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Cláusula de hardship em contratos de compra e venda internacional.

Aplicação em cenários de extrema variação de taxas cambiais

Cláusula de hardship em contratos de compra e venda internacional. Aplicação em cenários de extrema variação de taxas cambiais

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Examinam-se os principais aspectos relacionados à cláusula de hardship, nos contratos de compra e venda internacional, como meio de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, em cenários de extrema variação das taxas cambiais fixadas para pagamento das obrigações contratuais.

INTRODUÇÃO

O agravamento da crise econômica internacional, iniciada em meados do ano 2008, gerou instabilidade no mercado financeiro, afetando, por consequência, as principais instituições financeiras do Brasil e gerando grande oscilação nas taxas de câmbio flutuante, fixadas pelo mercado de câmbio.

Diante da alteração do cenário econômico, as empresas que operam no comércio internacional, por meio de Contratos de Compra e Venda Internacional, os quais parametrizam o pagamento das obrigações contratuais em taxas de câmbio, viram suas operações lucrativas se traduzirem em prejuízos, surgindo então a necessidade de readaptação de seus contratos às novas condições do mercado, visando o equilíbrio econômico-financeiro e a conservação dos Contratos.

A cláusula de hardship ganha então destaque nos Contratos Internacionais, tendo em vista ser ela instrumento contratual automático de readaptação dos contratos, prevendo a possibilidade de renegociação dos termos contratuais previamente fixados.

A presente pesquisa se prestará a estudar a aplicabilidade das cláusulas de hardship como meio de mitigar os danos ocasionados aos contratantes e conservar a execução dos Contratos de Compra e Venda Internacional, viabilizando a retomada do equilíbrio econômico-financeiro destes, respondendo à pergunta se este mecanismo contratual é efetivo para este fim.

A metodologia utilizada para a realização da pesquisa foi doutrinária e empírica, com análise das decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça pátrios, disponibilizadas no site http://www.jusbrasil.com.br/.

A consulta à jurisprudência foi realizada no dia 29 de Agosto de 2016, das 20:00 às 23:00 horas. A busca contemplou a palavra chave “hardship”, sendo excluídos acórdãos os quais tinham sob análise contratos de natureza diversa daqueles estudados neste trabalho, totalizando o montante de 10 (dez) acórdãos excluídos. A amostra final da pesquisa jurisprudencial foi de 01 (um) acórdão.

No primeiro capítulo serão apresentados os conceitos gerais de Contratos de Compra e Venda Internacional e suas principais características, apresentação geral dos principais aspectos da política cambial brasileira, e os impactos causados pela variação cambial nos Contratos Internacionais.

No segundo capítulo da pesquisa serão introduzidos o conceito e objetivo das cláusulas de hardship, bem como analisada a possibilidade de readaptação dos Contratos de Compra e Venda Internacional por meio desta cláusula.

No terceiro e último capítulo serão apresentados o objetivo e os dados da pesquisa jurisprudencial realizada, a qual se presta a responder ao problema central do trabalho, qual seja, se as cláusulas de hardship são instrumentos contratuais eficazes para readaptação dos Contratos de Compra e Venda Internacional, bem como analisar o entendimento dos tribunais pátrios acerca do tema.

Por derradeiro elaborou-se conclusões finais, nas quais foram sintetizados os principais pontos da pesquisa, bem como apresentadas questões futuras a serem estudadas acerca do tema.


1.  Contratos de Compra e Venda Internacional e a Política CAMBIAL BRASILEIRA

1.1. O que são os Contratos de Compra e Venda Internacional

Contrato de compra e venda internacional é o meio pelo qual as Partes formalizam a estrutura de uma determinada operação de comércio exterior[1]. O Contrato será considerado como internacional quando estiver presente um elemento de conexão, podendo ser a diferente nacionalidade ou domicílio dos contratantes, entrega de mercadoria ou prestação de serviços além das fronteiras do país negociante ou mesmo quando os locais de celebração e execução das obrigações não coincidam[2].

A doutrina[3] destaca que os Contratos Internacionais do Comércio se definem por suas características, destacando-se como principais a natureza extraterritorial do Contrato, a definição do direito aplicável, a utilização preponderante da Arbitragem Internacional, a utilização de Incoterms, a necessidade de garantias e seguros internacionais e a forma de pagamento baseada em moeda internacional, com a fixação de taxa de câmbio. Assim como nos demais contratos, a fase pré-contratual dos Contratos Internacionais define entre as Partes as condições comerciais do contrato, bem como as questões de direito, que serão fundamentais para execução do negócio no futuro[4].

Uma das principais características de um contrato de compra e venda internacional é seu alcance extraterritorial. Neste aspecto, se considera para determinação do alcance do contrato seus efeitos, e não apenas nacionalidade ou domicílio dos entes contratantes[5].

Característica decorrente do caráter extraterritorial dos contratos de compra e venda internacional, a submissão a diferentes jurisdições faz surgir a necessidade de as partes contratantes definirem contratualmente, por meio das cláusulas de jurisdição, qual será a legislação aplicável ao contrato.

Neste aspecto, as Partes poderão optar pelo direito aplicável ao Contrato[6], bem como pela Corte de julgamento competente para dirimir eventuais conflitos oriundos do Contrato, a qual poderá ser Estatal ou então a Arbitragem Internacional.

É muito comum que, nos contratos de compra e venda internacional, as Partes optem pela Arbitragem Internacional, elegendo Tribunal Arbitral livremente instituído entre elas, tendo em vista (i) a maior tecnicidade dos árbitros que irão apreciar o conflito, uma vez que estes podem ser indicados pelas Partes e possuem especialização nas matérias em litígio; (ii) maior segurança jurídica, tendo em vista que as matérias tem decisões mais uniformes; (iii)  maior celeridade com relação aos processos judiciais, ponto este que pode se relativizar a depender da matéria sob análise, a qual poderá requerer maior atenção dos árbitros para melhor solução do conflito[7]; e (iv) e ainda a confidencialidade dos processos arbitrais, o que protege o nome e marca das empresas envolvidas em determinado conflito, poupando-as de eventual debandada comercial eventualmente causados no mercado de capitais.

Note-se que, para que tenha força executória, é necessário que as partes contratantes formalizem a convenção de arbitragem internacional, por meio da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral[8], estabelecendo desde logo a Câmara Arbitral responsável pelo julgamento do processo, bem como o procedimento a ser utilizado por ela[9].

Outro aspecto diferenciador dos Contratos de Compra e Venda Internacional é a utilização de cláusulas nas quais se definem o Incoterms utilizados na operação. Os Incoterms são regras para interpretação das condições comerciais do contrato de comercio internacional, criada em 1936, pela Câmara de Comércio Internacional[10], as quais têm como principal objetivo, de acordo com Irineu Strenger, “harmonizar os negócios internacionais, dando aos seus partícipes maior solidez relativamente aos diferentes entraves que surgem inevitavelmente no processo comercial[11]”.

Pode-se resumir que os Inconterms como regras de caráter internacional que têm como objetivo definir padrões gerais de distribuição de custos inerentes à operação entre importador e exportador

A utilização de Inconterms em contratos de compra e venda internacional de visa suprir as diversas interpretações possíveis que a utilização de leis comerciais de diferentes países pode causar, bem como a insuficiência de dados que eventualmente pode prejudicar uma determinada operação. Ao todo existem 13 Inconterms, divididos em quatro diferentes grupos, sendo eles o Grupo E – Partida (EXW), Grupo F – Transporte Principal Não Pago (FCA, FAS, FOB), Grupo C – Transporte Principal Pago (CFR, CIF, CPT, CIP), Grupo D – Chegada (DAF, DES, DEQ, DDU, DDP)[12].

É comum o oferecimento de garantias bancárias nessa espécie contratual, as quais cobrem o valor da operação e por vezes o risco do negócio, tendo em vista seu caráter amplo.

Dentre as diversas garantias bancárias oferecidas para operações internacionais, dá-se destaque para garantias bancárias, sendo muito comum nestas operações a emissão de Cartas de Crédito[13] e ‘Standby Letters of Credit’, as quais, de acordo com Bruno Ratti, “poderão ser utilizadas para garantir a obrigação do tomador a pagar por mercadorias ou serviços”[14].

A cláusula de seguro internacional é componente comum em um operação de compra venda internacional de mercadorias, tendo em vista a necessidade de se amparar os riscos inerentes ao Contrato. O seguro é responsável por trazer estabilidade ao Contrato, partindo a responsabilidade dos riscos das operações entre as empresas contratantes[15].

Para definição da responsabilidade de contratação de seguro para as mercadorias importadas e/ou exportadas, as partes aplicam também ao contrato os Incoterms, tendo em vista que tais regras de direito comum têm como condão também a definição de tais responsabilidades, como é o caso das cláusulas CIF (Cost Insurance and Freight) e CIP (Carriage and Insurance Paid To), por exemplo.

Existem ainda outras formas de garantias utilizadas nos Contratos de Compra e Venda Internacionais, as quais não serão estudadas no âmbito desta pesquisa, tendo em vista sua alta complexidade técnica e por não serem objeto central deste trabalho.

Outra cláusula característica dessa espécie contratual é a cláusula de Fixação de Preço. Como será melhor analisado no subcapítulo 1.2 abaixo, a fixação do preço das obrigações oriundas destes contratos fica sempre sujeita à variações cambiais.

As Partes, por meio dessa cláusula, estabelecem relação entre o valor ajustado e as quantidades de mercadorias que serão adquiridas por meio do Contrato, bem como a moeda de pagamento do preço ajustado e sua forma de conversão para a moeda corrente nacional, no nosso caso, o Real.

A Comissão Econômica para a Europa das Nações Unidas, pensando na variação do preço das mercadorias, elaborou formula matemática, a qual se concretizou nos contratos de Compra e Venda Internacional como cláusula tipo denominada “cláusula de revisão”. Por meio dessa cláusula as Partes ficam autorizadas a revisar o preço previamente ajustado aplicando-se fórmula matemática, a qual traz o valor histórico ao presente, considerando as variações de valor de matéria prima e/ou mão de obra.

Por fim, nos Contratos sob análise dá-se destaque também às cláusulas de hardship e força maior (Force Majeure). Cláusulas de hardship, que serão adiante melhor analisadas, são aquelas que preveem a renegociação das condições contratuais quando ocorrem eventos durante a execução do Contrato os quais afetam o equilíbrio contratual, tornando-o demasiadamente oneroso para uma das partes[16].

Já as cláusulas de força maior tem o condão de suspender a execução ou exonerar uma das Partes da responsabilidade de execução do Contrato, tendo em vista a ocorrência de circunstâncias imprevisíveis, sendo impossível que as Partes não sofram seus efeitos, podendo-se citar como exemplo a existência de guerras, embargos comerciais, interrupção do transporte por tempo indeterminado, ou qualquer outro evento que possa comprometer a execução do Contrato[17].

1.2.      Política Cambial Brasileira

Desde o ano de 1999, a política cambial oficial brasileira, é baseada no chamado tripé macroeconômico[18], e adota, em tese, o regime de cambio flutuante que tem como diretriz básica a mínima, ou até nenhuma, intervenção do governo.

No entanto, o Banco Central do Brasil intervém na formação das taxas de câmbio, comprando ou vendendo moeda, caracterizando o “dirty flooting”[19] para impedir grandes variações cambiais, sem, no entanto, estabelecer uma taxa fixa, como ocorre em países como China.

Em decorrência da intervenção do Banco Central Bruno Ratti afirma que “apesar de termos taxas livres de câmbio não temos um mercado livre de câmbio, ou seja, aquele no qual inexistam quaisquer restrições”[20].

 De acordo com Pedro Rossi[21], a política cambial brasileira é institucionalizada, o que significa o governo atua ativamente, seja por meio do controle sobre fluxo de capital, intervenções do Banco Central, taxação sobre operação de derivativos ou regulamentação da posição dos bancos, para evitar que a volatilidade cambial seja de tal sorte que possa ocasionar danos imensuráveis aos investidores ou aos negócios que tem o pagamento das obrigações vinculados à taxa de cambio.

No âmbito do comércio exterior de mercadorias e serviços, o impacto da política cambial flutuante adotada pelo Brasil ocorre uma vez que a legislação brasileira[22] determina que os pagamentos das obrigações pecuniárias exequíveis no Brasil deverão ser realizados em moeda corrente nacional (Real).

Nos contratos de comércio internacional comumente os pagamentos das obrigações contratuais são fixados em moeda estrangeira, geralmente em moedas fortes como Dólar, Euro ou Libras, de modo que existem nestes contratos cláusulas que determinam a taxa de câmbio para conversão do valor do pagamento para Reais.

Dessa forma, em uma operação de compra e venda internacional, para ingresso do pagamento objeto de uma operação de exportação em território nacional, é necessário que uma instituição devidamente autorizada pelo Banco Central faça a intermediação da operação de câmbio, por meio de um contrato de câmbio, com a finalidade de transformar a moeda estrangeira em moeda nacional.

Do mesmo modo, em operações de compra e venda internacional, as quais tem como escopo a importação de mercadorias, a flutuação cambial tem implicações no que tange ao pagamento ao exportador estrangeiro, tendo em vista que tais obrigações são contratualmente fixadas em parâmetros cambiais, considerando para cálculo do valor devido ao exportador a taxa auferida no dia útil anterior à emissão da Fatura.

É claro o impacto da variação cambial com relação ao pagamento das obrigações advindas dos Contratos de Compra e Venda Internacional, conforme veremos a seguir.

1.3.      Os Impactos da Variação Cambial nos Contratos de Compra e Venda Internacional

Nos contratos de compra e venda internacional se faz necessária a troca de moeda para pagamento das obrigações pecuniárias assumidas pelas partes, troca essa que é feita com base em uma taxa de câmbio pré-fixada contratualmente[23].

De acordo com Bruno Ratti, muitas vezes a moeda perde a paridade do poder de compra[24] sem que haja a variação dos preços nos países envolvidos na negociação, seja por fatores políticos ou fatores de natureza psicológica, fazendo com que a taxa cambial sofra alterações bruscas, sujeitando as operações internacionais a um aumento de custo de execução que não existe no mercado interno. Como consequência da variação cambial podem resultar alterações no lucro das partes contratantes, ou até a conversão de operações deveras lucrativas em perdas inestimáveis[25].

Diante deste cenário de desequilíbrio das obrigações contratuais originalmente pactuadas, surge o dever das partes de renegociar o contrato, visando à retomada do equilíbrio contratual, pautada no princípio da boa-fé contratual, o qual nasce na fase inicial de negociação do contrato e permeia a relação dos contratantes até o fim da relação jurídica entre eles[26].

Neste aspecto, importante ressaltar que, por muitas vezes, um grande prejuízo de uma das partes se traduz em grande ganho para a outra parte, o que gera uma certa recusa da parte privilegiada em renegociar o contrato para que o equilíbrio vislumbrado inicialmente seja retomado.

Por isso é de suma importância que as partes ajam sempre com probidade, pautadas na boa-fé recíproca e com plena ciência de que em uma negociação, seja ela internacional ou não, deve-se vislumbrar além do lucro, colaborando as partes para a perfeita execução do contrato, já que ambas pretendem um fim comum, que é o objeto contratual.

Segundo ensinamento de Francesco Galano[27], a renegociação contratual deve ser pautada no princípio da boa-fé uma vez que durante a execução dos contratos as partes devem agir em cooperação, visando proteger os interesses uma da outra, bem como minimizar os danos eventualmente oriundos da relação contratual.

De acordo com Nelson Nery Junior e Thiago Rodovalho dos Santos a obrigação de renegociar o contrato surge quando se vislumbram perturbações na fase de cumprimento deste, afastando-o daquilo que fora previamente estipulado, devendo tais perturbações ser supervenientes à celebração do contrato[28].

A necessidade de equilíbrio das relações contratuais encontra-se inserida no conceito de justiça contratual[29], uma vez que atingida a justiça contratual, por obvio que será alcançado o equilíbrio contratual, sendo certo também que a justiça contratual somente será alcançada quando a relação contratual basear-se no princípio da boa-fé.

As cláusulas contratuais são redigidas com constante tentativa de prever o futuro, vez que o contrato não é escrito no mesmo momento de sua execução, mas não é possível abarcar todas futuras hipóteses capazes de ocorrer. Deste modo, quando um evento futuro inesperado e impossível de ser previstos pelas partes no momento de celebração do contrato ocorrer, será necessária a utilização de mecanismos para renegociação contratual.

No âmbito dos contratos internacionais o mecanismo de renegociação dos contratos encontra guarida nas cláusulas de hardship. Tais cláusulas nada mais são do que mecanismos de renegociação contratual originárias da autonomia de vontade das partes contratantes[30], previstas nos contratos de compra e venda internacional com grande frequência.

Júlio Gomes[31] conceitua as cláusulas de hardship como sendo aquelas que preveem a renegociação dos contratos quando da mudança brusca das circunstâncias originárias, de modo a afetar o equilíbrio global dos contratos.

A cláusula de hardship, tais quais todas as demais cláusulas contratuais, têm caráter vinculativo entre as partes contratantes, de modo deve ser acionada sua aplicação quando se concretizar uma situação de desequilíbrio contratual, cumprindo com aquilo que fora livremente estipulado entre elas no momento de celebração do contrato.

A cláusula de hardship foi incluída nos Princípios Unidroit Relativos aos Contratos Comerciais Internacionais, elaborado pelo Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado (Unidroit) em sua primeira edição (1994), nos artigos 6.2.1 a 6.2.3, sendo mantido nas edições posteriores[32].

Deste modo, resta clara a necessidade de aplicação das cláusulas de hardship para renegociação dos contratos de compra e venda internacional em cenários em que a variação cambial seja de tal ordem a promover um desequilíbrio contratual, tornando as obrigações previamente estipuladas inexequíveis ou desproporcionais, de modo que a retomada do equilíbrio contratual seja imprescindível para que o objeto do contrato seja cumprido pelos contratantes.


2.         EQUILÍBRIO ECONÔMICO FINANCEIRO DOS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA INTERNACIONAL E A CLÁUSULA DE HARDSHIP

2.1       Cláusula de Hardship como Instrumento de Equilíbrio Econômico Financeiro dos Contratos de Compra e Venda Internacional

2.1.1    Cláusula de Hardship: Conceito e Objetivo

Os Princípios UNIDROIT de 2010, já anteriormente mencionados, definem hardship da seguinte forma:

Artigo 6.2.2 (Definição de Hardship)

Existe hardship quando sobrevêm eventos que alteram fundamentalmente o equilíbrio do contrato, seja devido ao aumento do custo do cumprimento por uma das partes ou porque o valor que uma das partes recebe pelo cumprimento da outra parte se reduz, e

  1. Os eventos ocorrem ou se tornam conhecidos da parte prejudicada apenas após a conclusão do contrato;
  2. Os eventos não poderiam ter sido levados em consideração pela parte em desvantagem no momento da conclusão do contrato;
  3. Os eventos escapam ao controle da parte em desvantagem; e
  4. O risco dos eventos não foi assumido pela parte em desvantagem.

A cláusula de hardship surgiu no âmbito dos contratos internacionais

Ao celebrar um Contrato de Compra e Venda Internacional as Partes, cientes do risco inerente à operação, se valem de cláusulas de escape, as quais preveem a renegociação dos Contratos caso uma situação superveniente e inesperada ocorra, onerando sobremaneira uma das Partes ou ambos os contratantes.

Tem-se que hardship é a situação em que os fatores externos à negociação (políticos, econômicos, financeiros, etc.) vigentes na época de sua celebração se alteram causando um dano ou desequilíbrio a uma das Partes contratantes.

Rompendo com o princípio do “pacta sunt servanda”[33] e caminhando ao lado do princípio do “rebus sic standibus”[34], o direito contratual internacional entende que, concretizada uma situação imprevista e superveniente o Contrato deverá ser revisto e readaptado à nova realidade socioeconômica ou política dos entes contratantes, sendo necessária a revisão dos contratos.

Na seara dos contratos internacionais, tendo em vista a grande volatilidade das obrigações pactuadas entre as Partes e as inúmeras hipóteses de variações mercadológicas, as Partes contratantes vislumbraram a necessidade de salvaguardar a conservação do contrato por meio da sua readaptação, inserindo nestes instrumentos cláusulas exonerativas de responsabilidade, as quais decorrem da impossibilidade de cumprimento do Contrato do modo previamente ajustado[35].

A cláusula de hardship não tem como intuito suprimir a vontade das partes no momento de celebração do contrato, mas sim viabilizar sua execução mesmo quando da ocorrência de fato superveniente imprevisível, inevitável e externo à negociação, salvando-o de uma possível rescisão arbitrária e/ou prematura.

Cumpre informar também que não se confundem as cláusulas contratuais de força maior e de hardship. Conforme ensinamento de José Cretella Neto[36], ambas as cláusulas são aplicáveis quando eventos imprevisíveis, inevitáveis e externos afetam o equilíbrio contratual. No entanto, embora derivem das mesmas circunstâncias, será o caso de força maior quando tais eventos sejam de tal ordem a tornar o Contrato impossível de ser executado, permanente ou temporariamente, enquanto que a hardship se concretiza quando tais eventos não impossibilitem a execução do contrato, mas o torne excessivamente oneroso para uma das Partes, ou até mesmo sem utilidade para essa, podendo, contudo, ser executado em um patamar econômico deveras superior.

Também não se confundem as cláusulas de hardship a as cláusulas de correção monetária. Embora ambas sejam aplicáveis quando da modificação das circunstâncias econômicas existentes no momento de celebração do contrato por fatores externos, enquanto a primeira espécie visa a renegociação do contrato internacional diante de uma variação econômica futura e imprevisível, a segunda se aplica à eventos previsíveis, já mensurados quando da elaboração do contrato, e são aplicadas de maneira automática, sem necessidade de intervenção do judiciário[37].

O jurista Luiz Olavo Batista[38] considera que o objetivo da cláusula de hardship é a revisão do Contrato, ou sua rescisão, caso impossível a continuidade de sua execução. Neste ponto, ele entende que a forma de revisão dos contratos terá como base critérios subjetivos e objetivos, os quais visam trazer ao contrato o equilíbrio existente no momento de sua celebração[39].

Bruno Oppetit[40] entende a cláusula de hardship como um instrumento elaborado e genérico para adaptação de um contrato internacional ao novo cenário, o que gera questionamentos de ordem jurídica.

Já René Rodiere[41] entende que existem dois tipos de cláusula de readaptação, sendo a primeira executável automaticamente, sem necessidade de renegociação do contrato, e a segunda a cláusula de hardship, a qual exige a renegociação dos termos do Contrato.

Sendo assim, as cláusulas de hardship têm como característica sua generalidade, diferenciando-se das demais cláusulas de readaptação dos contratos que preveem circunstâncias pontais para sua utilização, de modo que quando presente qualquer circunstância superveniente, externa, imprevisível e inevitável, as partes possam fazer uso deste instrumento, com intuito de conservar o contrato readaptando sua execução ao novo cenário.

2.2       Readaptação dos Contratos de Compra e Venda Internacional e a cláusula de Hardship

As cláusulas de hardship são utilizadas nos contratos de compra e venda internacional como mecanismo de readaptação destes quando da ocorrência de eventos supervenientes e imprevisíveis, com o objetivo de que o contrato se torne novamente equilibrado e justo para ambos contratantes.

Nos contratos internacionais é comum que as cláusulas de hardship coexistam com cláusulas demais cláusulas de readaptação, não sendo correta a afirmação de que elas se anulam. Isso porque, como já visto, cada cláusula tem o momento correto para sua aplicação, sendo certo que as cláusulas de hardship se operam perante circunstâncias imprevistas que causam o desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos em questão, enquanto as demais são aplicáveis perante a ocorrência de eventos já previstos contratualmente[42].

Para sua utilização é imprescindível que as partes contratantes demonstrem o interesse em renegociar o ponto de desequilíbrio do contrato, visto que essas cláusulas não são de execução automática. Ademais, para que sejam utilizadas é necessário que ocorra mudança significativa no resultado que se era esperado do Contrato, ou seja, que seu resultado seja fundamentalmente diferente daquele que as partes esperavam quando de sua celebração.

A motivação para que uma das partes contratantes invoque a aplicação da cláusula de hardship é o prejuízo a ela causado em decorrência do desequilíbrio econômico-financeiro causado no contrato. A doutrina classifica como prejuízo um dano econômico exagerado, desproporcional e prejudicial para os interesses de uma das partes contratantes[43].

Assim que constatado que houve desequilíbrio econômico-financeiro, causando prejuízo a uma das partes (circunstância constitutiva de hardship), essas deverão iniciar as tratativas de renegociação do contrato, visando sua adaptação às novas circunstâncias. É comum que as cláusulas de hardship tragam em sua redação prazos para que a parte prejudicada advirta a outra parte acerca da circunstância de hardship, de forma que não cumprido este prazo será entendido que ela aceita que o contrato seja executado da forma que se encontra, sendo suprimido seu direito à renegociação das condições.

É importante que as cláusulas de hardship tragam, em sua redação, a forma com a qual a readaptação do Contrato irá ocorrer, descrevendo ao máximo o procedimento de que será utilizado quando instaurada sua renegociação. A doutrina propõe que as cláusulas de hardship devem prever se o contrato ficará suspenso ou terá sua execução continuada durante sua renegociação. Neste sentido René Rodiere[44] defende, amparado pela jurisprudência de alguns países, que o contrato deverá continuar sendo executado durante a sua negociação. Por outro lado, as partes podem estipular que o contrato seja suspenso até solução do conflito, ou então que tenha alguns de seus efeitos suspensos.

Uma vez detectada a ocorrência de hardship e invocada a aplicação da cláusula como mecanismo de readaptação do Contrato, as partes deverão iniciar as tratativas de acordo. No entanto, caso a parte não prejudicada se recuse a renegociar as condições do Contrato, os contratantes deverão solicitar a intervenção de árbitros ou do sistema judicial para resolução do conflito. A recusa da parte em renegociar o contrato constitui falta contratual, podendo ser usado como argumento pela parte prejudicada para a resilição do Contrato[45].

As cláusulas de hardship são então instrumentos que permitem que as partes contratantes tenham segurança nas contratações internacionais, visto que estas permitem a readaptação dos Contratos sempre que eventos externos, imprevisíveis e supervenientes ocorram, afetando o equilíbrio econômico-financeiro do Contrato, acarretando à um dos contratantes um prejuízo de tal sorte que a continuidade de execução do Contrato, nos termos e condições em que se encontra, se tornam deveras inviável, impedindo, dessa maneira, a resilição do Contrato.


CONCLUSÃO

À luz dos princípios gerais do contrato, este faz lei entre as partes contratantes, devendo ser levado até seu termo final nas condições pactuadas (pacta sunt servanda).

Contudo, no cenário atual de globalização, e considerando a universalidade dos Contratos de Compra e Venda Internacional, a imutabilidade contratual, que tem como objetivo a preservação do negócio jurídico, passa a ser prejudicial para as partes, vez que aniquila qualquer possibilidade de flexibilização das cláusulas para adaptação dos Contratos a novos cenários econômicos que possam surgir ao longo de sua execução.

Para garantir a flexibilização dos Contratos em circunstâncias imprevisíveis, externas e supervenientes, faz-se o uso das cláusulas de hardship, as quais tem como escopo a readaptação do contrato ao novo cenário econômico-financeiro, por meio da renegociação das condições contratuais pré estipuladas.

Note que, conforme abordado no texto, a cláusula de hardship não se confunde com a cláusula de força maior. Essa última é aplicável quando a circunstância externa, superveniente e imprevisível é de ordem que se torna impossível a continuidade da execução do contrato. Enquanto que a cláusula de hardship se aplica quando o evento externo, superveniente e imprevisível torna o contrato excessivamente oneroso para uma das partes, mas não impossível de ser executado.

A adaptação do contrato por meio da aplicação da cláusula de hardship é, sem dúvida, mais vantajosa para as partes, vez que viabiliza a continuidade de execução do contrato, ao passo que evita a recisão contratual, bem como eventuais custos à ela inerentes, como multas por resilição unilateral do contrato, pagamento de indenizações ou discussões judiciais que acarretam o desgaste da imagem das empresas perante o mercado.

Considerando que os Contratos são celebrados entre as partes visando a mútua contribuição entre estas, as cláusulas que preveem a adaptação do contrato se pautam no dever de cooperação das partes, decorrente do princípio da boa-fé contratual.

Decorre do trabalho ora apresentado questão que não foi respondida por este, por não ser objeto central do estudo, a qual trata da interpretação das circunstâncias externas, supervenientes e imprevisíveis que dão azo à aplicação das cláusulas de hardship, e qual interpretação jurisprudencial internacional acerca do tema.

Conclui-se, portanto, que as cláusulas de hardship são de extrema importância e difundida aplicabilidade no âmbito dos Contratos de Compra e Venda Internacionais, tendo em vista que tais contratos carecem de maior flexibilização em decorrência de estarem inseridos em ambiente globalizado, passível de variações de cunho econômico–financeiro, as quais afetam as condições originais dos Contratos.


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3. Endereços Eletrônicos

Princípios UNIDROIT 2010, UNIDROIT, disponível em http://www.unidroit.org/instruments/commercial-contracts/unidroit-principles-2010.

Decreto Lei 8.327 de 16 de outubro de 2014, art. 79 (Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias – UNCITRAL, mais conhecida como Convenção de Viena de 1980), disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Decreto/D8327.htm>.

Atualização RMCCI nº 04 do Banco Central do Brasil, disponível em <http://www.bcb.gov.br/rex/CNC/Ftp/GenceRMCCI.pdf>.

Lei 10.192 de 14 de fevereiro de 2001, art. 1º, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10192.htm.

Decreto 857 de 11 de setembro de 1969, art. 2º II, disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0857.htm>.

Os Incoterms devem ser analisados com base em “The Incoterms Rules©”, disponível em http://www.iccwbo.org/products-and-services/trade-facilitation/incoterms-2010/the-incoterms-rules/.


Notas

[1] José Cretela Neto define o Contrato como “instrumento por excelência do comércio internacional”. (CRETELA NETO, José. Contratos Internacionais: Cláusulas Típicas. Campinas: Milenium Editora, p.77)

[2] STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2003, p.34.

[3] De acordo com José Maria Espinar Vicente, os Contratos de Comércio Internacional podem ser definidos como aqueles pelos quais há intercâmbio de mercadorias entre diferentes países, ao menos uma das partes desempenham papel importante no meio econômico internacional, afetam não apenas os países envolvidos, mas todos aqueles que de alguma forma aos bens ou serviços ali comercializados, contém características peculiares como por exemplo, cláusulas de submissão, arbitragem, definição de Incoterms e taxas de câmbio para conversão de moedas. (VICENTE, José Maria Espinar. In: STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2003, p.34.)

Ainda no intuito de definir o Contrato Internacional do Comércio, Luiz Olavo Batista ensina que: ”São contratos internacionais do comércio, todas as manifestações bi ou plurilaterais da vontade livre das partes, objetivando relações patrimoniais ou de serviços, cujos elementos sejam vinculantes de dois ou mais sistemas jurídicos extraterritoriais, pela força do domicílio, nacionalidade, sede principal dos negócios, lugar do Contrato, lugar de execução ou qualquer circunstância que exprima um liame indicativo de Direito aplicável”. (BATISTA, Luiz Olavo.. Dos Contratos Internacionais: Uma visão Teórica e Prática. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 9-10)

[4] Conforme ensinamento de Irineu Strenger, a fase de negociação envolve o envio de inúmeras propostas e contrapropostas, as quais devem ser refletir exatamente os termos da negociação, porquanto são utilizadas pelas partes caso haja desentendimentos de informações no futuro. (STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2003, p.111.)

[5] Desse modo, mesmo que haja um contrato de compra e venda de suprimentos firmado entre empresas brasileiras, cujo objeto seja o fornecimento de alimentos para um país na África, para fins do direito este contrato será considerado como extraterritorial, uma vez que seu objetivo extrapola as fronteiras nacionais. (SIQUEIROS, José Luis. In: STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2003, p. 35.)

[6] As partes contratantes poderão, inclusive, definir que seja aplicado ao contrato direito de terceiro país alheio à relação contratual, ocasião em que deverão no mínimo ter conhecimento de tal legislação, a fim de se evitar desagradáveis surpresas no decorrer de eventual processo judicial.

[7] ANTUNES, José Engrácia Antunes. Direito e Justiça: Contratos Comerciais Noções Fundamentais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa: Volume Especial, 2007.

[8] A convenção de arbitragem internacional é o acordo entre as partes contratantes para submissão dos conflitos oriundos do contrato à Câmara Arbitral livremente instituída entre as Partes. A doutrina entende que enquanto a cláusula compromissória é firmada visando solução de conflitos futuros, o compromisso arbitral visa a solução de um conflito já existente. (CRETELA NETO, José. Contratos Internacionais: Cláusulas Típicas. Campinas: Milenium Editora, p.295)

[9] Lei 9.037 de 23 de setembro de 1996 (Lei da Arbitragem).

[10] Os Incoterms sofreram atualizações ao longo do tempo - 1953, 1967, 1976, 1980, 1990 –, tendo ocorrido sua última atualização em 2000.

[11] STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. Ed. 4º. São Paulo: LTr, 2003, p.283.

[12] Os Incoterms devem ser analisados com base em “The Incoterms Rules©”, disponível em < http://www.iccwbo.org/products-and-services/trade-facilitation/incoterms-2010/the-incoterms-rules/>

[13] Entende-se por carta de crédito um documento bancário emitido por instituição financeira, por meio do qual o banco emitente, por ordem do tomador do crédito, ou em seu benefício, se compromete a efetuar pagamento a um terceiro beneficiário ou à sua ordem, desde que os termos e condições do crédito sejam cumpridos.

[14] RATTI, Bruno. Comércio Internacional e Câmbio. 11ª Ed. São Paulo: Lex Editora. 2006, p. 103.

[15] STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. Ed. 4º. São Paulo: LTr, 2003, p. 373.

[16] Princípios UNIDROIT 2010, UNIDROIT, Chapter 6: Performance – Section 2: Hardship, itens 6.2.1 à 6.2.3, disponível em <http://www.unidroit.org/instruments/commercial-contracts/unidroit-principles-2010/403-chapter-6-performance-section-2-hardship>

[17] Decreto Lei 8.327 de 16 de outubro de 2014, art. 79 (Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias – UNCITRAL, mais conhecida como Convenção de Viena de 1980).

[18] Modelo de política econômica lançado no segundo mandato do Governo Fernando Henrique Cardoso, no ano de 1999, consubstanciado em: i) meta de inflação; ii) superávit primário; e iii) câmbio flutuante.

[19] RATTI, Bruno. Comércio Internacional e Câmbio. 11ª Ed. São Paulo: Lex Editora. 2006.

[20] RATTI, Bruno. Comércio Internacional e Câmbio. 11ª Ed. São Paulo: Lex Editora. 2006, p. 213.

[21] ROSSI, Pedro. Política Cambial no Brasil: Um Esquema Analítico. Revista de Política Analítica, vol. 35, nº  04 (141), pp. 708 – 722, outubro – dezembro 2015.

[22] Atualização RMCCI nº 04 do Banco Central do Brasil, disponível em <http://www.bcb.gov.br/rex/CNC/Ftp/GenceRMCCI.pdf>. Lei 10.192 de 14 de fevereiro de 2001, art. 1º e Decreto 857 de 11 de setembro de 1969, art. 2º II.

[23] Caso não seja contratualmente pré-fixada a taxa de câmbio que será utilizada para a troca de moeda, considera-se para esse fim a taxa divulgada pelo Banco Central do Brasil, através do sistema de informações SISBACEN sob o código PTAX 800 divulgada na data de emissão da Nota Fiscal para pagamento do serviço ou da mercadoria. (Determinação prevista na atualização do RMCCI nº 04 do Banco Central do Brasil, Título I, Capítulo I, item 23).

[24] A Teoria da Paridade do Poder de Compra, desenvolvida por Gustav Cassel em 1919, ensina que a taxa cambial sofre influência das políticas monetárias e comerciais adotadas internamente pelos países. Desse modo, a compra de moeda estrangeira é a troca do poder aquisitivo de um país pelo poder aquisitivo de outro, devendo o câmbio refletir a modificação dos preços nos dois países envolvidos na negociação. RATTI, Bruno. Comércio Internacional e Câmbio. 11ª Ed. São Paulo: Lex Editora. 2006, p. 312.

[25] KENEN, Peter B. The International Economy. New Jersey: Prentice-Hall, 1985, p.11.

[26] A Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias – UNCITRAL, não cita a importância da fase pré-contratual no âmbito dos contratos de compra e venda internacional de mercadorias. Já nos Princípios UNIDROIT 2010 existem regras aplicáveis a tais contratos no momento da formação destes, com definições sobre o modo de formação dos contratos, definição de oferta, retirada de oferta, revogação de oferta, rejeição de oferta, momento da aceitação, entre outras. Princípios UNIDROIT, UNIDROIT, Chapter 2: Formation and Authority of Agents – Section 1: Formation, itens 2.1.1 à 2.1.22, dísponível em <http://www.unidroit.org/instruments/commercial-contracts/unidroit-principles-2010/415-chapter-2-formation-and-authority-of-agents-section-1-formation>

[27] GALANO, Francesco. Trattado di Diritto Civile. In: NANNI, Giovanni Etore. A Obrigação de Renegociar no Direito Contratual Brasileiro. São Paulo: Revista do Advogado, nº 116, p. 88, jul. 2012.

[28] NERY JUNIOR, Nelson; SANTOS, Thiago Rodovalho dos. Renegociação Contratual. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 906, p. 127, abr. 2011.

[29] De acordo com André Luiz Menezes Azevedo Sette “A justiça contratual consiste, pois, numa justa distribuição de ônus e riscos entre as partes do contrato, exercendo além da função de controle da equivalência das prestações (ou seja, que a contraprestação seja adequada à prestação), outra integrativa das questões que as partes deixaram de regulamentar no contrato, bem como, ainda, uma função de interpretação das normas contratuais em busca do bem comum e da igualdade material”. SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos: seus princípios fundamentais sob a ótica do Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 147.

Já Nelson Rosenvald expõe que a justiça contratual é responsável por trazer ao contrato uma igualdade substancial entre as partes, equalizando vantagens e riscos de determinado negócio jurídico, sem, no entanto, excluir a utilidade econômica deste instrumento jurídico. ROSENVALD, Nelson. A função social do contrato, in: HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; TARTUCE, Flávio (coord.). Direito Contratual: temas atuais. São Paulo: Método, 2007, p. 91.

[30] GALLO, Paolo. Contratto e Buona Fede: Buona Fede in Senso Oggetivoe Transformazioni Del Contratto. In: NANNI, Giovanni Etore. A Obrigação de Renegociar no Direito Contratual Brasileiro. São Paulo: Revista do Advogado, nº 116, p. 92, jul. 2012.

[31] GOMES, Julio. Cláusula de Hardship. In: MONTEIRO, Antônio Pinto (Coord.) Contratos: Actualidade e Evolução. Porto: Universidade Católica Portuguesa, 1997, p. 167 – 204.

[32] Também há previsão acerca das cláusulas de hardship nos Princípios Fundamentais do Direito Europeu dos Contratos, publicado pela European Contract Law Commission (artigo 6:111), no projeto preliminar do Código Europeu dos Contratos (art.157),  bem como no Draft of Commom Frame of Reference (DCFR) (Livro III, art. 1:110).

[33] O princípio do “pacta sunt servanda” (por tradução livre “os pactos devem ser cumpridos”), visa preservar a autonomia da vontade dos contratantes e a segurança jurídica, impondo a força obrigatória dos contratos, a qual tem como premissa a máxima de que o Contrato faz lei entre as Partes. Sobre este princípio ensina Orlando Gomes que “celebrado que seja, com observância de todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos.”. GOMES, Orlando. Contratos. 18ª Ed., Forense: Rio de Janeiro, 1998, p. 36.

[34] O princípio do ”rebus sic standibus” (por tradução livre “permanecendo as coisas como estavam antes”), por sua vez, é antagônico ao “pacta sunt servanda” e tem como base a Teoria da Imprevisão, a qual estabelece que a ocorrência de fato imprevisível e superveniente à celebração do Contrato implica na alteração de suas condições originais, bem como na inexigibilidade das obrigações estabelecidas entre as Partes considerando tais condições. Diante de tal fato as Partes deverão repactuar as obrigações mútuas originárias do Contrato, tendo como base as novas condições ajustadas entre estes. Tal princípio é inserido nos contratos por meio da cláusula da imprevisão.

[35] De acordo com os ensinamentos de Jairo Silva Melo os Contratos Internacionais são negociados em ambientes político-econômicos de constante modificação, expondo os contratantes às variações políticas, econômicas, de quantidade do produto comercializado além da constante ameaça de variação na paridade da moeda utilizada na negociação com a moeda do país envolvido na negociação. MELO, Jairo Silva. Contratos Internacionais e Cláusulas Hardship. São Paulo: Aduaneiras, 1999, p. 80.

[36] CRETELLA NETO, José. Contratos Internacionais: Cláusulas Típicas. Campinas: Millennium Editora, 2011, p. 549-550.

[37] MELO, Jairo Silva. Contratos Internacionais e cláusula de hardship São Paulo: Aduaneiras, 1999, p. 94.

[38] BATISTA, Luiz Olavo. Dos Contratos Internacionais: uma visão teórica e prática. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 149.

[39] De acordo como Luiz Olavo Batista os critérios para revisão dos contratos: “podem ser subjetivos, como a menção à loyauté reciproque, à fairness of the parties ou à condições appropriate and equitable under the circunstances, podem também ser critérios objetivos, visando recolocar as partes em posição de equilíbrio comparável ao que existia no momento da celebração do contrato. Usa-se também misturar os dois critérios, ou referir-se à equidade, no caso da arbitragem.”. BATISTA, Luiz Olavo. Dos Contratos Internacionais: uma visão teórica e prática. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 149.

[40] OPPETIT, Bruno. L’adaptation dês contrats internationaux aux changements de circonstances: La clause “hardship”. Journal du Droit International. N. 4, 1974, p. 797.

[41] RODIERE, René. Les modifications Du contrat au cours de son exécution en raison de circunstances nouvelles / René Rodiere directeur. Institut de Droit Compare de L’Universite de Paris II, Associe au C.N.R.S., Editions A. Pedone. Micheline VAN CAMELBEKE.

[42] De acordo com Jairo Silva Melo: “As circunstâncias geradoras do desequilíbrio são aquelas de ordem econômica ou comercial que ocorram após a assinatura do contrato e fora das previsões normais manifestadas pelas partes, permitindo uma modificação das condições do contrato para readaptá-lo ao ponto de equilíbrio econômico”.  MELO, Jairo Silva. Contratos Internacionais e cláusula de hardship São Paulo: Aduaneiras, 1999, p. 102.

[43] MELO, Jairo Silva. Contratos Internacionais e cláusula de hardship São Paulo: Aduaneiras, 1999, p. 103.

[44] RODIERE, René. Les modifications Du contrat au cours de son exécution en raison de circunstances nouvelles / René Rodiere directeur. Institut de Droit Compare de L’Universite de Paris II, Associe au C.N.R.S., Editions A. Pedone. Micheline VAN CAMELBEKE, p. 182.

[45] De acordo com Jairo Silva Melo: “Esta posição, aprovada pela doutrina, evita que a parte que se beneficia da continuidade da circunstância econômica prejudicial, possa impedir intencionalmente a readaptação contratual, recusando o reajuste”. MELO, Jairo Silva. Contratos Internacionais e cláusula de hardship São Paulo: Aduaneiras, 1999, p. 111.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOLEDO, Graziela. Cláusula de hardship em contratos de compra e venda internacional. Aplicação em cenários de extrema variação de taxas cambiais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5985, 20 nov. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/77750. Acesso em: 26 abr. 2024.