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EFEITOS DO COVID-19 SOBRE O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

EFEITOS DO COVID-19 SOBRE O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

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Breve reflexão acerca dos impactos causados pela pandemia no, já fragilizado, sistema penitenciário brasileiro.

A pandemia do COVID-19 tem reflexos em diversos ramos do direito. Neste contexto é impossível não pensar nas consequências deste problema no, já precário, sistema prisional brasileiro. Vale ressaltar que em 2015 foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal o “estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário brasileiro”, nos autos da ADPF 347, frente a precariedade das nossas instituições prisionais.

Prisões, em sua maioria, superlotadas e com condições de higiene que beiram o desumano. Essa é a realidade de grande parte das unidades do nosso sistema carcerário, nestas circunstâncias a disseminação do vírus pelos presídios brasileiros tende a ser catastrófica. Cumpre ressaltar que os presos estão sob a tutela do estado, que tem responsabilidade objetiva por eventuais danos a integridade física dos detentos causada pela omissão do poder público.

Dado o exposto, conclui-se que é imprescindível que o estado tome medidas para barrar, ou, pelo menos, minimizar o avanço do Corona Vírus no sistema prisional brasileiro.

Notadamente, estando os presos reclusos, para que haja contaminação seria necessário que o vírus chegasse de fora para dentro das instituições. Por esta ótica o contágio pode se dar de três formas: funcionários, visitantes e novos presos. O cenário ideal seria que antes de adentrar nas unidades prisionais todos fossem testados para evitar o contágio, porém, como isso é inviável tecnicamente, devem ser adotadas medidas contingenciais.

Em relação aos funcionários dos presídios não há muito o que fazer, se não determinar o afastamento preventivo daqueles que apresentem sintomas.

Em contraponto, a visitação tem se mostrado um ponto bastante difícil de enfrentar. À primeira vista pode parecer simples, basta proibir as visitas, porém o problema está longe de poder ser resolvido tão facilmente. Primeiro porque a lei de execuções penais, em seu artigo 41 (que trata dos direitos dos presos), em seu inciso X, prevê o direito de visitação, portanto, em nosso entendimento é possível limitar esta garantia, mas não extirpá-la.

Atualmente sete estados proibiram a entrada de visitantes (o que entendemos ser ilegítimo, cabendo ao judiciário dirimir tal controvérsia mediante provocação), e outros oito restringiram as visitas proibindo, por exemplo, o ingresso de pessoas com sintomas suspeitos (tal medida já nos parece mais adequada). Outra medida bastante válida é fracionar os dias de visitas para evitar aglomerações.

Não nos limitando ao aspecto jurídico do problema, é fato notório que sempre que há restrição ou proibição de visitas nas instituições prisionais ocorrem rebeliões e atos de retaliação dentro e fora dos presídios. É necessário ter cautela ao determinar este tipo de medida, pois tudo que o país não precisa agora é uma nova crise penitenciária para lidar.

Já em relação à entrada de novos presos a suspensão dos prazos anunciada no dia 19/03 pelo CNJ deve reduzir bastante este fenômeno, visto que basicamente só irá prosseguir a marcha processual onde já hajam réus em ergastulo. De mesma sorte, a recomendação n.º 62 do CNJ, determina aos juízes a aplicação de prisão preventiva apenas em caráter excepcionalíssimo.

Para os presos civis (devedores de pensão alimentícia), a supramencionada recomendação sugere aos juízes a aplicação da prisão domiciliar, medida que nos parece mais adequada. Inclusive, dada a não taxatividade do rol de situações em que é aplicável a domiciliar, esta se torna uma das melhores ferramentas para garantir a integridade dos presos durante a pandemia.

Neste ponto, entendo ser cabível a prisão domiciliar a todos os presos que se enquadrem nos grupos de risco para o COVID-19, podendo a mesma ser requerida junto ao juízo da execução penal ou através de Habeas Corpus.

Outra possibilidade que vem sendo comentada no meio jurídico é a de um decreto de indulto, tal medida poderia ser positiva por aplacar os ânimos (evitando possíveis rebeliões) e reduzir a superlotação dos presídios. Todavia, vale lembrar que esta é uma faculdade do presidente, portanto, é escolha dele o se e o como de um possível indulto.

Pela leitura dos fatos, o que se conclui é a necessidade imediata de medidas de enfrentamento do atual momento de crise na saúde brasileira e mundial, com vistas a evitar que tal problema chegue às instituições do nosso sistema carcerário, tendo em vista que as consequências de um eventual contágio poderiam ser desastrosas.

Por outro lado, se é possível retirar algo de positivo deste momento tão delicado é a percepção da necessidade de adoção de políticas voltadas para a redução da superpopulação das prisões, bem como, a garantia de condições de vida e higiene dignas, condizentes com o modelo de ressocialização que se pretende adotar em nosso país, mas que nunca saiu do papel.


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