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Comentários às alterações da Lei nº 11.232/2005

Comentários às alterações da Lei nº 11.232/2005

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INTRODUÇÃO

            Grande parte da insatisfação da sociedade com o Poder Judiciário reside no fato de que as sentenças prolatadas no âmbito do processo civil não tem qualquer eficácia prática. Em outras palavras, o senso comum é o de que proferida a sentença o vencedor "ganha mas não leva".

            Visando combater essa justa insatisfação, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, no ano de 2004, mais precisamente em dezembro, formalizaram um Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano, tendo como desiderato o de implementar uma reforma constitucional e infraconstitucional que atacasse a morosidade do Poder Judiciário.

            Segundo o Pacto, "a morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos no regime democrático".

            A resposta concreta, porém, foi lenta. Somente em 19 de outubro de 2005 foi sancionada a primeira lei proveniente desse pacto, que foi a nº 11.187, que alterou a Lei nº 5.896, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, trazendo nova disciplina ao cabimento dos agravos retido e de instrumento, tornando o primeiro a regra.

            A alteração foi tímida, mas importante. Todavia, não atacou ponto importante que é o relativo ao cumprimento das sentenças e a dicotomia existente no ordenamento jurídico pátrio entre cognição-execução.

            O Pacto, como visto, é uma resposta à sociedade, que está alheia às técnicas jurídicas e que não consegue entender o porquê do vencedor em uma ação judicial não conseguir concretizar seu direito previsto na sentença.

            Neste contexto é que foi sancionada a Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, importante marco na legislação processual civil pátria, sobretudo porque acabou com a autonomia do processo de execução das sentenças judiciais, tornando-o parte, uma fase seguinte, do processo de cognição.

            O presente estudo pretende analisar as alterações trazidas pela Lei nº 11.232, de 2005, abordando algumas questões de ordem prática, além de tecer algumas críticas a certos pontos da lei.


1. FIM DA AUTONOMIA DO PROCESSO DE EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXECUTIVOS JUDICIAIS

            A Lei nº 11.232, 2005 trouxe significativas alterações na execução fundada em títulos judiciais, consoante se depreende da leitura do artigo 475-R, acrescentado pela supracitada lei, cuja redação transcrevemos, in verbis:

            "Art. 475-R Aplicam-se subsidiariamente ao cumprimento da sentença, n que couber, as normas que regem o processo de execução de título extrajudicial".

            Isso quer dizer que, para os títulos executivos extrajudiciais permanecem os dispositivos até então em vigor. A razão disso é simples: o desiderato principal buscado pela Lei nº 11.232, de 2005 foi o de tornar célere a satisfação do direito conferido pela sentença.

            Com isso, quer a Lei diminuir ou mesmo eliminar o hiato então existente entre o reconhecimento do direito, pelo Poder Judiciário, e a efetiva satisfação desse direito reconhecido, causado pela existência de um processo de conhecimento e um processo de execução, ambos autônomos.

            Destarte, há eliminação do processo de execução de título executivo judicial como instrumento autônomo. O que passa a existir agora é uma fase posterior à sentença, uma fase de satisfação do comando representado na sentença.

            Esse caráter autônomo, conduto, permanece nos procedimentos executórios de títulos executivos extrajudiciais, na medida em que não há necessidade de uma fase anterior, imprescindível ao reconhecimento do direito.

            Tal situação ocorre pelo fato de que "O título executivo exibe a causa da ação executória" [01] e, os títulos executivos [02] judiciais, como o próprio nome diz, são provenientes de provimentos jurisdicionais ou equivalentes, havendo, dessa forma, a necessidade de uma fase prévia de conhecimento, a fim de que o Poder Judiciário possa aplicar o direito ao caso concreto, situação materializada pela sentença, que, segundo o artigo 162, § 1º, com redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005 consiste no ato do magistrado que implica alguma das situações previstas nos artigos 267 e 269 do Código de Processo Civil.

            Note-se que há uma grande alteração no conceito tradicional de sentença. A revogada redação previa que a sentença era o ato do juiz que tinha o condão de pôr termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa. Com a redação trazida pela Lei nº 11.232, de 2005, a sentença nem sempre tem a força de pôr fim ao processo, pois a situações em que ela apenas colocará a termo uma fase do processo, lembrando que pela Lei nº 11.232, de 2005 a execução de títulos executivos judiciais enquadra-se em uma fase posterior à sentença e, portanto, inserta no bojo do processo de cognição. Por esta razão é que tanto ambos os caputs dos artigos 267 quanto o 269 falam agora, com a novel redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005 em "resolução de mérito" e não em "extinção do processo".

            Nos casos, porém, previstos no artigo 267, a conseqüência natural da não-resolução do mérito é a extinção do processo e, por tal razão, o caput do artigo 267 prevê que "Extinguem-se o processo, sem resolução do mérito".

            Entretanto, mesmo neste caso vê-se que o enfoque foi alterado. A ênfase recai sobre o fato de que não houve a resolução do mérito, fato este que torna inócua a existência de um processo, já que os incisos do artigo 267 trazem situações que impedem tal resolução.

            Eduardo J. Couture tratou desta questão, quando, ao definir a sentença como uma ato, prelecionou que "[...] la sentencia es aquel que emana de los agentes de la jurisdicción y mediante el cual deciden la causa o punto sometidos a su conocimiento" [03].

            Outra alteração nesta senda trazida pela Lei nº 11.232, de 2005 encontra-se no caput do artigo 463 do Código de Processo Civil que passou a ter a seguinte redação, in verbis:

            "Art. 463. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la".

            A alteração, apesar de parecer singela, traz em seu âmago a idéia de que a sentença não significa o cumprimento e encerramento pelo magistrado de seu ofício jurisdicional, idéia presente na redação revogada [04], já que prolatada a sentença o magistrado deverá praticar os atos necessários ao seu cumprimento.

            Em derradeiro, ressalte-se que essa idéia de que a sentença põe a termo uma fase do processo de cognição ficou claramente estabelecida com os artigos 3º e 4º da Lei nº 11.232, de 2005.

            O artigo 3º desloca para o Título VIII do Livro I – Do Procedimento Ordinário as disposições acerca da liquidação da sentença, antes previstas nos artigos 603 a 611 do Código de Processo Civil, tornando a liquidação, destarte, uma parte do procedimento ordinário, a ser observada em fase posterior à sentença.

            O artigo 4º da Lei nº 11.232, de 2005 é mais incisivo, na medida em que acrescenta ao Título VIII, o Capítulo X – Do Cumprimento da Sentença, matéria tratada nos artigos 475-I, 475-J, 475-L, 475-M, 475-N, 475-O, 475-P, 475-Q e 475-R, tornando hialino o desiderato do legislador infraconstitucional em tornar a execução da sentença uma fase do procedimento ordinário.


2. DA LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA

            Conforme relatado acima, o artigo 3º, da Lei nº 11.232, de 2005 acresceu alguns dispositivos do Código Civil, compondo o Capítulo IX, "Da Liquidação de Sentença", tornando a liquidação uma fase posterior à sentença.

            Dessa forma, o artigo 475-A prescreve que, nos casos em que a sentença não determinar o valor devido, deverá se proceder à sua liquidação.

            Aqui não há mais a liquidação para individuação do objeto da condenação, na medida em que nos casos em que houver condenação a entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, é dever do credor individualizá-la na petição inicial, caso a escolha a ele caiba ou será feita pelo devedor, quando a ele couber a escolha, no prazo assinalado pelo magistrado [05], observando-se, ainda, o disposto nos artigos 243 a 246 do Código Civil..

            Do requerimento de liquidação a parte não será mais citada, já que não se está iniciando nova ação, mas prosseguindo-se em fase de demanda em curso. Pelo texto do § 1º do artigo 475-A, a parte será intimada, na pessoa de seu advogado.

            Preceito importante encontra-se exarado no § 2º, do artigo 475-A, cuja redação transcrevemos, in verbis:

            "Art. 475-A omissis.

            [...]

            § 2º A liquidação poderá ser requerida na pendência de recurso, processando-se em autos apartados, no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cópias das peças processuais pertinentes".

            A fase preconizada no Capítulo XI, Título XVIII, do Livro I poderá ser desencadeada mesmo que haja recurso pendente.

            Aqui é preciso ter em mente que a liquidação de sentença é uma fase posterior à sentença. Isso não significa, porém, que seja necessariamente a fase seguinte à sentença. A parte inconformada poderá interpor recurso de apelação, que poderá ser recebido no efeito suspensivo e devolutivo.

            Decerto, com o disposto no § 2º do artigo 475-A, trazido pela Lei nº 11.232, de 2005, o efeito suspensivo conferido ao recurso de apelação não terá, agora, o condão de impedir que se proceda a liquidação da sentença.

            A liquidação nestes casos, será processada em autos apartados, uma espécie de autos suplementares ou carta de sentença, esta última, revogada pela Lei nº 11.232, de 2005, cujo artigo 9º expressamente revoga o artigo 590 do Código de Processo Civil que dispunha acerca da carta de sentença.

            O dispositivo em questão, a nosso ver, não é dos mais salutares. Na tentativa de celerizar o processo, a lei trouxe uma norma inócua.

            Não se pode deixar de considerar que se há recurso pendente, não se pode falar em coisa julgada e, portanto, imutabilidade da sentença. Em outras palavras, a sentença poderá ser reformada, tornando necessário que se proceda nova liquidação de sentença, amoldando-a aos novos parâmetros eventualmente trazidos pelo acórdão.

            Por outro lado, não se pode olvidar que decidida a liquidação a parte descontente poderá interpor recurso de agravo de instrumento, conforme redação do artigo 475-H, trazida pela Lei nº 11.232, de 2005, criando a situação de que, em um mesmo processo, encontram-se pendentes dois recursos distintos, interpostos em fases diferentes, levando aos já assoberbados Tribunais Superiores recurso de agravo contra uma situação ainda não consolidada definitivamente, ante a inexistência da coisa julgada no processo principal.

            A liquidação na pendência de recurso é portanto, disposição que nenhum benefício traz a idéia de celeridade e efetividade da sentença que se tem buscado nas últimas reformas do Código de Processo Civil.

            O § 3º do artigo 475-A veda a prolação, pelo magistrado, de sentença ilíquida em dois casos em que se aplica o procedimento sumário. O primeiro encontra-se exarado na letra "d" do inciso II, do artigo 275, e que trata do ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre.. O segundo caso encontra-se previsto na alínea "e" do inciso II, do artigo 275, que trata da cobrança de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veículo. Para estes casos, o juiz deverá, em sendo o caso, fixar de plano, a seu prudente critério, o valor devido.

            Este dispositivo também merece críticas, na medida em que deixar a fixação do valor devido a título de danos ao prudente arbítrio do magistrado vai de encontro a idéia de indenização (tornar indene), já que a indenização mede-se pela extensão do dano, nem mais, nem menos, havendo necessidade de que o magistrado fixe a extensão do dano causado para, então, fixar o valor devido a título de indenização.

            O "prudente arbítrio" não é capaz de suplantar uma avaliação técnica executada por perito, principalmente em casos que envolvam acidente de veículo de via terrestre. O magistrado não tem obrigação de ter conhecimentos técnicos estranhos ao direito – como por exemplo, de mecânica -, fato este que pode levá-lo a fixar como valor devido, montante superior ou inferior, situação em afronta ao enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

            Havendo apenas necessidade de realização de cálculo aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença na forma preconizada no artigo 475-J (acrescentado pela Lei nº 11.232, de 2005), quando então, deverá instruir o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo, conforme prevê o caput do artigo 475-B.

            O parágrafo 1º, do artigo 475-B repete a primeira parte do revogado parágrafo 1º do artigo 604, prevendo que o magistrado poderá, a requerimento do credor, requisitar dados existentes em poder do devedor ou de terceiros, quando estes forem imprescindíveis para a elaboração da memória de cálculo. Ademais, o antigo parágrafo 1º do artigo 604 foi cindido, agora, em dois dispositivos, os parágrafos 1º e 2º do artigo 475-B. O parágrafo 2º, em questão, afirma que se os dados não forem, injustificadamente, apresentados pelo devedor, reputar-se-ão corretos os cálculos apresentados pelo credor. Caso a não apresentação se dê pelo terceiro, também de forma injustificada, o texto afirma que incidirá ao caso o disposto no artigo 362, do Código de Processo Civil [06].

            O parágrafo 3º do artigo 475-B, acrescentado pela Lei nº 11.232, de 2005 traz disposição, a nosso viso, que demonstra o desconhecimento da realidade diuturna dos fóruns por parte do legislador.

            O dispositivo repete a primeira parte do revogado parágrafo 2º do artigo 604. Prescreve o parágrafo 3º do artigo 475-B, in verbis:

            "Art. 475-B omissis.

            [...]

            § 3º Poderá o juiz valer-se do contador do juízo, quando a memória apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão exeqüenda e, ainda, nos casos de assistência judiciária".

            Em primeiro lugar, o dispositivo apresenta uma faculdade do magistrado, que é a de se utilizar do contador do juízo, quando a memória de cálculo apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão exeqüenda. A questão é subjetiva, já que o que é aparente para uma pessoa não o é para outra. De qualquer forma, o magistrado, assim entendendo necessário, utilizar-se-á do contador do juízo para a elaboração de memória de cálculo discriminada.

            A segunda parte, porém, demonstra desconhecimento da realidade diária dos fóruns, na medida em que torna obrigatório o uso de contador do juízo, pelo magistrado, nos casos de assistência judiciária.

            Somente quem labutou nas lides processuais civis, sobretudo em juízos federais, em que, devido a existência de enormes contigentes de ações previdenciárias, que na sua maioria esmagadora contém aposentados litigando sob os auspícios da assistência judiciária, sabe que o dispositivo em questão irá abarrotar de processos os setores de cálculos dos fóruns, tornando mais lenta a tramitação dos feitos, já que a elaboração de memória de cálculo não é tarefa que se executa de forma rápida.

            Entendemos que tais cálculos são de inteira responsabilidade do credor, não podendo ser deixados para o juízo, a quem acabe apenas a conferência dos valores apresentados pelas partes e não a elaboração dos mesmos. Essa, inclusive, é a função do contador que é do juízo e não do credor, devedor ou das partes.

            O parágrafo 4º, do artigo 475-B afirma que se o credor não concordar com os cálculos feitos pelo contador do juízo, à luz do disposto na primeira parte parágrafo anterior, ou seja, nos casos em que a memória apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão, fará ele a execução pelo valor originalmente pretendido, devendo, porém, a penhora recair sobre o valor apurado pela contadoria do juízo.

            O artigo 475-C trata dos casos em que se fará a liquidação por arbitramento, repetindo o revogado texto do artigo 606, do Código de Processo Civil.

            Os artigos 475-E, 475-F e 475-G tratam da liquidação por artigos, não havendo qualquer alteração na sistemática outrora prevista nos artigos 608 a 610, revogados pela Lei nº 11.232, de 2005.

            Por fim, o artigo 475-H traz substancial mudança a liquidação da sentença ao prever que o julgamento dela será feito através de decisão e não mediante sentença, como era previsto no parágrafo único do artigo 607, do Código de Processo Civil, o que desafiava o recurso de apelação, que era recebida só no efeito devolutivo, conforme previa o também revogado artigo 520, III, do Código de Processo Civil. Agora, proferida decisão, caberá agravo de instrumento, que, via de regra, não tem efeito suspensivo, podendo a execução prosseguir, de igual forma, rumo à satisfação do credor, demonstrando, de forma categórica, que a autonomia da fase executiva foi abolida pelo legislador infraconstitucional.


3. DA AUTO-EXECUÇÃO

            Outra alteração trazida pela Lei nº 11.232, de 2005 foi a que revogou os artigos 570 e 605, do Código de Processo Civil, o primeiro que permitia ao devedor apresentar auto-execução e os segundo que facultava a este, no caso do artigo 570, apresentar memória de cálculo discriminada.

            É certo que a liquidação e cumprimento da sentença são fases lógicas, posteriores à sentença. Porém, o parágrafo 1º do artigo 475-A, com a redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005 afirma que deve haver requerimento de liquidação.

            Porém, não obstante a revogação dos artigos 570 e 605, entendemos que não houve a supressão da auto-execução, na medida em que o parágrafo 1 do artigo 475-A não afirma que o requerimento será feito apenas pelo credor. Diz apenas que do requerimento de liquidação "será a parte intimada", podendo aqui ser entendida como parte tanto o credor como o devedor.

            Questão que poderia surgir seria o caso de interesse do devedor em apresentar memória discriminada de cálculo, com vistas ao adimplemento da obrigação representada na sentença, ser obstado pelo fato de que os dados existentes de que dependa a elaboração do cálculo estarem em poder do credor. É uma situação inversa daquela prevista no artigo 475-B e parágrafos.

            Segundo Nelson Rosenvald, o Código Civil de 2002 persegue três grandes paradigmas, que são o princípio da socialidade, o princípio da eticidade e o princípio da eticidade [07].

            Pelo princípio da socialidade, que nos interessa no momento, o ordenamento jurídico outorga a um subjetivo um direito subjetivo, para que o indivíduo satisfaça um interesse próprio. Todavia, este direito é condicional, na medida em que a satisfação do interesse do indivíduo não poderá causar lesão às expectativas da coletividade. Ou seja, o direito subjetivo deve ser exercitado juntamente com sua função social.

            No campo obrigacional, o princípio incide de forma que os partícipes da relação jurídica e também com a sociedade, seja possível o atingimento da finalidade comum natural em uma relação jurídica de natureza obrigacional que é o adimplemento.

            Dessa forma, não há que se falar tão-somente em interesse do credor de receber, mas também existe o interesse do devedor em pagar e, em última análise, da coletividade em que as relações obrigacionais atinjam sua finalidade natural que é o adimplemento.

            Ora, no caso em que a elaboração de memória de cálculo pelo devedor depender de dados existentes em posse do credor, não obstante o artigo 475-B, com redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005, prever a situação inversa, ou seja, dados em posse do devedor, nada impede que o juiz, por analogia, se use do artigo 475-B a fim de requisitar tais dados, a requerimento do devedor, fixando prazo de 30 dias para que o credor cumpra a diligência, sendo que, em caso de não atendimento justificado, reputar-se correto os cálculos apresentados pelo devedor.

            A aplicação do artigo 475-B, por analogia, quando o requerente é o devedor encontra respaldo no princípio da socialidade, na medida em que, como já dissemos, é direito do devedor de adimplir da obrigação, libertando-se do dever imposto pela relação obrigacional, com o atingimento do fim natural das obrigações, que é o adimplemento.


4. DO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA

            A mudança mais significativa trazida com a Lei nº 11.232, de 2005 encontra-se no acréscimo do Capítulo X – "Do cumprimento da sentença".

            O artigo 475-I, em seu caput, promove, de forma contundente, a execução por quantia certa como uma fase do processo ordinário. O dispositivo em questão tem o seguinte texto, in verbis:

            "Art. 475-I. O cumprimento da sentença far-se-á conforme os arts. 461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigação por quantia certa, por execução, nos termos dos demais artigos deste Capítulo".

            Assim, sendo obrigação de fazer ou não fazer, ou nas obrigações de dar, a sentença que decide tais obrigações será cumprida em conformidade com o artigo 461, para as obrigações de fazer ou não fazer, e 461-A para as obrigações de entregar alguma coisa.

            Aqui nenhuma mudança há, na medida que o artigo 461, do Código de Processo Civil teve sua redação dada pela Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, e o artigo 461-A foi acrescentado pela Lei nº 10.444, de 07 de maio de 2002.

            Ipso facto, nas obrigações de fazer ou não fazer, ou de entregar alguma coisa, há tempo que inexiste autonomia da fase executória, bastando, tão-somente, que o magistrado intime o devedor a cumprir a obrigação, fixando prazo hábil para o cumprimento.

            O artigo 475-I, porém, trata, em sua segunda parte da obrigação por quantia certa, que será feita nos termos dos demais artigos do Capítulo X, do Título VIII, Livro I, do Código de Processo Civil.

            Este artigo tem dois parágrafos. O primeiro traz a definição de execução definitiva, como sendo aquela em que a sentença transitou em julgado e a provisória, em que houve impugnação da sentença mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo.

            O parágrafo 2º prescreve que, quando na sentença houver um aparte líquida e outra ilíquida, poderá o credor promover simultaneamente a execução da parte líquida e, em autos apartados, a liquidação da parte ilíquida.

            Cremos que não havia necessidade de previsão da formação de autos apartados para a execução da parte líquida. Apenas para argumentar, nos casos em que se formava autos suplementares ou a revogada carta de sentença, assim se fazia pelo fato de que o processo principal subia, em grau recursal, às instâncias superiores, permanecendo, em primeira instância os suplementares e a carta de sentença para prosseguimento da execução provisória.

            Ora, na sistemática trazida pela Lei nº 11.232, de 2005, os autos principais permanecerão em primeira instância, já que, no caso da parte líquida, poderá a parte apresentar impugnação, nos termos do artigo 475-L, a qual será resolvida mediante decisão, que desafia agravo de instrumento, mesma situação prevista para a liquidação da parte ilíquida, também resolvida através decisão, da qual se interpõe agravo de instrumento.

            Em suma, em qualquer dos casos os autos principais permanecem em primeira instância, não havendo qualquer prejuízo ao andamento da execução da parte líquida ou a liquidação da parte ilíquida.

            Por outro lado, a formação de autos apartados significa gasto desnecessários com papel por exemplo, sendo que as questões poderão ser resolvidas no bojo de um único processo, evitando-se, inclusive, o pagamento em duplicidade que pode ocorrer pela existência de dois processos, fato este não impossível de ocorrer, sobretudo em ações em que a Fazenda Pública, principalmente Federal, é ré e que o elevado número de processos dificulta o controle por parte dos advogados públicos.

            Pelo artigo 475-J, caput, não há mais citação do devedor para pagar em 24 horas. Condenado o devedor ao pagamento de quantia certa ou já terminada a fase de liquidação, terá ele o prazo de 15 (quinze) dias para efetuar o pagamento.

            Caso não o faça no prazo de 15 (quinze) dias, o montante da condenação será acrescido de uma multa no percentual de 10 (dez) por cento. Ademais, a requerimento do credor, que deverá instruí-lo com demonstrativo de débito atualizado até a data da propositura do requerimento [08], quando então se expedirá mandado de penhora e avaliação.

            Procedida a penhora e elaborado o auto de penhora pelo oficial de justiça, será o executado intimado de imediato, na pessoa de seu advogado, nos termos dos artigos 236 e 237.

            Não se faz necessária a intimação pessoal do devedor da penhora efetuada. Poderá tal intimação ser feita ao defensor do demandado nos termos previstos nos artigos 236 e 237, do Código de Processo Civil, somente sendo feita a intimação pessoal ou na pessoa de seu representante legal, quando da falta de defensor, casos em que poderá ser feito por mandado ou pelo correio.

            A intimação é necessária pois, a partir dela é que se começa a contar o prazo de 15 (quinze) dias para o oferecimento de impugnação.

            Se o oficial de justiça não puder efetuar a avaliação pelo fato de a mesma depender de conhecimentos especializados, preconiza o parágrafo 2º do artigo 475-J que o magistrado deverá, de imediato, nomear avaliador, para a realização de laudo técnico a ser apresentado no prazo fixado pelo juiz.

            O exeqüente poderá, no requerimento a que alude o caput do artigo 475-J, indicar os bens a serem penhorados, consoante previsão do parágafo 3º do artigo em tela. Aqui muda-se de forma substancialmente a forma de nomeação de bens à penhora.

            Pela sistemática do artigo 652, do Código de Processo Civil, aplicável, ainda, às execuções de título executivo extrajudicial, o devedor é citado para em 24 (vinte e quatro) horas pagar ou nomear bens à penhora. Ou seja, o direito de nomear é do devedor, que somente poderá ser recusada pelo credor se não for obedecida a ordem prevista no artigo 655, do Código de Processo Civil, além das situações previstas nos inciso II a VI do artigo 656, do Codex Processual, sendo que, não cumprida a exigência, pelo devedor, do previsto no artigo 656, é que será devolvido ao credor o direito à nomeação.

            Pelo parágrafo 3º do artigo 475-J o direito à nomeação é do credor, sobretudo porque o caput do artigo em questão fixa prazo de 15 (quinze) dias para o devedor tão-somente pagar a quantia, não havendo a faculdade prevista no artigo 652, do Código de Processo Civil de pagar ou nomear bens à penhora. Esse direito, todavia, deve ser exercido no momento de apresentação do requerimento previsto no caput do artigo 475-J.

            Não exercida a faculdade prevista no parágrafo 3º do artigo 475-J, caberá ao oficial de justiça efetuar a penhora, não sendo transferido ao devedor o direito de nomear bens à penhora por ausência de disposição legal neste sentido.

            No caso de o devedor, no prazo previsto no caput do artigo 475-J proceder ao pagamento parcial, a multa de 10 (dez) por cento prevista incidirá somente sobre o remanescente. É o que prescreve o parágrafo 4º, do artigo em estudo.

            Por fim, o parágrafo 5º do artigo 475-J prevê um prazo máximo em que os autos deverão permanecer em cartório esperando que o credor inicie a execução. Esse prazo é de 6 (seis) meses, ao final do qual o juiz mandará arquivar os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento a pedido da parte, entendendo-se aqui por "parte", tanto o credor como o devedor.

            Na execução por quantia certa de título de executivo judicial não existe mais a figura dos embargos à execução, verdadeira excrescência jurídica, que só tinha a função de tornar morosa a satisfação da obrigação representada pela sentença.

            Prevê a Lei nº 11.232, de 2005 a figura da impugnação, que deverá ser oferecida pelo devedor no prazo de 15 (quinze) dias, contados da intimação da penhora.

            A impugnação contudo, somente poderá versar sobre as questões previstas nos incisos I a IV do artigo 475-L, cuja redação transcrevemos abaixo:

            "Art. 475-L. A impugnação somente poderá versar sobre:

            I – falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;

            II – inexigibilidade do título;

            III – penhora incorreta ou avaliação errônea;

            IV – Ilegitimidade das partes;

            V – excesso de execução;

            VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença".

            Aqui não andou bem o legislador em alguns pontos.

            Os incisos I, III e VI não apresentam qualquer problema, não merecendo, portanto, maiores comentários. Os incisos II e V merecem alguns comentários.

            O problema encontra-se no IV, cuja inserção pelo legislador consideramos imprópria. Ora, o cumprimento da sentença é fase do processo de conhecimento. A ilegitimidade de parte é causa de carência da ação. Logo, no processo ordinário, a sua alegação deve se dar, nos termos do artigo 301, inciso X, do Código de Processo Civil, quando da apresentação da contestação, como preliminar ao mérito.

            Essa questão é, posteriormente analisada pelo magistrado quando do saneamento do processo.

            Possibilitar ao devedor que, em sede de impugnação venha a rediscutir, novamente, questão já apreciada ou acobertada pela preclusão por não ter sido alegada em momento oportuno é no mínimo um contra-senso quando se quer buscar uma maior celeridade na fase de execução.

            Se a ilegitimidade ocorrer por fato superveniente à sentença, envolvendo qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como por exemplo, a assunção de dívida prevista no artigo 299, do Código Civil, tal situação insere-se dentre as previstas no inciso VI, do artigo 475-L.

            O inciso V parece igualmente absurdo, mas não o é. Trata ele da possibilidade de impugnação quando esta versar sobre o excesso de execução. Ora, ou a sentença é líquida, com valor certo, fixado pelo magistrado ou ela é ilíquida e, neste caso, existe o instituto da liquidação de sentença, oportunidade em que o devedor terá a oportunidade de discutir sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e duplo grau de jurisdição o valor correto a ser pago, podendo, apresentar recurso de agravo de instrumento da decisão que resolve a liquidação.

            Ocorre que o caput do artigo 475-J expõe que o requerimento do credor deverá ser instruído com demonstrativo de débito atualizado e, é justamente nessa atualização que podem ocorrer erros ou abusos que venham a trazer excesso de execução.

            Nestes casos, deverá o executado declarar, de imediato, na impugnação, qual o valor que entenda correto, sob pena de rejeição liminar da impugnação (Art. 475-L, § 2º).

            No tocante ao inciso II a inexigibilidade poderá dar-se quando o título judicial estiver fundado em lei ou ato normativo que venham a ser declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou, ainda, fulcrado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Pretório Excelso como incompatíveis com a Carta Magna, conforme dicção do parágrafo 1º, do artigo 475-L.

            Seja que situação for, a impugnação, de regra, não tem efeito suspensivo. Poderá o magistrado, contudo, atribuir-lhe efeito suspensivo quando presentes dois requisitos cumulativos: relevância dos fundamentos apresentados pelo devedor e possibilidade de ocorrência de grave dano de difícil ou incerta reparação. É o que prescreve o caput do artigo 475-M.

            O parágrafo 1º, do artigo 475-M afirma, contudo, que o efeito suspensivo poderá ser arrostado pelo credor quando oferecer e prestar caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos, caso em que a execução terá seu prosseguimento normal.

            Segundo o parágrafo 2º, do artigo 475-M, em caso de deferimento do efeito suspensivo, com a paralisação do andamento da execução, a impugnação será instruída e decidida nos próprios autos. Se não for conferido efeito suspensivo à impugnação, deverá ela ser desentranhada dos autos principais, formando-se autos apartados que deverão ser distribuídos por dependência ao feito principal.

            Da decisão que defere ou não o efeito suspensivo cabe algum recurso? Aqui cabe o recurso de agravo de instrumento, tendo em vista se tratar de decisão interlocutória suscetível de causar lesão grave de difícil reparação [09]. Importa ressaltar, porém, que nos casos em que a decisão resolver a impugnação, dada a sua natureza de resolução da questão posta, com a conseqüente extinção da execução, o recurso cabível será o de apelação, à luz do parágrafo 3º, do artigo 475-M.

            O artigo 475-N traz o rol de títulos executivos judiciais, rol esse taxativo, já que as partes não podem criar outros títulos executivos, que somente por lei podem ser criados.

            O inciso I, do artigo 475-N, acrescentado pela Lei nº 11.232, de 2005, afirma que é título executivo judicial a sentença proferida no bojo do processo civil, que venha a reconhecer a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia. O inciso II trata da sentença penal condenatória transitada em julgado. O inciso III, da sentença homologatória de conciliação e transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo. O inciso IV, da sentença arbitral.

            O inciso V, traz nova situação, que é dos acordos judiciais, de qualquer natureza, que venham a ser homologados judicialmente. A situação é distinta daquela prevista no inciso III, do artigo 475-N, que traz situações em que há conciliação ou transação dentro de uma ação em curso. Nestes casos, obtida a composição intra-autos, o juiz profere sentença homologando o acordo, que, por força do disposto no supracitado inciso III, tem força executiva.

            A situação trazida pelo inciso V regula casos em que há composição das partes sem ação em curso. Nestes casos, a lei faculta às partes, inclusive como medida de celeridade, se valer do Judiciário para homologar tais acordos. Feito isto, o acordo extrajudicial passa a ter força executiva, transmudando-se em título executivo judicial.

            O inciso VI traz alteração visando adequar-se a Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004. Tal Emenda Constitucional acresceu a alínea "i" ao artigo 105 da Constituição Federal, passando ao Superior Tribunal de Justiça a competência para a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias.

            A par dessa alteração, o inciso VI, do artigo 475-N prevê que a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça constitui-se em título executivo judicial.

            O inciso VII afirma que o formal e a certidão de partilha são títulos executivos judiciais, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal, deixando claro o dispositivo sobre quem tem legitimidade passiva nestes casos.

            O parágrafo único prescreve que relativamente aos incisos II, IV e VI o mandado inicial previsto no artigo 475-J conterá a ordem de citação do devedor, no juízo cível, para liquidação ou execução, conforme o caso. Aqui se fala em citação pelo fato de inexistir anterior processo de conhecimento, o que se dá, por exemplo, nos casos preconizados no inciso I, do artigo 475-N.

            O artigo 475-O trata da execução provisória antes prevista no artigo 588, revogado pela Lei nº 11.232, de 2005.

            O inciso I afirma que corre por iniciativa [10], conta e responsabilidade do exeqüente, que ficará obrigado no caso de reforma da sentença, a reparar os danos [11] que o executado venha a sofrer.

            A execução ficará sem efeito nos casos em que acórdão venha modificar ou anular a sentença objeto da execução. Haverá a restituição das partes ao estado anterior, devendo ser liquidados, por arbitramento, eventuais prejuízos causados. Se a modificação ou anulação for parcial, somente nesta parte ficará sem efeito a execução, à luz do parágrafo 1º, do artigo 475-O.

            O inciso III trata de três situações. A primeira é o caso de levantamento de depósito em dinheiro, o segundo a prática de atos que importem alienação de propriedade [12] e o terceiro a prática de quaisquer atos que possam resultar em grave dano ao executado.

            Em todos os casos, deverá ser prestada caução suficiente e idônea, a ser arbitrada de plano pelo magistrado, prestada nos próprios autos.

            Essa caução, porém, poderá ser dispensada nas situações previstas no parágrafo 2º, do artigo 475-O, cuja redação transcrevemos, in verbis:

            "Art. 475-O omissis.

            [...]

            § 2º A caução a que se refere o inciso III do caput deste artigo poderá ser dispensada:

            I – quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário-mínimo;

            II – nos casos de execução provisória em que penda agravo de instrumento junto ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (art. 544), salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação".

            O inciso I repete o disposto no parágrafo 2º, do artigo 588, revogado pela Lei nº 11.232, de 2005, apenas acrescentando o caso de o crédito ser decorrente de ato ilícito.

            Quanto ao inciso II, vê-se, que o dispositivo em questão faz alusão ao artigo 544, do Código de Processo Civil trata do recurso interposto da não-admissão de recurso extraordinário ou recurso especial, quando, então, caberá. agravo de instrumento, respectivamente, ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de nova situação de dispensa da caução.

            É certo que o agravo de instrumento, de regra, não tem efeito suspensivo, podendo o relator, nos casos previstos no artigo 558, conceder tal efeito ao recurso.

            Por outro lado, tanto o recurso especial como o extraordinário não tem efeito suspensivo, consoante dicção do parágrafo 2º do artigo 542, do Código de Processo Civil, podendo o tal efeito ser concedido em alguns casos, conforme doutrina e jurisprudência sobre o assunto, em casos que justifiquem a medida.

            Dessa forma, o disposto no inciso II, do parágrafo 2º, do artigo 475-O insere-se nesta sistemática legal. Se, de regra o agravo de instrumento, bem como o recurso especial ou extraordinário não têm efeito suspensivo, seria absurdo exigir-se caução quando o único recurso pendente é o agravo de instrumento interposto contra decisão que denegou seguimento a recurso extraordinário ou especial.

            Andou bem, portanto, o legislador com essa alteração.

            O parágrafo 3º do artigo 475-O trata das peças que deverão instruir o requerimento de execução provisória. Aqui cabem algumas considerações. Para melhor compreensão, portanto, transcrevemos o parágrafo 3º, in verbis:

            "Art. 475-O omissis.

            [...]

            § 3º Ao requerer a execução provisória, o exeqüente instruirá a petição com cópias autenticadas das seguintes peças do processo, podendo o advogado valer-se do disposto na parte final do art. 544, § 1º:

            I – sentença ou acórdão exeqüendo;

            II – certidão de interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo;

            III – procurações outorgadas pelas partes;

            IV – decisão de habilitação, se for o caso;

            V – facultativamente, outras peças processuais que o exeqüente considere necessárias.

            Em primeiro lugar, os documentos poderão ser instruídos com cópias autenticadas ou, poderá o advogado, nos termos do artigo 544, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil, declarar as cópias autênticas, sob sua responsabilidade pessoal, medida certamente mais econômica ao seu cliente.

            O artigo 475-P traz regra de fixação de competência do juízo para o cumprimento da sentença. Assim, pelo dispositivo inserido pela Lei nº 11.232, de 2005, o cumprimento da sentença será efetuado perante os tribunais, nas causas de sua competência originária (inciso I), no juízo em que se processou a causa no primeiro grau de jurisdição (inciso II) ou no juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira (inciso III). Apesar de não dito expressamente, o inciso III abarca, outrossim, os casos acordo extrajudicial, de qualquer natureza, homologado judicialmente (Art. 475-N, V).

            O parágrafo único traz uma norma inovadora. O caso preconizado pelo inciso II, o exeqüente poderá optar pelo Juízo do local onde se encontrarem os bens sujeitos à expropriação ou pelo atual domicílio do executado. Nestes casos, pelo exeqüente deverá ser requerida a remessa dos autos ao juízo de origem, situação de que deverá ser atendido pelo magistrado, que não poderá se recusar em remeter os autos.

            Essa remessa, porém, deverá observar as regras de competência fixadas na Constituição e do Código de Processo Civil. Assim é que, uma ação processada em uma Vara Federal não poderá ser remetida ao Juízo Estadual para cumprimento da sentença e vice-versa.

            O artigo 475-Q trata dos casos em que envolva a prestação de alimentos, outrora prevista no artigo 602, revogado pela Lei nº 11.232, de 2005.

            Por fim, ressalte-se que o artigo 475-R afirma que as normas que regem o processo de execução de título extrajudicial serão aplicáveis, no que couber, ao cumprimento da sentença.


5. QUESTÕES FINAIS

            O artigo 5º e 6º, da Lei nº 11.232,, de 2005 trouxeram, respectivamente, alterações no Capítulo II, do Título III, do Livro II e no artigo 1.102-C, do Código de Processo Civil.

            O artigo 5º traz a seguinte redação, in verbis:

            "Art. 5º O capítulo II do Título III do Livro II da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 –Código de Processo Civil, passa a ser denominado "DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA" e seu artigo 741 passa a vigorar com a seguinte redação";

            Dessa forma, o antigo capítulo que tratava dos embargos à execução fundada em sentença dão lugar tão-somente aos embargos à execução interpostos contra a Fazenda Pública.

            Logo, para os casos em que a Fazenda Pública for devedora não há qualquer alteração com a Lei nº 11.232, de 2005, aplicando-se, nestes casos o rito previsto nos artigos 730 e 731, do Código de Processo Civil, podendo haver, pela Fazenda Pública, a interposição de embargos à execução, instrumento este que foi substituído pela Impugnação prevista no artigo 475-L.

            Qual a razão disso. Não haveria como se estender as ações em que a Fazenda Pública fosse ré, a sistemática prevista nos artigos 475-I e seguintes, mesmo que com algumas limitações.

            Ao prever a possibilidade de interposição de embargos à execução contra a Fazenda Pública, tem-se que, em sede de embargos haverá prolação de sentença, da qual caberá apelação.

            Nunca é demais ressaltar que, contra a Fazenda Pública não cabe execução provisória, já que o artigo 100, da Constituição Federal, dispõe que os pagamentos efetuados pela Fazenda Pública deverão ser feitos ou mediante precatório ou mediante requisição de pequeno valor, quando o montante não for superior a 60 (sessenta) salários mínimos. Em ambos os casos, deverá o instrumento ser instruído com certidão de transito em julgado.

            Ora, se há recurso pendente, mesmo que seja de agravo de instrumento, não há como se falar em transito em julgado. Dessa forma, a adoção para os casos em que a ré for a Fazenda Pública do rito previsto nos artigos 475-I e seguintes seria inócua, justamente pelo fato de inexistir execução provisória contra à Fazenda Pública, sendo a ela inaplicável o disposto nos artigos 475-O.

            Porque, então, criar instrumento de impugnação, que em tese não terá efeito suspensivo, se tal situação não terá efeito prático, principalmente pela necessidade de instrução do precatório ou do RPV com certidão de trânsito em julgado.

            É neste contexto, portanto, que o legislador decidiu manter o instituto dos embargos à execução interpostos contra a Fazenda Pública.

            Assim, a Fazenda Pública será citada para embargos à execução no prazo de 30 (trinta) dias, observando-se quanto ao mais, o disposto nos artigos 730 e 731, do Código de Processo Civil.

            O artigo 6º, da Lei nº 11.232, de 2005, trouxe alterações no caput e parágrafo 3º artigo 1.102-C, do Código de Processo Civil, que trata da ação monitória. A novel redação do caput e parágrafo 3º assim ficou, in verbis:

            "Art. 1.102-C. No prazo previsto no artigo 1.102-B, poderá o réu oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do mandado inicial. Se os embargos não forem opostos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo e prosseguindo-se na forma do Livro I, Título VIII, Capítulo X, desta Lei

            [...]

            § 3º Rejeitados os embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, intimando-se o devedor e prosseguindo-se na forma prevista no Livro I, Título VIII, Capítulo X, desta Lei".

            Logo, não opostos embargos, constitui-se, plero iure, o título executivo judicial, devendo ser observado o disposto no Código de Processo Civil para o cumprimento da sentença (Livro I, Título VIII, Capítulo X), mesma situação preconizada pela nova redação do parágrafo 3º, do artigo 1.102-C, quando houver rejeição dos embargos.

            Por fim, a lei somente entrará em vigor 6 (seis) meses após a data de sua publicação, consoante prescreve o artigo 8º, da Lei nº 11.232, de 2005.


CONCLUSÕES

            A lei trouxe importantes alterações. Como vimos, deu-se grande passo no sentido de tornar mais célere a satisfação da obrigação representada na sentença.

            Acabou-se, portanto, com o processo de execução nos casos de execução de sentença de fazer, não-fazer ou por quantia certa, remanescendo, quanto a esta, somente os casos em que a execução for proposta contra a Fazenda Pública.

            Portanto, criaram-se mecanismos visando a celerizar o cumprimento da sentença, principalmente pela abolição dos embargos à execução e a criação, em seu lugar, da impugnação, que, de regra, não terá efeito suspensivo.

            Muito precisa ser feito, contudo, para atingirmos uma justiça célere. Não bastam leis que tornem mais dinâmico o procedimento. É preciso que o Estado se conscientize da necessidade de efetuar investimentos na infra-estrutura do Poder Judiciário, com modernização dos equipamentos, contratação de servidores e juízes, capacitação de servidores.

            De qualquer forma, um importante passo foi dado, sendo uma importante resposta à sociedade brasileira que clama por um Judiciário célere e eficiente.


BIBLIOGRAFIA

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            ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais.

            BOTELHO, Marcos César Botelho. Recurso extraordinário em execução fiscal. Dissertação de conclusão de curso. Jaú: Faculdade de Direito de Jaú, 2001.

            CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. II, 2004.

            CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 11. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

            COUTURE, Eduardo J. Fundamentos del Derecho Procesal Civil. 3. ed. Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1997.

            EVANGELISTA, Stefanomaria & IANNELLI, Domenico. Manuale Di Procedura Civile. Milano: Editrice Torinese, 1996.

            FERREIRA, Fernando Amâncio. Curso de processo de execução. Coimbra: Livraria Almedina, 1999.

            ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações. 3. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004.


Notas

            01 ASSIS, Araken de. Op. cit., p. 120

            02 "Título executivo é cada um dos atos jurídicos que a lei reconhece como necessários e suficientes para legitimar a realização da execução, sem qualquer nova ou prévia indagação acerca da existência do crédito". WAMBIER, Luiz Rodrigues et alii. Op. cit., p. 46.

            03 COUTURE, Eduardo J. Fundamentos del derecho procesal civil, p. 277.

            04 A redação revogada dizia: "Art. 463. Ao publicar a sentença de mérito, o juiz cumpre e acaba o ofício jurisdicional".

            05 CPC, art. 461-A, caput.

            06 "Art. 362. Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a exibição, o juiz lhe ordenará que proceda ao respectivo depósito em cartório ou noutro lugar designado, no prazo de cinco dias, impondo ao requerente que o embolse das despesas que tiver; se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, tudo sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência".

            07 ROSENVALD, Nelson. Direito das obrigações, p. 17.

            08 O artigo 475-J remete ao disposto no artigo 614, II, do Código de Processo Civil, que fala em demonstrativo de débito atualizado até a data da propositura da ação. Ocorre que, no caso preconizado nos artigos 475-I e seguintes, não há nova ação executória, devendo o demonstrativo ser atualizado até a data do requerimento para a expedição do mandado de penhora e avaliação.

            09 CPC, art. 522, com redação dada pela Lei nº 11.187, de 19 de outubro de 2005.

            10 O revogado artigo 588 não trazia essa afirmação de que a execução provisória deveria correr por iniciativa do credor.

            11 A redação do artigo 588 falava em "prejuízos".

            12 O revogado inciso II, do artigo 588, que previa a questão, falava em alienação de domínio.


Autor

  • Marcos César Botelho

    Marcos César Botelho

    Advogado da União, Coordenador-Geral de Atos Normativos na CONJUR do Ministério da Defesa. Doutorando em Direito pela Instituição Toledo de Ensino - Bauru/SP. Mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direitio Público - Brasília/DF.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BOTELHO, Marcos César. Comentários às alterações da Lei nº 11.232/2005. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 923, 12 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7828. Acesso em: 26 abr. 2024.