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Educação inclusiva como direito de todos.

Inconstitucionalidade do Decreto nº 10.502/2020 frente à Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

Educação inclusiva como direito de todos. Inconstitucionalidade do Decreto nº 10.502/2020 frente à Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

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Todas as normas jurídicas devem respeito ao direito fundamental de todos ao ensino inclusivo, instituído constitucionalmente pela Convenção de Nova York. Qualquer regulamento posterior que impuser restrições ao seu alcance incorre em flagrante inconstitucionalidade, a ser declarada pelo Poder Judiciário.

Em nossos dias, o direito fundamental à educação constitui interesse social, indisponível, público e subjetivo (arts. 6º, caput, 205 e 208, III, e § 1º, da Constituição Federal; art. 53. do Estatuto da Criança e do Adolescente).

A repercussão desses conceitos para as pessoas com deficiência somente pode ser melhor compreendida mediante o estudo da evolução histórica do seu direito à educação e à participação na sociedade.

Nos primórdios, vigorava a total exclusão, quando as pessoas com deficiência simplesmente não tinham acesso ao ensino.

A partir do momento em que começou a se falar em “educação especial”, é importante ressaltar que esse termo genérico pode ser utilizado para se referir a pelo menos três etapas históricas diferentes.

Primeiro, veio a fase de segregação, em que as pessoas com deficiência passaram a ter acesso à educação mas permaneciam “invisíveis”, pois eram direcionadas para escolas especializadas, substitutivas do sistema de ensino regular. Nessa época, ainda vigorava o “modelo clínico de deficiência, em que a condição física, sensorial ou intelectual da pessoa, caracterizava-se como obstáculo a sua integração social, cabendo à pessoa com deficiência, adaptar-se às condições existentes na sociedade.” 1

Depois, surgiu o modelo de integração, que passou a aceitar alguns indivíduos nas escolas regulares, mas em classes especializadas. Ou seja, “os ambientes e as atitudes de toda a sociedade seguiam inalterados e apenas as pessoas com deficiência ‘selecionadas’ por especialistas de diferentes áreas podiam ser ‘integradas’ aos ambientes sociais comuns a todos” 2. “O modelo da integração é baseado na busca pela ‘normalização’. Nega-se a questão da diferença. A integração admite exceções, uma vez que é baseada em padrões, requisitos, condições.” 3

Por fim, o paradigma contemporâneo determina a inclusão das pessoas com deficiência no sistema de educação assegurado a todos. Agora, “à sociedade cabe promover as condições de acessibilidade, a fim de possibilitar às pessoas com deficiência viverem de forma independente e participarem plenamente de todos os aspectos da vida.” 4

Modernamente, a deficiência não é mais um problema a ser afastado, mas uma condição a ser acolhida: “a condição de deficiência passou a ser compreendida como algo essencialmente oriundo do contexto social. A deficiência deixa, portanto, de ser um problema exclusivamente do sujeito e passa a ser uma questão de acessibilidade e de quebra de barreiras sociais preexistentes a esse sujeito e que precisam ser removidas.” 5

No âmbito educacional, as escolas é que precisam se preparar para receber todos os indivíduos em suas turmas regulares: “[...] a educação inclusiva é incondicional . Uma escola inclusiva é uma escola que inclui a todos, sem discriminação, e a cada um, com suas diferenças, independentemente de sexo, idade, religião, origem étnica, raça, deficiência. Uma escola inclusiva é aquela com oportunidades iguais para todos e estratégias diferentes para cada um, de modo que todos possam desenvolver seu potencial. Uma escola que reconhece a educação como um direito humano básico e como alicerce de uma sociedade mais justa e igualitária.” 6

Em vez de exigir que a pessoa seja adequada aos meios, o objetivo da inclusão escolar é eliminar obstáculos à participação das pessoas diversas na sociedade.


BRASIL: DE 1978 À CONVENÇÃO DE NOVA YORK

Ao longo das últimas décadas, pode-se identificar como a educação vem evoluindo para alcançar as pessoas com deficiência em nosso país.

Sob o regime jurídico anterior, a Emenda Constitucional nº 12, de 1978 7, assegurava às pessoas com deficiência o direito à “educação especial e gratuita”. Contudo, na época, ainda prevaleciam os modelos paralelos, substitutivos do ensino regular, por meio de escolas especializadas (segregação) ou de classes especializadas (integração).

A Constituição Federal de 1988 assegurou a matrícula das pessoas com deficiência na “rede regular de ensino”, com a oferta transversal de “atendimento educacional especializado”:

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

Sem dúvida, a constitucionalização do modelo inclusivo abriu caminho para a superação de barreiras semânticas e culturais. “Esses termos, ‘atendimento educacional especializado’ e ‘educação especial’ , constitucionalmente, não são sinônimos . Se nosso legislador constituinte quisesse referir-se à ‘educação especial’ no art. 208, III, teria repetido essa expressão que constava na Emenda Constitucional nº 01, de 1969, no Capítulo ‘Do Direito à Ordem Econômica’. Lá sim era garantido ‘aos deficientes o acesso à educação especial’, não na atual Constituição.” 8

Apesar da clara oficialização do modelo inclusivo, o uso do verbete “preferencialmente” no texto constitucional ensejou interpretações conservadoras de que se trataria de mera faculdade estatal.

Porém, as resistências à implementação do modelo inclusivo vêm sendo gradativamente afastadas por reforços jurídicos subsequentes.

Em 2008, o Ministério da Educação lançou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), que firmou as linhas gerais para a implantação da inclusão escolar no Brasil, mediante a matrícula no ensino regular e a oferta de atendimento educacional especializado. “Isso foi o início do acerto de uma dívida histórica com as pessoas com deficiência, cuja educação havia sido terceirizada pelo Estado.” 9

No mesmo ano, o Decreto n° 6.571/2008 determinou que os alunos com deficiência sejam matriculados no ensino regular e também recebam atendimento educacional especializado “de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular” (art, 1º, caput e § 1º), tendo por fim “garantir a transversalidade das ações da educação especial no ensino regular” (art. 2º, II).

As “escolas especializadas” passaram a exercer, quando muito, papel complementar ou suplementar ao ensino regular, perdendo protagonismo e verbas públicas. Previsivelmente, a mudança “desagradou as instituições que mantinham escolas especiais, uma vez que o Estado brasileiro havia decidido investir recursos não apenas nas instituições privadas, mas também na inclusão escolar pública.” 10

A evolução legislativa culminou na Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que representa o ápice da normatividade mundial sobre educação inclusiva e não deixa dúvidas sobre a obrigatoriedade do sistema educacional inclusivo, sem comportar exceções de qualquer natureza.

A norma convencional foi assinada em 2006, aprovada pelo Congresso Nacional em 2008 (Decreto Legislativo nº 186/2008) e internalizada com força constitucional a partir de sua promulgação pela Presidência da República em 2009 (Decreto nº 6.949/2009).

Foi a primeira11 norma internacional de direitos humanos a ser promulgada no Brasil com força de emenda constitucional – conforme o art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/2004:

Art. 5º. [...] § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Acima de qualquer dúvida, a referida Convenção é um ato complexo equivalente a emenda constitucional, sendo uma norma formal e materialmente constitucional. “Estamos diante de algo equivalente a uma emenda à Constituição. Portanto, ele deve vincular o legislador infraconstitucional, a Administração Pública e todos os cidadãos. Pretender dar um tratamento de norma ordinária a uma emenda constitucional é um grave erro de interpretação . Portanto, quando se fala em tais normas, estamos falando em valores que devem permear toda a legislação infraconstitucional, os atos governamentais, e deve interferir diretamente nas relações privadas, mesmo que não haja participação do Estado.” 12

Assim, encontra-se em pleno vigor norma constitucional que diz ser obrigatória a matrícula de pessoas com deficiência no sistema educacional geral: trata-se do artigo 24 da Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, internalizado na forma do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal:

“O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e

Considerando que o Congresso Nacional aprovou, por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, conforme o procedimento do § 3º do art. 5º da Constituição, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007; [...]

DECRETA: [...]

Artigo 24 – Educação

1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida [...]

2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que:

a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência;

b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao ensino secundário, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem;

c) Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas;

d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação; [...]”

Nem mesmo uma nova emenda constitucional poderia abolir o sistema educacional inclusivo em todos os níveis, porque se trata de direito fundamental inserido em cláusula pétrea, nos termos do art. 60, § 4º, da Constituição Federal.

A missão de acolher e incluir as pessoas com deficiência foi dada às instituições do sistema regular de ensino, públicas ou privadas. O Supremo Tribunal Federal, em ação em controle concentrado de constitucionalidade (ADI 5.357), confirmou que a obrigação de matricular alunos com deficiência se estende às escolas particulares. Em seu voto condutor, o Ministro Edson Fachin esclareceu não se tratar de opção:

“Ou seja, à luz da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, e, por consequência, da própria Constituição da República, o ensino inclusivo em todos os níveis de educação não é realidade estranha ao ordenamento jurídico pátrio. Ao contrário, é imperativo que se põe mediante regra explícita.

Mais do que isso, dispositivos de status constitucional estabelecem a meta de inclusão plena, ao mesmo tempo em que se veda a exclusão das pessoas com deficiência do sistema educacional geral sob o pretexto de sua deficiência.” 13

Em suma, não há dúvidas de que o ordenamento constitucional exige tanto a obrigação de inclusão no ensino regular para todos, em todos os níveis, quanto a vedação de exclusão das pessoas com deficiência do sistema educacional geral.


BRASIL: DA CONVENÇÃO DE NOVA YORK ATÉ 2020

Exarado no âmbito do poder regulamentar do Poder Executivo federal, o Decreto nº 7.611/2011 ecoou de maneira geral a Convenção de Nova York, inclusive na “garantia de um sistema educacional inclusivo” e no direito à “não exclusão do sistema educacional geral” (art. 1º, I e III). Ademais, reafirmou que a educação especial deve ser transversal (art. 3º, II), atuando na escola como um todo e até fora dela, e que o atendimento educacional especializado deve atuar de forma “complementar ou suplementar” ao ensino regular (art. 4º).

Por outro lado, essa norma permitia o “apoio técnico e financeiro pelo Poder Público às instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial” (arts. 1º, VIII, e 8º).

A fim de esclarecer que o atendimento educacional especializado não poderia ser substitutivo do ensino inclusivo, mas somente complementar ou suplementar, o Ministério da Educação emitiu a Nota Técnica nº 62/2011:

“Considerando que a Constituição Federal ocupa o topo da hierarquia no ordenamento jurídico brasileiro, a legislação infraconstitucional deve refletir os dispositivos legais nela preconizados. Sabendo que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – ONU/2006 foi ratificada pelo Brasil, com força de Emenda Constitucional, por meio do Decreto n° 6.949/2009, seus princípios e compromissos devem ser assumidos integralmente, assim como, devem ser alterados os instrumentos legais que os contrapõem. Desta maneira, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em 1996, o Decreto n° 5.626/2005 e o Decreto n° 7.611/2011 devem ser interpretados à luz dos preceitos constitucionais atuais. [...]

Identifica-se nesse contexto, uma ruptura com o modelo de educação especial substitutiva ao ensino regular, que encaminha estudantes considerados não aptos às classes e escolas especiais, separando-os dos demais. [...] O Decreto n° 7.611/2011 não retoma o conceito anterior de educação especial substitutiva à escolarização no ensino regular, mantendo o caráter complementar, suplementar e transversal desta modalidade, ao situá-la no âmbito dos serviços de apoio à escolarização, em seu art. 2º [...]. Nesse sentido, a modalidade de Educação Especial é parte integrante do ensino regular e não se constitui em sistema paralelo de educação.” 14

Incorporando a experiência, a Lei nº 12.764/2012 (Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista) foi sancionada com vetos a dois dispositivos que permitiam, ainda que excepcionalmente, o serviço educacional fora da rede regular de ensino, conforme justificou a Mensagem de Veto:

“Ao reconhecer a possibilidade de exclusão de estudantes com transtorno do espectro autista da rede regular de ensino, os dispositivos contrariam a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, internalizada no direito brasileiro com status de emenda constitucional. Ademais, as propostas não se coadunam com as diretrizes que orientam as ações do poder público em busca de um sistema educacional inclusivo, com atendimento educacional especializado nas formas complementar e suplementar.”

Vale reafirmar o conteúdo de Nota Técnica de 2013 da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal: “[...] para o alcance da inclusão escolar plena e com qualidade de todas as crianças e adolescentes com deficiência, [...] não há qualquer lógica em se manter indefinidamente a possibilidade de manutenção de ensino escolar segregacionista, em ambientes exclusivos e separados . 15

Também seguindo a linha constitucional, a Lei nº 13.146/2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), reiterou a obrigatoriedade do “sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades” (arts. 27, caput, e 28, I), a promoção da “inclusão plena” (art. 28, II) e a “adoção de práticas pedagógicas inclusivas” (art. 28, X).

Nesse contexto, é por demais preocupante que, em paralelo às “escolas regulares inclusivas” (sic), o Decreto nº 10.502, de 30 de setembro de 2020, pretenda restabelecer os fracassados modelos de segregação em “escolas especializadas”, substitutivas à rede regular de ensino, e de integração em “classes especializadas” dentro dos estabelecimentos regulares, tais como definidas pelo seu art. 2º:

“Art. 2º. [...]

VI - escolas especializadas - instituições de ensino planejadas para o atendimento educacional aos educandos da educação especial que não se beneficiam, em seu desenvolvimento, quando incluídos em escolas regulares inclusivas e que apresentam demanda por apoios múltiplos e contínuos;

VII - classes especializadas - classes organizadas em escolas regulares inclusivas, com acessibilidade de arquitetura, equipamentos, mobiliário, projeto pedagógico e material didático, planejados com vistas ao atendimento das especificidades do público ao qual são destinadas, e que devem ser regidas por profissionais qualificados para o cumprimento de sua finalidade; [...]

X - escolas regulares inclusivas - instituições de ensino que oferecem atendimento educacional especializado aos educandos da educação especial em classes regulares, classes especializadas ou salas de recursos;”

Aliás, é sintomático que apenas as escolas regulares sejam adjetivadas como “inclusivas”, pois a inclusão não é um dever apenas de alguns estabelecimentos nem um direito somente de determinadas pessoas.

O novo regulamento traz de volta antigas práticas que evocam tristes memórias, ao focar na “definição de critérios de identificação, acolhimento e acompanhamento dos educandos que não se beneficiam das escolas regulares inclusivas” (art. 9º, III), assim como na influência no “processo de decisão da família ou do educando quanto à alternativa educacional mais adequada” (art. 3º, VI).

Ou seja, permite-se a pura e simples negação à pessoa com deficiência de seu direito à educação inclusiva, com base na atribuição à família de um suposto de direito de “decisão” entre as escolas regulares e as escolas ou classes especializadas:

“A frase ‘envolvimento do estudante e da família no processo decisório’ dá margem a múltiplas interpretações, inclusive a possibilidade de o estudante ser privado de pertencer à sociedade e exercer sua cidadania na escola comum. Nesse caso, configura uma discriminação por motivo de deficiência, uma vez que a decisão de não matricular na escola comum impede o reconhecimento, o gozo e o exercício de um direito humano fundamental, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. A parceria família/escola é fundamental, não obstante, processos decisórios não podem desconsiderar a personalidade jurídica da pessoa com deficiência, pois isso levaria à invisibilidade e à exclusão social.” 16

É inaceitável que o Estado, a pretexto de conferir “opções” às pessoas com deficiência, sirva ao propósito de quem deseja apartá-las do convívio social. Calham à espécie as palavras de Meire Cavalcante, que assim se contrapôs à insistência nos modelos educacionais já superados:

“Voltaríamos, com isso, ao modelo assistencialista da escola especial , ao modelo que permite que ‘um ser superior, especializado’ determine se uma criança ou um jovem é suficientemente cidadão (ou não) para estar numa escola comum [...], tentando perpetuar um modelo falido de escola especial , que se alinha mais a depósito de pessoas do que escola.” 17

Os integrantes dos movimentos pela inclusão escolar já denunciavam há muito tempo os riscos desse revisionismo cultural:

“Sabemos como as triagens acontecem e quais são as conseqüências da hierarquização de seres humanos. [...] Assim, repudiamos qualquer tentativa de incentivar a segregação de estudantes em espaços específicos [...]. Não há o que reformar! [...] A educação inclusiva é um meio potente para que as pessoas com deficiência tenham a possibilidade de ascensão social e econômica, de progredir nos estudos, de se inserirem em postos dignos de trabalho, de ter autonomia e de ter seu lugar respeitado na sociedade. A segregação escolar, que se quer ressuscitar, significa justamente o contrário: uma vida de dependência, de limitação e de lugar social, educacional e laboral determinado por outros. Esse retrocesso é reafirmar, como era no passado, que a educação poderá ser cerceada pela vontade de terceiros.” 18

Ao permitir que pessoas vulneráveis sejam sujeitas a triagem para o ingresso ou a permanência na escola regular, legitimam-se os sistemas paralelos de escolarização em detrimento da inclusão.

Pretende-se, na verdade, a extinção do modelo de inclusão, mediante a recriação de espaços paralelos de ensino, que já haviam sido banidos do ordenamento jurídico.

O direcionamento de alunos para classes e escolas especializadas afronta violentamente a ordem jurídica, que tem como pedra angular a Convenção de Nova York. Trata-se de norma discriminatória, flagrantemente inconstitucional, que tenta subjugar um direito fundamental ao alvedrio de um simples regulamento.


INCLUSÃO E VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL

O retorno aos modelos primitivos de educação especial em escolas ou classes diferenciadas, além de não encontrar amparo na ordem constitucional vigente, esbarra no princípio da proibição do retrocesso social.

Segundo Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer, a garantia da proibição de retrocesso tem por finalidade “preservar o bloco normativo – constitucional e infraconstitucional – já construído e consolidado no ordenamento jurídico, especialmente naquilo em que objetiva assegurar a fruição de direitos fundamentais, impedindo ou assegurando o controle de atos que venham a provocar a supressão ou restrição dos níveis de efetividade vigentes dos direitos fundamentais .” 19

Ao julgar caso concreto em que o Estado de São Paulo se recusava a matricular crianças em unidades de ensino infantil próximas à sua residência (ARE 639.337 AgR), o STF assentou ser vedada a redução ou a supressão do direito à educação, cuja efetivação é compulsória:

“A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS.

O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive.

A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina.

Em conseqüência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já concretizados.” 20

Como frisaram os Ministros Edson Fachin e Celso de Mello, nos votos condutores dos mencionados precedentes do STF sobre o direito à educação, o Poder Público deve agir sempre pela efetivação dos direitos fundamentais, e não para lhe frustrar o exercício:

“O ensino inclusivo é política pública estável, desenhada, amadurecida e depurada ao longo do tempo em espaços deliberativos nacionais e internacionais dos quais o Brasil faz parte. Não bastasse isso, foi incorporado à Constituição da República como regra. E ainda, não é possível sucumbir a argumentos fatalistas que permitam uma captura da Constituição e do mundo jurídico por supostos argumentos econômicos que, em realidade, se circunscrevem ao campo retórico. Sua apresentação desacompanhada de sério e prévio levantamento a dar-lhes sustentáculo, quando cabível, não se coaduna com a nobre legitimidade atribuída para se incoar a atuação desta Corte.” (Min. Edson Fachin) 21

“[...] as normas programáticas vinculam e obrigam os seus destinatários, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. [...] Não se mostrará lícito, contudo, ao Poder Público, em tal hipótese, criar obstáculo artificial que revele – a partir de indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político- -administrativa – o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. (ADPF 45/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Informativo/STF nº 345/2004). [...]” (Min. Celso de Mello) 22

Os Artigos 34 a 39 da Convenção de Nova York instituíram o Comitê sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência da Organização das Nações Unidas, a quem compete receber e analisar relatórios periódicos dos Estados-partes sobre a sua efetiva implementação. Em 2015, o Comitê apresentou suas Observações finais sobre o relatório inicial do Brasil , nas quais denunciou a necessidade de adequação das práticas nacionais à Convenção:

“7. O Comitê recomenda que o Estado Parte desenvolva uma estratégia voltada para a deficiência para implementar o modelo de direitos humanos de deficiência. O Comitê recomenda ainda que, em coordenação com as organizações de pessoas com deficiências, o Estado Parte inicie uma revisão sistemática da legislação, políticas e programas existentes e, se necessário, ajuste-os de acordo com a Convenção. Isto deve incluir uma revisão de toda a legislação, políticas ou programas em que os direitos das pessoas com deficiência sejam limitados ou negados com base na deficiência, ou em que os serviços e benefícios para as pessoas com deficiência levem à sua segregação ou exclusão.” 23

No Comentário Geral nº 4 (2016) 24, o Comitê repudiou políticas diferenciadas que, a pretexto de facilitar o acesso ao ensino, impliquem em perpetuação da exclusão:

“41. [...] (a) Não discriminação em todos os aspectos da educação, abrangendo todos os motivos de discriminação internacionalmente proibidos. Os Estados partes devem assegurar a não exclusão educacional de pessoas com deficiência e eliminar as desvantagens estruturais para alcançar participação e igualdade efetivas para todas as pessoas com deficiência. Também devem urgentemente tomar medidas para remover todas as formas de discriminação, sejam legais, administrativas e de outros tipos, que impeçam o direito de acesso à educação inclusiva. A adoção de medidas de ação afirmativa não constitui uma violação do direito à não discriminação em relação à educação, desde que tais medidas não levem à manutenção de padrões desiguais ou separados para diferentes grupos.” 25

“70. O Comitê insta os Estados partes a transferir recursos de ambientes segregados para ambientes inclusivos. Os Estados Partes devem desenvolver um modelo de financiamento que aloque recursos e incentivos para ambientes educacionais inclusivos, a fim de fornecer o apoio necessário às pessoas com deficiência. A determinação da abordagem mais adequada ao financiamento será, em grande medida, determinada pelo ambiente educacional existente e pelas necessidades dos possíveis alunos com deficiência afetados.”26

Atualmente, a legislação brasileira favorece a inclusão nas escolas públicas regulares, as quais recebem em dobro a verba correspondente à pessoa com deficiência, pelo chamado sistema da “dupla matrícula” (art. 9º-A do Decreto nº 6.253/2007). De modo perverso, o recente Decreto institucionaliza o desvio desses recursos públicos para destinação a instituições privadas que fomentam a exclusão educacional, em “escolas especializadas” e “classes especializadas” que substituem as escolas regulares. Passou-se a ter uma política oficial de incentivo e subsídio financeiro estatal à exclusão escolar. Mutatis mutandis, vale o ensinamento de Meire Cavalcante:

“Desta forma, o novo decreto permite que escolas especiais ofertem a Educação, ou seja, que sejam espaços segregados de escolarização regulamentados por lei. Isso significa que elas poderão substituir a escolarização em classes comuns de escolas regulares, fato já superado no nosso país. Além disso, poderão receber duplamente pela matrícula do aluno na escola especial e no AEE. A força motriz da inclusão (a dupla matrícula no Fundeb) tornou-se, agora, a força motriz da exclusão.” 27

A inaceitável reinstituição da educação especial terceirizada, em prejuízo da ampliação do investimento no ensino regular inclusivo, defende interesses opostos àqueles das pessoas com deficiência, pois alivia as escolas particulares e os governantes que nunca assumiram suas responsabilidades, além de beneficiar instituições privadas que adotam um modelo educacional retrógrado28.

Cabe ao Estado proporcionar meios para a escolarização inclusiva dos alunos com deficiência, que é obrigatória e não somente “preferencial”. Não pode, portanto,e favorecer um modelo educacional constitucionalmente proibido, ainda que a título de “decisão” ou “alternativa”. É o que enfatizou o Comentário Geral nº 6 (2018) 29 ao tratar da vedação de sistemas paralelos de ensino:

“18. Para que o artigo 24 (2) (a) seja implementado, a exclusão de pessoas com deficiência do sistema geral de ensino deve ser proibida, inclusive por meio de quaisquer disposições legislativas ou regulamentares que limitem sua inclusão com base em sua deficiência ou no grau de sua deficiência, tal como o condicionamento da inclusão ao tamanho do potencial do indivíduo ou a alegação de um ônus desproporcional e indevido para evitar a obrigação de fornecer adaptação razoável.30 [...]

29. As medidas específicas adotadas pelos Estados partes, de acordo com o artigo 5 (4) da Convenção, devem ser consistentes com todos os seus princípios e disposições. Em particular, não devem resultar na perpetuação do isolamento, da segregação, dos estereótipos, da estigmatização ou da discriminação das pessoas com deficiência. Assim, os Estados partes devem consultar de perto e envolver ativamente as organizações representativas das pessoas com deficiência quando adotarem medidas específicas. 31

40. O Artigo 4 (2) exige que os Estados Partes tomem medidas, no limite máximo dos recursos disponíveis para direitos econômicos, sociais e culturais e, quando necessário, dentro de uma estrutura de cooperação internacional, com vistas a atingir progressivamente a plena realização desses direitos. A realização progressiva significa que os Estados-partes têm a obrigação específica e contínua de agir da forma mais rápida e eficaz possível para a plena realização do artigo 24. Isso não é compatível com a manutenção de dois sistemas de educação: um sistema de ensino regular e um sistema de ensino especial/segregado. A realização progressiva deve ser entendida em conjunto com o objetivo geral da Convenção de estabelecer obrigações claras para os Estados partes em relação à plena realização dos direitos em questão. Da mesma forma, os Estados partes são encorajados a redefinir as alocações orçamentárias para a educação, inclusive transferindo parte de seus orçamentos para o desenvolvimento da educação inclusiva. [...]” 32

À vista de tamanho retrocesso, a professora Maria Teresa Eglér Mantoan, da Unicamp, lamenta que “o Brasil, mais uma vez, seja desonrado por descumprir e ignorar seus compromissos internacionais, visto que o país é signatário de documentos que pugnam pela inclusão, incondicionalmente”. 33


INCLUSÃO COMO DIREITO DE TODOS

Sem dúvida, a educação inclusiva constitui um direito constitucional fundamental, incondicional, indisponível e inalienável de cada aluno.

Esse direito merece proteção ainda maior quando se trata de criança ou adolescente com deficiência, por sua posição de dupla vulnerabilidade: “[o] seu filho com deficiência tem tanto direito de acesso à escola comum como qualquer outra criança sem deficiência. Esse direito, em nível de ensino fundamental, principalmente, é INDISPONÍVEL . Ou seja, ninguém pode abrir mão, nem ele e nem você por ele. É um direito humano , fundamental e ele não pode ser tolhido disso.” 34

Porém, o direito à inclusão não é apenas dos alunos com deficiência, mas de todas as pessoas que podem ser privadas de seu convívio, ou seja, da sociedade como um todo: “[...] a educação inclusiva é boa, possível, necessária e, mais que isso, um direito de TODOS [...] A escola inclusiva, que é uma escola de TODOS, ensina não apenas conhecimento técnico-científico, mas valores, princípios e atitudes. Ensina a viver junto, a conviver com um ambiente de tolerância e harmonia em meio à diversidade . [...]o ambiente de segregação não é bom para NINGUÉM! Nem para quem tem deficiência, nem para quem não tem.” 35

Hodiernamente, as escolas destinadas às pessoas com deficiência não podem mais ser “escolas especializadas” ou “classes especializadas”, específicas, exclusivas e substitutivas do ensino regular; são, agora, as mesmas escolas e classes destinadas às pessoas sem deficiência. No atual panorama constitucional, as escolas são de todos!


INCLUSÃO COMO DEVER DE TODOS

Nos termos do art. 205. da Constituição Federal, a educação constitui um dever do Estado, da família e da sociedade:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Ou seja, ao direito subjetivo da pessoa com deficiência corresponde um dever a ser exigido das autoridades e dos particulares:

“Educação inclusiva é política de Estado, compromisso reiterado quando da ratificação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, não cabendo mudança de conceito e privação de direitos que podem gerar consequências gravíssimas no que diz respeito à vida independente e autonomia, inclusive. Educação é direito indisponível e inalienável; a criança deve estudar, os pais e o estado assumem este compromisso por obrigação de fazer . Não cabe decisão contrária ao acesso e permanência na escola de todos e de cada um, sob risco de se violar gravemente a lei.” 36

Assim, a matrícula na rede regular de ensino não pode depender de uma “escolha” da família ou mesmo do próprio aluno, por se tratar de uma obrigação incondicional prevista nos arts. 4º e 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990), que não permitem exceções:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.

A doutrina frisa que, por decorrer de um interesse público e social, esse dever é oponível a todos, inclusive aos próprios familiares:

“É sabido que privar uma pessoa em idade escolar (4 a 17 anos) do acesso à escola comum se configura abandono intelectual por parte da família e grave afronta ao marco legal do país, se praticado pelo poder público. [...] Nesse caso, configura uma discriminação por motivo de deficiência, uma vez que a decisão de não matricular na escola comum impede o reconhecimento, o gozo e o exercício de um direito humano fundamental , em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.” 37

Portanto, a inclusão escolar é um direito de todos, indistintamente, e da mesma forma é obrigação de todos lhe dar máxima efetividade.


INCLUSÃO COMO DEVER DO ESTADO

A Convenção de Nova York dispõe expressamente que o Estado Parte tem a obrigação de dar efetividade às suas normas, que proíbem qualquer discriminação, inclusive nas esferas administrativa e judicial:

Artigo 4 – Obrigações gerais

1. Os Estados Partes se comprometem a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência. Para tanto, os Estados Partes se comprometem a:

a) Adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção;

b) Adotar todas as medidas necessárias, inclusive legislativas, para modificar ou revogar leis, regulamentos, costumes e práticas vigentes, que constituírem discriminação contra pessoas com deficiência;

c) Levar em conta, em todos os programas e políticas, a proteção e a promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiência;

d) Abster-se de participar em qualquer ato ou prática incompatível com a presente Convenção e assegurar que as autoridades públicas e instituições atuem em conformidade com a presente Convenção; [...]”

O Comentário Geral nº 4 (2016) 38 frisa que o dever de eliminar obstáculos à inclusão deve ser cumprido imediatamente:

“41. A realização progressiva não prejudica as obrigações imediatamente aplicáveis. Como o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais declarou em seu Comentário Geral nº 3 (1990) sobre a natureza das obrigações dos Estados Partes, os Estados partes têm uma obrigação principal mínima para assegurar a satisfação de níveis mínimos essenciais de cada aspecto do direito à educação. Portanto, os Estados partes devem implementar os seguintes direitos fundamentais com efeito imediato:

(a) Não discriminação em todos os aspectos da educação, abrangendo todos os motivos de discriminação internacionalmente proibidos. Os Estados partes devem assegurar a não exclusão educacional de pessoas com deficiência e eliminar as desvantagens estruturais para alcançar participação e igualdade efetivas para todas as pessoas com deficiência. Também devem urgentemente tomar medidas para remover todas as formas de discriminação, sejam legais, administrativas e de outros tipos, que impeçam o direito de acesso à educação inclusiva. A adoção de medidas de ação afirmativa não constitui uma violação do direito à não discriminação em relação à educação, desde que tais medidas não levem à manutenção de padrões desiguais ou separados para diferentes grupos. [...]” 39

Assim, todas as normas, costumes e práticas incompatíveis, que possam implicar em tratamento discriminatório, ainda que não revogadas, devem ser interpretadas conforme a Constituição Federal:

“19. Para que o artigo 4 (1) (b) da Convenção seja implementado, os Estados partes devem tomar todas as medidas apropriadas, inclusive legislativas, para modificar ou revogar leis, regulamentos, costumes e práticas existentes que constituam discriminação contra pessoas com deficiência e que violem o artigo 24. Sempre que necessário, as leis, regulamentos, costumes e práticas discriminatórias devem ser revogados ou alterados de forma sistemática e tempestiva.”40

Com maior razão, não é admissível que o Poder Público estabeleça exceções à inclusão educacional, porque lhe compete assegurar igualdade de tratamento a todos, como diz o Comentário Geral nº 6 (2018) 41:

“12. A igualdade e a não discriminação são tanto princípios quanto direitos. A Convenção refere-se a ambos, no artigo 3 como princípios e no artigo 5 como direitos. Também são também uma ferramenta interpretativa para todos os outros princípios e direitos consagrados na Convenção. Os princípios/direitos da igualdade e da não discriminação são uma pedra angular da proteção internacional garantida pela Convenção. Promover a igualdade e combater a discriminação são obrigações transversais de realização imediata. Não estão sujeitas a cumprimento progressivo. [...]”42

No já citado ADI 5357, o STF assentou que as políticas públicas devem assegurar medidas para efetivar concretamente o acesso igualitário à educação:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. LEI 13.146/2015. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ENSINO INCLUSIVO. CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INDEFERIMENTO DA MEDIDA CAUTELAR. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 13.146/2015 (arts. 28, § 1º e 30, caput, da Lei nº 13.146/2015). [...]

4. [...] Assim, a igualdade não se esgota com a previsão normativa de acesso igualitário a bens jurídicos, mas engloba também a previsão normativa de medidas que efetivamente possibilitem tal acesso e sua efetivação concreta.”43

O Ministro Edson Fachin alertou para o risco de oficializar a discriminação caso fossem criadas exceções ao modelo inclusivo:

“Não se pode, assim, pretender entravar a normatividade constitucional sobre o tema com base em leitura dos direitos fundamentais que os convolem em sua negação. [...] Perceba-se: corre-se o risco de se criar às instituições particulares de ensino odioso privilégio do qual não se podem furtar os demais agentes econômicos. Privilégio odioso porque oficializa a discriminação.” 44

No mesmo feito, o Ministro Luiz Fux também ressaltou que a Constituição Federal deve permear toda interpretação normativa:

“Tecnicamente, Senhor Presidente, eu diria que, no momento em que hoje se encontra o Direito Constitucional brasileiro, e até se afirma que a Constituição Federal ela é invasiva, porque invade todos os ramos da ciência jurídica, e isso na verdade é uma característica do neoconstitucionalismo, não se pode efetivamente empreender uma leitura da legislação infraconstitucional sem passar pelo tecido normativo da Constituição.”45

A Ministra Rosa Weber transcreveu ainda o magistério da Procuradora da República Eugênia Gonzaga 46, verbis:

“Os dirigentes de ensino, teimando em dizer que querem fazer uma ‘inclusão responsável’, continuam recusando matrículas e não promovendo as transformações necessárias. Responsável é fazer o que precisa ser feito para receber os alunos com deficiência.”47

Em caso concreto também já mencionado (ARE 639.337 AgR), o STF afirmou que a efetivação do direito subjetivo à educação não pode ser restringida pela discricionariedade dos governantes:

“POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO CONCRETIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL.

A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível [...]

A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. [...]

DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL.

O Poder Público - quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no próprio texto constitucional - transgride, com esse comportamento negativo, a própria integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g..

A inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais traduz inaceitável gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado. É que nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos. [...]

A intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais previstas e determinadas no texto constitucional, notadamente na área da educação infantil (RTJ 199/1219-1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República assegura à generalidade das pessoas. Precedentes.” 48

Em seu voto condutor, o Ministro Celso de Mello sublinhou:

“O fato que tenho por relevante consiste no reconhecimento de que a interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente. [...]

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da ‘reserva do possível’ – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.”49

Assim, em face de ato estatal que contrarie o desígnio constitucional, compete ao Poder Judiciário assegurar a sua plena efetividade (art. 5º, XXV, da Constituição).


CONCLUSÃO

Em resumo, as normas constitucionais que asseguram a todos o direito fundamental a um sistema educacional inclusivo, que é obrigatório, incondicional e irrenunciável, estão albergadas em cláusulas pétreas e devem ser imediatamente aplicáveis no plano interno e interpretadas de modo a lhes conceder máxima efetividade.

Todas as normas jurídicas devem respeito à Convenção de Nova York. Qualquer regulamento posterior que impuser restrições ao seu alcance incorre em flagrante inconstitucionalidade, a ser declarada pelo Poder Judiciário, mediante controle concentrado ou difuso.


NOTA DE ATUALIZAÇÃO

Em 5 de outubro de 2020, o partido Rede Sustentabilidade ajuizou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 751, que foi distribuída ao Ministro Dias Toffoli. (Veja aqui as peças processuais ).


Notas

1 Martinha Clarete Dutra dos Santos. Do direito à educação. Educação inclusiva: direito incondicional e indisponível. In: Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Comentada. Joyce Marquezin Setubal, Regiane Alves Costa Fayan (org.). Campinas: Fundação FEAC, 2017, 1ª edição revisada. https://www.feac.org.br/wp-content/uploads/2017/12/Lei-Brasileira-de-Inclusao-da-Pessoa-com-Deficiencia_vol.II_.pdf

2 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

3 https://diversa.org.br/educacao-inclusiva/por-onde-comecar/conceitos-fundamentais/

4 Martinha Clarete Dutra dos Santos. Do direito à educação. Educação inclusiva: direito incondicional e indisponível. In: Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Comentada. Joyce Marquezin Setubal, Regiane Alves Costa Fayan (org.). Campinas: Fundação FEAC, 2017, 1ª edição revisada. https://www.feac.org.br/wp-content/uploads/2017/12/Lei-Brasileira-de-Inclusao-da-Pessoa-com-Deficiencia_vol.II_.pdf

5 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

6 https://diversa.org.br/educacao-inclusiva/por-onde-comecar/conceitos-fundamentais/

7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc12-78.htm

8 Ministério Público Federal. Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. O acesso de pessoas com deficiência às classes e escolas comuns da rede regular de ensino. Brasília, 2003. https://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/pessoa-com-deficiencia/manual_acesso_pessoas_com_deficiencia.pdf

9 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

10 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

11 Há apenas mais uma norma internacional que seguiu o mesmo rito: é o Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras Dificuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso. https://www4.planalto.gov.br/legislacao/portal-legis/internacional/tratados-equivalentes-a-emendas-constitucionais-1

12 Luiz Alberto David Araujo. O Supremo Tribunal Federal e o dever de incluir: um vetor claro e inequívoco do direito à educação superior no Brasil. In: Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. especial 3, p. 43-53, dez. 2017. https://www.scielo.br/pdf/er/nspe.3/0104-4060-er-03-43.pdf

13 STF, ADI 5.357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

14 Nota Técnica nº 62/2011 da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI e da Diretoria de Políticas de Educação Especial - DPEE. https://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/download/nota_tecnica_62.pdf

15 https://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/temas-de-atuacao/inclusao-para-pessoas-com-deficiencia/educacao-inclusiva/documentos-tecnicos-pfdc/nota-tecnica-meta4-gt-inclusao

16 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

17 https://inclusaoja.com.br/2011/12/08/plano-nacional-de-educacao-inclusao-escolar-ameacada/

18 https://inclusaoja.com.br/2018/05/12/o-ministerio-da-educacao-quer-reformar-a-politica-de-inclusao-escolar/

19 Breves considerações sobre os deveres de proteção do Estado e a garantia da proibição de retrocesso em matéria ambiental. In: Revista de Direito Ambiental, n. 58, abr./jun. 2010. https://pfdc.pgr.mpf.mp.br/temas-de-atuacao/educacao/atuacao/recomendacao-1-2018-pfdc-mpf

20 STF, ARE 639.337 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 23/08/2011, DJe 14/9/2011. https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627428

21 Voto do Relator. STF, ADI 5357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

22 Voto condutor. STF, ARE 639.337 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 23/08/2011, DJe 14/9/2011. https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627428

23 https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cpd/documentos/relatorio-do-comite-da-onu-sobre-os-direitos-das-pessoas-com-deficiencia-traduzido-em-portugues

24 https://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx

25 41. […] (a) Non-discrimination in all aspects of education and encompassing all internationally prohibited grounds of discrimination. States parties must ensure nonexclusion from education for persons with disabilities and eliminate structural disadvantages to achieve effective participation and equality for all persons with disabilities. They must urgently take steps to remove all legal, administrative and other forms of discrimination impeding the right of access to inclusive education. The adoption of affirmative action measures does not constitute a violation of the right to non-discrimination with regard to education, so long as such measures do not lead to the maintenance of unequal or separate standards for different groups.

26 70. The Committee urges States parties to transfer resources from segregated to inclusive environments. States parties should develop a funding model that allocates resources and incentives for inclusive educational environments to provide the necessary support to persons with disabilities. The determination of the most appropriate approach to funding will be informed to a significant degree by the existing educational environment and the requirements of potential learners with disabilities who are affected by it.

27 https://inclusaoja.com.br/2011/11/20/educacao-inclusiva-o-brasil-nao-pode-e-nao-ira-retroceder/

28 https://inclusaoja.files.wordpress.com/2020/10/carta-convocacao-contra-desmonte-da-pneepei.pdf

29 https://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx

30 18. For article 24 (2) (a) to be implemented, the exclusion of persons with disabilities from the general education system should be prohibited, including through any legislative or regulatory provisions that limit their inclusion on the basis of their impairment or the degree of that impairment, such as by conditioning inclusion on the extent of the potential of the individual or by alleging a disproportionate and undue burden to evade the obligation to provide reasonable accommodation. […]

31 29. Specific measures adopted by States parties under article 5 (4) of the Convention must be consistent with all its principles and provisions. In particular, they must not result in perpetuation of isolation, segregation, stereotyping, stigmatization or otherwise discrimination against persons with disabilities. Thus, States parties must consult closely with and actively involve representative organizations of persons with disabilities when they adopt specific measures.

32 40. Article 4 (2) requires that States parties take measures to themaximum of their available resources regarding economic, social and cultural rights and, where needed, within a framework of international cooperation, with a view to achieving progressively the full realization of those rights. Progressive realization means that States parties have a specific and continuing obligation to move as expeditiously and effectively as possible towards the full realization of article 24. This is not compatible with sustaining two systems of education: a mainstream education system and a special/segregated education system. Progressive realization must be read in conjunction with the overall objective of the Convention to establish clear obligations for States parties in respect of the full realization of the rights in question. Similarly, States parties are encouraged to redefine budgetary allocations for education, including by transferring part of their budgets to the development of inclusive education. […]

33 Manifesto do LEPED em repúdio ao desmonte da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI/2008). https://inclusaoja.files.wordpress.com/2020/10/carta-convocacao-contra-desmonte-da-pneepei.pdf

34 Ministério Público Federal. Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Nota Técnica sobre a Meta 4 do Plano Nacional de Educação – PNE (PLC 103/2012). Brasília, 2013. https://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/temas-de-atuacao/inclusao-para-pessoas-com-deficiencia/educacao-inclusiva/documentos-tecnicos-pfdc/nota-tecnica-meta4-gt-inclusao

35 Juliana Izar Soares da Fonseca Segalla. Direito à educação. In: Manual dos Direitos da Pessoa com Deficiência. São Paulo, Saraiva, 2012

36 Em defesa da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Org. Maria Teresa Eglér Mantoan. Campinas: Unicamp, 2018. https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

37 Em defesa da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Org. Maria Teresa Eglér Mantoan. Campinas: Unicamp, 2018. https://inclusaoja.files.wordpress.com/2018/05/texto-de-anc3a1lise-dos-slides-sobre-a-reforma-da-pneepei-final1.pdf

38 https://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx

39 41. Progressive realization does not prejudice those obligations that are immediately applicable. As the Committee on Economic, Social and Cultural Rights has stated in its general comment No. 3. (1990) on the nature of States parties’ obligations, States parties have a minimum core obligation to ensure the satisfaction of, at the very least, minimum essential levels of each aspect of the right to education. Therefore, States parties should implement the following core rights with immediate effect: (a) Non-discrimination in all aspects of education and encompassing all internationally prohibited grounds of discrimination. States parties must ensure nonexclusion from education for persons with disabilities and eliminate structural disadvantages to achieve effective participation and equality for all persons with disabilities. They must urgently take steps to remove all legal, administrative and other forms of discrimination impeding the right of access to inclusive education. The adoption of affirmative action measures does not constitute a violation of the right to non-discrimination with regard to education, so long as such measures do not lead to the maintenance of unequal or separate standards for different groups.

40 19. For article 4 (1) (b) of the Convention to be implemented,States parties should take all appropriate measures, including legislation, to modify or abolish existing laws, regulations, customs and practices that constitute discrimination against persons with disabilities and that are in violation of article 24.Where necessary, discriminatory laws, regulations, customs and practices should be repealed or amended in a systematic and timebound manner.

41 https://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx

42 12. Equality and non-discrimination are principles and rights. The Convention refers to them in article 3 as principles and in article 5 as rights. They are also an interpretative tool for all the other principles and rights enshrined in the Convention. The principles/rights of equality and non-discrimination are a cornerstone of the international protection guaranteed by the Convention. Promoting equality and tackling discrimination are cross-cutting obligations of immediate realization. They are not subject to progressive realization.

43 STF, ADI 5357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

44 Voto do Relator. STF, ADI 5357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

45 Voto do Ministro Luiz Fux. STF, ADI 5357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

46 Eugênia Gonzaga. Direitos de pessoas com deficiência: garantia e igualdade na diversidade. 3ª ed. Rio de Janeiro: WVA Ed. 2012, p. 103

47 Apud voto da Ministra Rosa Weber. STF, ADI 5357, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 9/6/2016, DJe 10/11/2016. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=310709378&ext=.pdf

48 STF, ARE 639.337 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 23/08/2011, DJe 14/9/2011. https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627428

49 Voto condutor. STF, ARE 639.337 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 23/08/2011, DJe 14/9/2011. https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627428


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Paulo Gustavo Sampaio. Educação inclusiva como direito de todos. Inconstitucionalidade do Decreto nº 10.502/2020 frente à Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6304, 4 out. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/85803. Acesso em: 26 abr. 2024.