerca da propriedade destes terrenos. O artigo 31 do Código de Águas determina que são dos Estados os terrenos acaso por outro motivo não pertençam à União. Mas a opinião, arrimada na letra da lei, que determina serem bens dominicais ditas áreas sofre forte crítica de Hely Lopes Meirelles, que afirma que o fato de se haver reservado a incidência de servidão sobre estas áreas não as transfere ao domínio público. Segundo suas palavras: "Tal servidão, entretanto, não tem sido entendida corretamente por muitos dos nossos juristas, que a consideram como transferência da propriedade particular para o domínio público. O equívoco destes intérpretes é manifesto, pois as terras particulares atingidas por essa servidão administrativa não passaram para o domínio público, nem ficaram impedidas de ser utilizadas por seus proprietários, desde que nelas não façam construções ou quaisquer outras obras que prejudiquem o uso normal das águas públicas ou impeçam seu policiamento pelos agentes da Administração." [75]. Assim sendo, o domínio continua particular, apenas havendo a constituição de uma servidão.

            11.3- Ilhas

            As ilhas marítimas, fluviais e lacustres também estão, via de regra, dentre as terras públicas. As ilhas fluviais e lacustres situadas em zonas limítrofes com outros países bem como as oceânicas e costeiras que não pertençam ao Estados são bens da União. Obviamente as ilhas referidas aqui são aquelas que estão em águas públicas, posto que as localizadas em águas situadas em áreas particulares aos seus proprietários pertencem.. [76]

            11.4- Terras Indígenas

            Nesta epígrafe estão compreendidas as terras tradicionalmente ocupadas pelo índios nos termos do artigo 20, inc. XI da CF/88. O artigo 231, § 1º, por seu turno, as define como as terras habitadas pelos índios em caráter, permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos costumes e tradições. É preciso que se diga que a referência a tradicionalmente ocupadas nada tem com uma prescrição imemorial e o que se lhes foi assegurada (aos indígenas) não foi a posse civil mas uma posse "ab origine", nos moldes romanos. [77] Incluem-se entre os bens públicos de uso especial, podendo-se, mediante autorização do Congresso Nacional e ouvidas as comunidades afetadas, efetuar-se o aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais, assegurando-se aos índios participação nos resultados da lavra por forma a ser disposta em lei [78].

            11.5- Terras Devolutas

            Esta, sem dúvida, uma das questões mais ricas em se tratando de terras públicas. O marco fundamental da disciplina das terras devolutas é a Lei Imperial 601, de 18.09.1850, que veio disciplinar a ausência de escrituração referente às concessões das sesmarias, diploma este que foi regulamentado pelo Decreto 1.318 de 1854. Segundo o artigo 3º da lei, são terras devolutas as que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional, provincial ou municipal; as que não se acharem no domínio particular por qualquer título legítimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do governo geral ou provincial, não incursas em comisso por falta de cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura; as que não se acharem dadas por sesmarias ou outras concessões do governo e apesar de não se fundarem em título legítimo, forem legitimados por esta lei. [79] O artigo 5º do Decreto-lei 9.760/46 tem uma definição mais ampla. Segundo o dispositivo, seriam devolutas, na faixa de fronteira, nos Territórios Federais e no Distrito Federal, as terras que, não sendo próprias nem aplicadas a algum uso público federal, estadual ou municipal, não se incorporarem domínio privado: a) por força da lei nº 601, 18.09.1850, Decreto nº 1.318, de 30.1.1854, e outras leis de decretos gerais, federais e estaduais. b) em virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da União ou dos Estados; c) em virtude de lei ou concessão emanada de governo estrangeiro e ratificada ou reconhecida, expressa ou implicitamente, pelo Brasil, em tratado ou convenção de limites; d) em virtude de sentença judicial com força de coisa julgada; e) por se acharem em posse contínua e incontestada com justo título e boa-fé, por termo superior a 20 anos. f) por se acharem em posse pacífica e ininterrupta, por 30 anos, independentemente de justo título e boa-fé; g) por força de sentença declaratória nos termos do artigo 148 da Constituição Federal de 1937. [80] Classificam-se como bens dominicais [81].

            Para regular a questão das terras devolutas criou-se a Ação Discriminatória, disciplinada, a princípio, pelo Decreto-lei nº 9.760/46, que previa uma fase administrativa e uma fase judicial. Após, veio a Lei 3.081/56, prevendo apenas uma instância judicial. O Estatuto da Terra reavivou a instância administrativa. Sobreveio a lei 6.383/76 mantendo uma duplicidade de processo administrativo e judicial, ambos pautando-se por um procedimento bifásico compreendendo uma fase de chamamento dos interessados e uma fase demarcatória. O processo judicial tem cabimento quando dispensado o processo administrativo ou interrompido por presumida ineficácia, quando houver atentado e contra os que não atenderem ao chamamento administrativo. Segue o processo judicial o rito sumário determinando deslocamento da competência para a Justiça Federal.

            11.6- Faixa de Fronteira

            Quanto a estas, somente as terras devolutas que se encontrem na faixa de fronteira pertencem à União. Mas há restrições quanto ao uso do solo na faixa de 150 Km da fronteira, competindo ao Conselho de Defesa Nacional a propositura de critérios para a utilização desta faixa de terras. as restrições encontram-se atualmente na lei 6.634/79.


12- Conclusões

            Vai de longe o tempo do Estado patrimonial de feição absolutista, que confundia a propriedade do Estado com a do Monarca, porque, então, o Estado era o monarca na célebre frase do Luis XIV. O primeiro grande passo foi separar a res publicae do denominado "domínio da coroa". O advento do Estado Liberal em muito contribuiu para a despessoalização do domínio público, na verdade constituindo este modelo de Estado uma antítese ao sistema anterior.

            O advento, no início deste século, de um modelo de Estado Social, repelindo o Estado-mínimo do liberalismo, carreou ao Estado uma série de pesados encargos sociais. Sobreleva em importância a propriedade de bens pelo Estado, mormente em se tratando de bens imóveis, como elementos indispensáveis à consecução do fim magno do Estado: o bem comum.

            Grassa, com efeito, grande distância entre pura e simplesmente prever em textos legais metas a serem atingidas pelo Estado, como se faz v.g nos artigos 1º a 8º da Constituição e em tornar estas metas, estes objetivos, algo concreto, palpável. O Estado precisa alocar meios humanos e materiais aptos a buscar a efetividade da "promessa" solenemente feita no texto constitucional. Quanto maiores os encargos, maior a massa de recursos humanos e materiais necessários ao cumprimento do mister de administrar.

            Da mesma forma, o conteúdo da propriedade, mesmo a privada, ganha novos contornos que chegam como elementos secundários a influenciar a propriedade pública, que já tem em si ínsito o conteúdo publicístico. A disciplina dos bens públicos tem seu sustentáculo no arcabouço legislativo, sobressaindo, em primeira plana a Constituição. Mas nem por isso é desprezível a contribuição da doutrina e da jurisprudência no deslinde de intrincadas questões que surgem pela impossibilidade lógica de uma lei absoluta que abarque toda a realidade.

            Pudemos ver na linhas passadas uma pequena amostra da feição jurídica dos bens públicos em nosso ordenamento. em especial das terras públicas. A questão do domínio do solo sempre foi capital em nossa história e permanecem com proeminência dentro dos bens públicos os imóveis, firmando-se como imprescindível mecanismo para o Estado na busca do bem comum.


13- Bibliografia

            - Bandeira de Mello, Celso Antônio; Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 7a ed., 1995

            - Carvalho Santos, J.M; Código Civil Brasileiro Interpretado, Freitas Bastos, 1967, v. VIII

            - Cretella Júnior, José; Direito Administrativo Brasileiro, Forense, 2a ed., 2000.

Tratado de Direito Administrativo, Forense, 1a ed., 1972, t. X

            - Di Pietro, Maria Sylvia Zanella; Direito Administrativo, Atlas, 12a ed. 2000.

            - Gasparini, Diogenes; Direito Administrativo, Saraiva, 3a ed., 1993.

            - Gomes, Orlando; Direitos Reais, Forense, 14a ed., 1999

            - Meirelles, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 17a ed., 1992

            - Moraes Salles, José Carlos; Usucapião de Bens Móveis e Imóveis, RT, 5a ed., 1999.

            - Nequet, Lenine; Da Prescrição Aquisitiva- Usucapião, Coleção Ajuris, 3a ed., 1981.

            - Pontes de Miranda, Francisco Cavalcanti; Tratado de Direito Privado, Borsói, 1958, v. 2.

- Tratado de Direito Privado, Borsói, 1971, v. XVIII.

            - Pereira, Caio Mário da Silva; Instituições de Direito Civil, Forense, 1997. v. IV.

            - Silva, José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 13a ed., 1997.


Notas

            01 José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 13a ed., 1997, p. 100.

            02 É característica marcante nas sociedades primitivas, ainda presente em grupos indígenas ainda hoje.

            03 Compreende o período da derrocada da nobreza e ascensão da burguesia, alterando profundamente a estrutura da sociedade

            04 Ver exemplificativaente os artigos 7a e 8a da CF

            05 Já se via no Direito Romano " in suo enim alii hactemus facere licet, quatemus nihil in alienum immitat". D. L 8, T. V, 8, § 5.

            06 Caio Mario, Instituição de Direito Civil, Forense, V. IV, n. 320, p. 142.

            07 Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, V. VIII, 10 ed., 1963. p. 5, n 1.

            08 Hely Lopes Meirelles: "O conceito de domínio público não é uniforme na doutrina, mas os administrativistas concordam em que tal domínio, como direito de propriedade, só é exercido sobre bens pertencentes às entidades públicas e, como poder de Soberania interna, alcança tanto bens públicos como coisas particulares de interesse coletivo." E segue: " A expressão domínio público ora significa o poder que o Estado exerce sobre os bens próprios e alheios, ora designa a condição desses bens. A mesma expressão pode ainda ser tomada como o conjunto de bens destinados ao uso público(direito ou indireto- geral ou especial- uti singuli ou uti universi), como pode designar o regime a que se subordina esse complexo de coisas afetadas de interesse público" (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 17a ed. 1992, p. 426). Também Cretella Júnior manifesta-se demonstrando a dificuldade de definição da expressão, verbis; "A expressão domínio público, que se contrapõe à expressão domínio privado, conquanto simples na aparência, oferece extrema dificuldade para ser conceituada." (Direito Administrativo Brasileiro, Forense, 2a ed., 2000, p. 805). Maria Sylvia Zanella Di Pietro leciona que: " A expressão domínio público é equívoca, no sentido de que admite vários significados. 1. Em sentido amplo, é utilizada para designar o conjunto de bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, políticas e administrativas (União, Estados e Municípios, Distrito Federal, Territórios e autarquias). 2. em sentido menos amplo, utilizado na referida classificação do direito francês, designa os bens afetados a um fim público, os quais, no direito brasileiro, compreendem os de uso comum do povo e os de uso especial. 3. Em sentido restrito, fala-se em bens do domínio público para designar apenas os destinados ao uso comum do povo, correspondendo ao demaio do direito italiano; como não eram considerados, por alguns autores, como pertencentes ao poder público, dizia-se que estavam no domínio público; o seu titular seria, na realidade, o povo." (Direito Administrativo, Atlas, 12a ed. 2000, p. 519).

            09 Iden ibiden, op. et loc. cit.

            10 Idem Ibidem: "Em nome do domínio iminente é que são estabelecidas as limitações ao uso da propriedade privada, as servidões administrativas, e desapropriação, as medidas de polícia e o regime jurídico especial de certos bens particulares de interesse público"

            11 Idem ibidem, op. et loc cit.

            12 Cretella Júnior, Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 811.

            13 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, Atlas, 12a ed., 2000, p. 517.

            14 Contudo calha a lembrança de Pontes de Miranda, segundo a qual: "Os dois conceitos, de bem particular e de bem público, não correspondem, exatamente, à precipuidade da satisfação dos interesses privados, ou públicos. Há caminhos abertos ao público que pertencem a particulares e deveres e obrigações de direito público que se integram no conteúdo do direito de propriedade e, pois, o limitam. O problema de se distinguirem os bens particulares e os bens públicos é, pois, de solução a posteriori. Cada sistema jurídico diz quais são os bens públicos. Tanto quanto o outro problema, inconfundível com esse, de se precisar dentro de quais limites fica o direito de propriedade, quais os deveres e obrigações que se lhe impõe."(Tratado de Direito Privado, Borsói, 1954, t. II, § 155, p. 155-156)

            15 Mais uma vez adverte Cretella Júnior: "Não é fácil compreender de maneira exata o sentido da expressão bens públicos que, para alguns, é sinônimo da designação paralela coisas públicas, ao passo que para outros, entre ambas as expressões há filiação de gênero a espécie". (Direito Administrativo cit., p. 808)

            16 Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 428.

            17 Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 7a ed., 1995, p. 520.

            18 Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 808.

            19 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo cit. p. 521.

            20 José Cretella Júnior, Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 819.

            21 Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 430

            22 Idem ibidem, op. et loc. cit.

            23 José Cretella Júnior, Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 826.

            24 Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo cit., p. 520.

            25 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo cit., p. 522

            26 Como lembra Di Pietro: "A expressão ´´uso especial´´, para designar essa modalidade de bem, não é muito feliz, porque se confunde com outro sentido em que é utilizada, quer no direito estrangeiro, quer no direito brasileiro, para indicar o uso privativo do bem público por particular e também para abranger determinada modalidade de uso comum sujeito a maiores restrições, como pagamento de pedágios e autorização para a circulação de veículos especiais. É mas adequada a expressão utilizada pelo direito italiano e pelo Código de Contabilidade Pública, ou seja, bens do patrimônio indisponível.; por aí se ressalta o caráter patrimonial do bem (ou seja, a sua possibilidade de ser economicamente avaliado) e sua indisponibilidade, que resulta, não da natureza do bem, mas do fato de estar ele afetado a um fim público" Ressalva adiante que o sentido de serviço há de ser o mais lato, não se limitando à utilização direta pela Administração. (Direito Administrativo cit, p. 522). Cretella Júnior, ao tratar da expressão uso especial afirma que :"A expressão ´´uso especial´´, num primeiro sentido, contrapondo-se à expressão ´´ uso geral´´, designa o conjunto de bens cuja utilização não é franqueada a todos,indistintamente, anonimamente, mas, ao contrário, depende de autorização do Estado, mediante o preenchimento de determinados requisitos por parte do usuário ´´ sempre que a utilização não acarrete praticamente uma desnaturação do uso geral da coisa´´. Nessa acepção, o uso especial difere do uso geral, porque a utilização do bem não é permitida a todos, as apenas a pessoas determinadas, com base em título particular, constituído ou pelo pagamento de taxa (pedágio, para o trânsito sobre algumas estradas ou pontes; direitos de ancoragem, para permanência nos portos), ou então, pela obtenção de permissões ou licenças expedidas pela autoridade administrativa. A última hipótese é mais freqüente. A circulação de veículos em estradas públicas é livre a todos, mas para os veículos de peso ou de gabarito que excedam o normal, tal circulação é subordinada a licença. A navegação em rios ou torrentes é livre também, mas a flutuação, ou seja, o transporte de troncos por meio do curso d`água depende licenças análogas. Num segundo sentido, que é o usado no Brasil, o uso especial refere-se ao uso exclusivo que o Estado faz de determinado bem para desempenho dos próprios. Em suma, no direito universal, o usuário do bem especial é o administrado; no direito pátrio, é, em regra geral, a administração a usuária do bem de uso comum." (Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 825)

            27 Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo cit., p. 520.

            28 Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro cit., p. 431.

            29Di Pietro, op. cit, p. 524. Segundo a autora, " hoje já se entende que a natureza desses bens não é exclusivamente patrimonial; a sua administração pode visar, paralelamente, a objetivos de interesse geral".

            30 Cretella Júnior, op. cit. p. 831.

            31 Na dicção de Cretella Júnior:"Aliás, a imprescritibilidade do domínio público, como conseqüência de sua inalienabilidade não é textual, sendo entendida por dedução, porque não podendo ser adquiridas de nenhum modo as coisas que se acham fora do comércio, também não podem ser usucapidas."( Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 807)

            32 Ver Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit., p. 526. Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit, p. 523

            33 Na Constituição de 1934, o art. 125 limitava as áreas a 10 hectares. No Constituição de 1937, o art. 148 o previu e na de 1946 o art. 156, § 3º. Com a emenda nº 10, de 9/11/64 a área foi aumentada para 100 hectares e foi suprimida a necessidade de ter nele sua morada e torná-la produtiva com o trabalho próprio.

            34 Idem ibidem, op. et loc. cit: "A legitimação difere do usucapião porque, neste, a posse dá direito à aquisição, pura e simples, do imóvel pelo simples decurso do tempo; naquela, a posse dá direito de preferência para aquisição do imóvel pelo valor histórico, desde que comprovados os requisitos legais". A área seria até 100 hectares.

            35 Pontes de Miranda já afirma três décadas antes d a Constituição de 1988 que; "Todos os bens públicos (art. 66, I-III) são, hoje inalienáveis e inusucapíveis." (Tratado de Direito Privado cit. p. 142). Para uma análise mais completa, consultar José Carlos Moraes Salles, Usucapião de Bens Móveis e Imóveis, RT, 5a ed. 1999, p. 62-68. Em contraponto, a opinião de Lenine Nequet, Da Prescrição Aquisitiva- Usucapião, Coleção Ajuris, 3a ed. 1981, p. 169.

            36 Ver Celso Antônio Bandeira de Mello op. cit., p. 522. Hely Lopes Meirelles. op. cit., p. 450. Cretella Júnior, Direito Administrativo Brasileiro cit. p., 807

            37 Através da desafatação, que os torna bens dominicais, passam, contudo a ser alienáveis nas condições da lei. Ver Hely Lopes Meirelles, op. cit., p. 450.

            38 Segundo o autor: "A impossibilidade de oneração dos bens públicos (das entidades estatais, autárquicas e fundacionais) parece-nos questão indiscutível diante das usa inalienabilidade e impenhorabilidade. "( Op. cit, p. 450)

            39 Meirelles, op. cit., p. 443.

            40 Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 22a ed., 1997, p. 82.

            41 Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 12a ed., 1999, p. 71-72.

            42 Tratado de Direito Administrativo, Forense, 1a ed., 1972, t. X, p. 37 e 38.

            43 Direito Administrativo, Saraiva, 3a ed., 1993, p. 6

            44 Direito Administrativo, Atlas, 10a ed., 1999, p. 61.

            45 Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, de acordo com o princípio "a Administração e seus agentes têm de atuar na conformidade de princípios éticos. Violá-los implicará violação ao próprio direito, configurando ilicitude que sujeita a conduta viciada a invalidação, porquanto tal princípio assumiu foros de pauta jurídica, na conformidade do artigo 37 da Constituição" (Op. cit., p. 69). Meirelles afiança que "a moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput). (...). O certo é que a moralidade do ato administrativo juntamente com sua legalidade e finalidade constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será ilegítima". (Op. cit., p. 84). Não basta ao ato de alienação ser legal, deve ser moralmente justificável.

            46 Hely Lopes Meirelles, op cit., p. 86.

            47 Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit. p. 68. Ver ainda Di Pietro, op. cit. p. 75 e 76

            48 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo cit. p. 71.

            49 Segundo Cretella Júnior: "O vocábulo afetação, entre os vários significados idiomáticos, da linguagem corrente, apresenta o sentido técnico, peculiar ao direito público, de ´´destinação ou consagração a um uso determinado´´, aparecendo, com tal acepção, em frases tais como afetação de uma sala a uma reunião pública, afetação de uma soma a uma despesa.(...). Em nossos dias, o vocábulo afetação e seu cognato afetar, passaram a fazer parte integrante do léxico especializado do direito administrativo, com sentidos precisos de destinação, destinar, idéia tanto mais importante quanto, no âmbito do direito público, o princípio básico informativo é o da finalidade pública destino de todas as operações, materiais ou jurídicas, realizadas pelo Estado para a consecução de seus fins". Segundo o autor quatro são as teorias acerca da natureza jurídica: a) ato jurídico. b) ato legislativo. c) fato determinante da utilização d) ato legislativo, conforme a natureza dos bens (Op. cit, p. 843 usque 848). Sobre a desafetação, consultar as páginas 849 et seq.

            50 Ver Di Pietro, op. cit, p.530. A lei 9.636/98 exige autorização do Presidente da República para alienação de bens imóveis da União. Como lembra Hely Lopes Meirelles, "a alienação de bens móveis e semoventes não tem normas rígidas para sua realização, salvo, em princípio, a exigência de avaliação prévia, autorização legal e licitação..."(Direito Adminsitrativo, 17a ed., p. 444)

            51 Di Pietro, op. cit. p. 547.

            52 Hely Lopes Meirelles, op. cit. p. 438, nota 14. Mais adiante complementa: " O que a lei federal denominou impropriamente de ´´locação´´ nada mais é que concessão remunerada de uso dos bens do domínio público patrimonial, instituto, esse, perfeitamente conhecido e praticado pela Administração Pública dos povos cultos e regido por normas próprias do Direito Administrativo."

            53 Definição de Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit., p. 535. Já Hely Lopes Meirelles o define como " o contrato pelo qual a Administração transfere o uso remunerado ou gratuito de terreno público a particular, como direito real resolúvel, para que dele se utilize em fins específicos de urbanização industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social." (Direito Administrativo Brasileiro cit. p. 439).

            54 Hely Lopes Meirelles,op. cit., p. 439. Segundo o mesmo autor, a concessão pode ser outorgada por escritura pública ou termo administrativo, cujo instrumento ficará sujeito a inscrição no livro próprio do registro imobiliário competente.

            55 Ver Bandeira de Mello, op. cit, p.536. Di Pietro, op. cit, p. 548. Segundo a lição de Meirelles, domínio útil consiste no direito de ususfruir o imóvel de modo mais completo possível e de transmiti-lo a outrem, por ato entre vivos ou de última vontade. Domínio direto ou iminente, é o direito à substância mesma do imóvel, sem as suas utilidades. Foro, cânon ou pensão é a contribuição anual e fixa que o foreiro ou anfiteuta paga ao senhorio direto, em caráter perpétuo, para o exercício de seus direitos sobre o domínio útil. ( Op. cit, p. 440)

            56 Di Pietro, op. cit. p. 550. Ver Orlando Gomes, Direitos Reais, Forense, 14a ed., 1999, p. 263. Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Borsói, 1971, v. XVIII, § 2158, p. 61.

            57 Definição de Meirelles, op. cit., p. 435. Di Pietro a define como: " o ato unilateral e discricionário, pelo qual a Administração consente, a título precário, que o particular se utilize de bem público" (Op. cit, p. 540). Idêntica é a definição de Bandeira de Mello: " é o ato unilateral pelo qual a autoridade administrativa faculta o uso de bem público para utilização epísódica de curta duração" (Op. cit, p. 532)

            58 Na doutrina de Cretella Júnior, a precariedade reveste-se de um conteúdo que tem ínsito duas possibilidades: a) revogabilidade a qualquer tempo sem indenização. b) revogabilidade a qualquer tempo mas com indenização. ( Op. cit. p. 866).Este último é o sentido que deve ser dado ao respeito que a Administração deve à permissão qualificada que não pode obstar uma utilização do bem. Caso necessária, ainda que atingindo o prazo conferido ao utente.

            59 Di Pietro, op. cit, p. 541.

            60 Iden ibidem. op. et loc. cit. Como lembra Hely Lopes Meirelles, acrescentando: "Tais autorizações não geram privilégios contra a Administração ainda que remuneradas e fruídas por muito tempo, e, por isso mesmo, dispensam lei autorizativa e licitação para seu deferimento"(Op. cit. p. 435)

            61 Mais uma definição de Meirelles, op. cit.. p. 436. Para Bandeira de Mello; "é o ato unilateral, precário e discricionário quanto à decisão de outorga, pelo qual se faculta a alguém o uso de um bem público." (Op. cit, p. 533). Já José Cretella Júnior, trazendo à colação a opinião da doutrina a define como: " o ato administrativo unilateral que autoriza o particular a ocupar privativamente a anormalmente uma porção do domínio afetado ao uso público, autorização concebível, tão -só, porque a ocupação pode ser compatível cm o uso público". (Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 859)

            62 Quanto ao bens da União, está prevista na Lei 9.636/98, concebendo a utilização de bens da União para fim de atividades recreativas, esportivas, culturais, religiosas ou educacionais.

            63 Definição de Cretella Júnior. op. cit.., p. 861.

            64 Definição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo cit, p. 544. Segundo a autora, trata-se de contrato de direito público, sinalagmático, oneroso ou gratuito, comutativo e realizado intuito personae.

            65 Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 437. Segundo autor, o que caracteriza a concessão de uso e a distingue dos demais institutos assemelhados- a autorização e permissão de uso é o caráter contratual e estável da outorga do uso do bem público para que o particular o utilize.

            66 Idem ibidem, p. 438.

            67 Idem ibidem, op. cit, p. 436.

            68 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo cit, p. 548.

            69 Di Pietro, op. cit, p. 554.

            70 Idem Ibidem. p. 453. Segundo o mesmo autor a sesmaria era uma forma de doação condicionada da terras públicas para cultivo e trato particular, já as "concessões de data" eram doações feitas pela municipalidade para cidadão das vilas para fins de edificação.( nota 34).

            71 Dita lei, denominada Lei de Terras limitou a forma de aquisição à compra, estabelecendo limitações em uma área de dez léguas das fronteiras dentre outras disposições.

            72 Ver p escorço histórico da legislação em Hely Lopes Meirelles, op. cit., p. 454- 456.

            73 Definição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit., p. 559. Ver ainda Bandeira de Mello, op. cit. p. 527. Hely Lopes Meirelles op. cit. p. 460.

            74 Conceito de Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 461.

            75 Direito Administrativo Brasileiro cit, p. 461. Completa dizendo que: "nterretar a reserva dessas faixas como transferência de domínio é desconhecer a natureza e finalidade da servidão que as onera, e que visa, única e exclusivamente, a deixar livres as margens das águas públicas para policiamento pelos agentes da Administração. Por isso mesmo, em caso de desapropriação indenizam-se também as terras reservadas. Nem poderia a lei despojar a propriedade particular sem indenizações. Se o legislador assim agisse, praticaria confisco, vedado pela nossa Constituição"

            76 Na nova disciplina do domínio da água em nosso direito não mais podemos falar em águas particulares.

            77 Observações de Di Pietro arrimada na doutrina de José Afonso da Silva na página 561 do Direito Administrativo.

            78 Di Pietro, op. cit, p. 561. Ver ainda Hely Lopes Meirelles op. cit, p. 459.

            79 Ver Cretella Júnior op cit. p. 834. Hely Lopes Meirelles op. cit., p.457. Segundo Bandeira de Mello, a atividade de regulação da lei s deu em três aspectos: a) Considerou-se como der per si titulados tantos os sesmeiros e concessionários que cumpriram regularmente suas obrigações ou haviam sido delas dispensados por ato competente, quanto os que tinham havido suas terras de particulares mediante ´´ título legítimo ´´,considerando-se como tais quaisquer atos então hábeis para translação de domínio, desde que o imposto de transmissão houvesse sido pago, ainda que os outorgantes houvessem sido sesmeiros ou concessionários inadimplentes ou mesmo simples posseiros, admitindo-se o mesmo para as companhias de colonização que tempestivamente demarcado suas terras. b) deferiu-se legitimação a primeiros ou segundos ocupantes das terras, se nelas houvesse cultura ou princípio de cultura e morada habitual do posseiro ou seu representante, bem como aos que a adquiriram de primeiro ocupante que as tenha possuído até a data do regulamento e as alienou sem tirar o título a que aludia o artigo 11 do referido diploma e ainda aos que as houveram, por compra e venda ou doação, do primeiro ocupante pagaram imposto de transmissão após publicação do regulamento. c) deferiu-se revalidação a atos concessivos caducos quando, embora descumpridas as condições de outorga, ainda estivessem em poder dos primeiros sesmeiros ou cessionários e nelas houvesse cultura ou princípio de cultura e morada habitual dos beneficiários ou representantes seus. (Curso de Direito Administrativo cit, p. 526).

            80É de se observar que era, quando da publicação do Decreto Lei 9.760 possível a usucapião pro labore

            81 Di Pietro, op. cit., p. 564. Segundo a autora: " Continua válido o conceito residual de terras devolutas como sendo todas as terras existentes no território brasileiro, que não se incorporam legitimamente ao domínio particular; bem como as já incorporadas ao patrimônio público, porém não afetadas a qualquer uso. " (Direito Administrativo cit. p. 564)


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Terras públicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 796, 7 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7235. Acesso em: 25 abr. 2024.